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estação intermodal como gerador de centralidades metropolitanas

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ESTAÇÃO INTERMODAL COMO GERADOR DE<br />

CENTRALIDADES METROPOLITANAS: O NÓ<br />

METROFERROVIÁRIO DA LUZ<br />

Autor: Lourenço Urbano Gimenes


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

RESUMO<br />

A <strong>intermodal</strong>ida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte é uma parte crucial da organização das metrópoles<br />

contemporâneas, pois é na estação <strong>intermodal</strong> on<strong>de</strong> se dá o maior potencial <strong>de</strong> articulação funcional<br />

e espacial entre as diferentes escalas da metrópole – seja pela capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte, pela<br />

abrangência ou pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> viabilizar centralida<strong>de</strong>s através das características anteriores.<br />

Desta forma, organiza funções em escala local e as vincula a uma lógica metropolitana,<br />

relacionando-as a outras centralida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> forma complementar. A estação <strong>intermodal</strong>, portanto, ao<br />

gerar centralida<strong>de</strong>, atua <strong>como</strong> nó <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> urbana potencialmente eficiente. Esta análise é<br />

proposta no capítulo 1 <strong>de</strong>sta dissertação, no item 1.1, on<strong>de</strong> maior ênfase será dada ao sistema<br />

metroferroviário por sua característica <strong>de</strong> maior capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte e conexões e possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> implantação <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> tecidos já urbanizados.<br />

Em 1.2 e 1.3 propõe-se uma apresentação terminológica e conceitual dos termos que serão<br />

empregados ao longo dos <strong>de</strong>mais capítulos. Abordagens sobre mobilida<strong>de</strong>, acessibilida<strong>de</strong>, micro e<br />

macroacessibilida<strong>de</strong>, ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>, nó e lugar são revistas a partir da visão <strong>de</strong> diversos<br />

autores e orientações, permitindo a elaboração precisa do conceito adotado neste trabalho.<br />

Sendo a estação <strong>intermodal</strong> o equipamento que melhor respon<strong>de</strong> a uma necessida<strong>de</strong> vital da<br />

metrópole – a eficiência do transporte <strong>de</strong> massas –, sua discussão é premente na realida<strong>de</strong><br />

paulistana. O capítulo 2 parte da suposição <strong>de</strong> que a estação da Luz, que será o maior nó <strong>de</strong><br />

transporte <strong>intermodal</strong> com a efetivação do PITU2020, é potencial centralida<strong>de</strong> funcional baseada no<br />

transporte metroferroviário. O item 2.1 apresenta o bairro da Luz. Em 2.2, os transportes urbanos<br />

são mostrados <strong>como</strong> elemento essencial no crescimento <strong>de</strong> São Paulo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua fundação, no<br />

século XVI, quando atuava <strong>como</strong> confluência <strong>de</strong> rotas comerciais. Em 2.3, o texto analisa as<br />

centralida<strong>de</strong>s já consolidadas da Região Metropolitana <strong>de</strong> São Paulo. Propõe-se mostrar <strong>como</strong> a<br />

relação entre as centralida<strong>de</strong>s, por não ser amparada por re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte a<strong>de</strong>quada, não constitui<br />

atualmente uma re<strong>de</strong> eficiente.<br />

O recorte proposto nesta monografia permitiu o estudo <strong>de</strong> casos on<strong>de</strong> o equipamento <strong>de</strong> transporte<br />

contribui para a viabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s, bem <strong>como</strong> para a consolidação do papel regional – e,<br />

às vezes, nacional e internacional – das cida<strong>de</strong>s que o abrigam. Estudos <strong>de</strong> caso internacionais<br />

permitem constatar <strong>como</strong> estações metroferroviárias po<strong>de</strong>m organizar ativida<strong>de</strong>s econômicas em<br />

escalas diversas, característica que se propõe, neste trabalho, ser possível na Luz no futuro. O<br />

capítulo 3 retoma, no item 3.1, a importância da mobilida<strong>de</strong> <strong>como</strong> elemento estruturador<br />

metropolitano e aprofunda o papel específico dos nós metroferroviários <strong>como</strong> <strong>gerador</strong>es <strong>de</strong><br />

centralida<strong>de</strong>. A base conceitual <strong>de</strong>ste capítulo é extraída <strong>de</strong> textos dos autores Luca Bertolini e Tejo<br />

Spit, <strong>de</strong> cuja obra são extraídos os estudos <strong>de</strong> caso (item 3.2), que foram aqui aprofundados e<br />

atualizados. Os limites <strong>de</strong> paralelismo entre esses casos e a Luz são abordados no item 3.3.<br />

O capítulo 4 conclui a pesquisa com foco na região da Luz.<br />

1


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

SUMÁRIO<br />

1 CONCEITUAÇÃO ........................................................................... 3<br />

1.1 Mobilida<strong>de</strong> <strong>como</strong> atributo fundamental da dinâmica metropolitana.... 3<br />

1.2 Terminologia ........................................................................................ 4<br />

1.3 Nós e lugares da <strong>intermodal</strong>ida<strong>de</strong> ........................................................ 6<br />

2 A METRÓPOLE PAULISTANA E A REGIÃO DA LUZ ............ 8<br />

2.1 Luz ....................................................................................................... 8<br />

2.2 O transporte na estruturação da metrópole <strong>de</strong> São Paulo ..................... 14<br />

2.3 RMSP: nós e lugares ............................................................................ 19<br />

3 INTERMODALIDADE E CENTRALIDADE ............................... 24<br />

3.1 Estações intermodais: equipamentos para a mobilida<strong>de</strong> e a<br />

estruturação <strong>metropolitanas</strong>......................................................................... 24<br />

3.2 Estudos <strong>de</strong> casos ................................................................................. 30<br />

3.2.1 Utrecht Centraal ............................................................................ 31<br />

3.2.2 Euralille ........................................................................................ 35<br />

3.2.3 King’s Cross – Saint Pancras ....................................................... 39<br />

3.3 Consi<strong>de</strong>rações sobre a luz: possibilida<strong>de</strong>s e limites <strong>de</strong> paralelismo .. 43<br />

4 CONCLUSÃO .................................................................................. 42<br />

5 BIBLIOGRAFIA .............................................................................. 44<br />

2


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

1 CONCEITUAÇÃO<br />

1.1 Mobilida<strong>de</strong> <strong>como</strong> atributo fundamental da dinâmica metropolitana<br />

Aujour’hui, on observe une transformation profon<strong>de</strong> <strong>de</strong>s rithmes <strong>de</strong> la vie cotidienne<br />

qui fait évoluer les pratiques <strong>de</strong> mobilité et pose <strong>de</strong>s problèmes nouveaux à la<br />

gestion urbaine et à l’organisation <strong>de</strong>s transports. (Bailly e Heurgon, 2001:5)<br />

A evolução <strong>de</strong> padrões econômicos típicos das três últimas décadas do século XX têm influenciado<br />

diretamente a vida urbana. De um lado, o intenso fluxo produtivo e financeiro internacional, uma<br />

das faces mais reconhecidas <strong>de</strong>ste período, resulta em entida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> comando <strong>de</strong> uma economia que<br />

não conhece restrições geográficas – as chamadas Cida<strong>de</strong>s Mundiais (Sassen, 1998). De outro lado,<br />

os reflexos da internacionalização da economia são perceptíveis em escala urbana e regional através<br />

das forças <strong>de</strong> concentração e dispersão <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s que caracterizam a metrópole contemporânea.<br />

Esta reconcentração seletiva é possibilitada pelo <strong>de</strong>senvolvimento das re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> telecomunicação,<br />

mas é efetivada por re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> transporte coerentes com o significativo acréscimo <strong>de</strong> fluxo humano<br />

gerado.<br />

O mito alarmista da década <strong>de</strong> 80 <strong>de</strong> que as cida<strong>de</strong>s po<strong>de</strong>riam <strong>de</strong>saparecer através da evolução da<br />

tecnologia <strong>de</strong> comunicação parece menos provável quanto mais esta tecnologia possibilita o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento econômico e o a<strong>de</strong>nsamento <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s terciárias. As análises <strong>de</strong> <strong>de</strong>clínio<br />

<strong>de</strong>mográfico e econômico <strong>de</strong> importantes cida<strong>de</strong>s européias e americanas nos anos 60 e 70 criaram<br />

sobre as análises dos anos seguintes a expectativa <strong>de</strong> que a cida<strong>de</strong> per<strong>de</strong>ria importância. Essa<br />

perspectiva messiânica <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rava, segundo Sassen (1998:13), que era o próprio topos o que<br />

tornava esta nova economia possível: seu componente mais significativo é a concentração <strong>de</strong> uma<br />

infra-estrutura extremamente diversificada e especializada, capaz <strong>de</strong> polarizar o gerenciamento das<br />

empresas espalhadas por todo o mundo. O crescimento expressivo da economia terciária aliada à<br />

<strong>de</strong>scentralização das ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção no mundo produziu, a partir da década <strong>de</strong> 80, cida<strong>de</strong>s<br />

com alta concentração <strong>de</strong> serviços financeiros, administrativos e gerenciais. Resultado disso é que<br />

<strong>de</strong>terminadas cida<strong>de</strong>s, em função <strong>de</strong> sua importância estratégica regional e internacional, sofreram<br />

modificações econômicas bastante importantes e, conseqüentemente, formais e funcionais (Graham<br />

e Mavin, 2001:14). A metrópole contemporânea abandona a supremacia da forma para ganhar em<br />

termos <strong>de</strong> função, <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ter espaço para ter tempo:<br />

Na metrópole mo<strong>de</strong>rna o crescimento ilimitado produziu um organismo expandido,<br />

extenso, multifacetado e setorizado, on<strong>de</strong> o traçado viário buscava reforçar a<br />

estrutura e fazer face à dispersão; já na metrópole contemporânea, a forma e a<br />

continuida<strong>de</strong> do tecido urbano <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser metas para tornarem-se condicionantes.<br />

(...) A dinâmica que se instalou no território metropolitano contemporâneo está,<br />

aceleradamente, diluindo a forma urbana (Meyer, 2000).<br />

Os limites físicos e administrativos das cida<strong>de</strong>s são continuamente questionados pelo crescente<br />

fluxo <strong>de</strong> pessoas que faz da cida<strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s. A importância da comunicação e da<br />

3


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

mobilida<strong>de</strong>, ao mesmo tempo causas e conseqüências da dinâmica <strong>de</strong> uma reconcentração seletiva,<br />

traduz-se i<strong>de</strong>almente pela maior circulação <strong>de</strong> pessoas através <strong>de</strong> estações intermodais<br />

metroferroviárias, que são os mais fortes elos físicos entre os centros econômicos da metrópole,<br />

<strong>como</strong> será <strong>de</strong>monstrado adiante.<br />

A organização do transporte metropolitano <strong>de</strong> massa, segundo Meyer, Grostein e Bi<strong>de</strong>rman<br />

(2004:30), <strong>de</strong>sempenhará um papel crucial no atual padrão <strong>de</strong> transformação da metrópole. Neste<br />

cenário, as estações intermodais assumem um papel importante para a efetivação e sustentação das<br />

mudanças assinaladas. Por suas características, <strong>como</strong> será visto no capítulo 3.1, as estações<br />

intermodais têm se provado motores eficazes para a criação <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s.<br />

SÃO PAULO<br />

Na década <strong>de</strong> 1980, a América Latina vivia uma crise da dívida e <strong>de</strong>terioração do comércio que lhe<br />

impôs um atraso adicional em relação ao bloco <strong>de</strong>senvolvido. A <strong>de</strong>rrubada da reserva <strong>de</strong> mercado<br />

brasileira e a retomada econômica da década <strong>de</strong> 1990 foram, assim, importantes para que o Brasil e,<br />

mais especificamente, a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, acordassem para uma vocação econômica<br />

diferenciada.<br />

Se for verda<strong>de</strong> que as tecnologias da informação, segundo Bailly e Heurgon (2001), proce<strong>de</strong>m mais<br />

por adição que por substituição, o mesmo não po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ocorrer com a transição entre os<br />

tipos <strong>de</strong> metrópole mo<strong>de</strong>rna e contemporânea apontados por Meyer (2000). O novo mo<strong>de</strong>lo não<br />

anula o anterior. Assim, se São Paulo <strong>de</strong>monstra uma vocação para o fluxo financeiro estratégico<br />

em termos nacionais e, mesmo, latino-americanos, seus contrastes internos (principalmente os<br />

sociais) intensificados no seu período ‘mo<strong>de</strong>rno’ não po<strong>de</strong>riam ser imediatamente superados.<br />

Os transportes urbanos, em São Paulo, sofreram um impacto muito gran<strong>de</strong> com a mudança do perfil<br />

econômico da metrópole. A metrópole sempre cresceu em função <strong>de</strong> um parcelamento abusivo e<br />

<strong>de</strong>sregrado e <strong>de</strong> uma política <strong>de</strong> transportes falha. Com o Plano Real, no início da década <strong>de</strong> 1990, o<br />

acesso a crédito motivou a rejeição sistemática ao ônibus. O metrô, durante muito tempo<br />

negligenciado, vem recebendo ultimamente alguma atenção, mas seu atraso é notório se<br />

contemplada a escala da metrópole. Dentro <strong>de</strong>ssa realida<strong>de</strong>, o Plano Integrado <strong>de</strong> Transportes<br />

Urbanos (PITU2020) tem se mostrado um instrumento bastante importante para a reestruturação do<br />

transporte metropolitano. A compatibilização da re<strong>de</strong> da CPTM à re<strong>de</strong> <strong>de</strong> metrô, entre outras<br />

providências previstas no plano, amplia a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> alta capacida<strong>de</strong> e interliga centros e<br />

sistemas antes <strong>de</strong>sconexos.<br />

Na reestruturação do transporte coletivo evi<strong>de</strong>ncia-se a estação da Luz, escolhida para se<br />

transformar no maior nó <strong>de</strong> transporte metropolitano brasileiro. Próxima do Centro Histórico, do<br />

eixo viário Norte-Sul e <strong>de</strong> vias <strong>de</strong> escala metropolitana (marginal do Tietê e Av. do Estado), abriga<br />

4 linhas <strong>de</strong> trem e 2 <strong>de</strong> metrô, além <strong>de</strong> contar com terminais <strong>de</strong> ônibus nas imediações e previsão <strong>de</strong><br />

linhas inter-aeroportos. A importância da Luz será abordada no capítulo 2.<br />

1.2 Terminologia<br />

MOBILIDADE E ACESSIBILIDADE<br />

4


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

Apesar <strong>de</strong> se tratarem <strong>de</strong> termos amplamente utilizados, os conceitos <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> e acessibilida<strong>de</strong><br />

oferecem gran<strong>de</strong> diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interpretações <strong>de</strong> acordo com o universo técnico abordado ou o<br />

interesse discursivo <strong>de</strong> cada autor.<br />

Uma visão mais tradicional, ensina Vasconcellos (2001:40), <strong>de</strong>fine mobilida<strong>de</strong> <strong>como</strong> a “habilida<strong>de</strong>”<br />

humana <strong>de</strong> “movimentar-se em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> condições físicas e econômicas individuais”. Na<br />

engenharia <strong>de</strong> transportes, mobilida<strong>de</strong> revela a quantida<strong>de</strong> média <strong>de</strong> viagens diárias <strong>de</strong> uma pessoa<br />

resi<strong>de</strong>nte numa <strong>de</strong>terminada região, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> on<strong>de</strong> ou <strong>como</strong> a viagem é feita. No livro ‘São<br />

Paulo Metrópole’, os autores <strong>de</strong>finem mobilida<strong>de</strong> <strong>como</strong> sendo “o conjunto <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocamentos da<br />

população no território” (Meyer, Grostein e Bi<strong>de</strong>rman, 2004:28). No entanto, ao estabelecer que<br />

“mobilida<strong>de</strong> une lugares e não apenas pontos longínquos”, os autores sugerem que esse “conjunto<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>slocamentos” não é apenas um dado inerte, restrito apenas a quem se <strong>de</strong>sloca, mas estabelece<br />

relação sutil entre a “população” e a função contida numa centralida<strong>de</strong> (“lugar”).<br />

A acessibilida<strong>de</strong>, no estudo acima citado, é <strong>de</strong>finida <strong>como</strong> ”a possibilida<strong>de</strong> física <strong>de</strong> realização<br />

<strong>de</strong>sses <strong>de</strong>slocamentos”, e refere-se, principalmente, à disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vias e meios <strong>de</strong> transporte.<br />

Assim, a acessibilida<strong>de</strong> seria o sustentáculo físico <strong>de</strong> uma dinâmica social e econômica expressa<br />

pelo termo mobilida<strong>de</strong>. Essa <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> acessibilida<strong>de</strong> aproxima-se do conceito <strong>de</strong> acessibilida<strong>de</strong><br />

utilizado na engenharia <strong>de</strong> transportes, on<strong>de</strong> subdivi<strong>de</strong>-se em dois termos: a macroacessibilida<strong>de</strong><br />

refere-se à facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cruzar um território. Numa escala metropolitana, macroacessibilida<strong>de</strong> é<br />

associada às re<strong>de</strong>s viárias <strong>de</strong> transporte motorizado. A microacessibilida<strong>de</strong> refere-se à facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

ace<strong>de</strong>r a um meio <strong>de</strong> transporte ou a um <strong>de</strong>stino final a partir <strong>de</strong>le. A microacessibilida<strong>de</strong> é,<br />

portanto, um componente da macroacessibilida<strong>de</strong>, sendo que esta confun<strong>de</strong>-se com o próprio<br />

conceito <strong>de</strong> acessibilida<strong>de</strong>.<br />

Já para Moseley (apud Vasconcelos, 2001:40), acessibilida<strong>de</strong> é a mobilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stinada à satisfação<br />

<strong>de</strong> necessida<strong>de</strong>s. Neste caso, acessibilida<strong>de</strong> não é apenas compreendida <strong>como</strong> facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cruzar o<br />

espaço, mas a facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> chegar aos <strong>de</strong>stinos. Em que pese seja mais completa que a noção<br />

tradicional <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>, esta visão ainda não dá conta da compreensão <strong>de</strong> um processo mais<br />

amplo <strong>de</strong> organização metropolitana.<br />

O conceito <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que se apropriarão os próximos capítulos refletem, principalmente, o<br />

sentido expresso pela bibliografia estrangeira referenciada, e o conceito <strong>de</strong> acessibilida<strong>de</strong> conforme<br />

sintetizado acima a partir da visão <strong>de</strong> Moseley. Portanto, mobilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>verá ser entendido neste<br />

texto <strong>como</strong> uma extensão do conceito <strong>de</strong> fluxos, enquanto capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> circulação qualificada num<br />

contexto metropolitano. Ou seja, <strong>de</strong>ntro do recorte do transporte <strong>de</strong> passageiros, mobilida<strong>de</strong> referese<br />

à capacida<strong>de</strong>, oportunida<strong>de</strong> e objetivo <strong>de</strong> <strong>de</strong>slocamento para ou entre centralida<strong>de</strong>s econômicas, o<br />

que inclui a noção <strong>de</strong> acessibilida<strong>de</strong>.<br />

À noção <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> aqui empregada não se aplicam unida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> medida, uma vez que a análise<br />

se dá em nível abstrato e consi<strong>de</strong>ra conjuntos variáveis <strong>de</strong> dados, cuja pertinência oscila <strong>de</strong> acordo<br />

com o objetivo <strong>de</strong> cada análise <strong>de</strong>sejada. Portanto, problematizar acerca da contribuição quantitativa<br />

da acessibilida<strong>de</strong> para uma maior mobilida<strong>de</strong> parece ser um raciocínio <strong>de</strong> muitas respostas. Da<br />

mesma forma, relacionar aumento da quantida<strong>de</strong>, extensão e capilarida<strong>de</strong> dos modos <strong>de</strong> transporte<br />

na metrópole a um aumento da mobilida<strong>de</strong>, apesar <strong>de</strong> sugerir implicação direta, não será uma<br />

equação convincente se não consi<strong>de</strong>rar questões sociais, geográficas, econômicas, políticas etc. Isso<br />

posto, sugere-se <strong>como</strong> possibilida<strong>de</strong> metodológica enfocar a análise num recorte menos abstrato,<br />

que é a estação modal <strong>como</strong> ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>, <strong>como</strong> veremos a seguir.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

AMBIENTE DE MOBILIDADE<br />

Elemento-chave <strong>de</strong>sta dissertação, o conceito <strong>de</strong> ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> é igualmente tratado <strong>de</strong><br />

formas diferentes por autores diversos. Dear e Scott (apud Vasconcelos, 2001:34) chamam <strong>de</strong><br />

ambiente <strong>de</strong> circulação o espaço <strong>de</strong> transição entre o ‘espaço <strong>de</strong> produção’ e o ‘espaço <strong>de</strong><br />

reprodução’. A distinção funcional entre as estruturas <strong>de</strong> produção/reprodução e <strong>de</strong> circulação<br />

encontra no ambiente <strong>de</strong> circulação uma síntese. A noção <strong>de</strong> ambiente <strong>de</strong> circulação carece <strong>de</strong><br />

especificida<strong>de</strong> metropolitana e, sobretudo, diz respeito ao conjunto total dos elementos urbanos.<br />

Uma abordagem mais a<strong>de</strong>quada quanto a escala e função é proposta por Nigriello, Pereira e Metran<br />

(2002:93): pontos <strong>de</strong> articulação são “lugares do espaço urbano com <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> transporte e<br />

a<strong>de</strong>nsamento significativos (...) em função do potencial <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento a eles intrínseco. Neles,<br />

a articulação entre a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte e a concentração <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s merece especial atenção<br />

porque respon<strong>de</strong>, ao mesmo tempo, a objetivos do planejamento urbano e do planejamento <strong>de</strong><br />

transportes”.<br />

Na mesma linha, Meyer, Grostein e Bi<strong>de</strong>rman (2004:164) <strong>de</strong>nominam pólos <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong><br />

metropolitana localizações urbanas precisas on<strong>de</strong> se articulam funções <strong>de</strong> abrangências<br />

metropolitana e local através <strong>de</strong> (ou associado a) um pólo <strong>de</strong> transporte público <strong>de</strong> massa. O vínculo<br />

ao transporte <strong>de</strong> massa, segundo os autores, diferencia esses pólos <strong>de</strong> outras formas <strong>de</strong> agregação <strong>de</strong><br />

funções e <strong>de</strong> mera coesão territorial, pois é capaz <strong>de</strong> estruturar todo o território metropolitano.<br />

Assim, os pólos <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> metropolitana são consi<strong>de</strong>rados “o antídoto para a dispersão<br />

funcional e a <strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong> territorial”.<br />

