45-54 - Universidade de Coimbra
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DEFENSOR r>O POVO-1-° ANNO Domingo, 10 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 1895 —N.° 56<br />
CARTA DE LISBOA<br />
3i <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> i8g5<br />
Está isto muito falho <strong>de</strong> noticias <strong>de</strong> sensação.<br />
' O que ha, está dito e <strong>de</strong>scripto por varias<br />
fórmas e feitios.<br />
Viajata real e suas consequências, resultado<br />
da brilhante fórma administrativa do<br />
primoroso gabinete Fervilha St C. a .<br />
A scena do Ferreira d'Almeida com o<br />
embarque das forças expediccionarias.<br />
A diplomacia do sr. <strong>de</strong> Soveral e a sua<br />
toilètte aprimorada. ..<br />
A crise <strong>de</strong>bellada, quando tudo vae redobrando<br />
<strong>de</strong> carestia, e as transacções se tornam<br />
difficilimas...<br />
A comedia eleitoral, a mais extraordinaria<br />
<strong>de</strong> que ha memoria nos nossos tempos,..<br />
Uma eleição fim <strong>de</strong> século. ..<br />
Por faltar em século lembrou-me um communicado<br />
ha dias publicado no Século, d'um<br />
maduro, que lamentava que tivesse havido<br />
tanta commiseração para com os vadios que<br />
foram mandados para a Africa por apupar a<br />
padralhada, e não houvesse ao menos duas<br />
palavras <strong>de</strong> elogio aos missionários, que foram<br />
evangelisar os negros.<br />
Lá que o homemsito tem razão, isso tem,<br />
mas que quer?<br />
Esses <strong>de</strong>sgraçados que foram <strong>de</strong>gredados<br />
pelo crime <strong>de</strong> não trabalharem, <strong>de</strong>viam<br />
exigir, que com elles fosse a maioria do clero,<br />
o qual pouco mais faz do que cousa nenhuma.<br />
Aquelles não tinham on<strong>de</strong> se empregar e<br />
estes acham mal empregado o tempo, que se<br />
consome com o trabalho.<br />
Se uns são gatunos d'alguma carteira ou<br />
d'alguma corrente <strong>de</strong> plaquet, uns miseros<br />
prejuízos materiaes; os outros são ladrões da<br />
honra, são uns bandidos que assaltam as famílias<br />
e lhes roubam o que ellas têm <strong>de</strong> mais<br />
caro — a innocencia das creanças, os affagos<br />
e as caricias que ellas lhes dispensam, e finalmente,<br />
o amor filial...<br />
Ladrões perigosos pela sua astúcia, porque<br />
se introduzem sobrepticiamente no seio<br />
das famílias, e lentamente vão lançando o<br />
germem do veneno...<br />
Aquelles pobres diabos lá foram, barra<br />
fóra, colonisar, a Africa, o que causou grave<br />
prejuizo á nossa policia, porque ficou prejudicada<br />
com a falta dos collegas.<br />
Os outros por cá ficaram á solta, com a<br />
protecção do segundo estado, e, pela moda,<br />
teem carta franca para fazerem o que quizerem,<br />
comtanto que os <strong>de</strong>ixem...<br />
Os paes, que se acautellem, dispensando-lhes<br />
os seus serviços espirituaes...<br />
Que seria dos cangalheiros, se lhes acabassem<br />
com a raça ?!. ..<br />
•<br />
As associações <strong>de</strong> soccorros mutuos vão<br />
levar volta.<br />
Imaginem que o Campos Henriques se<br />
lembrou <strong>de</strong> mandar perguntar ás associações<br />
qual era o seu estado financeiro, para d'aqui<br />
fazer uma reforma radical!...<br />
Também pergunta se sabem quando é<br />
que os seus estatutos sairam approvados!,..<br />
Que tal está o da rabeca ?!...<br />
São todos da mesma força.<br />
• • •<br />
ARMANDO VIVALDO.<br />
