3. XIX: CENTRO ACADÊMICOO Brasil inicia o século XIX com um fato marcante, o des<strong>em</strong>barque no Rio deJaneiro <strong>da</strong> corte de D. João VI fugi<strong>da</strong> de Napoleão, <strong>em</strong> 1808, e a conseqüenteabertura dos portos brasileiros para o mercado internacional livre, para o b<strong>em</strong> e para omal, pois a estrutura econômica colonial imposta por Portugal <strong>em</strong> na<strong>da</strong> capacitava oBrasil para competir de forma ativa nesse mercado.Quatorze anos depois é declara<strong>da</strong> a Independência do país pelo prínciperegente, de passag<strong>em</strong> por SP. Essas grandes mu<strong>da</strong>nças ao nível políticoadministrativo<strong>em</strong> pouco afetaram a situação morfológica e cultural de SP. O período éexatamente marcado pela afirmação política <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de perante a nova reali<strong>da</strong>de doImpério e os novos rumos políticos <strong>da</strong> nação. A situação que lhe é coloca<strong>da</strong>, capital <strong>da</strong>província, estabelece as bases para seu posicionamento de grande centro político <strong>da</strong>extensa área agora, depois de três séculos, ocupa<strong>da</strong> no planalto e que sofrerá grandeexplosão urbana no período do café.A afirmação política cobre o período <strong>da</strong> Independência até a Revolução de1842. O movimento liberal reforça a condição de isolamento e relativa autonomia dospaulistas <strong>em</strong> relação ao governo central e às influências culturais vin<strong>da</strong>s <strong>da</strong> Corte.Contudo, e até por conta desse processo que se estende desde a fun<strong>da</strong>ção, asocie<strong>da</strong>de permanece provinciana, volta<strong>da</strong> para o seu interior, só que agora o seuinterior não é somente o centro urbanizado, mas sim uma extensa hinterlândia e além.A vi<strong>da</strong> na província ain<strong>da</strong> é carrega<strong>da</strong> de sua tradição comunal. O famoso casoenvolvendo o Imperador e Domitila de Castro Melo, a Marquesa de Santos, e aimportância que ela vai ocupando na cena cultural <strong>da</strong> ci<strong>da</strong>de d<strong>em</strong>onstram essacondição.Da mesma maneira, a forma urbana permanece praticamente circunscrita àsapresenta<strong>da</strong>s nos século anteriores, assim descrita por Morse. “...ao t<strong>em</strong>po <strong>da</strong>Independência, São Paulo ain<strong>da</strong> conservava certos características <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>derural que se sustentava <strong>em</strong> grande parte com sua própria policultura. O plano de ruas,a maneira de viajar e as rotas segui<strong>da</strong>s, os materiais de construção, os processos decultivar a terra, foram espontaneamente determinados pelo ambiente e poucomu<strong>da</strong>ram com o passar dos séculos.” (1)As causas que imped<strong>em</strong> o povoado de se desenvolver culturalmente, nasmesmas condições que politicamente, encontram-se na economia estagna<strong>da</strong>, s<strong>em</strong>qualquer inserção no mercado externo, brasileiro e internacional, e por continuar <strong>em</strong>substancial isolamento geográfico. A penosa viag<strong>em</strong> pela serra tornava a única funçãoexpressiva do povoado, a cabeça de ponte do planalto com o litoral, incompleta. Ocenário até então era contrário a um franco desenvolvimento material e cultural dopovoado.“Após a era <strong>da</strong>s bandeiras, nos séculos XVII e parte do XVIII, a antigaprovíncia de São Paulo permaneceu durante quase 100 anos <strong>em</strong> estado acentuado depobreza; somente depois de 1860 é que a produção cafeeira começou a terimportância. Os documentos antigos preferiram referir-se aos paulistas e não a SãoPaulo; o destaque urbano <strong>da</strong> Capital só apareceu com as estações de estra<strong>da</strong>s deferro e a cultura do café”. (2)Paralelamente, e no mesmo nível, aos importantes fatos políticos no início dosoitocentos, dev<strong>em</strong>os considerar, <strong>em</strong> termos de cultura artística, a chega<strong>da</strong> <strong>da</strong> MissãoFrancesa no Rio <strong>em</strong> 1816. Junto com a moralização artística proposta peloneoclássico, implanta-se uma retalha<strong>da</strong> visão do Iluminismo propondo romper com as1. MORSE, R.M., op. cit. p. 53.2. PORTO, A. R., op. cit. p. 47
