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acredito muito em Deus.<br />
Milagre<br />
Dostoiévski observou que os seres humanos não estão à procura de Deus; estão à<br />
procura do milagre. Deus é o objeto mágico que, se propriamente manipulado, faz<br />
a minha vontade, realiza o meu pedido. Traduzindo em linguagem grosseira: não é<br />
ela ou ele que eu desejo, ao me casar. É o dinheiro que ela ou ele tem. No mundo<br />
do “eu-tu”, o outro ouve atentamente e acolhe o tu como parte de si mesmo. Pode<br />
ser um cachorro, uma árvore, uma criança, um ancião, até mesmo o chefe... E, ao<br />
assim me relacionar, um mundo humano é criado ao meu redor, mundo em que as<br />
entidades não são objetos de uso, mas objetos de prazer. Buber conclui sua<br />
filosofia dizendo que Deus não está aqui, não está ali; Deus está “entre”, na<br />
relação, no hífen... Deus se encontra no espaço misterioso e invisível da relação.<br />
Dois tipos de experiência religiosa<br />
O primeiro é quando a alma faz silêncio para ouvir a música sagrada que o Grande<br />
Mistério faz tocar no universo. Não se pede nada. A beleza do sagrado nos basta.<br />
Essa experiência religiosa nos torna mais sábios e belos. O segundo tipo de<br />
experiência religiosa é quando a alma sai em busca de fórmulas para engaiolar o<br />
sagrado a fim de usá-lo para os seus propósitos. A alma nada ouve da melodia do<br />
Grande Mistério porque está chafurdada na confusão dos desejos e na confusão da<br />
vida. Quanto mais ávidos do milagre, mais longe de Deus.<br />
Quem mais ama?<br />
Não é preciso acreditar que Deus existe para se ter a experiência do sagrado. Os<br />
poetas ateus sabem disso. Disse o Chico: “Saudade é o revés do parto. É arrumar o<br />
quarto para o filho que já morreu”. Qual é a mãe que mais ama? Aquela que<br />
arruma o quarto porque o filho vai chegar ou aquela que arruma o quarto para o<br />
filho que nunca vai chegar? Muitos altares são construídos diante do abismo escuro.<br />
Sabia disso também o místico espanhol católico dom Miguel de Unamuno:<br />
“Acreditar em Deus é, antes de mais nada e principalmente, querer que ele exista”.<br />
O sentimento religioso não mora no mundo das coisas que existem. Se Deus<br />
existisse, então o mundo seria o Paraíso... Deus mora no mundo das coisas que<br />
não existem, o mundo da saudade, da nostalgia. Os deuses que moram no mundo<br />
das coisas que existem não são deuses. São ídolos.