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Locke-Segundo tratado sobre o governo

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<strong>Segundo</strong> Tratado Sobre o Governo Civil 15<br />

assim reafirmando, nos termos de nossas próprias circunstâncias, a atitude defendida no século XVII pelos Whigs,<br />

de quem herdamos uma imortal tradição política. Para os filósofos absolutistas do século XIX, que se inspiraram<br />

em Hegel, a defesa da revolução feita por <strong>Locke</strong> parecia revoltante, pois eles não queriam ouvir falar de qualquer<br />

questionamento da autoridade majestática do estado. Mas, pelo menos neste aspecto, não cabe à nossa geração<br />

criticar <strong>Locke</strong>.<br />

Um dos primeiros a aplicar os ensinamentos de <strong>Locke</strong> foi William Molyneux 66, que argumentava que as<br />

relações da Inglaterra com a Irlanda no passado não constituíam uma conquista, e que mesmo que o fossem, a<br />

conquista não conferiria à Inglaterra os direitos que reclamava <strong>sobre</strong> a Irlanda. Molyneux correspondeu-se com<br />

<strong>Locke</strong> <strong>sobre</strong> este assunto e desenvolveu sua causa em linhas extraídas diretamente do <strong>Segundo</strong> <strong>tratado</strong>. É<br />

desnecessário dizer que seu apelo caiu em ouvidos surdos, ainda que, como mais tarde observou Dean Tucker 67,<br />

ele se destinasse ao benefício, não da maioria católica romana irlandesa, mas apenas da minoria protestante. Na<br />

Inglaterra, no entanto, a aceitação geral da atitude de <strong>Locke</strong> em relação ao <strong>governo</strong> logo se tornou perceptível. Em<br />

alguns lugares ele foi criticado durante algum tempo, tanto por seus Tratados <strong>sobre</strong> o <strong>governo</strong> quanto por suas<br />

Cartas <strong>sobre</strong> a tolerância, como republicano e incrédulo 68; mas depois da bem sucedida Revolução os dois<br />

extremos na política, republicanos e ultramonarquistas, tenderam a se extinguir. Os Whigs continuaram a insistir<br />

no consentimento do povo como a base necessária do <strong>governo</strong>, e a impugnação do Dr. Sacheverell deu-lhes uma<br />

oportunidade de reafirmar e enfatizar seus pontos de vista. Por outro lado, o Act of Settlement, aprovado por uma<br />

maioria de Tories em 1701, mostrou que eles também estavam desejando limitar a autoridade real e estabelecer<br />

condições para a sucessão ao trono. É verdade que os Tories ainda estavam longe de aceitar a idéia da tolerância,<br />

como se pode ver por seu Ato de Concordância Ocasional e Ato do Cisma; mas embora em muitos pontos os<br />

interesses e as políticas dos Whigs e dos Tories divergissem, na questão constitucional concordavam agora<br />

substancialmente 69.<br />

Uma rápida vista das publicações de Bolingbroke, por exemplo, já mostrará a extensão de seu débito a <strong>Locke</strong>.<br />

Como este, ele cita Hooker aprovadoramente e fala dos parlamentos como instituídos para serem “os verdadeiros<br />

guardiães da liberdade”, em concordância com “aquela grande e nobre confiança que o organismo coletivo do<br />

povo da Grã-Bretanha deposita no representante” 70. Ele também limita a soberania do parlamento, pois há algo<br />

que ele acha que um parlamento não pode fazer: não pode “anular a constituição”. “A legislatura é um poder<br />

supremo, e pode ser chamado, em um certo sentido, um poder absoluto, mas em nenhum sentido um poder<br />

arbitrário. É limitada ao bem público da sociedade”, e em último recurso, em caso de abuso, o povo tem o direito<br />

de resistir ao poder supremo 71.<br />

O Bispo Hoadly, de fama bangoriana, admitia que como a origem patriarcal da monarquia foi “examinada<br />

há muito tempo atrás pelo Autor dos dois <strong>tratado</strong>s <strong>sobre</strong> o <strong>governo</strong>..., a Ele eu devo por Justiça remeter o Leitor”.<br />

Este foi seu único reconhecimento da obra de <strong>Locke</strong>, mas todo o seu argumento, embora pretendesse remontar a<br />

Hooker, na verdade não era mais que uma reafirmação da posição de <strong>Locke</strong> 72. A referência um tanto rancorosa de<br />

Hoadly a <strong>Locke</strong>, embora ele fosse um Whig, pode ser uma indicação de que o nome de <strong>Locke</strong> ainda era mal visto<br />

nos círculos clericais no início do século XVIII; mas o Bispo Warburton, escrevendo quando os hanoverianos já<br />

reinavam seguramente há vinte anos, não hesitou em adotar abertamente os princípios de <strong>Locke</strong> 73,a ele se<br />

referindo como “a honra dessa época e o instrutor do futuro”. O Espectador aludia a <strong>Locke</strong> como “uma glória<br />

nacional”, e embora ele provavelmente fosse mais conhecido e respeitado como o autor do Ensaio <strong>sobre</strong> o<br />

entendimento humano, não pode haver dúvida de que no século XVIII também sua teoria política se tornou tão<br />

geralmente aceita quanto virtualmente incontestada. Suas doutrinas podem ser registradas nas Characteristics<br />

66<br />

Em The Case of Ireland’s being bound by Acts of Parliament in England stated, Du blin, 1698.<br />

67<br />

. Josiah Tucker (Decano de Gloucester), A Treatise concerning Civil Government, 1781, p. 96s.<br />

68<br />

Cf. alguns exemplos de opinião acadêmica em Oxford citados por Ch. Bastide, John <strong>Locke</strong>, ses théories politiques et leur influence en Angleterre, Paris, 1906, p. 283s.<br />

69 Ver a interessante comparação entre os pontos de vista dos Whigs e dos Tories após a Revolução em H. Hallam, Constitutional History of England, c. xvi.<br />

70 Bolingbroke, Dissertation on Parties, 1733-34, Carta x.<br />

71 Ibid., Carta xvii. Bolingbroke também seguiu <strong>Locke</strong> em sua Idea of a Patriot King, 1738, onde rejeitou o direito divino como absurdo e declarou que os reis devem<br />

governar para o bem do povo.<br />

72 B. Hoadly, The Original and Institution of Civil Government discussed, 1710, in Works, ed. J. Hoadly, 1773, ii. 182s.<br />

73 W. Warburton, The Alliance between Church and State (1736), e The Divine Legation of Moses Demonstrated (1738).

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