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| CLUBE DO LIVRO LIBERAL<br />
do rei não o justifica. Como a autoridade do rei lhe é outorgada pela lei, ele não pode conferir a ninguém o poder<br />
de agir contra a lei ou justificar seu ato por seu comissionamento. O comissionamento ou a ordem de qualquer<br />
magistrado onde ele não tem autoridade são tão nulos e insignificantes quanto aqueles de um homem qualquer. A<br />
diferença entre um e outro é que o magistrado tem alguma autoridade dentro de limites e fins determinados,<br />
enquanto o homem comum não tem nenhuma. Não é o comissionamento, mas a autoridade, que dá o direito de<br />
agir, e contra as leis não pode haver autoridade; mas apesar de tal resistência, a pessoa e a autoridade do rei ainda<br />
estão ambas asseguradas, e assim não há riscos nem para o governante nem para o <strong>governo</strong>.<br />
207. Terceiro: Supondo-se um <strong>governo</strong> em que a pessoa do magistrado supremo não é sagrada, esta<br />
doutrina que autoriza a resistência cada vez que ele exerce ilegalmente seu poder tem por efeito criar situações<br />
inúteis que o exporiam a riscos ou colocariam o <strong>governo</strong> em má situação. Quando a parte prejudicada pode ser<br />
aliviada e seus danos reparados pelo apelo à lei, não pode haver pretexto para a força, que só deve ser utilizada<br />
quando um homem é interceptado em seu apelo à lei. Nada justifica a força hostil, exceto quando é negado a<br />
alguém o recurso legal. Apenas esta força coloca quem a usa em estado de guerra e torna legal a resistência a ele.<br />
Um homem com uma espada em suas mãos exige minha carteira na estrada, quando talvez eu não possua nem<br />
doze cêntimos em meu bolso; legalmente, eu posso matar este homem. A outro eu entreguei cem libras para<br />
guardar apenas enquanto eu desmonto, e ele se recusa a me devolver o dinheiro quando eu torno a montar, e tira<br />
a sua espada para defender a posse pela força: tento retomá-lo. Este homem me causa um prejuízo cem vezes,<br />
talvez mil vezes maior que o outro talvez tencionasse me fazer (a quem eu matei antes que realmente me tivesse<br />
feito alguma coisa); entretanto, eu podia legalmente matar o primeiro, enquanto legalmente eu não podia nem<br />
sequer ferir o segundo. A razão é clara. O primeiro utilizou a força e minha vida ficou ameaçada; eu podia não ter<br />
tempo de utilizar as vias legais para protegê-la; e se viesse a perdê-la, seria muito tarde para qualquer recurso. A<br />
lei não poderia ressuscitar minha carcaça sem vida. A perda seria irreparável, e para evitá-la a lei da natureza me<br />
dá o direito de destruir o indivíduo que<br />
se colocou em estado de guerra contra mim e ameaçou minha destruição. Mas no outro caso, minha vida não<br />
estando em perigo, eu posso ter o benefício de apelar para a lei e ter dessa forma a reparação para minhas cem<br />
libras.<br />
208. Quarto: Se os atos ilegais cometidos pelo magistrado foram confirmados (pelo poder que ele detém),<br />
e se o mesmo poder obstrui a reparação que a lei obriga, o direito de resistir não perturbará o <strong>governo</strong> de<br />
maneira intempestiva, nem sem razão grave, mesmo diante de atos de tirania assim manifestos. Se<br />
a questão não interessa senão a alguns particulares, ainda que eles tenham o direito de se defender e de recuperar<br />
pela força aquilo que lhes foi tomado ilegalmente pela força, o direito de agir dessa forma não corre o risco de<br />
facilmente engajá-los em um conflito em que certamente eles perecerão; sendo impossível para um ou poucos<br />
homens oprimidos perturbarem o <strong>governo</strong> se o conjunto do povo não se encontra interessado, assim como um<br />
louco furioso ou um descontente exaltado derrubarem um estado firmemente estabelecido, pois o povo também<br />
está pouco inclinado a seguir um ou outro.<br />
209. Mas se estes atos ilegais estendem seus efeitos à maioria do povo; ou se a má ação e a opressão só<br />
atingem uma minoria, mas em condições tais que todo mundo parece ameaçado pelo precedente assim criado e<br />
por suas conseqüências, e se todos estão convencidos em suas consciências, que suas leis estão em perigo, e com<br />
elas seus bens, liberdades e vidas, e talvez até sua religião, eu não sei como eles poderiam ser impedidos de<br />
resistir à força ilegal usada contra eles. Admito que esta é uma inconveniência que espera todos o <strong>governo</strong>s, sejam<br />
quais forem, quando os governantes deixam as coisas chegarem a um ponto em que a grande massa de seu povo<br />
os trata como suspeitos; é a situação mais perigosa em que eles podem se colocar, e eles são os que merecem<br />
menos piedade, pois isso é muito fácil de ser evitado. É impossível para um governante, se ele realmente pretende<br />
o bem do seu povo e ao mesmo tempo sua preservação e a de suas leis, não conseguir que eles enxerguem e<br />
sintam isso, como para um pai de família não deixar seus filhos perceberem que ele os ama e cuida deles.<br />
210. Mas se todo mundo constata que se pretende agir de uma maneira e se age na verdade de outra; se<br />
são usados ar tifícios para escapar da lei e se utiliza a confiança da prerrogativa (que é um poder arbitrário em