11 DOS CORONÉIS DE BARRANCO - Biblioteca da Floresta

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documento da Delegação Acreana à 3 a Conferência em 1949, sobretudo com relação aos seringueiros. Acrescentese, ainda, a legitimidade que reconhecem do poder das oligarquias regionais sobre aqueles territórios e suas gentes. Eis como se refere à Amazônia o, então, Segundo Secretário da Embaixada dos EUA no Brasil, Sr. Walter Walmsley: ‘Não existe em lugar algum civilizado um quadro mais negro que se possa escolher para descrever aquilo que se costumou chamar de corrupções e exploração. Apesar disso, a sociedade, estabelecida com seus tentáculos centenares abrangendo todos os tributários, foi totalmente ignorada pelo nosso primitivo plano da borracha. O comércio fluvial é o sistema arterial desta feudal organização social. Nós tentamos cortar estas artérias na esperança de que o corpo sobrevivesse e que também fosse útil para nós. Nós falhamos em não consultar aqueles que, através de secular experiência acumularam um singular e profundo conhecimento da região. Entramos na propriedade alheia e ignoramos o dono. Tomamos decisões não somente em Belém e Manaus, o que já era um grande mal, mas também no Rio de Janeiro e Washington o que era pior, sobre problemas acerca dos quais não tínhamos a mais leve idéia e a mínima familiaridade. Apesar das nossas recentes concessões a eles (os comerciantes, etc.), seja os homens de negócios como os oficiais locais, continuam desconfiados e de sobreaviso. A Amazônia é uma cadeia de intermediários, todos se saciando no sangue dos pobres extratores. Dinheiro nada significa para o seringueiro enterrado vivo no interior do seu esquálido barracão. O que ele necessita na verdade é de alimentos e remédios que o mantenham vivo e do álcool para livrálo do desespero. Que diferença faz para ele se o mesmo se levanta da rede e não pode saciar sua fome? Se um seringueiro for creditado com um preço compensador pela sua borracha é debitado por um preço ainda maior pelos suprimentos que lhe são vendidos. Nem o Banco da Borracha, nem a Rubber Development Corporation ou outra qualquer entidade, sem a organização dos rios das firmas comerciais aviadoras, têm alguma coisa a oferecer pelo aumento de sua borracha. O abastecimento tem que seguir a maneira tradicional através das firmas 243
aviadoras. É inútil tentar chegar diretamente ao seringueiro como pretendíamos fazer. Assim nós planejamos no vácuo, em uma larga escala 12 , sem sequer conhecer as condições locais e esperando que um homem, cuja mão direita foi cortada, nos ofereça a esquerda’. (Walmsley, apud Martinello, 1988 p. 279) 13 . Reconhecida está, portanto, a Amazônia como território das antigas oligarquias, por meio de quem se poderá acessar os recursos; região que não se pode entrar, posto que propriedade alheia, se ignorarmos o dono’. É o reconhecimento explícito de que se está diante de um território. Seja porque os países europeus, mesmo com a emancipação política das suas antigas colônias na Ásia e na África, conseguiram restabelecer o abastecimento da borracha das suas plantations nos novos países independentes no pósguerra; seja porque a borracha sintética começou a ocupar uma faixa do mercado cada vez mais significativa, o fato é que a borracha brasileira voltou a perder posições nos mercados externos. Já em 1950, o Brasil passara a ser importador de borracha. E, como nos alertara Vitor Nunes Leal, o coronelismo se expressa como uma relação em que a decadência do grande proprietário de terras, no caso acreano os seringalistas, o obriga a recorrer ao seu prestígio político para obter as benesses dos poderes públicos. Assim ‘A borracha produzida nos seringais e, de modo geral, no território, é enviada às praças de Manaus e Belém, por via fluvial (navios do SNAPP e batelões particulares). (...) Os seringalistas vendem o seu produto diretamente ao Banco de Crédito da Amazônia, todavia reclamam, pedindo financiamento maior para poder explorar maior número de estradas. Assim, por exemplo, os grandes seringais da bacia do Purus, no rio Acre e no rio Iaco, como é o caso dos seringais Mercês e 12 Observese aqui, mais uma vez, o uso dessa expressão, escala, no sentido de hierarquia de poder, de que há degraus como se fosse uma escada (echelle). 13 Creio estar aqui diante de uma das melhores caracterizações que se poderia ter feito do porque do sucesso dos plantios de borracha pelos europeus, sobretudo os ingleses, de borracha no sul e sudeste asiáticos. E, como se vê, não é porque lá se fez ‘plantio racional da borracha’, como procuram afirmar análises de cunho estritamente econômico e que ignoram o contexto sociopolíticocultural, em que se insere qualquer economia, mas sim porque, no caso da Amazônia, não se podia ignorar o poder que essas oligarquias haviam consolidado e que qualquer um que quisesse explorar os recursos naturais da região haveria que, mais cedo ou mais tarde, se aliar, ou para ser mais explícito, partilhar com elas o excedente econômico. No sudeste asiático, o estatuto político no início do século era de colônia. 244
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