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11 DOS CORONÉIS DE BARRANCO - Biblioteca da Floresta

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<strong>11</strong> ­ <strong>DOS</strong> <strong>CORONÉIS</strong> <strong>DE</strong> <strong>BARRANCO</strong><br />

(1912/1942 a 1958­1967)<br />

Durante a viagem que se realizou pelo (Álbum do) Rio Acre<br />

através do olhar <strong>da</strong> objetiva de Emílio Falcão, salientei a linguagem<br />

mercantil que caracterizava o tratamento que os diferentes protagonistas<br />

se emprestavam ­ o industrial, o comerciante, a empresa, o fábrico, o<br />

capitalista, o oper ário ­ e que alertou para o caráter empresarial dos<br />

seringais acreanos.<br />

Poder­se­ia ter destacado ali mesmo o tratamento de Capitão,<br />

Major e Coronel também presente entre os mesmos personagens e que<br />

nos remeteria às relações sociais marca<strong>da</strong>s pelo coronelismo tão<br />

características de formação social do país. É dessa dimensão que vou<br />

tratar agora.<br />

O Acre não conhecera, ‘... os autênticos ou falsos<br />

‘coronéis’ <strong>da</strong> extinta Guar<strong>da</strong> Nacional’ 1 , cria<strong>da</strong> em 18 de<br />

agosto de 1831, a cuja origem se deve o coronelismo, um dos fenômenos<br />

sociológicos mais característicos de formação socioespacial do Brasil, até<br />

porque à época não fazia parte do território brasileiro.<br />

No entanto, lá estavam presentes no Acre, aquelas insígnias que<br />

qualificam lugares sociais, emprestando­lhes poder e prestígio. No caso<br />

acreano, o cor onel remonta ao sertão, sobretudo cearense que, como se<br />

viu, é de onde provém a maior parte dos que para ali/aqui migraram. Há<br />

uma história incorpora<strong>da</strong>, no sentido forte que essa expressão possa<br />

conter, ou seja, de que os corpos carregam consigo, por meio do habitus,<br />

uma história. Nesse sentido, pode­se dizer que o cor onelismo do sertão<br />

nordestino se trans­porta para os seringais dos altos rios, exatamente na<br />

medi<strong>da</strong> que os seus protagonistas portam costumes, hábitos, posturas,<br />

leal<strong>da</strong>des, fideli<strong>da</strong>des.<br />

1 ‘Com efeito, além dos que realmente ocupavam tal posto, o tratamento de ‘coronel’ começou desde<br />

logo a ser <strong>da</strong>do pelos sertanejos a todo e qualquer potentado’, conforme se expressa o historiador e<br />

filólogo Basílio de Magalhães (apud Leal, 1975 p. 19)’.<br />

224


No entanto, no Acre, com certeza, esses protagonistas que encimam<br />

as relações de caráter coronelístico foram algo mais que<br />

‘o posto (que) era geralmente concedido ao<br />

Chefe político <strong>da</strong> comuna’ (...) pelo qual ‘ele<br />

e os outros oficiais, uma vez inteirados <strong>da</strong>s<br />

suas respectivas nomeações, tratavam logo de<br />

obter as patentes, pagando­lhes os emolumentos<br />

e averbações, para que pudessem elas produzir<br />

seus efeitos legais’ (Magalhães, apud Leal, 1975<br />

p.21).<br />

As patentes no Acre tiveram tanto aquele caráter ‘<strong>da</strong>do pelos<br />

sertanejos a todo e qualquer potentado’, de que nos falara o<br />

historiador e filólogo Basílio de Magalhães (apud Leal, p. 19) , como<br />

aquele sentido que o Barão do Rio Branco tinha afirmado a respeito <strong>da</strong><br />

Guar<strong>da</strong> Nacional que prestara<br />

‘relevantíssimos serviços à ordem pública e<br />

foi um grande auxiliar do exército de linha<br />

nas nossas guerras estrangeiras, de 1851 a 1852 e<br />

de 1864 a 1870’ (Rio Branco, apud Leal, 1975, p.21).<br />

O caráter capitalista, com seu dinamismo empresarial característico,<br />

<strong>da</strong> montagem dos seringais acreanos, exigia, com certeza, uma habili<strong>da</strong>de<br />

maior para os negócios <strong>da</strong> empresa do que para os negócios <strong>da</strong> política.<br />

Os políticos amazonenses sabem o que isso significa. O Seringal Empresa<br />

é o que caracteriza a Territoriali<strong>da</strong>de Seringalista. Sabemos como o<br />

Seringal Empresa foi sendo transformado em Penápolis e, depois, em<br />

‘Rio Branco’ e, nesse mesmo movimento transformando­se em uma<br />

Territoriali<strong>da</strong>de mais complexa e contraditória de Seringueiros Autônomos<br />

e de Coronéis de Barranco.<br />

Tal como dissera George, 1971,, em seu Geografia social do<br />

mundo que ‘na França o capitalismo penetrou em to<strong>da</strong> parte<br />

mas o feu<strong>da</strong>lismo não saiu de parte alguma’, também no Acre o<br />

componente coronelístico esteve longe de ser algo que se contrapusesse<br />

ao caráter de empresa. O que se pode afirmar é que à medi<strong>da</strong> que os<br />

negócios <strong>da</strong> borracha entravam em crise mais o caráter coronelístico<br />

tendia a substituí­lo fato que, segundo Vitor Nunes Leal, é constituinte<br />

dessas relações, como será visto. Assim, os negócios <strong>da</strong> política<br />

tornavam­se mais importantes que os negócios <strong>da</strong> empresa.<br />

Só com o decorrer de nossa pesquisa é que fui sendo, pouco a<br />

pouco, convencido de que mu<strong>da</strong>ra a natureza <strong>da</strong>s relações socioespaciais,<br />

225


posto que os ‘de cima’ continuaram sendo chamados de patr ões ou de<br />

seringalistas, expressões que já haviam se consagrado. 2<br />

No entanto, se patr ão é uma designação que se pode observar<br />

atravessando os diferentes espaços acreanos ao longo do tempo, há um<br />

sutil deslocamento que põe o acento no Coronel e não mais no<br />

Capitalista.<br />

Mais uma vez será na companhia de Samuel Benchimol que serão<br />

encontra<strong>da</strong>s as razões para entender as relações sociais que estão a ser<br />

engendra<strong>da</strong>s e assumir o caráter coronelístico como um componente<br />

central que passa a configurar as contraditórias territoriali<strong>da</strong>des que<br />

marcam a geografia acreana. Foi ele quem apresentou o documento<br />

elaborado pelos ‘Coronéis de Barranco’ que, reunidos em Manaus,<br />

deliberaram apresentar um memorial­apelo ao Presidente Vargas em 21<br />

de agosto de 1939. Foi esse ensaísta, ele mesmo protagonista <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong>de­espaço que se põe a estu<strong>da</strong>r, quem destacou:<br />

‘os seringalistas arruinados foram promovidos<br />

pelos políticos a ‘Coronel de Barranco’.<br />

(...) ‘O papel que os ‘Coronéis de Barranco’,<br />

donos dos seringais, representaram nessa<br />

época tem sido explorado em prosa e em verso 3<br />

...” (Benchimol, op. cit. 1977: 349).<br />

As observações de Samuel Benchimol sobre os Coronéis de<br />

Barranco acabaram por remeter a Vitor Nunes Leal que, sem dúvi<strong>da</strong>,<br />

identificou no coronelismo um dos traços instituintes <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de<br />

brasileira, mormente após a independência. Em seu clássico livro<br />

Coronelismo, enxa<strong>da</strong> e voto, Leal soube captar na linguagem ordinária do<br />

dia­a­dia as práticas que engendram aquelas relações sociais e elevou o<br />

coronelismo à categoria de um conceito de alto poder explicativo <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong>de brasileira que está longe de ter sido esgotado 4 .<br />

Acompanhem esse olhar de Vitor Nunes Leal que afirma que no<br />

coronelismo:<br />

2<br />

­ De fato, ‘patrão é aplicado tanto ao proprietário quanto ao arren<strong>da</strong>tário ou gerente do seringal. Seu<br />

significado está referido ao exercício do poder e <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de. Patrão é aquele que estabelece as leis,<br />

faz com que sejam cumpri<strong>da</strong>s, tem poder sobre a vi<strong>da</strong> de seus fregueses’ (Allegretti op. cit. 43).<br />

3<br />

­ Não há como não deixar de ver aqui nessa expressão de Samuel Benchimol a presença do excelente<br />

romance de Araújo Lima ‘O Coronel de Barranco’.<br />

4<br />

­ A seguinte passagem chega a ser premonitória e não resisto a citá­la: “Novas condições...forçaram<br />

o velho tipo de chefe municipal a uma retira<strong>da</strong> estratégica: o coronel foi para o fundo do cenário. Mas,<br />

cautelosamente, deixou no primeiro plano, na direção <strong>da</strong> política de seu feudo, o genro­doutor, a<br />

facha<strong>da</strong> moderna do coronelismo como força política’ (Emil Farhat. O genro, o grande culpado.<br />

apud Leal, p.22. Os grifos são meus).<br />

226


‘o aspecto que salta aos olhos é o <strong>da</strong><br />

liderança, com a figura do ‘coronel’ ocupando<br />

o lugar de maior destaque’. ‘Esta ascendência,<br />

resulta muito naturalmente <strong>da</strong> sua quali<strong>da</strong>de<br />

de proprietário rural. A massa humana que<br />

tira sua subsistência <strong>da</strong>s suas terras vive no<br />

mais lamentável estado de pobreza, ignorância<br />

e abandono. Diante dela, o ‘coronel’ é rico.<br />

Há, é certo, muitos fazendeiros abastados e<br />

prósperos, mas o comum, nos dias de hoje, é o<br />

fazendeiro apenas ‘remediado’: gente que tem<br />

proprie<strong>da</strong>des e negócios, mas não possui<br />

disponibili<strong>da</strong>des financeiras; que tem o gado<br />

sob penhor ou a terra hipoteca<strong>da</strong>; que<br />

regateia taxas e impostos, pleiteando<br />

condescendência fiscal; que corteja os bancos<br />

e demais credores, para poder prosseguir suas<br />

ativi<strong>da</strong>des lucrativas. Quem já andou pelo<br />

interior há de ter observado a falta de<br />

conforto em que vive a maioria dos nossos<br />

fazendeiros. Como costumam ‘passar bem de<br />

boca’ ­ bebendo leite e comendo ovos,<br />

galinha, carne de porco e sobremesa ­ e têm<br />

na sede <strong>da</strong> fazen<strong>da</strong> um conforto primário, mas<br />

inacessível ao trabalhador do eito ­ às<br />

vezes, água encana<strong>da</strong>, instalações sanitárias<br />

e até luz elétrica e rádio ­, o roceiro vê<br />

sempre no ‘coronel’ um homem rico, ain<strong>da</strong> que<br />

não o seja; rico, em comparação com sua<br />

pobreza sem remédio. Além do mais, no meio<br />

rural, é o proprietário de terra ou de gado<br />

quem tem meios de obter financiamentos. Para<br />

isso muito concorre seu prestígio político,<br />

pelas notórias ligações dos nossos bancos. É,<br />

pois, para o próprio ‘coronel’ que o roceiro<br />

apela nos momentos de apertura, comprando<br />

fiado em seu armazém para pagar com a<br />

colheita, ou pedindo dinheiro, nas mesmas<br />

condições, para outras necessi<strong>da</strong>des’ (Leal,<br />

1967: p.24).<br />

Deixem de lado o preconceito que normalmente habita os corações<br />

e mentes mesmo dos nossos melhores intelectuais, como Leal, que no<br />

fundo deixa escapar a sabedoria dessa ‘massa humana que tira sua<br />

subsistência <strong>da</strong>s suas terras (e que) vive no mais<br />

lamentável estado de pobreza, ignorância e abandono’.<br />

Retirem, também, <strong>da</strong>qui o ‘fazendeiro­proprietário­<strong>da</strong>­terra­e­do­gado’ e<br />

o substituam pelo patrão­proprietário­do­seringal e o quadro estará<br />

pintado com características realistas.<br />

“O ‘coronelismo’ é sobretudo um compromisso,<br />

uma troca de proveitos entre o poder político,<br />

227


progressivamente fortalecido, e a decadente<br />

influência social dos chefes locais, nota<strong>da</strong>mente<br />

dos senhores de terras. Não é possível, pois,<br />

compreender o fenômeno sem referência à nossa<br />

estrutura agrária, que fornece a base de<br />

sustentação <strong>da</strong>s manifestações do poder privado<br />

ain<strong>da</strong> tão visíveis no interior do Brasil.<br />

Paradoxalmente, entretanto, esses<br />

remanescentes de privatismo são alimentados pelo<br />

poder público...’ (Leal, op.cit : 20).<br />

Apesar de a referência empírica em que se baseia Vitor Nunes Leal<br />

estar localiza<strong>da</strong> bem longe do Acre, sua caracterização do<br />

‘coronelismo’ permite­nos captar o caráter instituinte <strong>da</strong><br />

Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco.<br />

Aproximemos Leal do ex­juiz e interventor no Acre J.M.B.<br />

Castelo Branco. Fazendo um comentário sobre o texto que Teixeira<br />

Guerra previamente havia lhe submetido à apreciação antes de sua<br />

publicação, assim se expressou Castelo Branco a respeito <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de<br />

