Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa
Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa
Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Sexta-feira<br />
9 Julho 2010<br />
www.ipsilon.pt<br />
<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong><br />
E a realida<strong>de</strong> entrou por Serralves a<strong>de</strong>ntro<br />
PAULO PIMENTA ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7400 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE<br />
Vergílio Ferreira Miles Cleret Charlotte Rampling
Flash<br />
Sumário<br />
<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> 6<br />
A aventura <strong>de</strong> uma pintora<br />
atenta à realida<strong>de</strong><br />
Vergílio Ferreira 12<br />
O que ele não publicou, mas<br />
também não <strong>de</strong>struiu<br />
Dave Eggers 14<br />
Escritor com causas<br />
São José Almeida 18<br />
Abriu o armário da<br />
homossexualida<strong>de</strong> na<br />
ditadura<br />
Mi Ami 22<br />
O rock como celebração<br />
tribal<br />
Miles Cleret 26<br />
O homem que reinventou<br />
África para o século XXI<br />
Charlotte Rampling 28<br />
Entrevista com a actriz<br />
Ficha Técnica<br />
Directora Bárbara Reis<br />
Editor Vasco Câmara, Inês Nadais<br />
(adjunta)<br />
Conselho editorial Isabel<br />
Coutinho, Óscar Faria, Cristina<br />
Fernan<strong>de</strong>s, Vítor Belanciano<br />
Design Mark Porter, Simon<br />
Esterson, Kuchar Swara<br />
Directora <strong>de</strong> arte Sónia Matos<br />
Designers Ana Carvalho, Carla<br />
Noronha, Mariana Soares<br />
Editor <strong>de</strong> fotografia Miguel<br />
Ma<strong>de</strong>ira<br />
E-mail: ipsilon@publico.pt<br />
Alguém adopta um<br />
Hitchcock mudo?<br />
A iniciativa foi já experimentada em<br />
diferentes áreas, nomeadamente<br />
em museus, bibliotecas e... jardins<br />
zoológicos. Trata-se <strong>de</strong> propor a<br />
alguém — uma empresa ou um<br />
privado — que, ao abrigo do<br />
mecenato, “adopte” e cui<strong>de</strong> do<br />
restauro ou da sobrevivência <strong>de</strong> um<br />
quadro antigo, <strong>de</strong> um livro raro ou<br />
<strong>de</strong>... um animal da sua estimação.<br />
Coube agora ao British Film<br />
Institute (BFI) recorrer a este<br />
expediente para tentar restaurar os<br />
primeiros filmes <strong>de</strong> Alfred<br />
Hitchcock (1899-1980). Com o mote<br />
“Adopte um Hitchcock”, a<br />
campanha arranca com uma lista<br />
<strong>de</strong> nove títulos, entre os quais está<br />
“The Lodger: A Story of the London<br />
Fog”, tido como obra-prima na<br />
altura do seu lançamento (1926). Os<br />
outros oito são igualmente filmes da<br />
fase inicial da carreira do gran<strong>de</strong><br />
mestre do suspense, ainda em<br />
versão muda e realizados em<br />
Inglaterra, e que têm em comum<br />
estarem a precisar <strong>de</strong> restauro para<br />
po<strong>de</strong>rem voltar a ser visionados<br />
com mais qualida<strong>de</strong>. Os restantes<br />
títulos em causa são “The Pleasure<br />
Gar<strong>de</strong>n”, (1925), “The Ring” (1927),<br />
“Downhill” (1927), “Easy Virtue”<br />
(1927), “The Farmers Wife” (1927),<br />
“Champagne” (1928), “The<br />
Manxman” (1929) e “Blackmail”<br />
(1929).<br />
O montante <strong>de</strong>sta operação é<br />
estimado pelo BFI em cerca <strong>de</strong> 1,2<br />
milhões <strong>de</strong> euros, e po<strong>de</strong>-se ace<strong>de</strong>r<br />
a mais informação sobre a<br />
campanha no “site” do BFI:<br />
(www.bfi.org.uk/nationalarchive/<br />
hitchcock), on<strong>de</strong> todo o tipo <strong>de</strong><br />
contribuições são “most welcome”.<br />
Por exemplo, um quarto <strong>de</strong> libra<br />
(30 cêntimos) chega para restaurar<br />
50 centímetros <strong>de</strong> filme; uma<br />
contribuição <strong>de</strong> 5 mil libras (6 mil<br />
euros) já dá direito a que o nome do<br />
dador passe a figurar nos créditos<br />
<strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cimento; 100 mil libras<br />
(120 mil euros) chega para restaurar<br />
todo um filme, diz o BFI, que<br />
consi<strong>de</strong>ra os nove títulos <strong>de</strong><br />
Hitchcock “uma parte crucial da<br />
história britânica”. E sublinha:<br />
Hitchcock<br />
Afinal,<br />
Bacon<br />
<strong>de</strong>senhavaa<br />
Francis Bacon dizia que não<br />
sabia <strong>de</strong>senhar. Mas os<br />
cerca <strong>de</strong> 41 <strong>de</strong>senhos da<br />
autoria do pintor angloirlandês<br />
(1909-1992) que<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o dia 5 po<strong>de</strong>m ser<br />
vistos na Fundação Eugénio<br />
Almeida, em Évora, na<br />
exposição “Bacon: A Ponta<br />
do Iceberg”, <strong>de</strong>smentem<br />
essa i<strong>de</strong>ia. São os<br />
chamados “Desenhos<br />
Italianos”, produzidos nos<br />
anos 1980 por um Bacon<br />
já septuagenário, e<br />
oferecidos a um jovem<br />
jornalista italiano,<br />
Cristiano Ravarino, com<br />
o qual Bacon manteve uma<br />
relação durante um período<br />
que passou em Itália.<br />
Despreocupado,<br />
<strong>de</strong>scontraído, longe da<br />
fama e das atenções que o<br />
incomodavam em<br />
Inglaterra, Bacon<br />
<strong>de</strong>senhava — e distribuía os<br />
seus <strong>de</strong>senhos por<br />
Ravarino, mas também por<br />
“homens e mulheres que<br />
não podiam sequer<br />
imaginar o valor do<br />
presente, donos <strong>de</strong> bares,<br />
restaurantes e pequenas<br />
pousadas, ao que parece<br />
como pedido <strong>de</strong> <strong>de</strong>sculpa<br />
pelos seus estados <strong>de</strong><br />
embriaguez”, conta<br />
Alessandro Riva num texto<br />
do catálogo.<br />
O inglês Eduard Lucie-<br />
Smith, comissário da<br />
exposição e um dos<br />
principais estudiosos <strong>de</strong><br />
Bacon, explicou ao Ipsílon<br />
que existiu uma gran<strong>de</strong><br />
controvérsia sobre a<br />
autenticida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes<br />
<strong>de</strong>senhos, em parte<br />
motivada pelo facto <strong>de</strong> o<br />
pintor ter assumido<br />
publicamente,<br />
variadíssimas vezes, não<br />
<strong>de</strong>senhar, mas também por<br />
ser normal <strong>de</strong>itar fora<br />
trabalhos ou oferecê-los a<br />
amigos, entre os quais o<br />
Os <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong> Francis Bacon não eram feitos para<br />
escritor ven<strong>de</strong>r. O pintor distribuía-os por donos <strong>de</strong> bares<br />
Steven<br />
como pedido <strong>de</strong> <strong>de</strong>sculpa pela sua embriaguez<br />
Spen<strong>de</strong>r e<br />
oactor<br />
Paul<br />
Danquah.<br />
Segundo<br />
Lucie-<br />
Smith, a<br />
Ravarino<br />
terá dado<br />
“250<br />
<strong>de</strong>senhos,<br />
talvez mais”.<br />
São<br />
<strong>de</strong>senhos em<br />
vários<br />
formatos <strong>de</strong><br />
papel, a cores<br />
e a preto e<br />
branco, a<br />
maior parte<br />
<strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />
dimensão,<br />
assinados e<br />
autónomos.<br />
Os <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong><br />
célebre<br />
Bacon não<br />
retrato do Papa Inocêncio X<br />
eram feitos para ven<strong>de</strong>r, (a partir <strong>de</strong> Velázquez),<br />
pelo contrário: uma gran<strong>de</strong> crucificações e autoretratos.<br />
parte do trabalho foi<br />
escondida do público. Sendo hoje evi<strong>de</strong>nte que a<br />
“Alguns <strong>de</strong>senhos repensam obra <strong>de</strong> Bacon é fértil em<br />
e recapitulam” trabalhos <strong>de</strong>senhos, o que se po<strong>de</strong><br />
anteriores, explica ainda o <strong>de</strong>duzir da repetida<br />
comissário. “Mais velho e afirmação do pintor, e <strong>de</strong><br />
com mais experiência”, outros, <strong>de</strong> que nunca criou<br />
Bacon regressa a temas que qualquer tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho?<br />
já tinha trabalhado, como o Maria <strong>Lisboa</strong><br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 3
Flash<br />
Música<br />
Antony cantou duas<br />
canções em “Volta”,<br />
<strong>de</strong> Björk, e a islan<strong>de</strong>sa<br />
<strong>de</strong>volve agora a cortesia.<br />
No alinhamento <strong>de</strong><br />
“Swanlights”, álbum <strong>de</strong><br />
Antony & The Johnsons<br />
com edição marcada<br />
para 11 <strong>de</strong> Outubro,<br />
encontramos um dueto<br />
entre os dois, “Fletta”. O<br />
álbum é uma<br />
edição<br />
especial,<br />
um livrodisco<br />
<strong>de</strong><br />
144 páginas<br />
com pinturas,<br />
fotografias e<br />
textos assinados por<br />
Antony Hegarty.<br />
Meryl Streep vai ser Margaret Thatcher no cinema<br />
“Cada cêntimo conta”.<br />
Para além <strong>de</strong>stes, o BFI está a lançar<br />
uma campanha paralela para<br />
encontrar 75 filmes <strong>de</strong>saparecidos<br />
<strong>de</strong> vários realizadores britânicos.<br />
Entre os “most wanted”, há<br />
também um Hitchcock, “The<br />
Mountain Eagle” (1926), tido como<br />
o “Santo Graal” da filmografia do<br />
realizador; segundo o BFI, trata-se<br />
do único da mais <strong>de</strong> meia centena<br />
<strong>de</strong> filmes que terá realizado que se<br />
consi<strong>de</strong>ra hoje perdido.<br />
Não é preciso<br />
esperar 11 anos por<br />
um novo álbum dos<br />
Portishead<br />
Já estávamos preparados para nova<br />
longa espera, mas alegrem-se os<br />
corações: não será necessário. Os<br />
Portishead estão prestes a entrar<br />
em estúdio para começar a<br />
trabalhar no sucessor <strong>de</strong> “Third” e é<br />
certo que não se repetirão os 11 anos<br />
que o separaram <strong>de</strong> “Portishead”, o<br />
segundo álbum da banda britânica,<br />
editado em 1997. A revelação foi<br />
feita por Geoff Barrow à BBC 6<br />
Music, numa entrevista em que o<br />
multi-instrumentista e produtor da<br />
banda adiantou ainda que o novo<br />
álbum será editado por uma<br />
multinacional, a Universal.<br />
“Disseram-nos que po<strong>de</strong>mos fazer o<br />
que quisermos. Ven<strong>de</strong>mos discos<br />
suficientes para os manter<br />
contentes.”<br />
Fazer o que quiserem significa que,<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong>sse “Third” em que<br />
mandaram às malvas o trip-hop que<br />
ajudaram a <strong>de</strong>finir em favor <strong>de</strong><br />
electrónica mais rugosa e dos<br />
ritmos kraut rock dos Can ou Neu!,<br />
não há retrocesso possível. “Estarei<br />
a compor para os Portishead entre<br />
Julho e Agosto e só quero pôr outro<br />
álbum cá fora. Tenho esperança<br />
que seja bem mais rápido [que<br />
anteriormente] porque estamos<br />
todos mais velhos e mais sábios.”<br />
Se tomarmos como referência<br />
“Chase The Tear”, o “single” <strong>de</strong><br />
beneficência<br />
para a<br />
Amnistia<br />
Martin Scorsese não pára: está a rodar “A Invenção<br />
<strong>de</strong> Hugo Cabret”, a que se seguirá “Silêncio” e um<br />
“biopic” <strong>de</strong> Frank Sinatra<br />
Internacional que editaram em<br />
Dezembro, o novo álbum<br />
aprofundará a hibri<strong>de</strong>z electrónicoorgânica<br />
e a força propulsora <strong>de</strong><br />
“Third”. “É isso que somos agora.<br />
Quebrámos o mol<strong>de</strong> daquilo que as<br />
pessoas esperavam <strong>de</strong> nós”,<br />
confessou Barrow.<br />
Antes do trabalho no novo álbum,<br />
Adrian Utley, guitarrista, baixista,<br />
teclista e também produtor dos<br />
Portishead, gravou com Will<br />
Gregory, dos Goldfrapp, uma nova<br />
banda sonora para “A Paixão <strong>de</strong><br />
Joana D’Arc”, o histórico filme <strong>de</strong><br />
Carl Dreyer, apresentada ao vivo em<br />
Bristol, em Maio. Geoff Barrow, por<br />
sua vez, lançou em Novembro <strong>de</strong><br />
2009 o álbum <strong>de</strong> estreia homónimo<br />
da sua nova banda, os BEAK>, que<br />
vem apresentando em digressão. E<br />
a discreta Beth Gibbons? Mantém-se<br />
na sombra? “Está ocupada a<br />
compor”,<br />
esclareceu<br />
Barrow à BBC6.<br />
Martin Scorsese para<br />
crianças<br />
Depois <strong>de</strong> “Shutter Island”, Martin<br />
Scorsese está a adaptar ao cinema<br />
3D o romance “A Invenção <strong>de</strong> Hugo<br />
Cabret”, com texto e ilustrações <strong>de</strong><br />
Brian Selznick (ed. Gailivro). A<br />
rodagem já começou em Londres, e<br />
a estreia está marcada para 9 <strong>de</strong><br />
Dezembro <strong>de</strong> 2011 nos Estados<br />
Unidos, estando também prevista<br />
uma versão 2D.<br />
“A Invenção <strong>de</strong> Hugo Cabret” é a<br />
história <strong>de</strong> um órfão <strong>de</strong> 12 anos,<br />
Hugo, que vive na Gare <strong>de</strong><br />
Montparnasse, a movimentada<br />
estação <strong>de</strong> comboios parisiense,<br />
on<strong>de</strong> a sua sobrevivência <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong><br />
segredos e do anonimato.<br />
Pela estação passam<br />
uma excêntrica<br />
rapariga amante<br />
<strong>de</strong> livros e um<br />
velho amargo,<br />
dono <strong>de</strong> uma<br />
lojinha <strong>de</strong><br />
brinquedos (que se <strong>de</strong>scobre ser o<br />
cineasta Georges Méliès), um<br />
<strong>de</strong>senho misterioso, uma chave<br />
roubada, um homem mecânico e<br />
uma mensagem escondida. É a<br />
primeira adaptação que Scorsese<br />
faz <strong>de</strong> uma história infanto-juvenil.<br />
Ben Kingsley, Chloe Moretz, Sacha<br />
Baron Cohen, Ju<strong>de</strong> Law,<br />
Christopher Lee e Mathieu Amalric<br />
integram o elenco<br />
A seguir, o realizador irá adaptar<br />
“Silêncio”, romance <strong>de</strong> Shusaku<br />
Endo, e rodar um “biopic” sobre o<br />
cantor e actor Frank Sinatra.<br />
Meryl Streep vai<br />
ser A Dama <strong>de</strong><br />
Ferro?<br />
Meryl Streep po<strong>de</strong>rá estar<br />
prestes a voltar a trabalhar com<br />
a realizadora <strong>de</strong> “Mamma<br />
Mia!”, Phyllida Lloyd,<br />
<strong>de</strong>pois do sucesso <strong>de</strong><br />
2008 com as músicas<br />
dos Abba. Segundo o<br />
“Hollywood<br />
Reporter”, a actriz, com dois<br />
Óscares e 61 anos, mostrou<br />
interesse em interpretar o papel da<br />
Dama <strong>de</strong> Ferro e os seus agentes<br />
estão a negociar a sua participação<br />
no “biopic” “Thatcher”, on<strong>de</strong><br />
interpretaria Margaret Thatcher. O<br />
actor Jim Broadbent po<strong>de</strong>rá vir a<br />
interpretar Denis, o marido da exprimeira-ministra<br />
britânica.<br />
A rodagem está prevista para o final<br />
do ano. O filme baseia-se num<br />
argumento escrito por Abi Morgan,<br />
que escreveu as séries <strong>de</strong> televisão<br />
“Brick Lane” e “Sex Traffic”, e fala<br />
do “po<strong>de</strong>r e do preço que se paga<br />
pelo po<strong>de</strong>r”, sendo “um retrato<br />
surpreen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> uma mulher<br />
extraordinária e complexa.”<br />
Conta o “Hollywood Reporter” que<br />
esta biografia filmada <strong>de</strong> Thatcher<br />
se situa nos 17 dias que<br />
antece<strong>de</strong>ram a Guerra das<br />
Malvinas, em 1982. E mostra como<br />
aquela a quem chamam “Dama <strong>de</strong><br />
Ferro” lutou para salvar a sua<br />
carreira.<br />
James Cameron<br />
filma os Black Eyed<br />
Peas em 3D<br />
A seguir a “Avatar”, James Cameron<br />
vai realizar um documentário em<br />
3D sobre os Black Eyed Peas. A<br />
novida<strong>de</strong> foi dada por Will.I.Am à<br />
revista “Vibe”. “Temos o melhor<br />
realizador porque somos o melhor<br />
grupo do planeta”, disse, sem<br />
modéstias, o lí<strong>de</strong>r da banda norteamericana.<br />
O filme mostrará o<br />
grupo em digressão e em concerto.<br />
Ainda não se sabe se vai<br />
ser rodado em 3D ou se<br />
vai ser convertido<br />
<strong>de</strong>pois. A rodagem<br />
será na América do<br />
Sul e a estreia está<br />
prevista para 2011.<br />
James Cameron tem um “feeling”<br />
Os Portishead só querem “pôr outro álbum cá fora”<br />
4 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
AGENDA CULTURAL FNAC<br />
entrada livre<br />
entrada livre<br />
APRESENTAÇÃO AO VIVO LANÇAMENTO EXPOSIÇÃO<br />
LANÇAMENTO<br />
AS VIAGENS DE LOIS - PORTUGAL<br />
Livro <strong>de</strong> Jacques Martin e Luís Diferr<br />
Chama-se Portugal e será o quinto volume criado em torno <strong>de</strong> Loïs, um herói do século XVII que foi das últimas<br />
personagens imaginadas pelo recentemente falecido Jacques Martin, autor das famosas aventuras <strong>de</strong> Alix.<br />
10.07. 17H00 FNAC CASCAISHOPPING<br />
LANÇAMENTO | INAUGURAÇÃO<br />
OS POSTAIS DA PRIMEIRA REPÚBLICA<br />
Professor António Ventura<br />
No ano da comemoração do centenário da República, a FNAC inaugura uma exposição que revisita os tempos<br />
da Primeira República em Portugal e convida-o a participar numa conversa em torno do tema O Bilhete Postal<br />
Ilustrado na Propaganda Política, no âmbito da Tertúlia Letras Com(n)Vida.<br />
12.07. 18H30 FNAC CHIADO<br />
AO VIVO<br />
MADAME GODARD<br />
Galapagos<br />
Galapagos é o título do longa-duração <strong>de</strong> estreia da banda <strong>de</strong> Viana do Castelo. O single Atlas 1977, divulgado<br />
nas rádios nacionais, será um dos temas em <strong>de</strong>staque no Fórum FNAC.<br />
10.07. 22H00 FNAC LEIRIASHOPPING<br />
11.07. 17H00 FNAC COIMBRA<br />
APRESENTAÇÃO<br />
VIVA O VINIL<br />
Henrique Amaro, João Lopes, Nuno Galopim,<br />
Paulo Furtado e Vítor Belanciano<br />
A FNAC convida alguns dos "pesos-pesados" da música, do jornalismo e da rádio para um "combate" on<strong>de</strong><br />
cada um terá <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua selecção musical.<br />
15.07. 18H00 FNAC CHIADO<br />
EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA<br />
RETROSPECTIVA CINEMA PORTUGUÊS<br />
Composta por material pertencente ao Arquivo Fotográfico da Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema,<br />
esta série <strong>de</strong> fotografias <strong>de</strong> rodagem, feitas entre os anos 20 e os anos 70, focaliza-se sobretudo em<br />
dois períodos: o período clássico do cinema português, nos anos 30 e 40, e o Cinema Novo, nos anos 60.<br />
03.06. - 03.09.2010 FNAC VISEU<br />
Consulte todos os eventos da Agenda Fnac,<br />
assim como outros conteúdos culturais em http://cultura.fnac.pt<br />
Apoio:
<strong>Marlene</strong> D<br />
uma pintora da<br />
The Wall, <strong>de</strong><br />
2009, que<br />
representa o<br />
muro erigido por<br />
Israel para isolar<br />
a Cisjordânia,<br />
po<strong>de</strong>rá ser<br />
interpretada<br />
como uma obra<br />
própalestiniana.<br />
Capa<br />
6 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
<strong>Dumas</strong><br />
vida mo<strong>de</strong>rna<br />
“Contra o Muro”, no<br />
Museu <strong>de</strong> Serralves,<br />
não é apenas uma<br />
viagem à obra e ao<br />
percurso <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong><br />
<strong>Dumas</strong>. É uma das mais<br />
importantes exposições<br />
<strong>de</strong> pintura dos últimos<br />
anos. E um reencontro,<br />
sempre renovado, com<br />
algumas das questões<br />
que marcam a vida da<br />
pintura contemporânea.<br />
José Marmeleira<br />
(textos) e Paulo<br />
Pimenta (fotos)<br />
Numa das salas <strong>de</strong> “Contra o Muro”,<br />
pinturas <strong>de</strong> cabeças e rostos acompanham,<br />
entre a circunspecção e a indiferença,<br />
a conversa do Ípsilon com<br />
<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> (Cida<strong>de</strong> do Cabo,<br />
1953). A artista respon<strong>de</strong> <strong>de</strong>sembaraçada<br />
e com humor às perguntas. Por<br />
vezes, surpreen<strong>de</strong>-se, divaga, mas<br />
não per<strong>de</strong> o rumo, regressa sempre.<br />
Afinal, está num mundo cujos segredos<br />
conhece como ninguém: a sua<br />
pintura. De resto, o cenário da entrevista<br />
não foi casual: foi a própria artista<br />
que propôs a realização da entrevista<br />
junto às suas obras.<br />
Esclarecido o contexto, convém<br />
dizer que <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> é uma das<br />
mais relevantes pintoras contemporâneas.<br />
Alcançou um sucesso crítico<br />
que, embora não sendo consensual,<br />
é acompanhado por sucesso comercial<br />
e “Contra o Muro”, no Museu <strong>de</strong><br />
Serralves até Outubro, promete ser<br />
um dos momentos mais singulares<br />
da sua carreira. Ao todo são 40 obras<br />
feitas na última década, incluindo<br />
algumas já <strong>de</strong>ste ano – a gran<strong>de</strong> maioria<br />
revelada em Abril, na Galeria David<br />
Zwirner, em Nova Iorque – e nunca<br />
antes mostradas na Europa. É<br />
provável até que dificilmente voltem<br />
ser apreciadas nestas condições num<br />
país europeu. Culpa <strong>de</strong> constrangimentos<br />
financeiros e logísticos do<br />
actual contexto internacional que<br />
muito provavelmente impedirão que<br />
voltem a ser reunidas.<br />
Mas estes são assuntos relativamente<br />
mundanos. “Contra o Muro”<br />
é uma exposição marcante e, enquanto<br />
individual <strong>de</strong> pintura, um acontecimento.<br />
Por duas razões. A primeira<br />
revela-se naquilo que mostra <strong>de</strong> inédito<br />
da obra da artista: elementos<br />
arquitectónicos e construções humanas<br />
que i<strong>de</strong>ntificam o conflito israelopalestiniano<br />
como motivo pictórico;<br />
e pinturas que representam a na-<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 7
“Child Waving”<br />
(Criança a<br />
acenar), <strong>de</strong> 2010<br />
“The Mother”<br />
(A mãe), <strong>de</strong><br />
2009<br />
Pormenor da<br />
série<br />
“Blindfol<strong>de</strong>d”<br />
(Vendados),<br />
<strong>de</strong> 2002,<br />
durante a<br />
montagem <strong>de</strong><br />
“Contra o<br />
Muro”, em<br />
Serralves<br />
tureza-morta, tema que durante décadas<br />
<strong>Dumas</strong> se recusou a trabalhar.<br />
A segunda é a obra, com as suas preocupações,<br />
<strong>de</strong>sencontros e progressos,<br />
numa aventura individual que é<br />
também a aventura <strong>de</strong> toda a arte<br />
contemporânea atenta à realida<strong>de</strong>.<br />
Representar o muro<br />
A representação do mundo pela pintura,<br />
ou a pintura como forma <strong>de</strong><br />
representar o mundo: comece-se por<br />
aqui. Porquê Israel e a Palestina?<br />
“E porque não? Não sou historiadora<br />
ou política, mas penso que na<br />
nossa socieda<strong>de</strong> global continua a ser<br />
um drama muito importante, indissociável<br />
até <strong>de</strong> outros mais traumáticos<br />
como a II Guerra Mundial ou o<br />
Holocausto. Em 2010 ainda testemunhamos<br />
muitas coisas relacionadas<br />
com o que se vive no Médio Oriente.<br />
Não acho <strong>de</strong>spropositado trazer o<br />
tema para a minha pintura.”<br />
Foi a partir <strong>de</strong> 1976 que a artista,<br />
já a viver na Europa, vinda da África<br />
do Sul, <strong>de</strong>scobriu as raízes europeias<br />
do conflito. Na verda<strong>de</strong>, o assunto<br />
tinha aflorado na série “Man Kind”<br />
(2002-2006), inspirada em fotografias<br />
<strong>de</strong> corpos e rostos muçulmanos<br />
– a série está em Serralves. Em “Contra<br />
o Muro”, porém, estamos diante<br />
<strong>de</strong> um cenário político mais explícito<br />
e <strong>de</strong> uma posição, assinalada pela<br />
representação do muro erigido por<br />
Israel (e <strong>de</strong> imagens da repressão<br />
exercida pelo exército israelita), que<br />
muitos interpretarão como pró-palestiniana.<br />
Por exemplo, o governo<br />
se<strong>de</strong>ado em Jerusalém, é um comprador<br />
improvável das pinturas “po-<br />
“Não sou uma<br />
historiadora ou<br />
política, mas penso<br />
que na nossa<br />
socieda<strong>de</strong> global<br />
[o conflito israelopalestiniano]<br />
continua a ser um<br />
drama muito<br />
importante”<br />
líticas” <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong>. Ou<br />
não?<br />
“Não sei [risos]. Quando inaugurei<br />
a exposição em Nova Iorque ouvi<br />
críticas. Disseram-me que este não<br />
era o caminho. Que eu não estivera<br />
lá, não conhecia a realida<strong>de</strong>. Compreendo<br />
essa perspectiva, mas não<br />
a aceito. Vivi o ‘apartheid’ na África<br />
do Sul, mas, por ter lutado contra<br />
esse regime, não faço <strong>de</strong> todos os<br />
negros anjos e <strong>de</strong> todos os branco<br />
<strong>de</strong>mónios. O mesmo acontece aqui.<br />
Apenas quis representar um muro.<br />
Quando se vê o outro como inimigo,<br />
o efeito é <strong>de</strong>vastador. Não apenas a<br />
um nível político mas num plano<br />
mais existencial”.<br />
<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> viveu e estudou<br />
na África do Sul até 1976, contornando<br />
como podia as limitações impostas<br />
pela censura, nomeadamente no<br />
meio estudantil britânico da Michaelis<br />
School of Fine Arts da University<br />
of Cape Town.<br />
“Foram anos formativos, muito<br />
importantes. Estávamos longe da<br />
socieda<strong>de</strong> e era fácil escapar aos censores.<br />
Víamos coisas proibidas no<br />
clube <strong>de</strong> cinema [da escola]. Filmes<br />
do [Ingmar] Bergman, do Godard,<br />
do Alain Resnais”.<br />
A relação com pintura era, entretanto,<br />
vivida <strong>de</strong> forma dolorosa, confusa.<br />
Mais natural parecia o afecto<br />
por certos fotógrafos: “Nessa altura<br />
não havia muitos pintores <strong>de</strong> que<br />
gostasse. Não conseguia gostar <strong>de</strong><br />
Rembrandt. Não me ajudava na minha<br />
arte, ao contrário da fotografia<br />
da Diane Arbus e do Richard Avedon<br />
com quem sentia partilhar sensibilida<strong>de</strong>s<br />
comuns e que me permitiam<br />
chegar à pintura <strong>de</strong> outra maneira.<br />
Da Arbus gostava da intensida<strong>de</strong>, o<br />
Avedon influenciou-me formalmente.<br />
Gostava dos seus fundos neutrais,<br />
sobretudos os das fotografias do pai<br />
antes <strong>de</strong> morrer. Tinha um distanciamento<br />
face aos retratados que me<br />
lembrava o Andy Warhol.”<br />
O <strong>de</strong>sejo da realida<strong>de</strong><br />
A relação <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> com a<br />
pintura iniciou-se assim por vias<br />
<strong>Marlene</strong><br />
<strong>Dumas</strong><br />
fotografada<br />
em Serralves<br />
em frente a<br />
“The Sleep of<br />
Reason”, <strong>de</strong><br />
2009, um<br />
auto-retrato<br />
da artista<br />
8 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 9
Figure in a<br />
Landscape<br />
(Figura numa<br />
paisagem,<br />
2010)<br />
exteriores, “estrangeiras”. Na opinião<br />
da artista, não existiam outros<br />
caminhos: “Vivia inserida numa socieda<strong>de</strong><br />
que não valorizava a pintura<br />
ou que a submetia a um ensino<br />
caduco. Não respondia aos meus<br />
<strong>de</strong>sejos e aspirações. Chegava a sentir-me<br />
culpada por ser uma pintora,<br />
activida<strong>de</strong> que na África do Sul todos<br />
achavam insignificante e não tinha<br />
mo<strong>de</strong>los. Vivia um conflito com<br />
aquilo <strong>de</strong> que gostava. Por isso, criei<br />
a minha própria história pessoal<br />
com o suporte.”<br />
“Contra o Muro” parece retomar<br />
essa velha e difícil relação, reconciliando<br />
a pintora com géneros e temas<br />
como a abstracção que se insinua no<br />
muro <strong>de</strong> “Em Construção” (2009) e<br />
nos blocos azuis <strong>de</strong> “Barreira mentais”<br />
(2009).<br />
“Sempre quis ser uma pintora abstracta,<br />
adorava os expressionistasabstractos,<br />
mas a abstracção não era<br />
suficiente para mim, pois também<br />
queria a realida<strong>de</strong>. Esse foi outro conflito<br />
que experimentei”, conta. O impasse<br />
acabou resolvido, ou pelo menos<br />
atenuado, com o cinema da Nouvelle<br />
Vague. “Não <strong>de</strong>ixo <strong>de</strong> pensar a<br />
pintura enquanto abstracção, enquanto<br />
construção <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong>.<br />
Não pretendo testemunhar a realida<strong>de</strong>,<br />
apenas confrontar-me com ela.<br />
Daí, para mim, nos meus tempos <strong>de</strong><br />
estudante, a importância <strong>de</strong> filmes<br />
como ‘Hiroshima mon amour’, do<br />
Alain Resnais. Combinava uma história<br />
<strong>de</strong> amor, uma dimensão política<br />
ou documental e uma reflexão sobre<br />
a linguagem artística, que naquele<br />
caso se tratava do cinema. Era essa<br />
“Sempre quis ser uma<br />
pintora abstracta,<br />
mas a abstracção não<br />
era suficiente para<br />
mim, pois também<br />
queria a realida<strong>de</strong>.<br />
Não pretendo<br />
testemunhar<br />
a realida<strong>de</strong>, apenas<br />
confrontar-me<br />
com ela”<br />
coexistência que queria encontrar na<br />
pintura”.<br />
Uma arte ou uma pintura que possa<br />
representar, também, o que é estar<br />
apaixonado, como sugeriu numa entrevista?<br />
“Ah [risos], aí queria apenas<br />
mostrar os meus ciúmes em relação<br />
ao cinema e à música pop. Gosto <strong>de</strong><br />
uma arte inteligente, tanto estética<br />
como conceptualmente, mas [que<br />
seja] também sensual e emocional.<br />
Encontro-a em artistas como Luc Tuymans,<br />
Louise Bourgeois, Francis Bacon<br />
ou Steve McQueen.”<br />
O interesse pela representação e a<br />
vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> abordar motivos narrativos<br />
não implicaram um afastamento das<br />
premissas do conceptualismo, abraçadas<br />
no início da carreira. Pelo contrário.<br />
A reflexão sobre as possibilida<strong>de</strong>s<br />
da pintura, e a relação <strong>de</strong>sta com<br />
a fotografia, bem como o questionar<br />
das imagens, foram atitu<strong>de</strong>s cultivadas<br />
e com frequência passadas para o papel<br />
em pequenos textos assinados pela<br />
pintora. O canadiano Jeff Wall, conhecido<br />
pelas suas fotografias <strong>de</strong> situações<br />
do dia-a-dia, foi, nesse sentido,<br />
uma inspiração. “Quando se interroga<br />
sobre o lugar e a condição do pintor<br />
da vida mo<strong>de</strong>rna, e faz do médium<br />
fotográfico um instrumento pictórico,<br />
[o Jeff Wall] enuncia algumas das minhas<br />
preocupações e i<strong>de</strong>ias. [Ele mostrou-me<br />
que] era possível e legítimo<br />
aceitar o <strong>de</strong>safio que certos temas nos<br />
colocam” e, <strong>de</strong>ssa forma, abordar o<br />
“For Whom<br />
the Bell Tolls “<br />
(Por quem os<br />
sinos<br />
dobram), <strong>de</strong><br />
2008<br />
Mortos e vivos, grupos <strong>de</strong><br />
pessoas, bebés, mo<strong>de</strong>los<br />
femininos, mulheres em<br />
lágrimas. A obra <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong><br />
<strong>Dumas</strong> é uma galeria <strong>de</strong> figuras,<br />
corpos e rostos, construída<br />
através da pintura e do <strong>de</strong>senho,<br />
num confronto repetido com<br />
o conceito <strong>de</strong> retrato e com o<br />
próprio espectador.<br />
Um mundo <strong>de</strong> retratos<br />
Na obra <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong>, o retrato não é apenas um motivo para levar a realida<strong>de</strong> à tela ou ao papel. É também um meio<br />
<strong>de</strong> questionar a construção <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s, a empatia do espectador e a própria pintura.<br />
Em “Contra o Muro” há uma<br />
série que se <strong>de</strong>staca nesse<br />
confronto: “Man Kind”, com os<br />
seus anónimos homens árabes,<br />
sob os títulos <strong>de</strong> “The Semite”,<br />
“The Mediator” (um Cristo<br />
tímido ou indiferente?) ou “The<br />
Lookalike”. São pinturas a óleo<br />
<strong>de</strong> um mundo pós-11 <strong>de</strong> Setembro<br />
– as imagens originais reportam<br />
à guerra no Iraque e em Gaza<br />
– e propõem mais do que uma<br />
posição política, propõem um<br />
questionamento da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />
privada e pública. Ou não fossem<br />
rostos abertos ao sentido, nesse<br />
espaço <strong>de</strong> tensão psicológica que<br />
é superfície pintada segundo<br />
<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong>.<br />
Em 1986, no conjunto <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senhos e litografias “Fear<br />
of Babies”, a artista quebrou a<br />
familiar docilida<strong>de</strong> dos bebés<br />
em esgares inquietantes, antes<br />
<strong>de</strong> regressar ao tema, cinco<br />
anos <strong>de</strong>pois, com “The First<br />
