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Aqui - História da Medicina

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4<br />

A MELANCOLIA NAS CENTÚRIAS DE AMATO LUSITANO<br />

Por José Morgado Pereira<br />

A escolha <strong>da</strong> Melancolia em Amato Lusitano como<br />

tema para estas jorna<strong>da</strong>s permite-me também aflorar<br />

o outro tema proposto: A Dor (e a Vi<strong>da</strong>). Vi<strong>da</strong> e dor<br />

não serão sinónimos, à maneira de Schopenhauer,<br />

mas a dor faz parte <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. Ora a dor moral, de que<br />

se irá falar, continua ain<strong>da</strong>, em certos autores<br />

contemporâneos, a ser uma espécie de signo <strong>da</strong><br />

Melancolia.<br />

Refira-se desde já que o significado actual do termo<br />

Melancolia é muito mais restritivo do que no passado,<br />

tendo caído em relativo desuso, substituído pelo termo<br />

Depressão, que é relativamente recente (século XVIII<br />

e, principalmente, século<br />

XIX).<br />

Por outro lado, o estar<br />

“em baixo”, triste, infeliz,<br />

desanimado, desesperado,<br />

acabrunhado, etc.,<br />

são estados que afectam<br />

em <strong>da</strong>do momento qualquer<br />

ser humano. Separações,<br />

desilusões, lutos,<br />

per<strong>da</strong>s, desgostos diversos,<br />

são experiências<br />

A Dor (e a Vi<strong>da</strong>).<br />

A Vi<strong>da</strong> e a dor afectivas frequentes e<br />

não serão inevitáveis.<br />

sinónimos, à O sentir-se “melancólico<br />

ou deprimido” não<br />

maneira de<br />

Schopenhauer,<br />

mas a dor faz implica pois um estado<br />

parte <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. patológico ou qualquer<br />

Ora a dor moral, afecção mental. Só<br />

(...), continua<br />

ain<strong>da</strong>, em quando esses estados se<br />

certos autores prolongam e agravam, se<br />

contemporâneos, tornariam não reversíveis<br />

a ser uma e acompanhados de<br />

espécie de<br />

signo de sintomas tradutores de<br />

Melancolia. repercussão de ordem<br />

somática, é que se deverá falar em doença.<br />

Mas para os antigos, a constatação de um temor e<br />

tristeza persistentes era indicativo de melancolia. Para<br />

a ciência actual, tal estado pode efectivamente<br />

corresponder ao leque <strong>da</strong>s perturbações depressivas,<br />

mas também ser um mero epifenómeno de um largo<br />

espectro de afecções de gravi<strong>da</strong>de, curso, prognóstico<br />

e tratamento completamente diferentes.<br />

Voltemos à melancolia antiga, a que vem desde os<br />

séculos V e IV A.C. até ao século XVIII, e cuja análise<br />

obriga a arrisca<strong>da</strong>s viagens retrospectivas, sabendo-<br />

-se de antemão que é muito dificil reconhecer no<br />

passado as categorias nosológicas que hoje nos são<br />

familiares. Como diz Starobinski, falta sempre qualquer<br />

coisa, e principalmente a presença <strong>da</strong>s pessoas<br />

doentes.<br />

Curiosamente, a Melancolia tinha uma causali<strong>da</strong>de<br />

defini<strong>da</strong>, de acordo com a teoria humoral, a atrabilis<br />

ou bílis negra.<br />

Apesar <strong>da</strong> ideia dos<br />

humores vir <strong>da</strong> medicina<br />

empírica, e de a ideia de<br />

saúde como equilíbrio de<br />

diversas partes ser contribuição<br />

dos filósofos gregos,<br />

é Hipócrates que cria a doutrina<br />

humoralista unitária<br />

que persiste afinal até há<br />

poucos séculos. Aos quatro<br />

sucos ou humores corporais<br />

(sangue, bílis amarela,<br />

bílis negra e fleuma)<br />

corresponderiam os quatro<br />

elementos (ar, fogo, terra e<br />

água). Ca<strong>da</strong> humor é<br />

combinação de duas <strong>da</strong>s<br />

quatro quali<strong>da</strong>des (cálido,<br />

húmido, seco e frio). Em<br />

ca<strong>da</strong> um dos quatro temperamentos<br />

(sanguíneo,<br />

colérico,bilioso e fleumático)<br />

predominaria um dos<br />

humores. To<strong>da</strong>s as<br />

doenças resultariam de uma , perturbação do equilíbrio<br />

humoral, por excesso ou corrupção de um dos<br />

humores. A bílis negra, sedia<strong>da</strong> no baço, tinha que<br />

ver com o elemento terra, com a estação do Outono<br />

(e com a i<strong>da</strong>de pré-senil), e com as quali<strong>da</strong>des frio e<br />

seco. A bílis negra tinha concentra<strong>da</strong>s substâncias

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