Para Bertolini (1999), a acessibilida<strong>de</strong> combinada com características <strong>de</strong> localização é capaz <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>terminar condições urbanas e econômicas específicas. Para o autor Ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>, são<br />

fruto da combinação entre acessibilida<strong>de</strong> e proximida<strong>de</strong>, e po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong>finidos pelo conjunto <strong>de</strong><br />

condições <strong>de</strong> naturezas diversas (capacida<strong>de</strong>, velocida<strong>de</strong> e horários <strong>de</strong> transporte, diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

serviços, <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>s funcionais, qualida<strong>de</strong> do espaço público etc.) que influenciam a presença <strong>de</strong><br />

pessoas num <strong>de</strong>terminado local.<br />

1.3 Nós e lugares da <strong>intermodal</strong>ida<strong>de</strong><br />

Nó e lugar são i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s, embora contraditórias, da estação <strong>intermodal</strong> enquanto entida<strong>de</strong><br />

geográfica e funcional. Ela é um nó, um ponto <strong>de</strong> acesso a trens e outros modos <strong>de</strong> transporte<br />

interligados, e é um lugar, uma parte específica da cida<strong>de</strong> com uma concentração <strong>de</strong> infra-estrutura,<br />

edifícios diversificados e espaços livres.<br />

Nó é um elemento funcional <strong>de</strong> caráter objetivo e representa i) a interface entre a cida<strong>de</strong> e um modo<br />

<strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> relevância e ii) a interface entre diversos modos <strong>de</strong> transporte num único ponto.<br />

Desta maneira, um nó é apreensível e qualificável pela quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas que transporta, a<br />

quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> modos <strong>de</strong> transporte que interliga e a qualida<strong>de</strong> da transferência entre esses modos<br />

em relação ao número <strong>de</strong> usuários (eficiência relativa).<br />

Lugar é um elemento <strong>de</strong> <strong>de</strong>finição complexa, pois apresenta abordagens objetivas e subjetivas que<br />

aplicam-se com exclusivida<strong>de</strong> a uma realida<strong>de</strong> específica. É um ambiente físico, que encontra no<br />

termo ‘espaço’ um bom sinônimo, e é também um entorno físico, que po<strong>de</strong> ser compreendido pelo<br />

termo ‘atmosfera’. Adaptado ao objeto <strong>de</strong> estudo aqui tratado, lugar po<strong>de</strong> ser entendido <strong>como</strong> o<br />

‘pedaço da cida<strong>de</strong>’ on<strong>de</strong> se localiza a estação. O lugar <strong>de</strong> uma estação na cida<strong>de</strong>, tem limites<br />

6


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

incertos: a influência <strong>de</strong> uma estação po<strong>de</strong> transcen<strong>de</strong>r em muito o seu entorno imediato, da mesma<br />

forma que elementos vizinhos po<strong>de</strong>m ter relação muito frágil com ela. Quatro abordagens básicas<br />

po<strong>de</strong>m ser i<strong>de</strong>ntificadas para a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> lugar, sendo que nenhuma esgota, individualmente, a<br />

análise pretendida. São elas:<br />

1. Raio <strong>de</strong> alcance a pé: a área <strong>de</strong> influência <strong>de</strong> uma estação é <strong>de</strong>finida por uma área circular cujo<br />

raio é passível <strong>de</strong> ser vencido a pé em situações cotidianas. Alguns autores sugerem raios <strong>de</strong> 500m,<br />

enquanto outros preferem medida em tempo ( <strong>como</strong> ‘caminhada <strong>de</strong> 10 minutos’). A vantagem <strong>de</strong>sse<br />

parâmetro são suas imparcialida<strong>de</strong> e fácil aplicação. Contra essa abordagem pesa a correspondência<br />

quase sempre ina<strong>de</strong>quada à realida<strong>de</strong> funcional da vizinhança, com a qual geralmente não coinci<strong>de</strong>,<br />

nem reflete o fator tempo x distância em todas as situações (consi<strong>de</strong>rando-se barreiras e aci<strong>de</strong>ntes<br />

geográficos).<br />

2. Elementos funcional-históricos: a área <strong>de</strong> influência é <strong>de</strong>terminada pela soma dos elementos e<br />

equipamentos funcionais <strong>de</strong> forte relação com a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte. Ao consi<strong>de</strong>rar só o passado e o<br />

presente, limita a compreensão do potencial da área.<br />

3. Topográfico: costuma ser uma <strong>de</strong>marcação retangular arbitrária que retrata a área <strong>de</strong> influência<br />

da estação na cida<strong>de</strong>. Delimita um recorte no mapa da cida<strong>de</strong> que abrange elementos urbanos<br />

significativos escolhidos com base em critérios pouco objetivos, mas pautados pelo ‘bom senso’ do<br />

<strong>de</strong>limitador e pela ‘relevância’ dos elementos escolhidos. Esta abordagem une parâmetros <strong>de</strong><br />

usuário e parâmetros funcionais, mas a sua <strong>de</strong>finição é <strong>de</strong>licada e não é passível <strong>de</strong> verificação.<br />

4. Perímetro <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento: área <strong>de</strong>finida por um estudo ou planejamento existente.<br />

Vantagens <strong>de</strong>ssa abordagem são sua aplicabilida<strong>de</strong> a uma realida<strong>de</strong> palpável; maior coincidência,<br />

com limites administrativos e coincidência razoável com fronteiras funcionais. Entre as<br />

<strong>de</strong>svantagens, po<strong>de</strong>-se apontar que áreas sob a influência da estação, mas negligenciadas no plano,<br />

são <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>radas; que a perspectiva do empreen<strong>de</strong>dor é geralmente parcial, o que contamina o<br />

universo consi<strong>de</strong>rado; e, finalmente, caso o plano seja mal elaborado, viciado ou incompleto, não se<br />

compreen<strong>de</strong> o recorte e não se po<strong>de</strong> aplicar o parâmetro.<br />

ESTAÇÕES: AMBIENTES DE MOBILIDADE<br />

Alguns impactos positivos do <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> transporte sobre re<strong>de</strong>s sócio-econômicas são<br />

evi<strong>de</strong>ntes. No papel <strong>de</strong> principais nós <strong>de</strong> transporte, estações são freqüentemente associadas a nós<br />

<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s sócio-econômicas: ativida<strong>de</strong>s ten<strong>de</strong>m a se concentrar ao redor <strong>de</strong> nós <strong>de</strong> transporte<br />

<strong>como</strong> estações intermodais, criando ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> significativa importância para a<br />

cida<strong>de</strong>. Enquanto nó e lugar, a estação e seu entorno participam <strong>de</strong> uma escala mais ampla, um<br />

sistema <strong>de</strong> competição e complementação numa escala regional e, algumas vezes, até internacional.<br />

Os ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> têm nas estações intermodais o seu condicionante mais forte, o que<br />

<strong>de</strong>monstra que acessibilida<strong>de</strong> não é somente uma característica do nó <strong>de</strong> transporte (estação<br />

<strong>intermodal</strong>), mas também é do local <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s. Assim, um ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> consolidado<br />

é um lugar aon<strong>de</strong> muitas pessoas diferentes conseguem chegar, e também on<strong>de</strong> muitas pessoas<br />

po<strong>de</strong>m fazer coisas diferentes. A aplicação do conceito <strong>de</strong> ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> a estações<br />

intermodais constitui um passo em direção à integração das consi<strong>de</strong>rações <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> e<br />

acessibilida<strong>de</strong>. Em poucas palavras, a estação <strong>intermodal</strong>, sendo nó e um lugar acessíveis,<br />

concretiza-se <strong>como</strong> elemento fundamental <strong>de</strong> organização metropolitana.<br />

7


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

2 A METRÓPOLE PAULISTANA E A REGIÃO DA LUZ<br />

2.1 Luz<br />

CONTEXTO<br />

Com essa conclusão, o estudo “Área da Luz” sintetiza o seu diagnóstico do Bairro da Luz:<br />

A Z8-007 não é, hoje, um centro administrativo, mas dispõe <strong>de</strong> equipamentos<br />

administrativos <strong>de</strong> âmbito municipal e metropolitano. Não é um pólo comercial ou <strong>de</strong><br />

serviço, mas dispõe <strong>de</strong> estabelecimentos comerciais e <strong>de</strong> serviço que esten<strong>de</strong>m sua<br />

atração a níveis municipais e metropolitanos. Não é um núcleo industrial, mas possui<br />

gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> indústrias, <strong>de</strong> tipos variados, pulverizadas pela área. Não é um centro<br />

<strong>de</strong> transporte, mas dispõe <strong>de</strong> um terminal <strong>de</strong> transportes suburbanos <strong>de</strong> passageiros. Não<br />

é um centro <strong>de</strong> lazer e cultura, mas dispõe <strong>de</strong> equipamentos <strong>de</strong> lazer e cultura, que<br />

aten<strong>de</strong>m a cida<strong>de</strong> e a Metrópole. (César, 1977:128)<br />

As dicotomias existentes hoje no bairro, tão bem sintetizadas na frase acima, não permitem<br />

compreen<strong>de</strong>r a real importância da região para a história da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo. Ou talvez permita,<br />

nas entrelinhas, compreen<strong>de</strong>r que o bairro tem um potencial inatingido ou um sucesso estancado. É<br />

um pouco dos dois.<br />

Os Campos do Guaré eram uma enorme várzea pantanosa entre os rios Tietê e Tamanduateí, a dois<br />

quilômetros do “triângulo” ao qual se restringia a vila <strong>de</strong> São Paulo. O Caminho do Guaré<br />

começava no Mosteiro <strong>de</strong> São Bento e atingia o rio Tietê, <strong>de</strong> on<strong>de</strong> os tropeiros seguiam em direção<br />

a Minas Gerais. No último ponto seco do Caminho construiu-se uma pequena capela, por volta <strong>de</strong><br />

1583. Em 1603, a capela recebe a imagem <strong>de</strong> N. Sa. da Luz, cuja fama rebatiza a região.<br />

Ocupada inicialmente por fazendas <strong>de</strong> gado, nos séculos XVII e XVIII a região viu crescer o<br />

movimento comercial dos tropeiros e feirantes. Por causa do <strong>de</strong>scobrimento do ouro em Minas<br />

Gerais, pelo Caminho do Guaré chegaram a passar dois terços dos habitantes <strong>de</strong> São Paulo, que<br />

abandonaram a vila em busca <strong>de</strong> trabalho. Nessa época, São Paulo não era mais do que uma vila<br />

muito pobre no entroncamento <strong>de</strong> cinco rotas comerciais.<br />

A tímida vila sobre a colina, lentamente beneficiada pelo transporte <strong>de</strong> mercadorias, passou a<br />

instalar no Guaré funções institucionais que já não cabiam mais no Triângulo. Foi assim que, em<br />

1774, <strong>de</strong>stinaram-se os terrenos em torno da capela para a fundação <strong>de</strong> um convento, tornando o<br />

Guaré o primeiro transbordamento urbano para fora da colina histórica. O acesso se dava pela R. da<br />

Constituição, atual Florêncio <strong>de</strong> Abreu, on<strong>de</strong> se instalavam algumas das primeiras casas <strong>de</strong> melhor<br />

padrão construtivo da cida<strong>de</strong>. Testemunho do prestígio da área foi a iniciativa <strong>de</strong> instalar aí o nobre<br />

Jardim Botânico, em 1790, que foi inaugurado em 1825 <strong>como</strong> Jardim Público, hoje chamado <strong>de</strong><br />

Parque da Luz. O Jardim era o orgulho dos paulistanos. Antes da inauguração do Jardim, achava-se<br />

8


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

já concluída uma das maiores obras do período colonial: o Aterrado <strong>de</strong> Sant’Anna vencia a várzea e<br />

viabilizava o crescimento do comércio na região. A Avenida Tira<strong>de</strong>ntes, que substituiu o Caminho<br />

da Luz sobre o aterro, compunha com seus canteiros ajardinados um cenário urbano altamente<br />

sofisticado on<strong>de</strong> instalaram-se ainda diversos outros equipamentos administrativos, religiosos e<br />

culturais no século XIX.<br />

O café, a partir da segunda meta<strong>de</strong> do século XIX, viria alterar profundamente o perfil <strong>de</strong> São<br />

Paulo, justamente a partir da Luz. Os cafezais penetraram rapidamente a partir do Vale do Paraíba<br />

em direção ao Oeste Paulista, on<strong>de</strong> encontram solo fértil e a<strong>de</strong>quado à sua cultura. As novas<br />

distâncias e a produtivida<strong>de</strong> dos cafezais revelam a ineficiência do transporte tradicional. Com o<br />

crescimento da <strong>de</strong>manda pelo produto no mundo, cresce a pressão pela implantação <strong>de</strong> uma<br />

ferrovia. Com inéditas garantias do governo imperial, viabiliza-se a construção da linha férrea. Em<br />

1856 autorizou-se ao Barão <strong>de</strong> Mauá a construção da ligação entre Santos e Jundiaí.<br />

A linha da São Paulo Railway (SPR) seria implantada entre 1862 e 1867, com 139Km totais.<br />

Dispunha <strong>de</strong> concessão <strong>de</strong> 90 anos a contar da inauguração e exclusivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso ao Porto <strong>de</strong><br />

Santos por 30 anos iniciais. O propósito da ferrovia era apenas o transporte <strong>de</strong> café entre o interior e<br />

Santos através dos terrenos secos e planos da Mooca, Brás, Pari, Luz, Barra Funda e Lapa. Sua<br />

primeira estação para passageiros ocupou terreno ao lado do Jardim Público, <strong>de</strong> fácil acesso ao<br />

centro. O tráfego na SPR superou largamente a previsão, tornando-a altamente lucrativa. A cômoda<br />

exclusivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso a Santos não estimulou a companhia a expandir sua re<strong>de</strong>, uma vez que<br />

qualquer outro sistema seria tributário seu. Visando escoar a produção <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a origem, até 1880<br />

formam-se outras companhias: Companhia Paulista <strong>de</strong> Estrada <strong>de</strong> Ferro, Estrada <strong>de</strong> Ferro<br />

Sorocabana, Estrada <strong>de</strong> Ferro Ituana, Companhia Mogiana <strong>de</strong> Vias Férreas e Estrada <strong>de</strong> Ferro Rio-<br />

São Paulo.<br />

O primeiro boom provocado pelo início <strong>de</strong> operação da ferrovia coinci<strong>de</strong> com o governo <strong>de</strong> João<br />

Teodoro (1872-1875). Nesse período, a cida<strong>de</strong> conheceu o que alguns historiadores chamam <strong>de</strong><br />

‘segunda fundação <strong>de</strong> São Paulo’, dado o grau dos investimentos e melhorias implantados.<br />

Significativamente enriquecida pelo café, a cida<strong>de</strong> recebeu gran<strong>de</strong>s obras <strong>de</strong> infra-estrutura básica e<br />

viária, sendo a região da Luz uma das mais beneficiadas. Em 1872 iniciou-se a ocupação a leste da<br />

Tira<strong>de</strong>ntes e criou-se a ligação entre as estações da Luz e do Norte. As ruas passaram a ter<br />

iluminação a gás e abriramse os principais eixos viários dos Campos Elísios, o primeiro bairro<br />

projetado, <strong>de</strong>stinado às elites cafeeiras. O bairro conhece uma ‘epi<strong>de</strong>mia <strong>de</strong> urbanização’ cujo<br />

epicentro é a estação da Luz: bon<strong>de</strong> a tração animal, sistema <strong>de</strong> esgoto e outros melhoramentos<br />

qualificam ainda mais a região e incentivam o parcelamento do entorno. Bairros operários ocupam a<br />

baixada do Tamanduateí e a orla ferroviária, e a ativida<strong>de</strong> econômica ganha impulso com a<br />

mudança do comércio <strong>de</strong> gêneros agrícolas do Piques para a área das estações. A ferrovia promove<br />

gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento no bairro, estimulando a instalação <strong>de</strong> comércio variado e serviços para os<br />

viajantes, <strong>como</strong> hotéis e restaurantes, e tornando o bairro o mais bem equipado da cida<strong>de</strong>.<br />

A partir da década <strong>de</strong> 1870, São Paulo conhece um crescimento sem prece<strong>de</strong>ntes. O crescimento <strong>de</strong><br />

700% em pouco mais <strong>de</strong> 25 anos causou um aumento sensível <strong>de</strong> loteamentos <strong>de</strong> diversos padrões e<br />

proliferação <strong>de</strong> cortiços na Luz. Nesta época, cerca <strong>de</strong> 50% da população paulistana era <strong>de</strong><br />

imigrantes italianos. A maioria, <strong>de</strong>scontentes com a lavoura do café, retornava à Cida<strong>de</strong> e<br />

alimentava uma indústria incipiente à beira das linhas <strong>de</strong> trem. A construção do viaduto do Chá, em<br />

1892, permite a conexão do Centro com a República e origina novos empreendimentos para a classe<br />

mais abastada. A Luz vislumbra sua estagnação: com o crescimento ao norte dificultado pelas<br />

indústrias, a <strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong> do tecido urbano em relação à linha férrea, os freqüentes alagamentos<br />

dos rios e a má fama das fábricas, a elite abandona os Campos Elísios apenas 20 anos após sua<br />

inauguração para ocupar Higienópolis e a Av. Paulista. Dois fatores retardam a percepção dos<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

problemas estruturais da região: a inauguração da estação da Sorocabana, em 1902, e a inauguração<br />

da nova estação da Luz, em 1901. Esta, luxuosíssima e próxima ao Jardim, passa a ser um dos<br />

locais <strong>de</strong> encontro da elite paulistana.<br />

Paralelamente ao último suspiro <strong>de</strong> progresso simbolizado pelas novas estações, agravam-se os<br />

problemas da área: o rebaixamento da linha da SPR estabeleceu a Av. Tira<strong>de</strong>ntes <strong>como</strong> principal<br />

transposição, sobrecarregando-a; a relação da ferrovia com a cida<strong>de</strong>, baseada em transporte <strong>de</strong><br />

cargas e viagens longas, agrava a <strong>de</strong>sconexão entre a linha e o tecido urbano; este, aliado à<br />

inflexibilida<strong>de</strong> da ferrovia, assiste aos parcelamento e uso aleatórios e contribui para o seu<br />

isolamento do Centro, contradizendo a importância dos equipamentos estabelecidos e a nobreza dos<br />

Campos Elísios. Posteriormente, no final da década <strong>de</strong> 1920, a inauguração do Parque da Água<br />

Branca passa a rivalizar diretamente com o Parque da Luz, dissolvendo sua importância <strong>como</strong> pólo<br />

<strong>de</strong> lazer. Em 1929, com a <strong>de</strong>rrocada da economia cafeeira, a ferrovia <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser o sustentáculo<br />

econômico da Cida<strong>de</strong>.<br />

O automóvel, que a partir do início do século apresenta substancial crescimento, enxerga no Plano<br />

<strong>de</strong> Avenidas <strong>de</strong> Prestes Maia, <strong>de</strong> 1930, seu maior estímulo. Propunha a sistematização da malha<br />

viária para reestruturar e reforçar o centro, priorizando a macroacessibilida<strong>de</strong> metropolitana e<br />

flui<strong>de</strong>z <strong>de</strong> tráfego. Na Luz, o Plano fez-se presente através da integração da Av. Tira<strong>de</strong>ntes ao<br />

chamado ‘Sistema Y’ que, interligado à marginal do Tietê, reforçou sua função estratégica numa<br />

escala alheia à das <strong>de</strong>mais ruas do bairro e acelerou a necrose do bairro. Portanto, a reestruturação<br />

viária da Metrópole, ao priorizar o automóvel e a macroacessibilida<strong>de</strong>, minou o dinamismo<br />

econômico que caracterizou a Luz no final do século XIX.<br />

Na década <strong>de</strong> 1950, amparada no conjunto <strong>de</strong> intervenções <strong>de</strong> Prestes Maia, a Cida<strong>de</strong> experimenta<br />

uma radical expansão do mo<strong>de</strong>lo rodoviarista e nega a ferrovia <strong>como</strong> potencial elemento <strong>de</strong><br />

transporte urbano. Os trens <strong>de</strong> longo percurso dão lugar aos trens <strong>de</strong> subúrbio e, somados ao<br />

terminal <strong>de</strong> ônibus, implantado em 1961 em frente à estação da Sorocabana, aumentam a<br />

<strong>de</strong>svalorização da área com a injeção <strong>de</strong> enorme massa <strong>de</strong> trabalhadores.<br />

A partir <strong>de</strong> 1968, com a fundação do Metrô, e do plano <strong>de</strong> implantação da primeira linha cruzando a<br />

Luz, enxerga-se a possibilida<strong>de</strong> reconversão da área. Em 1974, com a inauguração da Linha 1, a<br />

prefeitura <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> ‘congelar’ o bairro através da nova lei <strong>de</strong> zoneamento, caracterizando-o <strong>como</strong> Z8-<br />

007. A intenção era que o bairro não sofresse, novamente, uma ocupação indiscriminada que<br />

pu<strong>de</strong>sse afetar seu significado histórico. Pretendia-se estancar a pressão imobiliária até que fosse<br />

criado um plano <strong>de</strong> renovação. Imaginava-se que a área pu<strong>de</strong>sse ser a continuida<strong>de</strong> do Centro, uma<br />

vez que contava com facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso, disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> terrenos ociosos e públicos e<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>nsamento baseada em infra-estruturas reais. O plano foi concluído em 1979 e<br />

não viu a maior parte <strong>de</strong> suas idéias implantadas. Pior: as restrições emergenciais da Z8-007 foram<br />

ingenuamente mantidas e contribuíram para uma maior <strong>de</strong>cadência do bairro.<br />

Atualmente, a região encontra-se <strong>de</strong>teriorada do ponto <strong>de</strong> vista urbanístico, ambiental, econômico e<br />

social, embora abrigue importantes pólos <strong>de</strong> comércio especializado. Pela estação da Luz chegam<br />

hoje à região cerca <strong>de</strong> 50mil passageiros por dia, número que será elevado a cerca <strong>de</strong> 300 mil na<br />

próxima década e po<strong>de</strong>rá chegar a 500 mil na seguinte através da reformulação e mo<strong>de</strong>rnização da<br />

re<strong>de</strong> da CPTM e integração operacional, física e tarifária entre as linhas 1 e 4 do metrô, previstas no<br />

PITU-2020 e no Projeto Integração Centro. Esses dados, associados aos predicados históricos e<br />

culturais do bairro, reforçam a urgência em se planejar a estação e o bairro da Luz para absorver o<br />

potencial <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong> que, mais uma vez, po<strong>de</strong>rá voltar a <strong>de</strong>sempenhar.<br />

A ESTAÇÃO DA LUZ – BREVE HISTÓRICO<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

Por ser um equipamento voltado iminentemente para o transporte <strong>de</strong> café, a linha da SPR<br />

estabelecia poucos pontos <strong>de</strong> contato com a cida<strong>de</strong>. Para o tráfego <strong>de</strong> passageiros, poucas estações<br />

foram previstas. A primeira e principal <strong>de</strong>las, justamente por ser o ponto <strong>de</strong> maior proximida<strong>de</strong> ao<br />

Centro, foi a estação da Luz.<br />

Ocupando uma gran<strong>de</strong> faixa <strong>de</strong> 45m suprimida em 1860 do Jardim da Luz, construiu-se<br />

inicialmente uma mo<strong>de</strong>sta estação junto ao Jardim. No próprio ano da inauguração, em 1867, dada a<br />

simplicida<strong>de</strong> da construção e ina<strong>de</strong>quação ao tráfego do entorno, exigem-se melhorias. A segunda<br />

estação, mera ampliação da primeira e <strong>de</strong> padrão também muito simples, rapidamente se vê<br />

saturada.<br />

A renovação da exclusivida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso a Santos, em 1897, obriga a SPR a mo<strong>de</strong>rnizar todas as<br />

suas instalações. A lucrativa companhia não mediu esforços para equipar suas estações,<br />

especialmente a da Luz, com o que houvesse <strong>de</strong> mais luxuoso. Fez construir aí um edifício<br />

monumental totalmente com materiais importados da Inglaterra. O novo edifício, inaugurado em<br />

