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A CIDADE E AS SERRAS - Portal Educacional

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E Ç A D E Q U E I R Ó S<br />

jurou que assim o ordenara o seu Jacinto. Mas, decorridas semanas, tremi. Aparecera, vindo de Lisboa, um<br />

contramestre, com operários, e mais caixotes, para instalar um telefone!<br />

–Um telefone, em Tormes, Jacinto?<br />

O meu Príncipe explicou, com humildade:<br />

–Para casa de meu sogro!... bem vês.<br />

Era razoável e carinhoso. O telefone porém, sutilmente, mudamente, estendeu outro longo fio, para<br />

Valverde. E Jacinto, alargando os braços, quase suplicante:<br />

–Para casa do médico. Compreendes...<br />

Era prudente. Mas, certa manhã, em Guiães, acordei aos berros da tia Vicência! Um homem chegara,<br />

misterioso, com outros homens, trazendo arame, para instalar na nossa casa o novo invento. Sosseguei a tia<br />

Vicência, jurando que essa máquina nem fazia barulho, nem trazia doenças, nem atraía as trovoadas. Mas<br />

corri a Tormes. Jacinto sorriu, encolhendo os ombros:<br />

–Que queres? Em Guiães está o boticário, está o carniceiro... E, depois, estás tu!<br />

Era fraternal. Todavia pensei: Estamos perdidos! Dentro dum mês temos a pobre Joana a apertar o<br />

vestido pôr meio duma máquina! Pois não! o Progresso, que, à intimação de Jacinto, subira a Tormes a<br />

estabelecer aquela sua maravilha, pensando talvez que conquistara mais um reino para desfear, desceu,<br />

silenciosamente, desiludido, e não avistamos mais sobre a serra a sua hirta sombra cor de ferro e de fuligem.<br />

Então compreendi que, verdadeiramente, na alma de Jacinto se estabelecera o equilíbrio da vida, e com ele a<br />

Grã–Ventura, de que tanto tempo ele fora o Príncipe sem Principado. E uma tarde, no pomar, encontrando o<br />

nosso velho Grilo, agora reconciliado com a serra, desde que a serra lhe dera meninos para trazer às<br />

cavaleiras, observei ao digno preto, que lia o seu Fígaro, armado de imensos óculos redondos:<br />

–Pois, Grilo, agora realmente bem podemos dizer que o Sr. D. Jacinto está firme.<br />

O Grilo arredou os óculos para a testa, e levantando para o ar os cinco dedos em curva como pétalas<br />

duma tulipa:<br />

–Sua Exª brotou!<br />

Profundo sempre o digno preto! Sim! Aquele ressequido galho da Cidade, plantado na serra, pregara,<br />

chupara o humo do torrão herdado, criara seiva, afundara raízes, engrossara de tronco, atirara ramos,<br />

rebentara em flores, forte, sereno, ditoso, benéfico, nobre, dando frutos, derramando sombra. E abrigados<br />

pela grande árvore, e pôr ela nutridos, cem casais em redor a bendiziam.<br />

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