15.02.2018 Views

VOi Fevereiro/2018

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

HISTÓRIAS<br />

O Velho e o Cinema<br />

O<br />

velho – mas não tão velho assim, na realidade<br />

talvez ainda esteja mais para meia idade<br />

– se espanta logo depois de passar a última<br />

cena. Mas que coisa é essa agora? Por que<br />

acender a luz logo que o filme acaba? Estão<br />

nos expulsando da sala? Quem teve a infeliz ideia? Essa é<br />

só mais uma das coisas que estranha quando vai ao cinema<br />

agora. Como todo mundo que envelhece, ele é saudosista<br />

de sua época, que era muito melhor que a atual, como todo<br />

velho acha.<br />

Pra que toda essa pipoca, refrigerante, não comeram<br />

em casa?, fica matutando quando vê os enormes potes e<br />

copos cheios de comida e líquido, que o pessoal chama<br />

de combo (combo?). Antes era só um saquinho de pipoca,<br />

uma balinha e olhe lá – compradas no carrinho do pipoqueiro<br />

ou do senhor que carregava um caixote com gostosuras<br />

– porque a gente ia no cinema pra ver filme, não<br />

pra comer, o lanche era depois, uma pizza lá no Savoia,<br />

com vitamina. A mãe e o pai gostavam de uma coalhada na<br />

Schaffer também.<br />

Já não eram mais os tempos de gala da Cinelândia curitibana,<br />

com os Cines Avenida, Palácio, Ópera e Odeon,<br />

nos quais os pais até namoraram, mas a capital tinha ainda<br />

mais salas na região central – Vitória, Bristol, Cinema 1,<br />

Lido, Condor, Astor, Plaza, Glória (quando ainda não passava<br />

os filmes de sacanagem), Rívoli, São João, Groff, Luz,<br />

Ritz, todos cinemas de rua – nos anos 1980, abriram alguns<br />

em centros comerciais, o Cine Itália, o Palace Itália e o<br />

Novo Batel. Tinha também o Ribalta no Cabral, mas nesse<br />

só foi uma vez.<br />

As sessões eram corridas, às 14h, 16h, 18h, 20h e 22h.<br />

E dava para entrar a hora que quisesse, ficar de uma sessão<br />

para outra. Se você perdia o começo do filme era<br />

só esperar um pouco começar a outra<br />

sessão para conferir o início. Ele lembra<br />

das matinês em que brincava pela sala<br />

com outras crianças na primeira sessão<br />

e depois via o filme na outra, isso quando<br />

o filme era legal, pois se não fosse, a<br />

brincadeira continuava. Recorda também<br />

que Os Trapalhões vinham sempre lançar<br />

seus filmes no Cine Vitória, uma bagunça<br />

generalizada na gigantesca sala para quase 2 mil pessoas,<br />

mas no final dava tudo certo. Depois vieram as tardes e<br />

noites de namoro, quando o que passava na tela até era o<br />

que menos importava.<br />

As salas não tinham essas novidades (frescuras) de hoje<br />

em dia, lugar marcado, poltrona que mexe (que o velho<br />

estranha, mas até curte em alguns filmes). Algumas tinham<br />

grande conforto como as do Condor, do Astor, outras nem<br />

tanto, eram só cadeiras simples como no Groff. Às vezes,<br />

era difícil ver quando sentava uma pessoa muito alta na sua<br />

frente, porque as salas não eram no tal esquema de estádio,<br />

mas era só trocar de lugar.<br />

E era principalmente barato, havia salas de cinema em<br />

qualquer cidade, todo mundo podia pagar, não era uma<br />

coisa de shopping, elitista. Estava de bobeira no centro, tinha<br />

um tempo livre, entrava na salinha e curtia uma sessão<br />

– alguns até matavam aula ou trabalho para ver um filme.<br />

Ah, mas hoje dá pra ver na televisão, no computador,<br />

no tablet, no celular. Mas isso não é cinema. Cinema é a<br />

sala grande, a luz projetada na tela, a experiência emocionante<br />

dividida com outras pessoas, sim outras pessoas,<br />

mas gente que respeita o ritual, não alguns muitos de hoje<br />

em dia, que passam o tempo inteiro olhando a telinha do<br />

aparelhinho que não conseguem largar, ou que não param<br />

de falar porque pensam que estão na sala de casa vendo<br />

novela (alguns filmes até parecem novela, mas aí já é outra<br />

história).<br />

Mesmo com todas as (más) novidades, o velho continua<br />

e continuará indo ao escurinho do cinema, e, como diz a<br />

Rita (Lee), “chupando drops de anis, longe de qualquer<br />

problema, perto de um final feliz”.<br />

Foto: divulgação<br />

Por Rudney Flores<br />

74<br />

FEVEREIRO <strong>2018</strong><br />

revistavoi.com.br

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!