1901, <strong>de</strong>senvolve-se sobre a calha rebaixada da ferrovia. Desta forma, a linha não obstruía mais o<br />

tráfego na Av. Tira<strong>de</strong>ntes e escondia as composições que cruzavam a cida<strong>de</strong>. Voltada para o Jardim<br />

o edifício ostenta na ala oeste uma enorme torre com relógio que virou marco na cida<strong>de</strong>. Pretendiase<br />

configurar uma imponente ‘porta <strong>de</strong> acesso’ para São Paulo que, aliada ao Jardim,<br />

impressionasse os visitantes que nela encontravam o símbolo da <strong>de</strong>finitiva transformação da antiga<br />

vila em um dos centros da economia nacional.<br />

A estação representa o ápice da economia cafeeira, mas marca também o <strong>de</strong>clínio velado da região,<br />

apesar <strong>de</strong> ter se tornado ponto <strong>de</strong> encontro da elite quando <strong>de</strong> sua inauguração. O rebaixamento da<br />

linha, apesar <strong>de</strong> interessante <strong>como</strong> obra <strong>de</strong> engenharia, não previu conexão a<strong>de</strong>quada entre seus<br />

flancos norte e sul.<br />

Em 1946 um incêndio <strong>de</strong>strói boa parte do prédio. A reconstrução, <strong>de</strong> 1947 a 1951, prevê a<br />

ampliação do edifício com intuito <strong>de</strong> absorver um tráfego <strong>de</strong> passageiros 20 vezes maior que à<br />

época <strong>de</strong> sua construção original. Em 1976 o Con<strong>de</strong>phaat inicia o tombamento do complexo,<br />

concluído apenas em 1982. Em 1995, passa a fazer parte do patrimônio nacional. Atualmente, dois<br />

projetos estão em andamento no edifício. Um <strong>de</strong>les se refere à instalação do centro cultural ‘Estação<br />

da Luz da Nossa Língua’. O projeto previa um centro <strong>de</strong> estudo da língua portuguesa e o restauro<br />

das fachadas do edifício, este concluído em 2004. O outro projeto é a a<strong>de</strong>quação da infra-estrutura<br />

da estação para aten<strong>de</strong>r ao acréscimo <strong>de</strong> passageiros nos próximos anos. As intervenções respon<strong>de</strong>m<br />

a três quesitos básicos: dois <strong>de</strong>les são o atendimento a <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 35mil passageiros por<br />

hora nos horários <strong>de</strong> pico e a integração física e operacional a<strong>de</strong>quada entre as linhas A, B, D e E da<br />

CPTM e as linhas 1 e 4 do Metrô; o outro quesito é a criação <strong>de</strong> melhor integração física e funcional<br />

com o entorno imediato, gerando uma renovação consistente que possa irradiar para toda a região.<br />

AMBIENTE DE MOBILIDADE<br />

Como pô<strong>de</strong> ser observado a partir do histórico exposto, existe uma clara vinculação entre os<br />

equipamentos <strong>de</strong> transporte, a estrutura produtiva e a configuração espacial em todas as fases do<br />

<strong>de</strong>senvolvimento da região da Luz.<br />

Uma análise da acessibilida<strong>de</strong> da área sugere que há um <strong>de</strong>scompasso substancial entre a macro e a<br />

microacessibilida<strong>de</strong>. A macroacessibilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong> ser i<strong>de</strong>ntificada por alguns elementos-chave <strong>como</strong><br />

as linhas férreas e <strong>de</strong> metrô, o terminal <strong>de</strong> ônibus Princesa Isabel e o eixo norte-sul da Tira<strong>de</strong>ntes.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

Todos eles dizem respeito à lógica metropolitana e conectam-se a importantes vias <strong>de</strong> longo<br />

alcance, <strong>como</strong> as Marginais do rio Tietê, as avenidas Nove <strong>de</strong> Julho e Vinte e Três <strong>de</strong> Maio, as<br />

linhas 2 e 3 do Metrô e as linhas F e C da CPTM.<br />

Chegam atualmente, nas imediações da Luz, um total <strong>de</strong> 118 linhas <strong>de</strong> ônibus que alcançam bairros<br />

<strong>de</strong> toda as regiões da cida<strong>de</strong>. Dessas linhas, 40 têm seus pontos finais distribuídos <strong>de</strong> maneira<br />

fragmentada nas ruas do bairro, outras 23 utilizam o terminal Princesa Isabel <strong>como</strong> término e 55<br />

passam pelo bairro com outros <strong>de</strong>stinos.<br />

A instalação da Rodoviária junto à Praça Júlio Prestes, na década <strong>de</strong> 60, saturou as estreitas ruas do<br />

bairro. Em 1982, com a inauguração do Terminal Tietê, a região viu-se livre do movimento <strong>de</strong><br />

ônibus que não serviam diretamente ao bairro.<br />

Na estação Júlio Prestes circulam os trens da Linha B, com movimentação diária <strong>de</strong><br />

aproximadamente 10.000 passageiros. A estação Luz, por sua vez, é atendida pelas Linhas A, D e E<br />

com movimentação diária <strong>de</strong> aproximadamente 180.000 pessoas ao longo <strong>de</strong> sua extensão. Lê-se na<br />

configuração das linhas (quantida<strong>de</strong> e localização <strong>de</strong> estações, <strong>de</strong>stinos etc.) e na organização<br />

espacial (trajetos) uma mistura da sua antiga função <strong>de</strong> apoio à produção e da sua conversão em<br />

transporte suburbano a partir da década <strong>de</strong> 50. As linhas da CPTM têm baixa eficácia, hoje, quanto<br />

à comunicação <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s <strong>metropolitanas</strong>. No entanto, as ações previstas no PITU2020 têm<br />

alterado a função <strong>de</strong>ssas linhas, qualificando-as ao transporte intraurbano: intervalos menores,<br />

novas estações, maior conforto e conexão à re<strong>de</strong> metroviária. Ações que, em sua maior parte,<br />

privilegiam a macroacessibilida<strong>de</strong>. Há <strong>de</strong> se mencionar, também, os projetos existentes <strong>de</strong> trem<br />

expresso entre aeroportos.<br />

A linha 1 do Metrô apresenta duas estações na área: Luz e Tira<strong>de</strong>ntes, próximas à estação da Luz e<br />

à Fatec, respectivamente. Essa linha atravessa dois dos mais importantes centros metropolitanos <strong>de</strong><br />

São Paulo (o Centro Histórico e Av. Paulista), além <strong>de</strong> passar por outros bairros funcionalmente<br />

importantes, alimentar o Terminal Rodoviário Tietê (o maior e mais importante do país) e conectarse<br />

às linhas 2 e 3 do Metrô. Pela linha 1 circulam 1.089.002 passageiros/dia-útil dos quais 72.000<br />

embarcam na Estação da Luz e 16.500 na Estação Tira<strong>de</strong>ntes 1 . A linha 4 (Luz-Vila Sônia), que se<br />

encontra hoje em obra, passará, pelo Centro e pela Av. Paulista. Adicionalmente, atravessará a<br />

região <strong>de</strong> Pinheiros/Faria Lima, importante pólo funcional metropolitano. A linha 4 aten<strong>de</strong>rá ao<br />

maior vetor <strong>de</strong> tráfego alimentador do Centro, hoje caracterizado pelo eixo Rebouças-Consolação, e<br />

<strong>de</strong>verá representar importante alternativa <strong>de</strong> substituição modal aos numerosos ônibus que<br />

conectam o Centro aos bairros e municípios a oeste. Com capacida<strong>de</strong> para 1 milhão <strong>de</strong><br />

passageiros/dia, quando sua construção estiver completa e as re<strong>de</strong>s do Metrô e da CPTM estiverem<br />

interligadas, estima-se que pela estação da Luz passarão <strong>de</strong> 300mil a 500mil passageiros por dia, o<br />

que representa um crescimento <strong>de</strong> 600% a 1000% do movimento estimado em 50mil passageiros no<br />

ano 2000.<br />

É notória a vocação da região da Luz, a partir dos dados acima expostos, <strong>como</strong> importante nó <strong>de</strong><br />

transporte metropolitano, o que comprova a tese <strong>de</strong> que a macroacessibilida<strong>de</strong> do bairro é<br />

significativa. No entanto, o bairro é <strong>de</strong>ficitário em microacessibilida<strong>de</strong>. Os numerosos ônibus e<br />

carros que trafegam na região contam com um gran<strong>de</strong> eixo viário, que é a avenida Tira<strong>de</strong>ntes, mas<br />

não dispõem <strong>de</strong> vias a<strong>de</strong>quadas <strong>de</strong> aproximação. Desta forma, a avenida Tira<strong>de</strong>ntes relaciona-se<br />

mal com as estreitas ruas dos antigos bairros que corta. Seu tráfego eminentemente <strong>de</strong> passagem<br />

impõe ao bairro uma <strong>de</strong>gradação severa e inibe a instalação <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s variadas ao longo da via.<br />

Os edifícios instalados na Tira<strong>de</strong>ntes, pela sua função, carecem <strong>de</strong> acesso a<strong>de</strong>quado para pe<strong>de</strong>stres e<br />

1 Dados fornecidos pelo Metrô SP referentes à média diária do mês <strong>de</strong> maio/2005.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

não estabelecem relação eficaz com os <strong>de</strong>mais edifícios da região, prejudicando a concretização <strong>de</strong><br />

sua vocação cultural e <strong>de</strong> lazer. Ainda, a existência <strong>de</strong> uma avenida <strong>de</strong> seção avantajada e <strong>de</strong> tráfego<br />

<strong>de</strong> passagem segrega os tecidos lin<strong>de</strong>iros ao oferecer transposições raras e extremamente<br />

ina<strong>de</strong>quadas.<br />

Os trens da CPTM, embora tragam quantida<strong>de</strong> expressiva <strong>de</strong> passageiros para o bairro, contam com<br />

poucas estações e, portanto, apresentam baixa capilarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso. Esta condição <strong>de</strong>sestimula<br />

sua utilização para transporte local associado a outros modos, <strong>como</strong> o Metrô e ônibus. Por estar<br />

rebaixada em relação ao nível da rua, e consi<strong>de</strong>rando as importantes diferenças <strong>de</strong> cota entre os<br />

bairros dos Campos Elísios-Santa Efigência e Bom Retiro, a trincheira dificulta a comunicação<br />

entre eles e canaliza todo o tráfego <strong>de</strong> veículos e pe<strong>de</strong>stres para poucos pontos <strong>de</strong> travessia. Seria<br />

necessária a reavaliação da transposição da linha da CPTM e da avenida Tira<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> forma a<br />

minimizar, no bairro, o impacto <strong>de</strong>ssas vias fundamentais para a estrutura <strong>de</strong> transportes<br />

metropolitanos.<br />

Quanto ao Metrô, apesar <strong>de</strong> fortalecer a acessibilida<strong>de</strong> da região tanto na escala macro quanto<br />

micro, per<strong>de</strong> na estação Tira<strong>de</strong>ntes a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> efetivar sua capacida<strong>de</strong> em função dos<br />

problemas da avenida Tira<strong>de</strong>ntes acima mencionados. Os pe<strong>de</strong>stres não têm acesso a<strong>de</strong>quado a<br />

muitos dos outros equipamentos do bairro e o caráter agressivo da avenida não estimula a utilização<br />

da estação da Luz.<br />

O entorno da estação da Luz é profícua em equipamentos culturais e <strong>de</strong> lazer. A Pinacoteca é hoje<br />

um dos principais museus da cida<strong>de</strong>, e o Museu <strong>de</strong> Arte Sacra abriga as mais preciosas obras <strong>de</strong> arte<br />

da história <strong>de</strong> São Paulo. A Sala São Paulo converteu-se em gran<strong>de</strong> sucesso graças a uma boa<br />

ocupação do edifício existente e a um marketing eficiente. Po<strong>de</strong>-se citar, ainda, a Estação<br />

Pinacoteca, o Conservatório Musical Tom Jobim e o próprio Parque da Luz <strong>como</strong> equipamentos<br />

culturais importantes.<br />

É gran<strong>de</strong> a presença <strong>de</strong> órgãos administrativos na área. Além disso, da área acessa-se facilmente o<br />

complexo do Anhembi e o Terminal Rodoviário Tietê, equipamentos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância<br />

funcional. No entanto, a região não atrai empresas e, menos ainda, habitação <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>. A<br />

proximida<strong>de</strong> do Centro, a infra-estrutura instalada, a oferta <strong>de</strong> transporte e a gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

construções obsoletas é uma realida<strong>de</strong> que sugere potencial <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Porém, apesar da<br />

presença <strong>de</strong> funções culturais qualificadas e da força do nó <strong>de</strong> transporte, a Luz não é, ainda, um<br />

ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>. A análise indica que um dos maiores entraves para um pleno<br />

<strong>de</strong>senvolvimento da área seja a péssima microacessibilida<strong>de</strong> da região.<br />

FIGURA 1: ambiente <strong>de</strong><br />

mobilida<strong>de</strong> ou nó-lugar gerado<br />

pela Estação da Luz. Neste<br />

esquema, <strong>como</strong> exemplo,<br />

fun<strong>de</strong>m-se o nó <strong>de</strong> transporte<br />

com uma somatória <strong>de</strong><br />

interpretações <strong>de</strong> lugar<br />

(funcional-histórica e perímetro<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento).<br />

13


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

2.2 O transporte na estruturação da metrópole <strong>de</strong> São Paulo<br />

O arranjo espacial da gran<strong>de</strong> São Paulo repousa sobretudo na<br />

infra-estrutura em vias <strong>de</strong> transporte. (Langenbuch,1971:334)<br />

Mobilida<strong>de</strong> e acessibilida<strong>de</strong> são termos cuja aplicação a São Paulo confun<strong>de</strong>-se com a própria<br />

história da metrópole paulistana. Seu <strong>de</strong>senvolvimento urbano sempre esteve associado aos seus<br />

ciclos produtivos e, estes, aos transportes <strong>como</strong> elemento “validador” da ocupação territorial.<br />

Conforme sugere Meyer (in Meyer e Izzo Jr, 1999:10), a estruturação física <strong>de</strong> São Paulo tem sido a<br />

expressão da permanente adaptação ao território, visando sempre um bom <strong>de</strong>sempenho <strong>de</strong> funções<br />

urbanas específicas. E acrescenta: “quando se torna evi<strong>de</strong>nte um conjunto <strong>de</strong> profundas<br />

transformações estruturais no seu sistema produtivo, é indispensável, para a compreensão e<br />

posterior enfrentamento <strong>de</strong> um novo panorama urbano, buscar esclarecer o percurso histórico <strong>de</strong><br />

questões que afetam a metrópole contemporânea”. Dando continuida<strong>de</strong> a esse embasamento<br />

histórico, que no item anterior apresentou o recorte da Luz, trata-se a seguir da relação entre<br />

transporte, ocupação territorial e dinâmica produtiva em São Paulo.<br />

No livro São Paulo Metrópole (2004), os autores anotam que a análise da metrópole sob o tema da<br />

mobilida<strong>de</strong> precisa necessariamente contemplar a relação que se estabeleceu ao longo do processo<br />

<strong>de</strong> formação da cida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> sua metropolização. Com esta finalida<strong>de</strong>, propõe-se, nesta monografia,<br />

uma divisão em quatro etapas históricas baseadas na mobilida<strong>de</strong> e na produção econômica.<br />

A CIDADE DAS ROTAS: da fundação à chegada da ferrovia (1554-1872)<br />

É fato largamente explorado pela maior parte dos historiadores que São Paulo permanecia um<br />

vilarejo ainda muito <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> sua fundação. Embora seja verda<strong>de</strong> que a cida<strong>de</strong> resumia-se a um<br />

pequeno número <strong>de</strong> construções precárias, a idéia <strong>de</strong> que fosse insignificante não coinci<strong>de</strong> com a<br />

importância funcional que exercia numa escala muito maior que a urbana.<br />

Já no século XVI, pelo caminho <strong>de</strong> Santos passavam tropeiros entre o sertão e o litoral. A cida<strong>de</strong><br />

servia-lhes <strong>de</strong> parada. No século seguinte, o movimento <strong>de</strong> tropas que cruzavam São Paulo aumenta<br />

com a <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> pedras preciosas no sertão e a <strong>de</strong>manda por índios. A partir <strong>de</strong> 1695, com a<br />

<strong>de</strong>scoberta do ouro em Minas Gerais e no Centro Oeste, São Paulo se vê significativamente<br />

esvaziada <strong>de</strong> habitantes, que partem para as minas. A vila vê crescer, porém, o movimento nas<br />

novas estradas que se estendiam em diferentes direções e tinham nela sua confluência.<br />

No final do século XVIII, cinco rotas convergem para São Paulo, trazendo o expressivo número <strong>de</strong><br />

até 4 tropas diariamente (Soukef Jr. e Mazzoco, 2000). O aumento do tráfego e a importância<br />

estratégica representada pela colina dos jesuítas promoveram a vila a entreposto comercial, cujas<br />

feiras possibilitaram a acumulação <strong>de</strong> capitais. No século XIX, a penetração do café a partir do Vale<br />

do Paraíba serviu-se da cida<strong>de</strong> não só <strong>como</strong> local <strong>de</strong> negociação e transporte da mercadoria, mas<br />

também se apropriou <strong>de</strong>sse capital para o rápido estabelecimento da ativida<strong>de</strong> cafeeira no estado.<br />

14


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

Avançando avidamente em direção às terras férteis do oeste, a cultura do café revelou a<br />

ina<strong>de</strong>quação do transporte tradicional. Somado ao aumento da já mencionada <strong>de</strong>manda<br />

internacional pelo produto, iniciaram-se, na segunda meta<strong>de</strong> do século XIX, os estudos para<br />

implantação <strong>de</strong> uma linha férrea até o porto <strong>de</strong> Santos. Nesta época, apesar da funcional da cida<strong>de</strong>, a<br />

riqueza do café permanecia nas fazendas e não repercutia diretamente na cida<strong>de</strong>, que já abrigava a<br />

Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Direito e comércio em expansão.<br />

A CIDADE DO CAFÉ: da ferrovia e do bon<strong>de</strong> à política rodoviarista (1872-1930)<br />

Com a instalação da São Paulo Railway, em 1867, e <strong>de</strong> outras linhas nos anos subseqüentes, houve<br />

severa reorganização urbana em São Paulo. Com a facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte, os fazen<strong>de</strong>iros passaram<br />

a controlar as fazendas a partir da cida<strong>de</strong>.<br />

O Triângulo histórico, que i<strong>de</strong>ntificava até então o núcleo urbanizado, sente seu primeiro impulso<br />

<strong>de</strong> transbordamento. A atual rua Florêncio <strong>de</strong> Abreu, ao norte, recebeu as primeiras casas que<br />

indicavam o Guaré <strong>como</strong> nova frente <strong>de</strong> ocupação. Des<strong>de</strong> o início do século XIX, quando o Jardim<br />

Público foi inaugurado, esse vetor norte apresentava-se <strong>como</strong> situação privilegiada. Durante a<br />

instalação da ferrovia, chácaras que bor<strong>de</strong>avam a cida<strong>de</strong> passavam por acelerado processo <strong>de</strong><br />

urbanização (Meyer e Izzo, 1999). O Triângulo começa, então, a per<strong>de</strong>r função resi<strong>de</strong>ncial e a<br />

concentrar ativida<strong>de</strong>s comerciais, religiosas e administrativas. Implanta-se o primeiro bairro<br />

planejado, os Campos Elísios (1872), on<strong>de</strong> instalaram-se as aristocráticas casas dos cafeicultores.<br />

No governo <strong>de</strong> João Teodoro Xavier, iniciado em 1872, reforçou-se o caráter progressista da<br />

transformação urbana em andamento: ruas calçadas e iluminadas e articulação viária entre o<br />

Triângulo e as novas áreas <strong>de</strong> expansão. Neste período, conhecido <strong>como</strong> ‘segunda fundação’ da<br />

cida<strong>de</strong>, implantaram-se as primeiras linhas <strong>de</strong> bon<strong>de</strong> a tração animal. O bon<strong>de</strong> inaugurava o<br />

transporte público urbano através da Companhia <strong>de</strong> Carris <strong>de</strong> Ferro <strong>de</strong> São Paulo em outubro <strong>de</strong><br />

1872 (Vana, 2005), em substituição às diligências e ao lombo <strong>de</strong> burro, e oferecia sustentação aos<br />

novos núcleos <strong>de</strong> ocupação (Meyer, Grostein e Bi<strong>de</strong>rman, 2004). Em 5 anos <strong>de</strong> funcionamento, as<br />

linhas <strong>de</strong> bon<strong>de</strong> formaram uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> 25km, com 82 carros.<br />

A instalação da ferrovia e do bon<strong>de</strong> possibilitou a rápida urbanização dos arredores. Segundo<br />

Langenbuch (1971:78), um “novo período <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento urbano” ocorre a partir <strong>de</strong> 1870. Já<br />

Meyer e Izzo (1999:20) apontam que “a nova infra-estrutura selou seu passado provinciano e<br />

colonial e abriu a cida<strong>de</strong> para um embrionário ciclo metropolitano”. Vencido o limite geográfico<br />

através do Viaduto do Chá, expan<strong>de</strong>-se ainda mais a zona resi<strong>de</strong>ncial. Os arruamentos do Chá e<br />

Santa Efigênia (1879), Higienópolis e Paulista (1890 a 1895), e Jardins (1910) foram <strong>de</strong>stinados à<br />

elite. Próximos ao centro, abrem-se bairros para a nova classe média <strong>como</strong> Consolação, Santa<br />

Cecília, Vila Buarque e Liberda<strong>de</strong>, e nas várzeas dos rios e ao longo das ferrovias surgem bairros<br />

operários <strong>como</strong> Pari, Brás, Mooca, Ipiranga, Vila Pru<strong>de</strong>nte, Bom Retiro e Barra Funda. Estes<br />

últimos criam situação propícia para a implantação das primeiras fábricas.<br />

A ocupação do território através do loteamento <strong>de</strong> chácaras particulares implicou, por um lado, a<br />

<strong>de</strong>scontinuida<strong>de</strong> do tecido urbano. Por outro lado, os impactos do impressionante crescimento<br />

<strong>de</strong>mográfico a partir <strong>de</strong> 1870 não implicaram o congestionamento da colina histórica, cuja vocação<br />

<strong>de</strong> centro comercial e administrativo foi acentuada pelo caráter resi<strong>de</strong>ncial dos núcleos periféricos.<br />

