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Locke-Segundo tratado sobre o governo

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<strong>Segundo</strong> Tratado Sobre o Governo Civil 89<br />

todas as pessoas que a eles se juntarem, não representam diante da grandeza divina senão uma gota do oceano ou<br />

um grão de poeira na balança – absolutamente nada!<br />

196. O resumo da questão referente à conquista é o seguinte: o conquistador, se tiver uma causa justa,<br />

tem um direito despótico <strong>sobre</strong> as pessoas de todos aqueles que realmente ajudaram e concorreram na guerra<br />

contra ele, e um direito de recuperar seu prejuízo e sua despesa à custa do trabalho e dos bens dos vencidos,<br />

contanto que com isso não prejudique terceiros. Sobre o restante do povo, se há alguns que não concordaram com<br />

a guerra, e <strong>sobre</strong> os filhos dos próprios prisioneiros ou as posses de ambos, ele não tem poder algum; e assim, não<br />

pode retirar da conquista nenhum título legítimo para exercer <strong>sobre</strong> eles sua dominação, nem para transmitir<br />

algum à sua posteridade; mas se é um agressor, e se coloca em um estado de guerra contra eles, nem ele nem seus<br />

sucessores têm qualquer direito de principado maior que Hingar ou Hubba, os dinamarqueses, tiveram aqui na<br />

Inglaterra, ou Spartacus teria se tivesse conquistado a Itália; ou seja, o direito que alguém tem de se livrar de seu<br />

jugo assim que Deus proporcionar àqueles que estão sob sua sujeição a coragem e a oportunidade para fazê-lo.<br />

Assim, Deus não levou em conta os direitos, fossem quais fossem, que os reis da Assíria podiam reivindicar <strong>sobre</strong><br />

Judá pela força da espada, e ajudou Ezequias a se libertar da dominação deste império conquistador. “E o Senhor<br />

estava com Ezequias, e ele prosperou; por isso ele progrediu, rebelou-se contra o rei da Assíria e se recusou a<br />

servi-lo” (2Reis 18,7). Fica evidente então que, se alguém abala um poder ao qual foi submetido pela força e não<br />

pelo direito, esta ação recebe o nome de rebelião, mas não constitui um pecado diante de Deus, que, ao contrário,<br />

a aprova e autoriza, sem dar qualquer importância aos acordos e aos pactos que intervêm, uma vez que foram<br />

extorquidos pela força. Para qualquer um que tenha lido atentamente a história de Acaz e Ezequias, parece muito<br />

provável que os assírios tenham vencido Acaz e o deposto, tenham feito de Ezequias rei durante a vida de seu pai,<br />

e que Ezequias, em virtude de um acordo, durante todo esse tempo tenha-lhe prestado homenagem e pago<br />

tributo.<br />

CAPÍTULO XVII<br />

DA USURPAÇÃO<br />

197. Assim como a conquista pode ser chamada de usurpação do estrangeiro, a usurpação também é uma<br />

espécie de conquista doméstica, com a diferença de que jamais um usurpador pode ter o direito do seu lado, só<br />

havendo usurpação quando alguém toma posse daquilo que pertence por direito a outra pessoa. Isto, embora<br />

também constitua uma usurpação, é apenas uma troca de pessoas, mas não das formas e regras do <strong>governo</strong>; mas<br />

se o usurpador estende seu poder além daquele por direito pertencente aos príncipes ou governadores legítimos<br />

da comunidade civil, trata-se de tirania adicionada à usurpação.<br />

198. Em todos os <strong>governo</strong>s legítimos, a designação das pessoas que devem comandar é um elemento tão<br />

natural e necessário quanto a forma do <strong>governo</strong> em si, e dela o povo originalmente retirou seu estabelecimento.<br />

Por isso, todas as comunidades civis com a forma de <strong>governo</strong> estabelecida prevêem regras também para designar<br />

aqueles que terão qualquer participação na autoridade pública, assim como métodos estabelecidos para investilos<br />

de suas funções. A anarquia é um tanto semelhante, seja ela desprovida de qualquer forma de <strong>governo</strong> ou<br />

regida por uma monarquia escolhida, mas sem que se tenha previsto o meio de se designar ou nomear a pessoa<br />

que exercerá o poder e será o monarca. Quem quer que exerça qualquer parcela do poder por outros meios que<br />

não aqueles prescritos pelas leis da comunidade civil não tem o direito de exigir obediência, mesmo que a forma<br />

da comunidade civil seja ainda preservada, pois não se trata de uma pessoa que as leis tenham designado, e<br />

conseqüentemente não é a pessoa a quem o povo deu seu consentimento. Nem este usurpador nem qualquer de<br />

seus sucessores jamais poderão ter um título, até que o povo esteja ao mesmo tempo em liberdade de consentir e<br />

tenha realmente consentido em reconhecê-lo e permitir-lhe a autoridade que eles até então lhes usurparam.

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