COIvl - Centro de Documentação e Pesquisa Vergueiro
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A COPA DA INFLAÇÃO. OU MAIS UMA DESCULPA<br />
Eron Br um<br />
Entro direto no assunto e me <strong>de</strong>fino: a Copa do Mundo não é culpada do novo<br />
mergulho da economia brasileira em direção ao caos e tampouco <strong>de</strong>ve ser responsabili-<br />
zada pelos recentes lances casufsticos da nossa política. Por acaso a genialida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pele,<br />
a sutileza <strong>de</strong> Tostão, a garra do Gerson e o furacão Jairzinho em 70, no México, contri-<br />
buíram para que ninguém tomasse conhecimento <strong>de</strong> um tal milagre econômico que<br />
nunca existiu? Passada a euforia, <strong>de</strong>scobriu-se a farsa. E o fracasso do futebol or<strong>de</strong>m<br />
unida <strong>de</strong> 78, na Argentina, significou alguma coisa para a economia? A vitória <strong>de</strong> 70 e<br />
a <strong>de</strong>rrota <strong>de</strong> 78, aliadas ao <strong>de</strong>sastre <strong>de</strong> 74, na Alemanha, também não sensibilizaram os<br />
eleitores: o partido do Governo, a cada pleito que se realiza, recebe menos votos. Nas<br />
<strong>de</strong>rrotas ou nas vitórias da seleção.<br />
Mas os números citados pelos economistas são fatais e, durante algumas semanas,<br />
viraram manchete nacional. A cada jogo dos comportados atletas <strong>de</strong> Telê a Nação per-<br />
dia Cr$ 114 bilhões. Como foram seis partidas, per<strong>de</strong>mos ou <strong>de</strong>ixamos <strong>de</strong> ganhar Cr$..<br />
684 bilhões. E quando naquela sombria segunda-feira os gols <strong>de</strong>sconcertantes do <strong>de</strong>sa-<br />
jeitado Paolo Rossi <strong>de</strong>spacharam os canarinhos <strong>de</strong> volta, a comunida<strong>de</strong> econômica respi-<br />
rou aliviada: estamos salvos da catástrofe.<br />
Até que não fica muito difícil justificar a mística dos números e o <strong>de</strong>cantado pre-<br />
juízo que a Copa do Mundo teria gerado. É só tomar como exemplo o dia-a-dia <strong>de</strong><br />
qualquer trabalhador. Se ele falta no emprego e não justifica, no final do mâs recebe<br />
menos porque <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> produzir. Como paramos seis dias, <strong>de</strong>ixamos <strong>de</strong> faturar Cr$...<br />
684 bilhões, garantem os economistas. Mas graças a Paolo Rossi voltamos ao trabalho<br />
antes do previsto e, assim, asseguramos os lucros dos bancos, das indústrias e do co-<br />
mércio.<br />
Os teóricos da catástrofe do futebol — os mesmos que voltarão a repetir suas surra-<br />
das críticas por ocasião do carnaval — relacionaram a euforia dos cinco primeiros jogos<br />
ao disparo da inflação. Os mais <strong>de</strong> 8 por cento registrados em um único mâs e a ameaça<br />
<strong>de</strong> que a taxa anual retorna aos incômodos trás dígitos são filhos legítimos da Copa. E<br />
indagam do alto do pe<strong>de</strong>stal: com a inflação, não vieram os aumentos insuportáveis da<br />
casa própria, dos colégios, do leite, do pão, do açúcar, do café e do transporte urbano?<br />
Vieram sim e viriam <strong>de</strong> qualquer maneira. Com Copa ou sem Copa. Com ou sem<br />
Paolo Rossi. Por acaso o panorama seria outro se a opnião pública n?o estivesse com<br />
mentes e corações voltados para os alegres estádios espanhóis? Ora, as causas da crise<br />
econômica são tantas e tão graves que o futebol, uma das poucas alegrias que ainda não<br />
tiraram do povo, não passa <strong>de</strong> refresco. Com essa política econômica que aí esta nem<br />
uma dúzia <strong>de</strong> copas conquistadas ou perdidas darão jeito. Aliás, é bom levar o assunto<br />
mais a sério e não alinhar o futebol como causa <strong>de</strong> inflação e <strong>de</strong> <strong>de</strong>sastre econômico.<br />
Os fatores são outros e a Nação inteira os conhece muito bem.<br />
De <strong>de</strong>sculpa em <strong>de</strong>sculpa o Brasil vai per<strong>de</strong>ndo fôlego. A dívida externa cresce, os<br />
juros não baixam, o <strong>de</strong>semprego assuta, a inflação dispara, Ia crise social se agrava, o<br />
mo<strong>de</strong>lo econômico não muda e para cada tropeço se encontra um bo<strong>de</strong> expiatório. (O<br />
chuchu e os barbeiros já pertencem ao time). O último foi a Copa e agora se fala que as