Revista Fenacerci 2020
A FENACERCI disponibiliza a 27º Edição da Revista FENACERCI.
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prolongando-se no tempo e surgindo repetidas
vezes.
Enquanto experiência que envolve sensações e
emoções desagradáveis, a dor pode ser descrita
por palavras como “picada, pontada, moinha,
peso, …” ou “insuportável, horrível, …”. Mas a incapacidade
de verbalizar a dor não nega a possibilidade
de que um indivíduo a sinta e tenha
necessidade de tratamento para a aliviar.
Hoje sabemos que as pessoas com problemas de
desenvolvimento podem ter dor pelas mesmas
causas que a restante população e têm, além
disso, dores que resultam dos seus problemas
neurológicos, músculo esqueléticos e outros. A
sua condição clínica expõe-nas a tratamentos e
cirurgias de que as outras crianças da mesma
idade não necessitam. Por exemplo, crianças e
jovens com paralisia cerebral necessitam, muitas
vezes, de tratamentos dentários ou cirurgias
para corrigir deformidades, os quais acarretam
dor aguda. Também sofrem de dor crónica relacionada
com a sua espasticidade e posições
desalinhadas da cabeça, do tronco e dos membros.
A fisioterapia de que necessitam pode
também ser dolorosa. O refluxo gastro esofágico
e a obstipação são outra causa frequente de
dor. Crianças com Síndroma de Down, não raro,
têm doenças cardíacas e leucemias. Ou seja, os
estudos indicam que pessoas com problemas de
desenvolvimento têm dor, aguda e crónica, com
maior frequência e intensidade do que a população
em geral.
Ora, quando alguém tem dor, a verbalização
dessa dor, ou autorrelato, é a forma mais comum
e mais fácil de comunicar a dor. E é fácil
de entender por parte de cuidadores e profissionais.
Assim, as pessoas que se expressam de maneira
diferente do habitual ficam em desvantagem
para comunicar a sua dor. A nossa capacidade
de sabermos se têm dor é, pois, inferencial, isto
é, baseia-se na nossa interpretação das suas expressões
e comportamentos. Como já dissemos,
é uma questão de comunicação: o que me está a
“dizer” a pessoa com dor? O que a estou a “ouvir
dizer”?
Dum lado e do outro há muitos fatores a influenciar.
Por um lado, a experiência de dor (sensações,
emoções e pensamentos) é influenciada
por fatores biológicos, genéticos, experiências
anteriores, mas também do contexto em que
ocorre a dor; a expressão da dor depende do
repertório de linguagem e das habilidades motoras.
Muitas manifestações não são específicas
da dor (como a expressão facial, o choro, as vocalizações
ou a agitação motora) e algumas podem
ser atípicas, como os problemas de sono,
manifestações de ansiedade, problemas gastrintestinais,
exacerbação de comportamentos
de autoagressão. O repertório destas manifestações
também é variável, por exemplo, os autistas
têm um leque de expressões faciais menor,
por isso podem mostrar menos expressão
facial, embora tenham mais aceleração cardíaca
quando se colhe sangue, o que mostra a ativação
do seu sistema de stress perante um estímulo
doloroso. Enquanto o autorrelato da dor é,
geralmente, paralelo à experiência de dor, estas
outras manifestações podem ser discordantes
ou estar desfasadas, sobretudo em pessoas com
problemas de desenvolvimento. As suas formas
de expressão verbal e não-verbal podem ser
ambíguas, tornando difícil aos familiares, cuidadores
e profissionais de saúde saberem se se
trata de dor, e se esta necessita de ser tratada.
Por outro lado, a avaliação da dor depende da
atenção, sensibilidade, atitude e empatia do
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