People I-V” (1991), retratando<br />
querubins em poses adultas,<br />
rectas e frontais. No início dos<br />
anos 90, foi a vez dos “Black<br />
Drawings [Desenhos negros]”,<br />
e, pela primeira vez, <strong>Dumas</strong> fez<br />
Propõe-se mais do<br />
que uma posição<br />
política, propõe-se<br />
um questionamento<br />
da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />
privada e pública<br />
das pessoas negras assunto da<br />
sua obra. Em diferentes tons <strong>de</strong><br />
preto, sobre papel, cada rosto<br />
numa folha à espera da empatia<br />
do espectador.<br />
Depois da representação<br />
do medo e dos rostos negros,<br />
o <strong>de</strong>sejo e a pornografia com<br />
“Porno as Collage (1993) e<br />
“Porno Blues” (1993), grupos<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>senhos feitos a partir<br />
fotografias <strong>de</strong> revistas<br />
pornográficas. O traço,<br />
levemente expressionista,<br />
compunha corpos anónimos<br />
em actos sexuais e que se<br />
aproximavam da abstracção.<br />
Nos anos seguintes, chegou o<br />
erotismo com “Group Show”<br />
(1994) ou “We Were All All in<br />
Love with Cyclopes (1997)”,<br />
obras inspiradas em fotografias<br />
<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los femininos.<br />
A vida pessoal acaba<br />
igualmente transportada<br />
para a pintura. Em “The First<br />
People I-V” – <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong><br />
foi mãe pouco antes iniciar este<br />
trabalho – e sobretudo em “The<br />
Eyes of Night Creatures”, uma<br />
série <strong>de</strong> 16 telas, on<strong>de</strong> reuniu<br />
imagens encontradas em<br />
revistas e polarói<strong>de</strong>s <strong>de</strong> amigos,<br />
familiares e conhecidos. São<br />
retratos <strong>de</strong> rostos, por <strong>de</strong>trás<br />
dos quais não há nada para<br />
ver: o palco pertence às faces,<br />
aos olhares, à pintura na sua<br />
dimensão mais “autoritária” e<br />
sensual. É o que acontece noutra<br />
série revelada no Museu <strong>de</strong><br />
Serralves: a das mulheres que<br />
choram, em “For Whom the Bell<br />
Tolls”, “Selfportrait at Noon”<br />
ou “Crying at Public”. Mais do<br />
que a realida<strong>de</strong> do sofrimento<br />
humano, a artista evoca a<br />
realida<strong>de</strong>, a dimensão física e<br />
interior da pintura. Com que o<br />
espectador se confronta.<br />
“Living on<br />
your Knees”<br />
(A vida <strong>de</strong><br />
joelhos), <strong>de</strong><br />
2010<br />
10 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
A pintura, a fotografia<br />
e o efeito Tuymans<br />
Embora próxima das motivações <strong>de</strong> outros artistas que<br />
utilizaram a fotografia enquanto material da pintura, como<br />
Luc Tuymans, <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> não dispensa o gestualismo e<br />
a dimensão física do acto <strong>de</strong> pintar.<br />
quotidiano sem produzir imagens anedóticas<br />
ou propaganda.<br />
Pensar as imagens<br />
com a pintura<br />
O gesto porém acarretou críticas, algumas<br />
dirigidas à técnica <strong>de</strong> <strong>Dumas</strong>.<br />
“Há pintores acham que sou uma má<br />
pintora. Dizem que a minha pintura<br />
não tem ‘pintura’ suficiente. Mas para<br />
mim tem sido um <strong>de</strong>safio fazê-la<br />
com meios mínimos. Talvez seja melhor<br />
<strong>de</strong>senhadora que pintora. Aliás,<br />
as minhas melhores pinturas são como<br />
<strong>de</strong>senhos. Estou mais próxima do<br />
Picasso do que do Matisse.”<br />
Outra crítica (injusta) tem a ver com<br />
a selecção das imagens fotográficas<br />
que antece<strong>de</strong> o trabalho sobre a tela.<br />
“Faço-a <strong>de</strong>s<strong>de</strong> jovem, sempre gostei<br />
<strong>de</strong> imagens. É um método e um gosto<br />
que partilhei com o Richard Prince e<br />
a Barbara Kruger e outros artistas da<br />
Pictures Generation. Mas, talvez por<br />
ter ficado na Europa, não <strong>de</strong>senvolvi<br />
a mesma atracção pela publicida<strong>de</strong> e<br />
o <strong>de</strong>sign que eles.”<br />
Data <strong>de</strong>ste período um certo afastamento<br />
<strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> <strong>de</strong> práticas<br />
e processos como a apropriação, a colagem<br />
e o uso do texto, que havia experimentado<br />
entre os anos 70 e 80 do<br />
século XX. “Quando fiz as primeiras<br />
pinturas <strong>de</strong> cabeças e rostos, em meados<br />
da década <strong>de</strong> 80, quis logo pôr o<br />
título por baixo da tela [risos]. Não sei<br />
o que teria acontecido se tivesse ido<br />
para Nova Iorque. Se calhar, tinha ficado<br />
parecida com a arte do John Bal<strong>de</strong>ssari<br />
ou da Barbara Kruger”. E isso<br />
seria mau? “Não sei, havia ali um formalismo<br />
<strong>de</strong>masiado frio e rígido,<br />
quando eu queria o calor, a emoção<br />
da pintura dos loucos ou do expressionismo-abstracto.<br />
Mas a reflexão<br />
sobre as imagens sempre me interessou<br />
e continua a interessar-me. Por<br />
exemplo, que tipo <strong>de</strong> imagem é hoje<br />
a do homem mais temido? O rosto do<br />
‘criminoso’? Aquele que tememos? É<br />
o muçulmano, como há sessenta anos<br />
era o negro. Quero fazer uma pintura<br />
tradicional, ‘parecida’ com a do século<br />
XIX, mas também quero pensar a<br />
forma como as imagens influenciam<br />
o nosso pensamento.”<br />
Tornemos à natureza-morta, género<br />
que durante décadas <strong>Dumas</strong> se<br />
recusou a pintar e que em “Contra o<br />
Muro” está representado em “Carida<strong>de</strong>”<br />
(2010), “As Vinhas da Ira”<br />
(2009) e “As Vinhas da Abundância”<br />
(2009). “Quando era estudante, <strong>de</strong>testava-o.<br />
Não significava nada para<br />
mim. Era uma coisa burguesa, ‘kitsch’,<br />
sem valor. Uma composição com<br />
a qual não conseguia lidar. Mais tar<strong>de</strong><br />
apercebi-me que não era minha inimiga.<br />
Lembro-me <strong>de</strong> ver, num catálogo,<br />
uma natureza-morta com três<br />
pedaços <strong>de</strong> salmão [“Tres rodajas <strong>de</strong><br />
salmón”]. Era uma pintura do Goya<br />
(1746 – 1828), muito simples, com todos<br />
os elementos formais do género,<br />
muito comovente. E percebi que era<br />
possível fazer naturezas-mortas com<br />
a mesma força e emoção”.<br />
Uma reconciliação, portanto?<br />
“Quando somos jovens artistas queremos<br />
fazer sempre coisas diferentes,<br />
novas, mas à medida que envelhecemos,<br />
se tivermos sorte, aquilo que procuramos,<br />
por vezes inconscientemente,<br />
surge <strong>de</strong> uma forma inesperada”.<br />
Assim, também se <strong>de</strong>itam abaixo<br />
(velhos) muros.<br />
Em cima,<br />
“Charity “<br />
(Carida<strong>de</strong>), <strong>de</strong><br />
2010, <strong>de</strong><br />
<strong>Marlene</strong><br />
<strong>Dumas</strong>; em<br />
baixo, “Tres<br />
rodajas <strong>de</strong><br />
salmón (1808-<br />
12), <strong>de</strong> Goya,<br />
que inspirou<br />
<strong>Dumas</strong> a<br />
trabalhar o<br />
tema da<br />
naturezamorta<br />
<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> não é a primeira<br />
artista a usar a fotografia como<br />
mo<strong>de</strong>lo ou alimento principal<br />
da pintura. No primeiro caso,<br />
existiram antes Van Gogh ou<br />
Degas, no segundo, Gerhard<br />
Richter. Também não está<br />
sozinha na resposta à apregoada<br />
dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> pintura em<br />
expressar as “verda<strong>de</strong>s” do<br />
seu tempo. Lembre-se (outra<br />
vez) Richter, mas também Luc<br />
Tuymans, Wilhelm Sasnal,<br />
Eberhard Havekost ou Peter<br />
Doig e, no contexto português,<br />
Bruno Pacheco, Diogo Pimentão<br />
e Carlos Correia.<br />
Será no entanto justo afirmar<br />
que, nessa <strong>de</strong>manda, a pintora<br />
encontrou o seu território. Como<br />
alguns dos nomes referidos,<br />
negou e aceitou a pintura, foi<br />
influenciada por Luc Tuymans<br />
e fez da imagem fotográfica<br />
(encontrada ou produzida<br />
originalmente) um campo <strong>de</strong><br />
experimentação que esten<strong>de</strong><br />
as possibilida<strong>de</strong>s formais<br />
e conceptuais da prática<br />
pictórica.<br />
Mas a sua assinatura<br />
dificilmente po<strong>de</strong> ser associada<br />
ao conjunto <strong>de</strong> artistas que<br />
Jordan Kantor agregou no artigo<br />
“O Efeito Tuymans”, publicado<br />
em 2004 na revista americana<br />
Artforum. Faltam à pintura <strong>de</strong><br />
<strong>Dumas</strong> alguns dos aspectos<br />
i<strong>de</strong>ntificados pelo crítico e<br />
ensaísta: as cores pálidas,<br />
o trabalho com as imagens<br />
em movimento da televisão<br />
e do cinema (e não apenas<br />
com os “stills” dos filmes) e,<br />
principalmente, falta á pintura<br />
<strong>de</strong> <strong>Dumas</strong> a indiferença violenta<br />
que caracteriza a obra do artista<br />
belga. Em comum, permanecem<br />
somente certos temas que<br />
remetem para a cultura e<br />
história europeias, embora<br />
sem a presença espectral das<br />
telas <strong>de</strong> Sasnal ou Tuymans. O<br />
que sobressai nesse encontro<br />
da pintora com a fotografia<br />
é antes um gestualismo que<br />
distorce e satura as formas – um<br />
trabalho físico diante da tela<br />
como se fosse uma dança – e<br />
uma atracção pela superfície<br />
plana da imagem fotográfica.<br />
Cores, expressão, sensualida<strong>de</strong>,<br />
empatia e excesso em vez <strong>de</strong><br />
uma impenetrabilida<strong>de</strong> suave e<br />
congelada.<br />
A propósito das relações<br />
entre a fotografia e pintura, a<br />
artista discorre: “Não digo que,<br />
usando a fotografia, a pintura<br />
inventa uma realida<strong>de</strong> superior<br />
à fotografia ou que torna a<br />
fotografia melhor. Eu limito-me<br />
a usar a fotografia, gosto da sua<br />
bidimensionalida<strong>de</strong>, do facto<br />
<strong>de</strong> ser plana. Não me interessa<br />
a tridimensionalida<strong>de</strong>”. E<br />
profetiza: “A pintura vai<br />
continuar como uma forma<br />
artística, como forma <strong>de</strong><br />
expressão visual. Será um pouco<br />
tradicional, quase primitiva,<br />
mas vai ficar entre nós. E vai<br />
continuar porque estamos<br />
cheios <strong>de</strong> ecrãs. Nas televisão,<br />
nos computadores. Estão em<br />
todo o lado”.<br />
Petrus &<br />
Paulus (1998),<br />
<strong>de</strong> Luc<br />
Tuymans<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 11
Livros<br />
Manuscritos<br />
da novela “A<br />
Curva <strong>de</strong> Uma<br />
Vida”, agora<br />
editado<br />
Eça <strong>de</strong> Queirós achava<br />
que se <strong>de</strong>viam pu-<br />
blicar <strong>de</strong> um homem<br />
célebre até as “contas<br />
do alfaiate”. Quem con-<br />
ta isto é o escritor Vergílio<br />
Ferreira num dos<br />
volumes do seu diário<br />
“Conta-Corrente”, a propósito<br />
<strong>de</strong> uma discussão que teve com<br />
a sua mulher, Regina Kasprzykowski,<br />
sobre se é lícito ou não publicar-se o<br />
que um autor rejeitou. Para Vergílio<br />
Ferreira, “um autor não dá garantias trabalhado, <strong>de</strong>ixado<br />
para a posterida<strong>de</strong>. Tive<br />
quase nenhumas (mormente quando<br />
gran<strong>de</strong> autor) sobre a valia do que realiza.<br />
E não há obra medíocre alguma <strong>de</strong> mexer em papéis <strong>de</strong> vários autores<br />
oportunida<strong>de</strong> na Biblioteca Nacional<br />
<strong>de</strong> um autor que lhe <strong>de</strong>strua a obra e nem todos têm essa consciência <strong>de</strong><br />
superior.”<br />
os <strong>de</strong>ixar arrumadinhos”, conta. Através<br />
do estudo do espólio a investiga-<br />
O escritor foi mais longe: “Saber<br />
como se errou, progrediu, hesitou — dora percebeu que Vergílio Ferreira<br />
tudo são modos <strong>de</strong> ampliar o conhecimento<br />
<strong>de</strong> um autor. De qualquer e, às vezes, até datava essas visitas.<br />
ia revisitando os seus papéis. “Mexia<br />
modo, se um artista não quer que se Às vezes chegamos lá pelos instrumentos<br />
utilizados, pelas canetas, pe-<br />
lhe conheça a obra, <strong>de</strong>strua-a ele”.<br />
Vergílio Ferreira não <strong>de</strong>struiu a sua e las tintas.”<br />
<strong>de</strong>ixou o acervo tão organizado que “Ele estava a preparar o espólio para<br />
o futuro. Tinha essa noção <strong>de</strong> que<br />
só po<strong>de</strong>ria estar a pensar no futuro.<br />
Dois inéditos do autor chegam agora<br />
às livrarias, editados pela Quetzal: um escritor fez para substanciar a<br />
era necessário conhecer tudo o que<br />
uma novela (“A Curva <strong>de</strong> Uma Vida”, apreciação que fazemos <strong>de</strong>le”, acrescenta<br />
Hel<strong>de</strong>r Godinho.<br />
1938) e um romance (“Promessa”, <strong>de</strong><br />
1947). Passados tantos anos <strong>de</strong>pois da<br />
publicação <strong>de</strong> “Cartas a Sandra”, o As hesitações do autor<br />
último romance do Prémio Camões Vergílio Ferreira morreu aos 80 anos,<br />
1992, já saíram do seu espólio “Escrever”<br />
(livro em que estava a trabalhar cadas, muitos dos seus títulos foram<br />
a 1 <strong>de</strong> Março <strong>de</strong> 1996. Nas últimas dé-<br />
quando morreu), um “Diário Inédito” <strong>de</strong>saparecendo das livrarias. “A publicação<br />
dos inéditos veio agitar as<br />
e estas duas obras. “Promessa”, que<br />
teve como primeiro título “Sequência”,<br />
é o único romance inédito com-<br />
adormecimento”, consi<strong>de</strong>ra o inves-<br />
águas e ter o efeito contrário a esse<br />
pleto que existe no espólio e a <strong>de</strong>cisão tigador. “Houve uma má gestão da<br />
<strong>de</strong> o trazer a público não foi fácil <strong>de</strong> edição e do catálogo. Há muitos livros<br />
tomar para a equipa <strong>de</strong> investigadores que se <strong>de</strong>ixaram esgotar”, lamenta.<br />
e professores que está a estudar, catalogar<br />
e anotar a sua obra.<br />
Em 1997, a família <strong>de</strong> Vergílio Ferreira<br />
doou o espólio do escritor à Biblioteca<br />
Nacional e, por sua sugestão,<br />
foi criada uma equipa para o estudar<br />
dirigida pelo académico Hel<strong>de</strong>r Godinho,<br />
seu aluno e amigo, que fez a<br />
tese sobre a sua obra.<br />
A investigadora Ana Isabel Turíbio,<br />
“Se um artista não<br />
que faz parte do grupo <strong>de</strong> estudo e<br />
inventariou o espólio, diz que este<br />
quer que se lhe<br />
estava organizado a pensar nos estudiosos<br />
futuros. “O espólio vinha muito<br />
organizado, com as abreviaturas<br />
conheça a obra,<br />
<strong>de</strong>senvolvidas, com alguns comentários<br />
para ele próprio (‘anotei outra<br />
<strong>de</strong>strua-a ele”,<br />
cópia e agora não sei on<strong>de</strong> está’; ‘críticos<br />
<strong>de</strong> lábia fácil não imaginam o<br />
escreveu Vergílio<br />
Ferreira<br />
esforço...’). Vê-se que é um espólio<br />
LUÍS RAMOS/ARQUIVO<br />
Vergílio Ferreira <strong>de</strong>ixou o seu<br />
acervo tão organizado que só<br />
po<strong>de</strong>ria estar a pensar no futuro<br />
Como Vergílio Ferreira<br />
preparou o fut<br />
Uma novela e um romance inéditos, que Vergílio Ferreira optou por não publicar em vida, saíram<br />
completa. A equipa <strong>de</strong> investigadores que está a trabalhar o seu espólio conta ao Ípsilon as razões<br />
12 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
NAMING SPONSOR PRESENTING SPONSOR OFFICIAL SPONSOR OFFICIAL CAR INSTITUTIONAL SPONSOR<br />
MEDIA PARTNERS PARTNERS<br />
Francisco José Viegas, editor da<br />
Quetzal, está a reeditar a obra completa<br />
e a publicar os inéditos encontrados<br />
no espólio. A reedição <strong>de</strong> “Na<br />
Tua Face” sai este mês, as reedições<br />
“Cartas a Sandra” e “Carta ao Futuro”<br />
estão previstas para Setembro. No<br />
próximo ano <strong>de</strong>verão publicar a edição<br />
crítica <strong>de</strong> “O Caminho Fica Longe”<br />
(por Ana Isabel Turíbio). Em preparação<br />
está a edição genética <strong>de</strong><br />
“On<strong>de</strong> Tudo Foi Morrendo”, bem como<br />
uma edição <strong>de</strong> “Sobre o humorismo<br />
<strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós” — no espólio<br />
existe uma segunda edição completamente<br />
preparada que <strong>de</strong>veria ter<br />
saído em 1945, mas que Vergílio Ferreira<br />
não chegou a publicar. Em negociação<br />
está um contrato com uma<br />
agente literária internacional que ficará<br />
com os direitos da obra para o<br />
mundo inteiro.<br />
Esta equipa que estuda o espólio,<br />
e que inclui ainda Fernanda Irene<br />
Fonseca e Cátia Barroso, assumiu a<br />
responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trazer a público<br />
o romance e a novela que o autor<br />
não publicou em vida por várias razões.<br />
Uma <strong>de</strong>las é o facto <strong>de</strong> Vergílio<br />
Ferreira ter emprestado há 30 anos<br />
o original dactiloscrito do romance<br />
“Promessa” (1947) a Hel<strong>de</strong>r Godinho<br />
quando ele estava fazer a sua tese.<br />
“Portanto, ele não rejeitava o livro”,<br />
afirma o académico. “Eu estava a<br />
fazer a tese <strong>de</strong> doutoramento e o<br />
Vergílio Ferreira disse-me que havia<br />
um romance que não tinha publicado<br />
mas que achava que eu <strong>de</strong>via ler.<br />
Li-o e percebi por que não o publicou.”<br />
Os investigadores têm consciência<br />
do “carácter datado” <strong>de</strong>ste romance<br />
escrito antes <strong>de</strong> “Mudança” (1949).<br />
“‘Promessa’ é um romance em que<br />
falta o equilíbrio do sentimento, a<br />
emoção poética na escrita que ‘Mudança’<br />
já tem. Mas é importante porque<br />
é o primeiro romance <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias,<br />
escrito na época em que o autor acabara<br />
<strong>de</strong> ler Hegel e Sartre. Escreveu a<br />
seguir ‘Mudança’, que na obra publicada<br />
passou a ser o primeiro romance<br />
<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias”, explica o investigador.<br />
“Promessa” mostra também que a<br />
ruptura <strong>de</strong> Vergílio Ferreira com a<br />
temática neo-realista foi anterior a<br />
“Mudança”.<br />
“A leitura <strong>de</strong> ‘Promessa’ po<strong>de</strong> ser<br />
difícil para o leitor comum. É um livro<br />
cheio <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias secamente expostas<br />
sem aquela dimensão poética com<br />
que ele vai <strong>de</strong>pois adoçar as i<strong>de</strong>ias”,<br />
afirma Hel<strong>de</strong>r Godinho. “Há muitos<br />
turo<br />
diálogos, mais do que ele fará posteriormente.<br />
‘Promessa’ é o momento<br />
<strong>de</strong> mudança <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> romance<br />
neo-realista para um romance <strong>de</strong><br />
i<strong>de</strong>ias. Vê-se que ele está à procura do<br />
estilo, no sentido forte do termo.”<br />
Em 1956, Vergílio Ferreira escreveu<br />
na página <strong>de</strong> rosto do dactiloscrito <strong>de</strong><br />
“Promessa”: “Releio trechos. O livro<br />
não é precisamente uma tolice. Está<br />
quase certo, embora à sua maneira.<br />
Com pequenas emendas…” Anos <strong>de</strong>pois,<br />
em 1980, contam os investigadores<br />
no prefácio do livro agora publicado,<br />
o escritor voltou a reler o<br />
romance e acrescentou um outro comentário:<br />
“Livro medíocre e precipitado.<br />
Talvez re-escrito possa aguentar-se.<br />
Ou talvez não muito ‘medíocre’,<br />
mas apenas ultrapassado. Se o<br />
tivesse publicado antes <strong>de</strong> ‘Mudança’,<br />
estaria certo, talvez.”<br />
Ao longo do tempo, Vergílio Ferreira<br />
vai mudando <strong>de</strong> opinião em relação<br />
aos seus livros. O escritor contou a<br />
Hel<strong>de</strong>r Godinho que quando publicou<br />
“Alegria Breve”, andou preocupado<br />
uns dias a pensar que se calhar o livro<br />
não prestava. “Este livro, que é talvez<br />
o maior <strong>de</strong> Vergílio Ferreira, foi publicado<br />
em francês na colecção Gallimard<br />
e penso que foi até Jean Bloch-<br />
Michel que disse que ao ler-se aquele<br />
livro via-se que um dos gran<strong>de</strong>s escritores<br />
europeus vivia em <strong>Lisboa</strong>. As<br />
hesitações <strong>de</strong>le, opinativas, não eram<br />
significativas”, afirma Godinho.<br />
O primeiro escrito<br />
Quando Ana Isabel Turíbio pegou no<br />
espólio <strong>de</strong> Vergílio Ferreira para o inventariar<br />
teve <strong>de</strong> dar várias voltas<br />
para organizar os papéis. Foi nessa<br />
altura que encontrou o manuscrito<br />
da novela “A Curva <strong>de</strong> Uma Vida”, que<br />
é o primeiro escrito <strong>de</strong> Vergílio Ferreira,<br />
e foi agora publicada.<br />
“É difícil pegar nos papéis porque<br />
temos a presença do autor, física, ainda<br />
muito próxima. À medida que o<br />
tempo vai passando conseguimos<br />
criar distância e espaço para reflectir,<br />
e já sem emoção trabalhar com os<br />
critérios que a Biblioteca Nacional<br />
utiliza”, explica a investigadora, que<br />
fez a edição genética e crítica da novela<br />
com Cátia Barroso, bolseira no<br />
Centro <strong>de</strong> Estudos do Imaginário Literário,<br />
e que se tornou “uma ilustre<br />
vergiliana aos 22 anos”.<br />
As especialistas consi<strong>de</strong>ram que em<br />
“A Curva <strong>de</strong> Uma Vida” se encontra<br />
muito do que irá ser a maneira como<br />
Vergílio escreverá no futuro. Estão lá<br />
na Quetzal, que está a reeditar a obra<br />
da <strong>de</strong>cisão. Isabel Coutinho<br />
Alguns dos investigadores que<br />
estão a trabalhar no espólio <strong>de</strong><br />
Vergilio Ferreira: Ana Isabel<br />
Turíbio, Hel<strong>de</strong>r Godinho e Cátia<br />
Barroso<br />
Em 1956, Vergílio<br />
escreveu sobre<br />
“Promessa”: “O livro<br />
está quase certo.”<br />
E, em 1980, quando o<br />
releu: “Livro medíocre<br />
e precipitado”<br />
apresenta<br />
ANTÓNIO PINHO VARGAS LAURENT FILIPE GROOVE4TET<br />
PQ.MARECHAL CARMONA CASCAIS<br />
NOITE DE JAZZ<br />
EM PORTUGUÊS<br />
17JUL<br />
HIPÓDROMO CASCAIS<br />
MARIA BETHÂNIA<br />
CELSO FONSECA<br />
22JUL<br />
CASCAIS HIPÓDROMO 13JUL NORAH JONES<br />
25JUL DIANA KRALL PQ.MARECHAL CARMONA<br />
24JUL CORINNE BAILEY RAE 28JUL ELVIS COSTELLO & THE<br />
SUGARCANES 29JUL SOLOMON BURKE Special Guest JOSS<br />
STONE MAFRA JARDIM DO CERCO 23JUL ORQUESTRA<br />
BUENA VISTA SOCIAL CLUB® Feat. OMARA PORTUONDO<br />
Bilhetes à venda na Ticketline (www.ticketline.pt) e locais habituais<br />
MIGUEL MANSO<br />
JARDIM CERCO MAFRA<br />
DEOLINDA<br />
20JUL<br />
temas como a morte, a partida, a relação<br />
com os pais. “Vergílio Ferreira<br />
integrou na novela outros tipos <strong>de</strong><br />
registo: o diarístico, o epistolar e o<br />
lírico, que serão géneros que o vão<br />
acompanhando <strong>de</strong>pois em outras<br />
obras”, explica Ana Isabel para quem<br />
a publicação <strong>de</strong>sta novela se justifica<br />
em função da obra que veio <strong>de</strong>pois.<br />
“Isto era publicável quando ele tinha<br />
22 anos, hoje é publicável como documento<br />
histórico”, acrescenta Hel<strong>de</strong>r<br />
Godinho. “E como prova <strong>de</strong> coerência,<br />
já aqui se encontra muito daquilo<br />
que foi a sua obra”, nota Ana<br />
Isabel.<br />
No espólio encontra-se correspondência<br />
que ainda não foi publicada.<br />
“Nem será”, dizem os investigadores.<br />
É muito privada, faz referências pessoais<br />
e envolve pessoas vivas. Gran<strong>de</strong><br />
parte da correspondência é trocada<br />
com Eduardo Lourenço (que Vergílio<br />
consi<strong>de</strong>rava ser o seu melhor amigo),<br />
Jorge <strong>de</strong> Sena, Mário Dionísio, André<br />
Malraux, com brasileiros que fizeram<br />
teses sobre a sua obra, com o pintor<br />
Júlio Resen<strong>de</strong>, etc.<br />
No espólio também estão as fotografias<br />
que Vergílio Ferreira usava na<br />
construção dos seus romances.<br />
“É muito interessante visitar o ‘dossier’<br />
genético <strong>de</strong> ‘Para Sempre’ e <strong>de</strong><br />
outros romances. Vê-se que ele tirava<br />
fotografias às ruas para <strong>de</strong>pois as <strong>de</strong>screver”,<br />
conta Hel<strong>de</strong>r Godinho. Vergílio<br />
fotografou “a zona do Saldanha,<br />
da Casal Ribeiro [<strong>Lisboa</strong>], e para a<br />
<strong>de</strong>screver com rigor” na obra “Em<br />
Nome da Terra”. “Em ‘Rápida, a Sombra’<br />
usou uma fotografia <strong>de</strong> um calendário<br />
com uma rapariga com uma<br />
camisola transparente para <strong>de</strong>screver<br />
a situação em que a personagem sai<br />
das águas como uma Vénus.”<br />
Depois <strong>de</strong> reunir essa documentação,<br />
conta Ana Isabel Turíbio, Vergílio<br />
perguntava “Para quê, se tudo o<br />
mais está na imaginação?”. Mas logo<br />
a seguir explicava que era para não<br />
cometer “gaffes”.<br />
Ver crítica <strong>de</strong> livros pág. 46 e segs.<br />
PQ.MARECHAL CARMONA CASCAIS<br />
CLUB DES BELUGAS<br />
Orchestra<br />
27JUL<br />
www.cooljazzfest.com<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 13
Dave Eggers, Nova<br />
e o empreiteiro Z<br />
Um dos meninos <strong>de</strong> ouro da nova literatura americana pôs mais uma vez o seu talento (enorme) ao s<br />
resultado, inquietante, é uma narrativa não-ficcional que se lê com a avi<strong>de</strong>z <strong>de</strong> um romance. Sobre os me c<br />
ROBERT GALBRAIT/REUTERS<br />
Livros<br />
Em 2005 Nova Orleães<br />
transformou-se num cenário<br />
pós-apocalíptico<br />
Em 2004, o escritor norte-americano<br />
Dave Eggers (n. 1970) – fundador da<br />
editora McSweeney’s, autor <strong>de</strong> livros<br />
que já foram finalistas do Pulitzer<br />
Prize e do National Book Critics Circle<br />
Award, e nesse ano consi<strong>de</strong>rado pela<br />
“Time” uma das 100 pessoas mais<br />
influentes no mundo – <strong>de</strong>u algumas<br />
aulas no curso <strong>de</strong> jornalismo da Universida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> Berkeley (Califórnia).<br />
Foi nessa altura que, com a professora<br />
e activista dos direitos humanos<br />
Lola Vollen, criou a colecção <strong>de</strong> livros<br />
“Voice of Witness” que se propunha<br />
recorrer à história oral, narrada na<br />
primeira pessoa, para ilustrar crises<br />
<strong>de</strong> direitos humanos um pouco por<br />
todo o mundo. O primeiro volume<br />
da série coligiu testemunhos <strong>de</strong> norte-americanos<br />
que tinham sido vítimas<br />
<strong>de</strong> erros judiciais, a que se seguiu<br />
outro <strong>de</strong>dicado a refugiados<br />
sudaneses. No final <strong>de</strong> 2005 surgiu<br />
“Voices from <strong>de</strong> Storm” (Vozes da<br />
Tempesta<strong>de</strong>), que recolhia dúzias <strong>de</strong><br />
narrativas <strong>de</strong> habitantes <strong>de</strong> Nova Orleães<br />
acerca das suas vidas antes,<br />
durante e após o furacão Katrina;<br />
entre essas vidas encontravam-se as<br />
<strong>de</strong> Abdulrahman e Kathy Zeitoun, um<br />
casal muçulmano – ele americano <strong>de</strong><br />
origem síria, ela americana do Louisiana<br />
convertida ao islamismo ainda<br />
antes <strong>de</strong> ter conhecido o marido –<br />
pais <strong>de</strong> quatro crianças e donos <strong>de</strong><br />
uma bem sucedida empresa <strong>de</strong> construção<br />
civil, a Zeitoun A. Pinturas e<br />
Empreitadas Lda.<br />
Já no pós-livro, a história do pesa<strong>de</strong>lo<br />
“kafkiano” vivido por esta família<br />
não saía da cabeça <strong>de</strong> Eggers, e na<br />
primeira oportunida<strong>de</strong> o escritor visitou<br />
os Zeitoun em Nova Orleães. Era<br />
para ele evi<strong>de</strong>nte que havia ali muito<br />
mais do que aquilo que fora incluído<br />
em “Voices from <strong>de</strong> Storm”, e por<br />
isso <strong>de</strong>u início a um processo <strong>de</strong> entrevistas<br />
e <strong>de</strong> investigações, em Nova<br />
Orleães e na Síria, que durou três<br />
anos. Passado esse período, Dave Eggers<br />
escreveu “Zeitoun”, publicado<br />
originalmente em 2009 (a tradução<br />
portuguesa acaba <strong>de</strong> sair), uma surpreen<strong>de</strong>nte<br />
obra não-ficcional em<br />
DARRON CUMMINGS<br />
“De certa maneira,<br />
era um mundo novo,<br />
sem mapa. Ele<br />
[Abdulrahman] podia<br />
ser um explorador.<br />
Podia ver tudo<br />
em primeira-mão”<br />
Alguns dos habitantes que não<br />
abandonaram a cida<strong>de</strong><br />
ajudaram nos trabalhos <strong>de</strong><br />
limpeza<br />
que todos os factos, segundo o autor,<br />
“foram confirmados por fontes in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes,<br />
bem como nos registos<br />
históricos”. O dinheiro obtido com<br />
os direitos <strong>de</strong>ste livro reverte a favor<br />
da Fundação Zeitoun – entretanto<br />
criada pela família, por Dave Eggers<br />
e pela editora McSweeney’s – cujo<br />
objectivo é contribuir para a reconstrução<br />
<strong>de</strong> Nova Orleães e promover<br />
o respeito pelos direitos humanos nos<br />
EUA e no mundo.<br />
Debaixo do furacão<br />
Do principio: a 27 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 2005<br />
o Centro Nacional <strong>de</strong> furacões avisa<br />
que o Katrina po<strong>de</strong>rá atingir a categoria<br />
5 quando chegar a terra e que<br />
se dirige em direcção a Nova Orleães.<br />
Kathy Zeitoun <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> sair da cida<strong>de</strong><br />
com os quatro filhos e alojar-se em<br />
casa <strong>de</strong> familiares. O marido teima<br />
em ficar. Quer olhar pela casa e pelas<br />
outras proprieda<strong>de</strong>s, alguns prédios<br />
com inquilinos. Um dia <strong>de</strong>pois chega<br />
o furacão. Durante a madrugada Zeitoun<br />
consegue ir remendando as brechas<br />
que se abrem na casa. A água<br />
escoa-se das ruas. Mas um dia <strong>de</strong>pois<br />
rompem-se os diques da cida<strong>de</strong> e o<br />
nível da água atinge os quatro metros.<br />
Ele mudara entretanto alguns dos<br />
seus pertences do andar <strong>de</strong> baixo para<br />
o <strong>de</strong> cima, e lembra-se que há alguns<br />
anos comprara em segunda mão<br />
uma canoa <strong>de</strong> cinco metros, feita <strong>de</strong><br />
alumínio, que quase nunca utilizara.<br />
Foi buscá-la à garagem. “Imaginou-se<br />
a flutuar, sozinho, pelas ruas da cida<strong>de</strong>.<br />
De certa maneira era um novo<br />
mundo, sem mapa. Ele podia ser um<br />
explorador. Podia ver tudo em primeira-mão.”<br />
Abdulrahman aventura-se naque-<br />
RICK WILKIN/REUTERS<br />
14 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
a Orleães<br />
Zeitoun<br />
música<br />
serviço <strong>de</strong> uma causa, a dos direitos humanos no seu país. O<br />
e canismos “kafkianos” da justiça americana. José Riço Direitinho<br />
A zona <strong>de</strong> Treme, sob vários<br />
metros <strong>de</strong> água, a 29 <strong>de</strong> Agosto<br />
<strong>de</strong> 2005<br />
le cenário pós-apocalíptico. Começa<br />
a navegar e a salvar pessoas. A primeira<br />
foi uma mulher que estava<br />
<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> casa, a flutuar perto do<br />
tecto, agarrada ao topo <strong>de</strong> uma estante<br />
havia um dia. “O vestido axadrezado<br />
<strong>de</strong>la estava espalhado sobre<br />
a superfície da água como uma gran<strong>de</strong><br />
flor flutuante.”<br />
Sem nunca per<strong>de</strong>r o rigor da forma<br />
do relato verídico, Eggers não <strong>de</strong>ixa<br />
<strong>de</strong> usar o seu talento <strong>de</strong> romancista<br />
nas <strong>de</strong>scrições que faz, como a da<br />
citação anterior. Toda a história, apesar<br />
<strong>de</strong> seguir uma or<strong>de</strong>m cronológica<br />
com enumeração das datas, está repleta<br />
<strong>de</strong> analepses, <strong>de</strong> lembranças<br />
da infância e da juventu<strong>de</strong> <strong>de</strong> ambos,<br />
<strong>de</strong> pormenores laterais que fazem<br />
<strong>de</strong>sta gran<strong>de</strong> narrativa não-ficcional<br />
um romance (no sentido mais lato da<br />
palavra).<br />
Eggers sabe como pren<strong>de</strong>r o leitor,<br />
adiando <strong>de</strong>sfechos ou tornando-os<br />
imprevisíveis. É assim que a meio do<br />
livro, e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> vários salvamentos<br />