Rio Branco:<br />

‘Até 1920 pouco progrediu, apesar de ser a<br />

capital do departamento mais rico do<br />

território (do Alto Acre). As outras capitais<br />

(Sena Madureira e Cruzeiro do Sul) superaram­<br />

na em tudo, até que, unificado o território,<br />

a administração central passou para Rio<br />

Branco e <strong>da</strong>í o desenvolvimento, aliás, lento,<br />

só tomando maior impulso ultimamente. Cruzeiro<br />

do Sul e Feijó foram instala<strong>da</strong>s em seringais,<br />

em cujo local, só havia um barracão senhorial<br />

e algumas barracas. Do esforço, repartições e<br />

aparato governamentais, originaram­se a<br />

criação e o impulso que elas tomaram. A<br />

influência <strong>da</strong> goma elástica passava ao largo,<br />

no bojo <strong>da</strong>s embarcações que ali tocavam para<br />

o despacho oficial, deixar mercadorias outras<br />

e passageiros.<br />

O intercâmbio com os seringais veio depois de<br />

várias crises <strong>da</strong> borracha, que impulsionaram<br />

a lavoura e as trocas de mercadorias entre os<br />

comerciantes <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong>des, do campo e dos<br />

seringais; mesmo porque as grandes casas de<br />

Manaus e Belém, fornecedoras de mercadorias a<br />

estes e às vezes possuidoras de grandes<br />

latifúndios, desapareceram ou perderam sua<br />

influência (Castelo Branco, apud Guerra, 1955, p. 88).<br />

228


Mais uma vez não é possível explorarmos to<strong>da</strong> a riqueza desse<br />

depoimento sem localizarmos seu autor. Castelo Branco foi um membro<br />

<strong>da</strong> burocracia do Estado nomeado pelo Rio de Janeiro e que exerceu as<br />

funções de interventor e juiz federal no Departamento do Alto Juruá. Seu<br />

depoimento revela tanto uma aproximação quanto um afastamento <strong>da</strong>s<br />

oligarquias seringalistas. De um lado acentua que Sena Madureira e<br />

Cruzeiro do Sul superavam ‘em tudo’ Rio Branco até 1920, cujo<br />

progresso, aliás, ‘muito lento’, só se dera tardiamente já após a segun<strong>da</strong><br />

Guerra.<br />

O depoimento de Castelo Branco não deve ser visto como algo que<br />

por sua objetivi<strong>da</strong>de nos esclarece a reali<strong>da</strong>de socioespacial sob análise,<br />

mas, sobretudo, como um protagonista <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de/do espaço acreano.<br />

Sob esse prisma veremos que ele deixa nos escapar o mal­estar causado<br />

entre as oligarquias dos outros vales, que não o do rio Acre, ou seja, entre<br />

os seringalistas do próprio Purus (Sena Madureira), do Envira (Feijó) e do<br />

Juruá (Cruzeiro do Sul) pela centralização administrativa em Rio Branco o<br />

que ensejou, também, a criação de um Partido Autonomista do Alto Juruá.<br />

Castelo Branco atribui ao ‘esforço, repartições e aparato<br />

governamentais’ (...) ‘o impulso’ (...) ‘que tomaram’ Cruzeiro<br />

do Sul e Feijó que ‘foram instala<strong>da</strong>s em seringais, em<br />

cujo local, só havia um barracão senhorial e algumas<br />

barracas’ posto que ‘a influência <strong>da</strong> goma elástica<br />

passava ao largo, no bojo <strong>da</strong>s embarcações que ali tocavam<br />

para o despacho oficial, deixar mercadorias outras e<br />

passageiros’.<br />

Tudo indica, como já salientamos, que a escolha de Rio Branco<br />

como capital do Território Federal a partir e 1920 fora motiva<strong>da</strong> por<br />

razões econômicas posto que à proporção que decaíam os preços <strong>da</strong><br />

borracha mais forte se tornara a migração em direção ao vale do Acre,<br />

durante os anos que, imediatamente, se seguiram à crise nas exportações.<br />

Assim, o argumento de Castelo Branco para o impulso de Feijó e Cruzeiro<br />

do Sul mostrar­se­á mais válido ain<strong>da</strong> para Rio Branco exatamente pela<br />

presença de todo o aparato político­administrativo do governo (do<br />

Território) federal. E, mais, seu depoimento nos permite captar uma<br />

dimensão geográfica extremamente importante posto que se antes<br />

‘a influência <strong>da</strong> goma elástica passava ao<br />

largo no bojo <strong>da</strong>s embarcações que ali tocavam<br />

para o despacho oficial, deixar mercadorias<br />

outras e passageiros’, a partir <strong>da</strong> crise que<br />

por fim viria atingir também o ‘rio <strong>da</strong><br />

borracha’, sobretudo a partir dos anos vinte,<br />

‘o intercâmbio com os seringais veio depois<br />

229


de várias crises <strong>da</strong> borracha, que<br />

impulsionaram a lavoura e as trocas de<br />

mercadorias entre os comerciantes <strong>da</strong>s<br />

ci<strong>da</strong>des, do campo e dos seringais; mesmo<br />

porque as grandes casas de Manaus e Belém,<br />

fornecedoras de mercadorias a estes e às<br />

vezes possuidoras de grandes latifúndios,<br />

desapareceram ou perderam sua influência’.<br />

O economista acreano Mário José de Lima caracteriza o período<br />

que se segue à déca<strong>da</strong> de 1920 como aquele em que<br />

‘os núcleos urbanos que, inicialmente, (eram) meros<br />

entrepostos dos seringais, com a reestruturação produtiva,<br />

passam a assumir a centrali<strong>da</strong>de dos negócios. As<br />

ativi<strong>da</strong>des inerentes às ci<strong>da</strong>des, nota<strong>da</strong>mente serviços,<br />

constróem uma rede de sustentação para a produção<br />

agrícola e fun<strong>da</strong>m fluxos de negócios que imprimem uma<br />

nova feição à região’ (Lima, 1994, p. 170. Os grifos são<br />

meus).<br />

Há entre o depoimento de Mário José de Lima e o de Castelo<br />

Branco uma diferença por meio <strong>da</strong> qual será possível esclarecer um dos<br />

aspectos mais interessantes <strong>da</strong> Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco.<br />

Entre o desenvolvimento de Rio Branco, aliás lento de Castelo Branco e a<br />

‘centrali<strong>da</strong>de dos negócios’ dos núcleos urbanos de M. J. de Lima (Lima,<br />

1994) se inscreve aquilo que Vitor Nunes Leal chamara a atenção e que<br />

diz respeito exatamente à dependência <strong>da</strong>s vilas, povoados e pequenas<br />

ci<strong>da</strong>des, aliás como to<strong>da</strong>s do Acre na época, em relação à dinâmica do<br />

mundo rural. Nesse sentido, a centrali<strong>da</strong>de dos núcleos urbanos não<br />

derivaria de ‘uma rede de sustentação para a produção<br />

agrícola (que) fun<strong>da</strong>m fluxos de negócios que imprimem uma<br />

nova feição à região’, mas sim ao novo lugar dos patrões, dos<br />

seringais no novo padrão de relações socioespaciais. A centrali<strong>da</strong>de que a<br />

ci<strong>da</strong>de passa a ter é menos por razões deriva<strong>da</strong>s de uma dinâmica<br />

econômica do que <strong>da</strong> importância política que passa a ter exatamente em<br />

virtude <strong>da</strong> decadência econômico­mercantil do seringal. Como<br />

disséramos, apoiados em Vitor Nunes Leal, o patrão passara a ter que se<br />

interessar mais pelas coisas <strong>da</strong> política do que pelas coisas <strong>da</strong> economia.<br />

Vitor Nunes Leal recorre a O chefe político de Rubens Amaral<br />

(1944) para caracterizar essa dependência <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, dos serviços, em<br />

relação ao mundo rural. Com, a palavra a Rubens Amaral:<br />

230


‘Aqui 5 tivemos numerosas categorias de chefes<br />

políticos. Desde logo, dividiam­se eles em<br />

coronéis e doutores. Muitas vezes existindo<br />

isolados; o coronel dominando de sua fazen<strong>da</strong> e<br />

congregando outros fazendeiros, com influência<br />

na ci<strong>da</strong>de porque deles dependiam o comércio<br />

como fornecedor, advogados e médicos para<br />

garantia <strong>da</strong> clientela, funcionários que eles<br />

podiam nomear e demitir arbitrariamente,<br />

outras ativi<strong>da</strong>des por idênticos motivos; o<br />

doutor, mais pelo poder <strong>da</strong> inteligência e <strong>da</strong><br />

cultura, pelo prestígio <strong>da</strong> palavra ou por<br />

serviços prestados na advocacia e na medicina<br />

às famílias ricas ou às massas pobres. Muitas<br />

vezes em simbiose: o coronel entrava com a<br />

influência pessoal ou do clã, com o dinheiro e<br />

a tradição; o doutor, a ele aliado, com o<br />

manejo <strong>da</strong> máquina ...”<br />

No Acre, e aqui é possível admitir­se especialmente em Rio Branco,<br />

a influência dos seringalistas adquire uma importância política maior pelo<br />

significado que tem a borracha nesse contexto. Se, de um lado, o governo<br />

federal, ou melhor, o seu segmento <strong>da</strong> burocracia civil e militar, apostou<br />

em Rio Branco para colocar todo o seu aparato burocrático­administrativo<br />

na expectativa de que a borracha lhes garantiria os recursos necessários à<br />

afirmação política desse estamento <strong>da</strong> burocracia estatal que, sem dúvi<strong>da</strong>,<br />

o Acre emprestara para consoli<strong>da</strong>r esse segmento no bloco de poder<br />

nacional; De outro lado, o seringalista que, agora, não depende mais<br />

exclusivamente <strong>da</strong>s Casas Aviadoras de Manaus e Belém que, como<br />

destacara o próprio Castelo Branco, perderam a sua influência, se verá<br />

tendo que manejar o jogo político para obter os recursos de que necessita.<br />

Em 1928, é aberta a primeira agência bancária do Acre, em Rio<br />

Branco. E não é uma agência de um banco qualquer, mas do Banco do<br />

Brasil com implicações que, de muito, transcendem a dimensão<br />

econômica, pois como destacara Vitor Nunes Leal,<br />

5 ­ O autor refere­se a São Paulo.<br />

6 ­ Aqui no Acre o seringalista.<br />

‘no meio rural, é o proprietário de<br />

6<br />

terra ou de gado quem tem meios de<br />

obter financiamentos. Para isso muito<br />

concorre seu prestígio político, pelas<br />

notórias ligações dos nossos bancos’. (Os<br />

grifos são meus.)<br />

231


E aqui Vitor Nunes Leal nos reenvia a Samuel Benchimol que<br />

batizara o Manifesto dos Coronéis de Barranco exatamente como<br />

‘Manifesto dos Coronéis de Barr anco’ no Tempo <strong>da</strong>s Vacas Magras’.<br />

