Sumário - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ
Sumário - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ
Sumário - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
ASPECTOS DA COSMOGONIA E DA<br />
COSMOGRAFIA ESCANDINAVAS<br />
Prof. Dr. Ciro Flamarion Cardoso – UFF<br />
Aspectos textuais e teórico-metodológicos; controvérsias <strong>de</strong> enfoque no<br />
relativo à mitologia escandinava<br />
Neste artigo estaremos li<strong>da</strong>ndo com fontes escritas que apresentem<br />
conteúdos míticos pertinentes ao nosso tema, por sua vez vinculado à<br />
cosmogonia e à cosmografia escandinavas pagãs, origina<strong>da</strong>s em tempos précristãos.<br />
A <strong>de</strong>limitação <strong>de</strong> um corpus principal no interior <strong>da</strong>quele - bem maior -<br />
dos textos disponíveis que, <strong>de</strong> uma ou outra maneira, vêm sendo tratados como<br />
fontes primárias <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que tiveram início os estudos científicos acerca <strong>da</strong><br />
mitologia nórdica, bem como o modo <strong>de</strong> trabalhar com os textos do corpus central,<br />
precisam ser esclarecidos <strong>de</strong> saí<strong>da</strong>.<br />
Nossa escolha, no relativo ao corpus principal <strong>de</strong> fontes, recaiu na assim<br />
chama<strong>da</strong> Ed<strong>da</strong> poética, em <strong>de</strong>trimento <strong>da</strong> Ed<strong>da</strong> em prosa (ou Ed<strong>da</strong> <strong>de</strong> Snorri) -<br />
por mais que esta última não seja <strong>de</strong>ixa<strong>da</strong> <strong>de</strong> lado na análise. A razão <strong>de</strong> tal<br />
escolha pren<strong>de</strong>-se ao caráter do texto <strong>de</strong> Snorri Sturluson (1179-1241). Em sua<br />
primeira parte em especial, Gylfaginning (1), temos um hábil compêndio <strong>da</strong><br />
mitologia escandinava pré-cristã, com altas doses <strong>de</strong> racionalização introduzi<strong>da</strong>s<br />
pelo compilador. É sem dúvi<strong>da</strong> notável que, após o prólogo <strong>de</strong> sua obra - prólogo<br />
que talvez se <strong>de</strong>va a outro autor -, o escritor islandês do século XIII “tenha, no<br />
conjunto, resistido à tentação <strong>de</strong> alterar suas fontes com a finali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
racionalizá-las <strong>de</strong> acordo com a moral cristã” (DAVIDSON, 1996: 24). Isto não<br />
significa ter escapado necessariamente ao impacto do cristianismo, mesmo<br />
porque, nas formas em que a elas teve acesso, suas fontes haviam sido redigi<strong>da</strong>s<br />
majoritariamente por poetas que escreviam após a cristianização, embora o<br />
fizessem com base em tradições mais antigas (o que é confirmado por paralelos<br />
textuais escáldicos prévios <strong>da</strong>táveis e por material iconográfico obtido em pedras<br />
rúnicas cronologicamente anteriores, por exemplo). Além do mais, embora seja<br />
um dos poucos produtores <strong>de</strong> textos, na Islândia do século XIII (a obra é <strong>da</strong>ta<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong> aproxima<strong>da</strong>mente 1220), exteriores à estrutura eclesiástica, Snorri teve uma<br />
formação intelectual cristã. O que mais nos preocupa, entretanto, é o acentuado<br />
viés racionalista e evemerista presente em Snorri Sturluson: não temos dúvi<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />
que tenha efetuado consi<strong>de</strong>ráveis or<strong>de</strong>namento e reinterpretação dos materiais<br />
expostos em seu compêndio, com base em suas opiniões, preferências e<br />
concepções. Falando <strong>de</strong> outro modo, embora sejamos forçados por défaut a usar<br />
o livro <strong>de</strong> Snorri como fonte primária, sua estrutura é a <strong>de</strong> uma fonte secundária<br />
(um texto altamente elaborado sobre a mitologia nórdica, baseado em fontes<br />
primárias, muitas <strong>da</strong>s quais perdi<strong>da</strong>s para nós). A regra metodológica <strong>de</strong>riva<strong>da</strong><br />
<strong>de</strong>stas constatações será, na prática, que nossa confiança nas asseverações do<br />
Gylfaginning aumentará muito quando existir a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> - que não se dá em<br />
7