o silêncio das sereias: tempo, direito e violência ... - Domínio Público
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A experiência da modernidade, do presente, do atual, implica uma percepção de<br />
ruptura com o passado, ruptura valorizada positivamente, pois almeja ser a promessa de uma<br />
mudança decisiva <strong>das</strong> relações sociais, como na ideia de revolução, ideia de um novo radical<br />
histórico, e uma outra percepção paradigmática, pois “... ao se tornar sinônimo de „novo‟, o<br />
conceito de „moderno‟ assume uma dimensão certamente essencial para a nossa compreensão<br />
de „modernidade‟, mas, ao mesmo <strong>tempo</strong>, uma dinâmica interna que ameaça implodir a sua<br />
relação com o <strong>tempo</strong>. 133 ”.<br />
Por meio dessa mudança o novo se condena à obsolescência, enquanto o moderno<br />
passa a designar um espaço de atualidade restringido, limitado. Ao se constituir como<br />
paradigma pautado pela novidade, pelo fugaz, fugidio, forma um meio que a destrói<br />
celeremente, em um processo de autodevoração, a interpretação fundante e dissolutora do<br />
antigo pelo “moderno”.<br />
Para Benjamin, em outro sentido, a literatura da modernidade possui uma relação<br />
privilegiada com o <strong>tempo</strong>, com a <strong>tempo</strong>ralidade e com a morte, pois, se vincula à antiguidade,<br />
não pelo fato de depender dela como molde de suas futuras elaborações, mas “... porque a<br />
Antigüidade revela uma propriedade comum a ambas, a sua Gebrechlichkeit (fragilidade). É<br />
porque o antigo nos aparece como ruína que o aproximamos do moderno, igualmente fadado à<br />
destruição. 134 ”.<br />
Essa percepção profunda da transitoriedade já figurava na idade barroca, motivo de<br />
reflexões de Benjamin 135 . Porém, essa consciência do provisório opunha, no cenário barroco,<br />
a eternidade divina à fugacidade humana, em um panorama no qual a teologia não havia sido<br />
abalada de maneira frontal. Para Gagnebin: “O que é próprio da modernidade é o<br />
desmoronamento desse horizonte e, conseqüentemente, a falta de um pólo duradouro que<br />
servia, outrora, de razão e de consolo do efêmero. 136 ”.<br />
A consciência do <strong>tempo</strong> moderno é perpassada pela união do passado ao presente na<br />
forma de um futuro inafastável, a morte, conceito que não pode ser separado, na genealogia<br />
da sociedade burguesa, do modo de produção capitalista. Esta <strong>tempo</strong>ralidade está presente na<br />
atividade industrial, no <strong>tempo</strong> do trabalho e no fetiche da mercadoria, o novo que em um curto<br />
período se torna obsoleto, sucata, trapo. Por isso, na interpretação de Benjamin há uma “...<br />
133 GAGNEBIN, J. M. Sete aulas sobre linguagem, memória e história. p. 141.<br />
134 GAGNEBIN, J. M. Sete aulas sobre linguagem, memória e história. p. 147.<br />
135 BENJAMIN, W. Origem do drama barroco alemão. São Paulo: Brasiliense, 1984.<br />
136 GAGNEBIN, J. M. Sete aulas sobre linguagem, memória e história. p. 148.<br />
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