Prespectiva d'um arranjo<br />
Os jornaes <strong>de</strong> Lisboa <strong>de</strong>nunciam a falta<br />
<strong>de</strong> entrada na respectiva recebedoria, das<br />
quantias em <strong>de</strong>bito á fazenda nacional, pelos<br />
her<strong>de</strong>iros do fallecido sr. D. Fernando,<br />
não obstante haver findado o prazo d'esse<br />
pagamento.<br />
Quem não tem pago direitos d'alfan<strong>de</strong>ga,<br />
dos vestidos e rendas, mobílias e outros artigos<br />
que vêm do extrangeiro, não é extranhavel<br />
que queiram fazer o mesmo, com o pagamento<br />
dos direitos á fazenda nacional.<br />
Com razão se disse no parlamento — Estamos<br />
em crise <strong>de</strong> ladrões!<br />
A revolta da índia<br />
Parece que o relatorio da syndicancia da<br />
revolta da índia prova a connivencia d'officiaes<br />
no movimento. Confirmam assim as<br />
informações que primeiro vieram e foram<br />
<strong>de</strong>smentidas.<br />
Consta também que certo official andou<br />
unido aos nativos contra os europeus. O<br />
mesmo ofíicial tratava mal os soldados.<br />
Em a noite da revolta fechou-se com o<br />
official <strong>de</strong> inspecção na caserna da companhia<br />
e apezar <strong>de</strong> ter 3oo homens fieis, nem sequer<br />
auxiliou o administrador.<br />
Confesso traidor! Que a justiça e a lei<br />
sejam inexoráveis na con<strong>de</strong>mnação <strong>de</strong> crime<br />
{So repugnante, como é o <strong>de</strong> lesa-patria!<br />
Popularida<strong>de</strong> do governo<br />
A viagem d'el-rei se tem acarretado vergonhas<br />
e afírontas ao paiz, tem tornado por<br />
toda a parte, bem conhecido o valor dos<br />
gran<strong>de</strong>s estadistas que o sr. D. Carlos tem á<br />
frente da governação do Estado.<br />
A imprensa estrangeira não se cança, a<br />
proposito da viagem e do conflicto com a<br />
Italia, <strong>de</strong> os <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar, chamando-lhes ineptos,<br />
miseros ministros, ignorantes, <strong>de</strong>sgraçados<br />
conselheiros, <strong>de</strong>sconhecedores do », b,<br />
c da historia, estadistas <strong>de</strong> polichinello, que<br />
fazem do rei um manequim, expondo-o ás<br />
complicadas exigencias das côrtes estrangeiras,<br />
com quem se não tratou, diplomaticamente,<br />
essas visitas.<br />
E para cumulo <strong>de</strong> tudo isto, ainda um<br />
jornal francez, apreciando a situação creada<br />
e mantida por esses energúmenos dictadores,<br />
escreve estas palavras :<br />
«O joven rei <strong>de</strong> Sabóia não teve a <strong>de</strong>sgraça<br />
<strong>de</strong> ser ro<strong>de</strong>ado <strong>de</strong> minitros tão idiotas,<br />
como o <strong>de</strong>sventurado D. Carlos.»<br />
Idiotas! Para quem tem fumaças <strong>de</strong> espertalhões—<br />
é para alargar as ventas, arrebitar<br />
as orelhas, e alçar as mãos — <strong>de</strong> baixo...<br />
Idiotas!..., Idiotas!... E' <strong>de</strong> mais.<br />
Muita gente lh'o tem dito!<br />
Expedição <strong>de</strong> Moçambique<br />
São esperadas por estes dias em Lisboa,<br />
200 praças da expedição <strong>de</strong> Moçambique,<br />
que recolhem á metropole por motivo <strong>de</strong><br />
doenças.<br />
Estamos para vêr o enthusiasmo da recepção,<br />
quando esses valentes chegarem ao<br />
Tejo, a <strong>de</strong>sembarque.<br />
Ninguém se incommodará por certo, a ir<br />
esperal-os nem a saudar os valorosos soldados<br />
