O Homem que Calculava Malba Tahan
aventuras de um singular calculista persa é um romance infanto-juvenil do fictício escritor Malba Tahan (heterônimo do professor brasileiro Julio César de Mello e Souza), que narra as aventuras e proezas matemáticas do calculista persa Beremiz Samir1 na Bagdá do século XIII. Foi publicado pela primeira vez em 19382 e já chegou a sua 80ª edição. A narrativa, dentro da paisagem do mundo islâmico medieval, trata das peripécias matemáticas do protagonista, que resolve e explica, de modo extraordinário, diversos problemas, quebra-cabeças e curiosidades da matemática. Inclui, ainda, lendas e histórias pitorescas, como, por exemplo, a lenda da origem do jogo de xadrez e a história da filósofa e matemática Hipátia de Alexandria. Sem ser um livro didático, tem, contudo, uma forte tonalidade moralista. Por isso, o livro é indicado como um livro paradidático em vários países, tendo sido citado na Revista Book Report e em várias publicações do gênero.
aventuras de um singular calculista persa é um romance infanto-juvenil do fictício escritor Malba Tahan (heterônimo do professor brasileiro Julio César de Mello e Souza), que narra as aventuras e proezas matemáticas do calculista persa Beremiz Samir1 na Bagdá do século XIII. Foi publicado pela primeira vez em 19382 e já chegou a sua 80ª edição.
A narrativa, dentro da paisagem do mundo islâmico medieval, trata das peripécias matemáticas do protagonista, que resolve e explica, de modo extraordinário, diversos problemas, quebra-cabeças e curiosidades da matemática. Inclui, ainda, lendas e histórias pitorescas, como, por exemplo, a lenda da origem do jogo de xadrez e a história da filósofa e matemática Hipátia de Alexandria. Sem ser um livro didático, tem, contudo, uma forte tonalidade moralista. Por isso, o livro é indicado como um livro paradidático em vários países, tendo sido citado na Revista Book Report e em várias publicações do gênero.
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ecompensa. Recusava sistematicamente o dinheiro <strong>que</strong> lhe ofereciam e quando um xe<strong>que</strong> rico, a<br />
<strong>que</strong>m ensinara, insistia em pagar a consulta, Beremiz recebia a bolsa cheia de dinares, agradecia a<br />
esmola e mandava distribuir, integralmente, a quantia entre os pobres do bairro.<br />
Certa vez um mercador, chamado Aziz Nemã, empunhando um papel cheio de números e contas,<br />
veio <strong>que</strong>ixar-se de um sócio a <strong>que</strong>m tratava de “ladrão miserável”, “chacal imundo”, e outros epítetos,<br />
não menos insultuosos. Beremiz procurou acalmar o ânimo exaltadíssimo do homem e chamá-lo ao<br />
caminho da mansidão.<br />
— Acautelai-vos — aconselhou — contra os juízos arrebatados pela paixão por<strong>que</strong> esta desfigura<br />
muitas vezes a verdade. A<strong>que</strong>le <strong>que</strong> olha por um vidro de cor vê todos os objetos da cor desse vidro: se<br />
o vidro é vermelho, tudo lhe parece rubro; se é amarelo, tudo se lhe apresenta completamente<br />
amarelado. A paixão está para nós como a cor do vidro para os olhos. Se alguém nos agrada, tudo lhe<br />
louvamos e desculpamos; se, ao contrário, nos aborrece, tudo lhe condenamos, ou interpretamos de<br />
modo desfavorável.<br />
E, a seguir, examinou com paciência as contas, e descobriu nelas vários enganos <strong>que</strong> desvirtuavam<br />
os resultados. Aziz certificou-se de <strong>que</strong> havia sido injusto para com o sócio, e tão encantado ficou com a<br />
maneira inteligente e conciliadora de Beremiz, <strong>que</strong> nos convidou, na<strong>que</strong>la noite, a um passeio pela<br />
cidade.<br />
Fomos levados, pelo nosso delicado companheiro, até o café Bazari<strong>que</strong>, no extremo da praça de<br />
Otmã.<br />
Um famoso contador de histórias, no meio da sala invadida por fumo negro e espesso, prendia a<br />
atenção de um grupo numeroso de ouvintes.<br />
Tivemos a sorte de chegar exatamente no momento em <strong>que</strong> o xe<strong>que</strong> el-medah, 3 tendo terminado a<br />
costumada prece inaugural, começava a narrativa. Era um homem de seus cin<strong>que</strong>nta anos, quase negro,<br />
a barba negríssima, e dois grandes olhos cintilantes; trazia, como quase todos os outros narradores de<br />
Bagdá, um amplíssimo pano branco apertado em torno da cabeça por uma corda de pelo de camelo,<br />
<strong>que</strong> lhe dava a majestade de um sacerdote antigo. Falava com voz alta e vagarosa, ereto no meio do<br />
círculo dos ouvintes, acompanhado submissamente por dois tocadores de alaúde e de tambor. Narrava,<br />
com entusiasmo, uma história de amor, intercalada com as vicissitudes da vida de um sultão. Os<br />
ouvintes não lhe perdiam uma só palavra. O gesto do xe<strong>que</strong> era tão arrebatado, a sua voz tão expressiva,<br />
o seu rosto tão elo<strong>que</strong>nte, <strong>que</strong> às vezes deixava a impressão de viver as aventuras <strong>que</strong> sua fantasia criava.<br />
Falava de uma longa viagem. Imitava o passo lento do cavalo fatigado. Aqui encarnava o beduíno<br />
sedento procurando, em torno de si, uma gota d’água; ali deixava pender os braços e a cabeça como um<br />
homem prostrado.<br />
Que admiração me causava o xe<strong>que</strong> contador de histórias!<br />
Árabes, armênios, egípcios, persas e nômades bronzeados no Hedjaz, imóveis, sem respirar,<br />
refletiam na expressão do rosto todas as palavras do orador. Na<strong>que</strong>le momento, com a alma toda nos<br />
olhos, deixavam ver, claramente, a ingenuidade e a frescura de sentimentos <strong>que</strong> ocultavam sob a<br />
aparência de uma dureza selvagem. O contador de histórias andava para a direita e para a es<strong>que</strong>rda,<br />
parava, retrocedia aterrado, cobria o rosto com as mãos, erguia os braços para o céu, e, à medida <strong>que</strong> se<br />
ia afervorando e levantando a voz, os músicos tocavam e batiam com mais fúria.