e encontros com outros homens que<br />
se recusaram a abandonar a cida<strong>de</strong>,<br />
assistimos à prisão <strong>de</strong> Zeitoun, e <strong>de</strong><br />
outros três homens, e ao seu transporte<br />
para um estranho campo militar<br />
montado no Terminal <strong>de</strong> Passageiros<br />
<strong>de</strong> Nova Orleães. “(…) Detido<br />
à boca das armas numa casa que era<br />
sua, trazido para uma base militar <strong>de</strong><br />
campanha montada <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma<br />
estação <strong>de</strong> carros, acusado <strong>de</strong> terrorismo<br />
e fechado numa jaula ao ar livre.”<br />
Só muitas páginas adiante se lêem<br />
as palavras “al-Qaeda” e “talibãs” e<br />
nos apercebemos <strong>de</strong> que no campo<br />
os guardas utilizam gás pimenta contra<br />
os prisioneiros mais mal-comportados<br />
(mais tar<strong>de</strong> balas <strong>de</strong> borracha);<br />
também a <strong>de</strong>scrição do lugar não <strong>de</strong>ixa<br />
prever nada <strong>de</strong> bom. “Já antes vira<br />
estruturas semelhantes àquela, nas<br />
proprieda<strong>de</strong>s dos seus clientes que<br />
criavam cães. Esta gaiola, tal como<br />
essas outras, era um recinto vedado<br />
e dividido em recintos mais pequenos.<br />
Parecia um canil gigante, e no<br />
entanto tinha um aspecto ainda mais<br />
familiar que isso. Parecia-se mais precisamente<br />
com as imagens que ele já<br />
vira da baía <strong>de</strong> Guantánamo.”<br />
Depois <strong>de</strong> alguns dias neste campo,<br />
Zeitoun é levado para uma prisão <strong>de</strong><br />
alta segurança. Depois da <strong>de</strong>tenção<br />
não foi autorizado a fazer um único<br />
telefonema, nem à mulher nem a um<br />
advogado.<br />
Eggers tem o cuidado <strong>de</strong> mencionar<br />
que este relato reflecte a visão<br />
dos eventos por parte da família Zeitoun,<br />
o que não torna este livro excepcional<br />
menos inquietante. O autor<br />
chegou a entrevistar os polícias que<br />
pren<strong>de</strong>ram os quatro homens.<br />
Filantropia do autor<br />
Mas esta história “kafkiana” do empreiteiro<br />
Zeitoun, não é a primeira<br />
que apela ao lado filantrópico <strong>de</strong> Dave<br />
Eggers – autor do recente “O Sítio<br />
das Coisas Selvagens” (Quetzal, 2010).<br />
Já em 2002, e por achar que a escola<br />
não promove <strong>de</strong>vidamente o acto da<br />
escrita, ajudou a criar em São Francisco<br />
uma organização sem fins lucrativos,<br />
a 826 Valencia, que se <strong>de</strong>stina<br />
a ensinar crianças e jovens entre<br />
os seis e os <strong>de</strong>zoito anos a escrever<br />
ficção, uma espécie <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> escrita<br />
criativa para os mais novos. (Recentemente<br />
doou para esta organização<br />
cerca <strong>de</strong> 250 mil dólares.) O<br />
que nasceu em São Francisco como<br />
um projecto local esten<strong>de</strong>u-se em<br />
poucos anos a outras cida<strong>de</strong>s como<br />
Los Angeles, Nova Iorque, Seattle,<br />
Chicago e Boston. Ainda nesta área<br />
da promoção da escrita e da leitura,<br />
e também <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2002, Dave Eggers<br />
é o editor <strong>de</strong> uma antologia anual<br />
(uma das mais vendidas nos EUA) intitulada<br />
“The Best American Nonrequired<br />
Readings”, que publica os<br />
melhores trabalhos <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong><br />
alunos do ensino secundário que periodicamente<br />
se reúne com ele nos<br />
escritórios da McSweeney’s para ler<br />
e <strong>de</strong>bater textos.<br />
Esta costela filantrópica <strong>de</strong> Eggers,<br />
que parece querer fazer carreira como<br />
“escritor com causas”, tem ainda<br />
uma forte expressão literária: um dia,<br />
conheceu Valentino Achak Deng, um<br />
refugiado sudanês, e durante meses<br />
conversou com ele (à semelhança do<br />
que viria a fazer com os Zeitoun), ouviu<br />
as suas muitas histórias <strong>de</strong> menino<br />
perdido na guerra civil do Sudão, nos<br />
vários campos <strong>de</strong> refugiados por on<strong>de</strong><br />
passou, como chegou aos Estados<br />
Unidos e como foi a sua difícil adaptação<br />
a um mundo que <strong>de</strong>sconhecia.<br />
Depois pôs mãos à obra e com a sua<br />
talentosa criativida<strong>de</strong> escreveu um<br />
romance brilhante, “What Is the<br />
What” (“O Que É o Quê”, Casa das<br />
Letras, 2009), uma autobiografia ficcionada<br />
que se tornou num “bestseller”<br />
e que foi finalista do “National<br />
Book Critics Circle Award”. O dinheiro<br />
obtido com os direitos do livro<br />
entregou-o a Achak Deng, que criou<br />
uma fundação que se propõe construir<br />
escolas secundárias no sul do<br />
Sudão; a primeira foi inaugurada em<br />
Maio do ano passado.<br />
Para breve está anunciado um volume<br />
do “Voice Witness” <strong>de</strong>dicado a<br />
vítimas do regime do Zimbabué. Que<br />
mais se seguirá?<br />
Hanne Hukkelberg<br />
Blood from a stone<br />
14 Julho 22h00 M/6<br />
palestra-performance<br />
Jeremy Xido<br />
Cabula6<br />
The Angola Project<br />
16 Julho 21h30 M/12<br />
Em inglês, sem legendagem<br />
www.teatromariamatos.pt<br />
© Carina Musk-An<strong>de</strong>rsen<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 15
Há uma piada eclesiástica que diz que<br />
nem o Espírito Santo sabe quantas<br />
or<strong>de</strong>ns e congregações femininas<br />
existem na Igreja. A partir <strong>de</strong> agora,<br />
esse problema está resolvido, pelo<br />
menos no que a Portugal se refere. A<br />
Gradiva acaba <strong>de</strong> publicar o “Dicionário<br />
Histórico das Or<strong>de</strong>ns e Instituições<br />
Afins em Portugal”, realizado<br />
por uma equipa <strong>de</strong> 136 autores, coor<strong>de</strong>nados<br />
pelo Centro <strong>de</strong> Literaturas e<br />
Culturas Lusófonas e Europeias e pelo<br />
Centro <strong>de</strong> História da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Letras <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>.<br />
Dirigido por José Eduardo Franco,<br />
José Augusto Mourão e Ana Cristina<br />
da Costa Gomes, o dicionário inclui<br />
376 entradas, divididas em sete capítulos:<br />
or<strong>de</strong>ns cristãs (o maior, com<br />
240, incluindo uma or<strong>de</strong>m protestante/evangélica);<br />
hindus e budistas (duas);<br />
esotéricas (11); maçónicas (77);<br />
templárias, neotemplárias e míticas<br />
(13); honoríficas e civis (21); e profissionais<br />
(12). No total, são mil páginas,<br />
incluindo introduções a cada capítulo,<br />
índices antroponímicos, bibliografias<br />
específicas e uma profusão <strong>de</strong><br />
ilustrações.<br />
Ficamos, assim, a saber tudo sobre<br />
a história, dados, objectivos e regras<br />
<strong>de</strong> instituições tão diferentes quanto<br />
os jesuítas ou franciscanos, a Or<strong>de</strong>m<br />
dos Advogados ou a Or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> Malta,<br />
a Ogyen Kunzang budista ou a Or<strong>de</strong>m<br />
dos Pastores Baptistas, a Or<strong>de</strong>m dos<br />
Trovadores ou a Fe<strong>de</strong>ração Maçónica<br />
Portuguesa, a Or<strong>de</strong>m Templária <strong>de</strong><br />
Portugal, a Or<strong>de</strong>m Hebraica ou a Or<strong>de</strong>m<br />
do Infante Dom Henrique.<br />
O pioneirismo e novida<strong>de</strong> do projecto<br />
traduziram-se já no seu acolhimento<br />
positivo pela comunida<strong>de</strong> científica.<br />
De tal modo que a sua concretização<br />
DANIEL ROCHA<br />
RUI GAUDÊNCIO<br />
Em cima: monjas carmelitas do<br />
Mosteiro <strong>de</strong> Ban<strong>de</strong>. Em baixo:<br />
os fra<strong>de</strong>s da Or<strong>de</strong>m dos<br />
Cartuxos em Évora<br />
em Portugal levou investigadores <strong>de</strong><br />
outros países a iniciar ou programar<br />
iniciativas semelhantes. É o caso <strong>de</strong><br />
Espanha, França, Angola, Moçambique<br />
e Brasil (on<strong>de</strong> o projecto tem já cerca<br />
<strong>de</strong> mil entradas).<br />
Em ano <strong>de</strong> centenário da República,<br />
po<strong>de</strong> pensar-se que o Dicionário<br />
aparece também como forma <strong>de</strong> celebrar<br />
a efeméri<strong>de</strong>. Sim e não: os organizadores<br />
assinalam apenas a “feliz<br />
coincidência”. Iniciado em 2000, o<br />
projecto foi pensado para estar concluído<br />
cinco anos <strong>de</strong>pois, mas alguns<br />
atrasos acabaram por ditar a <strong>de</strong>cisão<br />
<strong>de</strong> o publicar em 2010.<br />
Feliz coincidência, já que o dicionário<br />
reflecte agora a evolução plural<br />
da socieda<strong>de</strong> portuguesa neste último<br />
século. Há 100 anos, um projecto <strong>de</strong>stes<br />
seria impensável: já com a República<br />
instaurada, membros <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns<br />
maçónicas protagonizaram perseguições<br />
e humilhações <strong>de</strong> membros <strong>de</strong><br />
or<strong>de</strong>ns religiosas — é conhecida a foto<br />
dos republicanos a “medir” o cérebro<br />
<strong>de</strong> padres jesuítas. Hoje, realida<strong>de</strong>s<br />
como essa seriam inconcebíveis e intoleráveis.<br />
Diferentes grupos e sectores que<br />
estiveram em conflito estão, agora,<br />
juntos num mesmo volume. O que<br />
remete para o que os coor<strong>de</strong>nadores<br />
caracterizam como “ecumenismo<br />
cultural” e aprofundamento da <strong>de</strong>mocracia<br />
“também no plano cultural<br />
e científico”.<br />
Na introdução geral, escrevem a<br />
propósito os responsáveis do dicionário:<br />
“Alguns perguntarão pelas razões<br />
que presi<strong>de</strong>m à integração numa<br />
mesma obra <strong>de</strong> instituições aparentemente<br />
tão diversas como as or<strong>de</strong>ns<br />
religiosas católicas e as or<strong>de</strong>ns maçónicas.<br />
Tanto mais que, nomeadamente<br />
estes dois tipos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns, viveram,<br />
num <strong>de</strong>terminado período do curso<br />
da sua história, experiências fracturantes<br />
<strong>de</strong> hostilida<strong>de</strong> grave e estiveram<br />
<strong>de</strong> costas voltadas umas para as<br />
outras, digladiando-se em polémicas<br />
<strong>de</strong> carácter i<strong>de</strong>ológico, disputando<br />
espaços <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, particularmente<br />
ao longo do séc. XIX e primeiras décadas<br />
do séc. XX, período em que a<br />
questão religiosa subiu ao rubro!”<br />
O que une, então, esta tão gran<strong>de</strong><br />
diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instituições? Des<strong>de</strong><br />
logo, o nome (or<strong>de</strong>m, congregação,<br />
associação em alguns casos) e os aspectos<br />
formais que as constituem<br />
(uma regra, uma constituição ou um<br />
estatuto).<br />
Num estudo publicado há quatro<br />
anos na revista “Brotéria”, em que se<br />
apresentava o projecto, José Augusto<br />
Mourão falava da noção <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m no<br />
discurso e no sentido <strong>de</strong> pertença às<br />
instituições religiosas: “A noção <strong>de</strong><br />
or<strong>de</strong>m evoca <strong>de</strong> imediato a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
relação entre um antes (‘prius’) e um<br />
<strong>de</strong>pois (‘posterius’), as partes e o todo.<br />
Em matemática como em tudo.<br />
Os valores trazem a ganga da história<br />
que os <strong>de</strong>u à luz. (…) A noção <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />
apela à noção <strong>de</strong> tempo, <strong>de</strong> espaço,<br />
<strong>de</strong> normativo, <strong>de</strong> comum, <strong>de</strong><br />
conexão.”<br />
Para além <strong>de</strong>sses aspectos, há ainda,<br />
no universo <strong>de</strong>stas organizações,<br />
uma dimensão ritual, iniciática e integradora<br />
comuns a todas elas. O tempo,<br />
aliás, é uma nota dominante no<br />
universo das or<strong>de</strong>ns religiosas — das<br />
quais serão reproduzidos outros mo<strong>de</strong>los,<br />
como adiante se verá: é o tempo<br />
que organiza a vida <strong>de</strong>ssas comunida<strong>de</strong>s,<br />
à volta <strong>de</strong> momentos rituais<br />
como a oração, a refeição ou a liturgia.<br />
Um tempo que se impregna <strong>de</strong><br />
quotidiano, mas que está para além<br />
<strong>de</strong>le. Um tempo vivido sem pressas,<br />
na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> harmonizar circunstância<br />
e intemporalida<strong>de</strong>, conjuntura e eternida<strong>de</strong>.<br />
Um mundo que mudou<br />
Não é por acaso que predominam no<br />
dicionário as or<strong>de</strong>ns religiosas católicas.<br />
O i<strong>de</strong>ário que organiza estas instituições,<br />
nota José Eduardo Franco<br />
em conversa com o Ípsilon, bem co-<br />
RUI GAUDÊNCIO<br />
Um dicionário<br />
que vem<br />
pôr or<strong>de</strong>m nas<br />
or<strong>de</strong>ns<br />
Or<strong>de</strong>ns religiosas junto <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns<br />
maçónicas e esotéricas, or<strong>de</strong>ns<br />
profissionais e militares. Um<br />
dicionário inédito acaba <strong>de</strong> ser<br />
publicado em Portugal, recenseando<br />
todas as or<strong>de</strong>ns e instituições afins.<br />
O projecto será imitado em vários<br />
países. António Marujo<br />
16 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
mo as etapas do processo <strong>de</strong> integração,<br />
apresentam processos semelhantes<br />
entre diferentes tipos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns.<br />
Aos votos religiosos correspon<strong>de</strong>m,<br />
por exemplo, os graus maçónicos ou<br />
os diferentes processos <strong>de</strong> integração<br />
profissional.<br />
“São processos <strong>de</strong>calcados da experiência<br />
monástica, mais evi<strong>de</strong>ntes<br />
no caso da maçonaria”, diz o investigador.<br />
No caso das or<strong>de</strong>ns civis ou<br />
honoríficas, é o tipo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ário que as<br />
organiza — seja regra, constituição ou<br />
estatuto — que se assemelha ao das<br />
or<strong>de</strong>ns religiosas. “O religioso continua<br />
a mo<strong>de</strong>lar muitas experiências<br />
sociais contemporâneas”, diz José<br />
Eduardo Franco. Mas esta diversida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> instituições evi<strong>de</strong>ncia também<br />
um mundo que mudou: <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong><br />
“unificada pelo religioso”<br />
para uma era <strong>de</strong> secularização e <strong>de</strong><br />
autonomização da vida social em relação<br />
ao sagrado.<br />
Apesar <strong>de</strong>ssa evolução, percebe-se<br />
a relação <strong>de</strong> diálogo ou tensão em que<br />
estas instituições se foram estabelecendo<br />
com o restante corpo social.<br />
Bastará, aliás, folhear a obra num primeiro<br />
olhar para se perceber essa<br />
relação na diversida<strong>de</strong> dos factores:<br />
a influência na arquitectura ou nas<br />
artes, os fundos patrimoniais, a acção<br />
social ou caritativa, a participação em<br />
<strong>de</strong>bates culturais ou políticos da socieda<strong>de</strong><br />
portuguesa…<br />
Deslizes e excessos<br />
O rigor factual, histórico e documental<br />
das entradas é apreciável. Mas há pequenos<br />
<strong>de</strong>slizes <strong>de</strong> linguagem que <strong>de</strong>veriam<br />
ter sido evitados: a utilização<br />
<strong>de</strong> expressões como “Santo Padre”<br />
(mais própria do interior do catolicismo)<br />
em vez <strong>de</strong> Papa, por exemplo (p.<br />
662); ou a adjectivação por vezes utilizada,<br />
sobretudo quando se fala da actualida<strong>de</strong><br />
e não existe ainda suficiente<br />
distância histórica (“gran<strong>de</strong> figura <strong>de</strong><br />
referência espiritual”, p. 644).<br />
Aliás, no que respeita aos mais recentes<br />
movimentos católicos, a controvérsia<br />
que essas instituições ainda hoje<br />
levantam é quase omitida. É o exemplo<br />
da entrada sobre a Comunhão e<br />
Libertação, grupo nascido nos meios<br />
universitários italianos, que se i<strong>de</strong>ntifica,<br />
entre outras coisas, pelo anúncio<br />
militante do cristianismo, pela afirmação<br />
da unida<strong>de</strong> em torno do Papa e<br />
pela a<strong>de</strong>são à moral tradicional veiculada<br />
pela hierarquia católica.<br />
Noutro caso como a Opus Dei, apenas<br />
se apresentam as críticas genéricas<br />
que se fazem à instituição e os<br />
argumentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa que esta costuma<br />
utilizar: o secretismo confundido<br />
com o recato, o conservadorismo<br />
e as elites contra o trabalho em “todos<br />
os meios sociais”, o po<strong>de</strong>r económico<br />
versus “os orçamentos muito mo<strong>de</strong>stos”<br />
<strong>de</strong> parte dos membros, as críticas<br />
a “O Código Da Vinci” que “erradamente<br />
fantasia e colabora” para a<br />
“lenda negra” da Opus Dei… Mas tudo<br />
isto é enumerado sem qualquer aprofundamento<br />
<strong>de</strong> dados que sustentem<br />
os argumentos evocados.<br />
Se a distância é mais difícil em relação<br />
a aspectos actuais, a adjectivação<br />
ou a formulação genérica sem os<br />
factos que a fundamentem <strong>de</strong>veriam<br />
ter sido evitadas.<br />
Estes movimentos e associações<br />
contemporâneas são aqui apresentados<br />
também com razões que se justificam<br />
na respectiva introdução — e<br />
que se aceitam. Elas “são her<strong>de</strong>iras,<br />
Diferentes grupos e<br />
sectores que<br />
estiveram em conflito<br />
estão, agora, juntos<br />
num mesmo volume.<br />
Esta diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
instituições evi<strong>de</strong>ncia<br />
um mundo que<br />
mudou: <strong>de</strong> uma<br />
socieda<strong>de</strong> “unificada<br />
pelo religioso” para<br />
uma era <strong>de</strong><br />
autonomização da<br />
vida social em relação<br />
ao sagrado<br />
ou comungam, <strong>de</strong> elementos representativos,<br />
colhidos na milenar experiência<br />
ascética e institucional do<br />
monaquismo católico”.<br />
Se há excessos em alguns casos,<br />
noutros, como na entrada respeitante<br />
ao Gran<strong>de</strong> Oriente Lusitano, pecase<br />
por <strong>de</strong>feito, ficando-se com a sensação<br />
<strong>de</strong> que muito ficou por dizer.<br />
Com tudo o que já há publicado sobre<br />
a instituição e a sua história, a entrada<br />
respectiva <strong>de</strong>veria ser mais completa.<br />
Durante este ano serão ainda publicados<br />
os primeiros <strong>de</strong> oito dicionários<br />
reunindo os diferentes temas:<br />
or<strong>de</strong>ns católicas; or<strong>de</strong>ns <strong>de</strong> inspiração<br />
franciscana; or<strong>de</strong>ns maçónicas;<br />
or<strong>de</strong>ns honoríficas; or<strong>de</strong>ns profissionais;<br />
or<strong>de</strong>ns hindus e budistas; or<strong>de</strong>ns<br />
esotéricas; or<strong>de</strong>ns templárias.<br />
Cada um <strong>de</strong>stes volumes a publicar<br />
em separado terá entradas mais <strong>de</strong>senvolvidas<br />
em relação à versão original.<br />
A Aletheia acaba <strong>de</strong> publicar<br />
também um volume <strong>de</strong>dicado apenas<br />
à Or<strong>de</strong>m dos Pregadores, ou Dominicanos,<br />
da responsabilida<strong>de</strong> do mesmo<br />
Gabinete <strong>de</strong> Estudos das Or<strong>de</strong>ns criado<br />
para assegurar a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes<br />
projectos.<br />
Este Dicionário das Or<strong>de</strong>ns terá<br />
uma outra continuação: entre os dias<br />
2 e 5 <strong>de</strong> Novembro próximo, um gran<strong>de</strong><br />
congresso internacional aprofundará<br />
a “Memória, Presença e Diásporas”<br />
das or<strong>de</strong>ns e congregações religiosas<br />
em Portugal. A dimensão po<strong>de</strong><br />
medir-se também pelo facto <strong>de</strong>, inicialmente,<br />
o congresso estar previsto<br />
para dois dias. Há 200 intervenções<br />
já previstas entre 700 participantes<br />
inscritos, sobre áreas tão distintas<br />
quanto a história da arte, a assistência,<br />
a cultura, a missionação ou a relação<br />
com a política.<br />
A última etapa será, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> publicados<br />
os diferentes volumes, a disponibilização<br />
da informação em suporte<br />
digital, com actualização permanente.<br />
Uma nota sobre a iconografia e o<br />
tratamento gráfico: como, em muitos<br />
casos, a ilustração esteve <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />
dos arquivos das instituições, acabam<br />
por coexistir bons exemplos <strong>de</strong><br />
tratamento (icono)gráfico, a par <strong>de</strong><br />
outros menos interessantes.<br />
No primeiro caso, estão sobretudo<br />
as or<strong>de</strong>ns mais antigas, on<strong>de</strong> é possível<br />
recorrer a peças <strong>de</strong> arte, monumentos<br />
ou símbolos mais marcantes<br />
(é o caso <strong>de</strong> algumas or<strong>de</strong>ns religiosas,<br />
mas também maçónicas). No segundo,<br />
<strong>de</strong>vem referir-se sobretudo<br />
instituições mais contemporâneas,<br />
como suce<strong>de</strong> com as or<strong>de</strong>ns profissionais.<br />
Por exemplo, o friso <strong>de</strong> bastonários<br />
da Or<strong>de</strong>m dos Médicos Veterinários<br />
era evitável. Deveria mesmo<br />
ter-se optado por não reproduzir fotos<br />
<strong>de</strong> actuais dirigentes das diferentes<br />
instituições, evitando o aspecto<br />
“<strong>de</strong>sactualizado” que a obra po<strong>de</strong>rá<br />
aparentar assim que um <strong>de</strong>sses dirigentes<br />
mu<strong>de</strong>.<br />
Esta limitação reflecte-se também<br />
no <strong>de</strong>senho gráfico <strong>de</strong> algumas páginas,<br />
menos cuidadoso. E não ajuda o<br />
facto <strong>de</strong> a bibliografia não aparecer<br />
num corpo <strong>de</strong> letra diferente do resto<br />
do texto — o que marcaria uma ruptura<br />
mais evi<strong>de</strong>nte entre as diferentes<br />
entradas.<br />
Outro pormenor: em alguns casos,<br />
as legendas <strong>de</strong> fotos ou ilustrações<br />
<strong>de</strong>notam falta <strong>de</strong> edição: on<strong>de</strong> se lê<br />
apenas “Fundador” ou um mais extenso<br />
“Soberano Gran<strong>de</strong> Comendador<br />
do Supremo Conselho <strong>de</strong> Portugal”<br />
<strong>de</strong>veriam, antes, ler-se os nomes<br />
respectivos.<br />
Nota final: fala-se, ainda, em instituições<br />
“dicionarizadas” e em “siglários”.<br />
Numa época em que a língua<br />
portuguesa é tão pontapeada em tantos<br />
lados, uma obra como esta <strong>de</strong>veria<br />
ter tido a cautela <strong>de</strong> evitar neologismos<br />
feios e <strong>de</strong>snecessários.<br />
Pormenores, todos eles, a merecer<br />
revisão nas futuras edições parciais,<br />
mas que só reafirmam o ineditismo,<br />
relevância e abrangência <strong>de</strong>sta obra.<br />
Livros<br />
SÁB 24 JUL<br />
22:00 PRAÇA | € 15<br />
Camané tem feito um percurso<br />
singular como intérprete <strong>de</strong><br />
eleição do fado contemporâneo.<br />
Foram muitos os prémios que<br />
recebeu e muitas as colaborações<br />
com músicos das áreas mais<br />
diversas. Com um novo álbum na<br />
calha, esta voz fundamental da<br />
música portuguesa apresenta<br />
um concerto recheado <strong>de</strong><br />
êxitos <strong>de</strong> carreira.<br />
JANTAR+CONCERTO € 30<br />
No dicionário<br />
agora<br />
publicado<br />
predominam<br />
as or<strong>de</strong>ns<br />
religiosas<br />
católicas<br />
APOIO<br />
PATROCINADOR<br />
VERÃO NA CASA<br />
MECENAS CASA DA MÚSICA<br />
APOIO INSTITUCIONAL<br />
MECENAS PRINCIPAL CASA DA MÚSICA<br />
PATROCINADOR VERÃO NA CASA<br />
SEJA UM DOS PRIMEIROS A APRESENTAR HOJE ESTE JORNAL NA CASA DA MÚSICA E GANHE UM CONVITE DUPLO<br />
PARA O CONCERTO DE CAMANÉ. OFERTA LIMITADA AOS PRIMEIROS 10 LEITORES.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 17
São José Almeida abriu<br />
dos homossexuais na<br />
“Os Homossexuais no Estado Novo” traça a homossexualida<strong>de</strong> (masculina e feminina) d<br />
do século XX português. Raquel Ribeiro<br />
Livros<br />
Na apresentação do livro “Os Homossexuais<br />
no Estado Novo”, <strong>de</strong> São José<br />
Almeida (ed. Sextante), há um mês,<br />
no Porto, a poeta e professora universitária<br />
Ana Luísa Amaral começava<br />
por questionar, citando Judith Butler<br />
(uma das mais proeminentes investigadoras<br />
americanas em estudos “queer”<br />
e activista <strong>de</strong> direitos LGBT), qual<br />
a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se falar em direitos<br />
dos homossexuais quando a Palestina<br />
ainda estava sob domínio israelita.<br />
Resposta <strong>de</strong> Butler: “Tudo tem a ver<br />
com a violência, por isso é impossível<br />
estabelecer priorida<strong>de</strong>s.”<br />
Ao Ípsilon, Ana Luísa Amaral completou<br />
esta i<strong>de</strong>ia, explicando, a propósito<br />
do livro da jornalista do PÚBLI-<br />
CO São José Almeida, que “a forma<br />
mais conservadora <strong>de</strong> dar priorida<strong>de</strong><br />
a <strong>de</strong>terminados assuntos é dizer que<br />
assuntos políticos, como a crise económica,<br />
são mais importantes”. “Não<br />
me parece: todos eles exibem violência.<br />
Uma socieda<strong>de</strong> que resolve as<br />
suas crises económicas, mas não resolve<br />
as suas crises sociais e <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>,<br />
é uma socieda<strong>de</strong> injusta também.”<br />
Nesse sentido, continua Amaral,<br />
“Os Homossexuais no Estado<br />
Novo” é um livro “completamente<br />
político, porque os assuntos <strong>de</strong> visibilida<strong>de</strong><br />
são sempre políticos, digam<br />
respeito aos sem-abrigo, aos homossexuais<br />
ou às mulheres”.<br />
Esta obra começou por ser uma<br />
investigação jornalística <strong>de</strong> São José<br />
Almeida sobre como viviam os homossexuais<br />
durante o Estado Novo,<br />
publicada na revista “Pública” no Verão<br />
<strong>de</strong> 2009. A autora explica na introdução<br />
que a investigação não parou<br />
aí, ainda que este seja um princípio,<br />
“um livro inacabado”, ou até<br />
uma porta que se abre para um caminho<br />
que a socieda<strong>de</strong> portuguesa<br />
<strong>de</strong>verá percorrer <strong>de</strong> forma a “revisitar<br />
a história”, e “se reencontrar consigo<br />
mesma”. É altura, escreve, “<strong>de</strong><br />
Portugal começar a ajustar contas<br />
com a História”.<br />
Uma história <strong>de</strong> Portugal<br />
São José Almeida colige uma pesquisa<br />
totalmente original reunindo uma<br />
série <strong>de</strong> vozes <strong>de</strong> especialistas portugueses<br />
e estrangeiros, <strong>de</strong> testemunhos<br />
pessoais, <strong>de</strong> investigações, mas<br />
também recorrendo a um enquadramento<br />
teórico, científico e jurídico<br />
das problemáticas envolvendo a homossexualida<strong>de</strong><br />
no século XX português.<br />
António Fernando Cascais, professor<br />
na Universida<strong>de</strong> Nova <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong><br />
e especialista em história da<br />
homossexualida<strong>de</strong> em Portugal , é<br />
uma das fontes fundamentais usadas<br />
pela jornalista para compor a história<br />
dos homossexuais durante a ditadura.<br />
Ao Ípsilon afirma que esta investigação<br />
“é uma incursão num terreno<br />
que não estava pura e simplesmente<br />
<strong>de</strong>sbravado”.<br />
Almeida traça a história da homossexualida<strong>de</strong><br />
em Portugal entre 1912<br />
(ano da Lei sobre a Mendicida<strong>de</strong>) e<br />
1982, quando entra em vigor o novo<br />
Código Penal (<strong>de</strong> que foram eliminados<br />
os artigos 70º e 71º, referentes<br />
àqueles que “se entreguem habitualmente<br />
à pratica <strong>de</strong> vícios contra a natureza”).<br />
A autora mostra como a<br />
homossexualida<strong>de</strong> é a “sexualida<strong>de</strong><br />
transgressora numa socieda<strong>de</strong> patriarcal”,<br />
sublinhando dois eixos no<br />
contexto português: um referente à<br />
“diferença <strong>de</strong> classe social, a diversida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> tratamento para quem é das<br />
elites e das aristocracias do regime e<br />
para quem é do povo”; e outro relacionado<br />
com os não-ditos, os silenciamentos,<br />
a “inexistência <strong>de</strong> uma<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>” que permita uma noção<br />
<strong>de</strong> comunida<strong>de</strong>, “partilha <strong>de</strong> grupo”,<br />
Mário Cesariny Figura maior do surrealismo português, “foi um<br />
dos homossexuais portugueses que mais se expôs publicamente na<br />
assunção plena da sua homossexualida<strong>de</strong>”, transformando-se “numa<br />
figura <strong>de</strong> referência da homossexualida<strong>de</strong> portuguesa durante o Estado<br />
Novo”. O poeta “sempre se assumiu como um ser com uma sexualida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sviante, como um ser estigmatizado <strong>de</strong>vido à sua não-inserção no<br />
padrão <strong>de</strong> família patriarcal e heterosexual”.<br />
ADRIANO MIRANDA<br />
18 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
o armário<br />
ditadura<br />
PEDRO CUNHA<br />
) durante o Estado Novo, reescrevendo a história<br />
PEDRO CUNHA<br />
A história dos<br />
homossexuais no<br />
Estado Novo é<br />
coinci<strong>de</strong>nte com a<br />
história do país nesse<br />
período. A repressão e<br />
exclusão social a que<br />
estavam sujeitos<br />
relegou-os para uma<br />
semi-clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong><br />
comum durante estes anos. Ouvindo<br />
um número consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> testemunhas<br />
que contam, em primeira mão,<br />
as suas experiências vividas sob a ditadura,<br />
São José Almeida <strong>de</strong>monstra<br />
os dois pesos e as duas medidas do<br />
regime relativamente aos homossexuais<br />
(das elites e das classes baixas),<br />
tendo em conta como a “repressão e<br />
a exclusão social a que estavam votados<br />
no Estado Novo levavam a que a<br />
sua vivência — em que a sexualida<strong>de</strong><br />
ocupa um lugar central, como em todas<br />
as pessoas — fosse relegada para<br />
uma semi-clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>, uma espécie<br />
<strong>de</strong> submundo, muitas vezes<br />
i<strong>de</strong>ntificados como os ‘bas-fonds’ e o<br />
crime”.<br />
Este trabalho mostra, assim, como<br />
a história dos homossexuais no Estado<br />
Novo é, no fundo, coinci<strong>de</strong>nte com<br />
a história do próprio país durante esse<br />
período e da resistência ao regime.<br />
“Evi<strong>de</strong>ntemente que os homossexuais,<br />
enquanto grupo, nunca é apenas<br />
aquilo que é: é aquilo que é mais o<br />
que lhe acontece. É uma história do<br />
país durante esse período, uma história<br />
do regime e das suas características”,<br />
explica Cascais.<br />
Ana Luísa Amaral diz que a obra<br />
“dá voz às vozes que estiveram em<br />
silêncio durante esse período”, e são<br />
os testemunhos que a professora diz<br />
po<strong>de</strong>rem vir a ser úteis nas suas aulas<br />
<strong>de</strong> Introdução aos Estudos Feministas,<br />
na Universida<strong>de</strong> do Porto, por<br />
exemplo: “Alguns testemunhos são<br />
muito importantes, pungentes, até.<br />
Esta disciplina po<strong>de</strong> sensibilizar os<br />
alunos para questões sobre o outro,<br />
apren<strong>de</strong>r a ver o outro como um semelhante.<br />
Quem está ali podia ser<br />
eu. Mas [os testemunhos] também<br />
[servem] para os alunos se chocarem<br />
e se sensibilizarem com a estupi<strong>de</strong>z<br />
da violência pela qual estas pessoas<br />
tiveram <strong>de</strong> passar.” A noção <strong>de</strong> testemunho<br />
é sublinhada por Cascais<br />
que diz que “Os Homossexuais no<br />
Estado Novo” é, em termos metodológicos,<br />
“uma história oral, na primeira<br />
pessoa”. Mas há uma “relevância<br />
histórico-política” que tem que<br />
ver com a “dar voz a quem não a tinha,<br />
