Em 1913 e 14 acontec<strong>em</strong> exposições de Lasar Segall e de Anita Malfatti naci<strong>da</strong>de. Ambos já apresentam influências do expressionismo al<strong>em</strong>ão, já operamlinguagens muito diferentes <strong>da</strong> normatização acadêmica, contudo passamdesapercebidos pela socie<strong>da</strong>de local. Nenhum comentário, positivo ou negativo, maisexaltado ficou registrado. Porém <strong>em</strong> 1917, <strong>em</strong> nova exposição, Anita, agora maisradical e provocativa, escancara todo o caráter ain<strong>da</strong> provinciano – tanto dosconservadores quanto do grupo modernista - <strong>da</strong> metrópole. As reações são ruidosas eos apoios id<strong>em</strong>, de onde v<strong>em</strong> o famoso episódio de “paranóia ou mistificação” deMonteiro Lobato e a defesa <strong>da</strong> artista feita por Oswald. Do episódio nasceu a união dogrupo central <strong>da</strong> SAM, Oswald, Mário, Anita e Di Cavalcanti, engrossado com achega<strong>da</strong> de Brecheret <strong>em</strong> 1919.Ficou estabelecido pela história a liderança dos Andrades, tanto de articulaçãoquanto de orientação conceitual e formal. Tal visão é enfraquecedoura do alcance <strong>da</strong>experiência artística desenvolvi<strong>da</strong> pelos modernistas. O grupo só conseguiu aprofundi<strong>da</strong>de nas <strong>pesquisa</strong>s a que chegou graças a visões amplas dos universosartísticos. A esse respeito Mário Pedrosa deixou o seguinte registro: “Sob o impactoproduzido nos jovens literatos pelas esculturas de Brecheret e as pinturassombriamente dramáticas de Malfatti, os cânones do acad<strong>em</strong>ismo literário de queain<strong>da</strong> estavam impregnados começaram a ceder. Assim, a iniciação modernista delescomeçou a se fazer não através <strong>da</strong> literatura e <strong>da</strong> poesia mas através <strong>da</strong>s artesespecificamente não-verbais <strong>da</strong> pintura e <strong>da</strong> escultura.” (4)Em 1921, Paulicéia Desvaira<strong>da</strong>, de Mário de Andrade vincula as especulaçõesà metrópole e o faz com linguag<strong>em</strong> apropria<strong>da</strong> ao novo ambiente urbano local, o queprovoca o significativo artigo de Oswald, “O meu poeta futurista”. O Modernismopaulista contava já nesse momento com repertório programático para se constituir <strong>em</strong>movimento. Assim, <strong>da</strong> maneira mais moderna e provocativa possível, o grupo, sobamparo <strong>da</strong> aristocracia quatrocentona e insultando o burguês (5) , se apresenta para asocie<strong>da</strong>de paulistana como movimento artístico na S<strong>em</strong>ana de Arte Moderna.A SAM contou com a participação, além do núcleo citado, artistas de váriasáreas, todos tomados pelo desejo de mu<strong>da</strong>nça radical. Poetas (como: Guilherme deAlmei<strong>da</strong>, Menotti Del Pichia), pintores (como: John Graz, Ferrignac), escultores (VictorBrecheret, Wilhelm Haarberg), músicos (Villa-Lobos) e arquitetos (Garcia Moya). (6) Aaudiência repleta <strong>da</strong> fina-flor <strong>da</strong> elite paulistana, se sentiu evident<strong>em</strong>ente ofendi<strong>da</strong> eindigna<strong>da</strong>, mas só. Vista quase como uma mal-criação dos filho dessa mesma elite.Os reflexos imediatos <strong>da</strong> S<strong>em</strong>ana não alteram <strong>em</strong> muita coisa a calmaria cultural <strong>da</strong>metrópole provinciana querendo ser moderna.Mas, se o evento não significava um primeiro momento e, sim o encontro dediversas ocorrências <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> dos 10, também não representou um fim. Durante adéca<strong>da</strong> de 20 os trabalhos dos modernistas se desenvolv<strong>em</strong> e alcançam níveis deexperimentação, também de posicionamento crítico e teórico, bastante intenso seconsiderarmos a cena brasileira. Suas experimentações causarão impactos a longoprazo, <strong>em</strong> vários momentos posteriores <strong>da</strong>s artes brasileiras a geração de 22 seráreverencia<strong>da</strong>.***Ao final <strong>da</strong> déca<strong>da</strong>, a crise de 29 e o Golpe getulista de „30 alteramsubstancialmente o panorama do país, e <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de <strong>em</strong> especial, tambémculturalmente, entra-se <strong>em</strong> uma fase mais politiza<strong>da</strong> e de serie<strong>da</strong>de força<strong>da</strong>. A crise4. PEDROSA, Mário. S<strong>em</strong>ana de Arte Moderna; in: AMARAL, Aracy A. Artes Plásticas na S<strong>em</strong>ana de22. São Paulo, Ed. 34, 1998. p 291.5. ANDRADE, Mário. Paulicéia desvaira<strong>da</strong>; in: Poesias Completas. São Paulo, CL, s/d. p. 45-47.6. SCHWARTZ, <strong>Jorge</strong>. Tupi or not tupi - O grito de guerra na literatura do Brasil moderno; in:Catálogo <strong>da</strong> Exposição: Da antropofagia a Brasília - Brasil 1920 - 1950. MAB -FAAP/ Cosac & Naify, SãoPaulo, 2002. p143.
