Ensinar com afecto O segredo do bom professor - Página
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Manuais escolares: um recurso didático<br />
ou um fim em si mesmo?<br />
O <strong>do</strong>ssier deste mês dedica as suas páginas aos manuais escolares e a questões que habitualmente passam ao la<strong>do</strong> quan<strong>do</strong><br />
deles falamos. Afinal, qual é hoje o papel <strong>do</strong>s manuais escolares? Serão eles um recurso didático ou um instrumento de<br />
normalização <strong>do</strong>s saberes? E deveria ou não existir um organismo certifica<strong>do</strong>r <strong>do</strong>s manuais escolares que incluisse representantes<br />
das áreas científicas, ministério e editoras, passan<strong>do</strong> pelos <strong>professor</strong>es e pelos pais? Apesar da existência <strong>do</strong><br />
Decreto-Lei 369/90, de 26 de Novembro, que estabelece o sistema de a<strong>do</strong>pção, o perío<strong>do</strong> de vigência e o regime de controlo<br />
e qualidade <strong>do</strong>s manuais escolares, a lei nem sempre é cumprida <strong>com</strong> rigor.<br />
Neste número, destaque para uma entrevista <strong>com</strong> Carlinda Leite, da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da<br />
Universidade <strong>do</strong> Porto e para um artigo de Ana Maria Brito Jorge, <strong>professor</strong>a de matemática e autora de manuais escolares<br />
desta disciplina. Espaço ainda para as opiniões de Albino Almeida, presidente da Confederação das Associações de pais,<br />
António Avelãs, da Federação Nacional de Professores e de Vasco Teixeira, director editorial da Porto Editora.<br />
Esta disciplina é “de estu<strong>do</strong>”, aquela<br />
é mais “de praticar”… Nesta preciso<br />
de ler muitas vezes o manual, naquela,<br />
nem pego no livro, é só resolver<br />
bastantes exercícios!... Há equívocos<br />
que demoram (e demorarão…) a<br />
desmontar, e este é um deles: todas<br />
as disciplinas exigem um estu<strong>do</strong><br />
bem alicerça<strong>do</strong>, contínuo e estrutura<strong>do</strong>,<br />
que não tem necessariamente<br />
que ser <strong>do</strong>loroso, mas que exige, isso<br />
sim, algum esforço individual.<br />
O estudante, nomeadamente <strong>do</strong><br />
Ensino Secundário, precisa de encarar<br />
qualquer disciplina <strong>com</strong>o um repositório<br />
de saberes, enriquece<strong>do</strong>res<br />
e forma<strong>do</strong>res, que ele pode assimilar<br />
trabalhan<strong>do</strong> os conceitos a<br />
partir das aquisições feitas na aula, e<br />
procuran<strong>do</strong>, depois, a subsequente<br />
maturação que o estu<strong>do</strong> adequa<strong>do</strong><br />
lhe pode proporcionar. E nunca a<br />
memorização ou a mecanização pode<br />
substituir ou, sequer, antecipar-se<br />
à colheita das ideias, realizada a partir<br />
de uma leitura atenta e persistente,<br />
na fase “solitária” <strong>do</strong> trabalho.<br />
Manual escolar,<br />
uma ferramenta <strong>do</strong> aluno<br />
E é neste contexto que o manual<br />
da disciplina deve ser encara<strong>do</strong> <strong>com</strong>o<br />
uma ferramenta de trabalho para<br />
o aluno. Uma ferramenta que lhe<br />
permitirá prolongar os momentos de<br />
aprendizagem na turma, revisitar as<br />
palavras, as perguntas, os problemas<br />
e as reflexões colocadas pelo<br />
<strong>professor</strong> e, mais <strong>do</strong> que isso, consolidar<br />
a apropriação <strong>do</strong>s conceitos,<br />