reescrever a história noutros<br />
termos que não nos existentes: os<br />
do silenciamento, do enviesamento,<br />
dando rosto a estereótipos, humanizando-os.”<br />
Natália Correia É um dos exemplos da “clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> em que era<br />
vivido o lesbianismo e a sua invisibilida<strong>de</strong> pública era uma realida<strong>de</strong><br />
mesmo no meio artístico”. A poeta frequentava o círculo <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>s na<br />
casa <strong>de</strong> Fernanda <strong>de</strong> Castro (mulher <strong>de</strong> António Ferro, chefe <strong>de</strong><br />
propaganda do regime) “que se juntava em férias no Algarve, [e que] era<br />
claramente um círculo <strong>de</strong> relações homossexuais”, conta António<br />
Fernando Cascais no livro.<br />
Poetas e escritores, pioneiros<br />
Salientando sempre a diferença <strong>de</strong><br />
classes que se estabelecia na “comunida<strong>de</strong>”<br />
homossexual em Portugal<br />
(entre aspas porque, precisamente,<br />
essa comunida<strong>de</strong> não existia enquanto<br />
tal), a autora recorre a exemplos<br />
das artes e da literatura que, até certo<br />
ponto, foram pioneiros <strong>de</strong> uma<br />
forma <strong>de</strong> sentir a sexualida<strong>de</strong> durante<br />
a ditadura (António Botto, Eugénio<br />
<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Mário <strong>de</strong> Cesariny, Natália<br />
Correia, João Villaret, entre muitos<br />
outros). Essa é também a leitura<br />
<strong>de</strong> Eduardo Pitta no livro “Fractura<br />
— A condição homossexual na literatura<br />
portuguesa contemporânea”<br />
(2003), on<strong>de</strong> textos <strong>de</strong> autores portugueses<br />
são analisados segundo uma<br />
perspectiva “gay” ou “queer”.<br />
Nos anos 20, “uma nova or<strong>de</strong>m se<br />
anuncia”, com a censura dos livros e<br />
posterior ostracização dos poetas Judith<br />
Teixeira, Raul Leal e António Botto.<br />
Botto foi saneado e exilou-se no<br />
Brasil no final dos anos 40. Citando<br />
Cascais, a autora escreve: “A partir<br />
daí, a homossexualida<strong>de</strong> exprime-se<br />
na literatura <strong>de</strong> forma cifrada, críptica.<br />
[...] Ninguém queria ter a sorte <strong>de</strong><br />
Botto e <strong>de</strong> Teixeira, o próprio Eugénio<br />
<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> disse que não queria pagar<br />
em vida o que Botto pagou.” Só<br />
mais tar<strong>de</strong>, na geração dos surrealistas<br />
com Cesariny (o “único homossexual<br />
português?”, pergunta ironicamente<br />
Almeida), com Natália Correia<br />
e Ary dos Santos haveria uma maior<br />
abertura (social e até política) relativamente<br />
à homossexualida<strong>de</strong>.<br />
A referência a figuras <strong>de</strong> proa da<br />
literatura portuguesa po<strong>de</strong> ser polémica,<br />
nomeadamente no que diz<br />
respeito ao caso Jorge <strong>de</strong> Sena, já<br />
falecido, mas cuja família está ainda<br />
hoje viva. Ana Luísa Amaral diz que<br />
o livro <strong>de</strong> Almeida levanta a questão<br />
dos limites entre o público e o privado<br />
<strong>de</strong> “forma interessante”: até<br />
que ponto, pergunta Amaral, “é que<br />
se <strong>de</strong>ve questionar a eventual homossexualida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> Jorge <strong>de</strong> Sena<br />
partindo ou <strong>de</strong> entrevistas, ou do<br />
texto do autor? É complexo e polémico.<br />
Essa questão é saudável porque<br />
po<strong>de</strong> levantar um <strong>de</strong>bate interessante<br />
sobre a crítica literária em<br />
Portugal.”<br />
Fernando Lopes Graça Músico e compositor, pertenceu ao PCP e<br />
foi um opositor do regime <strong>de</strong> Salazar. Cesariny apren<strong>de</strong>u música com<br />
ele. Era amigo <strong>de</strong> Ary dos Santos, “homossexual absolutamente<br />
assumido e explícito na noite lisboeta”, nos anos 60. O dirigente do PCP<br />
Ruben <strong>de</strong> Carvalho conta no livro: “Fernando Lopes Graça <strong>de</strong>scobriu-se<br />
comunista e homossexual ao mesmo tempo; o Ary, primeiro, percebeu<br />
que era homossexual e, <strong>de</strong>pois, que era comunista”.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 19
MANUEL ROBERTO<br />
Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nunca afirmou a sua homossexualida<strong>de</strong>,<br />
mas era pública. Foi provavelmente marcado pela ostracização do poeta<br />
António Botto (no final dos anos 40) <strong>de</strong>vido à assunção da sua<br />
homossexualida<strong>de</strong>. António Fernando Cascais diz, no livro, que<br />
“ninguém queria ter a sorte <strong>de</strong> Botto (...), o próprio Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />
disse que não queria pagar em vida o que Botto pagou”.<br />
O “caso” Sena diz respeito à suposta<br />
homossexualida<strong>de</strong> do autor <strong>de</strong><br />
“Sinais <strong>de</strong> Fogo”, ainda hoje tido por<br />
vários especialistas como um dos romances<br />
pioneiros da literatura “queer”<br />
em Portugal. Citando Fernando<br />
Dacosta, a autora escreve: “[Sena]<br />
casou. Fazia, praticamente, um filho<br />
por ano, o que é uma atitu<strong>de</strong> muito<br />
normal nos homossexuais. Conhecio”.<br />
Dacosta conta (corroborado por<br />
Eduardo Pitta) que Sena foi expulso<br />
da Marinha por ter sido apanhado<br />
com um rapaz. O conto <strong>de</strong> Sena,<br />
“Grã-Canária”, incluído em “As Andanças<br />
do Demónio” é, “nesse sentido,<br />
autobiográfico”, conta Pitta à<br />
autora. São José Almeida explica como<br />
a polémica estalou em 1982 quando<br />
o “Expresso” apresentou um trabalho<br />
<strong>de</strong> Arnaldo Saraiva sobre a<br />
homossexualida<strong>de</strong> em Jorge <strong>de</strong> Sena.<br />
Grupos <strong>de</strong> intelectuais escreveram<br />
cartas inflamadas (e indignadas) sobre<br />
o assunto. Para a autora, o “caso”<br />
Sena é, por isso, exemplar <strong>de</strong> toda a<br />
sua investigação: “Pela forma como<br />
tem sido interpretado e pelas polémicas<br />
que tem gerado, [Sena] é <strong>de</strong>monstrativo<br />
<strong>de</strong> como os passos para<br />
i<strong>de</strong>ntificar as referências que permitam<br />
a construção <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />
‘gay’ em Portugal são, muitas vezes,<br />
impossíveis <strong>de</strong> dar até muito tar<strong>de</strong><br />
no século XX português”.<br />
“Os Homossexuais no<br />
Estado Novo” é “uma<br />
história oral, na<br />
primeira pessoa”, que<br />
dá voz a quem esteve<br />
em silêncio nesse<br />
período<br />
Mulheres e linguagem<br />
Além da história oral, o enquadramento<br />
científico e jurídico do homossexual<br />
é uma das mais-valias do livro<br />
<strong>de</strong> Almeida. Com base nas teorias <strong>de</strong><br />
Egas Moniz e Asdrúbal António <strong>de</strong><br />
Aguiar, da década <strong>de</strong> 20 do século<br />
passado, a autora explica que a homossexualida<strong>de</strong><br />
era “vista como doença,<br />
que po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser tratada, e<br />
como perversão, que tem <strong>de</strong> ser corrigida,<br />
a bem da nova or<strong>de</strong>m social<br />
burguesa”. Essa percepção (e as categorias<br />
<strong>de</strong>senvolvidas a partir <strong>de</strong>sta)<br />
dominou o discurso oficial na ditadura.<br />
Para Ana Luísa Amaral, este enquadramento<br />
é uma primeira contribuição<br />
para a criação <strong>de</strong> “um léxico inclusivo<br />
para a cidadania”. Isto quer<br />
dizer que “<strong>de</strong>signações, categorias,<br />
o próprio conceito <strong>de</strong> homossexual<br />
e a sua naturalização, conceitos que<br />
dizem respeito às sexualida<strong>de</strong>s, tornam-se<br />
abertos a toda a socieda<strong>de</strong>”.<br />
O livro mostra, portanto, “como se<br />
esboroaram essas categorias e é um<br />
novo léxico que se vai construir”.<br />
Cascais concorda: “Normalmente, os<br />
homossexuais não têm história, têm<br />
uma tipologia <strong>de</strong> doença, têm uma<br />
patologia.” Com este livro, “isto está<br />
<strong>de</strong>sfeito. A outra coisa que está <strong>de</strong>sfeita<br />
é o preconceito histórico <strong>de</strong> que<br />
uma história dos homossexuais diz<br />
apenas respeito aos homossexuais, é<br />
uma micro-história ou a história <strong>de</strong><br />
uma minoria. Ora, não há histórias<br />
só <strong>de</strong> minorias, porque as minorias<br />
nunca estão isoladas.”<br />
Anna Klobucka, investigadora <strong>de</strong><br />
Estudos Portugueses na Universida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> Massachusetts-Dartmouth, nos<br />
Estados Unidos, tem-se <strong>de</strong>bruçado<br />
sobre questões <strong>de</strong> género e teorias<br />
feminista e “queer” na literatura portuguesa.<br />
“Do meu ponto <strong>de</strong> vista,<br />
que é também o da minha agenda<br />
<strong>de</strong> pesquisa e daquilo que me interessa<br />
pessoalmente, o que me parece<br />
mais útil e original [neste livro] é<br />
que permite <strong>de</strong>senvolver uma perspectiva<br />
<strong>de</strong> análise muito mais bem<br />
informada sobre o que se po<strong>de</strong>ria<br />
chamar, segundo o livro <strong>de</strong> Eve<br />
Sedgwick, a ‘epistemologia do armário<br />
português’.” A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> “armário”<br />
(ou neste caso da sua “abertura”,<br />
com o livro <strong>de</strong> Almeida) é, diz Klobucka,<br />
“um fenómeno universal no<br />
oci<strong>de</strong>nte” que tem a ver com a relação<br />
que a homossexualida<strong>de</strong> estabelece<br />
com o (in)cumprimento “das<br />
regras em vários contextos culturais”.<br />
Mas há diferenças entre países<br />
e épocas: “Usar fontes que se baseiam<br />
na realida<strong>de</strong> dos EUA ou da<br />
Inglaterra, ou mesmo <strong>de</strong> Espanha,<br />
para pensar e analisar o caso português<br />
é <strong>de</strong>slocado.” O contexto português<br />
“é bastante distinto <strong>de</strong> outros<br />
que tenho estudado em obras teóricas<br />
e isso é muito precioso”.<br />
O “armário” aqui aberto está na<br />
voz dos testemunhos, mas também<br />
no facto <strong>de</strong> Almeida tentar estabelecer<br />
sempre uma certa parida<strong>de</strong><br />
entre a homossexualida<strong>de</strong> feminina<br />
e masculina. A autora escreve que,<br />
na história, a “mulher surge sempre<br />
como segunda figura”, e a “concepção<br />
do lesbianismo” é <strong>de</strong>calcada da<br />
dos homens. Nesse sentido, tanto<br />
para Klobucka como para Ana Luísa<br />
Amaral o capítulo <strong>de</strong>dicado ao lesbianismo,<br />
“Mas isso existe?”, é relevante.<br />
Klobucka afirma que a autora<br />
“faz muito com o pouco material que<br />
tem”, dando máxima “inclusivida<strong>de</strong><br />
à esfera do lesbianismo que é particularmente<br />
invisível e usualmente<br />
mal documentada por comparação<br />
à homossexualida<strong>de</strong> masculina na<br />
Pedro Homem <strong>de</strong> Mello O autor do poema<br />
“O rapaz da camisola ver<strong>de</strong>” (1954), cantado por<br />
Amália <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong>pois, “vê os [seus] versos em que<br />
o homoerotismo é cristalinamente assumido serem<br />
silenciados pela censura do pudor hipócrita da<br />
cultura social vigente”. Ainda assim, era protegido<br />
pelo regime, mesmo no “ambiente fechado da<br />
socieda<strong>de</strong> portuense na época”: “A única pessoa que<br />
tinha coragem <strong>de</strong> não se retirar se lhe atirassem<br />
alguma boca era o Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. No Pedro<br />
Homem <strong>de</strong> Mello também não se atreviam a tocar”,<br />
diz, no livro, o artista plástico Óscar Alves.<br />
Jorge <strong>de</strong> Sena A suposta homossexualida<strong>de</strong> do<br />
autor <strong>de</strong> “Sinais <strong>de</strong> Fogo” é levantada num trabalho<br />
no “Expresso” em 1982, coor<strong>de</strong>nado por Arnaldo<br />
Saraiva, que <strong>de</strong>u origem a reacções acesas <strong>de</strong><br />
grupos <strong>de</strong> intelectuais portugueses. “Pelos vistos, em<br />
1982, e para alguns intelectuais, a simples alusão à<br />
hipótese <strong>de</strong> homossexualida<strong>de</strong> — imediatamente<br />
excluída com elementos plausíveis — é ainda um<br />
sinal <strong>de</strong> suspeita e perversida<strong>de</strong>. Quem é que é<br />
perverso? Quem simplifica? Quem é o puritano?”,<br />
escreveu Saraiva na altura.<br />
cultura portuguesa”. Klobucka acrescenta<br />
ainda que “a situação das mulheres<br />
portuguesas durante o Estado<br />
Novo era muito diferente do estatuto<br />
social dos homens e naturalmente<br />
a questão homossexual também<br />
tem <strong>de</strong> ser construída <strong>de</strong> uma forma<br />
diferente”.<br />
20 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Mi Ami<br />
Este punk não é<br />
aquilo que pensamos<br />
Os Mi Ami são um ritmo que jorra <strong>de</strong> forma incessante, como se o rock’n’roll se<br />
transformasse em celebração tribal, em funk dilacerado, em violento psica<strong>de</strong>lismo.<br />
Em “Steal Your Face”, o segundo álbum, põem Bob Marley na capa para lançar uma<br />
pergunta: “Como viver num mundo em que tudo é trivializado e transformado<br />
em lixo?” Mário Lopes<br />
Música<br />
Daniel Martin-McCormick, à<br />
esquerda, irrita-se quando lhe<br />
falam em supostas influências<br />
africanas na música dos Mi Ami<br />
Antes, entre 2001 e 2004, existiram<br />
os Black Eyes. Canções <strong>de</strong> guitarras<br />
nervosas e ritmo tenso, com um vocalista<br />
cuja estridência do canto, quase<br />
<strong>de</strong>mencial, potenciava uma sensação<br />
<strong>de</strong> catarse neurótica. Os Black<br />
Eyes, da mesma Washington <strong>de</strong> Fugazi<br />
e Q And Not U, eram uma banda<br />
perfeitamente alinhada numa época<br />
<strong>de</strong> re<strong>de</strong>scoberta e apropriação criativa<br />
<strong>de</strong> pós-punk e da no-wave. Agora<br />
existem os Mi Ami, que continuam a<br />
revelar muita da catarse neurótica dos<br />
Black Eyes, mas são completamente<br />
diferentes, inclassificáveis. Um ritmo<br />
que jorra <strong>de</strong> forma incessante, como<br />
se o rock’n’roll se transformasse em<br />
celebração tribal, em funk dilacerado,<br />
em violento psica<strong>de</strong>lismo que nos<br />
transporta na sua voragem.<br />
Daniel Martin-McCormick, guitarrista<br />
e vocalista dos Mi Ami, ex-guitarrista<br />
e vocalista dos Black Eyes,<br />
canta da mesma forma, mas atinge<br />
uma dimensão diferente. Quando ouvimos<br />
o segundo álbum da banda,<br />
“Steal Your Face”, imaginamos um<br />
trio (Daniel, o baixista Jacob Long,<br />
também vindo dos Black Eyes, e o baterista<br />
Damon Palermo) que aprofundou<br />
a empatia musical ao estado <strong>de</strong><br />
“jam” <strong>de</strong> músicos clássicos <strong>de</strong> jazz:<br />
não há pontes ou refrães, antes música<br />
como um fluxo contínuo que se<br />
vai modulando dinamicamente, enquanto<br />
a guitarra se ergue num turbilhão,<br />
enquanto o “cowbell” surge e<br />
sugere contenção eléctrica para que<br />
o “groove” diabólico se <strong>de</strong>staque.<br />
Daniel Martin-McCormick, agora a<br />
viver em São Francisco mas formado<br />
na fértil e influente cena punk <strong>de</strong> Washington<br />
D.C. — a dos supracitados<br />
Fugazi e da sua mítica editora, a Dischord<br />
—, é um homem que <strong>de</strong>nuncia<br />
no discurso a ética em que cresceu.<br />
Fala <strong>de</strong> forma pausada, pesando as<br />
palavras, tentando assegurar que<br />
transmite com exactidão as i<strong>de</strong>ias que<br />
quer fazer passar. Tem a sua grelha <strong>de</strong><br />
valores bem <strong>de</strong>finida, tão bem <strong>de</strong>finida<br />
quanto a visão musical. “O disco<br />
mostra-nos a tocar ao vivo no estúdio,<br />
é uma ‘performance’ ao vivo e é apenas<br />
nesse sentido que haverá algo <strong>de</strong><br />
‘jazzmen’ na nossa forma <strong>de</strong> operar.”<br />
Dito isto, acrescenta rapidamente,<br />
para não <strong>de</strong>ixar espaço a dúvidas:<br />
“Não funcionamos, <strong>de</strong> todo, em ‘fluxo<br />
<strong>de</strong> consciência’. Isso implicaria reproduzir<br />
o que quer que nos passasse<br />
pela cabeça naquele momento, quando<br />
o que acontece é precisamente o<br />
contrário”. Cada uma das seis longas<br />
canções <strong>de</strong> “Steal Your Face” foi <strong>de</strong>senvolvida<br />
em ensaios durante um<br />
mês antes <strong>de</strong> chegar a estúdio. “Temos<br />
muito bem <strong>de</strong>finido o que estamos a<br />
fazer e aquilo que será a canção antes<br />
<strong>de</strong> a gravarmos. O que fazemos no estúdio<br />
é dar-lhe vida.”<br />
Quando o punk se irrita<br />
Paralelamente a um percurso discográfico<br />
que, em longa duração, conta<br />
com a estreia “Watersports”, editada<br />
em 2009, e o “Steal Your Face” que<br />
agora lançam, os Mi Ami vão mantendo<br />
activida<strong>de</strong> contínua, quer em palco<br />
— o vocalista assegura que as constantes<br />
digressões foram indispensáveis<br />
para que a música “ganhasse<br />
22 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
VIVA A SARDINHA!<br />
14 MAIO / 15 JULHO<br />
contornos muito intensos” —, quer<br />
através da edição <strong>de</strong> “singles” <strong>de</strong> 12<br />
polegadas. Títulos como “African<br />
rhythms”, uma remistura para os<br />
nova-iorquinos Telepathe (“Devil’s<br />
tri<strong>de</strong>nt”) e os padrões rítmicos circulares<br />
que compõem as suas canções,<br />
a par do fascínio recente por toda a<br />
música exterior ao padrão anglo-saxónico,<br />
fazem com que Daniel Martin-McCormick<br />
seja confrontado mais<br />
vezes do que gostaria com supostas<br />
influências africanas. Abordar tal<br />
questão é ver o homem com quem o<br />
Ípsilon conversa irritar-se com o facilitismo<br />
da comparação. É ver o velho<br />
punk <strong>de</strong> Washington passar ao<br />
ataque. “Nos últimos anos todos temos<br />
mais consciência da ‘world music’,<br />
porque antes era difícil obtê-la e<br />
agora está muito disponível. É excitante<br />
ter acesso a toda essa música,<br />
mas chegámos a um ponto em que a<br />
vemos referida constantemente e a<br />
<strong>de</strong>spropósito. Claro que os Konono<br />
nº1 <strong>de</strong>ram alguns dos melhores concertos<br />
que vi na vida e é provável que<br />
alguns dos meus motivos <strong>de</strong> guitarra<br />
sejam influenciados por eles. Mas<br />
quando ouço a nossa música parece<br />
tão óbvio que não estamos a tentar<br />
<strong>de</strong> forma alguma soar africanos que<br />
essas referências <strong>de</strong>ixam-me perplexo.<br />
O Damon [Palermo] não toca bateria<br />
da forma habitual num baterista<br />
rock, mas não anda à procura <strong>de</strong><br />
polirritmos nigerianos. Parece-me<br />
que as pessoas querem ouvi-los na<br />
nossa música, mas nós não procuramos<br />
segui-los.”<br />
Percebemos o <strong>de</strong>sconforto <strong>de</strong> Martin-McCormick.<br />
Não existe realmente<br />
nada <strong>de</strong> “africano” ou <strong>de</strong> “world music”<br />
na música dos Mi Ami. As suas<br />
canções nascem num espaço íntimo,<br />
partilhado por três músicos. É o som<br />
<strong>de</strong> quem <strong>de</strong>scobriu nessa empatia<br />
partilhada a ignição para que algo novo,<br />
feérico, fosse <strong>de</strong>spoletado. É a<br />
música <strong>de</strong> punks que enten<strong>de</strong>m o<br />
punk como espaço <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> total,<br />
que não têm pachorra para discursos<br />
puristas e são avessos a que os cristalizem<br />
numa imagem. “Não sei quão<br />
relevante é o punk como estilo <strong>de</strong>finido<br />
historicamente. Quando comecei<br />
a tocar [em Washington] havia<br />
uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> bandas vagamente enraizada<br />
na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> punk mas para<br />
quem a noção <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> era mais<br />
importante do que a história do movimento.”<br />
E é aqui que regressamos<br />
a “Steal Your Face”.<br />
O vocalista dos Mi<br />
Ami não gosta <strong>de</strong><br />
Doors nem <strong>de</strong> Bob<br />
Marley. “Não consigo<br />
ouvir a música <strong>de</strong><br />
nenhum <strong>de</strong>sses tipos<br />
sem ver tudo aquilo<br />
que foi construído à<br />
sua volta <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />
morte. Já não tem<br />
qualquer relação com<br />
música”<br />
A piada Bob Marley<br />
Na capa, um Bob Marley retalhado<br />
ganha <strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> vampiro. Na contracapa,<br />
Jerry Garcia, guitarrista dos<br />
Grateful Dead, surge <strong>de</strong>sfigurado. No<br />
interior, Jim Morrison é um fantasma<br />
irreconhecível, um contorno <strong>de</strong> face<br />
sobre o qual foi sobreposta uma figura<br />
feminina. As colagens fotográficas<br />
são, explica Daniel Martin-McCormick,<br />
a ilustração <strong>de</strong> uma pergunta:<br />
“Como viver num mundo em que tudo<br />
é trivializado e transformado em<br />
lixo?”<br />
Ele não gosta <strong>de</strong> Jerry Garcia, acha<br />
que Jim Morrison terá sido um ser humano<br />
intragável e diz que Bob Marley<br />
é uma piada recorrente na banda.<br />
“Não consigo ouvir a música <strong>de</strong> nenhum<br />
<strong>de</strong>sses tipos sem ver tudo aquilo<br />
que foi construído à sua volta <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
a morte. Já não tem qualquer relação<br />
com música”. Os Doors: “Não penso<br />
neles como poesia, penso na cultura<br />
que lhes presta <strong>de</strong>voção, que é repugnante<br />
e pateta.” Bob Marley: “Nem sei<br />
se gosto da música <strong>de</strong>le, sei que o culto<br />
dos fãs é <strong>de</strong>primente. A noção <strong>de</strong><br />
que aquilo correspon<strong>de</strong> a uma i<strong>de</strong>ia<br />
grandiosa <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> quando não<br />
passa <strong>de</strong> um produto vendido aos milhões...<br />
Toda essa conversa revolucionária,<br />
neste contexto, transforma-se<br />
num monte <strong>de</strong> esterco.” Daniel não<br />
chega a abordar Jerry Garcia, mas está<br />
imparável: “E esse processo não<br />
termina ali. Agora temos os Red Hot<br />
Chili Peppers como a nova escola <strong>de</strong><br />
tudo isto. Com um ‘twist’. Música <strong>de</strong><br />
qualida<strong>de</strong> notoriamente inferior que<br />
atinge o mesmo estatuto.”<br />
O vocalista dos Mi Ami, o ex-Black<br />
Eyes que trocou Washington por São<br />
Francisco com uma bolsa para estudar<br />
guitarra clássica — “não toco guitarra<br />
clássica e não era isso que me<br />
interessava para a banda, mas [os estudos]<br />
mudaram a forma como abordo<br />
o instrumento e como me relaciono<br />
com a música como um todo”—,<br />
irá falar-nos então <strong>de</strong> como o aborrece<br />
música que seja “tudo tensão ou<br />
tudo re<strong>de</strong>nção”, sem zonas cinzentas.<br />
Irá dizer-nos que, neste momento,<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> todos os concertos e do<br />
tempo passado em ensaios, raramente<br />
discute questões musicais com os<br />
companheiros <strong>de</strong> banda: “Desenvolvemos<br />
uma empatia suficientemente<br />
intensa para dispensar discursos filosóficos”.<br />
Reafirma que vê a música como algo<br />
“muito volátil e abstracto, sem regras”,<br />
e conclui: “Interessa-nos estabelecer<br />
uma ligação forte com o público,<br />
sentir que o hipnotizamos”. O<br />
espaço íntimo que se abre <strong>de</strong> forma<br />
intensa e incontrolável ao exterior.<br />
Sem mediações e sem mistificações.<br />
“It’s the music, man”, diria Jerry Garcia.<br />
Seria das poucas frases que Daniel<br />
Martin-McCormick aprovaria ao lí<strong>de</strong>r<br />
dos Grateful Dead.<br />
Ver crítica pág. 34 e segs.<br />
CINECONCHAS<br />
CINEMA AO AR LIVRE<br />
JULHO, 21H45<br />
QUINTAS, SEXTAS E SÁBADOS<br />
PARQUE DAS CONCHAS<br />
9<br />
10<br />
15<br />
16<br />
17<br />
<br />
<br />
22<br />
23<br />
24<br />
ENTRADA LIVRE / PARA TODAS AS IDADES<br />
A REPÚBLICA<br />
É UMA MULHER<br />
CONCERTO DE ENCERRAMENTO<br />
15 JULHO, 22H<br />
CARMINHO, LURA, MART’NÁLIA<br />
PARTICIPAÇÃO ESPECIAL CARLOS DO CARMO<br />
ALAMEDA D. AFONSO HENRIQUES<br />
ENTRADA LIVRE / M/3<br />
TODA A PROGRAMAÇÃO EM<br />
WWW.FESTASDELISBOA.COM<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
<br />
silva!<strong>de</strong>signers / andré da loba<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 23
Ao terceiro<br />
álbum,<br />
continua a<br />
haver uma<br />
atmosfera <strong>de</strong><br />
intimida<strong>de</strong>,<br />
mas as<br />
canções são<br />
mais<br />
enérgicas<br />
Há três anos, a norueguesa Hanne<br />
Hukkelberg foi responsável por um<br />
concerto inesquecível no Lux, em <strong>Lisboa</strong>.<br />
A sua música é complexa, pequenas<br />
sinfonias pop com jazz, electrónica<br />
e vários exotismos lá <strong>de</strong>ntro.<br />
Po<strong>de</strong>r-se-ia imaginar que na passagem<br />
para palco se iria per<strong>de</strong>r qualquer<br />
coisa <strong>de</strong> essencial, <strong>de</strong> tal maneira a<br />
sua música é habitada por <strong>de</strong>talhes.<br />
Mas não. Não só as proprieda<strong>de</strong>s se<br />
mantiveram intactas, como foram até<br />
apuradas.<br />
Nessa altura, a norueguesa tinha<br />
lançado dois álbuns, “Little Things”<br />
(2005) e “Rykestrasse 68” (2007). Des<strong>de</strong><br />
então criou mais uma obra, “Blood<br />
From Stone” (2009), e será sobre esta<br />
última que o concerto da próxima<br />
quarta-feira, no Teatro Maria Matos,<br />
em <strong>Lisboa</strong>, irá incidir. Se os dois primeiros<br />
registos eram constituídos por<br />
canções minuciosas, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> insinuação<br />
melódica, retocadas por instrumentos<br />
convencionais mas também<br />
por materiais sónicos menos<br />
convencionais (rodas <strong>de</strong> bicicleta, velhas<br />
máquinas <strong>de</strong> escrever, sinos, copos<br />
e outros apetrechos <strong>de</strong> cozinha),<br />
o novo álbum é diferente.<br />
“Está mais <strong>de</strong> acordo com aquilo<br />
que são as convenções da pop e do<br />
rock, embora também não seja exactamente<br />
isso”, ri-se ela, tentando explicar<br />
o que lhe ia na mente quando<br />
gravou o último álbum. “Estava saturada<br />
<strong>de</strong> fazer música com todos aqueles<br />
instrumentos estranhos que comecei<br />
por utilizar por acaso, e queria<br />
criar qualquer coisa mais convencional,<br />
mas sem esse peso <strong>de</strong> ter <strong>de</strong> ser<br />
segundo a medida padrão. É um álbum<br />
rock, talvez. É um disco <strong>de</strong> grupo,<br />
mais pensado para ser exposto<br />
em palco.”<br />
A formação que vem tocar com ela<br />
reflecte-o. Há três anos pareciam um<br />
bando <strong>de</strong> saltimbancos multi-instrumentistas<br />
em palco. Agora, serão apenas<br />
três. Hanne canta e toca guitarra.<br />
Ivar Grv<strong>de</strong>land ocupa-se da guitarra,<br />
do baixo e dos “samplers”, enquanto<br />
Kenneth Kapstad estará na bateria e<br />
na percussão. “É mais confortável<br />
viajar apenas com dois músicos e é<br />
também, <strong>de</strong> alguma forma, mais <strong>de</strong>safiante.<br />
As canções dos dois primeiros<br />
álbuns eram muito exigentes ao<br />
nível dos pormenores. Estas são mais<br />
<strong>de</strong>scarnadas e mais inteligíveis na<br />
transposição para palco.”<br />
Nas canções dos dois primeiros álbuns<br />
havia uma voz esguia que se<br />
movia por entre um torvelinho <strong>de</strong><br />
pianadas, violinos, banjos, acor<strong>de</strong>ões,<br />
harpas e manipulação <strong>de</strong> sons concretos.<br />
No terceiro, existe uma i<strong>de</strong>ia<br />
<strong>de</strong> composição mais <strong>de</strong>finida. Continua<br />
a haver uma atmosfera <strong>de</strong> intimida<strong>de</strong>,<br />
mas as canções são mais enérgicas<br />
e musculadas. Até a sua forma<br />
<strong>de</strong> cantar está diferente. Menos introspectiva<br />
e sussurrada. Agora sobressai<br />
e é virada para o exterior. Há<br />
três anos, em entrevista, dizia-nos que<br />
preferia ser comparada aos Radiohead<br />
do que à islan<strong>de</strong>sa Björk, como<br />
acontece normalmente. O terceiro<br />
álbum veio dar-lhe razão.<br />
“Na preparação para este disco ouvi<br />
uma série <strong>de</strong> coisas dos anos 80,<br />
Cocteau Twins, Sonic Youth ou Pixies,<br />
que eram algumas das bandas que me<br />
marcaram quando fiz parte <strong>de</strong> bandas<br />
rock antes <strong>de</strong> enveredar por um percurso<br />
solo.” Para além da música,<br />
existe um ou outro elemento que teve<br />
influência na feitura <strong>de</strong> qualquer<br />
disco: lugares, cida<strong>de</strong>s, países. O primeiro<br />
álbum era marcado pela atmosfera<br />
<strong>de</strong> Oslo, “pelas longas viagens <strong>de</strong><br />
bicicleta” pela cida<strong>de</strong>. O segundo era<br />
uma alusão directa aos seis meses que<br />
habitou em Berlim. O terceiro foi concebido<br />
num dos recantos mais isolados<br />
da Noruega, na ilha <strong>de</strong> Senja, 300<br />
quilómetros a norte do círculo polar<br />
Há três anos dizia<br />
que preferia<br />
ser comparada aos<br />
Radiohead do que<br />
à islan<strong>de</strong>sa Björk.<br />
O novo álbum veio<br />
dar-lhe razão<br />
árctico, on<strong>de</strong> permaneceu durante<br />
sete meses.<br />
“Depois <strong>de</strong> ter composto um disco<br />
numa cida<strong>de</strong> tão vibrante como Berlim,<br />
e <strong>de</strong> viajar um pouco por todo o<br />
lado, tinha necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estar num<br />
lugar sossegado. Talvez por isso, como<br />
reacção ao facto <strong>de</strong> estar num<br />
lugar tão tranquilo, o álbum acabou<br />
por adquirir uma forma mais enérgica<br />
do que pensava no início.”<br />
Agora está, outra vez, numa cida<strong>de</strong><br />
agitada. Vive há seis meses em Nova<br />
Iorque, mais exactamente em<br />
Brooklyn, o bairro on<strong>de</strong> parece viver<br />
toda a gente que é gente na música.<br />
Em gestação está um novo álbum.<br />
“Tem sido óptimo estar aqui, dar concertos,<br />
conhecer pessoas, mergulhar<br />
no ambiente, mas não vim para<br />
Brooklyn com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fazer qualquer<br />
coisa <strong>de</strong> específico. Aconteceu,<br />
apenas. O ambiente on<strong>de</strong> se cria é<br />
importante, mas o mais <strong>de</strong>terminante<br />
é aquilo que se quer, as pessoas<br />
com quem estamos, as possibilida<strong>de</strong>s<br />
e as ferramentas que se têm à mão.”<br />
O seu percurso tem sido feito <strong>de</strong><br />
aparentes contradições. Começou a<br />
cantar no coro da igreja, passou por<br />
bandas <strong>de</strong> metal, acabou a criar fantasias<br />
pop. O disco que vem apresentar<br />
a Portugal é mais pragmático que<br />
os anteriores, mas aquilo que lhe interessa<br />
é a criação <strong>de</strong> um universo<br />
encantado, inspirado em lugares reais.<br />
De preferência, sítios que preencham<br />
uma condição importante — on<strong>de</strong><br />
se possa circular à-vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> bicicleta.<br />
“Não posso viver sem isso.”<br />
Ver agenda <strong>de</strong> concertos pág. 38 e segs.<br />
Música<br />
Os lugares <strong>de</strong><br />
Hanne Hukkelberg<br />
Oslo, Berlim, Ilha <strong>de</strong> Senja, Brooklyn. É esta a geografia íntima <strong>de</strong> Hanne Hukkelberg, a cantora<br />
norueguesa que cria fantasias pop a partir dos lugares on<strong>de</strong> habita. Quarta-feira é a vez <strong>de</strong><br />
<strong>Lisboa</strong>. Vítor Belanciano<br />
24 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
A Optimus Discos lança “Os Dias <strong>de</strong> Raiva”, um projecto original do Pacman.<br />
Vai a www.optimusdiscos.com no teu computador ou telemóvel e faz<br />
download grátis. Aproveita também as edições limitadas nas lojas Fnac<br />
por apenas €4,90. Há um novo som na área.
