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Eros e Psique - Fluid Creative

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o edifício ergue-se na Rua de Alcolena, situada no<br />

Bairro do Restelo (Encosta da Ajuda) – «desenhado<br />

por Faria da Costa entre 1938 e 1940, no espírito<br />

da cidade-jardim howardiana»⁵. Devido à sua<br />

localização, o imóvel encontra-se abrangido pela Zona<br />

Especial de Protecção de vários edifícios classificados,<br />

sobressaindo de entre eles a Capela de São Jerónimo,<br />

que se avizinha no ângulo Nascente.<br />

Há muito desabitada e actualmente em processo de<br />

classificação como imóvel de interesse municipal⁶, a<br />

vivenda sofreu vários desmantelamentos na sequência<br />

das arrematações por diversos proprietários e, nesta<br />

dispersão do espólio artístico, perdeu numerosas<br />

obras, tais como uma tapeçaria de parede concebida<br />

por Sara Afonso, uma pintura a óleo sobre tela de<br />

Almada Negreiros e outra de Eduardo Viana, alguns<br />

painéis de azulejos⁷ e o vitral, também de Almada<br />

Negreiros – possivelmente executado na laboriosa<br />

Oficina de Vitrais e Mosaicos de Ricardo Leone,<br />

sediada em Lisboa e responsável pela produção de<br />

numerosos exemplares desta arte renascida durante<br />

o Estado Novo⁸, tendo por diversas vezes contado<br />

com a colaboração de Almada, enquanto desenhador<br />

de cartões⁹.<br />

⁵ «Referência às ideias de Ebenezer Howard para o movimento das<br />

Cidades-Jardins na Inglaterra, uma tentativa de criar uma entidade que<br />

incluísse cidade e campo.» TOUSSAINT, 2009.<br />

⁶ Vide as Propostas P096.09 (17-02-2009) e P097.09 (24-02-2009)<br />

assinadas pelas Vereadoras do Movimento Cidadãos Por Lisboa, Arq.ª<br />

Helena Roseta e Dr.ª Manuela Júdice, apresentadas na Câmara Municipal<br />

de Lisboa, com vista à classificação do imóvel como Património Municipal<br />

e posterior transformação em Casa-Museu do Modernismo lisboeta.<br />

10 <strong>Eros</strong> e <strong>Psique</strong> Um vitral gnóstico de Almada Negreiros 11<br />

