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MARCELO MORAES E SILVA ENTRE A ILHA DESERTA E O ...

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CAPÍTULO 2 – MAPEAMENTOS: GEOGRAFIAS DO CAMPO EPISTEMOLOGICO<br />

Não basta aprender o que tem de se dizer em todos os casos sobre um<br />

objeto, mas também devemos falar dele. Temos sempre de começar por<br />

aprender o método de o abordar. (WITTGENSTEIN apud VEIGA-NETO,<br />

2004, p.51).<br />

Se eu tivesse de descrever num romance esta praça neste exato<br />

momento... que faria O problema mais sério não seria de espaço mas de<br />

tempo. Como dar em palavras o quadro inteiro com a rapidez e a luminosa<br />

nitidez com que a retina o apanha Impossível! O remédio é reproduzir um<br />

por um dos elementos do quadro. Mas por onde começar Do particular<br />

para o geral Tomar por exemplo, aquela menininha de vestido azulturquesa<br />

que ali passa na calçada, lambendo um picolé tão rosado quanto<br />

sua própria língua Ou partir do geral e descer ao particular Nesse caso eu<br />

começaria pela abóbada celeste e me veria logo em dificuldades para definir<br />

a qualidade desse azul sem mancha – sem jaça, como se dizia no tempo do<br />

Bilac, quando os escritores tinham uma paixão carnal pelas palavras.<br />

Depois qualificaria a luz do sol – ouro âmbar mel topázio chá Podia<br />

escrever simplesmente “a luz do sol das cinco-horas duma tarde de<br />

dezembro” [...] e o leitor que se danasse! Está claro que viriam a seguir as<br />

árvores: cedros, plátanos, jacarandás, paineiras, cinamomos [...] O pintor<br />

frustrado que mora dentro de mim não poderia deixar de anotar o contraste<br />

do vermelho queimado dos passeios interiores da praça e o verde vivo e<br />

lustroso da relva dos canteiros. Mas que importância pode ter esse<br />

pormenor pictórico depois da destruição de Hiroshima [...] Mas escrevendo<br />

tudo isso eu não ajudaria muito o leitor a visualizar o quadro. A cena toda<br />

tem um ar alegre e meio rústico de feira: homens, mulheres e crianças a<br />

passearem pelas calçadas ou sentados nos bancos: senhoras e senhores<br />

idosos debruçados às janelas de suas casas que dão para a praça. [...]<br />

Terminado o inventário, teria eu dado ao leitor uma idéia do quadro<br />

Duvido. Neste particular a pintura, arte espacial, é mais feliz que a literatura.<br />

De resto, que importância real poderá ter a descrição duma paisagem numa<br />

história de seres e conflitos humanos Talvez o melhor seja resumir tudo<br />

[...] (VERISSÍMO, 1997, p. 580-581).<br />

Como iniciar a escrita de um trabalho acadêmico Quais os critérios precisam<br />

ser utilizados para “pintar” adequadamente o quadro desejado Que aspectos<br />

devem ser levados em conta para dar “vida” ao presente estudo<br />

Foram essas indagações e várias outras, que me levaram a utilizar as<br />

epígrafes citadas no início deste capítulo. Apesar de aparentemente antagônicas, as<br />

duas ponderações parecem convergir para uma mesma direção. Pois, ao aconselhar<br />

sempre aprender o método de abordar determinada temática, Ludwig Wittgenstein<br />

teria o mesmo objetivo que o personagem de Veríssimo na construção de seus<br />

romances.<br />

Nesse sentido, assim como Ludwig Wittgenstein e Floriano Cambará, também<br />

procuro a minha forma de abordar a temática deste trabalho, dentre as dúvidas

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