Trabalhadores - Centro de Documentação e Pesquisa Vergueiro
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que emergem <strong>de</strong> uma leitura das medidas anunciadas e<br />
da avaliação do contexto econômico em que estão sendo<br />
lançadas.<br />
1. Um dos pontos básicos que <strong>de</strong>veria constar <strong>de</strong> uma<br />
política industrial é sinalizar o investimento, sinalizar<br />
quais os setores estratégicos e quais as políticas especí-<br />
ficas para eles. Fala-se dos setores "<strong>de</strong> ponta", com<br />
complexo eletrônico, química fina etc. Mas qual a política<br />
setorial? Como o Estado vai incentivar o <strong>de</strong>senvolvimen-<br />
to dos setores prioritários? Quais são os setores prioritá-<br />
rios?<br />
Essas são questões não abordadas na divulgação das<br />
das medidas. E talvez seja por isso que alguns comenta-<br />
ristas falam que as medidas caracterizam antes uma po-<br />
lítica <strong>de</strong> comércio exterior que uma política industrial.<br />
2. É preciso salientar que o "livre comércio" não existe<br />
em nenhum país do mundo; todos, <strong>de</strong> uma forma ou <strong>de</strong><br />
outra, praticam formas <strong>de</strong> proteção à sua economia, par-<br />
ticularmente à indústria. Se tomarmos como exemplo al-<br />
guns países "mo<strong>de</strong>rnos", veremos cotas restritivas à im-<br />
portação <strong>de</strong> veículos japoneses em quase todos os paí-<br />
ses da Europa Oci<strong>de</strong>ntal, proteção à agricultura Japone-<br />
sa, sobretaxa em muitos produtos importados pelos Es-<br />
tados Unidos. Isto sem contar as políticas históricas <strong>de</strong><br />
proteção <strong>de</strong>senvolvidas por países europeus, pelos Esta-<br />
dos Unidos, pelo Japão, entre outros, que levou a um <strong>de</strong>-<br />
terminado grau <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico e <strong>de</strong><br />
segmentos/setores da indústria.<br />
3. Uma eventual necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> abertura da econo-<br />
mia brasileira à concorrência internacional não leva à<br />
concordância com o discurso dito "neo liberal" <strong>de</strong> abertu-<br />
ra total <strong>de</strong> mercados, o que exclui critérios <strong>de</strong> seterivida<br />
<strong>de</strong> (ou seja, a eleição <strong>de</strong> setores prioritários para serem<br />
estimulados e protegidos por parte <strong>de</strong> uma política indus-<br />
trial). Um exemplo <strong>de</strong> política "neo liberal" foi praticada<br />
por Martinez <strong>de</strong> Hoz na Argentina, durante o governo mi-<br />
litar <strong>de</strong> Jorge Vi<strong>de</strong>la, e que apresentou sérias conse-<br />
qüências <strong>de</strong> <strong>de</strong>smobilização, "quebra" <strong>de</strong> indústrias e for-<br />
te crescimento do <strong>de</strong>semprego. Uma década <strong>de</strong>pois, a<br />
Argentina sente os reflexos <strong>de</strong> tais diretrizes.<br />
4. As diretrizes anunciadas levam à direção <strong>de</strong> uma<br />
abertura generalizada do país às importações <strong>de</strong> produ-<br />
tos, sejam bens primários, intermediários, ou finais. Com<br />
periodicida<strong>de</strong> a <strong>de</strong>finir, <strong>de</strong>lineia-se um processo generali-<br />
zado <strong>de</strong> redução <strong>de</strong> alíquotas <strong>de</strong> importação (o "ad valo-<br />
rem"). Tal fato ten<strong>de</strong> a gerar um aumento da competição<br />
no mercado brasileiro, que teria um nível <strong>de</strong> preços mais<br />
internacionalizado. Isto po<strong>de</strong> levar algumas empresas ra-<br />
dicadas no Brasil a terem problemas <strong>de</strong> sustentação <strong>de</strong><br />
sua ativida<strong>de</strong>, com a conseqüente redução/dispensa <strong>de</strong><br />
pessoal.<br />
É aqui que se percebe uma gran<strong>de</strong> lacuna da política<br />
apresentada: nada se fala sobre políticas compensatórias<br />
para os trabalhadores atingidos, tais como políticas <strong>de</strong><br />
emprego, <strong>de</strong> renda, <strong>de</strong> reciclagem profissional. Isto é in-<br />
consistente com o objetivo alegado <strong>de</strong> "melhorar as con-<br />