Miles Cleret <strong>de</strong>u bom<br />
ao Panamá e à Colô<br />
Nunca ninguém tinha posto tão ao claro a gran<strong>de</strong>za da música africana e da América Latina.<br />
SoundWay, Miles Cleret mostrou que os negros estavam muito à frente. Foi ele que nos reedu<br />
Um tipo<br />
precoce, Miles<br />
Cleret tornouse<br />
DJ aos 14<br />
anos e<br />
investiga<br />
música<br />
africana<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os 17<br />
Música<br />
“Em Inglaterra,<br />
a ‘world music’ era<br />
o cúmulo do ‘uncool’.<br />
Eu mostrei-lhes<br />
que não era assim,<br />
que era música com a<br />
qual se podiam<br />
i<strong>de</strong>ntificar”<br />
Ao leme da sua editora SoundWay,<br />
Miles Cleret <strong>de</strong>itou cá para fora alguma<br />
da mais extraordinária música<br />
alguma vez feita: cumbias, salsas,<br />
calypsos, highlife, disco, géneros obscuros<br />
mesmo nos seus países <strong>de</strong> origem,<br />
como o Gana, a Nigéria, a Colômbia<br />
e o Panamá. O príncipe da<br />
“world music” não purista esteve entre<br />
nós.<br />
Seis da tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> sábado passado e<br />
ali para os lados da esplanada do Centro<br />
<strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna da Fundação<br />
Gulbenkian, em <strong>Lisboa</strong>, tudo ia bem:<br />
os passantes apessoavam-se do pequeno<br />
espaço e <strong>de</strong>ixavam-se embalar<br />
pela estranha música que um tipo<br />
com ar pachola ia escolhendo meticulosamente.<br />
Era um cenário familiar — no sentido<br />
em que famílias (pai, mãe, filhos,<br />
avós também) passavam, ouviam,<br />
gostavam e por ali ficavam mais um<br />
pouco. Ao todo, não <strong>de</strong>vem ter estado<br />
mais <strong>de</strong> 30 pessoas <strong>de</strong> cada vez, mas<br />
do que vimos não houve ninguém que<br />
passasse e ficasse indiferente.<br />
Tudo graças ao apurado ouvido do<br />
sujeito que cuidava da selecção dos<br />
vinis, um moço alto, <strong>de</strong> cabelo a ameaçar<br />
chegar aos ombros (com pontas<br />
rebel<strong>de</strong>s “ma non troppo”), vestido<br />
<strong>de</strong> boné e uma camisa preta que nos<br />
dias seguintes trocaria por padrões<br />
havaianos.<br />
O nome <strong>de</strong>le é Miles Cleret e não é<br />
um DJ qualquer a quem a Fundação<br />
Gulbenkian pediu que entretesse os<br />
passantes <strong>de</strong> sábado à tar<strong>de</strong>. Ele é o<br />
fundador e i<strong>de</strong>ólogo da SoundWay,<br />
possivelmente a melhor editora do<br />
mundo no negócio <strong>de</strong> reedições <strong>de</strong><br />
música africana e da América Latina<br />
— ou seja, aquilo a que hoje, com medo,<br />
chamamos música preta.<br />
Miles dobrava-se para as suas malas<br />
e <strong>de</strong> lá saltava um vinil raro, isto vez<br />
após vez após vez, levando as gentes<br />
não a um estado <strong>de</strong> euforia (não há<br />
euforias à tar<strong>de</strong>), mas sim <strong>de</strong> libertação<br />
do corpo sem recurso a drogas<br />
ou excesso <strong>de</strong> álcool. Bastou, para tal,<br />
recorrer a cumbias, salsas, psica<strong>de</strong>lismos,<br />
funks e que mais. Nigérias,<br />
Ganas, Colômbias, Panamás.<br />
Um mundo admirável que, já antes<br />
da SoundWay aparecer, <strong>de</strong>sconfiávamos<br />
existir, mas só graças à editora<br />
<strong>de</strong> Miles pu<strong>de</strong>mos fruir na sua inteireza.<br />
E não coisa pequena: foi Cleret<br />
que tornou homens Victor Olaya, Oscar<br />
Sulley ou Joe Mensah em heróis.<br />
Foi ele quem mais fez pela total reescrita<br />
do cânone musical da segunda<br />
meta<strong>de</strong> do século XX, com as suas<br />
constantes compilações temáticas,<br />
resgatando “singles” esquecidos ou<br />
nunca editados, na sua maior parte<br />
gravados nas décadas <strong>de</strong> 1960 e 1970.<br />
Foi ele que nos mostrou que os negros<br />
estavam muito à frente. Foi ele que<br />
nos reeducou na arte da dança.<br />
O primeiro gran<strong>de</strong> sucesso da SoundWay<br />
surgiu logo<br />
ao primeiro ro CD (antes<br />
só tinha havido “singles”): “Ghana<br />
Soundz”, editado em 2002, mostrava<br />
ao mundo as maravilhas <strong>de</strong> um género<br />
chamado ado “highlife”, feito <strong>de</strong> guitarras<br />
rendilhadas e ritmos em constante<br />
tropeção. Não era uma obraprima<br />
absoluta como “Guitar and The<br />
Gun”, a melhor compilação <strong>de</strong> pre <strong>de</strong>dicada ao “highlife” do Gana,<br />
mas estava perto. E não teria existido<br />
se não fosse a obsessão <strong>de</strong> Cleret.<br />
sem-<br />
Em 200101 Miles estava no Gana, “na<br />
casa <strong>de</strong> um amigo” e o amigo “punha<br />
disco após disco <strong>de</strong> música do Gana”<br />
e os discos eram “ todos espantosos”.<br />
Logo ali, contou-nos Miles, ficou “com<br />
vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> editar aquele material”.<br />
Seguiu-se e o óbvio: “Falei com várias<br />
editoras mas elas não quiseram editar<br />
aquelas canções”. Como é que fazem<br />
aqueles que foram educados na tura punk? DIY, não é? Exacto: “Por<br />
isso, resolvi editar eu próprio”.<br />
cul-<br />
E assim nasceu a SoundWay, apenas<br />
e só para que o mundo, uma pequena<br />
parte do mundo pu<strong>de</strong>sse ouvir<br />
aquelas canções.<br />
Perfil <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>dor<br />
Mas mesmo mo isto foi, <strong>de</strong> certa forma,<br />
um acaso. Foi o Gana, como podia ter<br />
sido outro país qualquer. Acontece<br />
que há uma década Cleret “viajava<br />
muito”. Queria “conhecer África” e,<br />
sem saber a que país ir primeiro, op-<br />
tou pelo Gana por uma razão simples:<br />
“Todas as pessoas que eu conhecia<br />
do Gana eram extremamente simpáticas”.<br />
Mal recebeu as negas das editoras,<br />
Cleret, assombrado pela beleza <strong>de</strong><br />
tudo o que ouvira, sou ao Gana <strong>de</strong>cidido<br />
a compilar material<br />
regres-<br />
para editar. Isto,<br />
note-se, não<br />
era a vida <strong>de</strong>le,<br />
mas há<br />
muito que<br />
ele sabia<br />
que mais cedo ou mais tar<strong>de</strong> seria a<br />
sua vida. Durante anos tinha aguentado<br />
com “trabalhos <strong>de</strong> merda só para<br />
po<strong>de</strong>r viajar e comprar discos”. Na<br />
altura em que <strong>de</strong>scobriu o Gana “trabalhava<br />
à comissão, em vendas”. “O<br />
meu pai trabalhava em publicida<strong>de</strong>,<br />
por isso acho que tenho um lado <strong>de</strong><br />
ven<strong>de</strong>dor, que é essencial num negócio<br />
<strong>de</strong>stes”, conta, sem pudores nem<br />
manias (Miles é um tipo absolutamente<br />
à-vonta<strong>de</strong>).<br />
Dessa segunda vez, esteve no Gana<br />
um mês — foi só aí que percebeu “a<br />
quantida<strong>de</strong> enorme <strong>de</strong> música extraordinária<br />
ria que nunca nca tinha saído <strong>de</strong><br />
lá”. Tinha os dias<br />
mais que ocupados:<br />
os:<br />
havia que “fazer listas <strong>de</strong> pessoas soas<br />
com<br />
quem <strong>de</strong>via falar, bater a portas,<br />
ouvir gravações <strong>de</strong> discos<br />
que nunca tinha ouvido”.<br />
Tudo para reunir<br />
suficiente material<br />
para uma compila-<br />
ção.<br />
“Começava a<br />
minha saga às sete<br />
da manhã e acaba<br />
doze ou catorze ho-<br />
ras <strong>de</strong>pois”, conta.<br />
“Em certos dias não<br />
encontrava nada,<br />
enquanto noutros<br />
dava <strong>de</strong> caras<br />
com<br />
um tipo<br />
que<br />
tinha 50<br />
discos. Ia<br />
juntando as pe-<br />
ças e construinn<br />
do uma narrativa<br />
do que foi<br />
aquela música.”<br />
Um mês <strong>de</strong>pois,<br />
“Ghana<br />
Soundz” estava<br />
pronto. Em oito<br />
anos ven<strong>de</strong>u 15 mil<br />
exemplares — ele só<br />
queria que ven<strong>de</strong>sse<br />
quatro mil, <strong>de</strong> modo a<br />
pagar as <strong>de</strong>spesas, “com<br />
as viagens incluídas”.<br />
Do Gana foi para a Nigéria,<br />
a seguir Colômbia e<br />
Panamá. A lista <strong>de</strong> discos<br />
da SoundWay foi-se tornando<br />
gradualmente<br />
mais preciosa:<br />
em 2004<br />
lançou “Afro-Baby: The Revolution of<br />
the Afro-Sound In Nigeria 1970-1979”.<br />
No mesmo ano editou o segundo volume<br />
<strong>de</strong> “Ghana Soundz” e o extraordinário<br />
“The Kings of Benin Urban<br />
Groove 1972-1980”, uma compilação<br />
do melhor da Orchestre Poly-Rhytmo,<br />
que ainda recentemente tocou em<br />
Portugal.<br />
Mas a gran<strong>de</strong> novida<strong>de</strong> veio em<br />
2006, quando lançou “Panama!”, uma<br />
colectânea dos milhentos géneros bastardos<br />
que fizeram furor nas caves do<br />
país durante as décadas <strong>de</strong> 1960 e<br />
1970. Nunca ninguém tinha posto tão<br />
ao claro a gran<strong>de</strong>za da música da Amé-<br />
rica<br />
do<br />
Sul (ex-<br />
26 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
nome<br />
ômbia<br />
Fundador e i<strong>de</strong>ólogo da editora<br />
cou na arte da dança. João Bonifácio<br />
ceptuando os tangos e os sambas dos<br />
países do costume). “Panama!” foi um<br />
sucesso tão gran<strong>de</strong> que, entretanto,<br />
já saíram “Panama! 2” e Panama! 3”,<br />
qual <strong>de</strong>les o melhor.<br />
A seguir veio “Colombia!”, outro<br />
estrondo <strong>de</strong> miscigenação musical.<br />
Seguiram-se várias compilações <strong>de</strong>dicadas<br />
à Nigéria (ao blues, ao highlife,<br />
ao disco local) e um disco inteiro<br />
só com temas do genial guitarrista Sir<br />
Victor Uwaifo, “Guitar-Boy Superstar<br />
1970-1976”. Destaque ainda para o<br />
fabuloso “Tumbelélé”, para “Palenque<br />
Palenque” e para as magistrais<br />
reedições do enorme Geraldo Pino.<br />
Isto, obviamente, é uma obra <strong>de</strong><br />
amor.<br />
“Não sei fazer mais nada”, dizia-nos<br />
Miles no seu jeito <strong>de</strong>sassombrado <strong>de</strong><br />
olhar o mundo. “O meu pai era melómano.<br />
Tornei-me DJ aos 14 anos,<br />
mas não fazia dinheiro nenhum. Isto<br />
é o que sempre me interessou: procurar<br />
discos. Investigo este tipo <strong>de</strong><br />
música <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os 17 anos. Mas mesmo<br />
em Londres, com todas as comunida<strong>de</strong>s<br />
africanas que lá existem, era difícil<br />
ter acesso a estes discos. Só se encontrava<br />
a ponta do icebergue. Na<br />
altura ouvia muito funk americano e<br />
hip-hop. Interessei-me por afrobeat<br />
e foi a partir daí que comecei a ouvir<br />
música africana.”<br />
Durante anos, tudo o que dizia respeito<br />
à SoundWay era feito por Miles.<br />
“Era eu que viajava, escolhia, encontrava<br />
pessoas <strong>de</strong>saparecidas há 35<br />
anos, fazia os contratos, colava as embalagens,<br />
enviava os discos.”<br />
De entre as múltiplas tarefas <strong>de</strong>correntes<br />
da sua função, uma é mais importante<br />
que as outras: escrever os<br />
textos. “Hoje, para ven<strong>de</strong>r os discos,<br />
é preciso oferecer mais que música.<br />
Os textos das nossas compilações são<br />
essenciais para explicar a história da<br />
música, das migrações, da colonização.”<br />
Andar atrás da música<br />
Apenas para que se perceba como<br />
esta indústria é pequena, conte-se a<br />
história que levou à feitura <strong>de</strong> “Panama!”.<br />
“Eu tinha encontrado uns discos<br />
no eBay e, mal os ouvi, comprei<br />
bilhetes <strong>de</strong> avião para ir lá. Depois,<br />
acabei por falar com o tipo a quem<br />
tinha comprado coisas no eBay, o Enrico,<br />
que morava na Costa Rica e me<br />
ajudou a procurar as coisas certas.”<br />
Tão simples quanto isto: um tipo que<br />
ele nunca tinha visto ajudou-o a encontrar<br />
os discos certos. “Não tenho<br />
dúvidas que não teria este sucesso<br />
sem a Internet”, conta.<br />
“Isto é um mercado muito pequeno,<br />
mas alguns <strong>de</strong>stes tipos que agora reeditamos<br />
eram gran<strong>de</strong>s estrelas antigamente.<br />
Alguns não acreditam que<br />
na melhor das hipóteses só ven<strong>de</strong>mos<br />
10 mil discos. Porque antes vendiam<br />
facilmente 100 mil. Claro que não estão<br />
cheios <strong>de</strong> dinheiro, porque em muitos<br />
casos foram enganados por produtores<br />
que só queriam o dinheiro.”<br />
O mais porreiro <strong>de</strong>stes anos a divulgar<br />
música “é que algumas faixas<br />
foram usadas em filmes ou sampladas<br />
por tipos do hip-hop em canções que<br />
acabaram vendidas em anúncios —<br />
tipos como Usher. Graças a ele, já pu<strong>de</strong><br />
entregar um cheque <strong>de</strong> 40 mil<br />
dólares a músicos que não faziam dinheiro<br />
há muitos anos”.<br />
O curioso é verificar como entretanto<br />
as coisas mudaram: “Voltei ao<br />
Gana há pouco tempo e os discos agora<br />
valem <strong>de</strong>z vezes mais na rua”. Sempre<br />
<strong>de</strong> pés na terra, Miles <strong>de</strong>sconfia<br />
que a febre actual com Ganas e Nigérias<br />
“não vai durar, como a febre com<br />
o reggae ou o funk não duraram”. E,<br />
sem vergonhas, diz que vai “ficar cansado<br />
disto”. “Não da música”, acrescenta,<br />
“mas <strong>de</strong> andar atrás <strong>de</strong>la”.<br />
Mas, ao menos, já <strong>de</strong>ixou um legado.<br />
“Em Inglaterra, a ‘world music’<br />
era o cúmulo do ‘uncool’. As pessoas<br />
pensavam em música <strong>de</strong> África e da<br />
América Latina como ‘world music’<br />
e eu mostrei-lhes que não era assim,<br />
mostrei-lhes que era música com a<br />
qual se podiam i<strong>de</strong>ntificar.”<br />
Os brancos “cool” agora po<strong>de</strong>m<br />
dançar ao som <strong>de</strong> pretos “uncool”<br />
que ninguém conhece. E isso só dá<br />
saú<strong>de</strong>.<br />
Ver crítica <strong>de</strong> discos pág. 34 e segs.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 27
Teatro<br />
À frente do importante Théâtre <strong>de</strong> le<br />
Ville, em Paris, Emmanuel Demarcy-<br />
Mota, 40 anos, filho <strong>de</strong> pai francês e<br />
mãe portuguesa, habita o teatro <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
cedo. A sua relação com os textos<br />
fundamentais da dramaturgia mundial,<br />
dos quais já vimos “Seis personagens<br />
em busca <strong>de</strong> um autor”, <strong>de</strong><br />
Piran<strong>de</strong>llo (CCB, 2003), “Rinoceronte”,<br />
<strong>de</strong> Ionesco (S. João e D. Maria,<br />
2006), “Tanto Amor Desperdiçado<br />
(D. Maria, 2007), <strong>de</strong> Shakespeare e<br />
“Homem por Homem”, <strong>de</strong> Brecht (D.<br />
Maria, 2007), está novamente presente<br />
em “Casimiro e Carolina”, <strong>de</strong> Odon<br />
von Horvath, peça com a qual regressa<br />
ao Festival <strong>de</strong> Almada, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
Piran<strong>de</strong>llo e Ionesco.<br />
Estreada em 2009, mas pensada<br />
“muito antes da crise”, diz-nos em<br />
entrevista, “é uma peça que prevê o<br />
que se vai passar”. Situada em 1929,<br />
portanto, anunciando a ascensão do<br />
nazismo, reflecte sobre as relações<br />
entre diferentes figuras que Demarcy-<br />
Mota não quer ver tratadas “pela melancolia”,<br />
numa festa da cerveja numa<br />
floresta. Temas como o <strong>de</strong>semprego<br />
e as dificulda<strong>de</strong>s económicas, a ambição<br />
e a inveja, estão presentes num<br />
texto que, segundo o encenador “não<br />
precisa ser actualizado, é actual”. A<br />
pequena história cruza-se com a gran<strong>de</strong><br />
história, num exercício <strong>de</strong> reflexão<br />
que o encenador utiliza para se dirigir<br />
à responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada um na<br />
previsão da catástrofe.<br />
A escolha, diz Demarcy-Mota, “implica<br />
uma responsabilida<strong>de</strong>”. “Fazer<br />
teatro também”, acrescenta.<br />
É comum encontrarmos no<br />
seu trabalho uma distância<br />
em relação ao que é proposto<br />
pelo autor, mas não estamos<br />
exactamente perante uma<br />
simplificação dos textos,<br />
que facilite a sua inscrição<br />
contemporânea. É uma<br />
preocupação?<br />
Não me interessa falar senão das intuições.<br />
Esta peça interessa-me por<br />
isso, primeiro as intuições, <strong>de</strong>pois o<br />
trabalho sobre elas. Discuto muito<br />
com François Regnault, o tradutor,<br />
vemos as versões em inglês, em alemão,<br />
e escolhemos as palavras em<br />
francês que sirvam o que queremos<br />
dizer. Há uma responsabilida<strong>de</strong> e é<br />
por isso que é um trabalho esgotante<br />
que dura dois ou três meses. Depois<br />
retiro todas as didascálias, todas as<br />
<strong>de</strong>scrições, nem mesmo os actores as<br />
sabem, ficam só os diálogos.<br />
Nessa recusa <strong>de</strong> transposição<br />
para a contemporaneida<strong>de</strong>,<br />
permanecemos num território<br />
abstracto, sem um tempo, quase<br />
imaginário. Como se todas as<br />
suas peças habitassem uma terra<br />
<strong>de</strong> ninguém.<br />
A questão me interessa, nesta peça,<br />
é o que significa 1929 hoje. Não me<br />
apetece recriar 1929, não sei o que é,<br />
não estava lá. E o hoje, por si só, também<br />
não me interessa, preciso dos<br />
dois. Preciso do concreto. No caso dos<br />
figurinos, por exemplo — e tenho<br />
gran<strong>de</strong>s discussões com a figurinista<br />
—, há personagens que têm ténis comprados<br />
na feira da ladra e, ao lado,<br />
uma que tem um chapéu do fim do<br />
século XIX.<br />
Sugerindo um diálogo com o<br />
tempo teatral e não com o tempo<br />
real?<br />
É uma questão difícil para mim. É o<br />
tempo teatral que me leva à realida<strong>de</strong>,<br />
é o tempo teatral que também dá conta<br />
da realida<strong>de</strong>. O que me interessa<br />
nesta peça não é a melancolia, mas o<br />
pessimismo que a peça transporta.<br />
De qualquer forma, há sempre<br />
um lugar privilegiado para o<br />
sentido das palavras. A escolha<br />
dos autores é feita sabendo<br />
também o po<strong>de</strong>r das palavras,<br />
como as trabalhar e apresentar?<br />
Sentimos sempre que, no fim,<br />
o essencial, o que se queria dar<br />
a ver, era o texto, e as imagens<br />
estão lá para servir...<br />
Para servir ou estar ao lado, não estou<br />
certo.<br />
Li numa entrevista que se tivesse<br />
feito esta peça há uns anos seria<br />
sobre a juventu<strong>de</strong>.<br />
É verda<strong>de</strong>. É uma peça que conheço<br />
há muito tempo. Que gostava <strong>de</strong> ter<br />
montado quando tinha 25 anos.<br />
Po<strong>de</strong>m montar-se textos <strong>de</strong>stes<br />
quando não se tem ainda uma<br />
experiência <strong>de</strong> vida tão rica, tão<br />
múltipla?<br />
Se aos 25 ou 30 tivesse feito esta peça,<br />
seria, <strong>de</strong> facto, sobre a juventu<strong>de</strong>, o<br />
protagonista seria um jovem, e não<br />
um actor <strong>de</strong> 60 anos, que é frágil apenas<br />
aparentemente. Talvez não resultasse,<br />
não sei. Não haveria uma pesquisa<br />
precisa sobre o peso <strong>de</strong> uma<br />
existência, e sobretudo existência no<br />
início do século XX. Para mim, todas<br />
as questões da peça estão presentes<br />
na imagem inicial, podíamos terminar<br />
o espectáculo ali. Aqui estão eles, em<br />
Emmanuel Demarcy-Mota<br />
O teatro sem artifícios<br />
Emmanuel Demarcy-Mota faz <strong>de</strong> “Casimiro e Carolina”, <strong>de</strong> Odon von Horvath, um gran<strong>de</strong><br />
fresco teatral, impondo uma leitura pessimista no que podia ser só melancolia. Hoje no S. João,<br />
e dias 15 e 16 no D. Maria, o futuro que não se imaginava em 1929 alerta-nos para o presente<br />
em que vivemos. Tiago Bartolomeu Costa, em Paris<br />
28 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
“Para mim, o teatro<br />
está entre a infância<br />
e o científico, nas<br />
questões que coloca<br />
ao mundo. Não há<br />
senão hipóteses.<br />
Um espectáculo<br />
transporta uma nova<br />
hipótese sobre<br />
uma questão”<br />
grupo, atrás umas sombras, um fresco.<br />
Podíamos agra<strong>de</strong>cer, dizer “boa<br />
noite”, fazer <strong>de</strong>scer a cortina e ir embora.<br />
Porque procura, também, um<br />
trabalho ao nível da imagem,<br />
mas uma imagem rente à carne,<br />
perto do osso?<br />
Sim, on<strong>de</strong> os actores se expõem. É<br />
um espectáculo fisicamente muito<br />
duro. Mas é preciso que isso passe<br />
pelo cenário, pela maquinaria <strong>de</strong> cena,<br />
pelo actor, que exista em todo o<br />
espectáculo e não apenas num aspecto.<br />
O cenário não me interessa. Fiz<br />
espectáculos on<strong>de</strong> o cenário falhou,<br />
não era o que queria. Há coisas <strong>de</strong> que<br />
gosto e outras <strong>de</strong> que não gosto. Nesta<br />
gosto <strong>de</strong> quase tudo. É como se o<br />
cenário fosse uma máquina <strong>de</strong> <strong>de</strong>struição.<br />
É preciso que se passe qualquer<br />
coisa física entre a maquinaria<br />
e o actor.<br />
Para que se torne real?<br />
[longa pausa] Para que encontre uma<br />
realida<strong>de</strong>, se é para ser real, não sei.<br />
Não sei o que é o real.<br />
Porque quando falamos <strong>de</strong><br />
artificial, e <strong>de</strong> artificialida<strong>de</strong>,<br />
é sempre ambicionando uma<br />
proximida<strong>de</strong> com o real.<br />
Absolutamente. Gosto imenso do que<br />
dizia Grotowski sobre o artificial. Na<br />
mesma palavra está contido o termo<br />
“arte” e “fictício”. É uma palavra com<br />
diferentes significados. Há o lado do<br />
artifício, que é falso, que está longe<br />
da realida<strong>de</strong>, há “artefacto”, e é partindo<br />
disso que trabalho. A imagem<br />
está ao serviço do texto, talvez. Mas<br />
eu não o diria, ou pelo menos não<br />
<strong>de</strong>sse modo. De qualquer forma, não<br />
acredito num teatro on<strong>de</strong> exista uma<br />
fabricação da imagem, o teatro <strong>de</strong>ve<br />
sustentar-se numa outra coisa. Já o<br />
experimentei, em três ou quatro momentos,<br />
mas são dois campos paralelos.<br />
O que se sente nas suas peças é<br />
que se pe<strong>de</strong> aos espectadores<br />
para procurarem não tanto<br />
compreen<strong>de</strong>r, mas estarem<br />
presentes e dialogar com o que<br />
é proposto. Como se fosse mais<br />
importante ser-se intuitivo antes<br />
<strong>de</strong> se ser racional.<br />
Sim, e isso passa muito pela minha<br />
experiência <strong>de</strong> espectador. Comecei<br />
a ver espectáculos muito novo, e houve<br />
muitos que, mesmo não os compreen<strong>de</strong>ndo,<br />
me <strong>de</strong>ixavam muito<br />
feliz, porque me perguntavam o que<br />
havia ali que eu pu<strong>de</strong>sse investir. Só<br />
mais tar<strong>de</strong> é que surge a elaboração<br />
a partir da intuição.<br />
Há, ao mesmo tempo, um<br />
trabalho sobre a hierarquia dos<br />
elementos cénicos, anulando<br />
uma construção em pirâmi<strong>de</strong>?<br />
Completamente. Mas eu gosto <strong>de</strong> contar<br />
histórias. E gosto que mas contem.<br />
Po<strong>de</strong>mos contá-las <strong>de</strong> diferentes formas,<br />
pelo inverso, linearmente, mas<br />
as histórias são importantes. E essa é<br />
uma noção que foi muito criticada,<br />
por exemplo, em França, porque implicava<br />
contar as histórias entendidas<br />
como valores tradicionais. Eu não<br />
acredito nisso. O efeito teatral po<strong>de</strong><br />
passar por contar as histórias.<br />
Quando falamos <strong>de</strong> texto<br />
falamos <strong>de</strong> um texto enquanto<br />
elemento escrito porque, <strong>de</strong>pois,<br />
há todo o texto que existe no<br />
corpo, na luz...<br />
Sim, quando falo do texto falo no sentido<br />
primário das palavras, a presença<br />
das palavras, a sonorida<strong>de</strong> das palavras.<br />
Adoro as sonorida<strong>de</strong>s, as vozes<br />
diferentes dos actores que contrastam,<br />
que são particulares. Quando<br />
ensaio penso no som e no modo como<br />
<strong>de</strong>senha uma arquitectura espacial.<br />
Depois há o sentido da frase e o sentido<br />
geral. Mas gosto <strong>de</strong> contar histórias<br />
e <strong>de</strong> voltar a elas. Por exemplo,<br />
no próximo ano voltarei a “Rinoceronte”,<br />
<strong>de</strong> Ionesco. Quero contá-la,<br />
mas ao contrário.<br />
Porque a sua relação com o texto<br />
mudou?<br />
Mudou a minha relação com o próprio<br />
espectáculo. A peça conta uma<br />
catástrofe, e quero partir, não da previsão<br />
<strong>de</strong>ssa catástrofe, mas do fim,<br />
quando o homem está sozinho. Quero<br />
trabalhar sobre a i<strong>de</strong>ia da cumplicida<strong>de</strong>,<br />
quando já se sabe o que aconteceu<br />
e qual a nossa responsabilida<strong>de</strong><br />
hoje, quando já conhecemos a catástrofe.<br />
Penso que a conhecemos, não<br />
vale a pena lamentarmo-nos. Os franceses<br />
lamentam-se muito, os portugueses<br />
também. É uma questão que<br />
diz muito a autores da Europa Central,<br />
como Ionesco, <strong>de</strong> pai romeno e<br />
mãe francesa, mas também Horvath<br />
e Kafka.<br />
Pegando nessa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
cumplicida<strong>de</strong> e catástrofe:<br />
em “Casimiro e Carolina”,<br />
se reconhecemos que há a<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolher,<br />
não po<strong>de</strong>mos dizer que fomos<br />
surpreendidos pelo que<br />
aconteceu. A sua apresentação<br />
é uma reflexão sobre o modo<br />
como o teatro, ou o dispositivo<br />
teatral, se po<strong>de</strong> dirigir aos<br />
outros e clamar que a inocência<br />
não é uma <strong>de</strong>sculpa?<br />
Sim. A inocência, pelo menos em<br />
francês tem um sentido ligado à infância<br />
e que está ligado à capacida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> maravilhamento. Interessa-me a<br />
ingenuida<strong>de</strong> no sentido não pejorativo<br />
mas no gran<strong>de</strong> sentido do termo.<br />
Da gran<strong>de</strong> ingenuida<strong>de</strong> do homem<br />
perante as gran<strong>de</strong>s questões: o que é<br />
o céu, o que são as estrelas, porque é<br />
que a terra é redonda? Os cientistas<br />
fazem as mesmas perguntas que as<br />
crianças quando olham o mundo. Para<br />
mim, o teatro está entre a infância<br />
e o científico, nas questões que coloca<br />
ao mundo. Não há senão hipóteses.<br />
E um espectáculo transporta uma nova<br />
hipótese sobre uma questão. Ionesco<br />
e Horvath tinham, para mim,<br />
guardada uma parte da infância. Horvath<br />
ainda tem uma parte da infância<br />
nele, que vai ser <strong>de</strong>struída. Quando<br />
Ionesco escreve que viu o seu pai<br />
transformar-se em monstro, na Roménia<br />
fascista, é <strong>de</strong> alguém que, em<br />
criança, vê a infância ser transformada.<br />
Isso é uma questão muito pessoal<br />
que se relaciona com o olhar que<br />
achamos que as crianças têm, mas<br />
que não é o olhar que elas mesmas<br />
têm sobre o mundo.<br />
“Casimiro e<br />
Carolina”:<br />
Demarcy-<br />
Mota diz que<br />
“é como se o<br />
cenário fosse<br />
uma máquina<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>struição”<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 29
O que propõe<br />
é uma reflexão<br />
do papel do<br />
espectador, da sua<br />
responsabilida<strong>de</strong><br />
em trabalhar<br />
com aquilo que lhe<br />
é apresentado, não se<br />
colocando à margem?<br />
Exactamente. Quando fiz “Homem<br />
por Homem” houve pessoas que saíram<br />
e me disseram que era complicado,<br />
perguntaram-me o que <strong>de</strong>viam<br />
pensar. Foi a primeira vez que me irritei<br />
a sério. “Que quer Galy Gay? Ele<br />
quer ser outro homem, ele quer ser<br />
um monstro?”, disseram-me. “Atenção,<br />
tens o direito <strong>de</strong> reflectir”, respondi.<br />
Estamos numa época on<strong>de</strong> o<br />
teatro, pelo texto — e falo por mim<br />
que não sou coreógrafo, não sou artista<br />
visual, e preciso do texto, não o<br />
sei fazer <strong>de</strong> outra forma — me permite<br />
interrogar o outro sobre o que eu<br />
penso que po<strong>de</strong> ser importante. Ou<br />
então dizemos que Horvath não tem<br />
interesse, nem Ionesco, nem Brecht,<br />
e que as questões que eles colocam<br />
não são pertinentes.<br />
Seria necessário encontrar<br />
autores contemporâneos que<br />
trabalhassem sobre os mesmos<br />
temas com um ponto <strong>de</strong> vista<br />
diferente.<br />
Mas essa questão do lugar do espectador<br />
face a essas imagens está no<br />
modo como o espectáculo é construído,<br />
nesse lugar que é o teatro-edifício.<br />
E isso é o mais importante. Às<br />
vezes saio e penso que os espectadores<br />
não estavam lá. Não quero ser<br />
dogmático mas se isso persistir, esse<br />
abaixamento do nível <strong>de</strong> exigência,<br />
então será o político que vai ganhar<br />
na discussão do lugar da arte na socieda<strong>de</strong>.<br />
E o papel do espectador é<br />
fundamental. É preciso um pouco <strong>de</strong><br />
arrojo.<br />
Discutem-se apenas as formas, mas<br />
poucas vezes o sentido. Não estou a<br />
falar da qualida<strong>de</strong> artística, mas do<br />
<strong>de</strong>bate artístico.<br />
Isso porque as pessoas têm uma<br />
memória <strong>de</strong> peixe...?<br />
Sim, é por isso que monto estas peças,<br />
porque tenho a impressão que as pessoas<br />
ficam surpresas quando se fala<br />
<strong>de</strong> crise, que se esquecem que houve<br />
uma II Guerra Mundial, que a Shoah<br />
aconteceu. Paremos. Um pouco <strong>de</strong><br />
dignida<strong>de</strong>, por favor. Há escolhas difíceis<br />
a fazer e <strong>de</strong>vem ser difíceis — se<br />
forem fáceis não são importantes.<br />
A escolha pe<strong>de</strong>-nos uma<br />
posição?<br />
Sim, uma posição que vai criar contrastes<br />
e dificulda<strong>de</strong>s em cada um. As<br />
coisas discutem-se. A televisão impõe<br />
a ausência <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> individual,<br />
mas a escolha <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>finida pelas<br />
dificulda<strong>de</strong>s. Quando Bérenger diz<br />
em “Rinoceronte”, que não po<strong>de</strong> ser<br />
