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O CONTRAPONTO DA RECEITA<br />
A Receita Federal contesta o resultado apontado para o <strong>Brasil</strong><br />
no relatório Doing Business do Banco Mundial. Baseada em um<br />
levantamento paralelo, a Receita apurou que o tempo gasto com<br />
o pagamento de impostos no país é de apenas 600 horas por ano<br />
– bem menos do que as 2,6 mil horas calculadas pela instituição<br />
internacional. A diferença, no entanto, não chega a ser digna de<br />
alento. Considerando-se somente o resultado obtido pela Receita,<br />
o <strong>Brasil</strong> ainda ocuparia o 178° lugar no ranking dos países em que<br />
mais se perde tempo pagando impostos, à frente apenas da República<br />
do Congo, Senegal, Camarões, Equador, Chade, Mauritânia,<br />
Venezuela, Vietnã, Líbia, Nigéria e Bolívia.<br />
os compromissos, as empresas têm<br />
de manter estruturas e equipes dedicadas<br />
à tarefa de destrinchar a<br />
legislação e as prováveis interpretações<br />
que o Fisco dará a elas. Um<br />
estudo da consultoria Deloitte mostra<br />
que, além da carga tributária em<br />
si, as empresas brasileiras com faturamento<br />
de até R$ 100 milhões<br />
têm de gastar até 3,53% de sua<br />
receita com a manutenção de uma<br />
área de compliance tributário.<br />
A cada dia,<br />
31 novas regras<br />
Em parte, a complexidade tributária<br />
do <strong>Brasil</strong> nasce no próprio sistema<br />
legislativo, que não hesita em<br />
criar novas leis e emendas sobre o<br />
tema. Desde a promulgação da Constituição<br />
de 1988, foram editadas nada<br />
menos que 352 mil normas sobre<br />
impostos da União, estados e municípios<br />
brasileiros, segundo um estudo<br />
publicado em outubro de 2015<br />
pelo Instituto <strong>Brasil</strong>eiro de Planejamento<br />
Tributário (IBPT). É o equivalente<br />
a 31 mudanças fiscais por dia<br />
– o que resulta não só em dificuldades,<br />
mas também em insegurança jurídica.<br />
O IBPT calcula que, na média, cada<br />
empresa brasileira siga 3,6 mil<br />
normas diferentes. O custo para<br />
obedecê-las chegaria a um total de<br />
R$ 50 bilhões, aí incluídas desde a<br />
contratação de consultorias e profissionais<br />
para interpretar as normas até<br />
a aquisição de material e equipamentos<br />
necessários para se manter em<br />
dia com as regras do Fisco.<br />
Só que os novos regramentos se<br />
baseiam em um sistema tributário<br />
já anacrônico. Basta ver o exemplo<br />
do setor de bens e serviços: as empresas<br />
que atuam nesse mercado<br />
atendem a nada menos que quatro<br />
compromissos diferentes. Na esfera<br />
federal, há o Imposto sobre Produtos<br />
Industrializados (IPI), os Programas<br />
de Integração Social e de<br />
Formação do Patrimônio do Servidor<br />
Público (PIS/Pasep) e a Contribuição<br />
para Financiamento da Seguridade<br />
Social (Cofins). Nos estados, há o<br />
ICMS – com 27 legislações distintas.<br />
Nos municípios, o tributo é o ISS. À<br />
exceção do IPI, todos os demais impostos<br />
são cumulativos. Ou seja, são<br />
cobrados em todas as etapas da cadeia<br />
de produção e incidem uns sobre<br />
os outros, gerando o famoso<br />
efeito cascata. O montante de tributos,<br />
claro, é transferido ao último<br />
elo da cadeia – o consumidor final,<br />
que sofre para estimar quanto de<br />
impostos está pagando. De quebra,<br />
essas taxas prejudicam a competitividade<br />
de todas as empresas que<br />
compõem essa cadeia produtiva.<br />
Com um dos sistemas tributários<br />
mais labirínticos do mundo, o<br />
<strong>Brasil</strong> inteiro sofre para ganhar espaço<br />
nos fluxos de comércio internacional,<br />
que são vitais para gerar<br />
empregos e renda no plano doméstico.<br />
Envoltas em uma infinidade<br />
de regulamentos, normas, compromissos<br />
e exceções às regras, as<br />
empresas brasileiras são obrigadas<br />
a dedicar energia e recursos a tarefas<br />
que nem sempre melhoram<br />
sua capacidade de competir. Por<br />
exemplo: para cumprir com todos<br />
Dificilmente você<br />
encontrará um país<br />
com um sistema<br />
tributário tão<br />
confuso quanto<br />
o <strong>Brasil</strong>.<br />
Bernard Appy,<br />
diretor do Centro<br />
de Cidadania Fiscal<br />
Foto: Divulgação<br />
60 brasil novembro de 2016