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Medicina e Religião - História da Medicina

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Oriundo do território <strong>da</strong>s Humani<strong>da</strong>des, no meu<br />

espírito se formula, de quando em quando, a pergunta<br />

seguinte: por que razão as Facul<strong>da</strong>des de Letras (em<br />

uma delas me licenciei) e as Facul<strong>da</strong>des de <strong>Medicina</strong><br />

pertenciam, no meu tempo de estu<strong>da</strong>nte, à mesma<br />

Universi<strong>da</strong>de? E esta, ain<strong>da</strong> por cima, epiteta<strong>da</strong> de<br />

“clássica”? Na<strong>da</strong> sabendo <strong>da</strong>s intenções que terão<br />

conduzido o legislador a cimentar tal associação, que<br />

veios alicerçariam, por exemplo, as relações entre a<br />

filosofia grega e a anatomia? Entre a análise do texto<br />

literário e a investigação clínica? Entre o estudo<br />

iconográfico e iconológico <strong>da</strong> arte e a cirurgia? Entre<br />

a geografia humana e a epidemiologia? Entre a história<br />

<strong>da</strong>s mentali<strong>da</strong>des e a história <strong>da</strong> medicina? Entre os<br />

princípios <strong>da</strong> lógica e (<strong>da</strong>mos agora um salto no tempo)<br />

a recentíssima cadeira de corpo inteiro chama<strong>da</strong> ética<br />

médica ou bioética? Em tentativa de aprofun<strong>da</strong>mento<br />

<strong>da</strong> circunstância enuncia<strong>da</strong>, seja-nos legítimo admitir<br />

que o mundo plurifónico <strong>da</strong>s letras ou <strong>da</strong>s<br />

humani<strong>da</strong>des e o universo constelar mas englobante<br />

dos domínios médicos pretenderiam evidenciar,<br />

axiologicamente, que, ao fim e ao cabo, o desígnio<br />

em vista de ambas as Facul<strong>da</strong>des consubstanciava-se<br />

em idêntica finali<strong>da</strong>de: estu<strong>da</strong>r, conhecer melhor o<br />

Homem e na sua história e no seu devir; o Homem,<br />

centro <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>, medi<strong>da</strong> de to<strong>da</strong>s as coisas, e, como<br />

escreveu Sófocles, a mais assombrosa criação <strong>da</strong><br />

natureza.<br />

Porém em nossa época, uma diminuta mas<br />

poderosa e selvagem franja de homens, para a qual<br />

os valores morais constituíam na<strong>da</strong> e coisa nenhuma,<br />

consegue conduzir o Homem à amargura<strong>da</strong> categoria<br />

de inimigo de si-próprio. Duas guerras, tragicamente<br />

avassaladoras na eliminação física e no aniquilamento<br />

espiritual, haviam tentado destruir, com seus cau<strong>da</strong>is<br />

de sangue, o horizonte de esperança que a ciência<br />

médica, desde o início do século XX e em súbito<br />

arranque de desinteressa<strong>da</strong> pesquisa e investigação,<br />

colorira de confiança: os primeiros medicamentos<br />

químicos, a descoberta de importantes e essenciais<br />

41<br />

BIOÉTICA E HUMANIDADES<br />

António Salvado*<br />

vitaminas, o funcionamento do electrocardiógrafo e do<br />

electroencefalógrafo, a descoberta <strong>da</strong> penicilina e <strong>da</strong><br />

estreptomicina, do pulmão artificial, <strong>da</strong> vacina contra<br />

a febre amarela, do’pacemaker’, do factor sanguíneo<br />

Rh-e de tantos e tantos outros ‘inventos’ (passe o<br />

termo) que nos escusamos de enumerar, frutos de<br />

empenhamento científico, espécie de compromisso<br />

que não carecia de testificação ética relativamente<br />

aos seus autores, e isto porque estes materializavam<br />

apenas íntimos propósitos de soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de para com<br />

os seus irmãos pacientes - unidos, médicos/cientistas<br />

e utilizadores dos relevantes benefícios, no mesmo<br />

ideário de fraterno abraço.

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