Afinal, repitamos as palavras de Vitor Nunes Leal,<br />

‘o coronelismo é sobretudo um compromisso,<br />

uma troca de proveitos entre o poder<br />

político, progressivamente fortalecido, e a<br />

decadente influência social dos chefes<br />

locais, nota<strong>da</strong>mente dos senhores de terras.<br />

Não é possível, pois, compreender o fenômeno<br />

sem referência à nossa estrutura agrária, que<br />

fornece a base de sustentação <strong>da</strong>s<br />

manifestações do poder privado ain<strong>da</strong> tão<br />

visíveis no interior do Brasil.<br />

Paradoxalmente, entretanto, esses<br />

remanescentes de privatismo são alimentados<br />

pelo poder público...’ (Leal, 1975 : 20).<br />

Assim, a criação <strong>da</strong> agência do Banco do Brasil em Rio Branco em<br />

1928, sela uma aliança política entre a burocracia federal e as oligarquias<br />

regionais, aqui, bem entendido, do rio Acre, de Rio Branco e Xapuri 7 em<br />

particular.<br />

O Manifesto dos Coronéis de Barranco endereçado ao presidente<br />

<strong>da</strong> República logo de início identifica os protagonistas pela sua<br />

localização social e geográfica dizendo que são ‘proprietários de<br />

terras e comerciantes dos rios Tarauacá e Embira’, no vale<br />

do Juruá, e como se pode verificar no documento em tela (em anexo), não<br />

reconhecem em nenhum momento Rio Branco como locus de poder, como<br />

interlocutor político. Em, pelo menos, duas vezes quando o documento<br />

fala <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong>des mais importantes que estão mais próximas de onde<br />

moram os manifestantes se referem a Manaus e Belém.<br />

Logo a seguir os manifestantes lembram ao Presidente que<br />

‘o Acre brasileiro foi uma au<strong>da</strong>ciosa conquista<br />

de caráter lidimamente nacional mas executa<strong>da</strong><br />

por brasileiros desprovidos de qualquer<br />

auxílio governamental. Em zonas inhóspitas e<br />

agressivas, que nos combatiam com a febre, o<br />

índio, o estrangeiro, a distância a milhares<br />

de kilômetros dos primeiros civilizados,<br />

plantamos a bandeira do Brasil, exploramos as<br />

matas, povoamos o solo e nos limites em que<br />

poderíamos fazer pelo desbravamento do solo ­<br />

saneamos a terra. O deserto tornou­se<br />

7 ­ Na época Xapuri incluía o atual município de Brasiléia criado em 1936.<br />

232


produtivo e por muitos anos concorreu para a<br />

fortuna pública e particular do país, já pelos<br />

créditos arreca<strong>da</strong>dos pela União, já pelo<br />

regresso dos emigrantes enriquecidos às terras<br />

e estados de origem’.<br />

Depois de ter afirmado que ‘o Acre fora uma au<strong>da</strong>ciosa<br />

conquista de carater lidimamente nacional mas executa<strong>da</strong><br />

por brasileiros desprovidos de qualquer auxílio<br />

governamental’ passam a expor os seus pleitos dizendo:<br />

‘Cifram­se as nossas reivindicações, Snr.<br />

Presidente, no seguinte:<br />

1. Precisamos antes de tudo que a pesa<strong>da</strong><br />

carga de impostos decretados para o ano<br />

corrente não nos leve o minguado resultado de<br />

nosso esforço.<br />

(...) Pedimos que os impostos sejam reduzidos<br />

ao nível anterior a 1938, com o que já tinham<br />

as municipali<strong>da</strong>des fartos recursos<br />

orçamentários.<br />

2. Precisamos de mais população.(...)<br />

Pedimos, portanto, ao Governo Federal, que<br />

interfira junto aos governos dos Estados do<br />

nordeste para que não criem entraves à<br />

emigração dos trabalhadores que se queiram<br />

localizar no Acre e ain<strong>da</strong> que, com o objetivo<br />

de não onerá­los com dívi<strong>da</strong>s de início,<br />

conce<strong>da</strong> certo número de passagens gratuitas<br />

por ano, nas empresas de navegação<br />

subvenciona<strong>da</strong>s, aos trabalhadores que para lá<br />

se queiram dirigir. (...)<br />

3. Pleiteamos ain<strong>da</strong> que o Governo Federal<br />

melhore as condições de navegação para esta<br />

região.(...)<br />

Precisamos de fretes baixos, mas também e<br />

mais que isso precisamos de linhas regulares<br />

de navegação. Atualmente a Amazon River chega<br />

duas vezes por ano a Seabra e não penetra no<br />

rio Embira, forçando os proprietários a<br />

longas viagens de transporte de seus produtos<br />

em pequenos motores, sistema caro e difícil.<br />

4. Ain<strong>da</strong> um ponto de capital importância para<br />

nossa região é o que se refere à proteção à<br />

nascente indústria madeireira. Criamos essa<br />

indústria nos anos de crise, para compensar a<br />

ruína <strong>da</strong> indústria <strong>da</strong> borracha.(...)<br />

Essa é uma indústria de futuro e para qual<br />

antevemos largas possibili<strong>da</strong>des quando<br />

pudermos substituir os deficientes métodos<br />

atuais de extração por outros mais modernos.<br />

Por que esmagá­la de princípio com uma carga<br />

tributária, quando protegendo poderá o<br />

governo ter em mãos, de futuro, uma larga<br />

riqueza?<br />

233


Pedimos, por isso, a interferência de V.<br />

Excia., a fim de que sejam suspensas as<br />

tributações sobre essa indústria incipiente,<br />

permitindo assim o seu livre<br />

desenvolvimento.(...)’<br />

Enfim, o Manifesto dos Coronéis de Barranco revela, a sacie<strong>da</strong>de,<br />

que os patrões não conseguiam mais se manter sem a aju<strong>da</strong><br />

governamental: diminuição dos impostos, indução política <strong>da</strong> migração,<br />

controle governamental dos transportes e proteção à indústria madeireira<br />

nascente eram, em síntese, suas pretensões. O documento revelará, ain<strong>da</strong>,<br />

de modo lapi<strong>da</strong>r, a insatisfação dos Coronéis de Barranco <strong>da</strong> bacia do<br />

Juruá com a centralização administrativa do Território em Rio Branco<br />

desde 1920. Suas dificul<strong>da</strong>des são, rigorosamente, manifestas. O texto<br />

não foira escrito pelos próprios protagonistas, se revelaria lapi<strong>da</strong>r para a<br />

conceituação de Vitor Nunes Leal do que seja o coronelismo.<br />

‘O Acre, Snr. Presidente, por sua origem como<br />

projeção colonizadora do Brasil, encerra uma<br />

alta responsabili<strong>da</strong>de para os brasileiros. Ele<br />

não pode perecer nem decair, que nele estão<br />

simbolizados o espírito colonizador de nosso<br />

povo e sua capaci<strong>da</strong>de de iniciativa. Secção de<br />

altos rios, isolado do resto do Brasil e tendo<br />

os rios como único meio de comunicação, esse<br />

determinismo geográfico lega­o a uma<br />

contingência descentralizadora à qual não se<br />

poderá libertar. To<strong>da</strong> alteração dessa condição<br />

de vi<strong>da</strong> tem­no prejudicado e tolhido seu<br />

progresso, e a época em que as Prefeituras<br />

autônomas operavam segundo os interesses<br />

próprios de suas respectivas regiões foi a<br />

grande era de progresso deste território. Essa<br />

é a condição própria de nosso território, que<br />

reproduz, em grau menor, a contingência de<br />

todo o país e a conten<strong>da</strong> entre centralização e<br />

federalismo que terminou no Brasil com a<br />

República.<br />

E, tanto assim, que a centralização vem<br />

terminando e aniquilando o progresso <strong>da</strong>s<br />

Prefeituras em benefício único de uma só,<br />

esquecidos os interesses de uma população<br />

inteira pela conveniência de um único<br />

município ­ Rio Branco. Descentralizar o Acre<br />

é a grande aspiração de todos os acreanos,<br />

permitindo assim a ca<strong>da</strong> região construir o seu<br />

progresso com todos os seus recursos.’ (Os grifos<br />

são meus )<br />

234


Assim, se o caráter coronelístico tem um forte componente de<br />

sustentação no poder público, assim privatizado, como tão bem<br />

caracterizou Vitor Nunes Leal, o que se acabou de ver aponta que essa<br />

articulação é mais antiga ali no vale do Acre, em Rio Branco.<br />

A centralização no Acre que esse documento denuncia não deriva do<br />

que se passara no Brasil após a revolução de 30 que, sem dúvi<strong>da</strong>, opera<br />

uma nova geografia <strong>da</strong>s escalas de poder, de forte acento centralizador,<br />

mas, principalmente, <strong>da</strong> centralização em Rio Branco que, ao mesmo<br />

tempo, foi uma afirmação do Rio de Janeiro e, portanto, do poder <strong>da</strong>quele<br />

segmento que, por sua própria natureza sociológica, opera a uma escala<br />

supralocal, nacional, que tivera o Acre como um forte suporte e que,<br />

sobretudo pós anos 30, adquire uma importância em escala nacional na<br />

composição do novo bloco de poder que não tivera na época <strong>da</strong> ‘política<br />

dos governadores’ durante a República Velha. Enten<strong>da</strong>­se, portanto, o<br />

forte apelo patriótico do documento. Eles sabiam a quem estavam se<br />

dirigindo.<br />

No entanto, aquilo que até ali permanecera um privilégio do vale do<br />

Acre 8 logo se tornará extensivo a todo o Acre. A Batalha <strong>da</strong> Borracha,<br />

desencadea<strong>da</strong> pelos Acordos de Washington, em 1942, realizará, na<br />

prática, as reivindicações expostas no Manifesto dos Coronéis de<br />

Barranco de 1939: intervenção governamental nas esferas <strong>da</strong> circulação e<br />

transportes; incentivo e controle do fluxo migratório e subsídios à<br />

produção de borracha 9 .<br />

Com o domínio japonês <strong>da</strong> região dos seringais de cultivo asiáticos,<br />

como ataque às bases norte­americanas de Pear Harbour, ficou em risco o<br />

suprimento de borracha à indústria dos países aliados que detinham o<br />

controle colonial de grande parte <strong>da</strong>quela região. O caráter estratégico <strong>da</strong><br />

borracha ficou definitivamente demonstrado. É nesse contexto que o<br />

governo brasileiro assina os Acordos de Washington (1942) em que<br />

garante o suprimento de látex às indústrias dos Estados Unidos e, ao<br />

mesmo tempo, afirma­se um projeto nacional de industrialização<br />

formulado pelo estamento militar, que negocia naquelas circunstâncias a<br />

Companhia Siderúrgica Nacional e a Companhia Vale do Rio Doce.<br />

8 ­ E assim era visto pelos seringalistas dos outros vales<br />

9 Ali, em 1942, com os ‘Acordos de Washington’, já se tem a demonstração do que, mais tarde, será<br />

chamado de ‘pragmatismo responsável’ dos militares brasileiros, posto que tudo isso se fará com a<br />

aju<strong>da</strong> de capitais norte­americanos.<br />

235


Sem dúvi<strong>da</strong>, a Amazônia foi um importante trunfo nas negociações<br />

internacionais em que o governo Vargas consolidou o projeto de<br />

industrialização por substituições de importações e uma indústria de base<br />

no país.<br />

A excelente tese de doutorado do Professor e Historiador <strong>da</strong> UFAC ­<br />