Estes loteamentos tiveram ainda maior impulso com a instalação do bon<strong>de</strong> elétrico em 1900, que<br />

sustentou o a<strong>de</strong>nsamento <strong>de</strong> diversos bairros. Com uma re<strong>de</strong> capaz <strong>de</strong> quase quadruplicar em<br />

apenas dois anos (1900 a 1902), convém anotar que as linhas <strong>de</strong> bon<strong>de</strong> freqüentemente<br />

ultrapassavam a mancha urbanizada, atuando <strong>como</strong> instrumento <strong>de</strong> indução especulativa <strong>de</strong><br />

ocupação.<br />

15


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

O trem, por sua vez, contribuía <strong>de</strong> maneira diferente para a organização na nova cida<strong>de</strong>.<br />

Abandonando as fazendas, muitos imigrantes italianos voltaram a São Paulo e <strong>de</strong>dicaram-se à<br />

indústria incipiente que se instalava junto à ferrovia.<br />

A indústria possibilitou não só a ocupação <strong>de</strong> lotes <strong>de</strong> maior dimensão, fora da área mais<br />

<strong>de</strong>nsamente urbanizada do Centro, <strong>como</strong> também os <strong>de</strong>svios da linha para <strong>de</strong>ntro das indústrias, o<br />

que criou um sistema eficaz <strong>de</strong> carga e <strong>de</strong>scarga. Assim, se o bon<strong>de</strong> atuava <strong>como</strong> elemento <strong>de</strong><br />

indução <strong>de</strong> ocupação resi<strong>de</strong>ncial e valorização <strong>de</strong> empreendimentos privados, o trem possibilitava a<br />

consolidação da indústria que viria a se tornar a principal ativida<strong>de</strong> econômica após a crise <strong>de</strong> 1929.<br />

A ligação quase exclusiva da ferrovia à produção econômica impediu que ela se integrasse à malha<br />

social urbana. Seus poucos pontos <strong>de</strong> conexão ao tecido serviam apenas a passageiros em viagens<br />

longas, indiferentes ao trajeto intraurbano, o que <strong>de</strong>terminou sua <strong>de</strong>cadência gradual.<br />

A partir da década <strong>de</strong> 20, o rodoviarismo viria a transformar radicalmente a cida<strong>de</strong>, reorganizando o<br />

território urbanizado e estruturando o novo território regional.<br />

A CIDADE DO AUTOMÓVEL: do Plano <strong>de</strong> Avenidas à indústria (1930-1964)<br />

O ocaso da economia cafeeira, com a crise <strong>de</strong> 1929, revelou a vulnerabilida<strong>de</strong> da infra-estrutura<br />

ferroviária. Mesmo que servisse bem à indústria e a assentamentos periféricos relacionados a essa<br />

ativida<strong>de</strong>, a substancial negação do espaço urbano impediu-a <strong>de</strong> se tornar meio <strong>de</strong> transporte<br />

intraurbano.<br />

O bon<strong>de</strong> elétrico, principal meio <strong>de</strong> transporte municipal no início do século, assistiu ao<br />

crescimento da circulação <strong>de</strong> ônibus. O carro particular também aumentou significativamente sua<br />

participação no transporte urbano: entre 1924 e 1927 a frota mais que duplica, contando com quase<br />

14mil veículos neste último ano.<br />

Com vistas ao gran<strong>de</strong> crescimento das frotas <strong>de</strong> ônibus e automóveis, e prevendo a <strong>de</strong>sarticulação<br />

causada pelo arruamento indiscriminado promovido por especuladores incautos, a administração<br />

elaborou gran<strong>de</strong>s planos viários e urbanísticos. É o primeiro ciclo <strong>de</strong> ‘utopias viárias’, segundo<br />

Vasconcelos (2000), que procuram imaginar um novo e amplo espaço urbano, e não simplesmente<br />

aten<strong>de</strong>r às necessida<strong>de</strong>s imediatas <strong>de</strong> flui<strong>de</strong>z. Essas ‘utopias’ incluem os planos <strong>de</strong> Ramos <strong>de</strong><br />

Azevedo, Vitor Freire, Samuel das Neves, Bouvard e Prestes Maia, <strong>de</strong>ntre os quais o último é o<br />

maior exemplo. O Plano <strong>de</strong> Avenidas <strong>de</strong> Prestes Maia, <strong>de</strong> 1930, propunha essencialmente a<br />

remo<strong>de</strong>lação da cida<strong>de</strong> para o automóvel. O plano previa um sistema radio-concêntrico sugerindo a<br />

vocação do transporte por ônibus e carros em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> urbana sobre trilhos <strong>de</strong> alta<br />

capacida<strong>de</strong>. A implantação <strong>de</strong> boa parte do plano durante as décadas seguintes consolidou a<br />

importância do transporte sobre pneus, ao contrário do que se observava na Europa, on<strong>de</strong> os<br />

investimentos em metrô iniciaram-se já no século XIX.<br />

A prevalência da visão automobilística criou uma cida<strong>de</strong> extensa e pouco <strong>de</strong>nsa, especialmente no<br />

pós-guerra, quando o parque automobilístico passa a ser implantado. Entre 1930 e 1965, a cida<strong>de</strong><br />

quintuplicou sua população e intensificou sua pressão sobre a periferia. A verticalização no Centro<br />

e nos distritos lin<strong>de</strong>iros (Santa Efigênia, Campos Elísios, Santa Cecília, Higienópolis, Consolação,<br />

Paraíso, Liberda<strong>de</strong> e outros) contrastava com a ocupação <strong>de</strong> baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> dos <strong>de</strong>mais bairros da<br />

cida<strong>de</strong> que, nesta época, ainda não sentiam claramente o efeito nocivo da <strong>de</strong>sconexão do<br />

arruamento entre os bairros. De 1954 a 1963, a cida<strong>de</strong> duplicou sua área <strong>de</strong> ocupação às custas <strong>de</strong><br />

baixas <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>s e apoiada na implantação <strong>de</strong> rodovias e autoestradas. O transporte público que,<br />

na fase anterior, induzia à urbanização através do avanço das linhas <strong>de</strong> bon<strong>de</strong> e das estações<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

suburbanas <strong>de</strong> trem, inverte seu papel e passa, com os ônibus, a buscar os núcleos que rapidamente<br />

se urbanizavam <strong>de</strong> maneira legal ou clan<strong>de</strong>stina.<br />

Na franja periférica, os ‘subúrbios-estação’ conheceram gran<strong>de</strong> crescimento. Muito embora a<br />

ferrovia já não tivesse o mesmo papel <strong>de</strong> induzir ocupação, sua influência era direta no provimento<br />

<strong>de</strong> transporte para o Centro, consolidando o papel <strong>de</strong> ‘subúrbio-dormitório’. A importância da<br />

ferrovia é salientada por Langenbuch (1971:335) <strong>como</strong> elemento importante <strong>de</strong> estruturação<br />

metropolitana: “a estrutura viária (sobretudo as ferrovias, repita-se) constituiu o fator principal do<br />

arranjo espacial e configuração da Gran<strong>de</strong> São Paulo”. A partir dos anos 50, com uma política<br />

agressiva <strong>de</strong> implantação <strong>de</strong> rodovias, os trens <strong>de</strong> longo percurso ce<strong>de</strong>m ainda mais espaço aos <strong>de</strong><br />

subúrbio. Um dos poucos impactos que se pu<strong>de</strong>ram sentir na zona central da Cida<strong>de</strong> foi a<br />

transformação do complexo Júlio Prestes–Luz em gran<strong>de</strong> terminal metropolitano para transporte<br />

suburbano, cuja característica popular causou a perda <strong>de</strong>finitiva da atrativida<strong>de</strong> imobiliária do bairro<br />

e afastou o comércio e a habitação qualificados.<br />

A partir do final dos anos 1950, restrições quanto à verticalização dão força ao espalhamento<br />

urbano. A criação <strong>de</strong> novas centralida<strong>de</strong>s comerciais se dá <strong>de</strong> forma discreta, porém irreversível<br />

frente ao crescimento <strong>de</strong>sagregador, à <strong>de</strong>sarticulação do sistema <strong>de</strong> transporte público, à dissociação<br />

entre emprego e residência e à saturação espacial do Centro. Este continua a ser o maior pólo <strong>de</strong><br />

empregos e negócios, mas a ocupação comercial principalmente na região da avenida Paulista<br />

sugere um vetor sudoeste <strong>de</strong> crescimento, baseado exclusivamente no transporte rodoviário.<br />

O COLAPSO: reestruturação produtiva sem transporte <strong>de</strong> massa (1964-2005)<br />

Foi característica do governo militar, a partir do golpe <strong>de</strong> 1964, o gran<strong>de</strong> investimento em infraestrutura<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte. Essa postura fez-se sentir em diferentes campos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a construção <strong>de</strong><br />

hidrelétricas até o crescimento da malha rodoviária nacional vinculada ao fomento da indústria<br />

automobilística. Adicionalmente, o governo militar investiu direta e indiretamente em diversas<br />

regiões do país, <strong>de</strong>terminando retomada do crescimento industrial nacional na segunda meta<strong>de</strong> da<br />

década <strong>de</strong> 1960. Com a perda da polarização industrial da Gran<strong>de</strong> São Paulo, abriu-se maior espaço<br />

para o <strong>de</strong>senvolvimento do incipiente setor terciário que viria a caracterizar essa metrópole nas<br />

décadas seguintes.<br />

A partir <strong>de</strong> 1967, a mística do planejamento técnico e integrado resultaram, na escala local, na<br />

valorização do planejamento urbano e <strong>de</strong> planos estratégicos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>nação urbana. Em São Paulo,<br />

são <strong>de</strong>sta época o Plano Urbanístico Básico (PUB 1968), o Plano Metropolitano <strong>de</strong><br />

Desenvolvimento Integrado (PMDI 1970) e o Plano Diretor <strong>de</strong> Desenvolvimento Integrado (PDDI<br />

1971). A gestão <strong>de</strong> Faria Lima (1965-1969) investiu sobretudo no planejamento do anel viário e na<br />

urbanização do vale do rio Tietê, embasado nas gran<strong>de</strong>s transformações viárias previstas no PUB. O<br />

ponto central da proposta era uma malha <strong>de</strong> vias expressas <strong>como</strong> elemento fundamental do futuro<br />

sistema <strong>de</strong> transportes, endossando a postura histórica <strong>de</strong> promover ocupação <strong>de</strong> baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>.<br />

Ao ignorar as <strong>de</strong>ficiências da infra-estrutura das periferias, o plano agravou a expulsão da<br />

população <strong>de</strong> baixa renda para a periferia, ao mesmo tempo em que sua postura focada na<br />

macroacessibilida<strong>de</strong> piorou a ligação das vias locais às gran<strong>de</strong>s estruturas viárias. De forma<br />

secundária aos 800Km <strong>de</strong> vias previstas no plano, o PUB propunha também a instalação tardia do<br />

Metrô <strong>de</strong> 400Km <strong>como</strong> equipamento <strong>de</strong> acesso ao centro consolidado.<br />

A administração <strong>de</strong> Paulo Maluf (1969-1971) <strong>de</strong>u continuida<strong>de</strong> ao plano, seguindo a estratégia<br />

fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> estimular a indústria automobilística através <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s obras viárias. A restrição ao tema<br />

da macroacessibilida<strong>de</strong> metropolitana impediu que os bairros cortados por essas vias fossem por<br />

elas beneficiados.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

O PDDI e a legislação <strong>de</strong> zoneamento <strong>de</strong> 1972, ao impor ainda menor <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ocupação,<br />

perpetuou o impulso perverso <strong>de</strong> expansão horizontal da cida<strong>de</strong>, especialmente a Sudoeste,<br />

<strong>de</strong>svinculada <strong>de</strong> sistemas <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> massa. A partir <strong>de</strong> 1973, com a crise do petróleo, o<br />

cenário muda drasticamente: suspen<strong>de</strong>m-se os planos <strong>de</strong> vias expressas e intensificam-se os<br />

discursos em favor do transporte coletivo e do controle do crescimento urbano. O SISTRAN (1974-<br />

1976) promoveu a municipalização do trânsito e propôs um sistema <strong>de</strong> tronco-alimentação por uma<br />

re<strong>de</strong> básica <strong>de</strong> tração elétrica (Metrô, tróleibus e trens <strong>de</strong> subúrbio) ao longo <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s eixos,<br />

complementado por uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> ônibus a diesel. Pretendia-se maior facilida<strong>de</strong> gerencial e<br />

integração tarifária dos sistemas. Somente na gestão <strong>de</strong> Olavo Setúbal enxergou-se no transporte<br />

público um real condicionador da dinâmica urbana, sendo característica o impulso da construção do<br />

Metrô.<br />

Como resultado da política que priorizava o transporte motorizado individual, entre 1968 e 1979<br />

houve queda na oferta global e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> dos transportes públicos. Por causa do atraso na<br />

priorização <strong>de</strong> investimentos no transporte metroferroviário, entre 1977 e 1997, <strong>de</strong> acordo com as<br />

pesquisas OD, há uma queda <strong>de</strong> 10% <strong>de</strong> participação do transporte coletivo nos <strong>de</strong>slocamentos<br />

urbanos. O custo do transporte público chegou ao patamar <strong>de</strong> 2 vezes o custo do transporte<br />

individual, levando cerca <strong>de</strong> 2,3 vezes mais tempo <strong>de</strong> percurso. É evi<strong>de</strong>nte, portanto, a baixa<br />

eficiência e atrativida<strong>de</strong> dos modos coletivos ao longo das últimas décadas.<br />

A continuida<strong>de</strong> da política rodoviarista, principalmente nas administrações seguintes, marcou a<br />

cida<strong>de</strong> com obras assistemáticas, <strong>de</strong> justificativa falha e efeitos duvidosos, <strong>como</strong> gran<strong>de</strong>s avenidas<br />

<strong>de</strong> fundo <strong>de</strong> vale e túneis que encheram os olhos da população que via no conforto e status do<br />

automóvel um gran<strong>de</strong> incentivo ao contínuo abandono do transporte público. A reestruturação<br />

produtiva da metrópole paulistana já operava, na década <strong>de</strong> 80, <strong>de</strong> maneira clara: redução <strong>de</strong> porte e<br />

pulverização da indústria urbana, <strong>de</strong>senvolvimento do setor financeiro e <strong>de</strong> serviços diversos, e<br />

criação <strong>de</strong> uma lógica funcional policêntrica. Na década <strong>de</strong> 90 concluíram-se várias obras viárias<br />

que <strong>de</strong>stacaram-se pelo porte e localização. Guiadas pelos interesses do mercado imobiliário,<br />

potencializaram o processo <strong>de</strong> transformação funcional das áreas consolidadas que atravessaram<br />

(Meyer, Grostein e Bi<strong>de</strong>rman, 2004). Não por acaso, portanto, a maior parte <strong>de</strong>ssas obras induziram<br />

aumento no crescimento a sudoeste da capital, consolidando importantes centralida<strong>de</strong>s terciárias.<br />

A infra-estrutura <strong>de</strong> transporte individual a<strong>de</strong>qua-se, sob um olhar leigo, à ativida<strong>de</strong> terciária da<br />

região sudoeste. Isso é <strong>de</strong>tectável pelo padrão dos edifícios e dos serviços, pela migração <strong>de</strong><br />

empresas <strong>de</strong> outras centralida<strong>de</strong>s e pela <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> localização da empresa estar geralmente<br />

submetida à diretoria, que não utiliza o transporte público. Desta forma, é “compreensível” que<br />

estas centralida<strong>de</strong>s tenham se <strong>de</strong>senvolvido até o presente sem o suporte <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte<br />

público. Seus efeitos, porém, fazem-se sentir na rápida obsolescência das gran<strong>de</strong>s obras, que já não<br />

comportam o tráfego gerado. Assim, o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> pólos funcionais <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes do<br />

transporte individual impõe aumento natural do tráfego pela impossibilida<strong>de</strong> dos funcionários e<br />

usuários servirem-se do transporte público. O problema mostra-se tão grave, hoje, que chega a criar<br />

<strong>de</strong>seconomias severas às empresas aí instaladas.<br />

Outras consi<strong>de</strong>rações são importantes para a caracterização da metrópole paulistana atual. Uma<br />

<strong>de</strong>las é a verificação da estagnação da população da Cida<strong>de</strong>, seja em função do crescimento atraente<br />

<strong>de</strong> cida<strong>de</strong>s médias próximas, pelo alto custo <strong>de</strong> vida e operação comercial na Cida<strong>de</strong>, ou pelos<br />

graves problemas <strong>de</strong> segurança e circulação.<br />

A partir <strong>de</strong> 1995, <strong>como</strong> já foi <strong>de</strong>stacado anteriormente, o Plano Integrado <strong>de</strong> Transportes Urbanos<br />

para 2020 (PITU2020) busca reverter o processo <strong>de</strong> abandono do transporte público metropolitano.<br />

O Metrô chegou ao final do século com apenas 49Km <strong>de</strong> linhas, transportando 2,3milhões <strong>de</strong><br />

18


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

passageiros/dia. A CPTM, por sua vez, transporta apenas 900mil passageiros/dia numa total <strong>de</strong><br />

275Km. Consi<strong>de</strong>rando toda a extensão da re<strong>de</strong>, o transporte ferroviário respon<strong>de</strong> por 15 vezes<br />

menos usuários que o metrô por conta <strong>de</strong> sua baixa conexão ao tecido urbano (poucas estações) e<br />

baixa freqüência <strong>de</strong> trens. As simulações do PITU2020 prevêem o transporte <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 2milhões<br />

<strong>de</strong> passageiros/dia em 2006 nas linhas da CPTM a partir da integração gradual das duas re<strong>de</strong>s que<br />

respon<strong>de</strong>rão, segundo Viegas, por quase a meta<strong>de</strong> do transporte coletivo em São Paulo (in Um<br />

século <strong>de</strong> Luz, 2001). Cerca <strong>de</strong> 70% do fluxo da CPTM tem <strong>como</strong> <strong>de</strong>stino a região central (Barra<br />

Funda, Luz e Brás), on<strong>de</strong> a Luz <strong>de</strong>sempenha um forte protagonismo com a previsão <strong>de</strong> instalação da<br />

linha 4 <strong>de</strong> Metrô (em obras).<br />

2.3 RMSP: nós e lugares<br />

Alguns ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m ser mais favoráveis que outros para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />

ativida<strong>de</strong>s econômicas e sociais. Um primeiro passo para a elaboração <strong>de</strong> uma análise seria<br />

i<strong>de</strong>ntificar os diferentes tipos <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s presentes num contexto urbano e regional,<br />

compreen<strong>de</strong>r a relação entre eles e avaliar que tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s ou equipamentos po<strong>de</strong>m ser<br />

implantados para que essa característica se <strong>de</strong>senvolva com maior eficiência.<br />

Porém, conforme observado nos itens 2.1 e 2.2, acima, exemplos <strong>como</strong> o bairro da Luz e a região<br />

sudoeste do Município <strong>de</strong>nunciam que o conceito <strong>de</strong> ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> não po<strong>de</strong> ser<br />

diretamente aplicado sobre essas realida<strong>de</strong>s paulistanas, uma vez que reprentam nós que não<br />

alimentam lugares e lugares in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> nós.<br />

A partir do levantamento <strong>de</strong> ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> possíveis, os atores públicos e privados<br />

<strong>de</strong>vem <strong>de</strong>finir suas priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> investimento <strong>de</strong> forma a promover complementação (por<br />

especialização, por exemplo) e competição saudável entre esses ambientes, diversificando as<br />

centralida<strong>de</strong>s conectadas e estimulando o seu <strong>de</strong>senvolvimento individual e coletivo baseado no<br />

estabelecimento <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> funcional.<br />

Serão expostos, a seguir, dados sobre a situação atual <strong>de</strong> São Paulo quanto ao <strong>de</strong>scompasso entre a<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte e a distribuição <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s.<br />

NÓS<br />

Os estudos do PITU2020 avaliaram consistentemente o traçado das linhas sobre trilhos e pneus para<br />

aten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> forma hierarquizada ao maior número <strong>de</strong> lugares funcionalmente relevantes, existentes<br />

ou potenciais, cuja concentração no Centro Expandido e especialmente a sudoeste é evi<strong>de</strong>nte. Ao<br />

organizar uma estrutura em re<strong>de</strong>, esse plano atribui aos trilhos um papel <strong>de</strong>cisivo na organização<br />

metropolitana.<br />

O transporte metroferroviário, que conta hoje com 333,6Km em 22 dos 39 municípios da RMSP<br />

(consi<strong>de</strong>rando os 275Km da CPTM e os 58,6Km do Metrô), <strong>de</strong>ve atingir em 2020 444,8Km<br />

(Figueiredo, 2003). Apesar dos números sugerirem apenas 30% <strong>de</strong> acréscimo na re<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve-se<br />

consi<strong>de</strong>rar que a conversão dos trens da CPTM em transporte intraurbano é gradual, pois implica<br />

aumento da oferta <strong>de</strong> trens e estações. Assim, po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar que a re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte urbano<br />

sobre trilho aumentaria cerca <strong>de</strong> 900% em relação aos 43,6Km <strong>de</strong> Metrô em 1994.<br />

A futura linha 4 do metrô transformará a estação da Luz no principal entroncamento ferroviário,<br />

com possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> integração à re<strong>de</strong> rodoviária pela presença <strong>de</strong> importantes vias e terminais<br />

metropolitanos no entorno. A leitura das imagens abaixo permite i<strong>de</strong>ntificar outros entroncamentos<br />

19


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

relevantes. Um <strong>de</strong>les é a Lapa, cortada pelos trilhos da CPTM e com gran<strong>de</strong> afluxo <strong>de</strong> ônibus<br />

metropolitanos (notadamente <strong>de</strong> origem noroeste). Outro, <strong>de</strong> maior importância, é Pinheiros: além<br />

da previsão <strong>de</strong> conexão entre a linha C da CPTM e a futura linha 4 do Metrô, Pinheiros é um dos<br />

principais pontos <strong>de</strong> chegada <strong>de</strong> ônibus intermunicipais dos quadrantes sudoeste e noroeste. A<br />

estação Barra Funda é outro nó significativo pela presença da linha 3 do Metrô, das linhas A, B, D e<br />

E da CPTM, o terminal <strong>de</strong> ônibus intermunicipal e a previsão <strong>de</strong> parada do trem expresso entre os<br />

aeroportos <strong>de</strong> Cumbica e Viracopos.<br />

Os triângulos formados pelos cruzamentos do Metrô entre as estações Sé, República e Luz e entre<br />

Luz, Clínicas e Paraíso <strong>de</strong>limitam áreas on<strong>de</strong> os ônibus têm boa capilarida<strong>de</strong> e existe implantada<br />

boa infra-estrutura viária. Estes dois triângulos têm escala interna a<strong>de</strong>quada para o <strong>de</strong>slocamento a<br />

pé entre as três linhas <strong>de</strong> Metrô, situação incomum na Cida<strong>de</strong>.<br />

A região sudoeste, que tem recebido nas últimas décadas as maiores intervenções viárias,<br />

priorizando os automóveis, é justamente a região on<strong>de</strong>, <strong>como</strong> causa e efeito <strong>de</strong>ssas obras, surge o<br />

maior número <strong>de</strong> empreendimentos <strong>gerador</strong>es <strong>de</strong> tráfego. Nesta região, o PITU2020 prevê<br />

integração da re<strong>de</strong> metroferroviária através <strong>de</strong> VLP (Veículo Leve sobre Pneus) e capilarização por<br />

microônibus. Apesar <strong>de</strong> ser compreensível que o transporte sobre trilhos tenda a ligar as regiões<br />

mais distantes ao Centro Expandido, a baixa participação do Metrô na área não <strong>de</strong>sestimula,<br />

infelizmente, a utilização do transporte individual numa área <strong>de</strong> crescimento expressivo.<br />

