Revista Fenacerci 2020
A FENACERCI disponibiliza a 27º Edição da Revista FENACERCI.
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OPINIÃO
eram Trissomia 21 e, em certa medida, paralisia cerebral”
(5)
A personalidade, sendo crucial na forma como a
pessoa lida com os sintomas como já dissemos, tem
um papel particularmente significativo nas pessoas
mais diferentes, como as pessoas que lidam
com situações identificadas como “deficiência”. A
personalidade é definida como um modo de ser
estável no tempo, identificador da pessoa na sua
relação consigo própria e com o mundo, e resultante
de fatores inatos, eminentemente biológicos,
e outros adquiridos ao longo do desenvolvimento
da pessoa até à idade adulta. Há a tendência a valorizar
sobretudo os fatores relacionais associados
ao desenvolvimento psico-afetivo e à educação da
pessoa, na construção da sua personalidade, talvez
porque a pespetiva compreensiva da maneira de ser
das pessoas é humanamente mais fácil de apreender,
e também mais aliciante. Maldosamente, alguém
dizia que “a psicanálise é uma mentira muito
bem contada”. Sem adotarmos posições extremistas
como esta, temos no entanto de salvaguardar
os aspetos biológicos referidos na definição que
apresentámos de personalidade. Há de facto, sem
que se compreenda, mas porque é a natureza mais
íntima, primária, e essencial da pessoa, um modelo
afetivo que determina, a prióri, a forma como a pessoa
se relaciona consigo e com o mundo. É a partir
desta base que a construção da pessoa se vai organizando.
Infelizmente, as tendências inatas tendem
a ver-se reforçadas nas interações com os outros.
A psicologia animal ajuda-nos nesta compreensão.
Se um indivíduo se sente frágil junto do outro, e por
isso assume uma atitude passiva, o outro é automaticamente
colocado numa posição mais proativa, e
por isso tende a dominá-lo, acentuando essa fragilidade.
Se se sente inseguro e por isso assume uma
postura defensiva, o outro é colocado na posição
de ameaça ou agressor, e reage dentro desse papel,
reforçando a experiência de insegurança face a um
mundo ameaçador. E pouco a pouco a pessoa organiza-se,
com os seus núcleos de fragilidade, de segurança,
com os seus mecanismos de defesa mais
ou menos saudáveis, até estabilizar num adulto em
que o conjunto de todos estes elementos define a
pessoa que é.
As pessoas com perturbações do neurodesenvolvimento
têm, pelas suas caraterísticas inatas, uma
dificuldade de funcionamento no meio de vida habitual
que facilita a experiência de se sentir diferente.
Essa experiência é confirmada na aprendizagem
que fazem ao longo do seu crescimento (orientada
por familiares, educadores, e técnicos) e acabam
por se identificar como tal, como “diferentes”.
Ficam assim impedidos de se verem como mais
um, diferente apenas na medida em que todos
somos diferentes, e por isso integrado, na igualdade
do experimentar-se humano, partilhando
as angústias, incertezas e medos universais. Esta
será, provavelmente, a última grande tarefa que
todos teremos, num contexto técnico ou como
cidadãos, de conseguir que as pessoas que procuramos
ajudar se vejam como mais um, com
fragilidades e potencialidades, mas com um papel
social que não o torna diferente. Só assim
poderemos apagar um outro fator patológico, a
autoestigmatização, que perpetua os papéis de
alguém que precisa de ajuda e de outro que ajuda,
impedindo a integração plena da pessoa que
é o alvo da nossa intervenção. Que em última
análise, não precisa de ajuda, porque o mundo
em que vive também está feito à sua medida.
BIBLIOGRAFIA
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2009.
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