e ofíiciaes que vêm luctar pela integrida<strong>de</strong><br />
da patria e sua soberania, nas possessões<br />
portuguezas.<br />
Não terão um viva, nem um brado <strong>de</strong><br />
agra<strong>de</strong>cimento pela vida que arriscaram.<br />
Nem os ministros, nem o povo!<br />
Que não esqueça o <strong>de</strong>sprezo que se <strong>de</strong>u<br />
a uma leva <strong>de</strong> expedicionários que ha mezes<br />
regressaram da Africa, <strong>de</strong>sembarcando em<br />
Lisboa, on<strong>de</strong> não encontraram soccorros,<br />
tendo <strong>de</strong> se arrastar até ao hospital alguns,<br />
e outros irem em trens e em macas que bemfeitores<br />
pagaram.<br />
Ingratos como féras!<br />
•••«<br />
As lamas do Tejo<br />
Hersent, o concessionário das obras do<br />
porto <strong>de</strong> Lisboa e compadre <strong>de</strong> Emygdio<br />
Navarro, não está satisfeito com as exorbitantes<br />
quantias, como a ultima <strong>de</strong> 7:500 contos,<br />
com as quaes o governo lhe encheu as fauces<br />
<strong>de</strong>voradoras.<br />
Dizem que apresentára novas reclamações<br />
<strong>de</strong> in<strong>de</strong>mnisação, mas que o conselho superior<br />
<strong>de</strong> obras publicas e minas <strong>de</strong>satten<strong>de</strong>u<br />
as reclamações da empreza Hersent, por<br />
falta <strong>de</strong> fundamento, sendo <strong>de</strong> parecer que<br />
a mesma empreza é que é <strong>de</strong>vedora ao Estado,<br />
tendo <strong>de</strong> o in<strong>de</strong>mnisar.<br />
Veremos se o governo ce<strong>de</strong>rá á influencia<br />
das muitas amiza<strong>de</strong>s que conta o empreiteiro.<br />
Amigos <strong>de</strong> Hersent! Amigos que ficam<br />
caros ao paiz, e que apparecem ricos e po<strong>de</strong>rosos,<br />
quaes fidalgos nos seus solares.<br />
Bem vos lembraes do caso dos bonds...<br />
Mãos largas<br />
Pois não querem lá ver a generosida<strong>de</strong><br />
com que agora se sae a commissão municipal<br />
<strong>de</strong> Lisboa?<br />
Vae incluir no orçamento uma verba <strong>de</strong>stinada<br />
a um premio para o concurso <strong>de</strong> tiro<br />
civil!...<br />
Teem observado a patifaria do cachorro<br />
á Subscripção Nacional!?<br />
Pois consi<strong>de</strong>rem-se caloteados — os do<br />
tiro civil.<br />
••-«<br />
A cura da tysica<br />
Foi inaugurado em Roma o sexto congresso<br />
<strong>de</strong> medicina.<br />
Des<strong>de</strong> o principio do congresso que se<br />
sustentou uma acalorada discussão sobre a<br />
sorotherapia.<br />
Maragliano <strong>de</strong>senvolveu as leis da applicação<br />
da sorotherapia ao homem, indicando<br />
os resultados que tem obtido pelo seu methodo<br />
na cura da tuberculose.<br />
Indicou também em <strong>de</strong>talhe as matérias<br />
empregadas para vaccinar os animaes e os<br />
resultados que diversos médicos da Italia e<br />
dos outros paizes, obtiveram já sobre ug<br />
doentes. Alguns <strong>de</strong>sses doentes curados foram<br />
apresentados ao congresso. '<br />
O novo car<strong>de</strong>al<br />
Jacobini, o núncio apostolico em Lisboa,<br />
sempre abicha as esporas da victoria — recebendo<br />
em <strong>de</strong>zembro proximo, as honras <strong>de</strong><br />
car<strong>de</strong>al. — Caspité!<br />
E' o premio <strong>de</strong> consolação a quem teve<br />
manhas e artes <strong>de</strong> conseguir evitar que D.<br />
Carlos fosse a Roma.<br />
Quem mostrou gran<strong>de</strong>s recursos <strong>de</strong> estadista,<br />