Universi<strong>da</strong>de Federal do Acre ­ Pedro Martinello dispensa­me de<br />

caracterizar ‘A Batalha <strong>da</strong> Borracha’. E é com base nesta tese que pude<br />

observar que rapi<strong>da</strong>mente foram envia<strong>da</strong>s à Amazônia equipes de técnicos<br />

norte­americanos para fazer diagnósticos dos seringais. Inicia­se, a partir<br />

<strong>da</strong>í, uma nova fase de articulação entre as classes dominantes regionais<br />

amazônicas e o bloco de poder nacional, naquele momento sob o signo <strong>da</strong><br />

intervenção do Estado e <strong>da</strong> Rubber Development Corporation (RDC).<br />

Poder­se­ia dizer que, a partir de 1942, com a ‘Batalha <strong>da</strong> Borracha’,<br />

se generalizou para to<strong>da</strong> a Amazônia aquilo que era específico do vale do<br />

Acre, tão bem expresso na importância política de Rio Branco desde 1920,<br />

no estabelecimento de uma agência do Banco do Brasil em 1928 e que o<br />

Manifesto dos Coronéis de Barranco de 1939, por contraponto, acusara.<br />

Ali já se estabeleceram fortes laços entre os estamentos burocráticos<br />

nacionais e o poder local, os patrões, em crise.<br />

O caráter nacionalista que sempre recobriu o debate acerca <strong>da</strong><br />

Amazônia, no Acre com as peculiari<strong>da</strong>des já salienta<strong>da</strong>s de ter sido a<br />

única uni<strong>da</strong>de <strong>da</strong> federação incorpora<strong>da</strong> ao nosso território por ‘uma<br />

au<strong>da</strong>ciosa conquista de caráter lidimamente nacional, mas<br />

executa<strong>da</strong> por brasileiros desprovidos de qualquer auxílio<br />

governamental’, a partir <strong>da</strong> guerra e, sobretudo do pós­guerra, será<br />

enseja<strong>da</strong> a oportuni<strong>da</strong>de para uma aliança entre as oligarquias regionais<br />

amazônicas e os estamentos <strong>da</strong> burocracia federal, tanto civil como militar.<br />

Assim como em 1903, o Acre foi federalizado, isto é, o poder sobre<br />

seu território foi colocado sob o controle <strong>da</strong> burocracia civil e militar do<br />

Rio de Janeiro, em 1943 também serão federaliza<strong>da</strong>s áreas dos estados do<br />

Amazonas, do Pará e do Mato Grosso e criados novos Territórios Federais<br />

(Rio Branco, depois Roraima; Amapá e Guaporé, depois Rondônia), além<br />

de ratificar­se o mesmo estatuto para o Acre.<br />

Em 1942, foi criado o Banco <strong>da</strong> Borracha, mais tarde substituído pelo<br />

Banco de Crédito <strong>da</strong> Amazônia S.A., que passa a exercer o monopólio de<br />

compra e ven<strong>da</strong> dessa mercadoria. São alijados desse processo os<br />

comerciantes <strong>da</strong>s casas aviadoras de Manaus e Belém que não deixam de<br />

236


egistrar seus protestos. De 1942 a 1945, se estabelece, nos marcos do<br />

Acordo de Washington, uma política de migração que procura repovoar os<br />

seringais. Os Estados Unidos colocam à disposição cerca de 5 milhões de<br />

dólares para que fossem reaparelhados os portos e o sistema de transportes<br />

<strong>da</strong> região, além de garantir o suprimento de víveres para os seringais, em<br />

grande parte adquirido, mais uma vez, no Sul e Nordeste do país.<br />

A excepcionali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> guerra viria, assim, <strong>da</strong>r um novo alento aos<br />

patrões, agora com uma nova forma de apropriação do espaço com o que<br />

denominamos Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco, sobretudo com o<br />

fornecimento de mão­de­obra. Afinal, como já havíamos salientado, a<br />

escassez de mão­de­obra, sem dúvi<strong>da</strong>, foi um fator importantíssimo para<br />

que os patrões aceitassem relaxar uma série de imposições que faziam aos<br />

seringueiros. Com a acentuação do fluxo migratório a partir <strong>da</strong> Batalha de<br />

Borracha, o poder dos seringalistas é, em grande parte, recuperado. A<br />

garantia de compra e ven<strong>da</strong> <strong>da</strong> borracha por parte do governo estreita os<br />

vínculos políticos dos seringalistas com o poder à escala nacional. Os<br />

novos migrantes, os ‘sol<strong>da</strong>dos <strong>da</strong> borracha’, não vêm mais para ‘o<br />

Amazonas’ tentar a vi<strong>da</strong> ou enricar sob um horizonte de quem queria<br />

simplesmente se libertar, conforme se pode depreender do clima<br />

psicossocial, do imaginário, que caracterizara a perspectiva <strong>da</strong>queles que<br />

migraram no período áureo do ‘ciclo <strong>da</strong> borracha’. Não, agora já se tinha<br />

nacionalmente forjado uma nova imagem de que ali ‘no Amazonas’ se<br />

vivia numa ver<strong>da</strong>deira selva, no sentido de relações humanas brutais que é<br />

o que lhe empresta Alberto Rangel; que o seringueiro era profun<strong>da</strong>mente<br />

explorado, que Euclides <strong>da</strong> Cunha se encarregara de emprestar todo o seu<br />

fervor adjetivo, que lhe valera uma réplica dura de Plácido de Castro.<br />

Enfim, já não migrava para ‘o Amazonas’ sob o patrocínio de um patrão<br />

desde o início, mas sob o patrocínio do governo. Migrava­se como uma<br />

nova espécie de ‘voluntário <strong>da</strong> pátria’ a serviço dos patrões nos seringais,<br />

posto que eram ‘sol<strong>da</strong>dos <strong>da</strong> borracha’, antes de tudo e sobretudo.<br />

Fin<strong>da</strong> a guerra, os seringalistas se vêem empenhados de novo numa<br />

velha batalha: garantir apoio governamental às suas pretensões.<br />

Esse contexto do pós­guerra que, de certa forma só se extinguiria na<br />

Amazônia entre os anos de 1958 e 1967, pode ser caracterizado como o<br />

período áureo do que estamos chamando de Ter ritor iali<strong>da</strong>de dos<br />

Cor onéis de Barr anco.<br />

Aproximemo­nos dos próprios protagonistas e deixemos que eles<br />

mesmos falem de sua visão, de suas práticas. Pode­se ler, por exemplo, ns<br />

237


páginas 10 e <strong>11</strong> do documento, A borracha e os seus problemas<br />

correlatos, levado pela delegação acreana à 3 a Conferência Econômica <strong>da</strong><br />

Amazônia, realiza<strong>da</strong> em 1949, a seguinte passagem altamente<br />

esclarecedora: ‘a célula de nossa economia é o seringal,<br />

onde a dispersão demográfica ocorre como<br />

consequência <strong>da</strong> dispersão florística <strong>da</strong> Hevea<br />

brasiliensis. A não ser o pequeno número de<br />

trabalhadores nucleados nas imediações <strong>da</strong>s<br />

sedes dos seringais, a maior parte <strong>da</strong> massa<br />

operária se dispersa, vivendo as famílias dos<br />

seringueiros distanciados, entre si, de 3 a 6<br />

quilômetros e afasta<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s margens dos rios<br />

navegáveis, que são as vias naturais de<br />

comunicação, de 3 a 100 quilômetros, na<br />

grande maioria dos casos. Por este motivo<br />

torna­se impossível manter a assistência<br />

social e técnica eficiente, efetiva e direta,<br />

ao seringueiro, na produção de utili<strong>da</strong>des de<br />

auto­consumo. Este auxílio terá de efetuar­se<br />

por intermédio dos seringalistas, embora sob<br />

bases de fomento oriun<strong>da</strong>s dos poderes<br />

públicos, com o fornecimento de sementes<br />

seleciona<strong>da</strong>s, beneficiadoras manuais de arroz<br />

e milho e pequenos equipamentos para fabrico<br />

de farinha de mandioca e açúcar mascavo,<br />

rapaduras, mel, etc.’ (Os grifos são meus).<br />

O texto parece ter sido feito sob encomen<strong>da</strong> de Vitor Nunes Leal,<br />

tal sua semelhança com a caracterização que este doublèe de jurista e<br />

sociólogo faz do coronelismo.<br />

Aqui a condição de seringalista deriva <strong>da</strong> natural dispersão <strong>da</strong>s<br />

espécies de Hevea que condiciona a dispersão dos seringueiros e de sua<br />

distância <strong>da</strong>s vias naturais de comunicação, os rios, que fazem do<br />

seringal a célula de nossa economia. Ora, to<strong>da</strong> a crise que se abatera<br />

sobre os seringalistas, desde 1912 tornara praticamente impossível a esses<br />

mesmos seringalistas manter to<strong>da</strong> a base logística que lhes permitia<br />

organizar o espaço do seringal. Já foi visto como eles tiveram mesmo que<br />

se adequar às novas circunstâncias onde o sentido de autonomia dos<br />

seringueiros se constituía na condição de existência <strong>da</strong> extração <strong>da</strong><br />

borracha, dos seringueiros e dos próprios patrões. Assim, a colocação<br />

passara a se constituir o outro pólo em torno do qual se organizava a<br />

socie<strong>da</strong>de acreana. Insistimos que a prática <strong>da</strong> agricultura foi uma<br />

iniciativa <strong>da</strong>s famílias de extratores, assim como o saber <strong>da</strong>s populações<br />

indígenas e caboclas estava subjacente às práticas a partir de então ca<strong>da</strong><br />

vez mais presentes.<br />

238


O seringalistas ou seus prepostos gerentes, administradores ou<br />

arren<strong>da</strong>tários, enfim os patrões, tiveram que aprender nas novas<br />

circunstâncias e se dobraram, já que não dispunham dos mesmos meios<br />

para manter limpos os var adouros, os comboios de burros para levar os<br />

víveres e buscar a borracha nos centr os, enfim todo aquele séquito de<br />

capatazes, fiscais, noteiros e outros necessários para ‘manter a<br />

assistência social e técnica eficiente, efetiva e direta,<br />

ao seringueiro, na produção de utili<strong>da</strong>des de auto­<br />

consumo’.<br />

A antropóloga Mary Allegretty captou um desses mecanismos por<br />

meio do quais o patrão procurava manter seu poder e prestígio junto ao<br />

seringueiro e que, segundo ela, decorria <strong>da</strong><br />

‘impossibili<strong>da</strong>de do seringalista exercer um<br />

controle mais direto sobre a produção, em<br />

função do seu caráter disperso. Relações<br />

personaliza<strong>da</strong>s são reproduzi<strong>da</strong>s através <strong>da</strong><br />

distribuição aleatória, ‘segun<strong>da</strong> a<br />

conveniência’, de favores. E isso cria, entre<br />

os fregueses, a necessi<strong>da</strong>de de ser também<br />

protegido do patrão’ (Alegretty, 1979, p. 45).<br />

A personalização <strong>da</strong>s relações sociais, por exemplo, por meio do<br />