um rinoceronte, quer mas não po<strong>de</strong>,<br />
isso interessa-me. Se uma pessoa diz<br />
que não po<strong>de</strong> ser racista ou anti-semita<br />
em vez <strong>de</strong> dizer que não o quer<br />
ser, essa é uma escolha moral. E, aí,<br />
preciso <strong>de</strong> um autor que trabalhe isto<br />
<strong>de</strong> verda<strong>de</strong>, e estes autores tiveram<br />
tempo <strong>de</strong> as pensar.<br />
Há uma distância temporal em<br />
relação ao texto que nos permite<br />
i<strong>de</strong>ntificar esse tratamento dado<br />
ao pensamento.<br />
Sim. Por vezes gosto que as coisas não<br />
sejam completamente realistas, e que<br />
existam formas que quando as vemos<br />
não resultem numa discussão natu-<br />
Casimiro<br />
e Carolina<br />
De Odon von Horvath<br />
Encenação <strong>de</strong> Emmanuel<br />
Demarcy-Mota<br />
6ª, 9, no Teatro S. João<br />
Dias 15 e 16 no Teatro<br />
D. Maria II<br />
ralista e teatral. É<br />
isso que procuro.<br />
Há um natural no<br />
teatro?<br />
Não. Preciso que as coisas<br />
tenham uma forma.<br />
Quando aos 18 anos vi “O Sétimo<br />
Selo”, do Bergman, ou os filmes<br />
do Visconti, estava perante uma<br />
“mise-en-forme”, mas hoje o que se<br />
discute é o gosto, a estética. Há espectáculos<br />
dos quais gosto imenso mas<br />
que <strong>de</strong>testo. Gosto da forma mas não<br />
gosto da estética, porque reconheço<br />
a intenção. Que pluralida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> sentido<br />
são pesquisadas? À força <strong>de</strong> se<br />
criarem etiquetas, como em Avignon<br />
— teatro-dança, teatro-texto, teatropoema,<br />
teatro-visual —, quando é só<br />
teatro parece uma coisa jurássica, são<br />
dinossauros. Quando Clau<strong>de</strong> Régy<br />
faz isso [com “O<strong>de</strong> Marítima”], fá-lo<br />
porque tem 85 anos, mas se tivesse<br />
40 ia ter um problema. Escolher fazer<br />
Régy para 600 pessoas no Théâtre <strong>de</strong><br />
la Ville é um acto político, porque não<br />
é uma peça, é um poema que as pessoas<br />
conhecem mal — mesmo em Portugal,<br />
on<strong>de</strong> todos dizem ter lido Pessoa<br />
mas não o leram realmente —, que<br />
merece 600 pessoas e não 200. Tenho<br />
a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o fazer, não<br />
apenas como encenador, mas como<br />
director <strong>de</strong>sse teatro. Houve sete mil<br />
pessoas na Place du Châtelet que o<br />
viram, em Avignon foram quatro mil.<br />
Como fazer o nosso trabalho, então?<br />
Devemos respon<strong>de</strong>r às coisas, <strong>de</strong>vemos<br />
ser responsáveis — adoro essa<br />
palavra.<br />
A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ritual, que o<br />
teatro carregou, é algo que<br />
lhe interessa? Olhando para<br />
algumas das imagens que cria,<br />
fica a sensação <strong>de</strong> estarmos<br />
perante quadros, <strong>de</strong> encenações<br />
ritualistas. E, no entanto, parece<br />
haver uma proximida<strong>de</strong> ao ritual<br />
que <strong>de</strong>pois nos leva para outra<br />
zona, menos clara.<br />
Po<strong>de</strong>ria dizer que isso não me interessa,<br />
mas é isso. Há um ritual profundo<br />
na pintura, por exemplo, cujos<br />
ecos das minhas influências pictóricas<br />
estão presentes, <strong>de</strong> Rembrant a Brueghel,<br />
autores que tinham uma gran<strong>de</strong><br />
liberda<strong>de</strong> e que explodiram com a<br />
imagem. Mas não quero fazer crer que<br />
há um ritual. É um artificio que não<br />
me interessa e falseia as coisas porque<br />
as legitima <strong>de</strong> forma errada. Vejo teatro<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os cinco anos. Tirar os sapatos<br />
antes <strong>de</strong> subir ao palco, como<br />
na tenda da Ariane Mnouchkine, fazer<br />
as pessoas esperar à porta do Théâtre<br />
<strong>de</strong>s Bouffes du Nord para que se veja<br />
que há um ritual, são rituais que estão<br />
já <strong>de</strong>sconstruídos e <strong>de</strong>scodificados,<br />
para mim. Isso não me interessa. É<br />
muito claro que é preciso uma distância<br />
para se ser verda<strong>de</strong>iro, e que é<br />
isso que dá a liberda<strong>de</strong>. É preciso criar<br />
formas para as coisas aparecerem, e<br />
digo-o tanto em relação ao futuro do<br />
teatro como ao seu sentido actual.<br />
Mas é verda<strong>de</strong> que não é o discurso<br />
contemporâneo que me interessa. Há<br />
uma ritualização, sim, mas não a fabricação<br />
<strong>de</strong> um ritual. É preciso ir<br />
mais longe, o ritual existe <strong>de</strong>pois, não<br />
é antes, não se convoca um ritual. É<br />
uma questão muito pessoal, muito<br />
profunda, que dita também uma forma<br />
<strong>de</strong> fazer um espectáculo, <strong>de</strong> preparar<br />
uma peça.<br />
O Ípsilon viajou a convite do Festival <strong>de</strong><br />
Teatro <strong>de</strong> Almada<br />
VINCENT KESSLER/REUTERS<br />
Enigmática, distante e<br />
fria são i<strong>de</strong>ias que se<br />
colaram ao corpo e ao<br />
rosto — mas sobretudo<br />
à figura — <strong>de</strong> Charlotte<br />
Rampling, actriz<br />
<strong>de</strong> “O Porteiro da Noite”<br />
(1974, Liliana Cavani),<br />
“Os Malditos” (1969,<br />
Luchino Visconti) ou “Max,<br />
mon amour” (1986, Nagisa Oshima).<br />
Chega ao Porto e a <strong>Lisboa</strong> por<br />
via do Festival <strong>de</strong> Teatro <strong>de</strong> Almada,<br />
com uma peça que não é, pelo menos<br />
Charlot<br />
São raras e recentes as experiências teatrais d<br />
provoque”, diz, nesta entrevista, em que <strong>de</strong>ixa q<br />
Yourcenar/<br />
Cavafy<br />
Encenação <strong>de</strong> Jean-<br />
Clau<strong>de</strong> Feugnet, dia 16 <strong>de</strong><br />
Julho no Teatro Nacional<br />
S. João, dias 17 e 18 no<br />
Teatro Nacional<br />
D. Maria II.<br />
para ela, um espectáculo, mas “um<br />
encontro” entre<br />
Marguerite<br />
Yourcenar e<br />
nos Constanti-<br />
Cava-<br />
fy, conduzido pela força das palavras<br />
<strong>de</strong>stas duas figuras.<br />
A sua experiência no teatro é bastante<br />
mais reduzida e recente: “La<br />
Fause Suivante”, <strong>de</strong> Marivaux, por<br />
Martin Crimp, “A Dança da Morte”,<br />
<strong>de</strong> Strindberg, e “Pequenos<br />
Crimes Conjugais”, <strong>de</strong> Eric-Emmanuel<br />
Schmitt, são escolhas que reflectem<br />
essa procura <strong>de</strong> um encontro<br />
com personagens, mais do que<br />
uma carreira. Tal como o disco<br />
“Comme Une Femme” (2002), on<strong>de</strong><br />
as letras falam <strong>de</strong> uma mulher que<br />
se pergunta quem é, e <strong>de</strong>ixa que se<br />
confunda actriz, personagem e mu-<br />
lher.<br />
Ao longo do seu percurso, tem<br />
interpretado personagens<br />
fortes, mesmo se fictícias. Como<br />
foi entrar nos universos, reais,<br />
<strong>de</strong> Marguerite Yourcenar e<br />
Contantinos Cavafy, também<br />
eles figuras com personalida<strong>de</strong>s<br />
marcantes?<br />
São, efectivamente, personagens for-<br />
tes e é necessário encontrar um modo<br />
<strong>de</strong> as trabalhar a partir das palavras<br />
escritas do autor. De qualquer forma,<br />
e no caso específico <strong>de</strong> “Yourcenar/<br />
Cavafy”, não se trata <strong>de</strong> interpretar<br />
uma personagem, mas, através da<br />
récita dos seus textos, fazê-la viver e<br />
evoluir a partir do que escreveu<br />
e ir<br />
mais além.<br />
Vendo os filmes que interpretou,<br />
é característica uma distância<br />
entre a personagem e a actriz.<br />
Especulou-se que essa seria uma<br />
característica biográfica sua.<br />
Mas o que acontece quando o<br />
que se lhe pe<strong>de</strong> é para se colocar<br />
ao serviço <strong>de</strong> uma figura<br />
real, ela própria com uma<br />
biografia, e num exercício<br />
que exige ao actor um<br />
<strong>de</strong>spojamento da sua<br />
própria vida?<br />
Para mim, o que é interes-<br />
sante é o modo como o<br />
faço.<br />
E faço-o interpretando os<br />
dois papéis ao mesmo<br />
tempo, o da actriz e<br />
o da<br />
personagem. Quando<br />
interpreto, invisto em<br />
mim m e na persona-<br />
gem e isso emana<br />
da força das<br />
pala-<br />
vras <strong>de</strong> Yource-<br />
nar. São essas<br />
palavras que<br />
alimentam<br />
essa i<strong>de</strong>ia e<br />
constro-<br />
em<br />
um<br />
universo<br />
on<strong>de</strong> o<br />
possa fa-<br />
zer.<br />
Um<br />
universo<br />
que se<br />
sustenta<br />
numa<br />
pesquisa, ou<br />
uma procura<br />
constante, certo?<br />
Sim, a poesia é uma<br />
pes-<br />
quisa emocional absoluta,<br />
a literatura também. São<br />
via-<br />
30 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
tte, absolutamente<br />
s <strong>de</strong> Charlotte Rampling. “Só faço coisas quando sei que me vou confrontar com algo que me<br />
a que se confunda actriz, personagem e mulher. Tiago Bartolomeu Costa<br />
Charlotte Rampling e Polydoros<br />
Vogiatzis na peça “Yourcenar/<br />
Cavafy”<br />
“A interpretação<br />
surge <strong>de</strong> um encontro<br />
emocional.<br />
É, sobretudo, uma<br />
viagem com<br />
uma pessoa”<br />
gens. E são encontros através das viagens,<br />
feitas com um material que é a<br />
vida <strong>de</strong> outra pessoa. A interpretação<br />
surge <strong>de</strong> um encontro emocional, que<br />
parte do coração, e prossegue através<br />
da linguagem, e da palavra. É, sobretudo,<br />
uma viagem com uma pessoa.<br />
Ao mesmo tempo, é-lhe pedido<br />
que se ponha em causa, ou seja,<br />
que parta da sua experiência<br />
para nos conduzir nessa viagem.<br />
Sim, absolutamente. Penso que as<br />
coisas só po<strong>de</strong>m ser tratadas — se as<br />
quisermos tratar <strong>de</strong> forma inteligente<br />
e interessante — se nos colocarmos<br />
em causa face à personagem. É uma<br />
parceria fundamental e a única forma<br />
que tenho <strong>de</strong> trabalhar.<br />
E como faz as suas escolhas?<br />
Procurando personagens que<br />
queiram fazer um pacto consigo?<br />
Ao longo da minha vida, fui encontrando<br />
personagens no caminho. Personagens,<br />
realizadores, poetas. Nunca<br />
as procurei, e não o faço hoje. A<br />
dado momento da viagem, junto-me<br />
a uma personagem que encontro, não<br />
sei porquê, nunca soube, mas foi sempre<br />
assim.<br />
É isso que explica a colagem<br />
eterna a uma imagem fria e<br />
gelada, que se coloca numa<br />
posição <strong>de</strong> distância em relação<br />
ao espectador? É uma protecção<br />
da actriz?<br />
É como eu sou. Eu sou uma actriz, é<br />
certo, mas sou, realmente, assim. E é<br />
assim no teatro, e no cinema, sou<br />
sempre eu, e a personagem acompanha-me.<br />
Se me diz que sou fria — infelizmente,<br />
não gosto <strong>de</strong>ssa palavra<br />
— mas se me diz que sou impenetrável,<br />
não posso achar isso senão como<br />
um contra-senso para um actor. Trabalho<br />
a um nível mais profundo, se<br />
as pessoas acham isso, lamento por<br />
elas.<br />
O que me agrada nessa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
frieza, <strong>de</strong> gelo, é a sua própria<br />
ambiguida<strong>de</strong>, porque é algo<br />
provisório que se esfuma.<br />
Ouvindo as suas canções, por<br />
exemplo, ficamos sempre<br />
na dúvida se a estamos a<br />
ouvir falar <strong>de</strong> si, se há uma<br />
personagem que fala sobre<br />
coisas que lhe acontecem, ou se<br />
é algo distante. E essa mistura,<br />
quadridimensional diria, é mais<br />
do que real porque não se <strong>de</strong>ixa<br />
cair numa só categorização. É,<br />
por isso mesmo, um corpo que,<br />
apresentando-se, não <strong>de</strong>ixa<br />
nunca <strong>de</strong> ser abstracto.<br />
Você fez uma muito bela <strong>de</strong>scrição<br />
[risos].<br />
Pergunto-lhe isto porque se<br />
tornou frequente encontrar<br />
actrizes que traçam projectos<br />
<strong>de</strong> carreira que também passam<br />
pela música, ou por trabalhos<br />
com realizadores menos<br />
evi<strong>de</strong>ntes, com o objectivo <strong>de</strong><br />
escaparem a uma padronização<br />
e a um mo<strong>de</strong>lo. Até mesmo<br />
tentando escapar a uma imagem<br />
que se lhes colou. O que está a<br />
dizer é que as coisas são fruto do<br />
acaso e não <strong>de</strong> um planeamento<br />
estratégico?<br />
É isso, absolutamente. Só faço aquilo<br />
em que sei que posso investir. É a única<br />
forma <strong>de</strong> me apresentar ao mundo<br />
exterior. A carreira não me interessa,<br />
interessa-me a viagem. E uma estratégia<br />
não é, certamente, a viagem que<br />
quero fazer.<br />
As experiências teatrais<br />
chegaram mais tar<strong>de</strong>. E<br />
chegaram como?<br />
Sim, bastante mais tar<strong>de</strong>. Fi-las para<br />
saber como funcionaria esta minha<br />
i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> envolvimento face a um público,<br />
com um texto, e aten<strong>de</strong>ndo ao<br />
rigor do teatro. Encontrei três peças,<br />
duas em França e uma em Inglaterra.<br />
Só faço coisas quando sei que me vou<br />
confrontar com algo que me provoque<br />
e com alguém que me entusiasme.<br />
De qualquer forma, não é o teatro<br />
tradicional que me interessa.<br />
É por isso que as escolhas que<br />
fez não são evi<strong>de</strong>ntes?<br />
Sim, enfrento a vida como uma falta<br />
e uma prova. Como se fosse uma representação<br />
todos os dias. Quando<br />
escolho o que vou fazer, quando mer-<br />
gulho no que vou fazer, procuro ver<br />
se vou passar essa prova, e, <strong>de</strong>pois,<br />
não me interessa repeti-la. É preciso<br />
ser muito inventiva, para não me<br />
aborrecer nem cair numa rotina. Não<br />
é evi<strong>de</strong>nte nem é muito confortável,<br />
mas é como é, é o que me satisfaz. Ao<br />
mesmo tempo, é recompensador<br />
quando acontecem coisas que se correspon<strong>de</strong>m<br />
e que dialogam com o que<br />
procuro. Mas esta é só uma forma <strong>de</strong><br />
estar aqui. E é só a minha.<br />
É um percurso, <strong>de</strong> vida<br />
e profissional, que se<br />
complementa através da música,<br />
do teatro e do cinema, ou que<br />
alimenta, e se complementa,<br />
com a vida?<br />
Nunca po<strong>de</strong>remos dizer se o que veio<br />
primeiro foi a galinha ou o ovo. É uma<br />
coreografia constante. “Faço, não faço”,<br />
“quero fazer, não quero fazer”.<br />
E <strong>de</strong>pois há coisas que me forçam a<br />
encontros, como no caso <strong>de</strong> Yourcenar<br />
e Kavafi. É algo que é visceral e<br />
que me dá imenso medo.<br />
Essa era a palavra que me<br />
ocorria, medo. Quer combater o<br />
medo que as provas lhe causam?<br />
Sim, sim.<br />
Sem medo <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r?<br />
Sim, sobretudo sem medo <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r.<br />
É outra coisa.<br />
É o prazer <strong>de</strong> jogar?<br />
É o prazer <strong>de</strong> me expor.<br />
Expor-se, procurando dar e<br />
receber?<br />
Sim, absolutamente, porque o acto<br />
<strong>de</strong> se expor em cena tem <strong>de</strong> ser, para<br />
CONCURSO<br />
JOVENS CRIADORES<br />
2010<br />
.ARTES PLÁSTICAS.<br />
.BANDA DESENHADA.<br />
.ILUSTRAÇÃO.<br />
.ARTES DIGITAIS.<br />
.FOTOGRAFIA. FI<br />
.VÍDEO.<br />
.DANÇA.<br />
TEATRO<br />
.MÚSICA.<br />
.DESIGN DE EQUIPAMENTO.<br />
.DESIGN GRÁFICO.<br />
.JOALHARIA.<br />
.MODA.<br />
.LITERATURA.<br />
<br />
INSCRIÇÕES S ATÉ<br />
26 DE JULHO<br />
REGULAMENTOS EM<br />
ARTESIDEIAS.COM<br />
JUVENTUDE.GOV.PT<br />
mim, absoluto. Eu entro, absolutamente.<br />
Sou assim, é preciso que eu o<br />
sinta. Se não o sentir estou morta.<br />
No teatro há exposição mais<br />
próxima do real, porque existe<br />
todas as noites, enquanto no<br />
cinema é uma exposição mais<br />
distante, é isso?<br />
Não, é apenas diferente. Mas o processo<br />
para lá chegar é o mesmo.<br />
E no caso das canções?<br />
Eu não as canto em cena. Não consi<strong>de</strong>ro<br />
que tenha voz para cantar em<br />
cena. É algo muito íntimo, sou eu em<br />
frente a um microfone.<br />
Mas também é uma exposição.<br />
É uma exposição sim, mas que é à<br />
porta fechada, sou eu e três músicos<br />
num estúdio.<br />
Ao ouvirmos as canções,<br />
imaginamos que seja você,<br />
Charlotte, a expor-se?<br />
É um pouco isso, sim. É por isso que,<br />
neste momento, não faço questão <strong>de</strong><br />
as cantar em público. São para mim<br />
um diário. É uma experiência que não<br />
é para ser partilhada com os outros,<br />
nem é para os outros. Quando as pessoas<br />
me falam do disco, acabo por<br />
oferecê-lo, não tenho objectivos comerciais.<br />
Talvez um dia o coloque<br />
“online”. Mas é <strong>de</strong> uma outra or<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong> partilha este disco, é mais pessoal.<br />
Mas quem é que se expõe:<br />
a Charlotte Rampling ou a<br />
Charlotte?<br />
[risos] Good question, I have no<br />
answer for that!<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 31
Matthias Langhoff<br />
Tesouro nacional vivo<br />
“Cabaret Hamlet” é um espectáculo que não se conta, vive-se. O encenador é alguém que não<br />
se <strong>de</strong>screve, sente-se. No CCB, dias 14 e 15, vamos po<strong>de</strong>r estar mais perto <strong>de</strong> uma lenda viva do<br />
teatro. Tiago Bartolomeu Costa, em Paris<br />
DA MAIA NOGUEIRA<br />
Matthias<br />
Langhoff<br />
regressa ao<br />
Festival <strong>de</strong><br />
Teatro <strong>de</strong><br />
Almada pelo<br />
segundo ano<br />
consecutivo<br />
Matthias Langhoff é um tesouro nacional<br />
vivo. A expressão foi cunhada<br />
pelo crítico francês Bruno Tackels na<br />
revista “Mouvement”, e diz bem da<br />
grandiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste homem, figura<br />
maior do teatro, discípulo <strong>de</strong> Brecht,<br />
her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> um passado com o qual<br />
“nem sempre soube lidar”.<br />
“Tudo o que me move, tudo aquilo<br />
em que sempre acreditei, foi exactamente<br />
o que tentei colocar nas minhas<br />
peças, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início. E não tenho<br />
a certeza <strong>de</strong> alguma vez o ter<br />
conseguido.”<br />
O pretexto do encontro é “Cabaret<br />
Hamlet”, monumental obra panteísta,<br />
“um resquício do que Shakespeare<br />
escreveu”, a apresentar no Centro<br />
Cultural <strong>de</strong> Belém, em <strong>Lisboa</strong>, no âmbito<br />
do Festival <strong>de</strong> Teatro <strong>de</strong> Almada,<br />
que visita pelo segundo ano consecutivo,<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter mostrado “Dieu<br />
comme patient — ainsi parlait Isidore<br />
Ducasse”, a partir <strong>de</strong> Lautréamont. É<br />
uma peça longa — “o tempo precisa<br />
<strong>de</strong> tempo para acontecer” —, que trabalha<br />
os antagonismos das personagens<br />
<strong>de</strong> Shakesperare, que podiam<br />
ser entendidas como um espelho do<br />
mundo, como diria Shakespeare,<br />
“mas que são só sombras preparadas<br />
para serem <strong>de</strong>scobertas”. “Como<br />
nós”, acrescenta Langhoff.<br />
Esta peça é apenas uma janela para<br />
um universo feito “<strong>de</strong> escolhas programadas”,<br />
respon<strong>de</strong> o encenador,<br />
que já dirigiu teatros, e escolheu Brecht,<br />
Büchner, Schnitzler, Kafka ou<br />
Eurípi<strong>de</strong>s para “falar<br />
sempre com o<br />
passado, tando imagi-<br />
tennar<br />
ser possível<br />
viver<br />
um futuro”.<br />
“A intuição<br />
é importante<br />
para outras<br />
coisas: a intuição<br />
está na<br />
“O teatro foi sempre<br />
solitário, porque<br />
as escolhas levam<br />
à solidão. Falar<br />
do que<br />
fazemos com<br />
alguém que faça<br />
o mesmo não significa<br />
que falemos<br />
da mesma coisa”<br />
pesquisa proporcionada pela peça,<br />
não está na escolha da peça. As peças<br />
são escolhidas para respon<strong>de</strong>rem a<br />
dúvidas que temos. São escolhas pes-<br />
soais, não são abstractas.” “A prepa-<br />
ração <strong>de</strong><br />
um trabalho é um momen-<br />
to para questionar tudo, uma situa-<br />
ção muito complexa e ambígua.” “É<br />
preciso ter paciência”, alerta. E é<br />
preciso “estar sempre à espera <strong>de</strong><br />
tudo.” Cada apresentação “é uma<br />
oportunida<strong>de</strong> para não <strong>de</strong>ixar cair<br />
a pergunta, mais do que para respon<strong>de</strong>r.”<br />
O <strong>de</strong>safio está “na pró-<br />
pria persistência, no fazer face<br />
ao medo. Queiramos ou não, o<br />
medo é a vida. Quando a tomamos,<br />
temos <strong>de</strong> nos <strong>de</strong>ixar ir.<br />
Fazer um espectáculo é como<br />
uma vida, nasce-se e morrese.<br />
E morre-se como se é.<br />
Fazemos uma <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> nós, dos<br />
nossos medos, está tudo lá <strong>de</strong>ntro. É<br />
preciso ter paciência. E isso vem com<br />
o tempo”.<br />
Hamlet sou eu<br />
“O drama do príncipe da Dinamarca<br />
é o meu próprio drama”, lança para<br />
cima da mesa. “Com Hamlet enfrento<br />
a minha própria memória, a <strong>de</strong> regressar<br />
a um país ao qual não pertenço,<br />
obrigado a seguir uma herança<br />
que não quero e com a qual não estou<br />
<strong>de</strong> acordo.”<br />
De origem suíça, Langhoff mudouse<br />
cedo para a Alemanha — “on<strong>de</strong><br />
habitam todos os meus mortos” — vivendo<br />
há anos em França, o país que<br />
o <strong>de</strong>via consi<strong>de</strong>rar como um tesouro.<br />
“O exílio <strong>de</strong> Hamlet é o meu exílio” ,<br />
diz. “Penso nos meus pais, penso nos<br />
que já cá não estão, coloco-me em<br />
frente à minha memória”, confessa<br />
este homem “já sem pares”.<br />
“O teatro foi sempre solitário, porque<br />
as escolhas levam à solidão. Falar<br />
do que fazemos com alguém que faça<br />
o mesmo não significa que falemos<br />
da mesma coisa.” Recorda que este<br />
Hamlet é tão <strong>de</strong>le quanto a sua vida<br />
lhe pertence — “e disso estou pouco<br />
certo”.<br />
A peça surge “da impossibilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> dialogar com um passado <strong>de</strong> 500<br />
anos”. “Não é para saber se há espaço<br />
para Hamlet no presente, é para perguntar<br />
se há presente em Hamlet”,<br />
diz. “Procurei Hamlet toda a minha<br />
vida. Esperei por ele.” A primeira vez<br />
que ele se apresentou foi ao telefone.<br />
Era Heiner Muller, seu companheiro<br />
na direcção do Berliner Ensemble.<br />
“Ligou-me e disse: Não venhas já para<br />
o ensaio. Quando chegares tenho<br />
uma peça pronta para ti.” A peça<br />
chamava-se “Máquina Hamlet”. Estávamos<br />
em 1977. “Este regresso é uma<br />
coisa muito especial”, diz Langhoff.<br />
“O objectivo não é tornar a coisa acessível.<br />
As questões estão ao nível da<br />
impossibilida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> não saber o que<br />
vamos fazer com as consequências<br />
da escolha, mas saber que essas consequências<br />
resultam da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
se po<strong>de</strong>r escolher”, resume.<br />
“O que é tocante é que, mesmo sendo<br />
difícil, as pessoas são capazes <strong>de</strong><br />
encontrar as coisas que lhe tocam,<br />
on<strong>de</strong> o teatro as leva a um outro<br />
lugar, e que produzem um<br />
<strong>de</strong>bate, que as engran<strong>de</strong>ce.<br />
De tempos a tempos<br />
po<strong>de</strong> mesmo aparecer<br />
alguém que se diz profundamente<br />
alterado<br />
e, nessas alturas,<br />
achamos que po<strong>de</strong>mos<br />
prosseguir.” Por<br />
isso, Langhoff não acredita<br />
num regresso aos<br />
clássicos que impliquem<br />
uma inscrição do texto na contemporaneida<strong>de</strong>.<br />
“Tornar algo compreensível<br />
po<strong>de</strong> ser um problema.<br />
Mudar uma história não a torna, por<br />
si só, compreensível. Porque, muitas<br />
vezes, se o é, é outra coisa.”<br />
O Ípsilon viajou a convite do Festival <strong>de</strong><br />
Teatro <strong>de</strong> Almada<br />
François<br />
Chattot e<br />
Agnès Dewitte<br />
em “Cabaret<br />
Hamlet”<br />
Cabaret<br />
Hamlet<br />
Encenação <strong>de</strong> Matthias<br />
Langhoff<br />
Dias 14 e 15, no CCB,<br />
<strong>Lisboa</strong><br />
32 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Saul Bellow Se isto é um<br />
“homem mo<strong>de</strong>rno” Pág. 46<br />
Laurie An<strong>de</strong>rson<br />
Recomeçar, <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong>pois Pág. 35<br />
M.I.A.<br />
Porque é que ela é<br />
um ícone do nosso<br />
tempo Pág. 34<br />
m/18<br />
Pedro Abrunhosa<br />
& Comité Caviar<br />
8-jul<br />
Mafalda Veiga<br />
15-jul<br />
Jorge Palma<br />
22-jul<br />
Mayra Andra<strong>de</strong><br />
29-jul<br />
www.casino-estoril.pt<br />
DJ até às 03H00<br />
Reservas:<br />
info@dlounge.net | +351 919 938 114<br />
Programa sujeito a alterações
Discos<br />
Pop<br />
Ninguém<br />
cala M.I.A.<br />
É o álbum mais contrastante<br />
da polémica cantora. Há<br />
canções dançantes e lúdicas,<br />
mas também momentos <strong>de</strong><br />
catarse claustrofóbica. Vítor<br />
Belanciano<br />
M.I.A.<br />
Maya<br />
XL Recordings, distri. PopStock<br />
mmmmn<br />
Des<strong>de</strong> que <strong>de</strong>u nas<br />
vistas, em 2005, o<br />
percurso <strong>de</strong> Maya<br />
Arulpragasam, ou<br />
seja, M.I.A., tem<br />
estado envolto em<br />
polémicas. Só nos últimos meses,<br />
foram os sucessivos problemas com<br />
o governo americano por causa do<br />
seu cartão <strong>de</strong> resi<strong>de</strong>nte; ameaças do<br />
governo do Sri Lanka para que não<br />
se meta em assuntos <strong>de</strong> Estado; um<br />
“vi<strong>de</strong>oclip” para “Born free”, que foi<br />
censurado pelo Google por causa do<br />
seu alegado conteúdo violento; ou<br />
uma troca <strong>de</strong> piropos hostil com o<br />
“New York Times” por causa <strong>de</strong> uma<br />
entrevista em que terá sido citada<br />
fora <strong>de</strong> contexto.<br />
No meio <strong>de</strong>ste ruído, é fácil<br />
esquecermo-nos da música. E no<br />
entanto, ao longo <strong>de</strong> dois álbuns<br />
(“Arular”, <strong>de</strong> 2005 e “Kala”, <strong>de</strong><br />
2007), M.I.A. conseguiu criar uma<br />
sonorida<strong>de</strong> nova feita <strong>de</strong><br />
sobreposições inesperadas num<br />
ambiente sincrético colorido. Foi<br />
uma das primeiras a perceber o<br />
potencial que existia em criar um<br />
vocabulário o pop a partir <strong>de</strong> algumas<br />
das linguagens gens urbanas emergentes,<br />
como o dubstep, baile funk, kuduro<br />
ou dancehall. all.<br />
“Maya” não contém,<br />
naturalmente, nte, o travo <strong>de</strong> novida<strong>de</strong><br />
dos seus antecessores, mas é mais<br />
arriscado e<br />
diverso. Como outros<br />
nomes marcantes da cultura<br />
pop<br />
actual, <strong>de</strong> James<br />
Murphy (LCD<br />
Soundsystem)<br />
M.I.A. cria um caldo<br />
pop a partir da mais<br />
estimulante música<br />
urbana da actualida<strong>de</strong><br />
Espaço<br />
Público<br />
Este espaço vai ser<br />
seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />
teatro, livro, exposição,<br />
disco, álbum, canção,<br />
concerto, DVD viu e<br />
gostou tanto que lhe<br />
apeteceu escrever<br />
aos Animal Collective, M.I.A. é<br />
alguém capaz <strong>de</strong> prenunciar o<br />
tempo, tornando-se representação<br />
<strong>de</strong>le em simultâneo. A faceta<br />
politizada, o controle sobre a<br />
imagem e a forma como utiliza as<br />
potencialida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> difusão da<br />
Internet fazem <strong>de</strong>la um ícone do<br />
nosso tempo, mas também um alvo<br />
fácil <strong>de</strong> críticas. E não será com este<br />
álbum que isso se <strong>de</strong>svanecerá.<br />
No primeiro tema, “The message”,<br />
faz questão <strong>de</strong> dizer <strong>de</strong> imediato ao<br />
que vem, abordando as facetas<br />
sombrias da Internet através <strong>de</strong> um<br />
som electronicamente saturado.<br />
Quase todas as características<br />
nucleares dos dois álbuns anteriores<br />
estão presentes no novo registo —<br />
misto <strong>de</strong> balanço digital, subgraves,<br />
batidas gordurosas, climas exóticos e<br />
electrónica encardida — embora os<br />
cenários sejam mais claustrofóbicos.<br />
Há convidados repetentes (Diplo e<br />
Switch), mas também novida<strong>de</strong>s,<br />
como Rusko, Derek E. Miller dos<br />
Sleigh Bells, Blaqstrarr e Igor<br />
Cavalera, dos Sepultura.<br />
Como nos anteriores álbuns, há<br />
uma canção assumidamente <strong>de</strong><br />
gosto duvidoso (“XXX0”), incursões<br />
pelo dancehall mais lúdico (“It takes<br />
a muscle” ou “It iz what it iz”),<br />
tentativas <strong>de</strong> repetir o sucesso <strong>de</strong><br />
“Paper planes” (“Tell me why”), mas<br />
os temas que acabam por marcar<br />
são aqueles on<strong>de</strong> aposta num som<br />
ruidoso, misto <strong>de</strong> electrónica<br />
musculada e <strong>de</strong>formação roqueira,<br />
como “Born free” — o tal do<br />
“vi<strong>de</strong>oclip” polémico, inspirado nos<br />
Suici<strong>de</strong> — “Steppin up” e,<br />
principalmente, “Meds and feds”,<br />
admirável catarse <strong>de</strong> agitação<br />
dançante para guitarra distorcida.<br />
O melhor do pós-punk dos anos<br />
80 aconteceu quando o rock<br />
encontrou nos sons físicos do funk,<br />
disco ou dub, a sua possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
recriação. M.I.A. tem aplicado os<br />
mesmos princípios, mas<br />
noutro contexto,<br />
criando um caldo<br />
pop a partir <strong>de</strong><br />
alguma da mais<br />
estimulante<br />
música física e<br />
urbana da<br />
actualida<strong>de</strong>.<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
sobre ele, concordando<br />
ou não concordando<br />
com o que escrevemos?<br />
Envie-nos uma nota até<br />
500 caracteres para<br />
ipsilon@publico.pt. E<br />
nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />
Os Mi Ami fazem<br />
música on<strong>de</strong> tudo o que<br />
interessa é o ritmo<br />
Um violento<br />
ataque aos<br />