foi o <strong>de</strong> Soveral, vê-se que é homem<br />
<strong>de</strong> primeira, para a arteirice — não se <strong>de</strong>ixa<br />
ir. — Tem <strong>de</strong>do para o mexerico diplomático.<br />
E a julgarem que o macaco a%ul só era<br />
eximio na pirueta! Entre cruzes e agua benta<br />
se viu o núncio Jacobini.<br />
Ia per<strong>de</strong>ndo o chapéu cardinalício que representa,<br />
no caso, as botas da gorjeta!<br />
Exercito <strong>de</strong> reformados<br />
Aquelle Festas Pinto foi um raio que<br />
caiu do ministério da guerra. A reforma dos<br />
ofíiciaes superiores foi uma re<strong>de</strong> varredoura<br />
nos cofres públicos. Dentro em poucos annos<br />
temos dois exercitos um dos reformados<br />
e outro dos effectivos.<br />
Diz-se que durante o anno ainda serão<br />
reformados, por attingirem o limite da eda<strong>de</strong>:<br />
g tenentes-coroneis, 5 majores e 2 capitães.<br />
E 1 uma insaciavel sanguesuga, que o paiz<br />
tem a sugar-lhe toda a seiva — a bolsa, fazenda<br />
e os filhos.<br />
E não ha soldados!<br />
Galopinagem tonsurai<br />
bentos padres da Felgueira, reuniram,<br />
não para curar das almas, mas para cavarem<br />
na vinha da politica e disporem os trabalhos<br />
<strong>de</strong> galopinagem, para as próximas<br />
eleições.<br />
Òs reaccionários — partido catholico —<br />
trabalham para a conquista das suas candidaturas,<br />
e servem-se do clero para a galopinagem<br />
nas freguezias ruraes.<br />
E assim se ganha o céo — dos lobos.<br />
K<br />
>•<<br />
Protecção aos operários<br />
O <strong>de</strong>putado Coutaut, disse ha dias no<br />
parlamento francez, que a Republica tinha<br />
o imperioso <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> dar protecção aos operários,<br />
procurando collocação aos sem trabalho.<br />
Obrigar todo o patrão <strong>de</strong> qualquer officina<br />
importante, que queira interromper o<br />
trabalho, a <strong>de</strong>clara-lo em uma participação á<br />
auctorida<strong>de</strong> administrativa, com a antece<strong>de</strong>ncia<br />
<strong>de</strong> 34 horas; <strong>de</strong>vendo a auctorida<strong>de</strong>, em<br />
taes casos, tomar as provi<strong>de</strong>ncias necessarias<br />
para que recomece o trabalho o mais breve<br />
possivel.<br />
Coutaut apresentou uma proposta neste<br />
sentido.<br />
Não ha confrontos possíveis com o parlamento<br />
portuguez, on<strong>de</strong> as suas questões<br />
são meramente politiqueiras, <strong>de</strong> exclusivo interesse<br />
dos bandos.<br />
Nada se lhe compara!<br />
O tratamento do cancro<br />
Na ultima sessão da Aca<strong>de</strong>mia das Sciencias,<br />
<strong>de</strong> Paris, o dr. Marey expôz as gran<strong>de</strong>s<br />
linhas d'uma nota dos drs. Hericourt e<br />
Richet, ácerca dos últimos resultados obtidos<br />
pelo methodo serotherapico, no tratamento<br />
do cancro.<br />
Sobresae d'esse trabalho que o methodo<br />
<strong>de</strong>u até aqui resultados apreciaveis. Na maior<br />
parte dos casos o tumor ce<strong>de</strong>u e tomou um<br />
melhor aspecto<br />
E' <strong>de</strong> notar — e para isso chamamos a<br />
attenção dos nossos leitores — que os drs.<br />
Hericourt e Richet não mencionam nenhuma<br />
cura: contentam-se em registrar e assignalar<br />
as melhoras que obtiveram pelo methodo<br />
serotherapico, cujos felizes resultados constituem<br />
o que se chama uma étape scientifica.<br />
••