batizado dos seus filhos, aproximara o seringueiro do patrão, contribuindo<br />

assim para superar a distância física, alguns dizem geográfica. Desta<br />

forma, como um dono de seringal alertara seu gerente, as regras que<br />

recebia para administrar o seringal deveriam ser aplica<strong>da</strong>s segundo ‘as<br />

conveniências,’ não sendo, portanto, regras impessoais acima <strong>da</strong>s<br />

circunstâncias. As relações de compadrio jogam também um papel<br />

importante nessa Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco e assim, mais<br />

vez, a constituição de famílias, os batizados e casamentos, contribuíam<br />

para con­formar essas relações socioespaciais.<br />

Ser protegido dos patr ões deve ser visto como uma forma de estar<br />

mais próximo de quem dispõe de poder e, mais uma vez, nos vemos<br />

diante de to<strong>da</strong> uma linguagem que ordena o social ao fazê­lo com<br />

linguagem espacial. As relações de parentesco ganham, assim, uma<br />

enorme relevância para a compreensão, <strong>da</strong>s relações socio­espaciais, na<br />

medi<strong>da</strong> que elas fazem parte <strong>da</strong>s relações sociais que constroem na prática<br />

essa geografia. Afinal as relações de parentesco criam aproximações,<br />

conformam comuni<strong>da</strong>des de destino, ao que está ligado aquilo que se<br />

apropriam. Samuel Benchimol teve, mais uma vez, sensibili<strong>da</strong>de para<br />

captar essas relações dizendo<br />

239


‘o freguês quando vem ao barracão, toma<br />

intimi<strong>da</strong>de com o patrão. Come na sua mesa.<br />

Toma parte nas suas festas. O patrão, nas<br />

suas festas, tem como dever <strong>da</strong>nçar com suas<br />

mulheres e divertir­se com eles. É compadre<br />

nos batizados de seus filhos e padrinho nos<br />

seus casamentos’ (Benchimol, op. cit.: 179). Os<br />

grifos são meus.<br />

Na postulação que os seringalistas fazem de intermediação dos<br />

recursos públicos há uma clara tentativa de deslocar uma vinculação,<br />

presente na socie<strong>da</strong>de acreana, entre as autori<strong>da</strong>des federais e os próprios<br />

seringueiros. Com ela temos uma atualização de uma <strong>da</strong>s clivagens<br />

tradicionais que atravessam a socie<strong>da</strong>de amazônica onde a legitimi<strong>da</strong>de <strong>da</strong><br />

colonização estaria na afirmação <strong>da</strong> agri­cultura contra o extrativismo,<br />

enfim na afirmação <strong>da</strong> cultura contra a natureza. Assim, na condenação<br />

do extrativismo vai junto a condenação <strong>da</strong>queles que são os seus<br />

protagonistas.<br />

Uma dessas importantes autori<strong>da</strong>des envia<strong>da</strong>s ao Acre, Dr. João<br />

Kubitschek de Figueiredo, como bom gestor do Estado, elabora o<br />

‘Planejamento Geral para a Solução dos Problemas Acreanos’, onde deixa<br />

escapar a seguinte caracterização:<br />

‘O latifúndio tem sido e continua a ser um<br />

dos grandes males do nosso país,<br />

principalmente aqui na Amazônia, onde assume<br />

proporções alarmantes, se nos detivermos em<br />

análise objetiva nesse setor, tão vastos são<br />

os domínios de um só dono, terras e terras,<br />

ver<strong>da</strong>deiros feudos medievais, improdutivas<br />

porque ‘in natura’, apenas explora<strong>da</strong>s pelo<br />

extrativismo desordenado e prejudicial à flora<br />

e à fauna (sic)’.<br />

(...) Necessitamos de um remédio oficial para<br />

sanar esse mal e, assim, povoarmos a Amazônia,<br />

transformando os enormes tratos individuais,<br />

através de desapropriações justas, em pequenas<br />

proprie<strong>da</strong>des, sob legislação agrária que,<br />

nesta altura, é motivo de estudos para solução<br />

definitiva, por parte do senhor Presidente <strong>da</strong><br />

República, mol<strong>da</strong><strong>da</strong> em princípios mais humanos,<br />

sob as bases de um cristianismo social e<br />

a<strong>da</strong>ptado à vi<strong>da</strong> moderna, barreira que urge<br />

seja reforça<strong>da</strong> como defesa <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de à<br />

avalanche do mal’ 10 .<br />

10 In: Guerra, op. cit. P. 172.<br />

240


A crítica ao latifúndio e ao extrativismo, vistos pelos enviados do Rio<br />

de Janeiro como estrutura de proprie<strong>da</strong>de e ativi<strong>da</strong>de econômica a serem<br />

supera<strong>da</strong>s <strong>11</strong> , assim como o conflito sempre presente entre os que<br />

tentavam estabelecer um sistema jurídico formal, como os juízes federais<br />

e os coronéis que, como tais, se achavam donos <strong>da</strong> justiça, indicam<br />

algumas <strong>da</strong>s importantes clivagens que atravessavam a socie<strong>da</strong>de acreana<br />

que, como estamos vendo, não se resume aos conflitos ‘patrão­freguês’ ou<br />

‘seringalista­seringueiro’. A pequena proprie<strong>da</strong>de está presente no<br />

horizonte desses que vêm/vão do Rio de Janeiro e que condenam o<br />

latifúndio. Em diferentes momentos desta pesquisa vimos que essa<br />

afini<strong>da</strong>de dos do Rio de Janeiro com os possíveis pequenos proprietários<br />

era manti<strong>da</strong> através do erário público comprando as terras desses mesmos<br />

latifundiários, terras essas cuja legali<strong>da</strong>de era extremamente vicia<strong>da</strong> para<br />

não dizer duvidosa.<br />

Citemos aqui algumas materializações desse fantasma ­ a aliança<br />

<strong>da</strong>s autori<strong>da</strong>des federais com os ‘de baixo’, sobretudo os seringueiros ­<br />

que permeia o documento <strong>da</strong> Delegação Acreana à 3 a Conferência:<br />

1­ os vários ‘conjuntos mecânicos’ mantidos pelo governo federal e<br />

destinados ao apoio técnico dos ‘colonos’ e;<br />

2­ o apoio ao transporte dos seus produtos, sobretudo os alimentos,<br />

que eram transportados seja por rios, por meio de batelões, ou por<br />

estra<strong>da</strong>, por caminhões, sob os auspícios do governo federal para<br />

as principais vilas e ci<strong>da</strong>des.<br />

3­ O contrato­padrão que sinalizava limites à exploração aos<br />

seringueiros.<br />

Para as oligarquias amazônicas, em particular as acreanas e, entre<br />

essas, particularmente as do vale do Acre, esses fantasmas estavam muito<br />

vivos nesse pós­guerra pelo modo como se dera a presença do governo<br />

federal durante a Batalha <strong>da</strong> Borracha, seja através do monopólio de<br />

compra e ven<strong>da</strong> <strong>da</strong> borracha, medi<strong>da</strong> essa que atingira sobretudo as Casas<br />

Aviadoras de Belém e Manaus, mas também os comerciantes de Rio<br />

Branco até então financiados pelo Banco do Brasil como também pelo<br />

Contrato­Padrão (Vide documento em anexo) que reconhecia ao<br />

seringueiro o direito de receber 60% do preço <strong>da</strong> borracha o que<br />

explicitava a visão por parte dos enviados do Rio de Janeiro, aqui<br />

acompanhados pelos técnicos norte­americanos, <strong>da</strong> extrema exploração a<br />

que estavam subordinados os seringueiros sob o domínio dos seringalistas.<br />

<strong>11</strong> Visão essa que, a propósito, o texto por mim largamente utilizado de Teixeira Guerra é lapi<strong>da</strong>r.<br />

241


O historiador Pedro Martinello assinala que já<br />

‘a partir de 1944 nota­se um movimento de<br />

acomo<strong>da</strong>ção tendente a aplacar os ânimos <strong>da</strong><br />

combativa classe produtora amazônica. Seja,<br />

talvez, pelo desafogo ocasionado pelo sucesso<br />

<strong>da</strong> borracha sintética nos EUA, ou ain<strong>da</strong><br />

porque os ianques já planejavam se desengajar<br />

dos mais dispendiosos projetos do programa <strong>da</strong><br />

borracha, o fato é que, aos poucos, tal<br />

tendência de compatibilização e absorção do<br />

comércio local vai ganhando adeptos, não<br />

apenas entre as autori<strong>da</strong>des brasileiras mas,<br />

ain<strong>da</strong> mais, entre o pessoal americano.’<br />

(Martinello, 1988 : 277).<br />

Figura 39 – Caminhão transportando colonos e respectivos produtos<br />

<strong>da</strong> colônia José Guiomard dos Santos para o mercado de Rio Branco.<br />

(Localizar no texto a referência <strong>da</strong> figura)<br />

O Sr. F. McCann Jr. revela­nos, com seu riquíssimo depoimento,<br />

como se imbricam as escalas local, regional, nacional e internacional<br />

conformando a Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco no pós­guerra..<br />

‘As tentativas faliram durante a guerra para<br />

acabar com o tradicional sistema comercial de<br />

relações que vigiam na Amazônia, optando pela<br />

ven<strong>da</strong> de suprimentos diretamente aos<br />

seringalistas ou pelo financiamento<br />

diretamente ao próprio extrator.<br />

O tradicional sistema de crédito e as<br />

relações sociais entre os seringalistas e as<br />

casas aviadoras, e entre o seringalista e o<br />

extrator­seringueiro, eram por demais sóli<strong>da</strong>s<br />

e arraiga<strong>da</strong>s para que pudessem ser<br />

substituí<strong>da</strong>s num passe de mágica.<br />

A formação de cooperativas e a extensão do<br />

crédito diretamente ao seringueiro viriam<br />

eliminar o seringalista­comerciante e a<br />

segurança que ele, de qualquer maneira,<br />

representava. Ademais, tanto o caboclo<br />

amazonense, bem como o sertanejo nordestino<br />

não se achavam preparados para substituir um<br />

patrão de carne e osso por uma impessoal<br />

agência governamental. Além do mais, tais<br />

agências não possuíam dias santos, nem<br />

promoviam as festas e bailes domingueiros nos<br />

quais os seringueiros <strong>da</strong>vam vasão a alguma<br />

vi<strong>da</strong> social’ (McCann,. apud Martinello, op. cit.: 278).<br />

É impressionante a afini<strong>da</strong>de de visão que as autori<strong>da</strong>des norte­<br />

americanas passavam a ter <strong>da</strong> Amazônia com aquela expressa no<br />

