v22. n22 2024
Revista do curso da fotografia do curso de Fotografia da Universidade Católica de Pernambuco
Revista do curso da fotografia do curso de Fotografia da Universidade Católica de Pernambuco
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Outros carnavais.
Na página anteior, o carnaval
no Marco Zero, por Ignus.
Aqui, O olhar para os
detalhes, em carnaval
no subúrbio do Recife,
por Juliana Amara.
“Isso parte muito também da nossa
vivência, falando por mim que sou
uma mulher negra lgbt de periferia,
que nunca teve acesso à tecnologia,
que sempre fiz tudo a partir de muita
gambiarra e rede de apoio”,
falou ou digitou ou pensou ou
acendeu Amara.
Não se trata, portanto, de
autorreferência, mas de buscar
espaços, pensava eu aqui, enquanto
Ignus acendia outro e ascendia: “Hoje
eu entendo que estou conseguindo
alcançar vários espaços, e sinto
que minha experiência pode ser
compartilhada, para que pessoas que
são do mesmo meio que eu, possam
também acessar esses lugares e de
uma forma mais fácil.”
Juntas, elas se denominam “as
articuladas”. “Buscamos por artistas e
coletivos que precisam da nossa ajuda
com audiovisual”, respondem quase
em tom messiânico.
“E como acontece isso?”, me
pergunto, mas Ignus responde pelo
método preferido das duas: a telepatia:
“A gente vai lá, fortalece, enaltece, faz
fotos, vídeos, conteúdo. Além disso,
a gente também participa, juntas, do
‘Falas da Cena’.
O projeto foi criado por Ignus e tem o
objetivo de dar visibilidade a artistas
periféricos.
Em duas horas de conversa, troca de
mensagens, psicografias, a palavra
periferia aparece o tempo todo. Então
foi necessário saber de que lugar as
artistas estacam falando: de fora ou
de dentro dessa periferia. O tema se
estende, porque, na real, o Recife
todo é periferia, o Brasil é periférico.
Então, photomanguegirls, vocês se
consideram “fotógrafas periféricas”?
Neste momento, a gente se transfere
para o palco de um teatro aonde as
falas se misturam:
ignus
Não me considero periférica. Nasci
em Sertânia. Vim para Paulista.
Morei no Janga.
“Se isso não for ser periférica, não sei
o que é”, digo eu.
ignus continua
Entenda. Sempre tive muitos
privilégios, na educação, com boas
escolas e com cursos particulares. Uso
disso para devolver para o universo,
utilizo dos meus equipamentos para
fortalecer artistas periféricos que não
tiveram o mesmo acesso. Acredito que
essa é minha forma de contribuir e
devolver o que tive de facilidades.
amara
Quanto a mim, sou sim, periférica.
Cresci na periferia, sempre morei na
periferia, e meu objetivo principal é
fazer registro do meu meio. Embora
tudo seja discurso e imagem, sendo
desse contexto eu percebo que não
chega para todos, a partir que o
tempo vai passando, que câmeras
novas vão surgindo, boa parte da
população só tem acesso a uma
câmera de celular, que embora faça
sim muita coisa, a qualidade de
entrega é diferente, não podemos
comparar um vídeo de celular ou de
um equipamento mais inferior com
uma puta câmera de 20 mil reais e
todo o resto.
O que eu e Ignus fazemos, é
utilizar do nosso acesso e falo de
conhecimento, pois em equipamento
temos o básico, na real mesmo eu
mesma nem câmera tenho, e com
muito mais muito esforço, tentar
fazer algo melhor para a galera,
mostrar que essa pessoa é digna de
um bom registro, falando que hoje
em dia a imagem é muito
valorizada para artistas elevarem
suas carreiras.
ignus (complementando)
Como já estamos saturadas das
mesmas visões do centro [da cidade],
entendo que posso criar outros
diálogos com o que temos
na cidade. Fotografar por outras
perspectivas, procurar coisas
que ninguém olha, captar o sujo
e a energia caótica da cidade me
alimenta, o centro me ocupa.
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