12.04.2013 Views

Mrio-Zambujal-Cronica-Dos-Bons-Malandros - Agrupamento de ...

Mrio-Zambujal-Cronica-Dos-Bons-Malandros - Agrupamento de ...

Mrio-Zambujal-Cronica-Dos-Bons-Malandros - Agrupamento de ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

das escoriações menores nas bochechas e no pescoço. “Que selvagem! Que<br />

val<strong>de</strong>vinos! “, clamavam mesmo as visitas <strong>de</strong> melhor porte, referindo-se -<br />

esclareça-se - ao pequeno Pedro, por outro lado elevado a herói por todas as<br />

vítimas <strong>de</strong> Dona Glória, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> aí baptizado como o justiceiro, que não o era<br />

menos que o outro.<br />

Pedro e as vinte e sete cabras <strong>de</strong>sembarcaram em Vila Franca <strong>de</strong> Xira a<br />

meio da tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma quarta-feira <strong>de</strong> Março.<br />

E agora? - perguntou a si próprio, amarrado <strong>de</strong> angústia, olhando as ruas<br />

<strong>de</strong>sconhecidas on<strong>de</strong> passava gente <strong>de</strong>sconhecida, que havia <strong>de</strong> ter mais que<br />

fazer que preocupar-se com ele, Pedro, al<strong>de</strong>ãozinho <strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos, atormentado<br />

caminheiro dos labirintos da quarta classe sob a férrea regência da Couve<br />

Lombarda.<br />

“E agora? Tens cá família?” O homem da camioneta tinha uns olhos<br />

gran<strong>de</strong>s e bondosos, Pedro sentiu vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> contar tudo, <strong>de</strong> pedir socorro,<br />

tinha <strong>de</strong>z anos e estava só - mais só que um órfão <strong>de</strong> pai e mãe, órfão <strong>de</strong> al<strong>de</strong>ia,<br />

órfão <strong>de</strong> toda a gente.<br />

“Não, aqui não conheço ninguém. Só em Lisboa...” Quando começou a<br />

dizer era mentira, mas <strong>de</strong>pois lembrou-se que sim senhor, até conhecia,<br />

conhecia o senhor Florêncio, estabelecido no Bairro Alto com casa <strong>de</strong> comes e<br />

bebes. Só que o pai e o senhor Florêncio já não eram amigos, como o tinham<br />

sido muitos anos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a quarta classe <strong>de</strong>les, ainda não havia Couve<br />

Lombarda, mas a escola era a mesma, até talvez fosse a mesma palmatória.<br />

Muito amigos, sempre. Quando o senhor Florêncio ia <strong>de</strong> visita à al<strong>de</strong>ia,<br />

aquilo eram abraços e petiscadas, e a mãe nem se zangava porque o pai chegava<br />

bêbedo, tinha <strong>de</strong>sculpa, estava lá o amigo, além <strong>de</strong> que nessas noites o pai não<br />

gastava dinheiro da féria. Pedro bem gostaria, agora, que eles ainda fossem<br />

amigos. Mas na última vez que o senhor Florêncio fora à terra estalara um<br />

arraial <strong>de</strong> pancadaria, nem era nada com o pai <strong>de</strong> Pedro, mas ele metera-se ao<br />

barulho e havia <strong>de</strong> lhe dar o vinho para se pôr contra o amigo, o <strong>de</strong> Lisboa,<br />

proprietário <strong>de</strong> estabelecimento no Bairro Alto, nem menos.<br />

O senhor Florêncio ainda tinha, com certeza, uma cicatriz gran<strong>de</strong> e feia,<br />

porque o pai <strong>de</strong> Pedro <strong>de</strong>ra-lhe com uma garrafa <strong>de</strong> anis escarchado na cabeça,<br />

e partiram-se as duas, a cabeça e a garrafa, e saía o sangue e entrava o anis, era<br />

uma mistura cor-<strong>de</strong>-rosa “rosé”, como diria <strong>de</strong>pois o António Carteiro,<br />

afirmando que ainda fora uma sorte porque assim não tinha infectado.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!