242


documento <strong>da</strong> Delegação Acreana à 3 a Conferência em 1949, sobretudo<br />

com relação aos seringueiros.<br />

Acrescente­se, ain<strong>da</strong>, a legitimi<strong>da</strong>de que reconhecem do poder <strong>da</strong>s<br />

oligarquias regionais sobre aqueles territórios e suas gentes. Eis como se<br />

refere à Amazônia o, então, Segundo Secretário <strong>da</strong> Embaixa<strong>da</strong> dos EUA<br />

no Brasil, Sr. Walter Walmsley:<br />

‘Não existe em lugar algum civilizado um<br />

quadro mais negro que se possa escolher para<br />

descrever aquilo que se costumou chamar de<br />

corrupções e exploração. Apesar disso, a<br />

socie<strong>da</strong>de, estabeleci<strong>da</strong> com seus tentáculos<br />

centenares abrangendo todos os tributários,<br />

foi totalmente ignora<strong>da</strong> pelo nosso primitivo<br />

plano <strong>da</strong> borracha. O comércio fluvial é o<br />

sistema arterial desta feu<strong>da</strong>l organização<br />

social. Nós tentamos cortar estas artérias na<br />

esperança de que o corpo sobrevivesse e que<br />

também fosse útil para nós.<br />

Nós falhamos em não consultar aqueles que,<br />

através de secular experiência acumularam um<br />

singular e profundo conhecimento <strong>da</strong> região.<br />

Entramos na proprie<strong>da</strong>de alheia e ignoramos o<br />

dono. Tomamos decisões não somente em Belém e<br />

Manaus, o que já era um grande mal, mas também<br />

no Rio de Janeiro e Washington o que era pior,<br />

sobre problemas acerca dos quais não tínhamos<br />

a mais leve idéia e a mínima familiari<strong>da</strong>de.<br />

Apesar <strong>da</strong>s nossas recentes concessões a eles<br />

(os comerciantes, etc.), seja os homens de<br />

negócios como os oficiais locais, continuam<br />

desconfiados e de sobreaviso.<br />

A Amazônia é uma cadeia de intermediários,<br />

todos se saciando no sangue dos pobres<br />

extratores. Dinheiro na<strong>da</strong> significa para o<br />

seringueiro enterrado vivo no interior do seu<br />

esquálido barracão. O que ele necessita na<br />

ver<strong>da</strong>de é de alimentos e remédios que o<br />

mantenham vivo e do álcool para livrá­lo do<br />

desespero. Que diferença faz para ele se o<br />

mesmo se levanta <strong>da</strong> rede e não pode saciar sua<br />

fome?<br />

Se um seringueiro for creditado com um preço<br />

compensador pela sua borracha é debitado por<br />

um preço ain<strong>da</strong> maior pelos suprimentos que<br />

lhe são vendidos. Nem o Banco <strong>da</strong> Borracha,<br />

nem a Rubber Development Corporation ou outra<br />

qualquer enti<strong>da</strong>de, sem a organização dos rios<br />

<strong>da</strong>s firmas comerciais aviadoras, têm alguma<br />

coisa a oferecer pelo aumento de sua<br />

borracha. O abastecimento tem que seguir a<br />

maneira tradicional através <strong>da</strong>s firmas<br />

243


aviadoras. É inútil tentar chegar diretamente<br />

ao seringueiro como pretendíamos fazer. Assim<br />

nós planejamos no vácuo, em uma larga<br />

escala 12 , sem sequer conhecer as condições<br />

locais e esperando que um homem, cuja mão<br />

direita foi corta<strong>da</strong>, nos ofereça a esquer<strong>da</strong>’.<br />

(Walmsley, apud Martinello, 1988 p. 279) 13 .<br />

Reconheci<strong>da</strong> está, portanto, a Amazônia como território <strong>da</strong>s antigas<br />

oligarquias, por meio de quem se poderá acessar os recursos; região que<br />

não se pode entrar, posto que proprie<strong>da</strong>de alheia, se ignorarmos o dono’.<br />

É o reconhecimento explícito de que se está diante de um território.<br />

Seja porque os países europeus, mesmo com a emancipação política<br />

<strong>da</strong>s suas antigas colônias na Ásia e na África, conseguiram restabelecer o<br />

abastecimento <strong>da</strong> borracha <strong>da</strong>s suas plantations nos novos países<br />

independentes no pós­guerra; seja porque a borracha sintética começou a<br />

ocupar uma faixa do mercado ca<strong>da</strong> vez mais significativa, o fato é que a<br />

borracha brasileira voltou a perder posições nos mercados externos.<br />

Já em 1950, o Brasil passara a ser importador de borracha. E, como<br />

nos alertara Vitor Nunes Leal, o coronelismo se expressa como uma<br />

relação em que a decadência do grande proprietário de terras, no caso<br />

acreano os seringalistas, o obriga a recorrer ao seu prestígio político para<br />

obter as benesses dos poderes públicos. Assim<br />

‘A borracha produzi<strong>da</strong> nos seringais e, de modo<br />

geral, no território, é envia<strong>da</strong> às praças de<br />

Manaus e Belém, por via fluvial (navios do<br />

SNAPP e batelões particulares).<br />

(...) Os seringalistas vendem o seu produto<br />

diretamente ao Banco de Crédito <strong>da</strong> Amazônia,<br />

to<strong>da</strong>via reclamam, pedindo financiamento maior<br />

para poder explorar maior número de estra<strong>da</strong>s.<br />

Assim, por exemplo, os grandes seringais <strong>da</strong><br />

bacia do Purus, no rio Acre e no rio Iaco,<br />

como é o caso dos seringais Mercês e<br />

12 ­ Observe­se aqui, mais uma vez, o uso dessa expressão, escala, no sentido de hierarquia de poder,<br />

de que há degraus como se fosse uma esca<strong>da</strong> (echelle).<br />

13 Creio estar aqui diante de uma <strong>da</strong>s melhores caracterizações que se poderia ter feito do porque do<br />

sucesso dos plantios de borracha pelos europeus, sobretudo os ingleses, de borracha no sul e sudeste<br />

asiáticos. E, como se vê, não é porque lá se fez ‘plantio racional <strong>da</strong> borracha’, como procuram<br />

afirmar análises de cunho estritamente econômico e que ignoram o contexto sociopolítico­cultural, em<br />

que se insere qualquer economia, mas sim porque, no caso <strong>da</strong> Amazônia, não se podia ignorar o poder<br />

que essas oligarquias haviam consoli<strong>da</strong>do e que qualquer um que quisesse explorar os recursos<br />

naturais <strong>da</strong> região haveria que, mais cedo ou mais tarde, se aliar, ou para ser mais explícito, partilhar<br />

com elas o excedente econômico. No sudeste asiático, o estatuto político no início do século era de<br />

colônia.<br />

244


Guanabara, poderiam conter um número bem maior<br />

de seringueiros’ (Guerra, op.cit. : 201).<br />

Ouçamos, enfim, as palavras de um importante protagonista <strong>da</strong><br />

Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco, o Sr. Alberto Zaire. Assim<br />

como Teixeira Guerra, Leandro Tocantins e Samuel Benchimol, Zaire é<br />

um intelectual, um historiador, que viveu e protagonizou as relações<br />

sociais que analisa. Ouçamo­lo através de uma entrevista concedi<strong>da</strong> em<br />

1981 a pretexto de uma reportagem feita por Josué Fernandes de Souza a<br />

respeito <strong>da</strong> festa de São Sebastião em Xapuri (Souza, 1981). Este<br />

depoimento nos aju<strong>da</strong> a entender a trajetória <strong>da</strong> Territoriali<strong>da</strong>de dos<br />

Coronéis de Barranco tal como percebi<strong>da</strong> por esse atento protagonista.<br />

‘Josué Fernades de Souza ­ J.F.S ­ Desde quando o<br />

senhor testemunha a festa de Xapuri ?<br />

A. Zaire ­ Desde 1925. Com a i<strong>da</strong>de de sete<br />

anos, quando eu já tinha consciência, eu<br />

acompanhava empolgado aquelas festas, aquelas<br />

promessas. E outro fator é que a natureza<br />

hoje está castigando o Acre, se não bastasse<br />

a criminosa atitude de desativar os seringais<br />

mesmo primários, um crime praticado não<br />

contra Xapuri, mas ao Acre todo, tornando uma<br />

<strong>da</strong>s classes mais respeita<strong>da</strong>s, que era a dos<br />

seringueiros, em extinção.<br />

J.F.S. ­ Quem praticou esse crime?<br />

A. Zaire ­ Quem praticou, lamentavelmente, foi<br />

o governo brasileiro, a pedido ou por<br />

insinuação ou sugestão do americano, que<br />

tinha para abastecer suas fábricas de pneus,<br />

em São Paulo, a fonte produtora que lhes era<br />

de proprie<strong>da</strong>de sua no Ceilão, lá no Oriente.<br />

Eles pensavam que aquilo não terminava nunca<br />

mais. Então, primeiramente, eles montaram as<br />

fábricas de pneus, depois desenvolveram as<br />

fábricas de automóveis, tudo fizeram para<br />

acabar com dois fatores altamente econômicos<br />

e que traziam as melhores vantagens sob o<br />

aspecto financeiro para o país: acabaram com<br />

as estra<strong>da</strong>s de ferro, mostrando através de<br />

<strong>da</strong>dos mentirosos que elas seriam<br />

impraticáveis, antieconômicas, quando a<br />

própria América do Norte e a Rússia possuem a<br />

maior quilometragem de estra<strong>da</strong>s de ferro no<br />

mundo, prova que o meio de transporte mais<br />

barato ain<strong>da</strong> é a estra<strong>da</strong> de ferro.<br />

Segundo,desativaram a principal economia <strong>da</strong><br />

região, que <strong>da</strong>va para o Brasil quase dois<br />

terços <strong>da</strong> melhor borracha do mundo. Hoje, o<br />

Acre é um pedinte. O que os governos passam<br />

aqui, em termos de dificul<strong>da</strong>des, é uma<br />

decorrência, uma conseqüência desse crime<br />

245


praticado contra o Acre. Podíamos desativar<br />

os seringais, mas de que maneira? Deixando­os<br />

como estavam e procurando desenvolver e<br />

estimular outros meios de produção e<br />

riquezas. E melhorando e ou atualizando<br />

métodos mais modernos para a produção de<br />

borracha. E digam o que disserem: borracha no<br />

Brasil, só no Acre e no vale do rio Acre, o<br />

resto é borracha inferior. Esses crimes que<br />

se cometeram na Amazônia e, especialmente no<br />

Acre, jamais serão esquecidos e deram, por<br />

decorrência, num problema social que nenhum<br />

governo do Acre terá meios e modos de<br />

solucioná­los, nem o governo federal. O que<br />

verificamos, melancolicamente, é a extinção<br />

de uma classe. Uma classe à qual todos nós<br />

devemos, primeiramente, este território;<br />

segundo, os filhos do Acre, os acreanos,<br />

devem sua existência, o que somos hoje, o que<br />

o Acre é e o que poderia ser muito mais,<br />

àqueles nordestinos que tiveram a coragem de<br />

vir para cá desbravar nossas matas e<br />

desenvolver a produção <strong>da</strong> borracha. Pois,<br />

foram atacados pelas costas, de um momento<br />

para outro, se viram inteiramente abandonados<br />

à sua própria sorte e considerados, hoje,<br />

como uma classe em extinção. Do seringalista,<br />

então, não quero nem falar, porque embora eu<br />

tenha sido, saí antes desse debacle (sic) e,<br />

hoje, o que se vê são homens envelhecidos<br />

pelo tempo, com vergonha de dizer que foram<br />

seringalistas. Se, ontem, ser seringalista<br />

significava apogeu, fortaleza, fortuna, falar<br />

em seringalista é motivo para<br />

deboche,gracejos, sorrisos, decepções e<br />

vergonha.<br />

J.F.S ­ É possível destacar, cronologicamente,<br />

os momentos de apogeu e decadência?<br />

A. Zaire ­ A festa de São Sebastião, de certa<br />

forma, sempre esteve liga<strong>da</strong> à situação<br />

econômica. Quando a borracha tinha maior<br />

procura, evidentemente, a festa apresentava­<br />

se numa exuberância muito maior. O motivo que<br />

a tornava grandiosa era exatamente o dinheiro<br />

recolhido por patrões, por seringueiros,<br />

enfim, por todo mundo. Inclusive a presença<br />

dos turistas de todo o Acre, e de grande<br />

parte <strong>da</strong> Bolívia, acontecia porque to<strong>da</strong> a<br />

