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Conclusão<br />
O vitral <strong>Eros</strong> e <strong>Psique</strong> – único que Almada Negreiros<br />
produziu para uma residência privada – versa sobre<br />
um tema que desde a Antiguidade constitui uma<br />
alegoria ao Conhecimento, particularmente apreciada<br />
e explorada nos meios intelectuais. Através de uma<br />
representação imagética ambígua e polissémica<br />
das figuras dos dois amantes, a obra reflecte uma<br />
interpretação filosófica hermética do mito de Apuleio<br />
e funciona como metáfora do Amor Gnóstico Unitário,<br />
promovendo duas leituras que embora pareçam<br />
diferentes são, de facto, complementares e, em<br />
termos finais, equivalentes, pois confluem na mesma<br />
conclusão de que o dualismo inicial das personagens<br />
– baseado na oposição dos géneros masculino e<br />
feminino, das condições divina e humana, imortal<br />
e mortal, iniciador e iniciada – se unifica tanto na<br />
lenda como na concepção gnóstica do Mundo.<br />
Efectivamente, através da iniciação nos Mistérios<br />
gnósticos e do poder incondicional do Amor, <strong>Psique</strong><br />
ascende ao conhecimento e à imortalidade pela mão<br />
de <strong>Eros</strong>, passando a equiparar-se a esta divindade. A<br />
solução visual do Amor gnóstico é, pois, confluente<br />
com a do postulado hermético das correspondências,<br />
pelo que a simbólica conjunctio dos esposos míticos<br />
se subentende na aparência andrógina de ambos.<br />
44 <strong>Eros</strong> e <strong>Psique</strong> Um vitral gnóstico de Almada Negreiros 45<br />
A coerência absoluta que se verifica entre os sentidos<br />
do vitral, a função e a decoração do espaço em que<br />
se integra (uma biblioteca com paredes negras<br />
animadas por pentagramas brancos), os sentidos das<br />
restantes expressões plásticas agregadas à moradia,<br />
e os sentidos da organização espacial desta, confere<br />
ao conjunto habitacional uma dimensão de unidade<br />
absoluta que ultrapassa a conhecida associação<br />
entre a arquitectura e a sua ornamentação na época<br />
do Modernismo. A concentração e a exposição de<br />
tais sentidos nas duas fachadas de fruição pública<br />
do edifício revelam uma intenção de “publicitar” a<br />
filosofia de quem o habita.<br />
Relacionado com a fina-flor da cultura modernista e<br />
conhecedor de teorias filosóficas herméticas, José<br />
Manuel Ferrão contribuiu fortemente para a unidade<br />
simbólica da moradia na Rua de Alcolena que no<br />
seu todo orgânico constitui uma «interpretação<br />
objectivada duma impressão subjectiva»⁹⁸, deixando,<br />
deste modo, a sua marca indelével nas obras de<br />
Almada Negreiros e de António Varela.<br />
⁹⁸ PESSOA, 1966, p. 177. A frase completa, da qual citamos a derradeira<br />
parte, é: «A obra de arte, fundamentalmente, consiste numa interpretação<br />
objectivada duma impressão subjectiva.» Fernando Pessoa desenvolve<br />
esta ideia e explica que «Na arte temos a distinguir três partes. A arte<br />
envolve uma impressão, ou ideia, sobre a qual se trabalha; envolve uma<br />
interpretação dessa ideia ou impressão de modo a torná-la artística; e<br />
envolve, finalmente, uma coisa de que se tem essa impressão ou ideia.»<br />
Agradecimentos<br />
À Sr.ª D.ª Cecília Guitart Ferrão e à Dr.ª Madalena<br />
Guitart Ferrão, respectivamente viúva e filha de José<br />
Manuel Ferrão, pela partilha de vivências e empatia.<br />
À Dr.ª Maria Augusta Barbosa, amiga da família Ferrão,<br />
pela disponibilidade e preciosas informações.<br />
Ao Arq. José de Almada Negreiros e às Arq.as Rita e<br />
Catarina Almada Negreiros, respectivamente filho e<br />
netas do artista plástico, pela amizade, pelo apoio,<br />
pelo incentivo e pela autorização de reprodução de<br />
imagens.<br />
À Dr.ª Maria do Céu Pimentel e à Dr.ª Joana Morais<br />
Varela, respectivamente sobrinha e sobrinha neta<br />
de António Varela, pelo acesso ao arquivo familiar<br />
do arquitecto e pela autorização de reprodução de<br />
imagens.<br />
Ao Dr. Fernando Guimarães, pelas informações sobre<br />
a sua colaboração com José Manuel Ferrão na revista<br />
<strong>Eros</strong>.<br />
À D.ª Maria Almeida, antiga funcionária do anterior<br />
proprietário da residência, pela visita ao interior da<br />
casa.<br />
Ao fotógrafo Paulo Cintra, aos Arq.os Leonor Cintra<br />
e Michel Toussaint, pelo convite à realização de uma<br />
palestra sobre a moradia na Ordem dos Arquitectos.<br />
À Arq.ª Helena Roseta, ao Dr. Paulo Ferrero e à Dr.ª<br />
Luísa Jacobetty, pelo incondicional empenho na<br />
classificação da moradia.<br />
Ao fotógrafo Carlos Pombo, pela amizade e apoio na<br />
causa.<br />
Ao Doutor José Manuel Anes e à Doutora Yvette<br />
Centeno, pelos ensinamentos e pelo incentivo na<br />
republicação deste estudo.<br />
À Dr.ª Sara Afonso Ferreira e ao Dr. Luís Manuel<br />
Gaspar, pela amizade e pela generosidade com que<br />
partilharam o seu profundo conhecimento sobre o<br />
espólio de Almada Negreiros. À Dr.ª Sara também<br />
pelo apoio na pesquisa iconográfica, e ao Dr. Luís<br />
igualmente pelo empenho na revisão de texto.<br />
Ao Dr. José Mateus, da Biblioteca Geral da Universidade<br />
de Coimbra, pelo acesso ao poema «<strong>Eros</strong>», de José<br />
Manuel.<br />
À Dr.ª Rita Lougares, do Museu Colecção Berardo,<br />
pela cedência de imagens de dois estudos de Almada<br />
Negreiros.<br />
À Sr.ª D.ª Maria Amélia Santos Almeida e à Sr.ª D.ª<br />
Maria José Almeida, da galeria Antiks Design, pela<br />
cedência de imagens de dois estudos de Almada<br />
Negreiros.<br />
Ao Dr. Alfredo Caldeira, da Fundação Mário Soares,<br />
pela cedência da imagem de um desenho de Almada<br />
Negreiros, da Colecção Alberto de Lacerda.<br />
À Dr.ª Teresa Parra da Silva, pela oportunidade de<br />
estudo.<br />
À Prof. Doutora Raquel Henriques da Silva pelo<br />
impulso da nova publicação.<br />
Ao Dr. Rui Costa e à Dr.ª Teresa Xardoné, pela<br />
concretização da nova publicação.<br />
À Dr.ª Sandra Neves da Silva, pelas dissertações sobre<br />
filosofia hermética.<br />
Ao Carlos Martins, pela companhia e pela inesgotável<br />
paciência.<br />
Aos meus Pais, pela serenidade e pela lucidez.