sentidos<br />
Álbum negro, canções<br />
que vergastam em vez <strong>de</strong><br />
acariciar, que distorcem em<br />
vez <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir. Mário Lopes<br />
Mi Ami<br />
Steal Your Face<br />
Thrill Jockey; distri. Mbari<br />
mmmmn<br />
Tudo é<br />
incrivelmente<br />
intenso, <strong>de</strong> forma<br />
extenuante, em<br />
“Steal Your Face”.<br />
A secção rítmica<br />
que se pren<strong>de</strong> num “groove” para<br />
não mais largar, as guitarras que<br />
expelem ruído em golfadas, a voz<br />
andrógina que berra e berra, entre a<br />
catarse e a paranóia, entre a<br />
excitação e a ironia nada discreta: “I<br />
want to dance with somebody / I<br />
wanna feel the heat with<br />
somebody”, ouve-se em “Latin<br />
lover”, para a qual nunca<br />
pensaríamos convocar a imagem da<br />
jovem Whitney Houston. Este<br />
pormenor, contudo, é importante<br />
para apreciar <strong>de</strong>vidamente o novo<br />
álbum dos Mi Ami.<br />
Aquilo que às primeiras audições<br />
soa a um violento ataque aos<br />
sentidos (que é), a uma orgia <strong>de</strong><br />
ruído que apenas os movimentos<br />
circulares da secção rítmica<br />
impe<strong>de</strong>m <strong>de</strong> resvalar para o caos,<br />
vai-se pouco a pouco revelando<br />
como algo mais. Álbum negro,<br />
iminentemente nocturno, “Steal<br />
Your Face” faz-se <strong>de</strong> divagação<br />
psicadélica e <strong>de</strong> choques eléctricos<br />
pós-punk. Sugere algo <strong>de</strong> dub na<br />
reverberação constante que o<br />
atravessa mas não <strong>de</strong>ixa qualquer<br />
espaço para serenida<strong>de</strong> —<br />
psica<strong>de</strong>lismo, certamente, mas nada<br />
<strong>de</strong> sonhos cósmicos <strong>de</strong> “hippies” <strong>de</strong><br />
olhos nas estrelas.<br />
Quando o vocalista Daniel Martin-<br />
McCormick canta “Is it cool? I get<br />
excited”, na supracitada “Latin<br />
lover”, não está a apelar a euforia<br />
dançante: este é o som <strong>de</strong> uma<br />
acusação e se dançamos<br />
furiosamente, é porque essa parece<br />
ser a única forma <strong>de</strong> resistir<br />
incólume a canções que vergastam<br />
em vez <strong>de</strong> acariciar, que distorcem<br />
em vez <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir, que se eximem a<br />
qualquer tipo <strong>de</strong> conforto. Mesmo<br />
“Dreamers”, com as suas guitarras<br />
estelares e os timbalões percutidos<br />
em ondulação, com a voz perdida<br />
entre os instrumentos, qual sussurro<br />
<strong>de</strong> “jam” opiácea, não mantém o<br />
tom encantatório muito tempo. A<br />
distorção há-<strong>de</strong> crescer até nada<br />
restar da placi<strong>de</strong>z anterior e a<br />
canção há-<strong>de</strong> encarrilar naquele que<br />
é o tom <strong>de</strong> “Steal Your Face”: música<br />
on<strong>de</strong> tudo o que interessa é o ritmo,
Fela Kuti e Paulson<br />
Kalu: a diversida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> abordagens ao<br />
afro-beat é imensa<br />
música que cobre <strong>de</strong> matéria<br />
perigosa e <strong>de</strong>safiante esse esqueleto<br />
que dança furiosamente.<br />
Quando, em “Secrets”, prestamos<br />
atenção à linha <strong>de</strong> sintetizador que<br />
se <strong>de</strong>senha em fundo, é como se<br />
estivéssemos perante um<br />
surpreen<strong>de</strong>nte híbrido <strong>de</strong> Caravan,<br />
Health e At The Drive In. O resultado<br />
é tão magnífico quanto<br />
<strong>de</strong>sconcertante. Exactamente como<br />
o álbum que o alberga.<br />
Mais um dia<br />
na América<br />
A América olhada pela<br />
lente <strong>de</strong> Laurie An<strong>de</strong>rson,<br />
numa das suas obras mais<br />
conseguidas <strong>de</strong> sempre.<br />
Vítor Belanciano<br />
Laurie An<strong>de</strong>rson<br />
Homeland<br />
Nonesuch Records, distri. Warner<br />
mmmmn<br />
Tematicamente, é<br />
a América olhada<br />
ao microscópico.<br />
Sonoramente, são<br />
temas lentos,<br />
feitos <strong>de</strong><br />
ambientes electrónicos,<br />
envolvimentos <strong>de</strong> violino e aquela<br />
forma particular <strong>de</strong> dizer as<br />
palavras, entre o falado e o cantado.<br />
Nenhum local que não tenha já<br />
visitado inúmeras vezes. Mas a<br />
verda<strong>de</strong> é que o novo álbum <strong>de</strong><br />
Laurie An<strong>de</strong>rson — o seu primeiro na<br />
última década — é capaz <strong>de</strong> ser o seu<br />
melhor <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a estreia com “Big<br />
Science” (1982).<br />
Essa extraordinária obra inaugural<br />
foi criada a partir <strong>de</strong> excertos das<br />
suas “performances” da época.<br />
Entre a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> concerto, a<br />
narração <strong>de</strong> histórias e a criação<br />
audiovisual, nas apresentações<br />
ao vivo <strong>de</strong>ssa fase interrogava a<br />
socieda<strong>de</strong> do consumo ou as<br />
reacções pré-computador aos<br />
<strong>de</strong>senvolvimentos ntos tecnológicos.<br />
Agora regressa com um disco<br />
também ele resultante <strong>de</strong> um<br />
espectáculo (“United<br />
States”), que passou há<br />
três anos por <strong>Lisboa</strong> e<br />
Braga, uma espécie <strong>de</strong><br />
concerto-poema, on<strong>de</strong><br />
encarnava uma<br />
personagem que<br />
evocava a autorida<strong>de</strong><br />
dos homens, e<br />
funcionava como<br />
consciência da<br />
América conflituosa<br />
que se ergueu no pós-11<br />
<strong>de</strong> Setembro.<br />
A confiança cega na<br />
autorida<strong>de</strong>, a apetência<br />
dos meios <strong>de</strong><br />
comunicação pelo<br />
espectáculo, o colapso<br />
financeiro ou a política externa<br />
da Administração Bush são<br />
reflectidos num registo que<br />
consegue ser tão cómico como<br />
trágico. Produzido pela própria e<br />
pelo marido Lou Reed, e contando<br />
com um naipe <strong>de</strong> importantes<br />
convidados (Antony, Hal Willner,<br />
Alva Noto, Steven Bernstein ou Four<br />
Tet), é uma obra <strong>de</strong> meditações<br />
envolvidas por uma certa aura <strong>de</strong><br />
mistério, entrecortadas pela sua voz<br />
— angélica umas vezes, processada<br />
digitalmente noutros casos — e por<br />
ocasionais incursões pelo tecno e<br />
jazz, mas convergindo sobretudo<br />
para uma sonorida<strong>de</strong> electrónica<br />
expansiva, mas grave e melancólica.<br />
O tema que domina o álbum é<br />
“Another day in América”, longa<br />
reflexão <strong>de</strong> 11 minutos — feita <strong>de</strong><br />
climas sombrios, orquestração<br />
dissonante e voz robotizada — que é,<br />
ao mesmo tempo, uma divagação<br />
pelo lixo e glória, actuação política<br />
precoce e hesitação cívica da<br />
socieda<strong>de</strong> americana, questionando<br />
“how do we begin again?”. An<strong>de</strong>rson<br />
soube como recomeçar numa obra<br />
que exige total disponibilida<strong>de</strong>, mas<br />
da qual se sai satisfeito.<br />
Vários<br />
Nigeria Special:<br />
Volume 2, Mo<strong>de</strong>rn<br />
High life, Afro<br />
Sounds & Nigerian<br />
Blues<br />
SoundWay; distri. Massala<br />
mmmmn<br />
Massala<br />
Laurie An<strong>de</strong>rson não<br />
gravava um álbum há<br />
uma década<br />
Vários<br />
Nigeria AfroBeat<br />
Special: The New<br />
Explosive Sound In<br />
1970’s Nigeria<br />
SoundWay; distri.<br />
mmmmn<br />
É curioso como os<br />
nomes evoluem.<br />
Como o próprio nome<br />
indica, o género<br />
musical “highlife”,<br />
(“high” pela parte da<br />
mãe Nigéria e “life”<br />
pela parte do<br />
pai Gana) não<br />
era<br />
exactamente<br />
música <strong>de</strong><br />
gente<br />
pobre.<br />
Estes, numa<br />
espécie <strong>de</strong><br />
ânsia <strong>de</strong><br />
igualda<strong>de</strong><br />
social<br />
começaram a<br />
nomear a sua<br />
música como<br />
“highlife”, pelo<br />
que a música hoje<br />
assim conhecida (e que é música<br />
rural do Gana ou da Nigéria feita<br />
com guitarras eléctricas e combos <strong>de</strong><br />
percussão) está longe do que era o<br />
“highlife” original (mais próximo do<br />
conceito <strong>de</strong> orquestra africana). A<br />
partir da belíssima compilação<br />
“Nigeria Special: Volume 2, Mo<strong>de</strong>rn<br />
High life, Afro Sounds & Nigerian<br />
Blues” po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>terminar as<br />
diferenças face ao “highlife” ganês:<br />
este último <strong>de</strong>ve mais a guitarras<br />
<strong>de</strong>dilhadas e ritmos em constantes<br />
quebrantes, enquanto no caso<br />
nigeriano a mistura dos géneros é<br />
maior e menos estratificada. Não<br />
<strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> ser um extraordinário<br />
conjunto <strong>de</strong> canções, fica a dois<br />
palmos <strong>de</strong> “Guitar and The Gun”, a<br />
melhor compilação <strong>de</strong> “highlife” que<br />
alguma vez ouvimos (e on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m<br />
ouvir o magnífico guitarrista Jean<br />
Noel). Já “Nigeria Afrobeat Special” é<br />
conceptualmente mais forte. Tem<br />
um único <strong>de</strong>feito: incluir um tema<br />
<strong>de</strong> Fela Kuti, homem por <strong>de</strong>mais<br />
versado em compilações do género.<br />
Por outro lado po<strong>de</strong> ser a primeira<br />
oportunida<strong>de</strong> para quem não<br />
conhece este género (que se baseia<br />
num “beat” simultaneamente<br />
quebrado e propulsor da dança) <strong>de</strong><br />
ouvir a extraordinária música <strong>de</strong><br />
Orlando Julius. Melhor que tudo:<br />
aqui se <strong>de</strong>monstra que a diversida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> abordagens ao afro-beat é imensa<br />
e que o género está longe <strong>de</strong> se<br />
reduzir a Fela Kuti. Certos autores<br />
preferem pôr órgãos “vintage” à<br />
frente, outros confiam mais nas<br />
guitarras, por vezes há “jams”,<br />
noutras confia-se nos arranjos <strong>de</strong><br />
metais. Nem só <strong>de</strong> suor se fez o afrobeat<br />
e aqui há psica<strong>de</strong>lismo <strong>de</strong> todas<br />
as cores. Uma gran<strong>de</strong> compilação.<br />
João Bonifácio<br />
Tame Impala<br />
Innerspeaker<br />
Modular Records<br />
mmmmn<br />
Uma audição<br />
apressada <strong>de</strong><br />
“Innerspeaker”, o<br />
disco <strong>de</strong> estreia dos<br />
Tame Impala, po<strong>de</strong><br />
levar os mais<br />
distraídos a, <strong>de</strong> súbito, qualificá-los<br />
como nostálgicos <strong>de</strong> um certo<br />
psica<strong>de</strong>lismo arroxeado da década<br />
<strong>de</strong> 1960 com uma possível tendência<br />
para a citação — tendência<br />
suficientemente lata para abarcar<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os United States of America<br />
aos Stone Roses. E, <strong>de</strong> facto, os<br />
homens psica<strong>de</strong>lizam e citam (os<br />
19ª edição<br />
10, 17, 24 JUL<br />
2010, 18h00<br />
Ténis do Parque <strong>de</strong> Serralves<br />
Programação: António Curvelo<br />
10 JUL<br />
VIJAY IYER TRIO<br />
17 JUL<br />
BERNARDO SASSETTI TRIO<br />
COM PERICO SAMBEAT<br />
24 JUL<br />
“CONTACT”<br />
Dave Liebman / John Abercrombie /<br />
Marc Copeland / Drew Gress / Billy Hart<br />
Bilhetes à venda na recepção <strong>de</strong> Serralves e em www.serralves.pt<br />
Apoio Institucional<br />
Apoio à Internacionalização<br />
Apoio<br />
Apoio Media<br />
Patrocinador do Jazz do Parque<br />
Fundação <strong>de</strong> Serralves / Rua D. João <strong>de</strong> Castro, 210 - Porto<br />
o/ww<br />
www.serralves.pt / serralves@serralves.pt / Informações: 808 200 543<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 35
Discos<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Ratatat: a “trip” nunca se concretiza<br />
Tame Impala<br />
United States of America, os Stone<br />
Roses e muitos mais). Mas isso não<br />
os menoriza <strong>de</strong> todo. Tome-se, por<br />
exemplo, “Alter Ego”, a estupenda<br />
quarta canção do disco: pilha um<br />
“beat” usado milhares <strong>de</strong> vezes na<br />
electrónica mo<strong>de</strong>rna, ro<strong>de</strong>ia-o <strong>de</strong><br />
guitarras “glam” e dá-lhe um “rouge<br />
soul” na face: estamos tanto em<br />
território dos Broadcast como num<br />
lado B dos Beatles (fase<br />
“Revolution”) nunca lançado, um pé<br />
na melodia clássica, outro na pista<br />
<strong>de</strong> dança. O rei aqui é a guitarra, ora<br />
em “riffs” ora em <strong>de</strong>dilhados, ambos<br />
psicadélicos e etéreos. Quando a<br />
melodia se apruma lembramo-nos<br />
dos Stone Roses, até porque o baixo<br />
não está só a fazer figura <strong>de</strong> corpo<br />
presente. Quase sempre as vozes são<br />
“naives” e filtradas e podíamos jurar<br />
que, em “It’s not meant to be”, a<br />
bateria é passada pelos mesmos ecos<br />
e filtros usados pelos United States<br />
of America (e as guitarras usam os<br />
mesmos efeitos que os Byrds em<br />
“Eight Miles High”) . Ora mais pop,<br />
ora mais dançável, ora mais<br />
púrpura, o gran<strong>de</strong> mérito dos Tame<br />
Impala é juntar todas essas<br />
influências numa voz adormecida no<br />
mar <strong>de</strong> gaze das guitarras. Vão ser,<br />
obviamente, os próximos gran<strong>de</strong>s<br />
qualquer-coisa e alguém <strong>de</strong> bom<br />
senso <strong>de</strong>via editá-los cá e trazê-los<br />
para uma <strong>de</strong>sbunda <strong>de</strong> seis cordas a<br />
berrar alto. Muito alto. J.B.<br />
Tudo negro neste<br />
“Dark Si<strong>de</strong> Of The<br />
Moon”<br />
The Flaming Lips & Stardust And<br />
White Dwarfs<br />
The Dark Si<strong>de</strong> Of The Moon<br />
Warner<br />
mmmnn<br />
A i<strong>de</strong>ia<br />
parece<br />
<strong>de</strong>scabida. a.<br />
Uma releitura,<br />
canção por canção,<br />
<strong>de</strong> “Dark Si<strong>de</strong> Of<br />
The Moon”, clássico<br />
dos clássicos dos<br />
Pink Floyd que, não<br />
sendo necessariamente o melhor<br />
disco da banda, é o mais<br />
emblemático. À primeira vista, não<br />
passa <strong>de</strong> uma perda <strong>de</strong> tempo que<br />
chamará a atenção durante 15<br />
minutos antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>saparecer <strong>de</strong><br />
cena. Assim seria, não se <strong>de</strong>sse o<br />
caso <strong>de</strong> falarmos dos Flaming Lips,<br />
que gravaram em tempos um álbum<br />
quádruplo chamado “Zaireeka”, que<br />
só po<strong>de</strong>ríamos ouvir tal como<br />
i<strong>de</strong>alizado tocando os quatro CDs<br />
em simultâneo, em quatro<br />
aparelhagens diferentes. Ou seja, os<br />
Flaming Lips, que voltaram a soar<br />
urgentes e “psica<strong>de</strong>licamente”<br />
excessivos em “Embryonic” (o<br />
último álbum, <strong>de</strong> 2009), lançaramse<br />
às canções <strong>de</strong> “Dark Si<strong>de</strong> Of The<br />
Moon” porque, muito simplesmente,<br />
podiam fazê-lo.<br />
Convocaram Star<strong>de</strong>ath And White<br />
Dwarfs, a banda <strong>de</strong> Dennis Coyne,<br />
sobrinho <strong>de</strong> Wayne Coyne, <strong>de</strong>ram<br />
um toque a Henry Rollins e outro a<br />
Peaches e montaram uma bizarria<br />
que, ao contrário da maioria dos<br />
álbuns <strong>de</strong> versões, soa melhor na<br />
prática que em teoria.<br />
Editado em formato digital em<br />
Janeiro, conhece agora edição física.<br />
Nele, os Flaming Lips e os Star<strong>de</strong>ath<br />
And White Dwarfs transportam o<br />
psica<strong>de</strong>lismo “technicolor” e a<br />
limpi<strong>de</strong>z sonora do original para o seu<br />
próprio território. Ou seja, o ambiente<br />
torna-se <strong>de</strong>nso, as guitarras distorcem<br />
e planam em “feedback”, o<br />
existencialismo ganha contornos <strong>de</strong><br />
neurose. Henry Rollins, responsável<br />
pelo “spoken word” entre canções, dá<br />
o tom logo a início: “I’ve been mad for<br />
fucking years! I’m mad, I’ve always<br />
been mad!” E Peaches, mais à frente,<br />
ao recriar o solo vocal <strong>de</strong> “The great<br />
gig in the sky” em gritos enfurecidos,<br />
<strong>de</strong>mentes, prova que o “lunatic” <strong>de</strong>ste<br />
novo “Dark Si<strong>de</strong> Of The Moon” é<br />
realmente diferente do original<br />
imaginado por Roger Waters —<br />
digamos que, impulsionado pelo som<br />
dos Flaming Lips em “Embryonic”, foi<br />
criado da perspectiva da “cançãopsicose”<br />
dos Pink Floyd, “Careful with<br />
axe, Eugene”.<br />
Ao contrário da maioria dos álbuns <strong>de</strong> versões, a releitura dos Pink<br />
Floyd pelos Flaming Lips soa melhor na prática do que na teoria<br />
Mais curiosa que brilhante, a nova<br />
versão põe toques <strong>de</strong> telemóvel no<br />
lugar dos relógios <strong>de</strong> corda <strong>de</strong><br />
“Time”, transforma “On the run” em<br />
disco-funk “janado” (tudo<br />
reverberações e guitarras silvando<br />
como sirenes <strong>de</strong> nave espacial),<br />
transforma “Breath” em hino às<br />
maravilhas do “fuzz” aplicado ao<br />
som <strong>de</strong> baixo e faz <strong>de</strong> uma trôpega<br />
caixa <strong>de</strong> ritmos o suporte para a<br />
preguiçosa e falhada versão <strong>de</strong><br />
“Money” — o momento “ao lado” do<br />
álbum.<br />
“There’s no dark si<strong>de</strong> of the moon,<br />
really. As a matter of fact, it’s all<br />
dark”, <strong>de</strong>spe<strong>de</strong>-se Henry Rollins. Os<br />
Pink Floyd matizavam essa<br />
constatação com música grandiosa,<br />
<strong>de</strong> uma luminosida<strong>de</strong> reconfortante.<br />
Os Flaming Lips preferem brincar na<br />
escuridão. E, apesar <strong>de</strong><br />
continuarmos sem saber por que<br />
raio se aventuraram numa coisa<br />
<strong>de</strong>stas, saem-se bem. Não<br />
<strong>de</strong>slumbram, divagam livremente. E<br />
divertem. M.L.<br />
Psica<strong>de</strong>lismo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>signer<br />
Ratatat<br />
LP4<br />
XL Recordings; distri. Popstock<br />
mmmnn<br />
O álbum anterior<br />
tinha como título<br />
“LP3”. Este, o<br />
quarto, foi<br />
baptizado “LP4”,<br />
como se fosse a<br />
continuação da série. Faz todo o<br />
sentido. O som dos Ratatat, duo<br />
americano formado por Mike Stroud<br />
e Evan Mast, mantém-se inalterável<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a edição do álbum homónimo<br />
em 2004.<br />
Neste momento, po<strong>de</strong>m ser nome<br />
em ascensão enquanto produtores<br />
hip-hop, tendo trabalhado com Kid<br />
Cudi no seu álbum <strong>de</strong> estreia, “Man<br />
On The Moon: The End Of Day”, mas<br />
enquanto Ratatat mantêm o rumo<br />
inalterado: prosseguem pela autoestrada<br />
cósmica pejada <strong>de</strong><br />
sintetizadores ambientais, guitarras<br />
planantes e ritmos <strong>de</strong> um<br />
minimalismo eficiente. São<br />
psica<strong>de</strong>lismo <strong>de</strong> <strong>de</strong>signer,<br />
impecavelmente construído. Mas a<br />
verda<strong>de</strong> é que, apesar das<br />
produções luxuriantes (até<br />
acrescentaram tablas ou percussões<br />
turcas à equação), não passam <strong>de</strong><br />
música <strong>de</strong> fundo (<strong>de</strong> bom gosto<br />
inatacável, mas música <strong>de</strong> fundo<br />
ainda assim).<br />
Apreciamos as guitarras<br />
floydianas e o som do<br />
“harpsichord”, gostamos dos Moogs,<br />
da elegância das batidas, das<br />
sugestões funk e das orquestrações<br />
apontando a Oriente; apreciamos<br />
tudo isso e esta i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> uns Daft<br />
Punk alegremente ven<strong>de</strong>ndo a alma<br />
ao “space-rock” (sem rock,<br />
naturalmente), mas a “trip” nunca<br />
se concretiza. Limita-se a ficar lá<br />
longe, incógnita, a acariciar o<br />
subconsciente. M.L.<br />
Uma questão<br />
<strong>de</strong> ritmo<br />
PAUS<br />
É uma Água<br />
Enchufada<br />
mmmmn<br />
O EP <strong>de</strong> estreia dos PAUS confirma<br />
os sinais muito<br />
positivos que os<br />
lisboetas andavam<br />
a transmitir nos<br />
palcos. União <strong>de</strong><br />
músicos dos If Lucy<br />
Fell e Linda Martini com um ex-<br />
Vicious Five, os PAUS inventam uma<br />
música <strong>de</strong> difícil classificação,<br />
fortemente ancorada no ritmo. A<br />
culpa é da “bateria siamesa” (dois<br />
bateristas tocam em duas baterias<br />
unidas pelo mesmo bombo), uma<br />
criação do grupo que é a força<br />
propulsora das quatro canções aqui<br />
reunidas. Acompanham-na cânticos<br />
comunais (com palavras, em “Pelo<br />
pulso”, ou sem elas, a lembrar os<br />
ritos vocais dos Animal Collective,<br />
como em “Mete as mãos à boca”),<br />
um baixo a <strong>de</strong>sempenhar as suas<br />
funções habituais e as <strong>de</strong> uma<br />
guitarra e sintetizadores.<br />
“Lupiter Deacon” é um espantoso<br />
momento <strong>de</strong> fervilhar percussivo,<br />
sintetizador alienígena e dinâmicas<br />
crescendo-explosão — e um<br />
divertido momento “na na na na<br />
na”, que sublinha o apelo lúdico<br />
<strong>de</strong>stas canções. “Mete as mãos à<br />
boca” lembra uns Battles sem os<br />
histerismos e mais dados aos<br />
encantos libertários da selva,<br />
enquanto “Mudo e surdo” inventa<br />
uma espécie <strong>de</strong> “stoner” suave, com<br />
teclados aos círculos e cantorias<br />
gloriosamente <strong>de</strong>sprovidas <strong>de</strong><br />
sentido. “É uma Água”, interessante<br />
cruzamento <strong>de</strong> referências com a<br />
dose certa <strong>de</strong> idiossincrasias, augura<br />
um futuro radiante para os PAUS.<br />
Pedro Rios<br />
PAUS: o futuro é radiante<br />
Afrobeat<br />
futurista<br />
Donso<br />
Donso<br />
Comet, distri. Megamúsica<br />
mmmnn<br />
Álbum <strong>de</strong> estreia <strong>de</strong><br />
um novo quarteto<br />
com um pé na<br />
cultura tradicional<br />
do Mali e outro na<br />
cena <strong>de</strong> dança <strong>de</strong><br />
colheita francesa. De um lado estão<br />
Ge<strong>de</strong>on Papa Diarra, cantor <strong>de</strong> voz<br />
carinhosa, Guimba Kouyate,<br />
virtuoso do n’goni e doutras cordas,<br />
reforçados por um punhado <strong>de</strong><br />
instrumentistas malis. Do outro há<br />
Thomas Guillaume, típico<br />
percussionista entre cá e lá, e Pierre-<br />
Antoine Grison, que na editora<br />
tecno Ed Banger respon<strong>de</strong> pelo<br />
nome artístico <strong>de</strong> KrazyBalhead.<br />
Juntos, o que fazem é música <strong>de</strong><br />
fusão raízes afro-electrónica, o que<br />
nos tempos que correm está longe<br />
<strong>de</strong> ser uma novida<strong>de</strong>.<br />
Não será muito original, portanto,<br />
mas os Donso exibem na estreia um<br />
leque <strong>de</strong> trunfos que também não<br />
são <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezar. Ge<strong>de</strong>on Papa<br />
Diarra é, para começar, um cantor<br />
notável num estilo a meio caminho<br />
entre o purificador dos espíritos e o<br />
encantor <strong>de</strong> serpentes, tão à<br />
vonta<strong>de</strong> nas gran<strong>de</strong>s paisagens<br />
<strong>de</strong>sérticas, como no espaço<br />
acanhado das caves dançantes<br />
europeias. A equação <strong>de</strong> ritmos<br />
africanos com prestigiditação<br />
electrónica raramente terá soado<br />
tão harmónica e natural como nesta<br />
sequência <strong>de</strong> misturas elásticas e<br />
pulsantes.<br />
Por vezes, o convite a dançar é<br />
irresistível, outras, porventura a<br />
maior parte, é uma coisa mais<br />
anímica, uma vibração que não anda<br />
longe do <strong>de</strong>vaneio e da hipnose.<br />
Po<strong>de</strong>rá não adiantar gran<strong>de</strong> coisa,<br />
mas a estreia dos Donso <strong>de</strong>staca-se<br />
por este “groove” contagioso, que<br />
(melhor que muita concorrência) faz<br />
justiça ao programa <strong>de</strong> um afrobeat<br />
futurista. Luís Maio<br />
36 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Jos van Immerseel: a sua interpretação <strong>de</strong> Berlioz<br />
diverge das propostas com orquestras mo<strong>de</strong>rnas<br />
Clássica<br />
Radiografia<br />
da “Sinfonia<br />
Fantástica”<br />
A magia tímbrica dos<br />
instrumentos <strong>de</strong> época e o<br />
rigor <strong>de</strong> Van Immerseel e<br />
da Anima Eterna acentuam<br />
ainda mais as inovações <strong>de</strong><br />
Berlioz. Cristina Fernan<strong>de</strong>s<br />
Berlioz<br />
Sinfonia Fantástica<br />
Anima Eterna Brugge<br />
Jos van Immerseel (direcção)<br />
Zig-Zag Territoires<br />
mmmmn<br />
Composta em<br />
1830, a “Sinfonia<br />
Fantástica”, <strong>de</strong><br />
Berlioz, é um<br />
exemplo<br />
revolucionário da<br />
arte da orquestração e um<br />
paradigma da música programática<br />
do Romantismo, mesmo se mais<br />
tar<strong>de</strong> o autor prescindiu do<br />
argumento que relatava a paixão<br />
obsessiva <strong>de</strong> um artista por uma<br />
jovem mulher (representada<br />
musicalmente por uma “i<strong>de</strong>ia fixa”<br />
que percorre toda a obra) e as suas<br />
alucinações motivados pelo ópio. As<br />
interpretações <strong>de</strong>sta obra em<br />
instrumentos <strong>de</strong> época não são<br />
inéditas, mas são escassas. Depois<br />
<strong>de</strong> Norrington, Gardiner e<br />
Minkowski, surgiu há pouco tempo a<br />
reveladora versão <strong>de</strong> Jos van<br />
Immerseel com a sua orquestra<br />
Anima Eterna. Conhecendo-se o<br />
perfil meticuloso do maestro belga,<br />
era previsível que o resultado fosse<br />
<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> rigor e se revestisse <strong>de</strong> um<br />
colorido e <strong>de</strong> uma transparência que<br />
diverge das propostas com<br />
orquestras mo<strong>de</strong>rnas, normalmente<br />
caracterizadas por uma massa<br />
sonora mais compacta. A direcção<br />
As composições <strong>de</strong> Pascal Dusapin têm sido<br />
dirigidas por Rostropovitch, Krivine, Simon Rattle<br />
ou Michel Plasson<br />
<strong>de</strong> Immerseel é <strong>de</strong> uma<br />
objectivida<strong>de</strong> quase anti-romântica,<br />
mas a obra nunca per<strong>de</strong> a sua força.<br />
Pelo contrário: a percepção <strong>de</strong> um<br />
tecido orquestral on<strong>de</strong> cada linha e<br />
pormenor se distinguem com<br />
enorme niti<strong>de</strong>z, assim como a<br />
sedução tímbrica — ouçam-se as<br />
ma<strong>de</strong>iras na “Cena nos Campos” ou<br />
os oficlei<strong>de</strong>s associados ao “Dies<br />
Irae” —, contribuem para tornar<br />
ainda mais evi<strong>de</strong>nte o carácter<br />
inovador da composição. No<br />
burlesco Sabbath das bruxas<br />
retratado no último andamento,<br />
Immerseel usa dois pianos Érard em<br />
lugar dos sinos, solução que teria<br />
sido seguida pelo próprio Berlioz<br />
nalgumas salas <strong>de</strong> concerto, e<br />
recorre à sugestiva técnica do “col<br />
legno” (as cordas são percutidas pela<br />
vara do arcos dos violinos) na<br />
evocação da grotesca dança dos<br />
esqueletos. É conhecida a atracção<br />
<strong>de</strong> Berlioz pelas orquestras <strong>de</strong><br />
dimensões megalómanas, mas<br />
Immerseel opta aqui por um efectivo<br />
médio (pouco mais <strong>de</strong> 60 músicos),<br />
apoiando-se no facto <strong>de</strong> o<br />
compositor ter ficado satisfeito com<br />
o resultado obtido com orquestras<br />
alemãs <strong>de</strong> 50 instrumentistas. É<br />
possível que esta opção se <strong>de</strong>va<br />
também a questões <strong>de</strong> economia,<br />
mas por outro lado vem ao encontro<br />
da estética habitual da Anima<br />
Eterna, caracterizada por uma<br />
clareza quase camarística que<br />
parece aspirar a obter uma<br />
radiografia da estrutura interna da<br />
música. A “Sinfonia Fantástica” é<br />
complementada por uma versão<br />
igualmente <strong>de</strong>purada da abertura “O<br />
Carnaval Romano”.<br />
Uma odisseia<br />
orquestral<br />
Pascal Dusapin<br />
7 Solos pour orchestre<br />
Orchestre Philharmonique <strong>de</strong> Liège<br />
Wallonie Bruxelles<br />
Pascal Rophé (direcção)<br />
Naive, 2 CD<br />
mmmmn<br />
Pascal Dusapin<br />
(França, 1955) é um<br />
dos mais <strong>de</strong>stacados<br />
compositores da<br />
actualida<strong>de</strong>, senhor<br />
<strong>de</strong> um extenso<br />
catálogo <strong>de</strong> obras, tocadas<br />
regularmente por prestigiados<br />
agrupamentos em todo o mundo, as<br />
quais se encontram, em gran<strong>de</strong><br />
parte, gravadas pela editora Naïve.<br />
Sendo indiscutível o seu sucesso no<br />
domínio da ópera e no da música<br />
concertante, Dusapin tem um<br />
inquestionável domínio da escrita<br />
orquestral, na qual <strong>de</strong>monstra a sua<br />
“verve” melódica e o largo espectro<br />
<strong>de</strong> influências no seu trabalho.<br />
Os “7 Solos para orquestra”<br />
resultam <strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> obras<br />
escritas entre 1991 e 2008. Aquando<br />
das suas respectivas estreias, foram<br />
dirigidos por maestros da craveira<br />
<strong>de</strong> Rostropovitch, Krivine, Simon<br />
Rattle ou Michel Plasson, facto que<br />
atesta o reconhecimento<br />
internacional do compositor. Desta<br />
vez, foram todos gravados pela<br />
mesma orquestra, sob a direcção <strong>de</strong><br />
Pascal Rophé, maestro muito<br />
associado a Dusapin.<br />
No seu percurso <strong>de</strong> 18 anos, fica<br />
<strong>de</strong>monstrado um cunho pessoal <strong>de</strong><br />
escrita extremamente consistente e<br />
<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> dramatismo. Sendo a<br />
origem das peças autónoma, mesmo<br />
se primordialmente consi<strong>de</strong>radas<br />
como parte <strong>de</strong> um conjunto maior, a<br />
sua audição na íntegra parte <strong>de</strong> um<br />
pressuposto legítimo mas<br />
extremamente ambicioso. É que as<br />
suas relações harmónicas e<br />
motívicas, ou a exploração <strong>de</strong> certos<br />
efeitos aparentados, po<strong>de</strong> tornar a<br />
experiência confusa ou cansativa,<br />
mesmo tendo em conta que umas<br />
