Edição 34 - Memorial da América Latina
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Inscape (Psychological Morphology).<br />
lá, em Paris, que Matta descobriu sua condição<br />
de pintor. Seu passaporte para entrar<br />
na Vanguardia era um exemplar com<br />
dedicatória de Llanto por Ignacio Sánchez<br />
Mejías, que ele mostrou a Dalí, que por<br />
sua vez serviu para que Breton o recebesse<br />
na Galería Gradiva, onde lhe comprou<br />
dois desenhos e o declarou instantaneamente<br />
surrealista. De forma imediata, em<br />
1938, foi incluído na Exposição Internacional<br />
de Surrealismo e integrado ao grupo<br />
onde travou amizade com Duchamp,<br />
Magritte, Penrose, Tanguy e Miró. Já em<br />
1939, Breton frisou que em Matta assistimos<br />
à necessi<strong>da</strong>de de uma representação<br />
sugestiva do universo quadridimensional.<br />
Seus quadros são descritos como uma<br />
festa “onde são joga<strong>da</strong>s to<strong>da</strong>s as possibili<strong>da</strong>des,<br />
uma pérola que se transforma em<br />
bola de neve à qual se incorporam todos<br />
os fulgores, tanto físicos quanto mentais”.<br />
Marcel Duchamp, um antagonista<br />
<strong>da</strong>quilo que chamava de “retiniano”,<br />
considerava que Matta era o pintor mais<br />
profundo de sua geração; o que lhe interessava<br />
de sua obra era a forma em que<br />
tinha seguido os físicos modernos em<br />
busca de um novo espaço que não devia<br />
ser confundido com uma ilusão tridimensional.<br />
Na ver<strong>da</strong>de, a sua era uma<br />
visão deslumbrante do mundo em que,<br />
como afirmou Damián Bayón, partia <strong>da</strong><br />
rejeição <strong>da</strong> figuração cotidiana. Quando<br />
contemplamos os quadros do denominado<br />
“período cósmico”, encontramos<br />
uma espécie de simbologia hermética do<br />
primeiro dia <strong>da</strong> criação com uma atmosfera<br />
que sugere a catástrofe. A matéria,<br />
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nessas obras sumamente enérgicas, sempre<br />
dá a impressão de ser fluí<strong>da</strong>, instável,<br />
larvária e eruptiva. É como se Matta<br />
compusesse um planeta em gestação.<br />
No entanto, não se trata meramente de<br />
uma desordem expansiva, porque sempre<br />
há uma ordem arquitetônica, compartimentos<br />
e inclusive alusões a máquinas.<br />
Os traços nervosos, quase histéricos,<br />
de Roberto Matta, certamente<br />
estão relacionados à prática surrealista<br />
<strong>da</strong> escrita automática. Contudo, suas<br />
“morfologias psicológicas” escapam<br />
<strong>da</strong> “ortodoxia” <strong>da</strong> pintura visionária<br />
<strong>da</strong> época. Michaux falará de um universo<br />
constituído por on<strong>da</strong>s, que se<br />
contrapõe a um universo sólido. Este<br />
é um modelo dinâmico cujo infinito<br />
não é um ponto-centro ou um zênite<br />
detido, mas um infinito em movimento,<br />
atravessando sem fim o finito.<br />
Vemos mutações, estados em tensão,<br />
desespero, angústia ou desejo. William<br />
Rubin destaca que os símbolos poéticos<br />
de Matta faziam parte de um sistema<br />
de formas novo e muito pessoal,<br />
“que parecia in<strong>da</strong>gar mais profun<strong>da</strong>mente<br />
que o imaginário surrealista nos<br />
subterrâneos do inconsciente e chegar<br />
mais longe às fontes <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> psíquica.<br />
Daí a possibili<strong>da</strong>de de considerá-las<br />
uma iconografia <strong>da</strong> consciência humana,<br />
como teria podido existir antes de<br />
conceber-se e encarnar-se nessas formas<br />
e componentes reconhecíveis de<br />
nossa experiência cotidiana”. Se, por<br />
um lado, nunca deixa de manifestar<br />
uma espécie de simbolismo sexual cifrado<br />
ou, em outros termos, um erotismo<br />
sublimado, sua estética também<br />
poderia ser entendi<strong>da</strong> como uma espécie<br />
de prefiguração <strong>da</strong> ficção científica.<br />
Octavio Paz acertou na mosca<br />
quando disse que a pintura de Matta tem<br />
um pé na arquitetura e o outro no sonho.<br />
É evidente que Roberto Matta<br />
desenhava impressionantemente<br />
bem e que isso está presente em to-<br />
Obras: reprOduçãO