Vide também a Petição on line intitulada «É preciso salvar a Casa da Rua<br />

de Alcolena, da autoria do arquitecto António Varela, com murais de<br />

azulejo da autoria do pintor Almada Negreiros», promovida pela Ordem<br />

dos Arquitectos (05-03-2009).<br />

⁷ A remoção da totalidade dos azulejos havia sido prevista pelo antigo<br />

proprietário Carlos Lopes, mas acabou por ser interrompida em Fevereiro<br />

de 2009 por embargo camarário, pois para além de estar inserido na<br />

zona de protecção de dois monumentos classificados, o imóvel consta do<br />

Inventário Municipal de Património desde 1992, situações que inviabilizam<br />

qualquer intervenção de vulto, como a demolição ou a alteração formal<br />

e decorativa das fachadas. Todavia, para além daquela operação de<br />

destacamento, em Janeiro de 2009 os posteriores proprietários do imóvel,<br />

filhos do empreiteiro Vítor Santos, entregaram na Câmara Municipal de<br />

Lisboa um pedido de demolição integral da moradia e de reconstrução ex<br />

nouo, de acordo com um projecto do Arq. João Massapina. Vide Público,<br />

6-03-2009, p. 22.<br />

⁸ Sobre a actividade desta fábrica, vide ABREU, REDOL e CAETANO, 2000<br />

(sobretudo os artigos de Rui Afonso SANTOS - «Apontamentos para a<br />

História do Vitral no Século XX, p. 68-85 – e Dulce Freitas FERRAZ - «A<br />

Oficina de Ricardo Leone», p. 86-93) e VIEIRA, 2004 (sobretudo p. 61-<br />

69, 142-177 e 211). Nenhuma destas obras refere, no entanto, o vitral<br />

em estudo. Acerca da reabilitação do vitral no período do Estado Novo<br />

e das suas utilizações, «em 1927, a revista Arquitectura [sublinhava] o<br />

“magnifico partido” e o efeito “surpreendente” que se poderia tirar da<br />

aplicação do vitral a fachadas exteriores e, sobretudo, à decoração de<br />

salas, vestíbulos e escadas principais, ou ainda dos jardins de Inverno em<br />

“moradias ou palácios”.» VIEIRA, 2004, p. 74.<br />

⁹ Dos vários cartões para vitrais produzidos por Almada Negreiros para<br />

esta fábrica destacamos os destinados aos conjuntos da Igreja de Nossa<br />

Senhora de Fátima (1935) e da Fábrica de Fogões Portugal (1945). «Para<br />

a reabilitação (…) [do vitral] desejou Almada Negreiros contribuir não<br />

só na qualidade [de] pintor, mas também de conferencista, como bem<br />

mostraram as considerações que teceu sobre a sua finalidade e essência<br />

no discurso Elogio da ingenuidade ou as desavenças da esperteza<br />

saloia, proferido na Exposição de Artistas Modernos Independentes de<br />

1936. Ai declarava que “esta arte conhecida por vitral, e que é uma arte<br />

independente da pintura como de qualquer outra expressão de arte,<br />

tem por função aproveitar a diferença de luz da atmosfera livre para um<br />

recinto fechado na intenção de ajudar a concentrar-se cada um colectiva<br />

e individualmente.”» VIEIRA, 2004, p. 82 e 83 (com citação de ALMADA<br />

NEGREIROS, «Elogio da ingenuidade ou as desavenças da esperteza<br />

saloia», in Revista de Portugal, n.º 6, 1939, p. 164-174).<br />

Prefácio<br />

O vitral <strong>Eros</strong> e <strong>Psique</strong> passou a integrar as colecções<br />

da Assembleia da República em 2001, ainda<br />

identificado como uma representação da Queda de<br />

Ícaro. Identificação com a qual fora levado à praça<br />

em leilão em Dezembro do ano anterior, juntamente<br />

com uma tapeçaria da Manufactura de Portalegre, da<br />

autoria de Sara Afonso¹⁰, tal como o vitral, exemplar<br />

único concebido para a mesma residência privada por<br />

encomenda directa dos seus proprietários.<br />

A Assembleia da República perseguia então o propósito<br />

de adquirir obras de autores contemporâneos,<br />

diversificando e enriquecendo um património que<br />

raras aquisições tivera desde os anos 40 do séc. XX e<br />

que permanecia imbuído em grande parte pela estética<br />

oficial do Estado Novo, dominante nas áreas nobres e<br />

públicas do Palácio de São Bento, com excepção da ala<br />

da antiga Câmara dos Pares. As obras adquiridas ao<br />

longo de curto período de maior desafogo orçamental,<br />

no final dos anos 90, destinavam-se a decorar os<br />

amplos corredores e gabinetes do andar nobre<br />

após se ter verificado a impossibilidade de recurso<br />

às reservas dos museus nacionais em quantidade<br />

necessária. Não constituem uma colecção no sentido<br />

estrito do termo, já que não foram definidos critérios<br />

orientadores para uma programação aquisitiva e<br />

foram sendo integradas aleatoriamente, segundo os<br />

locais a que se destinavam ou, por vezes, as escolhas<br />

dos órgãos de administração.<br />

¹⁰ AA.VV., 2000, p. 40 e 139 – respectivamente n.ºs 547 e 681.<br />

Esta política aquisitiva teve início em 1998, por<br />

proposta do Museu, com a aquisição da tapeçaria<br />

Labirinto de Vieira da Silva, a que se seguiram em breve<br />

as tapeçarias Colheita e Anjinhos de Menez. Outras<br />

tapeçarias e inúmeras pinturas foram sendo adquiridas<br />

nos anos subsequentes, de entre as quais destacamos<br />

obras de Júlio, Cruzeiro Seixas, Graça Morais, Júlio<br />

Resende, Guilherme Parente, José de Guimarães,<br />

Carlos Botelho, Rogério Ribeiro, Malangantana; entre<br />

os mais jovens, Bruno Pacheco e Rui Vasconcelos são<br />

outros autores actualmente representados no acervo<br />

de Assembleia da República.<br />

Após ter tido conhecimento de que não fora<br />

concretizada a venda, em leilão, do vitral de Almada<br />

Negreiros e da tapeçaria de Sara Afonso, propus<br />

superiormente a respectiva aquisição às herdeiras<br />

dos encomendantes, de que sabia apenas terem sido<br />

amigos do casal de artistas. Considerei tratar-se de<br />

uma oportunidade única para adquirir uma obra de<br />

um dos mais importantes pintores portugueses do<br />

séc. XX, cuja cotação no mercado limita fortemente<br />

a possibilidade de integração em colecções de<br />

instituições públicas. A proposta contemplava<br />

igualmente a aquisição da tapeçaria de Sara Afonso,<br />

realizada na Manufactura de Portalegre, cujo tema<br />

central é uma sereia presa em rede de pesca.

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