20


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

FIGURA 2: conexões <strong>metropolitanas</strong> e os terminais <strong>de</strong> ônibus. Fonte: MEYER,<br />

GROSTEIN e BIDERMAN (2004)<br />

21


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

FIGURA 3: Re<strong>de</strong>s metroviária e<br />

rodoviária para 2020. Fonte:<br />

PITU2020<br />

LUGARES<br />

A diminuição dos empregos industriais (-12,3%) na RMSP entre 1987 e 1997 e o aumento dos<br />

empregos no comércio (+52,35%) e em serviços (+34,9%) concentrou na capital quase 20 vezes<br />

mais empresas terciárias que Guarulhos, o segundo maior pólo da RMSP (Brasil em Foco, 2005). A<br />

este dado somam-se as imagens abaixo, que mostram a expressiva concentração <strong>de</strong> empresas <strong>de</strong><br />

serviço a sudoeste da capital, portanto cerne terciário da Metrópole.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

FIGURA 4: as manchas <strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> empresas e <strong>de</strong>senvolvimento imobiliário configura com<br />

precisão o vetor sudoeste. Fonte: MEYER, GROSTEIN e BIDERMAN (2004)<br />

Este fenômeno é recente, já que começou a tomar corpo nos últimos 30 anos, tendo transbordando a<br />

avenida Paulista a partir dos anos 70 quando o crescimento da ativida<strong>de</strong> terciária atingiu a região da<br />

avenida Faria Lima e foi estancado pelo rio Pinheiros. As obras viárias mencionadas no item 2.2<br />

<strong>de</strong>ram suporte para o crescimento a sul da Faria Lima, alcançando a avenida Luís Carlos Berrini e<br />

apropriando-se da marginal do rio Pinheiros. A partir <strong>de</strong> 2000, aproveitando ainda o limite<br />

geográfico <strong>de</strong>ste rio e amparando-se na infra-estrutura viária das marginais, <strong>de</strong>lineia-se um tímido<br />

crescimento <strong>de</strong> serviços ao norte, em direção ao bairro da Lapa.<br />

De uma maneira simplificada, e <strong>de</strong> forma a estabelecer uma análise entre centralida<strong>de</strong> econômica e<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte, propõe-se separar as centralida<strong>de</strong>s paulistanas em 4 grupos: Centro Histórico,<br />

Paulista, Faria Lima/Itaim/Pinheiros, Berrini/Marginal Sul. O Centro Histórico e a Paulista<br />

concentram comércio, serviços e finanças numa área bastante irrigada por transporte <strong>de</strong> massa<br />

(Metrô e ônibus), além <strong>de</strong> oferecer estrutura viária abundante para o transporte individual (menos<br />

evi<strong>de</strong>nte no Centro Histórico). Nas últimas décadas, a fuga do setor <strong>de</strong> serviços em direção às<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

avenidas Faria Lima e Berrini implicou gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>svalorização do Centro Histórico e relativa perda<br />

<strong>de</strong> atrativida<strong>de</strong> da região da avenida Paulista. Ultimamente, porém, sua taxa <strong>de</strong> ociosida<strong>de</strong> tem<br />

baixado em <strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> uma crescente vacância <strong>de</strong> conjuntos comerciais <strong>de</strong> última geração no<br />

Itaim e Berrini. O Centro Histórico e a Paulista são centros <strong>de</strong> cultura e lazer, e <strong>de</strong>tém nas suas<br />

imediações a maior parte dos equipamentos (museus, teatros etc.) <strong>de</strong> toda a Metrópole.<br />

O centro Faria Lima/Pinheiros está <strong>como</strong>damente estabelecido entre alguns dos bairros resi<strong>de</strong>nciais<br />

mais nobres da Cida<strong>de</strong> (os ‘Jardins’) e é a região que recebe maior afluxo <strong>de</strong> tráfego ao Centro<br />

Expandido. Tem gran<strong>de</strong> diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> serviços e comércio, com contrastes <strong>como</strong> Largo da Batata<br />

(comércio popular) e Shopping Iguatemi e alameda Gabriel Monteiro da Silva (comércio <strong>de</strong> luxo).<br />

Conta com ampla e capilarizada re<strong>de</strong> <strong>de</strong> ônibus e importantes eixos viários, <strong>como</strong> a própria avenida<br />

Faria Lima e as avenidas Rebouças e Cida<strong>de</strong> Jardim. A linha C da CPTM já serve a região que<br />

receberá a linha 4 do Metrô, configurando importante nó <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> ônibus, trem e metrô. No<br />

entanto, o bairro da Vila Olímpia, que tem recebido a maior parte dos edifícios <strong>de</strong> alto padrão da<br />

região, apresenta sérios problemas <strong>de</strong> circulação pela excessiva <strong>de</strong>manda sobre malha viária<br />

vinculada ao tecido anterior, resi<strong>de</strong>ncial <strong>de</strong> baixa <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>.<br />

A Berrini/Marginal Sul é uma centralida<strong>de</strong> construída a partir da especulação imobiliária, sem<br />

planejamento da administração pública. Este centro é tão pujante quanto são graves os problemas a<br />

ele intrínsecos: expulsão <strong>de</strong> população <strong>de</strong> baixa renda, baixa oferta <strong>de</strong> transporte público e gran<strong>de</strong>s<br />

investimentos em infra-estrutura viária (<strong>como</strong> a avenida Águas Espraiadas) inócua. Sérios<br />

problemas <strong>de</strong> congestionamento aproximam sua realida<strong>de</strong> à da Vila Olímpia, fazendo <strong>de</strong>ste centro o<br />

pior em termos <strong>de</strong> acessibilida<strong>de</strong> e o menos inserido na re<strong>de</strong> <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s. A ina<strong>de</strong>quação da<br />

linha da CPTM é visível pela configuração dos espaços urbanos, que <strong>de</strong> nenhuma forma integram<br />

ou contemplam esse equipamento.<br />

Uma rápida análise <strong>de</strong>stas centralida<strong>de</strong>s indica que o setor terciário tem se <strong>de</strong>senvolvido à revelia <strong>de</strong><br />

uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transportes <strong>de</strong> massa, processo que talvez se altere, no futuro, com a incipiente<br />

ocupação do trecho norte da marginal do rio Pinheiros. Se, por um lado, é improvável e até<br />

in<strong>de</strong>sejável que a vocação terciária do sudoeste se reverta, por outro lado há áreas amplamente<br />

supridas por transportes <strong>de</strong> massa, <strong>como</strong> a Barra Funda e a Luz, que não concentram sequer uma<br />

parcela do potencial econômioco da Berrini. Os problemas dos nós <strong>de</strong> transporte que não alimentam<br />

centralida<strong>de</strong>s po<strong>de</strong>m ser resumidos nos problemas que o próprio PITU2020 vem tentando resolver:<br />

a re<strong>de</strong> da CPTM carece <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, freqüência, e integração. Outro problema <strong>de</strong>sses nós resi<strong>de</strong> no<br />

fato dos tecidos urbanos a eles lin<strong>de</strong>iros não oferecerem subsídios para uma a<strong>de</strong>quada<br />

microacessibilida<strong>de</strong>. Além disso, não há <strong>de</strong>manda que justifique a ‘invenção’ <strong>de</strong> uma nova<br />

centralida<strong>de</strong> terciária.<br />

Cabe, a partir do fracasso dos empreen<strong>de</strong>dores que apostaram recentemente na vocação terciária da<br />

Água Branca (região bem provida <strong>de</strong> trilhos), por exemplo, indagar se a estação da Luz po<strong>de</strong>ria, <strong>de</strong><br />

fato, viabilizar uma nova centralida<strong>de</strong>. No próximo capítulo será apresentado, através dos estudos<br />

<strong>de</strong> caso, <strong>como</strong> se dá a geração ou regeneração <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s a partir <strong>de</strong> estações intermodais.<br />

Como indício positivo, po<strong>de</strong> ser observado que a Luz não só <strong>de</strong>tém um po<strong>de</strong>roso nó <strong>de</strong> transporte,<br />

<strong>como</strong> já apresenta equipamentos outros que po<strong>de</strong>m configurar centralida<strong>de</strong>, além <strong>de</strong> estar próxima a<br />

um centro importante. Muito provavelmente não será conveniente a instalação <strong>de</strong> um centro <strong>de</strong><br />

serviços no bairro, dada a saturação do mercado e o <strong>de</strong>senvolvimento das <strong>de</strong>mais centralida<strong>de</strong>s<br />

nesse campo. Destacam-se, porém, a vocação comercial das ruas especializadas, os equipamentos<br />

culturais e educacionais já instalados e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aglutinamento funcional com o Centro<br />

Histórico.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

3 INTERMODALIDADE E CENTRALIDADE<br />

Station areas are potential no<strong>de</strong>s in emerging transport and information<br />

networks.(Spit e Bertolini, 1998:7)<br />

Com o <strong>de</strong>senvolvimento dos conceitos <strong>de</strong> renovação e reabilitação<br />

urbana e com a análise das experiências implantadas, os complexos<br />

ferroviários e os portos obsoletos, os bairros industriais abandonados,<br />

enfim, os <strong>de</strong>gradados centros históricos têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

reintegrar-se e projetar espaços propícios ao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma<br />

nova urbanida<strong>de</strong>.(Meyer e Izzo, 1999:120)<br />

A eficiência do transporte <strong>de</strong> massas encontra na estação <strong>intermodal</strong> <strong>de</strong> o equipamento que melhor<br />

respon<strong>de</strong> à necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> circulação da metrópole contemporânea. Ao mesmo tempo, a estação<br />

<strong>intermodal</strong> organiza funções em escala local e as vincula à estrutura geralmente policêntrica que<br />

caracteriza esse tipo <strong>de</strong> metrópole, relacionando-as a funções e usos vinculados à mesma malha <strong>de</strong><br />

transporte. Assim, é um elemento cuja função transcen<strong>de</strong> o transporte e é crucial para a organização<br />

econômica.<br />

Este capítulo procura <strong>de</strong>monstrar, através <strong>de</strong> exemplos consolidados, <strong>como</strong> estações intermodais<br />

baseadas no sistema metroferroviário exercem um papel <strong>de</strong> extrema relevância na reestruturação<br />

urbana e metropolitana. Essas estações têm se tornado parte <strong>de</strong> uma estratégia bastante eficaz <strong>de</strong><br />

consolidação econômica das áreas on<strong>de</strong> se localizam. Nos três casos expostos, a transformação do<br />

nó <strong>de</strong> transporte em centralida<strong>de</strong>, articulando as diferentes escalas envolvidas, consumiram tempo e,<br />

é claro, aportes financeiros altamente significativos, o que ratifica a importância da existência <strong>de</strong><br />

um projeto urbano que consi<strong>de</strong>re a mobilida<strong>de</strong> <strong>como</strong> elemento primordial. Ainda mais importante<br />

que analisar o que <strong>de</strong>u certo com o processo histórico <strong>de</strong> cada uma <strong>de</strong>ssas centralida<strong>de</strong>s, é<br />

indispensável consi<strong>de</strong>rar a SINGULARIDADE em que se <strong>de</strong>senvolveu cada caso. Apren<strong>de</strong>r com os<br />

erros e ser muito cauteloso com a transposição <strong>de</strong>sses exemplos para uma realida<strong>de</strong> diferente, <strong>como</strong><br />

a nossa, é indispensável para se chegar a uma análise coerente.<br />

3.1 Estações intermodais: equipamentos para a mobilida<strong>de</strong> e a estruturação<br />

<strong>metropolitanas</strong><br />

O entorno <strong>de</strong> estações é um dos poucos lugares na metrópole contemporânea on<strong>de</strong> pessoas <strong>de</strong><br />

interesses muito distintos po<strong>de</strong>m encontrar-se fisicamente. As oportunida<strong>de</strong>s geradas por um<br />

equipamento com este po<strong>de</strong>r são consi<strong>de</strong>ráveis, já que existe um gran<strong>de</strong> potencial para interação<br />

física, social e econômica, entre os seus usuários.<br />

O exemplo dos impactos urbanos <strong>de</strong> estações intermodais na Europa revela processos muito<br />

interessantes. Estratégias <strong>de</strong> implantação e requalificação <strong>de</strong> estações têm tido importância<br />

crescente na atração ou expulsão <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s econômicas, tanto em termos locais quanto em<br />

regionais ou internacionais. Existe, por este motivo, um esforço quase que conjunto pelo<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> ferroviária <strong>de</strong> alta velocida<strong>de</strong>, no continente europeu, que produza<br />

nós <strong>de</strong> interconexão eficientes e plurimodais. A recente atenção à ferrovia <strong>como</strong> elemento<br />

estruturador <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s representa uma ‘nova era ferroviária’. Spit e Bertolini (1998:17)<br />

observam que<br />

25


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

bal<strong>de</strong>ações intermodais <strong>de</strong> alta complexida<strong>de</strong> emergem através da conexão <strong>de</strong><br />

sistemas <strong>de</strong> transporte anteriormente separados (uma priorida<strong>de</strong> da política <strong>de</strong><br />

transportes da União Européia). Sob estas condições, um meio <strong>de</strong> transporte po<strong>de</strong><br />

dominar, muito embora outros estejam representados.<br />

A seguir, procura-se explicitar as razões da predominância das estações metroferroviárias <strong>como</strong><br />

pontos <strong>de</strong> articulação <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> transporte urbano.<br />

PORTOS, AEROPORTOS E ESTAÇÕES<br />

Assim <strong>como</strong> as primeiras estações ferroviárias foram construídas inicialmente <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong><br />

hermética, portos e aeroportos também têm origem em sistemas in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes entre si e com<br />

variados graus <strong>de</strong> compatibilida<strong>de</strong> às malha e vida urbanas. Os terminais das re<strong>de</strong>s ferroviária, aérea<br />

e marítima vêm se transformando, <strong>de</strong> maneira expressiva, em conexões intermodais <strong>de</strong> passageiros<br />

e cargas. Além disso, em adição à sua função nodal, e <strong>de</strong> acordo com os conceitos introduzidos no<br />

capítulo 1, esses terminais têm sido recentemente requalificados <strong>de</strong> forma a exercer o papel <strong>de</strong> lugar<br />

numa cida<strong>de</strong>. Este aspecto é evocado, por exemplo, em termos <strong>como</strong> cida<strong>de</strong>-aeroporto, distrito<br />

portuário ou vizinhança <strong>de</strong> estação, que refletem, individualmente, uma <strong>de</strong>terminada relação com<br />

seu entorno imediato, a região urbana e a abrangência <strong>de</strong> sua influência.<br />

As estações metroferroviárias ten<strong>de</strong>m estabelecer contato mais profícuo com a cida<strong>de</strong>, em<br />

<strong>de</strong>trimento dos portos e aeroportos. Isso se dá pela facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> implantação (menor escala dos<br />

equipamentos e dos edifícios requeridos) e pela liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> implantação (menores restrições<br />

ambientais, espaciais e técnicas). Outro aspecto evi<strong>de</strong>nte diz respeito ao alcance espacial, que é<br />

mais restrito em estações (lidam com uma escala predominantemente regional), do que em<br />

aeroportos e portos (cujas escalas são predominantemente a nacional e a internacional). A<br />

estimativa é que os trens <strong>de</strong> alta velocida<strong>de</strong> (TAV) po<strong>de</strong>riam respon<strong>de</strong>r por 80% a 90% <strong>de</strong> todas as<br />

viagens européias num alcance entre 160Km e 500Km e cerca <strong>de</strong> 50% até 800Km (Spit e Bertolini,<br />

1998:32). Uma <strong>de</strong>svantagem em relação aos terminais aéreos e marítimos seria a baixa capacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> adaptação das configurações da re<strong>de</strong> metroferroviária, já que nos dois últimos a alteração do<br />

equipamento <strong>de</strong> transporte exige muito pouca modificação física do terminal: na re<strong>de</strong> ferroviária, o<br />

tamanho da plataforma, a bitola dos trilhos, as dimensões dos túneis e as conexões subterrâneas<br />

entre estações são <strong>de</strong> difícil modificação.<br />

Mais que questões físicas, no entanto, portos, aeroportos e estações têm entre si diferenças<br />

significativas na relação espaço-tempo característica <strong>de</strong> cada modo. Conseqüentemente, suas<br />

dinâmicas <strong>de</strong> crescimento são pautadas pelo seu volume <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s em escalas muito diferentes:<br />

aeroportos servem a negócios internacionais e viagens <strong>de</strong> lazer, além <strong>de</strong> transportar mercadorias <strong>de</strong><br />

altíssimo valor agregado; portos servem principalmente ao transporte <strong>de</strong> carga <strong>de</strong> baixo valor e<br />

limitado transporte <strong>de</strong> lazer, enquanto estações servem, principalmente, a usuários cotidianos<br />

urbanos e regionais e a carga <strong>de</strong> baixo valor agregado.<br />

Um aspecto importante a se consi<strong>de</strong>rar na comparação aqui feita entre os modos é que, do ponto <strong>de</strong><br />

vista espacial, há uma diferença <strong>de</strong>terminante: a localização dos terminais e a interação da cida<strong>de</strong><br />

com a própria re<strong>de</strong>. O entorno das estações ten<strong>de</strong> a influir sobre o funcionamento das estações<br />

ferroviárias <strong>de</strong> forma muito mais expressiva que nos <strong>de</strong>mais casos, o que torna a estação um<br />

elemento mais integrado à lógica urbana e imbricado ao seu <strong>de</strong>senvolvimento. Isto ocorre,<br />

26


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

basicamente, por causa <strong>de</strong> dois fatores: a implantação <strong>de</strong> uma estação <strong>de</strong> passageiros no meio da<br />

cida<strong>de</strong> qualifica-a <strong>como</strong> elemento urbano cotidiano, on<strong>de</strong> se abrigam funções não só <strong>de</strong>stinadas aos<br />

usuários da re<strong>de</strong>, <strong>como</strong> também para qualquer usuário potencial do entorno; e a diversida<strong>de</strong> dos<br />

usuários é elevada, já que o sistema <strong>de</strong> transporte aten<strong>de</strong> um leque <strong>de</strong> profissionais autônomos,<br />

liberais, executivos, estudantes, <strong>de</strong>sempregados, operários etc.<br />

REURBANIZAÇÃO DO ENTORNO DE ESTAÇÕES<br />

As estações, <strong>como</strong> exposto acima, exercem um efeito mais consi<strong>de</strong>rável que outros tipos <strong>de</strong><br />

terminais sobre as cida<strong>de</strong>s on<strong>de</strong> se localizam. Não só sua implantação é mais fácil, <strong>como</strong> os modos<br />

<strong>de</strong> transporte que abrange são mais numerosos e, principalmente, é capaz <strong>de</strong> gerar e alimentar<br />

centralida<strong>de</strong>s com maior <strong>de</strong>senvoltura.<br />

Uma estação <strong>intermodal</strong> intraurbana po<strong>de</strong> interligar transportes <strong>de</strong> diferentes escalas: a local<br />

(metrô), a metropolitana (trem <strong>de</strong> subúrbio), a regional (trem), a nacional e a internacional (trem e<br />

TAV), que são modos <strong>de</strong> transporte análogos – sobre trilhos. Po<strong>de</strong>, ainda, interligar-se a terminais<br />

<strong>de</strong> ônibus e trams, além <strong>de</strong> possibilitar interface com transporte motorizado individual através <strong>de</strong><br />

estacionamentos e táxis conveniados e helicópteros. Quanto maior a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> modos e a<br />

conectivida<strong>de</strong> entre eles, maior será a concomitância <strong>de</strong> escalas <strong>de</strong> acesso e, conseqüentemente,<br />

maior a probabilida<strong>de</strong> do local on<strong>de</strong> se situa a estação <strong>de</strong>sempenhar uma função central na<br />

metrópole, na região ou no país.<br />

Mesmo que uma estação <strong>intermodal</strong> possa ser conseqüência <strong>de</strong> uma centralida<strong>de</strong> pré-existente, ou<br />

seja, tenha sido implantada para dar respaldo a uma centralida<strong>de</strong> herdada <strong>de</strong> outro momento<br />

histórico, evi<strong>de</strong>ncia-se seu papel <strong>de</strong> potencializador das funções econômicas presentes ou futuras e<br />

da centralida<strong>de</strong> exercida num contexto mais abrangente do ponto <strong>de</strong> vista espacial. Assim, uma<br />

estação tem o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> viabilizar o papel <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado local <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma lógica metropolitana,<br />

on<strong>de</strong> a tendência <strong>de</strong> multipolarida<strong>de</strong>, atualmente verificada nas gran<strong>de</strong>s cida<strong>de</strong>s, estabelece relações<br />

ora conflituosas, ora complementares entre seus centros. Em relação a esse aspecto, não parece<br />

equivocado afirmar que quanto maior a conectivida<strong>de</strong> entre os centros <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada<br />

metrópole, maior a probabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> exercerem funções complementares: o isolamento físico entre<br />

centros implica relativa in<strong>de</strong>pendência funcional, <strong>de</strong> forma que cada um ten<strong>de</strong>rá a ser o mais autosuficiente<br />

possível. Isso os torna objeto <strong>de</strong> uma escolha <strong>de</strong> <strong>de</strong>stino isolado e exclu<strong>de</strong>nte, ao passo<br />

que centros fartamente comunicados ten<strong>de</strong>m a ‘dividir’ especialida<strong>de</strong>s complementares e alimentam<br />

a consolidação <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong>.<br />

No entanto, embora essa <strong>de</strong>sejada complementarida<strong>de</strong> seja louvável para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />

cada um dos centros e da metrópole que os abriga, uma certa competitivida<strong>de</strong> entre eles também é<br />

natural e compreensível. Os centros mais <strong>de</strong>senvolvidos ou dotados <strong>de</strong> equipamentos mais<br />

qualificados atraem funções mais rentáveis e consumidores melhor qualificados, aumentando o<br />

potencial e a viabilida<strong>de</strong> da área. O <strong>de</strong>safio <strong>de</strong> tornar cada centro mais atraente ao longo do tempo<br />

embala o esforço <strong>de</strong> crescimento da metrópole <strong>como</strong> um todo.<br />

Os conceitos <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong> e complementarida<strong>de</strong> sugerem que, enquanto os custos <strong>de</strong><br />

reurbanização ou requalificação do entorno <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada estação restringem-se a um<br />

universo razoavelmente limitado do ponto <strong>de</strong> vista espacial, as conseqüências e condicionantes<br />