dições <strong>de</strong> vida da população brasileira".<br />
5. Outra questão can<strong>de</strong>nte é a questão mais geral do<br />
Economia<br />
crescimento econômico. Uma coisa é praticar uma políti-<br />
ca liberalizante num cenário <strong>de</strong> crescimento econômico,<br />
quando as empresas atingidas pela concorrência interna-<br />
cional po<strong>de</strong>m ter assegurado uma parcela do mercado<br />
durante a fase <strong>de</strong> transição, outra coisa é liberalizar im-<br />
portações num cenário <strong>de</strong> recessão.<br />
6. Alega-se que um dos objetivos das diretrizes anun-<br />
ciadas é "o aumento da eficiência da indústria, via sua<br />
mo<strong>de</strong>rnização e reestruturação", visando a ter,"(...) nos<br />
próximos anos, um constante aumento da produtivida<strong>de</strong><br />
e, portanto, do salário real". Porém, <strong>de</strong>vemos salientar<br />
que ninguém garante, a priori, que os aumentos <strong>de</strong> pro-<br />
dutivida<strong>de</strong> na indústria sejam incorporados aos salários<br />
ou aos preços, através <strong>de</strong> sua redução; a história recente<br />
do <strong>de</strong>senvolvimento brasileiro é a prova mais cabal <strong>de</strong> tal<br />
fato: entre 1981 e 1984 houve um aumento <strong>de</strong> 19,7% na<br />
produtivida<strong>de</strong> da indústria, enquanto o número <strong>de</strong> traba-<br />
lhadores era reduzido em 15,8% e os salários arrocha-<br />
dos . Tais fatos reforçam o exposto no item anterior, da<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> políticas complementares, entre elas a<br />
<strong>de</strong> rendas.<br />
7. A liberação generalizada das importações po<strong>de</strong> tra-<br />
zer problemas <strong>de</strong> reservas cambiais. A questão que se<br />
coloca é como aumentar importações sem mexer na<br />
questão da dívida externa? Geralmente são praticadas<br />
políticas <strong>de</strong> liberação <strong>de</strong> importações quando se tem di-<br />
visas. Lembremo-nos do "plano cruzado" quando, com a<br />
elevação das importações e queda das exportações,<br />
houve uma queda do superávit comercial <strong>de</strong> aproxima-<br />
damente 50% <strong>de</strong> 1986 em relação a 1985, e pressões<br />
posteriores para uma política <strong>de</strong> controle <strong>de</strong> importações<br />
e <strong>de</strong> <strong>de</strong>manda intema.<br />
8. É preciso lembrar que "abrir" o país às importações<br />
não significa necessariamente uma "integração competi-<br />
tiva" da indústria radicada no Brasil ao cenário interna-<br />
cional. Nada garante, em princípio, que a indústria brasi-<br />
leira vá se atualizar (nem a que custo) em termos <strong>de</strong><br />
processo <strong>de</strong> trabalho e inovações tecnológicas: po<strong>de</strong> ser<br />
que parcelas do mercado sejam dominadas por produtos<br />
importados.<br />
Para que tal não aconteça - ou que não aconteça in-<br />
discriminadamente -, é preciso conhecer, na prática,<br />
quais os instrumentos <strong>de</strong> apoio ao <strong>de</strong>senvolvimento tec-<br />
nológico, à política cambial, às práticas comerciais, à le-<br />
gislação anti-truste e contra práticas <strong>de</strong>sleais <strong>de</strong> comér-<br />
cio, o sistema <strong>de</strong> normatização e verificação da qualida-<br />
<strong>de</strong> dos produtos etc.<br />
9. Um aspecto dos mais relevantes para o aumento da<br />
competitivida<strong>de</strong> da indústria e para o investimento em<br />
geral, diz respeito às formas <strong>de</strong> financiamento <strong>de</strong>sse in-<br />
vestimento. Oual o papel do Estado, do sistema financei-<br />
ro privado e do sistema financeiro internacional como fi-<br />
nanciadores? Enfim, qual o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> financiamento?<br />
As diretrizes anunciadas não especificam tal mo<strong>de</strong>lo.<br />
10. Supondo que a indústria aqui radicada reaja inves-<br />
tindo em atualização tecnológica, é <strong>de</strong> se esperar uma<br />
maior difusão <strong>de</strong> inovações tecnológicas, particularmente<br />
relativas à automação e informática, bem como reorgani-