região era bafeja<strong>da</strong> pela situação econômico­<br />

financeira provoca<strong>da</strong> pelos produtos<br />

regionais. A festa vivia em função desta<br />

situação. Mas a época de apogeu que vi e<br />

guardei firmemente foi no período de 1944/46.<br />

Foi quando a borracha tomou um incremento<br />

246


espetacular. Foi nesta ocasião que vi a festa<br />

ser uma coisa difícil de contar, inclusive.<br />

Nos anos seguintes observou­se a borracha não<br />

alcançar preço igual a (19)46, com a última<br />

grande guerra. Contudo, ela continuou com<br />

preço compatível ao <strong>da</strong> mercadoria produtos de<br />

consumo. Então, como a situação financeira do<br />

país mantinha­se num equilíbrio quase<br />

perfeito, a festa não se ressentia de um<br />

preço exagerado <strong>da</strong> borracha porque ela se<br />

espelhava, na ver<strong>da</strong>de, no valor dos produtos<br />

de consumo e esse equilíbrio proporcionava um<br />

cunho de grandeza. Já de 46 a 70, a festa se<br />

manteve bem porque a borracha tinha os seus<br />

preços estabilizados pelo Banco <strong>da</strong> Amazônia.<br />

De 70 para cá, quando houve a desativação dos<br />

seringais, a festa de São Sebastião foi<br />

perdendo não a sua religiosi<strong>da</strong>de, mas a sua<br />

freqüência, os seus grandes estimuladores,<br />

que eram exatamente os seringueiros. Entramos<br />

numa fase em que o seringueiro passou a ser<br />

um intruso dentro dos seringais, por força<br />

<strong>da</strong>s circunstâncias, vendidos.’ (Souza, p. 32­33).<br />

Esse depoimento de Alberto Zaire se revela de uma enorme<br />

relevância não só por ter sido feito por um ex­seringalista, como ele se<br />

auto­identifica mas também pelo fato de estarmos diante de um historiador<br />

e, portanto, de um intelectual que, como tal, organiza suas idéias, as<br />

compara, as analisa. Sua periodização do que considera o período áureo <strong>da</strong><br />

borracha, para ele, de 1944 a 1946 e <strong>da</strong>í até 1970, corresponde exatamente<br />

àquele a que chegamos em nossas pesquisas a denominar como o período<br />

<strong>da</strong> Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco.<br />

No entanto, por maior que seja a importância que A . Zaire atribui ao<br />

seringueiro, é preciso que não se perca de vista o lugar social de quem está<br />

falando, o de seringalista, onde essa importância do seringueiro se revela<br />

na medi<strong>da</strong> que este produz borracha.<br />

O caráter desbravador do nordestino, que nos legou, primeiramente,<br />

este território, existe na medi<strong>da</strong> que produzia a borracha. Tudo aquilo que<br />

se passou no Acre entre o período desse ‘desbravamento’ e que consistiu<br />

na afirmação <strong>da</strong> autonomia do seringueiro(a)­agricultor não é aqui<br />

mencionado. Aqui o saber indígena não cumpre nenhum papel; nem a<br />

constituição <strong>da</strong>s famílias pelos que ficaram e, assim as mulheres não são<br />

considera<strong>da</strong>s, nem tão pouco a prática <strong>da</strong> agricultura que, no fundo,<br />

tornaram possível a socie<strong>da</strong>de acreana, até mesmo que os próprios<br />

patrões seringalistas pudessem existir, como já salientamos. Por esse olhar<br />

247


os seringueiros são uma classe em extinção eles que, já o vimos,<br />

também tinham sido extintos com a crise <strong>da</strong> Territoriali<strong>da</strong>de dos<br />

Seringalistas a partir de 1912.<br />

Assim, mais uma vez, os seringueiros são vítimas, não são capazes de<br />

se afirmarem, eles que<br />

‘não se achavam preparados para substituir um<br />

patrão de carne e osso por uma impessoal<br />

agência governamental. Além do mais, tais<br />

agências não possuíam dias santos, nem<br />

promoviam as festas e bailes domingueiros nos<br />

quais os seringueiros <strong>da</strong>vam vasão a alguma<br />

vi<strong>da</strong> social’<br />

e que necessitam<br />

‘na ver<strong>da</strong>de é de alimentos e remédios que o<br />

mantenham vivo e do álcool para livrá­lo do<br />

desespero. Que diferença faz para ele se o<br />

mesmo se levanta <strong>da</strong> rede e não pode saciar<br />

sua fome’.<br />

Enfim, no fundo, a partir dessa perspectiva, o que necessitam é do<br />

‘seringalista­comerciante e a segurança que<br />

ele, de qualquer maneira, representava.’<br />

O depoimento de Alberto Zaire nos esclarece o papel do Banco <strong>da</strong><br />

Amazônia na manutenção dos preços <strong>da</strong> borracha ‘e no equilíbrio<br />

quase perfeito’ porque passava o país nesse período ­ 1946 a 1970 ­<br />

que considera o melhor <strong>da</strong> festa de Xapuri que, não sem razão, coincide<br />

com o período em que as classes dominantes regionais amazônicas<br />

lograram melhores articulações políticas como parte do bloco de poder<br />

nacional em to<strong>da</strong> a história <strong>da</strong> Amazônia e que, por isso, para este autor<br />

emprestou­lhe aquele ‘cunho de grandeza’.<br />

Alberto Zaire mostra­nos, também, uma refina<strong>da</strong> percepção <strong>da</strong><br />

presença <strong>da</strong> indústria automobilística e de pneumáticos em território<br />

brasileiro. A princípio suas observações poderiam ser assimila<strong>da</strong>s a uma<br />

ideologia de caráter nacionalista que, se faz presente no imaginário dos<br />

acreanos tanto dos ‘de cima’ como dos ‘de baixo’. Ora, o período áureo<br />

<strong>da</strong> Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco coincide com o período<br />

nacional­desenvolvimentista que, sabemos, fora mais nacionalista até 1954<br />

e mais desenvolvimentista depois de 1956. A chama<strong>da</strong> ‘classe produtora<br />

de borracha’, que excluía o seringueiro, conseguiu, num primeiro<br />

momento, fazer nacional os seus interesses específicos.<br />

248


Entretanto, a indústria automobilística que se implanta no país,<br />

mormente após 1956, tráz para o interior do país os mesmos sujeitos que<br />

antes, de fora, se constituíam nos principais compradores de borracha, isto<br />

é, as grandes indústrias de pneumáticos e automobilísticas alemãs,<br />

inglesas, norte­americanas e italianas.<br />

Desta forma, os parâmetros de (seus) custos de produção mundiais<br />

são internalizados no país por empresas que, a essa altura, já tinham sob<br />

seu controle a produção <strong>da</strong> borracha sintética, além dos seringais de<br />

cultivo <strong>da</strong> Ásia. Como havia dito Alberto Zaire<br />

‘tinha para abastecer suas fábricas de pneus,<br />

em São Paulo, a fonte produtora que lhes era<br />

de proprie<strong>da</strong>de sua no Ceilão, lá no<br />

Oriente.(...). Então, primeiramente, eles<br />

montaram as fábricas de pneus, depois<br />

desenvolveram as fábricas de automóveis ...’<br />

Nesses marcos de internalização do mercado mundial <strong>da</strong> borracha, o<br />

que é mais do que uma característica meramente econômica, posto que<br />

implica novos pactos políticos entre os ‘de dentro’ e os ‘de fora’, as<br />

vantagens políticas ofereci<strong>da</strong>s às indústrias internacionais automobilísticas<br />

e de pneumáticos, sobretudo após 1958, desloca a Amazônia e o Acre, em<br />

particular, para uma posição marginal e periférica 14 . Mais uma vez, como<br />

se a economia pudesse ser abstraí<strong>da</strong> do contexto sociopolítico, a<br />

marginalização do Acre volta a ser atribuí<strong>da</strong> aos velhos argumentos,<br />

sempre atualizados, de atraso do extrativismo e <strong>da</strong>s suas elites .<br />

De fato há um quê de ver<strong>da</strong>de se pensamos o Acre nos marcos de<br />

uma lógica econômica restrita e que explica a sua marginalização. Como já<br />

nos ensinara Leo Waibel 15 , nas pega<strong>da</strong>s de von Thünen, as margens de<br />

lucro são menores naquelas áreas mais afasta<strong>da</strong>s do mercado. E, comofoi<br />

visto, o Acre, a Amazônia sul ocidental, ficara, até a segun<strong>da</strong> metade do<br />

século XIX, à margem até mesmo do processo colonial. De fato, <strong>da</strong><strong>da</strong>s as<br />

posições geográficas <strong>da</strong>s regiões de maior densi<strong>da</strong>de econômica, o Acre<br />

teria, para ser competitivo, como quer a lógica econômica estrita, que ter<br />

um nível de produtivi<strong>da</strong>de maior que as outras regiões para compensar os<br />

custos de transporte. Ou, ao contrário, explorar os seus recursos naturais,<br />

tal como se apresentam, encontrando nichos de mercado, como foi o caso<br />

<strong>da</strong> borracha, ou <strong>da</strong>s drogas do sertão, do ouro e diamante, ou fazer<br />

exploração pre<strong>da</strong>tória dos seus recursos naturais que, no entanto, é<br />

14 ­ O Acre passa a ser a principal uni<strong>da</strong>de <strong>da</strong> federação produtora de látex.<br />

15 ­ Waibel, L. Capítulos de geografia tropical e do Brasil. Rio de Janeiro: CNG/IBGE, 1956.<br />

249


economicamente racional 16 , porque torna suas ativi<strong>da</strong>des competitivas,<br />

como o provam a pecuária extensiva ou o garimpo, não só do diamante e<br />

do ouro, como também <strong>da</strong>s árvores raras. Eis uma <strong>da</strong>s razões por que a<br />

produção empresarial de borracha na Amazônia encontra dificul<strong>da</strong>des para<br />

competir.<br />

Não se acuse aqui, como um preconceito já profun<strong>da</strong>mente<br />

arraigado costuma afirmar, a incapaci<strong>da</strong>de ou incompetência dos<br />

seringalistas para fazer o ‘plantio racional de seringueiras’ na Amazônia.<br />

Warren Dean, em seu excelente livro A luta pela borracha no<br />

Brasil(Dean, 1992), esclarece sobre as dificul<strong>da</strong>des tanto técnico­<br />

ecológicas, como sociopolíticas, para que isso se desse e informa sobre as<br />

tentativas que foram feitas, desde o final do século passado, nos mais<br />

diferentes estados <strong>da</strong> Amazônia, para que se implantassem seringais de<br />

cultivo. Lembremos aqui do esforço de Henry Ford que, certamente, não<br />

pode ser acusado de incompetência técnica, que viu malogrado seus<br />

investimentos em seringais em Fordlândia e Belterra, no vale do Tapajós,<br />

tendo que vendê­los em 1945 17 .<br />

Esse quadro sociopolítico que reorganiza a geografia econômica <strong>da</strong><br />

borracha é extremamente importante para que se compreen<strong>da</strong> aquilo que a<br />

fala de Alberto Zaire notara e que expressa a contradição que, no fundo,<br />

coman<strong>da</strong> a socie<strong>da</strong>de acreana, entre os seringalistas e os seringueiros.<br />

Contrariamente ao que costuma afirmar o ‘cálculo econômico<br />

racional’, o Acre continuou a produzir borracha. Para aqueles que<br />

acreditam numa racionali<strong>da</strong>de econômica independentemente do contexto<br />

político e cultural que a torna possível, e natural, a explicação para essa<br />

continui<strong>da</strong>de estaria na aju<strong>da</strong> política que se <strong>da</strong>va por meio de subsídios<br />

do Banco <strong>da</strong> Amazônia. Por tudo que arrolamos até aqui é possível<br />

afirmar, com segurança, que ‘a aju<strong>da</strong> política’ longe de explicar a<br />

continui<strong>da</strong>de <strong>da</strong> produção de borracha contribui , sim, para explicar as<br />

condições de sustentabili<strong>da</strong>de dos Coronéis de Barranco, posto que o que<br />

