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Edição 34 - Memorial da América Latina

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Há certamente um fio condutor, afirma,<br />

mas é tarefa difícil encontrá-lo.<br />

O livro começa com a chega<strong>da</strong><br />

dos europeus, e a partir <strong>da</strong>í vai amarrando,<br />

no tempo e no espaço, to<strong>da</strong> sorte de<br />

aspectos culturais, que habilmente transforma<br />

em uma explicação convincente<br />

para esse processo, incluindo aí um dos<br />

períodos mais áridos para os estudos urbanos:<br />

a primeira parte do século XIX<br />

(ver, por exemplo, La ciu<strong>da</strong>d regular, de<br />

Fernando Aliata).<br />

O fio condutor, que alinhava esse<br />

período histórico, e que tem como suporte<br />

a ci<strong>da</strong>de – entendi<strong>da</strong> como uma<br />

socie<strong>da</strong>de urbana e sua criação – começa<br />

com a implantação de uma Europa na<br />

<strong>América</strong>, fazendo tabula rasa do que aqui<br />

existia: um território vazio. Este sistema,<br />

controlado com mão firme desde a metrópole<br />

no caso espanhol, mais frouxo<br />

no caso português, se no início permitiu<br />

a construção de algo que foi passível de<br />

controle, logo sucumbiu à toma<strong>da</strong> de<br />

consciência, por estas ci<strong>da</strong>des, de que já<br />

possuíam uma história, e ao confronto<br />

<strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de com uma construção abstrata<br />

que vinha <strong>da</strong> Europa. Diante <strong>da</strong> ofensiva<br />

mercantilista, nas últimas déca<strong>da</strong>s<br />

do século XVIII, estas ci<strong>da</strong>des sofrem<br />

nova inflexão, onde algumas se mantêm<br />

no esquema tradicional, estancando-se, e<br />

outras se transformam em ativas ci<strong>da</strong>des<br />

mercantis, já decidi<strong>da</strong>mente burguesas e<br />

em busca de independência. A socie<strong>da</strong>de<br />

industrial provoca novo impacto nas últimas<br />

déca<strong>da</strong>s do século XIX, período no<br />

qual passam a se inserir plenamente no<br />

sistema econômico capitalista mundial.<br />

Neste caso, as burguesias que já estavam<br />

constituí<strong>da</strong>s buscam um desenvolvimento<br />

heterônomo, freando o desenvolvimento<br />

autônomo mediante o exercício<br />

de um poder forte. Isto não durou mais<br />

do que alguns decênios, quando diante<br />

de novos atores, mu<strong>da</strong>nças políticas e do<br />

fenômeno <strong>da</strong> metropolização, é deflagrado<br />

um novo ciclo, a ci<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s massas.<br />

16<br />

Parafraseando Argan, esta é uma<br />

história <strong>da</strong> <strong>América</strong> <strong>Latina</strong> como história<br />

de suas ci<strong>da</strong>des. Que é, para Romero,<br />

esse jogo constante de forças, entre desenvolvimento<br />

heterônomo e autônomo,<br />

entre mundo rural e mundo urbano,<br />

entre ideologias e estruturas reais.<br />

Isto nos fornece armas para enfrentar<br />

alguns dos problemas frequentemente<br />

apontados na historiografia,<br />

como, por exemplo, o <strong>da</strong>s histórias<br />

nacionais, que li<strong>da</strong>m com um limite<br />

arbitrário, as fronteiras nacionais, para<br />

explicar fenômenos cuja lógica obriga<br />

a transcendê-las. Isto fica ain<strong>da</strong> mais<br />

evidente ao tratar do território e <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong>des.<br />

Outro problema refere-se à possibili<strong>da</strong>de<br />

de uma explicação conjunta<br />

<strong>da</strong>s colonizações espanhola e portuguesa,<br />

ain<strong>da</strong> um obstáculo a ser transposto.<br />

Esta tensão não está ausente no livro:<br />

o protagonismo <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de se vê surpreendido<br />

por um Brasil onde no período<br />

colonial as ativi<strong>da</strong>des nas ci<strong>da</strong>des eram<br />

quase sempre sazonais e a vi<strong>da</strong> se passava<br />

nos engenhos. Somente já avançado<br />

o século XVIII os universos luso-americano<br />

e hispano-americano se encontram<br />

em um percurso comum. Sérgio Buarque<br />

de Holan<strong>da</strong>, no célebre Raízes do<br />

Brasil, também percorreu a trilha destas<br />

ci<strong>da</strong>des, mas em Romero elas recebem<br />

como incumbência o papel principal, e<br />

a <strong>América</strong> <strong>Latina</strong> é o princípio.<br />

Que estas breves palavras sirvam<br />

de estímulo à leitura de um autor ain<strong>da</strong><br />

pouco conhecido no Brasil. Romero encontrou<br />

um fio. Mas o labirinto ain<strong>da</strong><br />

permanece à nossa espera.<br />

Ricardo Medrano é doutor em Arquitetura e Urbanismo<br />

pela Universi<strong>da</strong>de de São Paulo e professor<br />

<strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de Mackenzie.

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