tradições culturais <strong>da</strong> colônia, sinônimo de atraso. De tal forma é instala<strong>da</strong> no Rio aEscola Real de Ciências, Artes e Ofícios <strong>em</strong> agosto de 1816, para <strong>da</strong>r orig<strong>em</strong> àAcad<strong>em</strong>ia Real <strong>da</strong>s Artes <strong>em</strong> 1820. As artes brasileiras aproximam-se <strong>da</strong>s técnicas et<strong>em</strong>as europeus como nunca antes. Mesmo o Barroco brasileiro, totalmente submersono horizonte de colônia extrativista no ciclo do ouro, operou a<strong>da</strong>ptações às situaçõesregionais <strong>em</strong> alto grau. A Acad<strong>em</strong>ia por prerrogativas opera a normatização <strong>da</strong>slinguagens.Tal panorama aplicado à ci<strong>da</strong>de de taipa paulistana, deveria detonartransformações radicais. Contudo, quase na<strong>da</strong> pod<strong>em</strong>os observar <strong>da</strong> presença <strong>da</strong>Missão ou <strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia na cultura de SP até meados do XIX.Mais significativo para a ci<strong>da</strong>de foi a implantação <strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia de Direitopoucos anos depois <strong>da</strong> Independência. “...o ensino superior e não o el<strong>em</strong>entar que setornou o mais poderoso agente de cosmopolização. Desde que se abriram sua portas,<strong>em</strong> março de 1828, a Acad<strong>em</strong>ia de Direito foi por muitos decênios o centro vital <strong>da</strong>ci<strong>da</strong>de. Atraía alunos e professores de todo o país e de fora. Com estes vieramnecessi<strong>da</strong>des e atitudes que iriam lançar o fermento na comuni<strong>da</strong>de introverti<strong>da</strong>.Vieram os costumes mun<strong>da</strong>nos; as idéias e paixões políticas a transcender<strong>em</strong> ocontexto local; a necessi<strong>da</strong>de de teatros, jornais, livrarias, bailes e pontos de reuniõesnão formais, como os cafés; o ceticismo dos acadêmicos s<strong>em</strong>pre pronto a desarticularos estreitos padrões <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> provinciana.” (3) . Um ano após a instalação do curso dedireito, de forma precária no convento dos franciscanos, começa a circular O FarolPaulistano, primeiro jornal de SP.Apesar do clima urbano contido nas farras, até folclóricas, dos estu<strong>da</strong>ntes, quetanto marcarão as crônicas oitocentistas, elas são muito pouco significativas paraidentificarmos um ambiente cultural intenso na ci<strong>da</strong>de. A inanição cultural permanece.O próprio declínio <strong>da</strong> Acad<strong>em</strong>ia de Direito nos anos ‟30 d<strong>em</strong>onstra o limitado alcanceque o núcleo acadêmico tinha, <strong>em</strong> 1831 formaram-se 6 alunos e <strong>em</strong> 1840, sete. (4)Contudo, a Acad<strong>em</strong>ia se constituirá no grande centro gerador de idéias quando oambiente urbano lhe for mais favorável.Até meados do século não o era, principalmente a matéria urbana,morfologicamente SP ain<strong>da</strong> permanece uma vila: “Em 1822, por ocasião <strong>da</strong>proclamação <strong>da</strong> Independência do Brasil, São Paulo era uma pequena ci<strong>da</strong>de, de ruaspouco extensas, estreitas e tortuosas, onde se movia uma população que o censo feitono final do ano informa elevar-se apenas a 6.920 almas. O perímetro urbanoconstrangia-se na estreita área entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí, corta<strong>da</strong> por38 ruas, 10 travessas, 7 pátios e 6 becos.” (5)***- O café – motor econômicoA partir de meados do século a monocultura do café irá constituir-se no motoreconômico para intensas mu<strong>da</strong>nças nos rumos <strong>da</strong> ain<strong>da</strong> pequena vila de São Paulode Piratininga. O café esta sendo plantado no Brasil e exportado desde o início doséculo, concentrado basicamente no vale do Paraíba. Essa produção é escoa<strong>da</strong> pelosportos próximos, Parati, Ubatuba ou pelo Rio de Janeiro. Quando a expansão cafeeiraatinge o noroeste <strong>da</strong> província, SP, na situação geográfica que motivou sua orig<strong>em</strong> naocupação do planalto, assumirá o posto de gargalo por onde passará to<strong>da</strong> a produçãodo estado, produção essa <strong>em</strong> expansão geométrica, <strong>em</strong> direção ao porto de Santos.O fenômeno econômico de que se constitui o café, não só para SP, mas para oBrasil entre meados do XIX até 1930, são imensamente conhecidos, b<strong>em</strong> como atransformação <strong>da</strong> vila <strong>em</strong> metrópole. O que é necessário é apresentar algumasquestões a respeito <strong>da</strong> metrópole cafeeira e sua cultura.3. MORSE, R.M., op. cit. p. 83.4. Id<strong>em</strong>, p. 93.5. PORTO, A. R., op. cit. p. 39
- Page 1 and 2: SP.CULTURAJorge Bassani* Capítulo
- Page 3 and 4: 2. SP Império, século XIX, o ambi
- Page 5 and 6: Compondo o quadro, é a conseqüent
- Page 7: Ouvidor feita por Militão de Azeve
- Page 11 and 12: Academia de Direito: “Reduzido a
- Page 13 and 14: pela República altera significativ
- Page 15 and 16: De suas casas em SP, a de João Den
- Page 17 and 18: no Vale do Anhagabaú em frente ao
- Page 19 and 20: na economia cafeeira, acima de qual
- Page 21 and 22: 1922, no ano da SAM, junto aos bair
- Page 23 and 24: voltar de uma temporada de estudos
- Page 25 and 26: imigração se intensifica ainda ma
- Page 27 and 28: contra a arte abstrata. Da mesma fo
- Page 29 and 30: invenções construtíveis. De pref
- Page 31 and 32: Nesse sentido trabalharam profundam
- Page 33 and 34: 6. ANOS 70: A NOVA REALIDADE URBANA
- Page 35 and 36: Todavia, a par dessas heranças dos
- Page 37 and 38: 6.2- A cultura underground e de pes
- Page 39 and 40: expressões, o trabalho de Regina t
- Page 41 and 42: 6.3 ...e a arquitetura?De todas as
- Page 43 and 44: mais profundas de como reorganizar
- Page 45 and 46: subterrâneo, do centro para o sul