Gestão Hospitalar N.º 18 2019
Novo ciclo político Intervir no coração do SNS: motivação dos profissionais Qualidade e segurança do doente | As pessoas fazem a mudança Resistência a antimicrobianos | Infeções associadas a cuidados de saúde e resistência aos antimicrobianos: a estratégia seguida no CHEDV Refundar os cuidados de saúde primários - um caminho na direção da cobertura universal de saúde Adelaide Belo. cuidados integrados centrados nas pessoas Otimização da gestão segura entre o Hospital Vila Franca de Xira, o ACES Estuário do Tejo e as escolas Segurança do doente - eventos adversos relacionados com o medicamento em contexto intra-hospitalar Efeitos da utilização das terapêuticas não convencionais e análise da possível integração no Serviço Nacional de Saúde Congresso EAHM 2019, Ghent APAH promove visita técnica a hospitais belgas de gestores hospitalares portugueses no âmbito do EAHM2019 Prémio Healthcare Excellence Prémio reconhece as melhores práticas de gestão em saúde Fórum do Medicamento A equidade, a efetividade e a sustentabilidade no acesso à inovação marcam a 11.a edição do Fórum do Medicamento Homenagem aos sócios de honra e mérito da APAH Cerimónia comemorativa dos 50 anos da Administração Hospitalar em Portugal
Novo ciclo político
Intervir no coração do SNS: motivação dos profissionais
Qualidade e segurança do doente | As pessoas fazem a mudança
Resistência a antimicrobianos | Infeções associadas a cuidados de saúde e resistência aos antimicrobianos: a estratégia seguida no CHEDV
Refundar os cuidados de saúde primários - um caminho na direção da cobertura universal de saúde
Adelaide Belo. cuidados integrados centrados nas pessoas
Otimização da gestão segura entre o Hospital Vila Franca de Xira, o ACES Estuário do Tejo e as escolas
Segurança do doente - eventos adversos relacionados com o medicamento em contexto intra-hospitalar
Efeitos da utilização das terapêuticas não convencionais e análise da possível integração no Serviço Nacional de Saúde
Congresso EAHM 2019, Ghent
APAH promove visita técnica a hospitais belgas de gestores hospitalares portugueses no âmbito do EAHM2019
Prémio Healthcare Excellence
Prémio reconhece as melhores práticas de gestão em saúde
Fórum do Medicamento
A equidade, a efetividade e a sustentabilidade no acesso à inovação marcam a 11.a edição do Fórum do Medicamento
Homenagem aos sócios de honra e mérito da APAH
Cerimónia comemorativa dos 50 anos da Administração Hospitalar em Portugal
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
GH Qualidade e segurança do doente<br />
"AS PESSOAS<br />
FAZEM A MUDANÇA"<br />
Rui Cortes<br />
Consultor e fundador da Lean Health Portugal<br />
“<br />
People Make Change” foi a frase do International<br />
Forum on Quality&Safety for<br />
Healthcare, que decorreu em Glasgow,<br />
na Escócia, na última semana de março<br />
passado. Sem as pessoas não podemos<br />
mudar a cultura dos sistemas e das organizações de<br />
saúde, esta foi sem dúvida a mensagem e aprendizagem<br />
principal deste evento em que todos os profissionais<br />
têm duas responsabilidades: “Do their Job, Improve<br />
Their Job”.<br />
São três os pilares em que as pessoas têm de assegurar<br />
as condições para que se possa implementar uma cultura<br />
de mudança e melhoria contínua, e que passam pelo:<br />
1. papel e postura das lideranças de topo, mas também<br />
intermédias;<br />
2. facto dos profissionais se sentirem como verdadeiros<br />
agentes da mudança, atribuindo, assim, um maior significado<br />
e prazer no seu trabalho; e<br />
3. envolvimento dos utentes como agentes de mudança<br />
e geradores de inovação nos cuidados de saúde.<br />
No que aos gestores de topo diz respeito, e tendo tido<br />
oportunidade de participar na sessão apenas dedicada a<br />
“CEOs”, fica evidente que as preocupações são as mesmas<br />
entre os vários países, onde a grande mensagem foi<br />
a de que o líder tem de partir do pressuposto que pode<br />
estar errado. Saber fazer as questões certas e apoiar os<br />
diversos profissionais, num ambiente de confiança, na<br />
procura das respostas a essas questões, é fator crítico de<br />
sucesso sendo um papel do qual não se pode demitir.<br />
