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EDITORIAL Oideal de uma educação para todos, após três ... - APPOA

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SEÇÃO DEBATESCUMIOTTO, C. R. Uma escuta analítica...Em nossa prática, po<strong>de</strong>mos constatar a existência <strong>de</strong> significantesfundadores que <strong>de</strong>terminaram o modo <strong>de</strong> subjetivação, o modo do fazerpedagógico<strong>de</strong>sta escola.Para ilustrar a forma como estas construções vão se <strong>de</strong>lineando noespaço escolar, relataremos <strong>uma</strong> experiência em <strong>uma</strong> escola on<strong>de</strong>, na implantação<strong>de</strong> seu projeto, houve toda <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>alização <strong>de</strong> que esta escolaseria a melhor, a mais completa da cida<strong>de</strong>. Na época <strong>de</strong> sua implantação,muitas reuniões foram realizadas com a comunida<strong>de</strong> que iria ser atendidapor esta instituição, além do oferecimento <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> treinamento <strong>para</strong>professores, recursos materiais e técnicos à disposição assim como <strong>uma</strong>excelente estrutura física. A i<strong>de</strong>alização em relação a esta escola apareciano discurso político e social, sob a forma: “A escola que viria dar segurançae alimentação aos filhos <strong>de</strong> pais trabalhadores”. E ao longo do trabalho,po<strong>de</strong>mos constatar que um dos significantes fundadores <strong>de</strong>sta escola era aalimentação, on<strong>de</strong> o discurso emitido pelos i<strong>de</strong>alizadores da mesma (ospolíticos, os pedagogos), fez eco, fez ca<strong>de</strong>ia, discurso que aparecia da seguintemaneira: “A primeira tarefa pedagógica <strong>de</strong>sta escola é a alimentação”,ou “saco vazio não <strong>para</strong> em pé”. Embora tais discursos sejam comuns emnosso país, no que se refere às políticas públicas educacionais, aqui preten<strong>de</strong>mosnos ater às particularida<strong>de</strong>s do discurso <strong>de</strong>sta escola, e como esteproduziu efeitos <strong>de</strong>terminantes na sua prática pedagógica referente.Por significantes fundadores, enten<strong>de</strong>mos ser aquilo que aliado a outrossignificantes, constituíram, subjetivaram esta escola, ou seja, há algoda re<strong>de</strong> simbólica que vai além da boa intenção, do conhecimento teórico edidático dos educadores e que <strong>de</strong>termina o seu fazer pedagógico.Nos interessa investigar, como estes significantes fundadores pre<strong>para</strong>ramo campo <strong>de</strong> seus futuros sintomas; sem é claro, que os professores<strong>de</strong>sta instituição se <strong>de</strong>ssem conta. É interessante situar que quando fuichamada a intervir, dois anos após a implantação <strong>de</strong>sta unida<strong>de</strong> escolar, jáhavia um mal estar em relação ao nível <strong>de</strong> aprendizagem, on<strong>de</strong> os pedagogosse perguntavam: “Mas como que nossa escola, possuindo <strong>todos</strong> os equipamentos,profissionais e especialistas, possui um nível <strong>de</strong> aprendizagem atémais baixo do que as outras?” Será que é culpa dos pais, que não incentivaramas crianças a estudar? Para não falar dos esforços pedagógicos (mé<strong>todos</strong>,diferentes técnicas motivacionais, seleção dos estímulos mais favoráveis...)Somente no <strong>de</strong>correr do trabalho com toda a escola, é que pu<strong>de</strong>mosescutar que esse sintoma (a não aprendizagem), revelava a verda<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssaescola. É claro que o objetivo daqueles que a i<strong>de</strong>alizaram ou ali trabalharam,não era apenas a alimentação, mas, a repetição do significante alimentaçãofoi fazendo ca<strong>de</strong>ia, a ponto <strong>de</strong> fazer obstáculo à tarefa <strong>de</strong> aprendizagem, àrevelia do <strong>de</strong>sejo e das boas intenções das pessoas envolvidas.Este significante “alimentação” foi sendo “pescado”, nos seus retornosem diferentes situações, tais como: aniversários, trabalhos escolares ouem momentos informais, on<strong>de</strong> as crianças diziam: “Nossa escola é bonita etem comida boa”. E nos grupos <strong>de</strong> trabalho com professores, o significantealimentação aparecia em forma <strong>de</strong> queixa: “Parece que os alunos vêm aquisó <strong>para</strong> comer”.Queixa esta que retornava nas entrevistas com os pais e <strong>de</strong> tantorepetir, os professores se <strong>de</strong>ram conta do quanto este lugar da escola comoum lugar <strong>para</strong> comer insistia, e se propuseram a trabalhar o discurso tãoemitido pelos políticos, técnicos e i<strong>de</strong>alizadores <strong>de</strong>sta escola: “Saco vazionão <strong>para</strong> em pé!”, o que ao longo do trabalho, culminou em um semináriointerno, on<strong>de</strong> os professores convidaram os políticos, os pais e a comunida<strong>de</strong><strong>para</strong> discutirem os efeitos <strong>de</strong>ste significante imperativo na escola, propondoa seguinte reflexão: “Se saco vazio não <strong>para</strong> em pé, saco cheio tambémnão anda!”. Tal apontamento visava alertar que <strong>para</strong> o sujeito, <strong>para</strong> oapren<strong>de</strong>nte, não basta só comer, ele tem outras necessida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>sejos.A partir <strong>de</strong>stas produções, buscou-se um novo posicionamento frenteàs aprendizagens naquela escola; manteve-se o grupo <strong>de</strong> discussões, masos efeitos <strong>de</strong>sse significantes continuam até hoje, e o que mudou foi a relaçãoda comunida<strong>de</strong> escolar em relação a esse significante.Dessa forma, o trabalho da Psicanálise na escola vem apontar a existência<strong>de</strong> algo – o inconsciente – que vem ultrapassar a boa vonta<strong>de</strong> dospartícipes do processo ensino-aprendizagem, e se intrometer no planeja-74 C. da <strong>APPOA</strong>, Porto Alegre, n. 98, jan. 2002 C. da <strong>APPOA</strong>, Porto Alegre, n. 98, jan. 200275

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