<strong>de</strong>sse <strong>de</strong>senvolvimento operam em escala mais ampla, causando impacto na distribuição econômica<br />

e funcional da metrópole toda e consolidando-a economicamente <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> nacional e<br />

internacional.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

As características inerentes aos entornos <strong>de</strong> estações e sua conseqüente centralida<strong>de</strong> não têm<br />

passado <strong>de</strong>spercebido aos olhos dos empreen<strong>de</strong>dores imobiliários, o que será facilmente constatável<br />

na análise futura dos estudos <strong>de</strong> caso.<br />

MERCADO IMOBILIÁRIO<br />

O entorno <strong>de</strong> estações, num primeiro momento, po<strong>de</strong> mostrar-se pouco atraente do ponto <strong>de</strong> vista<br />

financeiro, imobiliário e <strong>de</strong> investimento. Somente um enorme esforço conjunto entre<br />

empreen<strong>de</strong>dores e governo po<strong>de</strong> viabilizar sua transformação em objetos potencialmente viáveis.<br />

Políticas <strong>de</strong> concentração <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s econômicas nas adjacências <strong>de</strong> estações, por exemplo, tem<br />

sido um instrumento comum nos países europeus: a diminuição da <strong>de</strong>pendência do automóvel<br />

favorece não só a qualida<strong>de</strong> do espaço, mas também a rapi<strong>de</strong>z no acesso e a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

consumidores servidos.<br />

O que antes eram apenas edifícios <strong>de</strong> apoio ao transporte ferroviário <strong>de</strong> carga passa a ser entendido<br />

pelo mercado imobiliário <strong>como</strong> possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<strong>de</strong>nsamento. O nó <strong>de</strong> transporte tornou-se um<br />

po<strong>de</strong>roso atrativo para a instalação <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s diversas, favorecendo a criação <strong>de</strong> espaços para<br />

escritórios, centros <strong>de</strong> convenções, lojas, hotéis e equipamentos <strong>de</strong> lazer, cultura e esporte. A<br />

maioria dos empreen<strong>de</strong>dores, investidores e consultores imobiliários enten<strong>de</strong>m, no entanto, que o<br />

entorno <strong>de</strong> estações tem algumas vantagens e muitas <strong>de</strong>svantagens. É necessário, assim, que uma<br />

série extensa <strong>de</strong> pré-requisitos seja atendida para minimizar as <strong>de</strong>svantagens:<br />

• favorecer excelente acessibilida<strong>de</strong> por transporte público diversificado e também por<br />

transporte individual (este atrai um consumidor menos numeroso, mas mais po<strong>de</strong>roso);<br />

• políticas públicas consistentes e direcionadas, principalmente em relação a benefícios para<br />

instalação <strong>de</strong> novas ativida<strong>de</strong>s, financiamentos para os investidores e investimento em infraestrutura;<br />

• consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> um mix abrangente <strong>de</strong> serviços, comércio, habitação e cultura,<br />

preferencialmente com pouca participação <strong>de</strong> equipamentos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte. Deve-se, durante o<br />

planejamento, atentar para a complementarida<strong>de</strong> em relação aos <strong>de</strong>mais centros metropolitanos<br />

existentes, <strong>de</strong> forma a criar a já mencionada complementarida<strong>de</strong> funcional. A estratégia <strong>de</strong><br />

implantação <strong>de</strong>ve prever o equilíbrio entre ativida<strong>de</strong>s lucrativas e não lucrativas, <strong>de</strong> forma que esta<br />

possa ser compensada por aquela;<br />

• os terrenos para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>vem estar disponíveis no tempo certo;<br />

• o <strong>de</strong>senho <strong>de</strong>ve favorecer a integração não só entre os edifícios novos, mas também em<br />

relação aos preexistentes da área a serem mantidos e em relação àqueles das áreas lin<strong>de</strong>iras.<br />

As <strong>de</strong>svantagens são evi<strong>de</strong>ntes. Para intervenções <strong>de</strong>ste porte, chama a atenção o prazo <strong>de</strong><br />

implantação (da construção dos edifícios em si e, principalmente, da infra-estrutura necessária), o<br />

que submete o empreendimento a gran<strong>de</strong>s flutuações do mercado imobiliário e da economia (micro<br />

e macro), além <strong>de</strong> ficar à mercê <strong>de</strong> planejamentos vinculados a mandatos políticos. Outro problema<br />

é o custo do <strong>de</strong>senvolvimento em relação ao retorno, que costuma gerar uma margem <strong>de</strong> lucro<br />

pequena. Insuficiências <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho urbano, acessibilida<strong>de</strong> e estacionamentos potencializam os<br />

riscos. Quanto à exeqüibilida<strong>de</strong>, os planos muitas vezes tropeçam em problemas legais em relação à<br />

aquisição da área para o empreendimento, uma vez que são geralmente muitos imóveis e pertencem<br />

28


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

a proprietários distintos, e em políticas <strong>de</strong> conservação <strong>de</strong> patrimônio, <strong>gerador</strong> <strong>de</strong> polêmicas que<br />

costumam atrasar ou inviabilizar os empreendimentos.<br />

A rápida obsolescência dos planejamentos por motivos diversos – reorientação política, <strong>de</strong>manda <strong>de</strong><br />

mercado, condicionantes macroeconômicos etc. – é outro risco eminente para a reurbanização <strong>de</strong><br />

entorno <strong>de</strong> estações. O conhecimento sobre o problema torna-se freqüentemente <strong>de</strong>satualizado<br />

durante o processo, <strong>de</strong> forma que ele precisa ser o mais flexível possível para incorporar novas<br />

lógicas econômicas, espaciais e <strong>de</strong> infra-estrutura.<br />

O programa funcional do plano <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma área <strong>de</strong> estação <strong>de</strong>ve ser embasado por<br />

estudos <strong>de</strong> implantação, viabilida<strong>de</strong> econômica e <strong>de</strong> mercado, já que, para cada área, aplica-se uma<br />

realida<strong>de</strong> muito particular. Isto indica, portanto, que nem todo entorno <strong>de</strong> estação é passível <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento imobiliário com sucesso.<br />

DESENVOLVIMENTO<br />

Conforme <strong>de</strong>stacado anteriormente, <strong>de</strong>vido à complexida<strong>de</strong> dos condicionantes e atores envolvidos,<br />

a reurbanização ou <strong>de</strong>senvolvimento do entorno <strong>de</strong> estações <strong>de</strong>ve ser entendida e estudada caso a<br />

caso, consi<strong>de</strong>rando aspectos do nó <strong>de</strong> transporte, do lugar da cida<strong>de</strong>, dos contextos histórico,<br />

econômico e político e do processo <strong>de</strong> planejamento e implantação. Muito embora essa<br />

especificida<strong>de</strong> <strong>de</strong>va ser sempre lembrada, é possível caracterizar esse <strong>de</strong>senvolvimento a partir <strong>de</strong><br />

elementos comuns. Bruijin (apud Spit e Bertolini, 1998:60-63) propõe algumas características<br />

genéricas para os planos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento mencionados:<br />

Singularida<strong>de</strong>: cada área <strong>de</strong> estação tem suas especificida<strong>de</strong>s, tanto em relação às suas qualida<strong>de</strong>s<br />

espaciais quanto em relação aos requisitos para o seu <strong>de</strong>senvolvimento. Isso cria limites para<br />

comparações qualitativas e quantitativas, mas po<strong>de</strong>-se apren<strong>de</strong>r com erros e acertos do processo,<br />

não do resultado.<br />

Escala e complexida<strong>de</strong>: por <strong>de</strong>finição, são projetos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> escala tanto do ponto <strong>de</strong> vista<br />

financeiro, quanto <strong>de</strong> número <strong>de</strong> atores e agentes envolvidos. Conseqüentemente, sua complexida<strong>de</strong><br />

é enorme, afetando a organização e a abrangência/profundida<strong>de</strong> do impacto da implantação do<br />

plano.<br />

Fragmentação: a larga escala envolvida e a lentidão no processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão e implementação<br />

implicam que suas partes <strong>de</strong>senvolvem-se com certa autonomia. Esses projetos isolados, somados,<br />

são normalmente vistos <strong>como</strong> um plano único e completo. A fragmentação é um dos fatores que<br />

impe<strong>de</strong>m mensurar o fracasso ou o sucesso do plano <strong>como</strong> um todo.<br />

Inter<strong>de</strong>pendência projetual: o plano geral é <strong>de</strong>sdobrado em projetos menores <strong>de</strong>ntro do território<br />

estudado, <strong>como</strong> exposto pelo tópico fragmentação, acima. Apesar <strong>de</strong> cada projeto ter seus<br />

condicionantes técnicos e financeiros individuais, seu <strong>de</strong>senho <strong>de</strong>ve se reportar a uma escala que os<br />

abrange todos e aos <strong>de</strong>mais projetos <strong>de</strong>senvolvidos ao mesmo tempo. A inter<strong>de</strong>pendência interfere<br />

no sucesso do <strong>de</strong>senvolvimento – quanto mais intensa, maior a probabilida<strong>de</strong> do empreendimento<br />

obter êxito.<br />

Parcerias público-privado (PPP): atores públicos e privados participam ativamente do<br />

planejamento e estão intimamente comprometidos entre si.<br />

29


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

Interesses funcionais conflituosos: o tempo <strong>de</strong> planejamento e implantação implica certa dose <strong>de</strong><br />

incerteza na aplicação <strong>de</strong> soluções, tanto do ponto <strong>de</strong> vista tecnológico, quanto do ponto <strong>de</strong> vista<br />

conceitual. A aplicação do plano, ao promover maior intensida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uso do lugar, torna a<br />

disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> espaço restrita e escassa. As funções previstas terão interesses comuns na<br />

aglomeração, mas interesses conflituosos (<strong>de</strong> localização ou setorização, por exemplo) aparecerão e<br />

<strong>de</strong>mandarão maior complexida<strong>de</strong> do projeto para resolvê-los.<br />

A <strong>de</strong>tecção das características básicas <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento, <strong>como</strong> feito acima por Bruijin,<br />

é um exercício eficiente e seguro para a compreensão <strong>de</strong> um plano para o entorno <strong>de</strong> estação. De<br />

maneira complementar, encontram-se em Dust e Bertolini (2003) e em Bertolini (1999) algumas<br />

idéias que po<strong>de</strong>m indicar um roteiro superficial para abordar o início <strong>de</strong> um plano:<br />

• Alguns ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m ser mais favoráveis que outros para o <strong>de</strong>senvolvimento<br />

<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s econômicas e sociais. Um primeiro passo para a elaboração <strong>de</strong> um plano seria<br />

i<strong>de</strong>ntificar os diferentes tipos <strong>de</strong> ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> presentes num contexto urbano e<br />

regional, compreen<strong>de</strong>r a relação entre eles e avaliar que tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s ou equipamentos<br />

po<strong>de</strong>m ser implantados para que essa característica se <strong>de</strong>senvolva com maior eficiência<br />

(analogamente ao <strong>de</strong>senvolvido no capítulo 2.3 <strong>de</strong>sta monografia).<br />

• A partir do levantamento <strong>de</strong> ambientes <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> e ativida<strong>de</strong>s possíveis, o ator público <strong>de</strong>ve<br />

<strong>de</strong>finir suas priorida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> investimento <strong>de</strong> forma a promover complementação (por<br />

especialização, por exemplo) entre esses ambientes, diversificando as centralida<strong>de</strong>s conectadas.<br />

Formas <strong>de</strong> controle e gestão (agências, comitês) in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e específicas para cada plano são<br />

<strong>de</strong>sejáveis, uma vez que o ator público é <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte dos atores privados para atingir seus<br />

objetivos.<br />

• Urbanistas e arquitetos participam do sucesso do plano ao <strong>de</strong>senhar seus equipamentos e<br />

edifícios <strong>de</strong> maneira responsável, integrada e criativa. Seus esforços <strong>de</strong>vem concentrar-se na<br />

garantia <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> e quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso ao ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>, na relação construtiva<br />

e espacial entre os projetos <strong>de</strong>senvolvidos e com a interface <strong>de</strong>ssa área e projetos com o<br />

remanescente e com a cida<strong>de</strong> em volta da área <strong>de</strong>senhada. Assim, é indispensável projetar<br />

responsavelmente os caminhos dos usuários entre os edifícios, os tecidos, as escalas e os usos.<br />

• Em relação ao planejamento do nó <strong>de</strong> transporte, para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> formas híbridas e<br />

inovativas <strong>de</strong> transporte público, <strong>de</strong>ve-se consi<strong>de</strong>rar o ponto <strong>de</strong> origem e o ponto <strong>de</strong> chegada<br />

para então prever as possíveis combinações modais. Os nós <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong>vem ter atenção<br />

especial em relação à qualida<strong>de</strong> do seu planejamento e projeto visando o conforto do usuário, já<br />

que o tempo <strong>de</strong> espera, bal<strong>de</strong>ação e tráfego intermediário é freqüentemente apontado <strong>como</strong> o<br />

fator mais negativo do transporte público.<br />

• Além da simples função <strong>de</strong> comunicação entre centros econômicos e conexão <strong>de</strong> meios <strong>de</strong><br />

transporte complementares, numerosas estações intermodais têm sido reformuladas para<br />

<strong>de</strong>sempenharem função <strong>de</strong> portais aos centros urbanos. Sua vocação original <strong>de</strong> ‘paradas <strong>de</strong><br />

trem’ vem sendo crescentemente transformada com vistas a uma integração funcional e espacial<br />

com o seu próprio entorno. Para tanto, têm sido dotadas <strong>de</strong> ‘atmosfera urbana’ interna<br />

(diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> funções complementares) e externa (qualificação dos acessos e interfaces<br />

físicas), além <strong>de</strong> aspecto físico/estético chamativo e marcante que transformam esses<br />

equipamentos <strong>de</strong> transporte em verda<strong>de</strong>iros elementos referenciais para a organização do<br />

entorno.<br />

30


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

O CONTEXTO EUROPEU<br />

O transporte ferroviário teve um período <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> crescimento entre a primeira meta<strong>de</strong> do século<br />

XIX e a virada para o século XX ( o transporte ferroviário exerceu função primordial para a<br />

Revolução Industrial e representava a única opção para transporte motorizado <strong>de</strong> longa distância),<br />

seguido <strong>de</strong> estagnação e relativo <strong>de</strong>clínio. A partir da década <strong>de</strong> 1930, não se verifica crescimento<br />

algum das re<strong>de</strong>s ferroviárias em escala mundial e após a Segunda Guerra o seu encurtamento<br />

<strong>de</strong>veu-se ao rápido <strong>de</strong>senvolvimento do automóvel (mais flexível do ponto <strong>de</strong> vista físico e mais<br />

po<strong>de</strong>roso por causa do forte lobby da indústria automobilística) e do avião (mais rápido para longas<br />

distâncias). Recentemente, pela saturação do sistema baseado no automóvel e através do<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> trens rápidos, é possível <strong>de</strong>tectar uma retomada do trem. Investimentos<br />

significativos nas re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> metrô em cida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> porte médio e gran<strong>de</strong> atestam sua importância <strong>como</strong><br />

equipamento estratégico metropolitano.<br />

A gran<strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> massa nas metrópoles estimula o sistema metroferroviário a<br />

se firmar <strong>como</strong> principal modo <strong>de</strong> transporte urbano. Baseado nisso, a requalificação <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong><br />

estação ferroviária e a criação uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong>ssas áreas na Europa tem sido o reflexo <strong>de</strong> uma política<br />

comum no continente. No entanto, esses esforços ten<strong>de</strong>m a concentrar-se exclusivamente no<br />

aspecto do nó ou do lugar, e a maioria <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ra aspectos <strong>de</strong> processo e contexto (aspectos<br />

aplicados no item 3.1 à Luz).<br />

Em 3.2, abaixo, são apresentados os casos <strong>de</strong> Utrecht Centraal, na Holanda, King’s Cross em<br />

Londres, Inglaterra, e Euralille, em Lille, França. Todos os casos foram divididos entre ambiente <strong>de</strong><br />

mobilida<strong>de</strong> (nó e lugar), contexto e processo. A seguir, em 3.3 serão discutidos o limites <strong>de</strong><br />

transposição dos exemplos para a realida<strong>de</strong> do estudo <strong>de</strong> caso paulistano – a Luz.<br />

3.2 Estudos <strong>de</strong> caso<br />

Os estudos <strong>de</strong> caso apresentados a seguir são <strong>de</strong> estações intermodais européias cujos exemplos<br />

a<strong>de</strong>quam-se ao propósito <strong>de</strong> análise do impacto urbano relacionado à sua implantação. Apesar da<br />

realida<strong>de</strong> japonesa oferecer uma condição i<strong>de</strong>al para análise <strong>de</strong> estações, os exemplos europeus são<br />

mais completos pela abrangência <strong>de</strong> escalas: <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a local até a internacional, com suas respectivas<br />

especificida<strong>de</strong>s envolvidas. As escalas relacionam-se através <strong>de</strong> um único equipamento, o que<br />

envolve não só diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> usuários <strong>como</strong> também diferenciação entre os possíveis impactos no<br />

seu entorno. Outro aspecto que nos leva à análise <strong>de</strong> exemplos europeus é que o <strong>de</strong>senvolvimento<br />

da mobilida<strong>de</strong> urbana a partir <strong>de</strong> equipamentos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte – as estações – faz parte <strong>de</strong> um<br />

projeto <strong>de</strong> todo o bloco europeu: existe uma consciência geral, e não somente <strong>de</strong> países isolados,<br />

sobre a importância da mobilida<strong>de</strong> numa economia terciária.<br />

É necessário enfatizar que cada processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> entorno <strong>de</strong> estação respon<strong>de</strong> única<br />

e exclusivamente a uma realida<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminada, e correspon<strong>de</strong> às especificida<strong>de</strong>s dos condicionantes<br />

históricos, políticos, econômicos e sociais a ela aplicáveis. No entanto, <strong>como</strong> será visto no próximo<br />

capítulo, é possível <strong>de</strong>tectar uma série <strong>de</strong> fatores pertinentes em comum aos processos estudados, o<br />

que permite estabelecer uma relação entre eles.<br />

Para o levantamento dos casos a seguir, levaram-se em consi<strong>de</strong>ração os conceitos <strong>de</strong> nó, lugar e<br />

ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>, anteriormente apresentados, além <strong>de</strong> <strong>de</strong>screver os aspecto do contexto e do<br />

processo envolvidos.<br />

31


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

3.2.1 Utrecht Centraal<br />

CONTEXTO<br />

Dentro <strong>de</strong> limites administrativos e legislativos precisos, as instâncias governamentais holan<strong>de</strong>sas<br />

(nacional, provincial e municipal) têm gran<strong>de</strong> autonomia <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que os assuntos não interfiram nas<br />

<strong>de</strong>mais escalas <strong>de</strong> planejamento. O governo municipal é a instância mais importante da política<br />

holan<strong>de</strong>sa, já que o planejamento físico das cida<strong>de</strong>s é elaborado e operado em nível local. Além<br />

disso, é prática corrente a atuação das prefeituras <strong>como</strong> investidores imobiliários. No entanto,<br />

quando o planejamento físico envolve gran<strong>de</strong>s estruturas, <strong>como</strong> é o caso da estação central <strong>de</strong><br />

Utrecht, o financiamento e o planejamento passam a ser responsabilida<strong>de</strong> do governo fe<strong>de</strong>ral.<br />

Des<strong>de</strong> meados da década <strong>de</strong> 1980, o projeto <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> entorno <strong>de</strong> estações tem sido alvo <strong>de</strong><br />

diversos estudos e iniciativas públicas e privadas. Uma política nacional <strong>de</strong> transporte e uso do solo<br />

(mobilida<strong>de</strong> e urbanização/a<strong>de</strong>nsamento) permitiu consolidar essa tendência, on<strong>de</strong> os principais<br />

elementos foram uma política locacional, investimentos maciços em transporte público e o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> projetos urbanos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualificação do entorno. A política<br />

locacional, conhecida <strong>como</strong> ABC, incentivava a concentração <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s <strong>gerador</strong>as <strong>de</strong> tráfego <strong>de</strong><br />

passageiros no entorno <strong>de</strong> nós <strong>de</strong> transporte urbano, visando à diminuição do transporte motorizado.<br />

Na área do transporte, o orçamento nacional passou a <strong>de</strong>stinar expressiva parcela <strong>de</strong> recursos ao<br />

planejamento <strong>de</strong> transporte público ferroviário, tendo <strong>como</strong> expectativa dobrar o número <strong>de</strong><br />

passageiros até 2010. Este programa nacional chegou a ser o mais generoso da Europa, prevendo o<br />

maior investimento por quilômetro <strong>de</strong> linha férrea. Já os gran<strong>de</strong>s projetos urbanos seriam<br />

<strong>de</strong>senvolvidos pelas municipalida<strong>de</strong>s em parceria com investidores privados, e entre seus objetivos<br />

<strong>de</strong>stacam-se a geração <strong>de</strong> empregos e a concentração <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s econômicas, evitando a evasão<br />

da classe média e reforçando centralida<strong>de</strong>s. O marketing urbano que envolve a implantação <strong>de</strong><br />

projetos urbanos-chave é endossado pelo governo holandês através <strong>de</strong> políticas fiscais e dotação <strong>de</strong><br />

recursos paralelos a esses gran<strong>de</strong>s empreendimentos, <strong>de</strong>ntre os quais muitos são <strong>de</strong> reestruturação<br />

<strong>de</strong> entorno <strong>de</strong> estações. Um dos projetos mais ambiciosos é justamente o Utrecht Centraal, um dos<br />

mais complexos projetos <strong>de</strong> reurbanização do entorno <strong>de</strong> estações na Europa.<br />

AMBIENTE DE MOBILIDADE<br />

Apesar <strong>de</strong> ser uma cida<strong>de</strong> média (ca. 240mil habitantes), Utrecht tem uma posição central no<br />

sistema ferroviário holandês. Isso faz <strong>de</strong>la um importante ponto <strong>de</strong> conexão nacional e a segunda<br />

maior estação ferroviária no país.<br />

A Holanda tem sido planejada, nos últimos anos, <strong>como</strong> um gran<strong>de</strong> conglomerado <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>sfuncionais:<br />

Amsterdam seria a cida<strong>de</strong>-aeroporto, Rotterdam a cida<strong>de</strong>-porto e Utrecht a cida<strong>de</strong>estação.<br />

O planejamento setorial vem sendo <strong>de</strong>senvolvido <strong>de</strong> maneira a potencializar cada uma<br />

<strong>de</strong>ssas ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> forma complementar. Em Utrecht Centraal, <strong>de</strong> 110mil passageiros/dia em<br />

1997 2 , a previsão é que em 2015 haja 205mil passageiros/dia 3 e, em 2020, cerca <strong>de</strong> 360mil<br />

passageiros/dia (131,4milhões/ano) 4 . Uma quantida<strong>de</strong> significativa <strong>de</strong> passageiros utiliza a estação<br />

2 Spit e Bertolini, 1998:90<br />

3 i<strong>de</strong>m<br />

4 www.utrecht.nl: 06/11/2004<br />

32


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

não apenas para conexões férreas, mas também para embarque e <strong>de</strong>sembarque <strong>de</strong> ônibus e trams,<br />

táxis e estacionamento para carros e bicicletas.<br />

Na década <strong>de</strong> 70, a estação passou por uma reforma radical. O resultado, porém, não aten<strong>de</strong>u à<br />

