Hipertensão ocular “mascarada” por e<strong>de</strong>ma <strong>de</strong> córnea após cirurgia da catarata351CRF 8,0mmHg. Optou-se por manter medicação tópicaanti-hipertensiva ocular e iniciar <strong>de</strong>smame do corticói<strong>de</strong>com lotoprednol 0,5% (Loteprol), bem como adicionarlubrificação tópica com lágrima artificial a base <strong>de</strong> HPGuar e com Polyquad como conservante (Oftane) 4 vezesao dia e suplementação alimentar com ácidos graxosessenciais tipo ômega 3 a base <strong>de</strong> linhaça em cápsulas<strong>de</strong> 1g, 2 vezes ao dia durante as refeições.Três semanas após a primeira avaliação, a pacienteretornou relatando redução importante dos sintomas e melhorada visão que era, sem correção, <strong>de</strong> 20/20 em OE. Apaciente fazia uso da suplementação alimentar recomendada,Loteprol 2 vezes ao dia e Oftane irregularmente, tendo<strong>de</strong>scontinuado por conta própria o Combigan há 5 dias.O ORA revelou IOPcc 13,9 mmHg, IOPg 11,5mmHg, CH 9,2 e CRF 8,2 (Figura 1B). A espessura central(Pentacam) foi <strong>de</strong> 522µm (Figura 2C). A diferença daespessura corneana po<strong>de</strong> ser observada no mapa diferencial(Figura 2D). Observou-se redução significativa darefletivida<strong>de</strong> (scattering) da córnea e restauração da transparênciacorneana e resolução do quadro <strong>de</strong> e<strong>de</strong>maestromal, que se correlacionou com os achados das imagens<strong>de</strong> Scheimpflug (Figura 3B). O padrão <strong>de</strong> progressãoespacial estava <strong>de</strong>ntro dos limites da normalida<strong>de</strong>(Figura 4B). Ao exame da lâmpada <strong>de</strong> fenda, observou-seainda leve ceratopatia ponteada no 1/3 inferior.Consi<strong>de</strong>rando-se a evolução clínica e os achados,optamos por manter <strong>de</strong>smame do corticói<strong>de</strong>, orientara paciente sobre a importância da lubrificação e dasuplementação alimentar para tratamento da disfunçãolacrimal e retornar para controle pressórico em um mês.Com isso, a paciente retornou neste período semqueixas, em uso da suplementação alimentar recomendadae Oftane 4 vezes ao dia. A acuida<strong>de</strong> visual sem correçãoera <strong>de</strong> 20/20 em OE. O exame do segmento anteriorrevelava olho esquerdo calmo pseudofácico, sem alteraçõesnotáveis. A TAG era <strong>de</strong> 15mmHg às 15 horas. OORA revelou IOPcc 15,1mmHg, IOPg 13,3mmHg, CH9,3 e CRF 8,1. A espessura central (Pentacam) foi <strong>de</strong>529µm. O exame da microscopia especular revelou contagem<strong>de</strong> 2.617 células/mm 2 em OD, com mosaico celularnormal e 1.960 células em OE, com mo<strong>de</strong>radospolimegatismo e pleomorfismo. A paciente foi orientadapara retornar em 3 meses para controle clínico e acompanhamentoou antes, em caso <strong>de</strong> alguma sintoma novo.DISCUSSÃOA influência da córnea nas medidas da TAG ésabida <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a introdução do método por Goldmann eFigura 3: Tomografia <strong>de</strong> segmento anterior com imagens <strong>de</strong>Scheimpflug (Pentacam)Figura 4: Gráfico <strong>de</strong> Progressão Paquimétrica Espacial: A – Naprimeira consulta com e<strong>de</strong>ma subclínico; B – Após o tratamentoSchimitd, em 1957 (1) . Entretanto, somente após a publicaçãodo estudo OHTS (Ocular Hypertension TreatmentStudy), em junho <strong>de</strong> 2002, que i<strong>de</strong>ntificou em análisemultivariada a espessura central da córnea (ECC) comoo mais importante fator preditivo para o <strong>de</strong>senvolvimento<strong>de</strong> lesão glaucomatosa do nervo óptico em pacienteshipertensos oculares, que houve a popularização do