A mudança precisa de uma clareza no propósito, apoiada<br />
pela coragem necessária; só assim podemos assegurar<br />
a primeira parte da “Trilogia de Juran”, acerca da<br />
Planificação da Qualidade. Este planeamento deve ser<br />
alinhado com os objetivos estratégicos da organização,<br />
ou então resultar da voz dos utentes no que diz respeito<br />
a fatores que condicionam os mesmos a terem uma<br />
experiência, nos serviços de saúde, com qualidade.<br />
É, no entanto, essencial, “os gestores de topo, terem o<br />
domínio sobre a psicologia da mudança, e sobre o facto<br />
de”, segundo Henry Timms, “estarmos a assistir ao<br />
chamado novo poder”, o que obriga a mudanças claras<br />
no estilo de liderança e nas estratégias usadas para assegurar<br />
o necessário envolvimento dos profissionais de<br />
saúde, para que se sintam como agentes de mudança.<br />
Um dos exemplos muito falado por vários presidentes<br />
de hospitais é a criação de um standard work em que,<br />
no mínimo, seja definido um dia por semana, sempre<br />
ao mesmo dia, sempre à mesma hora, em que os elementos<br />
do conselho de administração, durante uma<br />
ou duas horas, se dedicam exclusivamente a visitar os<br />
diversos serviços, a fim de conhecer os problemas,<br />
acompanhar e monitorar as melhorias, bem como desbloquear<br />
barreiras para as mesmas.<br />
Assim, o que se espera de um líder de topo não é quem<br />
resolva problemas, mas sim quem apoia e incentiva a<br />
resolução dos mesmos, que define objetivos claros,<br />
quem vai ao “terreno”, quem define qual o método de<br />
melhoria contínua a ser usado, quem cria uma cultura<br />
de transparência onde o erro é a melhor oportunidade<br />
de melhoria, seguindo a máxima de que “Confiem nas<br />
pessoas, ataquem os processos”. Ademais, um hospital<br />
que não identifica erros, não protege os seus doentes.<br />
Passando aos profissionais… são eles os verdadeiros<br />
agentes de mudança, numa cultura de transparência,<br />
suportados por líderes que assegurem uma visão clara<br />
e criem um ambiente seguro, levando, assim, a que os<br />
profissionais sintam o ímpeto da mudança. Para que tal<br />
aconteça, são essenciais os outros dois elementos da<br />
“Triologia de Juran”: o controlo de qualidade e a melhoria<br />
continua da qualidade.<br />
No que diz respeito ao controlo de qualidade, implica<br />
uma clara definição de quais os standards pretendidos<br />
em cada processo, de forma a que se possam listar os<br />
indicadores de processos e resultados, assentes em<br />
ferramentas de gestão visual, permitindo os huddles<br />
meetings diários, ou no mínimo semanais, e em que<br />
haja uma clara identificação de quais os problemas ou<br />
situações que têm de ser de imediato escaladas para<br />
a gestão de topo.<br />
Os huddles meetings, assentes na chamada “gestão diária”,<br />
são a ferramenta mais importante para assegurar<br />
uma verdadeira cultura de melhoria continua, em que,<br />
pela minha experiência, por vezes é condição suficiente<br />
para mudar resultados, mesmo sem haver qualquer<br />
alteração nos processos. Não obstante, tem-se revelado<br />
algo difícil implementar nos hospitais portugueses,<br />
o que nos impele a pensar sobre o que está a falhar na<br />
forma como está a ser apresentado, e não na culpabilização<br />
de quem resiste à sua implementação. Os huddles<br />
meetings são reuniões, em pé, de não mais de 15<br />
minutos, sempre à mesma hora e/ou no mesmo dia, no<br />
mesmo local, onde é feita uma monitoração dos quatro<br />
ou cinco indicadores que estão a ser acompanhados,<br />
e se definem medidas de implementação imediata ou<br />
se identificam pontos críticos que necessitam de recursos.<br />
São um primeiro passo para a gradual passagem<br />
de uma qualidade retrospetiva para uma qualidade em<br />
tempo real.<br />
Sem prejuízo do atual estado da arte em Portugal, o que<br />
ainda não referi no que diz respeito às pessoas fazerem<br />
a mudança, sendo indubitavelmente o aspeto mais importante,<br />
é que se assiste a uma gradual implementação<br />
desta prática, devendo adotar-se um verdadeiro trabalho<br />
