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O Tempo e o Vento - O Continente - Tomo II - OpenDrive

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município, deputado à Assembleia Provincial, verdadeiro varão de Plutarco que perpetua no<br />

tempo e na admiração de seus corvos um nome honrado e uma tradição de virtudes cívicas e<br />

privadas".<br />

O Almanaque circulou em Santa Fé e arredores, onde foi lido, comentado e apreciado. E<br />

através de seus dados estatísticos e de suas informações escrupulosamente colhidos pelo próprio<br />

dr. Nepomuceno - ficaram os santa-fezenses sabendo que a vila possuía agora sessenta e oito<br />

casas, entre as de tábua e de alvenaria, e trinta ranchos cobertos de capim; e que sua população já<br />

subia a seiscentas e trinta almas. Informava ainda o dr. Nepomuceno que Santa Fé contava com<br />

quatro bem sortidas casas de negócio, uma agência do correio - "cuja mala, lamentamos dizê-lo,<br />

chega apenas uma vez por semana" - uma padaria, uma selaria e uma marcenaria. "A ciência de<br />

Hipócrates está representada entre nós pelo ilustrado dr. Cari Winter, natural da Alemanha e<br />

formado em Medicina pela Universidade de Heidelberg e que fixou residência nesta vila em<br />

1851, data em que apresentou suas credenciais à nossa municipalidade. Não podemos deixar<br />

de mencionar o nosso Clotário Nunes, médico homeopata bem conceituado, e o curandeiro<br />

conhecido popularmente por Zé das Pílulas, muito procurado por causa de suas ervas<br />

medicinais cujos segredos diz ele ter aprendido dos índios coroados, dos quais parece ser<br />

descendente.”<br />

Causou também muito boa impressão a parte do almanaque em que o dr. Nepomuceno<br />

rememorava as guerras em que os filhos de Santa Fé haviam tomado parte. "Nossa vila (e aqui<br />

peço vénia para usar o possessivo nossa, uma vez que me considero um santa-fezense de<br />

coração se não de nascimento) tem pago pesado tributo de sangue e heroísmo no altar da<br />

pátria. Muitos foram os oficiais e soldados que deu para as lutas de que esta província tem<br />

sido teatro, e pode-se dizer sem exagero que não houve geração que não tivesse visto pelo<br />

menos uma guerra. Durante a luta civil que por espaço de dez anos ensangüentou o solo<br />

generoso do <strong>Continente</strong>, muitos toram os santa-fezenses que participaram dela, quer nas<br />

hostes farroupilhas quer nas forças legalistas. Não me cabe aqui, como magistrado e como<br />

homem isenso às paixões políticas, manifestar simpatias ou lançar diatribes. O que passou<br />

passou e mais vale esquecido do que lembrado, pois uma luta fratricida é mil vezes mais<br />

horrenda do que as guerras entre as nações. Graças ao Supremo Arquiteto do Universo o sol<br />

da paz raiou benfazejo no horizonte da província, e os inimigos de ontem se deram as mãos e<br />

recomeçaram a trabalhar juntos em prol da grandeza da Pátria comum. Mas, ai!, ainda nem<br />

bem se haviam cicatrizado as feridas abertas pela guerra civil e já de novo eram nossos<br />

irmãos arrancados ao aconchego dos seus lares e ao seu trabalho pacífico, convocados mais<br />

uma vez pelo pressago clarim da guerra. Rosas, o tirano argentino, ameaçava a integridade<br />

de nosso Brasil, e era necessário fazer frente a essa ameaça. E assim mais uma vez os santafezenses<br />

formaram os seus batalhões de voluntários e nessa luta, que nem por ser<br />

relativamente curta foi menos cruenta, muitos foram os filhos desta vila que tiveram atuação<br />

destacada. Entre eles é de justiça salientar o jovem Bolívar Terra Cambará, filho dum<br />

intrépido soldado, o capitão Rodrigo Severo Cambará, morto heroicamente num combate que<br />

se feriu nesta mesma vila em princípios de 1836. Bolívar, esse denodado jovem, cujo nome<br />

parece trazer em si uma destinação gloriosa, guiou os seus cavaleiros numa carga de lança,<br />

destruindo um quadrado inimigo e arrancando, ele próprio, das mãos dum adversário a<br />

bandeira argentina! Esse ato de bravura valeu-lhe a promoção ao posto de primeiro-tenente,<br />

e uma citação especial em ordem do dia.”<br />

As anedotas do Almanaque foram muito apreciadas, bem como as poesias, algumas da lavra<br />

do próprio dr. Nepomuceno, e outras de poetas famosos como Camões, Tomás Antônio<br />

Gonzaga e Gregório de Matos. No "fecho de ouro" dum de seus sonetos, o juiz de direito<br />

concluía com rimas ricas que sob o veludo da rosa às vezes um acúleo se esconde.<br />

Pouco tempo depois do aparecimento do Almanaque, o sonetista teve ocasião de sentir na<br />

própria carne a pungente verdade do verso. Sim - refletiu o magistrado - seu anuário podia ser

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