reconhecimento<strong>de</strong>sta variável (14) . Fórmulas <strong>de</strong> correçãoda TAG foram propostas com base em análises <strong>de</strong> regressãolinear com a ECC (15-18) . Entretanto, Gunvant etal. <strong>de</strong>monstraram que tais fórmulas po<strong>de</strong>m hipercorrigira medida da pressão em córneas finas (19) . Por outro lado,córneas com aumento da espessura por e<strong>de</strong>ma apresentamuma resistência reduzida e portanto um efeito naTAG similar a córneas com menor espessura (16-20) .Comisso, recomenda-se muito cuidado no uso <strong>de</strong> qualquerfórmula baseada em uma suposta relação sempre linearentre a espessura da córnea, sua resistência e seu efeitoRev Bras Oftalmol. 2009; 68 (6): 348-54
352Valbon BF, Fre<strong>de</strong>rico Guerra F, Silva RS, Canedo AL, Ambrósio Junior Rna TAG (5-9) . Adicionalmente, consi<strong>de</strong>rando-se os achados<strong>de</strong> Liu e Roberts, variações relacionadas com a tensãoda superfície referidas pela resistência da córnea(módulo <strong>de</strong> Young) potencialmente <strong>de</strong>terminam maiorimpacto na TAG, que a espessura central e aceratometria (5) .Com a introdução do ORA, iniciamos uma novafase no entendimento das proprieda<strong>de</strong>s biomecânicasda córnea (6) . Até então, o conhecimento nesta área eralimitado a estudos experimentais e mo<strong>de</strong>los matemáticos(8,21) . Fontes et al. reportaram as variações da CH eCRF em população brasileira normal, bem como suasrelações com diversos parâmetros clínicos (22) . A CH tevevalores médios <strong>de</strong> 10,17, com <strong>de</strong>svio-padrão <strong>de</strong> 1,82,enquanto o CRF médio foi <strong>de</strong> 10,14, com <strong>de</strong>svio-padrão<strong>de</strong> 1,8.Um recente artigo <strong>de</strong> <strong>de</strong>l Buey et al. <strong>de</strong>monstraque córneas com distrofia endotelial <strong>de</strong> Fuchs, com espessurasignificativamente maior (média <strong>de</strong> 606µm, com<strong>de</strong>svio-padrão <strong>de</strong> 20, variando entre 578-635µm), apresentammenores CH e CRF e maiores diferenças entreIOPcc que IOPg 23 . Adicionalmente, uma redução da CHe CRF foi encontrada após cirurgia da catarata, <strong>de</strong>vidoao e<strong>de</strong>ma pós-operatório (24-26) . Tal alteração se mostroutransitória, retornando aos patamares pré-operatóriosentre 1 e 3 meses (25,26) .A ECC po<strong>de</strong> ser medida por meio <strong>de</strong> sistema <strong>de</strong>ultrassom e óptico, não havendo diferenças significativasentre os métodos quando bem calibrados e realizadoscom metodologia correta (27) . A ECC varia <strong>de</strong>forma ampla na população normal, havendo algumasdiferenças em populações <strong>de</strong> diferentes regiões (22,28,29) .Por exemplo, na população norte-americana, o valormédio <strong>de</strong> ECC é <strong>de</strong> 556µm, com <strong>de</strong>svio-padrão <strong>de</strong> 35 (27)e na população brasileira, 545µm com <strong>de</strong>svio-padrão<strong>de</strong> 34 (22) , sendo que a variação foi semelhante emambas as populações, <strong>de</strong> 454 a 669µm. Existe, portanto,uma superposição <strong>de</strong> valores em córneas normais ecom e<strong>de</strong>ma por Distrofia <strong>de</strong> Fuchs (30) . Entretanto,e<strong>de</strong>ma po<strong>de</strong> ser i<strong>de</strong>ntificado com o padrão <strong>de</strong> atenuaçãoda progressão espacial da paquimetria, com menordiferença entre a região mais fina e a periferia dacórnea, o que é possível e facilitado pelos gráficos doPentacam, CTSP e PTI (12,13) .No presente caso relatado, observamos e<strong>de</strong>macorneano apesar da espessura central ser