de envolvimento, menos paternalista e determinista.<br />
Importa ainda referir os utentes e suas famílias, parte<br />
ativa e central nos processos de codesign e de cocriação,<br />
agora centrais no processo, não só no desenho de<br />
como deve ser construída a sua experiência no seu percurso<br />
nos cuidados de saúde, mas também na forma como<br />
esses desenhos são implementados e sustentados.<br />
Esta coprodução deve ser adaptada a cada local, uma<br />
vez que as iniquidades são muito grandes, inclusivamente<br />
dentro da mesma cidade. Não pode haver uma solução<br />
forçada para todos os locais, sem as devidas adaptações<br />
através do envolvimento dos utentes. A título de<br />
exemplo, refere-se o caso da diferença de 21 anos na<br />
esperança média de vida entre um extremo do metro<br />
de Londres e o outro extremo, o que deve ser tido em<br />
conta quando procuramos forçar soluções para realidades<br />
distintas, mesmo que pareçam estar ali ao lado.<br />
Para que todo este paradigma se torne uma realidade,<br />
impera (i) assegurar uma adequada e moderna capacitação<br />
de líderes, não só na metodologia de melhoria<br />
contínua, mas também na psicologia da mudança, (ii)<br />
bem como capacitar e envolver utentes e famílias em<br />
processos de cocriação e codesign.<br />
Sem esta capacitação alinhada e complementar, correse<br />
o risco claro de ser só uma das partes da equação<br />
a falar uma linguagem de mudança, criando ainda mais<br />
“silos” nas organizações em geral e no setor da saúde<br />
em particular.<br />
Desta forma estaremos em condições de assegurar<br />
melhores outcomes de saúde, beneficiar as experiências<br />
do doente e dos profissionais e aumentar o valor dos<br />
cuidados prestados.<br />
Juntando estes fatores, o Ministério da Saúde Escocês<br />
criou o conceito de Medicina Realística, que é composto<br />
por uma tomada de decisão partilhada, em detrimento<br />
de uma decisão assente na autonomia dos<br />
profissionais. Trata-se de uma abordagem personalizada<br />
nos processos de cuidados, onde se assegura uma<br />
redução do desperdício, principalmente em situações<br />
em que o doente seja lesado, reduzindo variações desnecessárias<br />
nos cuidados prestados e nos outcomes,<br />
assente numa melhor gestão de risco e onde todos<br />
possam ser “agentes de melhoria” e inovadores.<br />
Segundo os autores de Compassionomics, estamos ou<br />
inevitavelmente caminharemos para uma era além da<br />
empatia (quiçá compaixão), o que se revela crucial na<br />
saúde, onde, por exemplo, doentes terminais tendem<br />
a valorizar mais esse fator do que aspetos associados<br />
ao tratamento ou à sobrevida, preferindo, ao invés,<br />
poderem estar assintomáticos e passarem mais tempo<br />
com as suas famílias.<br />
A abordagem assente na compaixão remete para a<br />
questão “o que importa para si?”, evitando a decisão<br />
pelo doente ou pelo profissional sobre o que importa<br />
para ele, engrandecendo aspetos tão simples como<br />
a hora das marcações (um dos “pormenores” mais valorizados).<br />
Estas situações permitem reforçar as relações<br />
entre profissionais, gestores, comunidade e utentes,<br />
criando, assim, condições para um ambiente mais<br />
propício à mudança e assente em confiança e foco no<br />
bem-estar, quer de doentes quer dos profissionais.<br />
Resumindo, parafraseando Gary Kaplan, CEO do Virginia<br />
Mason Medical Centre, a qualidade nas organizações<br />
de saúde parte de uma clara visão que se concretiza<br />
com: “respeito pelas pessoas”, “envolvimento dos<br />
profissionais e das equipas”, “obsessão pela qualidade<br />
através da redução do desperdício” e uma cultura de<br />
inovação onde haja espaço para PDSA (Plan- Do-Study-Act),<br />
de forma a uma permanente procura de fazer<br />
melhor.<br />
Com efeito, fazendo bem à primeira e reduzindo desperdícios,<br />
bem como a variação nos processos, os custos<br />
são em si mesmo impactados no sentido decrescente.<br />
Em jeito de conclusão, as pessoas fazem as mudanças<br />
e os líderes têm de partir do pressuposto humilde que<br />
podem estar errados! Ã<br />
12 13