das técnicas e <strong>do</strong>s procedimentos<br />
que conheceu em cenário de aula.<br />
É claro que o papel <strong>do</strong> <strong>professor</strong><br />
é determinante e insubstituível e é<br />
claro também que é a ele, e não ao<br />
manual, que se confia o traça<strong>do</strong> de<br />
estratégias e a a<strong>do</strong>pção das meto<strong>do</strong>logias<br />
mais adequadas a uma<br />
boa aprendizagem por parte <strong>do</strong>s<br />
seus alunos.<br />
Mas é também certo que, se<br />
quem faz o manual é, simultaneamente,<br />
<strong>professor</strong> em exercício de<br />
funções lectivas, é possível adivinhar-lhe,<br />
nas páginas que escreveu,<br />
as opções de fun<strong>do</strong> quanto à orientação<br />
pedagógico – didáctica que<br />
preconiza para a prática lectiva.<br />
O manual escolar não obriga o<br />
<strong>professor</strong>, antes o liberta! Porque<br />
permite que o seu trabalho se prolongue<br />
no tempo (e no espaço…).<br />
O manual escolar não limita o<br />
<strong>professor</strong>, antes o prolonga, quan<strong>do</strong><br />
estimula a autonomia <strong>do</strong> aluno,<br />
quan<strong>do</strong> lhe abre portas para a recuperação<br />
e reinterpretação das vivências<br />
da aula.<br />
O <strong>professor</strong> trabalha <strong>com</strong> o programa<br />
da disciplina, gerin<strong>do</strong>-o e desenvolven<strong>do</strong>-o<br />
de acor<strong>do</strong> <strong>com</strong> as<br />
suas próprias opções, <strong>com</strong> as lições<br />
colhidas na sua experiência, <strong>com</strong> o<br />
acréscimo de formação que, continuadamente,<br />
terá obti<strong>do</strong>.<br />
E, a par deste trabalho, conhece<br />
o manual que o estudante utiliza e<br />
pode, naturalmente, abrir-lhe pistas<br />
para uma melhor utilização, para<br />
a forma mais enriquece<strong>do</strong>ra de<br />
exploração <strong>do</strong> texto que lhe é proporciona<strong>do</strong>.<br />
O manual escolar cumpre o seu<br />
papel quan<strong>do</strong>, nas mãos <strong>do</strong> estudan-<br />
Ana Alvim_isto é<br />
te, o desafia, o motiva, o apoia e lhe<br />
permite autoavaliar-se no processo<br />
de consolidação de novos saberes.<br />
Prolongan<strong>do</strong> as suas aprendizagens<br />
em aula, poden<strong>do</strong> recorrer a<br />
um manual que o cative e lhe facilite<br />
uma apropriação sólida <strong>do</strong>s saberes,<br />
o estudante reconhecerá no<br />
manual a tal ferramenta de que necessita<br />
para se apoiar, na sua preparação<br />
individual.<br />
Um <strong>bom</strong> manual há-de estimular<br />
a criatividade e a organização <strong>do</strong><br />
trabalho, quer de alunos, quer de<br />
<strong>professor</strong>es. Directamente, no caso<br />
<strong>do</strong>s primeiros, pois a pensar neles é<br />
que o manual nasceu…<br />
Ocorre mesmo lembrar a ideia<br />
expressa pelo grande matemático<br />
Carl Friedrich Gauss (1777 – 1855):<br />
“Não é o conhecimento, mas o acto<br />
de aprender, não a posse mas o acto<br />
de lá chegar, que proporciona a<br />
satisfação maior”.<br />
Professor e manual <strong>com</strong>plementam-se<br />
para que seja possível aos<br />
estudantes desvendarem tal prazer.<br />
35<br />
a página<br />
da educação<br />
julho 2003<br />
<strong>do</strong>ssier<br />
Ana Maria Brito Jorge<br />
Professora<br />
<strong>do</strong> Ensino Secundário<br />
Autora de manuais<br />
escolares