<strong>de</strong>manda <strong>de</strong> tráfego esperada para os anos seguintes. No final da década <strong>de</strong> 80, uma segunda e<br />

maior adaptação da infra-estrutura da estação. Completada em meados da década <strong>de</strong> 90, a reforma<br />

otimizou as conexões intermodais e o aumento da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atendimento da estação. A<br />

próxima reforma prevista, a ser empreendida a partir <strong>de</strong> 2006, prevê modificações ainda mais<br />

ambiciosas: extensão das plataformas, novo edifício para a estação e serviços (com uma enorme<br />

cobertura <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 80mil m 2 ), estação <strong>de</strong> ônibus compacta, túnel para carros e bicicleta<br />

interligando os dois lados da linha férrea, novas plataformas para o TAV alemão e para o novo<br />

sistema <strong>de</strong> trens regionais <strong>de</strong> Randstad. O novo equipamento será uma estação <strong>intermodal</strong> com<br />

conexões <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong> entre os modos, programados conforme a logística do usuário e não das<br />

empresas operadoras dos sistemas. A partir <strong>de</strong> um único guichê, o usuário terá acesso a trens, metrô,<br />

ônibus, trams, táxis e estacionamento conveniado.<br />

O entorno da estação conheceu também momentos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> mudança. Nos anos 60 e 70, o enorme<br />

centro <strong>de</strong> convenções Jaarbeurs mudou-se para o flanco oeste da linha, região que hoje conhece<br />

gran<strong>de</strong> crescimento. Construiu-se progressivamente, a partir <strong>de</strong> 1973, um enorme centro comercial<br />

<strong>de</strong>nominado Hoog Catharijne (HC). A leste da estação e junto ao centro histórico, este complexo<br />

abriga shopping center, escritórios, equipamentos esportivos e culturais e apartamentos.<br />

Análises feitas <strong>de</strong>z anos após a instalação do Hoog Catharijne apontam o complexo <strong>como</strong> agente <strong>de</strong><br />

manutenção da centralida<strong>de</strong> econômica do centro histórico e responsável pelo acréscimo <strong>de</strong><br />

empregos na região (Spit e Bertolini, 1998). Sua função, <strong>como</strong> pô<strong>de</strong> ser constatado posteriormente,<br />

é complementar à do centro histórico: além <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r a uma <strong>de</strong>manda por espaços terciários, não<br />

configurou uma função competidora em relação ao centro vizinho. Outro aspecto positivo é que sua<br />

localização <strong>de</strong>terminou o padrão <strong>de</strong> transporte dos usuários sobre um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> massas, o que<br />

evitou a atração <strong>de</strong> uma quantida<strong>de</strong> expressiva <strong>de</strong> automóveis. No entanto, esse aparente sucesso<br />

econômico não se esten<strong>de</strong>u para o entorno por causa <strong>de</strong> seus <strong>de</strong>senhos arquitetônico e urbano<br />

pobres: o complexo privou a cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma conexão direta com a estação, eliminando qualquer<br />

acesso alternativo. Seus corredores labirínticos, projetados para serem um continuum das ruas da<br />

cida<strong>de</strong>, tornaram-se um abrigo para usuários <strong>de</strong> drogas e mendigos à noite. Um local perigoso que<br />

foi totalmente fechado durante a noite a partir <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 2004. As ruas do entorno que não tinham<br />

relação direta com o complexo tiveram perda significativa <strong>de</strong> tráfego <strong>de</strong> pe<strong>de</strong>stres, o que implicou<br />

falência <strong>de</strong> lojas e perda <strong>de</strong> valor dos imóveis. Soma-se a isso a falta <strong>de</strong> empatia dos moradores em<br />

relação ao projeto, já que o edifício não é compreendido <strong>como</strong> parte da cida<strong>de</strong>.<br />

PROCESSO<br />

Apesar do sucesso econômico representado pelas sucessivas fases <strong>de</strong> implantação do HC, sua<br />

insatisfatória a<strong>de</strong>quação ao tecido lin<strong>de</strong>iro, a falta <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação dos usuários com o projeto e os<br />

parcos investimentos privados no entorno nas últimas duas décadas culminaram, em 1986, no plano<br />

<strong>de</strong> reestruturação da área, <strong>de</strong>nominado Utrecht City Project (UCP).<br />

O UCP, promovido pelo governo municipal em parceria com os proprietários do complexo, visava<br />

resolver as falhas arquitetônicas e urbanísticas através da reversão dos efeitos <strong>de</strong> barreira e <strong>de</strong> ilha<br />

evi<strong>de</strong>nciados. Outros objetivos do plano eram: promover melhoria na qualida<strong>de</strong> dos espaços<br />

33


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

públicos, diversificar as ativida<strong>de</strong>s econômicas, diminuir a <strong>de</strong>pendência do carro e, principalmente,<br />

fortalecer a área <strong>como</strong> centralida<strong>de</strong> terciária <strong>de</strong> alto padrão em escala local, e nacional.<br />

O acordo entre os consorciados (proprietários e municipalida<strong>de</strong>) ocorreu em 1988, quando então<br />

<strong>de</strong>veria ser elaborado um plano diretor para a área. Entretanto, <strong>de</strong>sentendimentos entre os atores<br />

envolvidos – entre os próprios consorciados e entre estes e a população – levaram o plano a uma<br />

sucessão <strong>de</strong> atrasos. O governo nacional, responsável por parte expressiva do financiamento,<br />

também mostrava <strong>de</strong>scrença quanto à viabilida<strong>de</strong> do projeto. À margem da discussão pública, o<br />

plano seguiu sua elaboração até sua apresentação em 1993, revelando maior comprometimento do<br />

governo municipal com os investidores, em <strong>de</strong>trimento da população. Além <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s reformas <strong>de</strong><br />

infra-estrutura, principalmente na estação, o plano previa acréscimo <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong>stinadas a<br />

escritórios, lojas, restaurantes e hotéis, apartamentos, cassino, auditório, cinema, teatro e galerias <strong>de</strong><br />

arte. O significativo acréscimo <strong>de</strong> área comercializável pagaria as caras reformas <strong>de</strong> infra-estrutura<br />

previstas.<br />

Através <strong>de</strong> um grupo ativo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1990, o BOCP, resi<strong>de</strong>ntes locais e ambientalistas apresentaram<br />

sua própria análise do UCP. Para o BOCP, o plano <strong>de</strong>veria ser uma resposta à real <strong>de</strong>manda local, e<br />

não uma manipulação <strong>de</strong> orçamento. As reivindicações do grupo po<strong>de</strong>m ser resumidas nos<br />

seguintes itens, <strong>de</strong> acordo com Spit e Bertolini (1998:102): o projeto <strong>de</strong>veria ser multifuncional; os<br />

espaços públicos não po<strong>de</strong>riam ser dominados por equipamentos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte; o plano <strong>de</strong>veria<br />

refletir as reais necessida<strong>de</strong>s da área, ao invés <strong>de</strong> uma equação entre o que é imposto pelo governo<br />

nacional e o que é exigido pelos incorporadores; os impactos do tráfego sobre a qualida<strong>de</strong> dos<br />

espaços públicos <strong>de</strong>veriam ser consi<strong>de</strong>rados com maior serieda<strong>de</strong>; características e funções<br />

existentes <strong>de</strong>veriam ser protegidas e incentivadas; o ruído dos trens <strong>de</strong>veria ser controlado ao longo<br />

da linha no trecho urbano, <strong>de</strong> modo que as áreas resi<strong>de</strong>nciais não ficassem restritas a localida<strong>de</strong>s<br />

periféricas; 10% das habitações <strong>de</strong>veriam ser <strong>de</strong>stinadas a habitação social, incluindo apartamentos<br />

para <strong>de</strong>ficientes e idosos; e estruturas existentes e em boa condição <strong>de</strong>veriam ter seu uso melhorado,<br />

sem serem <strong>de</strong>molidos.<br />

Somado à falta <strong>de</strong> apoio popular e do governo nacional, a instabilida<strong>de</strong> do mercado imobiliário na<br />

época levou à suspensão do UCP.<br />

O fracasso do UCP <strong>de</strong>u margem a uma parceria entre novos atores, visando superar os problemas<br />

<strong>de</strong>tectados nas tratativas e <strong>de</strong>senvolvimento do plano anterior. Os participantes do novo UCP eram<br />

agora as três maiores incorporadoras imobiliárias holan<strong>de</strong>sas e o governo municipal (três dos<br />

maiores interessados no plano – HC, Jaarbeurs e a companhia férrea – simplesmente ficaram fora da<br />

discussão). Desta vez, a municipalida<strong>de</strong> teria papel prepon<strong>de</strong>rante, garantindo o interesse público<br />

sobre o privado, e <strong>de</strong>tendo 51% das cotas e do financiamento. A primeira fase do plano, <strong>de</strong> pesquisa<br />

e avaliação, foi concluída em 1995 com a apresentação <strong>de</strong> um projeto conceitual muito pouco<br />

ousado. A expectativa <strong>de</strong> início das obras era 1996 e a conclusão em 2004. Os objetivos principais<br />

do plano eram a implantação <strong>de</strong> transportes públicos <strong>de</strong> alta qualida<strong>de</strong> e conseqüente redução do<br />

transporte individual, elaboração <strong>de</strong> espaços públicos qualificados, fortalecimento da estrutura<br />

econômica da cida<strong>de</strong> e região e concentração <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s <strong>gerador</strong>as <strong>de</strong> emprego no entorno da<br />

estação. Tratava-se mais <strong>de</strong> um projeto <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho urbano, <strong>de</strong>dicando pouca atenção a questões<br />

programáticas, que pouco mudaram em relação ao plano anterior.<br />

O aspecto superficial do segundo UCP significou um obstáculo tanto à aceitação popular, quanto ao<br />

<strong>de</strong>sembaraço <strong>de</strong> financiamento do governo central. Somaram-se a esse impasse os sérios contrastes<br />

<strong>de</strong> interesses com os excluídos do processo, cuja necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> participação mostrava-se evi<strong>de</strong>nte.<br />

Em 1996, logo após o <strong>de</strong>sse novo UCP, foi montado um novo grupo para elaboração <strong>de</strong> um plano<br />

para a área. As lições aprendidas nas duas experiências anteriores mostraram-se proveitosas e, em<br />

34


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

poucos meses, novas diretrizes foram publicadas. A intervenção proposta entendia que a melhora<br />

dos espaços públicos seria a principal maneira para estruturar uma solução. As diretrizes previam<br />

alterações drásticas na estrutura da área: o HC seria parcialmente <strong>de</strong>molido e setores remanescentes<br />

seriam profundamente alterados. O Jaarbeurs, por sua vez, <strong>de</strong>veria buscar diversificar suas<br />

ativida<strong>de</strong>s com foco no lazer e na cultura. O <strong>de</strong>senvolvimento das diretrizes, conhecido <strong>como</strong> VSO,<br />

partia do princípio que o maior problema a ser enfrentado era o isolamento entre os dois lados da<br />

linha férrea. Uma nova estação <strong>intermodal</strong> <strong>de</strong>veria qualificar um espaço <strong>de</strong> transição para o pe<strong>de</strong>stre<br />

entre o Leste e o Oeste da cida<strong>de</strong> ao configurar um eixo que integrasse todos os principais<br />

equipamentos. Outro elemento da proposta, o City Boulevard propunha a conversão <strong>de</strong> ruas nos<br />

dois lados da estação em amplas avenidas arborizadas ao longo dos canais existentes e conectadas<br />

entre si sob os trilhos.<br />

Comparando-se com o programa dos planos anteriores, o projeto previa maior concentração <strong>de</strong><br />

escritórios no setor Leste (a maior parte dos ca. 360mil m 2 propostos), além <strong>de</strong> equipamentos <strong>como</strong><br />

cinema e teatro <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> capacida<strong>de</strong>, centro <strong>de</strong> entretenimento, praças <strong>de</strong> alimentação e cassino,<br />

buscando um <strong>de</strong>senvolvimento até então inconsistente <strong>de</strong>sta área. Junto ao centro, a Oeste,<br />

concentrava-se a maioria dos quase 1900 apartamentos projetados (ca. 220mil m 2 ). Lojas e<br />

restaurantes somariam aproximadamente 52mil m 2 .<br />

Apesar do consenso parecer ter sido alcançado com entusiasmo, o VSO gerou novas controvérsias<br />

que acabaram por suspen<strong>de</strong>r também este plano. O mesmo grupo formado pela municipalida<strong>de</strong>, o<br />

Jaarbeurs, o HC e a companhia férrea iniciaram então um novo plano diretor para a área. O plano<br />

foi apresentado, em 2002, em versão preliminar, quando a população optou pela opção <strong>de</strong>nominada<br />

Spacious City Center, um entorno <strong>de</strong> estação ‘bonito, atrativo e vitalizado, acessível e novamente<br />

seguro para todos’ 5 . Em meados <strong>de</strong> 2003 o plano diretor foi reapresentado à população com<br />

soluções <strong>de</strong> zoneamento, acessibilida<strong>de</strong> e circulação, e condicionantes <strong>de</strong> <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>s e gabaritos.<br />

Continha também estudos <strong>de</strong> viabilida<strong>de</strong>, estimativa <strong>de</strong> custos e estudo <strong>de</strong> impacto ambiental.<br />

Atualmente, com o <strong>de</strong>senho preliminar dos primeiros edifícios apresentados, a previsão é que as<br />

obras se iniciem em 2006.<br />

FIGURA 5: esquema geral da última versão do UCP, 2003, mostrando a transposição da linha<br />

férrea pelos dois principais elementos do projeto: a City Corridor, em vermelho, é uma rua<br />

principalmente para pe<strong>de</strong>stres e ciclistas, com equipamentos culturais e esportivos; em ver<strong>de</strong>, a<br />

5 http://www.utrecht.nl/: 06/11/04<br />

35


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

Center Boulevard conecta os três principais elementos do complexo (oHC, a estação e o Jaarbeurs)<br />

e é um eixo eminentemente comercial. Fonte: www.utrecht.nl<br />

FIGURA 6: usos, <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>s e gabaritos previstos. Usos comerciais ao longo do Boulevard, usos<br />

institucionais ao longo do Corridor. Fonte: www.utrecht.nl<br />

CONTEXTO<br />

3.2.2 Euralille<br />

As iniciativas <strong>de</strong> requalificação <strong>de</strong> entorno <strong>de</strong> estações, na França, tiveram <strong>como</strong> mola propulsora o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento consistente e gradual da re<strong>de</strong> nacional <strong>de</strong> TGV 6 . A partir do sucesso da linha<br />

Paris-Lyon no início década <strong>de</strong> 1980, cida<strong>de</strong>s em todo o território Francês passaram a perseguir sua<br />

inclusão no plano <strong>de</strong> expansão <strong>como</strong> uma maneira <strong>de</strong> impulsionar a economia local. A conexão à<br />

re<strong>de</strong> <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> alta velocida<strong>de</strong> <strong>de</strong>u origem a numerosos e ambiciosos planos <strong>de</strong> reurbanização<br />

junto às estações.<br />

A realida<strong>de</strong> mostrou que o TGV serviu apenas <strong>como</strong> um catalisador <strong>de</strong> uma economia local ativa<br />

preexistente. A expectativa <strong>de</strong> que ele pu<strong>de</strong>sse criar novos centros, da estaca zero, não se verificou<br />

em localida<strong>de</strong>s não-<strong>metropolitanas</strong>.<br />

Os atores do <strong>de</strong>senvolvimento do transporte <strong>de</strong> alta velocida<strong>de</strong> na França tinham interesses<br />

divergentes. De um lado, à companhia férrea estatal (SNCF) interessava interligar a Paris os<br />

maiores pólos <strong>gerador</strong>es <strong>de</strong> tráfego. Do outro lado, governos locais e parceiros privados<br />

esforçavam-se em <strong>de</strong>sviar, ramificar e diluir a re<strong>de</strong> do TGV até os centros das cida<strong>de</strong>s. Ambas as<br />

partes obtiveram êxito relativo, curiosamente sem uma interferência forte do governo fe<strong>de</strong>ral.<br />

AMBIENTE DE MOBILIDADE<br />

Lille-Flandres e Lille-Europe são duas estações que compõem o complexo nó <strong>de</strong> transporte em<br />

Lille. O primeiro aten<strong>de</strong> os TGVs <strong>de</strong> Paris e trens regionais, o segundo aten<strong>de</strong> TAVs internacionais.<br />

Além dos TAVs e trens regionais, a estação <strong>intermodal</strong> agrega ainda metrô, ônibus, trams e<br />

estacionamento para mais <strong>de</strong> 6mil automóveis. Este importante nó <strong>de</strong> transporte situa Lille em<br />

posição privilegiada entre importantes capitais: a menos <strong>de</strong> 1 hora <strong>de</strong> Paris, 25 minutos <strong>de</strong> Bruxelas,<br />

e a 2 horas <strong>de</strong> Londres e Amsterdam, Lille é uma espécie <strong>de</strong> epicentro geográfico, excelente<br />

localização para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s terciárias.<br />

Lille é o coração <strong>de</strong> uma região metropolitana <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> 1,5 milhão <strong>de</strong> habitantes. O Euralille<br />

apropriou-se <strong>de</strong> um vasto território <strong>de</strong> antiga reserva militar, vizinho ao centro histórico e a infraestruturas<br />

<strong>de</strong> transporte (estradas e linhas férreas) que separam Lille das cida<strong>de</strong>s vizinhas. O gran<strong>de</strong><br />

vazio existente compunha com a existente estação Lille-Flandres um espaço mal integrado à cida<strong>de</strong><br />

e pouco atraente para o mercado imobiliário. A linha férrea e a estrada segregavam ainda uma área<br />

resi<strong>de</strong>ncial, alheia à dinâmica do centro histórico.<br />

A implantação do complexo Euralille previu que a região seria drasticamente transformada<br />

em diversas escalas: promoveria a integração entre duas realida<strong>de</strong>s muito diferentes,<br />

6 Train à Gran<strong>de</strong> Vitesse = Trem <strong>de</strong> Alta Velocida<strong>de</strong> (TAV) francês<br />

36


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

separadas pela cicatriz dos eixos <strong>de</strong> transporte; e seria transformada num centro com fácil<br />

acessibilida<strong>de</strong> (num raio <strong>de</strong> 30Km) e o centro <strong>de</strong> um triângulo <strong>de</strong>terminado por Paris,<br />

Bruxelas e Londres. Em 2020, a expectativa é que se torne a cida<strong>de</strong> mais acessível da<br />

Europa 7 .<br />

O PROCESSO<br />

O túnel do Canal da Macha, no início dos anos 80, foi o início <strong>de</strong> uma extensa negociação<br />

internacional que originou a idéia <strong>de</strong> transformar Lille em ponto estratégico <strong>de</strong>ssa ligação. Em<br />

1987, um passo importante foi dado em direção ao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> TAVs interligando a<br />

França, Holanda, Bélgica e Alemanha pela assinatura <strong>de</strong> um acordo multilateral envolvendo esses<br />

países. Os transportes estavam na or<strong>de</strong>m do dia. No final <strong>de</strong>sse ano, a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> que Lille abrigaria<br />

a estação <strong>de</strong> TGV era oficial.<br />

A ligação entre a duas estações (a existente Lille-Flandres e a nova Lille-Europe) seria promovida<br />

pela construção <strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> complexo com programa diversificado: escritórios, habitação, lojas,<br />

equipamentos públicos, culturais e esportivos e espaços abertos. Para a elaboração do projeto, foram<br />

convidados, em 1988, 8 arquitetos <strong>de</strong> renome internacional para um concurso <strong>de</strong> idéias. A idéia não<br />

era comparar projetos, mas sim posturas, partidos. O holandês Rem Koolhaas foi escolhido foi<br />

porque, segundo o júri, tinha uma visão <strong>de</strong> uma cida<strong>de</strong>, não só <strong>de</strong> um projeto arquitetônico. O<br />

trunfo do arquiteto foi apresentar uma noção <strong>de</strong> interconectivida<strong>de</strong> funcional, espacial e visual para<br />

a área, além <strong>de</strong> ressaltar sua importância estratégica <strong>como</strong> metrópole internacional emergente.<br />

O plano, apresentado em 1990, foi recebido positivamente pelos órgãos político-administrativos e<br />

pela população, com poucas ressalvas e fraca oposição. Após a aprovação do plano pelo governo<br />

metropolitano, formou-se uma socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> economia mista presidida pelo prefeito <strong>de</strong> Lille, e<br />

aplicou-se à área o instrumento <strong>de</strong> ZAC (zone d’aménagement concerte), uma espécie <strong>de</strong> ‘operação<br />

urbana’.<br />

Koolhaas jamais imaginou que um plano tão ambicioso <strong>como</strong> esse po<strong>de</strong>ria ser concretizado. No<br />

entanto, poucos planos do porte do Euralille po<strong>de</strong>m ser vistos com tanta serenida<strong>de</strong> quanto ao<br />

processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento do projeto e sua implantação, e poucos exemplos gozam <strong>de</strong> sucesso<br />

tão expressivo. A implantação do complexo <strong>intermodal</strong> associado a uma oferta coerente <strong>de</strong> espaços<br />

multifuncionais <strong>de</strong>terminou um <strong>de</strong>senvolvimento da cida<strong>de</strong> em várias escalas: localmente,<br />

fortaleceu o centro e promoveu relativa integração entre bairros antes <strong>de</strong>sconexos; a posição da<br />

cida<strong>de</strong> <strong>como</strong> pólo <strong>de</strong> serviços na região tornou-se uma realida<strong>de</strong> incontestável, transbordando sua<br />

influência para o âmbito nacional. O <strong>de</strong>senvolvimento <strong>como</strong> pólo terciário internacional, no<br />

entanto, ainda é tímido, ainda que o <strong>de</strong>senvolvimento nessa direção seja consistente.<br />

Quanto à diversida<strong>de</strong> funcional oferecido pelo Euralille, po<strong>de</strong>-se dizer que houve sucesso<br />

imobiliário no seu aspecto geral. As áreas resi<strong>de</strong>nciais foram todas absorvidas pelo mercado<br />

previsto e os escritórios foram absorvidos <strong>de</strong> maneira satisfatória. O correto planejamento do<br />

complexo previu que o <strong>de</strong>senvolvimento não <strong>de</strong>veria ser somente encarado <strong>como</strong> a efetivação <strong>de</strong><br />

um gran<strong>de</strong> nó <strong>de</strong> transporte, mas <strong>como</strong> enca<strong>de</strong>amento <strong>de</strong> funções coerentes. A diversida<strong>de</strong><br />

funcional buscada foi uma das chaves do sucesso <strong>de</strong>ste empreendimento. Como observa Bertolini<br />

(s/d), “o exemplo do Euralille nos lembra que estruturas físicas são apenas um entre os vários<br />

fatores para produção <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s urbanas”, já que <strong>de</strong>vem ser consi<strong>de</strong>rados outros fatores tais<br />

7 Segundo o estudo FAST, Lille passaria da 11ª. posição <strong>de</strong> acessibilida<strong>de</strong>, em 1991, para a 1ª. 30 anos <strong>de</strong>pois. Apud<br />

Spit e Bertolini (1998:73)<br />

37


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

<strong>como</strong> distribuição funcional interna e externa ao empreendimento, viabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> implantação<br />

(política e financeira) e conexão a uma realida<strong>de</strong> preexistente.<br />