na economia cafeeira, acima de qualquer coisa, desviou consideravelmente o ritmofestivo <strong>da</strong> S<strong>em</strong>ana. Afinal o Modernismo local, como tudo <strong>em</strong> SP do início do XX, suamatéria e sua cultura, fora um subproduto do café, como aponta L. Saia:“Do ponto de vista puramente urbano, a evolução <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de de São Paulodurante a vigência do ciclo do café constitui uma decorrência simples doscompromissos firmados pelo tipo colonial <strong>da</strong> economia: o alimento d<strong>em</strong>ográfico, aestrutura de ci<strong>da</strong>de forma<strong>da</strong> por reticulados sucessivos estabelecidos de conformi<strong>da</strong>decom a orientação <strong>da</strong>s divisas <strong>da</strong>s glebas primitivas, a aglutinação São Paulo-Santos, aposição relativa <strong>da</strong> faixa <strong>da</strong> industrialização incipiente e do comércio bruto ao longo<strong>da</strong>s vias férreas, o caráter estritamente técnico e capitalista dos serviços de utili<strong>da</strong>depública, a maneira de comerciar e utilizar os produtos importados, entre os quais seencontram os estilos arquitetônicos e formação de profissionais, tudo isso estáperfeitamente encaixado no esqu<strong>em</strong>a que exporta produção primária e importaprodutos elaborados. Mesmo as aparentes exceções, como os loteamentos <strong>da</strong> City e aS<strong>em</strong>ana de Arte Moderna, traduz<strong>em</strong> os compromissos que a monocultura do caféimpôs à ci<strong>da</strong>de de São Paulo” (7)Os modernistas se orientavam pelas vanguar<strong>da</strong>s européias envolvi<strong>da</strong>s <strong>em</strong>contextos econômicos, técnicos e políticos muito diferentes dos nossos. É certo qu<strong>em</strong>uito dessas proposições partiam de uma visão internacionalista <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> e <strong>da</strong> cultura,to<strong>da</strong>via a relação com a máquina e a industrialização foi uma <strong>da</strong>s molas <strong>da</strong> ArteModerna européia. A indústria <strong>em</strong> SP era insipiente até o momento, <strong>da</strong>do aheg<strong>em</strong>onia <strong>da</strong> economia cafeeira, ela só começaria a se firmar exatamente com odeclínio do café no mercado internacional.A própria leitura que os paulistas faz<strong>em</strong> <strong>da</strong>s novas dinâmicas urbanas na SPaprazível (8) pouco revelam dos choques <strong>da</strong>s ci<strong>da</strong>des modernas industriais. O que serevela muito no Modernismo de SP é a mistura de transgressão e ingenui<strong>da</strong>de. Aprópria aproximação com o Futurismo italiano, a mais ingênua <strong>da</strong>s vanguar<strong>da</strong>s, mostraesse caráter do rebelde s<strong>em</strong> ideologia que também caracterizou a S<strong>em</strong>ana.Ao lado <strong>da</strong>s profun<strong>da</strong>s renovações que a SAM promoveu na cultura do país,fica patente a falta de uma consciência mais agu<strong>da</strong> sobre a urbani<strong>da</strong>de moderna. Oambiente cafeeiro e a própria infantili<strong>da</strong>de <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de face o mundo moderno nosesclarece o porquê.Em parte por essas características, a ingenui<strong>da</strong>de e o descompromisso com osprogramas mais sectários, o Modernismo paulista tenha apresentado essa amplitudede caminhos para a cultura de SP. E, <strong>em</strong> certa medi<strong>da</strong>, para a própria cultura Modernainternacional. O Modernismo plural, d<strong>em</strong>ocrático, regionalista, caboclo, desenvolvidoaqui é extr<strong>em</strong>amente diferente do praticado <strong>em</strong> qualquer outra geografia. NoModernismo paulista, de forma totalmente inusita<strong>da</strong>, fundiu-se Futurismo comTradição, Internacional com Regional.A moe<strong>da</strong> que representava o pensamento modernista na ci<strong>da</strong>de tinha numaface Oswald e na outra, Mário de Andrade. “O fanfarrão e o scholar... juntosrepresentavam a síntese do intelectual paulistano”. (9) E explicam essa dupla direção,as paralelas que se encontram <strong>da</strong> Arte Moderna de SP. Oswald viaja várias vezespara a Europa, se mantém provocador e iconoclasta o t<strong>em</strong>po todo, enquanto Márionunca saiu do país, mergulhou no interior <strong>da</strong>s culturas regionais e primitivas do Brasile foi enquadrado pelo conhecimento <strong>da</strong> nova Acad<strong>em</strong>ia. A própria orig<strong>em</strong> mestiça ejesuítica ao mesmo t<strong>em</strong>po, também explica essas antíteses na cultura <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de, opositivo e negativo <strong>da</strong>s vanguar<strong>da</strong>s européias <strong>em</strong> harmônica convivência.“Entre 1922 e 1930, do festival <strong>da</strong> S<strong>em</strong>ana à revolução política, de um a outrodesses marcos heterogêneos, o movimento, como nos mostram os fatos <strong>da</strong> história7. SAIA, L., op.cit. p. 217.8. AMARAL, A. A. op. cit. p. 69.9. Antônio Gonçalves Filho.? O Estado, 18/01/2004. p. C3.
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