16 A racionali<strong>da</strong>de econômica tem uma temporali<strong>da</strong>de própria em constante processo de aceleração. O<br />

curto prazo predomina sobre o longo prazo no ‘cálculo econômico racional’, como se depreende <strong>da</strong><br />

máxima de Keynnes ‘no futuro, estaremos todos mortos’.<br />

17 Aliás o que a Ford procurava no Brasil era ter o controle de to<strong>da</strong> as etapas do ciclo de produção de<br />

borracha, o que era estratégico, se for olhado a partir <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> de 1920 quando a grande empresa<br />

norte­americana implanta seus seringais no Brasil. A produção de elastômeros sintéticos obrigou a<br />

que fossem redefini<strong>da</strong>s as estratégias. Enquanto a Alemanha importava borracha do Brasil, se<br />

preparando para a guerra durante os anos trinta, investia pesa<strong>da</strong>mente na borracha sintética,<br />

considerado um projeto com forte componente geopolítco, pois tornaria a Alemanha insensível ao<br />

possível bloqueio de borracha <strong>da</strong> Ásia numa situação de conflito, os Estados Unidos, assim como<br />

Ford, negligenciaram essa alternativa, o que viria lhes custar caro.<br />

250


<strong>da</strong>va suporte à produção de borracha era uma economia que transcendia a<br />

lógica mercantil e que estava posta pelas famílias de ‘camponeses <strong>da</strong><br />

floresta’, como tão bem caracterizou Mauro Almei<strong>da</strong>. Como será visto, o<br />

Coronel de Barranco não resistirá às mu<strong>da</strong>nças no contexto sociopolítico<br />

que começa a alterar a geografia econômica interna <strong>da</strong> borracha, sobretudo<br />

a partir dos anos1970.<br />

Já em 1958, o capital internacional fará sentir todo o peso <strong>da</strong>s suas<br />

determinações ao pressionar o governo brasileiro a extinguir o monopólio<br />

estatal de importação <strong>da</strong> borracha, o que é obtido pelo Decreto nº 44.728<br />

de 22 de outubro de 1958, assinado pelo então Presidente Juscelino<br />

Kubitschek. Não vejamos aqui, portanto, a afirmação de uma<br />

racionali<strong>da</strong>de técnica e econômica se impondo mas, insistimos, novas<br />

relações sociopolíticas, novas alianças que redefinem as marcas na terra,<br />

as geografias, alijando determina<strong>da</strong>s regiões e afirmando outras.<br />

Um analista <strong>da</strong>s políticas liga<strong>da</strong>s ao setor de borracha, Nelson Prado<br />

Alves Pinto, assim caracterizou o quadro sociopolítico<br />

‘... o suicídio do Presidente Vargas, o<br />

arrefecimento do movimento nacionalista e a<br />

franca abertura <strong>da</strong> economia nacional ao<br />

capital estrangeiro durante o Governo<br />

Juscelino Kubitschek (1956­1960) resultou, no<br />

que se refere à questão gomífera, no<br />

favorecimento <strong>da</strong>s grandes companhias<br />

produtoras de pneumáticos. Assim, o monopólio<br />

<strong>da</strong> comercialização <strong>da</strong> borracha até então<br />

exercido pelo Banco de Crédito <strong>da</strong> Borracha,<br />

foi revogado no tocante à importação dos<br />

elastômeros necessários à complementação do<br />

abastecimento nacional. Isto significava que,<br />

fixa<strong>da</strong> as proporções globais de borracha<br />

nacional e estrangeira a serem utiliza<strong>da</strong>s<br />

durante o ano (tarefa que cabia à Comissão<br />

Executiva de Defesa <strong>da</strong> Borracha), facultava­se<br />

aos fabricantes de artefatos de borracha, do<br />

setor pesado, a importação direta, com redução<br />

de direitos aduaneiros, <strong>da</strong> parcela suplementar<br />

ao seu consumo de borracha nacional’ 18 .<br />

Tabela – PREÇO DA BORRACHA<br />

E, mais, o Estado continuou com o monopólio de compra e ven<strong>da</strong> <strong>da</strong><br />

borracha nacional e, portanto, mantendo as condições de determinação<br />

18 Cf. PINTO, N. P.A. Evolução e consequência <strong>da</strong> política <strong>da</strong> borracha no Brasil. (Falência <strong>da</strong><br />

Borracha Vegetal). Campinas: Unicamp, 1980. p.134­135.<br />

251


política dos preços <strong>da</strong> borracha dos seringais amazônicos com influência<br />

direta sobre o Acre, então principal produtor nacional do látex.<br />

No uso dessas atribuições , a partir de 1964, os preços <strong>da</strong> borracha<br />

passam a ser delibera<strong>da</strong>mente mantidos abaixo <strong>da</strong> inflação acirrando as<br />

contradições no interior dos seringais. Segundo o governador do Acre, Sr.<br />

Jorge Kalume: ‘as mercadorias, de 1964 a 1966 aumentaram<br />

361,97 % e a borracha de 39 % , quando deveria ser, pelo<br />

menos, em relação ao salário mínimo’<br />

que, no período, aumentara no Acre em 127,82% 19 .<br />

O deputado pelo Território Federal de Rondônia, Vitor Nunes Leal,<br />

afirmara em pronunciamento feito na Câmara dos Deputados, em Brasília,<br />

que ‘enquanto o custo de vi<strong>da</strong> havia subido naqueles três<br />

anos 163 % o preço <strong>da</strong> borracha aumentara no máximo 31,7 % ’<br />

(Leal, 1967) 20 .<br />

Importa aqui menos a precisão desses <strong>da</strong>dos estatísticos e mais<br />

como eles são apropriados pelos protagonistas e, assim, pelas<br />

conseqüências que <strong>da</strong>í derivam. O que está em jogo aqui é, sem dúvi<strong>da</strong>, o<br />

conjunto de instrumentos institucionais através dos quais se fazem as<br />

articulações políticas configurando pactos socioespaciais. Assim se tecem<br />

as escalas.<br />

Mary Allegretti, ao entrevistar seringueiros do Seringal Alagoas,<br />

no rio Tarauacá, captou, por baixo, os efeitos dessas práticas de<br />

manipulação dos preços, ao registrar uma greve naquele seringal ocorri<strong>da</strong><br />

em 1964.<br />

Em Xapuri, também em 1964, os conflitos se acentuam tendo até<br />

mesmo ocorrido a ocupação <strong>da</strong> prefeitura por parte de seringueiros e<br />

colonos. Vê­se, assim, como os ‘de baixo’ acusam com essas<br />

manifestações os efeitos de políticas decidi<strong>da</strong>s alhures. Apesar de o Sr<br />

Roberto Campos, em seu relatório do Grupo de Trabalho que formulou a<br />

nova política nacional <strong>da</strong> borracha e que culminou na Lei nº 5.227 de 18<br />

de janeiro de 1967 21 , ter alertado sobre as conseqüências que adviriam,<br />

sobretudo para o Acre, <strong>da</strong> política que ele mesmo propunha para o setor,<br />

nenhuma política governamental específica cuidou disso.<br />

19 ­ MEIRA FILHO, A.A. A revogação <strong>da</strong> lei do monopólio estatal <strong>da</strong> borracha: suas conseqüências<br />

políticas, sociais, econômicas e ecológicas para a Amazônia’. Dissertação de Mestrado em Ciências<br />

Humanas ­ Direito do Estado. UFSC, 1984.<br />

20 Apud Meira Filho, A.A. op. cit. p. 80.<br />

21 ­ Essa lei extinguirá definitivamente o monopólio estatal <strong>da</strong> borracha.<br />

252


Aqui, sem dúvi<strong>da</strong>, o caráter ditatorial do regime político deitou por<br />

terra uma política que havia sido forja<strong>da</strong> por meio de um pacto político<br />

negociado nas Conferências Nacionais <strong>da</strong> Borracha de 1946, 1948 e 1949.<br />

Ali, já foi visto, a democracia ain<strong>da</strong> não chegara aos de baixo posto que o<br />

único sujeito social ausente foram os agricultore(a)s­seringueiro(a)s,<br />

fossem indígenas ou caboclos ou descendentes de nordestinos.<br />

Na nova geografia política do poder nacional que começa a se<br />

delinear após 1964, sobretudo após a extinção do Banco de Crédito <strong>da</strong><br />

Amazônia em 1967, não é mais aliando­se com o velho ‘bloco histórico’<br />

(Gramsci) regional, constituído pelos comerciantes, e suas casas<br />

aviadoras, e com os ‘coronéis de barranco’, que o bloco histórico nacional<br />

manterá relações, mas sim com os grandes capitais de fora <strong>da</strong> região,<br />

internacionais ou do Sul do país, para o que o Estado abrirá o seu caixa<br />

através de isenções fiscais e outros subsídios com explícito aval <strong>da</strong>s<br />

agências multilaterais de fomento ao desenvolvimento por meio de aportes<br />

político­financeiros 22 . Temos assim novas articulações entre os de fora e<br />

os de dentro, entre o local, o regional, o nacional e o internacional. São<br />

outros os degraus através dos quais se faz a hierarquia de poder, enfim, as<br />

escalas.<br />

Essa história dos incentivos fiscais e dos grandes projetos para a<br />

Amazônia já foi por demais bem conta<strong>da</strong> para que dela aqui nos<br />

ocupemos. To<strong>da</strong>via, sem dúvi<strong>da</strong>, pouco desse processo foi analisado de<br />

um ponto de vista <strong>da</strong> Amazônia Ocidental, particularmente do Acre e,<br />

entre os dessa/<strong>da</strong>quela região, os ‘de baixo’. Daí a surpresa com que se<br />

encarou a emergência de um vigoroso movimento de resistência dos<br />

seringueiros autônomos <strong>da</strong> região do Acre­Purus tão bem representados<br />

nas figuras de Wilson Pinheiro e Chico Mendes.<br />

Como já havíamos ressaltado, estávamos diante de territoriali<strong>da</strong>des<br />

que abrigavam em seu seio um movimento contraditório entre,os<br />

seringalistas e o(a)s agricultore(a)s­seringueiro(a)s. De fato, um dos<br />

lados dessa contradição, o dos Coronéis de Barranco, só se sustentou,<br />

22 ­ Assinalemos, de passagem, que a construção de obras, mais tarde acusa<strong>da</strong>s de megalômanas,<br />

foram to<strong>da</strong>s apoia<strong>da</strong>s por Bancos privados estrangeiros e agências multilaterais, como o BIRD e o<br />

BID, por exemplo. Destaque­se que obras como as hidrelétricas de Balbina e Tucuruí, assim como a<br />

Transamazônica e as BRs, com destaque para a BR­364 que liga Cuiabá a Porto Velho ­ Rio Branco,<br />

foram to<strong>da</strong>s <strong>da</strong> lavra de governos ditatoriais, portanto, sem o aval democrático <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de brasileira<br />

que, no entanto, continuaria tendo que sal<strong>da</strong>r os <strong>da</strong>nos não só ecológicos, mas também financeiros de<br />

uma dívi<strong>da</strong> externa que continua transferindo recursos para os bancos que foram os avalistas desses<br />

prejuízos.<br />

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enquanto contou com o apoio externo, enquanto pode acionar seus trunfos<br />

políticos. Com o fim desta articulação política desse poder local com o<br />

poder nacional, político no dizer de Vitor Nunes Leal, o coronelismo<br />

esboroa e, assim, mergulhamos na crise <strong>da</strong> Territoriali<strong>da</strong>de dos Coronéis<br />

de Barranco.<br />

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