FIGURA 17: plano geral Euralille em suas duas<br />

etapas (1ª. em vermelho, Euralille2 em azul).<br />

Fonte: www.saem-euralille.fr<br />

38


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

FIGURA 8: programa previsto para o complexo.<br />

Fonte: www.saem-euralille.fr<br />

3.2.3 King’s Cross – Saint Pancras<br />

CONTEXTO<br />

A Inglaterra não apresenta um planejamento <strong>de</strong> transportes expressivo em termos nacionais, <strong>de</strong><br />

forma que iniciativas individuais <strong>de</strong> instâncias administrativas menores e as empresas são<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> um plano integrador. Contudo, observam-se na Inglaterra diversas iniciativas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> entorno <strong>de</strong> estações, entre as quais a gran<strong>de</strong> maioria localiza-se na região <strong>de</strong><br />

Londres e, mais especificamente, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Londres. Esses projetos <strong>de</strong>vem-se à intervenção<br />

direta <strong>de</strong> dois agentes principais: a companhia férrea (British Rail) e empreen<strong>de</strong>dores imobiliários.<br />

A British Rail (BR) persegue, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1978, formas alternativas <strong>de</strong> investimento para complementar<br />

seus lucros. Operar sistematicamente no mercado imobiliário para capitalizar-se e investir em novas<br />

estruturas <strong>de</strong> transporte. Os empreen<strong>de</strong>dores imobiliários privados, por sua vez, há muito <strong>de</strong>tectam<br />

oportunida<strong>de</strong>s nas ocupações obsoletas da orla ferroviária.<br />

A interação das estratégias <strong>de</strong>sses dois agentes tem <strong>de</strong>terminado on<strong>de</strong>, <strong>como</strong> e quando<br />

<strong>de</strong>senvolvimentos imobiliários e <strong>de</strong> infra-estrutura tornam-se realida<strong>de</strong> no país. Esses planos,<br />

geralmente <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte e resultados vultosos, beneficiam a BR com parte expressiva dos lucros.<br />

O governo local age timidamente e, <strong>como</strong> única recompensa pela criação <strong>de</strong> solo vendável e<br />

permissão <strong>de</strong> construção, procura obter o máximo <strong>de</strong> benefício estrutural para a comunida<strong>de</strong>. Com a<br />

<strong>de</strong>bilida<strong>de</strong> do mercado imobiliário no início da década <strong>de</strong> 1990, o processo <strong>de</strong> planejamento<br />

baseado em empreendimentos in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> diretrizes governamentais tem se enfraquecido.<br />

Principalmente em casos <strong>como</strong> o King’s Cross, on<strong>de</strong> o plano não envolve meramente uma operação<br />

imobiliária, mas também a implantação <strong>de</strong> um equipamento <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte, os<br />

governos locais têm interferido <strong>de</strong> maneira mais <strong>de</strong>cisiva.<br />

AMBIENTE DE MOBILIDADE<br />

A conexão King’s Cross/Saint Pancras é um dos nós <strong>de</strong> transporte mais intensamente solicitados em<br />

Londres. Mais passageiros utilizam esta estação que qualquer outra na Inglaterra, à exceção <strong>de</strong><br />

Oxford Circus, no coração <strong>de</strong> Londres. O nó engloba diversas plataformas em diversos níveis que<br />

articulam: 1 linha <strong>de</strong> TAV internacional (chamado CTRL, através do Canal da Mancha, com<br />

conclusão prevista para 2007); 2 linhas <strong>de</strong> trem nacionais, incluindo TAV ( TAV com previsão para<br />

2007); trem rápido para os aeroportos <strong>de</strong> Stansted, Luton e Gatwick (previsão para 2007); 3 linhas<br />

<strong>de</strong> trem regionais; linhas <strong>de</strong> ônibus urbanos, regionais, nacionais e internacionais; ponto <strong>de</strong> táxi<br />

<strong>de</strong>ntro da estação; e não menos <strong>de</strong> 6 linhas <strong>de</strong> metrô.<br />

O projeto das estações King’s Cross e Saint Pancras prevê, no horário <strong>de</strong> pico, 10 trens<br />

internacionais, 36 trens nacionais e 48 trens regionais, totalizando expressivos 94 trens por hora nos<br />

dois sentidos, sem contar uma média <strong>de</strong> 240 trens do metrô por hora! Soma-se a esse emaranhado<br />

modal <strong>de</strong>ntro das estações a Euston Road, que faz parte do anel viário central <strong>de</strong> Londres e oferece<br />

boa acessibilida<strong>de</strong> ao nó também por automóvel.<br />

Os terrenos adjacentes às estações King’s Cross e Saint Pancras correspon<strong>de</strong>m a um dos maiores<br />

estoques <strong>de</strong> terra disponíveis atualmente para reurbanização na Europa. Localizados na periferia<br />

imediata do Centro, encontram-se ainda resquícios <strong>de</strong> ocupações industriais e <strong>de</strong> armazenagem e<br />

39


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

uma mo<strong>de</strong>sta reserva natural. Diversos equipamentos públicos e edifícios institucionais convivem<br />

com alguns prédios <strong>de</strong> serviço ao longo da Euston Road, hotéis no perímetro da estação, lojas nas<br />

vias principais e, ao norte da área <strong>de</strong> intervenção, indústrias leves. Cerca <strong>de</strong> 16mil pessoas moram<br />

no entorno das duas estações (Spit e Bertolini, 1998).<br />

O espaço urbano é consi<strong>de</strong>rado <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>nado, com raros e fragmentados espaços públicos, e sua<br />

reputação é atualmente das piores em Londres.<br />

O PROCESSO<br />

As complexas negociações para o plano <strong>de</strong> King’s Cross iniciaram-se há cerca <strong>de</strong> 18 anos e<br />

envolveram os governos central e municipal, a comunida<strong>de</strong>, os empreen<strong>de</strong>dores imobiliários e as<br />

companhias <strong>de</strong> transporte. Des<strong>de</strong> muito antes, no entanto, a área chama atenção: o Plano para o<br />

Desenvolvimento da Gran<strong>de</strong> Londres (GLDP) i<strong>de</strong>ntificou, em 1976, a região <strong>como</strong> possível pólo <strong>de</strong><br />

escritórios vinculado ao nó <strong>de</strong> transporte. Uma revisão do plano, em 1984, propôs limites ao caráter<br />

terciário e induziu à instalação <strong>de</strong> habitações <strong>de</strong> interesse social e indústrias leves.<br />

Em 1987, a BR convidou empreen<strong>de</strong>dores privados a apresentarem propostas para a área <strong>de</strong> cerca<br />

<strong>de</strong> 58ha. Nesta época, embora a BR mantivesse em segredo, planejava-se a chegada do CTRL ao<br />

local.<br />

O vencedor da concorrência foi o grupo London Regeneration Consortium (LRC), que apresentou<br />

um projeto do arquiteto Norman Foster. O projeto i<strong>de</strong>ntificou três elementos principais: as antigas<br />

estações, o canal Regent’s Canal e uma quantida<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> edifícios históricos ou <strong>de</strong><br />

relevância arquitetônica relacionados à ocupação ferroviária. A partir <strong>de</strong>sses elementos, e<br />

consi<strong>de</strong>rando todas as linhas realocadas para o subsolo, o projeto propunha a ocupação do espaço<br />

entre as duas estações <strong>como</strong> elemento <strong>de</strong> integração física funcional, acolhendo e distribuindo os<br />

usuários; um gran<strong>de</strong> parque no centro da área que abrigaria os principais edifícios remanescentes e<br />

daria ênfase ao canal, com acesso por barcos e ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> lazer; e edifícios que promovessem a<br />

transição do tecido existente com o parque.<br />

Após a apresentação do projeto ao Parlamento e ao governo local, imaginava-se que as autorizações<br />

e negociações seriam uma etapa rápida. No entanto, o processo ficou marcado pela instabilida<strong>de</strong> das<br />

negociações, atores e procedimentos.<br />

Spit e Bertolini (1998) anotam que, na primeira fase (1987 a 1992), tanto o governo local quanto os<br />

empreen<strong>de</strong>dores estavam interessados em acelerar o processo, muito embora os pontos <strong>de</strong> partida<br />

fossem muito. A aprovação do plano foi longa, com diversas interferências do governo com<br />

imposições ambientais e sociais, sempre aceitas pela LRC. No entanto, o excesso <strong>de</strong> restrições<br />

impostas passou a afetar a viabilida<strong>de</strong> do empreendimento. Grupos locais, sob uma organização<br />

<strong>de</strong>nominada King’s Cross Railway Lands Group (KXRLG), passou a exigir planos alternativos,<br />

tumultuando ainda mais o processo. O KXRLG e o Kings Cross Team (KXT) apresentaram 2<br />

propostas alternativas em 1991, esta mais realista, aquela mais radical.<br />

Em 1992, o governo local anunciou seu interesse em homologar o projeto do LRC, sob algumas<br />

condições. No entanto, em 1993, um parecer da Union Railways (UR), subsidiária da BR<br />

responsável pelo planejamento das linhas <strong>de</strong> TAV, pendia para o lado dos grupos locais: o parecer<br />

sugeria que a estação existente seria suficiente para abrigar a linha internacional, <strong>de</strong>scartando a<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> um caro terminal subterrâneo adicional. O governo, acatando o<br />

40


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

parecer da UR, inviabilizou o projeto da LRC, inteiramente baseado na criação da linha subterrânea.<br />

Adicionalmente, em 1994 o mercado imobiliário entrou em crise, abalando a credibilida<strong>de</strong> da<br />

operação proposta pelo LRC.<br />

Outros estudos e relatórios indicaram a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um uso temporário para a área. O governo<br />

local comissionou, em 1993, o KXRLG a <strong>de</strong>senvolver uma proposta, que não obteve êxito político.<br />

A situação só teve uma nova orientação quando da aprovação, em 1995, <strong>de</strong> uma verba do governo<br />

nacional para viabilização <strong>de</strong> projetos <strong>de</strong> regeneração urbana no país. Logo se formou um novo<br />

consórcio para coor<strong>de</strong>nar a verba <strong>de</strong>stinada ao local, o King’s Cross Partnership (KCP), formado<br />

por todos os atores relevantes. No entanto, a tensão no processo emperra, até os dias <strong>de</strong> hoje, a<br />

efetivação do plano. A conclusão do CTRL está atrasada, o que impe<strong>de</strong> a verificação do potencial<br />

do nó <strong>de</strong> transporte. Quanto à reurbanização da área, a ambiciosa expectativa do projeto <strong>de</strong> Foster<br />

acabou dando lugar a um plano mais realista, que aproveita o potencial instalado em Saint Pancras<br />

para a instalação dos novos trens e mantém as linhas na superfície. O projeto, <strong>de</strong>senvolvido pela<br />

incorporadora Argent St. George, será empreendido após a finalização das obras do CTRL, em<br />

2007.<br />

FIGURA 9: projeto proposto<br />

pela Argent St. George em<br />

julho <strong>de</strong> 2004. Fonte:<br />

http://www.kxrlg.org.uk/<br />

news/network1.htm<br />

3.3 Consi<strong>de</strong>rações sobre a luz: possibilida<strong>de</strong>s e limites <strong>de</strong> paralelismo<br />

É indispensável estabelecer limites para a comparação entre os exemplos expostos em 3.2 e a Luz.<br />

Mesmo que todos eles pertençam a uma realida<strong>de</strong> muito próxima entre si, a comparação entre eles<br />

<strong>de</strong>ve se basear no reconhecimento da SINGULARIDADE <strong>de</strong> cada caso. Assim, <strong>de</strong>ve-se consi<strong>de</strong>rar<br />

as especificida<strong>de</strong>s tangentes às suas características espaciais e funcionais, incluso os requisitos<br />

econômicos e políticos para o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> cada caso. Isso cria limites para comparações<br />

qualitativas e quantitativas, mas po<strong>de</strong>-se apren<strong>de</strong>r com erros e acertos do processo, e não do<br />

resultado individual.<br />

Relativo ao processo, Spit e Bertolini (1998) estabelecem tópicos <strong>de</strong> interesse para a elaboração <strong>de</strong><br />

uma análise comparativa, que po<strong>de</strong>m sugerir as possibilida<strong>de</strong>s do paralelismo com a realida<strong>de</strong><br />

paulistana. São eles Flexibilida<strong>de</strong>, Hierarquia <strong>de</strong> Influência, Escala e Ambiente <strong>de</strong> Mobilida<strong>de</strong>:<br />

1. Flexibilida<strong>de</strong>: À exceção da tranqüilida<strong>de</strong> observada no <strong>de</strong>senvolvimento do plano para o<br />

Euralille, a divergência entre atores é um problema freqüente em projetos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> porte.<br />

41


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

Associado a isto, problemas financeiros e <strong>de</strong>mais externalida<strong>de</strong>s retardam o processo <strong>de</strong><br />

planejamento e submetem a iniciativa à rigorosa ação do tempo. Um processo longo implica<br />

mudanças tanto na percepção da realida<strong>de</strong>, quanto da real <strong>de</strong>manda planejada. Pensando nisso,<br />

<strong>de</strong>ve-se perguntar em que medida um projeto urbano <strong>de</strong> escala tão significativa po<strong>de</strong> prever<br />

flexibilida<strong>de</strong> sem causar fissuras no processo.<br />

2. Hierarquia <strong>de</strong> Influência: nesses planos, o argumento econômico é sempre o mais relevante. A<br />

ele estão subordinados os elementos ambientais-funcionais e a proposta <strong>de</strong> melhoria urbanística,<br />

que serve <strong>como</strong> instrumento. Se houver discrepâncias entre os elementos, será, provavelmente, o<br />

argumento econômico que conduzirá ao resultado concreto. Outro dado importante que merece ser<br />

mencionado é o <strong>de</strong>senvolvimento imobiliário. Este age mais <strong>como</strong> condição para a implementação<br />

<strong>de</strong> um plano do que <strong>como</strong> incentivo a ele. Em São Paulo, a reconhecida força do mercado<br />

imobiliário em <strong>de</strong>terminar o sucesso ou fracasso <strong>de</strong> uma região, à revelia das condições políticas e<br />

<strong>de</strong> infra-estrutura, <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rado ao mesmo tempo <strong>como</strong> oportunida<strong>de</strong> e <strong>como</strong> risco para o<br />

plano.<br />

3. Escala: Metropolização é um conceito profundamente enraizado em processos <strong>de</strong>sta natureza.<br />

Sem a consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong>ssa escala, o projeto prova-se inócuo e ingênuo. Um plano para a região da<br />

Luz <strong>de</strong>verá contemplar a escala metropolitana, assumindo o papel <strong>de</strong> articulador <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s<br />

que provavelmente terá a chance <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenhar.<br />

4. Ambientes <strong>de</strong> Mobilida<strong>de</strong>: A configuração <strong>de</strong> um ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong> é característica<br />

freqüente <strong>de</strong> estações intermodais, e quanto mais abrangente e eficaz for o nó <strong>de</strong> transporte e quanto<br />

melhor qualificado for o seu entorno, maior será a sua dinâmica. Na Luz os maiores <strong>de</strong>safios pairam<br />

sobre a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> regeneração física do entorno e sobre a interface entre estação e espaço<br />

urbano. A quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> espaço para <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s econômicas e habitação <strong>de</strong>ve<br />

ser proporcional à capacida<strong>de</strong> do nó <strong>de</strong> transporte para provar a centralida<strong>de</strong> viável. Da mesma<br />

forma, o nó <strong>de</strong> transporte não po<strong>de</strong> operar com ociosida<strong>de</strong> quanto à proporção <strong>de</strong> espaços e<br />

ativida<strong>de</strong>s no entorno. Assim, o i<strong>de</strong>al do mercado imobiliário <strong>de</strong> máxima <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> e o i<strong>de</strong>al do<br />

planejamento <strong>de</strong> transporte <strong>de</strong> máxima flexibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> infra-estrutura <strong>de</strong>vem chegar a um difícil<br />

equilíbrio. A multifuncionalida<strong>de</strong> é <strong>de</strong>sejável por ser um elemento essencial para a atrativida<strong>de</strong>,<br />

habitabilida<strong>de</strong> e segurança da área, além <strong>de</strong> garantir melhor distribuição e utilização do sistema <strong>de</strong><br />

transporte e permitir melhores rendimentos na exploração imobiliária.<br />

No entanto, a multifuncionalida<strong>de</strong> é complicada <strong>de</strong> se planejar por ser difícil <strong>de</strong>terminar as<br />

proporções i<strong>de</strong>ais para cada tipo <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>. No próximo capítulo serão elencados condicionantes<br />

relativos ao caso da Luz que indicam uma possível vocação funcional para a área, mas um projeto<br />

efetivo não é objeto <strong>de</strong>ste estudo e <strong>de</strong>ve embasar-se em estudos <strong>de</strong> viabilida<strong>de</strong> aprofundados.<br />

42


1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

4 CONCLUSÃO<br />

O percurso induzido pela organização dos capítulos apresentados mostra que a região da Luz, <strong>de</strong><br />

acordo com o <strong>de</strong>senvolvimento histórico e a atual organização metropolitana, tem condições <strong>de</strong><br />

reverter a atual <strong>de</strong>cadência e tornar-se potente articulador <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s na<br />

Metrópole. Neste sentido, Meyer, Grostein e Bi<strong>de</strong>rman apontam o ‘Pólo Luz’ <strong>como</strong> situação<br />

exemplar <strong>de</strong> uma reor<strong>de</strong>nação <strong>de</strong> São Paulo, já que:<br />

o novo padrão <strong>de</strong> organização do território metropolitano está intrinsecamente<br />

associado à mobilida<strong>de</strong> e é comandado, em gran<strong>de</strong> parte, por seus novos atributos –<br />

dispersão e continuida<strong>de</strong>. Esse novo mo<strong>de</strong>lo espacial requer uma infra-estrutura <strong>de</strong><br />

transportes cuja eficiência repousa na capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> integrar as ativida<strong>de</strong>s (...) e criar<br />

fortes e eficientes pólos articuladores locais. (Meyer, Grsotein e Bi<strong>de</strong>rman, 2004:242).<br />

Reverter a <strong>de</strong>cadência da região da Luz, no entanto, é tarefa árdua. Não bastam, embora sejam<br />

essenciais, gran<strong>de</strong>s projetos <strong>de</strong> infra-estrutura <strong>de</strong> transportes, <strong>como</strong> é o caso do PITU2020. Faz-se<br />

necessária especial atenção a questões que transcen<strong>de</strong>m à mera instalação <strong>de</strong> um nó <strong>intermodal</strong> na<br />

estação da Luz, <strong>como</strong> a<strong>de</strong>quação do tecido urbano on<strong>de</strong> ela se insere (microacessibilida<strong>de</strong>) e<br />

incentivo à ocupação diversificada do seu entorno. A quantida<strong>de</strong> e a qualida<strong>de</strong> dos empregos e<br />

moradia a serem estimulados na região <strong>de</strong>verão estar em consonância com as proporções da nova<br />

estação e se reportar, concomitantemente, às escalas local e metropolitana sem se submeter aos<br />

vícios do mercado imobiliário nem à freqüente ingenuida<strong>de</strong> do planejamento estatal.<br />

Algumas consi<strong>de</strong>rações sintetizam as análises feitas ao longo <strong>de</strong>sta dissertação:<br />

• A metrópole paulistana está organizada em pólos funcionais que apresentam má comunicação<br />

entre si, inibindo a eficiência da re<strong>de</strong> <strong>de</strong> centralida<strong>de</strong>s. As centralida<strong>de</strong>s mais recentes e mais<br />

relevantes em São Paulo avançam sobre território mal servido por transporte <strong>de</strong> massas, e<br />

apresentam saturação no sistema viário.<br />

• A estação da Luz é o principal nó <strong>de</strong> um plano abrangente em avançada fase <strong>de</strong> implantação, e<br />

congregará o maior número <strong>de</strong> linhas férreas da Metrópole. Conta, além disso, com bom<br />

abastecimento <strong>de</strong> vias expressas <strong>como</strong> a avenida Tira<strong>de</strong>ntes e a Marginal do rio Tietê e<br />

terminais <strong>de</strong> ônibus nas proximida<strong>de</strong>s. O afluxo <strong>de</strong> pessoas à estação Luz ten<strong>de</strong> a sofrer<br />

expressivo aumento;<br />

• Problemas <strong>de</strong> microacessibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong>vem ser alvo <strong>de</strong> profundas investigações.<br />

• A região da Luz situa-se nas imediações <strong>de</strong> um centro estabelecido e indica possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

atuar <strong>como</strong> sua extensão funcional. Consi<strong>de</strong>rando que a economia terciária elegeu o vetor<br />

sudoeste, seria ingênuo supor que um centro <strong>de</strong> serviços adicional seria viável no bairro da Luz<br />

ou que este venha a substituir aquele. A região tem vocação <strong>de</strong> lazer pela existência <strong>de</strong><br />

equipamento relevante. O comércio já está consolidado na região e é representado por ruas <strong>de</strong><br />

comércio especializado. Pelo acréscimo <strong>de</strong> circulação <strong>de</strong> passageiros, o comércio será<br />

beneficiado e subsidiará a criação <strong>de</strong> serviços <strong>de</strong> apoio <strong>como</strong> alimentação, hotéis etc.<br />

Fundamental para o sucesso da possível nova centralida<strong>de</strong> seria a formação <strong>de</strong> pólo<br />

habitacional.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

• A estação da Luz se transformará, progressivamente, no irradiador <strong>de</strong> transformação <strong>de</strong> toda a<br />

região central e <strong>de</strong>ve ser consi<strong>de</strong>rada com tal importância. Como visto nos estudos <strong>de</strong> caso, o nó<br />

exerce papel <strong>de</strong> organização <strong>de</strong> todo o entorno, e o edifício <strong>intermodal</strong> <strong>de</strong>ve prever transição<br />

funcional e espacial entre o nó e o lugar, resultando no <strong>de</strong>nominado ambiente <strong>de</strong> mobilida<strong>de</strong>. O<br />

atual projeto para reformulação da estação e suas conexões é tímido neste sentido, <strong>de</strong>vendo ser<br />

revisto. Caso contrário, corre-se o risco <strong>de</strong> sedimentar o caráter <strong>de</strong> passagem do bairro que,<br />

elevado a índices superiores aos atuais, agravaria sua <strong>de</strong>terioração.<br />

Diante da exposição acima, e consi<strong>de</strong>rando que a estação <strong>intermodal</strong> baseada no transporte<br />

metroferroviário é capaz <strong>de</strong> gerar transformação urbana, fazem-se necessários dois projetos<br />

distintos, porém vinculados. Um <strong>de</strong>les seria a rea<strong>de</strong>quação urbanística da região da Luz (melhorar a<br />

microacessibilida<strong>de</strong> e planejar a ocupação equilibrada do território). Outro seria o reestudo do<br />

edifício da estação <strong>intermodal</strong> <strong>de</strong> forma a contemplar não só a real <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> tráfego, mas<br />

também a transição física e funcional entre o nó e o lugar que se alimentam.<br />

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1º Concurso <strong>de</strong> Monografia CBTU 2005 – A Cida<strong>de</strong> nos Trilhos<br />

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