Edição 34 - Memorial da América Latina
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A monocultura do arroz<br />
tornou-se ameaça<br />
constante à proteção dos<br />
povos indígenas do<br />
Estado de Roraima.<br />
RSS foram feitas instalações de infraestrutura,<br />
como a construção de estra<strong>da</strong>s<br />
e a instalação de equipamentos<br />
públicos (como, por exemplo, linhas<br />
de transmissão de energia). A demarcação<br />
enfrentou, ain<strong>da</strong>, impasses de<br />
natureza federativa, em razão <strong>da</strong> criação<br />
de municípios dentro <strong>da</strong> área identifica<strong>da</strong><br />
(nota<strong>da</strong>mente os Municípios<br />
de Normandia em 1982 e de Uiramutã<br />
e Pacaraima em 1995) e <strong>da</strong>s crescentes<br />
pressões exerci<strong>da</strong>s pelos poderes locais<br />
e regionais em face <strong>da</strong> União.<br />
Somaram-se a essas questões a<br />
disputa pela terra. De modo geral, a<br />
pecuária, o garimpo e agricultura –<br />
nota<strong>da</strong>mente a monocultura de arroz<br />
– tornaram-se ameaças constantes à<br />
proteção dos povos indígenas que habitam<br />
essa região do Estado de Roraima.<br />
Em estudo realizado pelo Instituto<br />
Nacional de Pesquisas <strong>da</strong> Amazônia<br />
para monitorar a presença de monoculturas<br />
na área, sua evolução no tempo<br />
e impactos ambientais, identificou-se<br />
a presença de extensas áreas de monocultura<br />
de arroz dentro dos limites<br />
<strong>da</strong> TI RSS. Com base em imagens de<br />
satélites realiza<strong>da</strong>s nos anos de 1992,<br />
1997, 1998, 2001 e 2005, verificou-se<br />
que tais plantações correspondiam a<br />
ocupações de má-fé, tendo em vista<br />
que cresceram em período posterior<br />
ao <strong>da</strong> definição, pelo poder executivo<br />
federal, dos limites <strong>da</strong>quela terra indígena.<br />
Isso explica porque o processo<br />
de demarcação <strong>da</strong> TI RSS culminou<br />
em um cenário de intolerância e violência:<br />
protestos de rizicultores e nãoíndios<br />
contrários à demarcação, invasões<br />
a sedes locais de órgãos federais,<br />
bloqueios de rodovias e outras vias<br />
públicas e, até mesmo, agressões entre<br />
os grupos envolvidos no conflito.<br />
No plano jurídico, a demarcação<br />
<strong>da</strong> TI RSS, nos moldes definidos pela<br />
União, foi contesta<strong>da</strong>, direta e indiretamente,<br />
em inúmeras ações judiciais<br />
40<br />
no âmbito <strong>da</strong> justiça estadual, <strong>da</strong> justiça<br />
federal e dos tribunais superiores.<br />
Em 2005, a questão chegou ao STF<br />
por meio de ação popular em que se<br />
contestava, essencialmente, o modelo<br />
contínuo de demarcação <strong>da</strong> terra<br />
indígena e pedia-se a nuli<strong>da</strong>de dos<br />
atos do executivo que determinaram<br />
os seus limites. Em março de 2009, o<br />
STF decidiu pela constitucionali<strong>da</strong>de<br />
do processo demarcatório, não sem<br />
estabelecer certas condições – mais<br />
especificamente 18 condições – à ocupação<br />
<strong>da</strong>s terras pelos índios.<br />
Os Ministros declararam a vali<strong>da</strong>de<br />
<strong>da</strong> demarcação contínua e a necessi<strong>da</strong>de<br />
de desocupação <strong>da</strong> TI RSS por parte dos<br />
não-índios que se encontravam na região,<br />
consagrando o entendimento de que as<br />
terras cuja posse é atribuí<strong>da</strong> aos índios<br />
pela Constituição Federal não se limitam<br />
ao espaço <strong>da</strong>s aldeias, mas compreendem<br />
to<strong>da</strong> a área necessária à reprodução física<br />
e cultural <strong>da</strong>s comuni<strong>da</strong>des indígenas, não<br />
devendo ser reduzi<strong>da</strong> em função <strong>da</strong> presença<br />
de ocupações de não-indígenas.<br />
Quanto a um dos pontos mais polêmicos<br />
do caso – o suposto risco à soberania<br />
nacional – o STF decidiu não<br />
se opor à inclusão de faixa de fronteira<br />
na área <strong>da</strong> TI RSS, considerando não<br />
haver impedimento à atuação do poder<br />
público na região para a defesa do<br />
território brasileiro, mediante intervenção<br />
<strong>da</strong>s Forças Arma<strong>da</strong>s ou <strong>da</strong> Polícia<br />
Federal. Entendeu-se que o país dispõe<br />
de normas capazes de autorizar a<br />
proteção do nosso território, sem que<br />
a terra indígena represente um empecilho.<br />
Afastou-se, no entanto, a necessi<strong>da</strong>de<br />
de consulta, nessas situações,<br />
às comuni<strong>da</strong>des indígenas envolvi<strong>da</strong>s<br />
e à Funai, o que representa riscos de<br />
abusos, justificados pelo histórico de<br />
violências cometi<strong>da</strong>s por autori<strong>da</strong>des<br />
arma<strong>da</strong>s em terras de índios.<br />
É relevante mencionar que a decisão<br />
assegurou a participação dos entes<br />
FOTO: reprOduçãO