inferior a600µm. A retificação da progressão espacial dapaquimetria, juntamente com a maior refletivida<strong>de</strong> doestroma corneano e as medidas <strong>de</strong> CH e CRF maisbaixas que os valores normais possibilitam a i<strong>de</strong>ntificaçãoclínica <strong>de</strong> e<strong>de</strong>ma. A IOPcc foi fundamental parao diagnóstico <strong>de</strong> hipertensão ocular.Hipertensão ocular é uma complicação reconhecidaapós cirurgia <strong>de</strong> catarata, mesmo quando realizadasem complicações ou intercorrências per-operatórias(31,32) . A diminuição das proprieda<strong>de</strong>s biomecânicas dacórnea está relacionada à dificulda<strong>de</strong> na capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong><strong>de</strong>tectar o aumento da PIO (24-26) . Uma forma alternativa<strong>de</strong> se <strong>de</strong>tectar tal aumento seria a tonometria <strong>de</strong> contornodinâmico (PASCAL), que sofre menor influência dascaracterísticas da córnea por não ser necessárioaplanação, mas apenas contato do sensor pressórico coma superfície (33-35) .Optamos pela associação <strong>de</strong> betabloqueadorcom alfa 2 agonista no tratamento da hipertensão ocularassociada à e<strong>de</strong>ma <strong>de</strong> córnea após cirurgia da catarata,uma vez que era <strong>de</strong>sejada uma redução acentuadada PIO e tratar-se das melhores escolhas emtermos <strong>de</strong> medicações para o caso. Em casos <strong>de</strong> doençaendotelial, evitamos o uso <strong>de</strong> inibidor da anidrasecarbônica tópico pela possível atuação na funçãoendotelial, que po<strong>de</strong> causar ou agravar o e<strong>de</strong>ma (36-38) .Consi<strong>de</strong>rando o quadro clínico da paciente, acreditamosque a causa da hipertensão ocular estaria relacionadacom o processo inflamatório não controladoa<strong>de</strong>quadamente, sendo também contraindicado o uso<strong>de</strong> prostaglandinas ou <strong>de</strong>rivados. O tratamento da inflamaçãoa base <strong>de</strong> corticói<strong>de</strong> geralmente é muito eficaz,<strong>de</strong>vendo ser associado e ter o seu <strong>de</strong>smame bemcontrolado. Optamos por substituir o colírio <strong>de</strong> acetato<strong>de</strong> prednisolona por etabonato <strong>de</strong> lotoprednol para o<strong>de</strong>smame do corticói<strong>de</strong>, pois existe menor chance <strong>de</strong>hipertensão cortisônica (39) . O <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> sinaise sintomas relacionados com a disfunção lacrimalpo<strong>de</strong> estar relacionado à presença <strong>de</strong> cloreto <strong>de</strong>benzalcônio como conservante nos colírios utilizados(40) . O tratamento com suplementação alimentar abase <strong>de</strong> ácidos graxos insaturados essenciais tipoômega 3 tem se mostrado eficaz em diversos estudos (41-43). O uso <strong>de</strong> colírio lubrificante a base <strong>de</strong> HP Guar éindicado no tratamento <strong>de</strong> disfunção lacrimal, principalmentese estiver relacionado com ceratopatia ponteada,bem como alterações da camada mucói<strong>de</strong> dofilme lacrimal (44-45) .Relatamos um caso <strong>de</strong> hipertensão ocular associadoà e<strong>de</strong>ma <strong>de</strong> córnea após cirurgia <strong>de</strong> catarata emque a medida da pressão ocular por meio <strong>de</strong> TAGera hipoestimado. A documentação propedêutica com oORA e Pentacam para avaliação biomecânica etomográfica mostraram-se fundamentais para o diagnóstico,<strong>de</strong> modo a guiar o tratamento e acompanhamentoclínico do caso.Rev Bras Oftalmol. 2009; 68 (6): 348-54
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