obras são mais “harmónicas”, outras<br />
mais “melódicas” ou, ainda, que<br />
exploram atmosferas mais estáticas<br />
ou contrastantes. A direcção <strong>de</strong><br />
Pascal Rophé é atenta aos <strong>de</strong>talhes e<br />
perfeita no domínio das atmosferas,<br />
<strong>de</strong>ixando, contudo, a sensação <strong>de</strong><br />
ainda haver espaço para uma maior<br />
beleza no potencial das partituras <strong>de</strong><br />
Dusapin.<br />
Jazz<br />
Somos todos<br />
bicaenses<br />
O novo projecto <strong>de</strong> Carlos<br />
Bica supera as expectativas.<br />
Nuno Catarino<br />
Carlos Bica<br />
Matéria Prima<br />
Clean Feed<br />
mmmmn<br />
Carlos Bica<br />
andava<br />
satisfeito com o<br />
seu trio<br />
Azul,<br />
uma<br />
parceria com Jim<br />
Black e Frank<br />
Möbus, mas<br />
resolveu avançar ançar<br />
para um projecto<br />
alternativo.<br />
Juntou o<br />
bateristarevelação<br />
João<br />
Lobo, o<br />
experiente<br />
guitarrista<br />
Mário Delgado<br />
e o brilhante<br />
pianista João o<br />
Paulo<br />
(parceria<br />
reforçada<br />
com o<br />
disco<br />
“White Works”). Convidou ainda o<br />
jovem trompetista alemão Matthias<br />
Schriefl, para acrescentar dinâmica.<br />
Neste disco gravado ao vivo, o<br />
quinteto trabalha alguns temas do<br />
repertório <strong>de</strong> Bica, mas não só. Para<br />
além <strong>de</strong> reinventar temas antigos<br />
como “Believer”, “Iceland” ou<br />
“Roses for you” (entre outros),<br />
inclui ainda inesperadas versões:<br />
“For Malena”, <strong>de</strong> Marc Ribot, ou o<br />
tema principal do filme “Paris,<br />
Texas”, <strong>de</strong> Ry Coo<strong>de</strong>r. É inevitável<br />
fazer a comparação <strong>de</strong>sta música<br />
com o trio Azul, mas este projecto<br />
consegue surpreen<strong>de</strong>r: a guitarra <strong>de</strong><br />
Delgado faz esquecer a frieza <strong>de</strong><br />
Frank Möbus; João Lobo não será<br />
Jim Black, mas aguenta o ritmo<br />
sempre com segurança; o piano (e o<br />
pontual acor<strong>de</strong>ão) <strong>de</strong> João Paulo<br />
acrescenta novas cores; o trompete<br />
<strong>de</strong> Schriefl brilha quando solicitado;<br />
e Bica continua o irrepreensível<br />
mestre do contrabaixo, versátil,<br />
criativo. Nada a apontar às<br />
composições (apenas a ausência <strong>de</strong><br />
novida<strong>de</strong>s), mas o mais importante é<br />
ver o modo como são<br />
transformadas: cada canção é<br />
investida com uma intensa energia,<br />
todos os músicos revelam um<br />
impecável acerto e cada tema vai<br />
ganhando asas à medida que é<br />
<strong>de</strong>senvolvido, e a força das melodias<br />
(tão açucaradas que nos conquistam<br />
com facilida<strong>de</strong>) vão sendo<br />
reforçadas pelos arabescos<br />
individuais. Vivendo entre a<br />
sofisticação e o “kitsch”, a música<br />
balança mesmo até à fronteira do<br />
piroso, mas é tudo sabiamente<br />
controlado o pelo lí<strong>de</strong>r contrabaixista.<br />
Este disco não é (só) jazz,<br />
esbate fronteiras <strong>de</strong><br />
estilo: é pop, é rock, é<br />
afro-cubana, é<br />
latina, tanta coisa<br />
ao mesmo tempo.<br />
Bica tem aqui um<br />
gran<strong>de</strong> disco, muito<br />
bem <strong>de</strong>senhado,<br />
muito bem<br />
executado, muito<br />
acessível.<br />
O novo projecto <strong>de</strong> Carlos Bica<br />
consegue surpreen<strong>de</strong>r<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 37
Concertos<br />
Vijay Iyer, um pianista jazz capaz<br />
<strong>de</strong> enveredar por múltiplos rumos,<br />
<strong>de</strong> M.I.A. aos clássicos<br />
Jazz<br />
Parque &<br />
Jazz<br />
O jazz regressa ao campo<br />
<strong>de</strong> ténis <strong>de</strong> Serralves. Nuno<br />
Catarino<br />
Jazz No Parque 2010<br />
Vijay Iyer Trio / Bernardo Sassetti<br />
Trio & Perico Sambeat / Contact<br />
Porto. Parque <strong>de</strong> Serralves. R. Serralves, 997. Tel:<br />
226156500. Sáb., 10, às 18h. De 10/07 a 24/07.<br />
Bilhetes entre €5 e €10.<br />
O palco é original, já bem conhecido<br />
para os fregueses do costume: o<br />
campo <strong>de</strong> ténis do Parque <strong>de</strong><br />
Serralves. Mais um ano, mais uma<br />
edição do Jazz No Parque, o festival<br />
<strong>de</strong> jazz <strong>de</strong> Serralves, três concertos<br />
em três sábados consecutivos: 10, 17<br />
e 24 <strong>de</strong> Julho, sempre às 18h. A<br />
programação <strong>de</strong>ste ano volta a ser<br />
da responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> António<br />
Curvelo e serão apresentadas três<br />
propostas do melhor jazz que se vai<br />
fazendo por aí.<br />
No primeiro dia do festival, 10 <strong>de</strong><br />
Julho, actua o trio do pianista Vijay<br />
Iyer, que recentemente editou<br />
“Historicity”. Este disco, que foi<br />
reconhecido como um dos melhores<br />
do ano transacto, mostra um<br />
pianista em excelente forma a<br />
enveredar por múltiplos rumos e<br />
capaz <strong>de</strong> absorver a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>:<br />
veja-se esse exemplo supremo que é<br />
a versão <strong>de</strong> “Galang” <strong>de</strong> M.I.A., a<br />
conviver bem ao lado <strong>de</strong><br />
reinterpretações<br />
<strong>de</strong> clássicos<br />
como Andrew Hill (“Smoke<br />
Stack”) ou Julius<br />
Hemphill<br />
(“Dogon A.D.”).<br />
No dia 17 actua o trio <strong>de</strong><br />
Bernardo Sassetti, com um<br />
convidado especial, o<br />
espanhol Perico Sambeat.<br />
Sassetti acaba <strong>de</strong> editar o disco<br />
“Motion”, mais uma vez muito<br />
bem acompanhado pelo<br />
contrabaixista Carlos<br />
Barretto e<br />
pelo baterista<br />
Alexandre Frazão,<br />
que já se afirmou<br />
como um dos<br />
gran<strong>de</strong>s<br />
marcos<br />
discográficos<br />
do ano. Além<br />
do convidado<br />
saxofonista, este<br />
concerto vai ser<br />
marcado pela<br />
estreia <strong>de</strong> novas<br />
composições do<br />
pianista. O Jazz no<br />
Parque<br />
encerra com<br />
a actuação, no dia 24<br />
<strong>de</strong> Julho, do grupo<br />
Contact, que reúne um<br />
quinteto <strong>de</strong> intérpretes<br />
<strong>de</strong> primeira linha: Dave<br />
Omar Souleyman<br />
Liebman (saxofone), John<br />
Abercrombie (guitarra), Marc<br />
Copeland (piano), Drew Gress<br />
(contrabaixo) e Billy Hart (bateria).<br />
Com músicos brilhantes como estes,<br />
será difícil conter as expectativas.<br />
Pop<br />
Omar para dançar<br />
Omar Souleyman<br />
Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />
Albuquerque. Tel.: 220120220. 3ª, 13, às 22h. 10€.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Lux Frágil. Av. Infante D. Henrique -<br />
Armazém A (Cais da Pedra a Santa Apolónia). 5ª,<br />
15, às 23h. Tel.: 218820890. 10€.<br />
Há cerca <strong>de</strong> um ano, o sírio Omar<br />
Souleyman e o seu colectivo <strong>de</strong><br />
músicos converteram o Anfiteatro<br />
da Gulbenkian, em <strong>Lisboa</strong>, numa<br />
invulgar pista <strong>de</strong> dança, através <strong>de</strong><br />
uma música física e sintética. Não<br />
custa acreditar que po<strong>de</strong>rá<br />
acontecer o mesmo na Casa da<br />
Música (com os Coup <strong>de</strong>Bam) e no<br />
Lux. Autêntica lenda pop na Síria, a<br />
música <strong>de</strong> Souleyman só agora tem<br />
sido dada a conhecer no oci<strong>de</strong>nte. A<br />
sua sonorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> combina<br />
influências turcas, curdas e<br />
árabes, dissolvidas numa<br />
abordagem electrónica ectrónica<br />
repleta <strong>de</strong> cordas e<br />
percussão. É uma<br />
sonorida<strong>de</strong> no fio da<br />
navalha do cor-<strong>de</strong>-rosa<br />
para ouvidos<br />
oci<strong>de</strong>ntais, mas é<br />
precisamente o<br />
à-vonta<strong>de</strong> dos<br />
músicos, e a<br />
dinâmica <strong>de</strong><br />
festa que é<br />
imposta, que<br />
acabam por<br />
conquistar.<br />
Pertencente aos<br />
quadros da<br />
Sublime<br />
Frequencies,<br />
editora americana especialista em<br />
lançar músicos <strong>de</strong>sconhecidos do<br />
continente africano e asiático,<br />
Souleyman lançou este ano o álbum<br />
“Jazeera Nights: folk and pop sounds<br />
of Syria”, compilação <strong>de</strong> temas<br />
anteriormente apenas disponível em<br />
cassete. Não <strong>de</strong>ve ter sido fácil<br />
compilar uma dúzia <strong>de</strong> canções<br />
provenientes <strong>de</strong>ssas cassetes — é que<br />
nos últimos anos, lançou cerca <strong>de</strong><br />
500, apenas na Síria. Vítor<br />
Belanciano<br />
Os imperdíveis<br />
Strange Boys<br />
The Strange Boys<br />
<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do<br />
Sodré. 4ª, 14, às 22h30. Tel.: 213430107. 8€.<br />
Os Strange Boys são das bandas mais<br />
entusiasmantes que o rock’n’roll nos<br />
ofereceu nos últimos anos e isso é<br />
óbvio para quem lhes conhece “The<br />
Strange Boys And Girls Club” e “Be<br />
Brave”, os dois álbuns que<br />
compõem a sua discografia. Isso é<br />
ainda mais óbvio para quem já os viu<br />
em concerto. Sobem a palco para ser<br />
sonho Dylanesco alimentado a<br />
hormonas <strong>de</strong> adolescente, para ser<br />
elo mo<strong>de</strong>rno<br />
numa<br />
ca<strong>de</strong>ia<br />
muito<br />
antiga (e<br />
sai uma<br />
versão <strong>de</strong><br />
The Strange Boys: canções urgentes e imediatas no MusicBox<br />
Cree<strong>de</strong>nce<br />
Clearwater<br />
Revival).<br />
Eles que<br />
Morcheeba<br />
veremos no<br />
Musicbox, em<br />
<strong>Lisboa</strong>, na<br />
próxima quartafeira<br />
(o ano<br />
passado<br />
passaram pelo<br />
Lounge e pelo<br />
festival Pare<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Coura), recuam<br />
às raízes sem pulsões puristas: it<br />
interessa-lhes aquele momento em<br />
que uma canção se reduz à sua<br />
forma mais urgente e imediata, sem<br />
filtro, e captam nesse movimento<br />
uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> presente, <strong>de</strong> agora, que<br />
reconhecemos nos melhores. E os<br />
Strange Boys <strong>de</strong> Ryan Sambol, o<br />
vocalista/guitarrista <strong>de</strong> voz<br />
estri<strong>de</strong>nte, imediatamente<br />
reconhecível, são claramente uns<br />
dos melhores.<br />
Filtraram toda a história <strong>de</strong><br />
garage-rock, perceberam ao ver os<br />
Black Lips em concerto a força<br />
incorruptível do rock’n’roll e,<br />
quando lhe <strong>de</strong>ram voz própria, a<br />
pessoalíssima voz <strong>de</strong> Ryan Sambol,<br />
cantautor <strong>de</strong>salinhado em banda<br />
eléctrica, tornaram-se vitais. O<br />
concerto é, obviamente, imperdível.<br />
Mário Lopes<br />
Os consagrados e a<br />
nostalgia do Festival<br />
Marés Vivas<br />
Festival Marés Vivas 2010<br />
Vila Nova <strong>de</strong> Gaia. No recinto junto à foz do Rio<br />
Douro (Cabe<strong>de</strong>lo). 5ª, 15, às 18h00 (portas). 25€<br />
(dia). Passe Festival: 45€. Informações: 223703735<br />
(Posto Turismo Gaia).<br />
Palco TMN: GNR, Goldfrapp,<br />
Morcheeba, Edward Maya. Palco<br />
Moche: Dr1ve, Lobo.<br />
A partir da próxima quinta-feira<br />
haverá Marés Vivas no Cabe<strong>de</strong>lo, em<br />
Gaia. Marés Vivas, o festival,<br />
entenda-se. Chega este ano à oitava<br />
edição e mantém-se fiel ao espírito<br />
que o vem<br />
caracterizando.<br />
Ou seja, aposta<br />
38 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Norah Jones no<br />
Cool Jazz Fest<br />
Dead Combo em trio com o realizador Bruno <strong>de</strong><br />
Almeida no Festival <strong>de</strong> Curtas <strong>de</strong> Vila do Con<strong>de</strong><br />
James Murphy vai<br />
aos pratos no Lux<br />
Dee Dee<br />
Bridgewater<br />
Quinteto<br />
Agenda<br />
em consagrados pelo gran<strong>de</strong><br />
público e na carga nostálgica <strong>de</strong><br />
nomes do passado.<br />
Na próxima quinta-feira, primeiro<br />
dia <strong>de</strong> um festival que terminará<br />
sábado, dia 17, veremos os GNR,<br />
cabeças <strong>de</strong> cartaz do primeiro dia, e<br />
Goldfrapp apresentarem os seus<br />
novos álbuns, “Retropolitana” e<br />
“Head First”. Ouvir-se-ão os<br />
regressados Morcheeba,<br />
recentemente reunidos, mostrar o<br />
novo álbum, “Blood Like<br />
Lemona<strong>de</strong>”, e passar em revista<br />
uma carreira que começou no triphop<br />
antes <strong>de</strong> ganhar protagonismo<br />
com a conversão a uma pop tingida<br />
<strong>de</strong> motivos soul (não faltará<br />
certamente “Rome wasn’t built<br />
in a day”).<br />
Depois chegarão os Placebo,<br />
cabeças <strong>de</strong> cartaz <strong>de</strong> sexta-feira, e o<br />
seu glam, versão anos 1990, <strong>de</strong><br />
“Without you I’m nothing”,<br />
chegarão o furacão Peaches e o<br />
espectáculo <strong>de</strong> David Fonseca, no<br />
mesmo dia, e o habitué Ben Harper,<br />
presença habitual em palcos<br />
portugueses e que para encerrar<br />
o festival traz consigo os Relentless<br />
7, a banda que o vem<br />
acompanhando em estúdio e em<br />
palco <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2008, e com quem<br />
gravou “White Lies for Dark Times”<br />
(regresso ao rock mais agreste dos<br />
primeiros tempos) e “Live From<br />
The Montreal International Jazz<br />
Festival”. A noite <strong>de</strong> Sábado conta<br />
ainda com os dEUS, banda querida<br />
dos indies portugueses <strong>de</strong> há duas<br />
décadas, e com os Editors, os mais<br />
bem-sucedidos representantes do<br />
revivalismo pós-punk p britânico.<br />
Para além<br />
Goldfrapp no Festival<br />
Marés Vivas<br />
sexta 9<br />
Optimus Alive! 10<br />
Algés. Passeio Marítimo <strong>de</strong> Algés. Às 17h00. 50€<br />
(dia). Passe Festival: 90€.<br />
Palco Optimus: Jet (18h30), Mão<br />
Morta (19h50), Manic Street<br />
Preachers (21h10), Skunk Anansie<br />
(22h50), Deftones (00h30). Palco<br />
Super Bock: Hurts (17h), Holy Ghost!<br />
(18h10), The Maccabees (19h20),<br />
New Young Pony Club (20h35),<br />
Gossip (21h55), Booka Sha<strong>de</strong><br />
(23h20), Bloody Beetroots Death<br />
Crew 77 (00h55), Steve Aoki (02h).<br />
Palco Optimus Clubbing: Enchufada<br />
DJs (17h), Macacos do Chinês<br />
(18h40), Paus (19h55), Zombies for<br />
Money (20h50), Octa Push (22h05),<br />
Sin<strong>de</strong>n (23h), Buraka Som Sistema<br />
(24h), Benga (01h), Laidback Luke<br />
(02h30).<br />
Aldina Duarte por Olga Roriz<br />
Direcção Musical: Olga Roriz. Com<br />
Aldina Duarte (voz), José Manuel<br />
Neto (guitarra portuguesa), Carlos<br />
Manuel Proença (viola), Pedro<br />
Wallenstein (contrabaixo), Manuel<br />
Paulo (piano), João Lucas<br />
(acor<strong>de</strong>ão), Sebastian Scheriff<br />
(percussão), Ana Isabel Dias (harpa).<br />
<strong>Lisboa</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> S. Luiz. R. Antº Maria<br />
Cardoso, 38-58. 6ª e sáb. às 21h00. Tel.: 213257650.<br />
10€ a 20€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
Dee Dee Bridgewater Quinteto<br />
Estoril. Casino. Pç. José Teodoro dos Santos. Às 22h.<br />
Tel.: 214667700. 30€ (dia). Assinatura: 90€. No<br />
D.Lounge.<br />
XXIX Estoril Jazz - Jazz Num Dia <strong>de</strong><br />
Verão 2010. Informações: 214827862.<br />
Opera(ções) Barrocas<br />
Encenação: Catarina Mol<strong>de</strong>r,<br />
Etienne Lamaison. Direcção<br />
Musical: Marcos Magalhães. Com<br />
Catarina Mol<strong>de</strong>r (soprano), Luis<br />
Rodrigues (barítono), Etienne<br />
Lamaison (clarinete), Marcos<br />
Magalhães (cravo), António Carrilho<br />
(flauta <strong>de</strong> bisel), Catherine Strynckx<br />
(violoncelo). Com Companhia <strong>de</strong><br />
Ópera do Castelo.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Castelo. Às 22h00. Tel.: 218800620. 7,5€.<br />
Crianças: 5€.<br />
Obras <strong>de</strong> Rameau, Haen<strong>de</strong>l,<br />
Pergolesi, Rebel e Couperin.<br />
Bill Orcutt<br />
Porto. Culturgest. Av. dos Aliados, 104 - Ed. da CGD.<br />
Às 22h00. Tel.: 222098116. 5€.<br />
Horse Meat Disco + James<br />
Murphy + Luke Howard +<br />
Severino<br />
<strong>Lisboa</strong>. Lux Frágil. Av. Infante D. Henrique -<br />
Armazém A (Cais da Pedra a Santa Apolónia). Às<br />
23h00. Tel.: 218820890.<br />
Consumo mínimo.<br />
Sérgio Godinho<br />
Aveiro. Teatro Aveirense. Pç. República. Às 22h00.<br />
Tel.: 234400922. 12€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
Bernardo Sassetti, Jean-<br />
François Lézé e Orquestra<br />
Nacional do Porto<br />
Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />
Albuquerque. Às 21h00. Tel.: 220120220. 10€.<br />
Ciclo Jazz Galp/Verão na Casa 2010.<br />
Obras <strong>de</strong> Sassetti, Jarre, Freitas,<br />
Massenet, Barry e Falla.<br />
Orquestra Juvenil da Bahia<br />
<strong>Lisboa</strong>. CCB. Pç. do Império. Às 21h00. Tel.:<br />
213612400. 5,5€ a 15,5€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
Miklós Perényi e Jenö Jandó<br />
Espinho. Auditório. R. 34, 884. Às 22h00. Tel.:<br />
227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
36.º Festival Internacional <strong>de</strong> Música<br />
<strong>de</strong> Espinho.<br />
Freddy Cole Quartet<br />
Figueira da Foz. Centro <strong>de</strong> Artes e Espectáculos. R.<br />
Aba<strong>de</strong> Pedro. Às 22h00. Tel.: 233407200. 5€ a 15€.<br />
3D - Festival Internacional <strong>de</strong> Jazz da<br />
Figueira da Foz.<br />
Lura + Zé Pedro dos Xutos + Las<br />
Gafas + Lovemakers<br />
Torres Novas. Jardim das Rosas. Av. Principal. Às<br />
22h00. Entrada livre.<br />
Jane Duboc + Al Di Meola World<br />
Sinfonia<br />
Funchal. Pq. <strong>de</strong> Santa Catarina. Av. do Infante. Às<br />
21h30. Tel.: 291200930. 15€ (dia). Passe Festival: 30€.<br />
11.º Funchal Jazz Festival.<br />
Cacus<br />
Com José Peixoto (guitarra), Carlos<br />
Zíngaro (violino), Ulrich Mitzlaff<br />
(violoncelo).<br />
<strong>Lisboa</strong>. Galeria Arthobler - <strong>Lisboa</strong>. R. Rodrigues<br />
Faria, 103 - Lx Factory (Ed. G. 03). Às 22h30. Tel.:<br />
965865186. 5€.<br />
The Un<strong>de</strong>rdogs + Cacique’97<br />
Aveiro. Rossio. Às 21h30.Entrada livre. Tel: 234406300.<br />
Sean Riley & The Slowri<strong>de</strong>rs +<br />
Contraband<br />
Vilar Formoso. Pavilhão Multiusos. Via Estruturante.<br />
Às 21h30. Tel.: 271571080. Entrada livre.<br />
Diabo Na Cruz<br />
Com Jorge Cruz (guitarra e voz), B<br />
Fachada (viola braguesa e voz),<br />
Bernardo Barata (baixo e voz), João<br />
Gil (sintes), João Pinheiro (bateria e<br />
percussão).<br />
Freamun<strong>de</strong>. Paços <strong>de</strong> Ferreira. Às 22h00. Entrada<br />
livre.<br />
Quaiss Kitir+Julian<br />
Marley+Finley Quaye.<br />
Cascais. Pq. Marechal Carmona. Às 20h00. 20€.<br />
Júlio Pereira<br />
Com Júlio Pereira (bandolim), Miguel<br />
Veras (viola), Sofia Vitória (voz e<br />
teclados).<br />
Castelo Branco. Cine-Teatro. Av. General Humberto<br />
Delgado. Às 21h30. Tel.: 272349560. 5€ (sujeito a<br />
<strong>de</strong>sconto).<br />
Emily Jane White<br />
Aveiro. Mercado Negro. R. João Mendonça, 17. Às<br />
22h00. Tel.: 234100052.<br />
El Gran Silencio<br />
<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do<br />
Sodré. Às 00h00. Tel.: 213430107. 8€.<br />
sábado 10<br />
Optimus Alive! 10<br />
Algés. Passeio Marítimo <strong>de</strong> Algés. Às 17h. 50€ (dia).<br />
Passe Festival: 90€.<br />
Palco Optimus: Gomez (18h30),<br />
Dropkick Murphys (19h50), Gogol<br />
Bor<strong>de</strong>llo (21h20), Pearl Jam (23h),<br />
LCD Soundsystem (01h30). Palco<br />
Super Bock: Girls (17h), Sean Riley +<br />
The Slowri<strong>de</strong>rs (18h05), Miike<br />
Snow (19h20), The Big Pink<br />
(20h45), Peaches (22h05), Simian<br />
Mobile Disco (23h30), Crookers<br />
(00h45), Boys Noize (02h15).<br />
Palco Optimus Clubbing:<br />
Enday (17h), The Kaviar<br />
(17h45), Noiserv (18h30),<br />
Becky Lee e Drunkfoot<br />
(19h30), Cibelle (20h30),<br />
The Legendary<br />
Tigerman e Convidados<br />
(21h45), Micro Audio<br />
Waves (23h40), Phoebe<br />
Norberto Lobo<br />
Kill<strong>de</strong>er + The Short Straws<br />
(00h45), The Bellrays<br />
(01h50), Homens da Luta<br />
(03h10).<br />
Trio 3: Oliver Lake + Reggie<br />
Workman + Andrew Cyrille<br />
Com Oliver Lake (saxofone), Reggie<br />
Workman (contrabaixo), Andrew<br />
Cyrille (bateria).<br />
Estoril. Casino. Pç. José Teodoro dos Santos. Às<br />
22h00. Tel.: 214667700. 30€ (dia). Assinatura: 90€.<br />
XXIX Estoril Jazz - Jazz Num Dia <strong>de</strong><br />
Verão 2010.<br />
Freddy Cole Quartet<br />
Sintra. CC Olga Cadaval. Pç. Dr. Francisco Sá<br />
Carneiro. Às 22h00. Tel.: 219107110. 15€ a 20€<br />
(sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
B Fachada<br />
Faro. Teatro Lethes. R. Portugal, 58. Às 21h30. Tel.:<br />
289820300. 7€.<br />
Bernardo Sassetti, Jean-François<br />
Lézé e Orquestra Nacional do<br />
Porto<br />
Caldas da Rainha. CC e Congressos. R. Doutor Leonel<br />
Sotto Mayor. Às 21h00. Tel.: 262889650.10€ a 15€.<br />
Obras <strong>de</strong> Sassetti, Jarre, Freitas,<br />
Massenet, Barry e Falla.<br />
Barclay James Harvest<br />
Vila Nova <strong>de</strong> Gaia. Miradouro da Serra do Pilar.<br />
Santa Marinha. Às 22h00. Entrada livre.<br />
Informações: 223742400.<br />
Bill Orcutt<br />
<strong>Lisboa</strong>. Museu do Chiado. R. Serpa Pinto, 4. Às<br />
22h30. Tel.: 213432148. 5€.<br />
Melech Mechaya<br />
Sesimbra. Cine-Teatro <strong>Municipal</strong> João Mota. Av.<br />
Liberda<strong>de</strong>, 46. Às 22h00. Tel.: 212234034. 5€.<br />
Sérgio Godinho<br />
Viana do Castelo. Jardim da Marina. Av. Marginal. Às<br />
21h45. Entrada livre.<br />
Ana Moura<br />
Águeda. Lg. 1º <strong>de</strong> Maio. Às 22h30. Entrada livre.<br />
Jordi Savall<br />
Com Jordi Savall (rebab; lira <strong>de</strong> arco e<br />
viela), Driss El Maloumi (oud),<br />
Dimitris Psonis s (santur e moresca),<br />
Pedro Estevan (darbouka; <strong>de</strong>f;<br />
tambor e pan<strong>de</strong>ireita).<br />
Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Igreja <strong>de</strong> N. Sra. da Conceição,<br />
Matriz. R. Igreja e R. São<br />
Pedro.<br />
Às 21h45. Tel.: 252615791. 5791. 6€<br />
(sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
Passe Festival: 35€.<br />
Informações:<br />
252614145.<br />
Festival<br />
Internacional <strong>de</strong><br />
Música da<br />
Póvoa <strong>de</strong><br />
Varzim.<br />
Emily Jane<br />
White<br />
Braga. Velha-a-<br />
Branca, Estaleiro<br />
Cultural. Lg.<br />
Senhora a Branca,<br />
23.<br />
Às 22h00. Tel.:<br />
253618234.<br />
Bruno <strong>de</strong><br />
Almeida<br />
+ Dead<br />
Combo<br />
Esperanza<br />
Spalding<br />
Vila do Con<strong>de</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> –<br />
Sala 1. Av. Dr. João Canavarro. Às<br />
00h30. Tel.: 252290050. 10€.<br />
Concerto-instalação “Esse Olhar Que<br />
Era Só Teu”. Remixed. Curtas - 18.º<br />
Festival Internacional <strong>de</strong> Cinema.<br />
DJ Jazzanova + Mike Stellar<br />
<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do<br />
Sodré. Às 02h00. Tel.: 213430107. 8€.<br />
domingo 11<br />
Cyro Baptista<br />
Coimbra. Pç. do Comércio. Às 22h00. Entrada livre.<br />
Esperanza Spalding Quarteto<br />
Com Esperanza Spalding<br />
(contrabaixo e voz), Leo Genovese<br />
(piano), Ricardo Vogt (guitarra),<br />
Dana Hawkins (bateria).<br />
Estoril. Casino. Pç. José Teodoro dos Santos. Às<br />
22h00. Tel.: 214667700. 30€ (dia). Assinatura: 90€.<br />
XXIX Estoril Jazz - Jazz Num Dia <strong>de</strong><br />
Verão 2010.<br />
segunda 12<br />
Tiken Jah Fakoly + Terrakota<br />
Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />
Albuquerque. Às 21h00. Tel.: 220120220. 10€.<br />
Mor Karbasi<br />
Manta Rota. Praia <strong>de</strong> Manta Rota - Vila Real <strong>de</strong><br />
Santo António. Às 22h00. Entrada livre.<br />
Informações: 214408565.<br />
Festival Sete Sóis Sete Luas 2010.<br />
terça 13<br />
Norah Jones<br />
Gandarinha. Hipódromo Manuel Possolo. R.<br />
Viscon<strong>de</strong> da Gandarinha. Às 22h00. Tel.:<br />
214844299. 20€ a 60€.<br />
Cool Jazz Fest 2010.<br />
quarta 14<br />
Deep Purple<br />
<strong>Lisboa</strong>. Coliseu. R. Portas St. Antão, 96. Às 21h30<br />
(portas abrem às 20h30). Tel.: 213240580. 28€ a<br />
32€. Camarotes: 150€ a 192€.<br />
Hanne Hukkelberg<br />
<strong>Lisboa</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> Maria Matos. Av. Frei<br />
Miguel<br />
Contreiras, 52. Às 22h00. Tel.: 218438801.<br />
15€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
Norberto Lobo<br />
<strong>Lisboa</strong>. A Barraca - Teatro Cinearte. Lg Santos, 2.<br />
Às 22h00. Tel.: 213965360. 6€.<br />
Sei Miguel<br />
<strong>Lisboa</strong>. Galeria Zé dos Bois. R. da Barroca, 59 -<br />
Bairro Alto. Às 22h00. Tel.: 213430205. 5€.<br />
quinta 15<br />
Samuel Úria<br />
Ton<strong>de</strong>la. Cine Tejá - Novo Ciclo ACERT. R. Dr.<br />
Ricardo Mota. Às 22h00. Tel.: 232814400. 10€.<br />
Passe Festival: 22,5€. Desconto para sócios.<br />
Phill Niblock + Katherine<br />
Liberovskaya<br />
Guarda. Teatro <strong>Municipal</strong>. R. Batalha Reis,<br />
12. Às 21h30. Tel.: 271205241. 5€.<br />
Quarteto<br />
Com Pedro Burmester (piano),<br />
Fausto Neves (piano), Miquel<br />
Bernat (percussão), Manuel<br />
Campos (percussão).<br />
Espinho. Auditório. R. 34, 884. Às 22h00.<br />
Tel.: 227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
36.º Festival Internacional <strong>de</strong><br />
Música <strong>de</strong> Espinho.<br />
Pop Dell’Arte + Corsage<br />
<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho,<br />
24 - Cais do Sodré. Às 23h00. Tel.:<br />
213430107. 10€.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 39
Concertos<br />
Ben Harper e os seus Relentless 7 vão estar no Festival Marés Vivas<br />
<strong>de</strong>les, o Marés Vivas conta no<br />
palco principal com concertos <strong>de</strong><br />
Edward Maya (dia 15), A Silent Film<br />
(dia 16) e Nikolaj Grandjean (dia 17).<br />
O palco secundário, cem por cento<br />
português, recebe Dr1ve e Lobo (dia<br />
15), Azeitonas, André Indiana e<br />
Mónica Ferraz (dia 16), e João Só E<br />
Os Abandonados e Caim (dia 17).<br />
M.L.<br />
Clássica<br />
Viagem<br />
musical à<br />
volta do<br />
globo<br />
O conjunto <strong>de</strong> violas da<br />
gamba Fretwork apresenta<br />
em Espinho o projecto<br />
“The World Encompassed”,<br />
recriação musical da<br />
viagem <strong>de</strong> Francis Drake<br />
entre 1577 e 1580. Cristina<br />
Fernan<strong>de</strong>s<br />
musicais e experimentar novos<br />
repertórios. Des<strong>de</strong> as mais antigas<br />
obras instrumentais impressas em<br />
Veneza em 1501 à música<br />
contemporânea, passando pelos<br />
compositores ingleses dos séculos<br />
XVI e XVII (Byrd, Gibbons, Lawes,<br />
Purcell, Locke, Dowland), por J. S.<br />
Bach ou pelas sonorida<strong>de</strong>s da<br />
música “klezmer”, o grupo tem<br />
explorado em concerto e em disco<br />
uma vasta gama <strong>de</strong> estilos e épocas.<br />
Tem assumido também um<br />
importante papel no incentivo à<br />
criação <strong>de</strong> novas peças através <strong>de</strong><br />
encomendas a compositores tão<br />
importantes como George<br />
Benjamin, Michael Nyman, John<br />
Tavener, Gavin Bryars, Elvis<br />
Costello, Alexan<strong>de</strong>r Goehr, Tan<br />
Dun, Barry Guy, Thea Musgrave ou<br />
Simon Bainbridge.<br />
Na sua estreia no Festival<br />
Internacional <strong>de</strong> Música <strong>de</strong> Espinho<br />
(dia 12, às 22h), o grupo irá<br />
apresentar precisamente um dos<br />
seus últimos projectos criativos,<br />
<strong>de</strong>senvolvido em parceria com o<br />
compositor Orlando Gough (n.<br />
1953). Sob o título “The World<br />
Encompassed”, será realizado um<br />
percurso musical alusivo às viagens<br />
marítimas <strong>de</strong> Francis Drake entre<br />
1577 e 1580. Sabe-se que o corsário e<br />
explorador inglês foi acompanhado<br />
durante a sua épica jornada por<br />
quatro intérpretes <strong>de</strong> viola da<br />
gamba, que tocavam nos momentos<br />
<strong>de</strong> culto religioso, serviam <strong>de</strong><br />
acompanhamento a hinos<br />
e canções e o entretinham<br />
durante as refeições, para<br />
além <strong>de</strong> terem servido para<br />
impressionar os nativos da Ámerica<br />
do Sul e <strong>de</strong> Java. A obra <strong>de</strong><br />
Orlando Gough, compositor<br />
que se tem <strong>de</strong>dicado sobretudo a<br />
escrever para espectáculos <strong>de</strong><br />
dança e teatro, combina trechos<br />
musicais originais do século XVI (<strong>de</strong><br />
John Taverner, Robert Parsons ou<br />
Alonso Mudarra) com peças<br />
novas e com a recriação dos<br />
exóticos ambientes <strong>de</strong>sta viagem à<br />
volta do mundo. Este programa já<br />
foi apresentado em vários países,<br />
incluindo numa digressão<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>z concertos à América do<br />
Norte.<br />
Éric Le Sage e os<br />
segredos da música<br />
<strong>de</strong> Schumann<br />
Éric Le Sage<br />
Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Auditório <strong>Municipal</strong>. R. D. Maria<br />
I, 56. 3ª, 13, às 21h45. Tel.: 252614145. 6€ (sujeito a<br />
<strong>de</strong>sconto). Passe Festival: 35€.<br />
32º Festival Internacional <strong>de</strong> Música da<br />
Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Obras <strong>de</strong> Schumann.<br />
Para Éric Le Sage, a música <strong>de</strong> Robert<br />
Schumann parece não ter segredos.<br />
Po<strong>de</strong> mesmo dizer-se que se trata do<br />
pianista do momento no que diz<br />
respeito à interpretação do extenso<br />
repertório <strong>de</strong>ste compositor<br />
romântico nascido há 200 anos.<br />
Vencedor dos concursos<br />
internacionais <strong>de</strong> piano do Porto<br />
(1985) e Robert Schumann <strong>de</strong> Zwickau<br />
(1989), o pianista francês encontra-se<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2006 a realizar a gravação<br />
integral da produção para piano <strong>de</strong><br />
Schumann na etiqueta Alpha, tendo<br />
obtido por esse trabalho alguns<br />
importantes prémios da crítica<br />
discográfica internacional. A sua<br />
presença no Festival Internacional <strong>de</strong><br />
Música da Póvoa <strong>de</strong> Varzim com um<br />
recital <strong>de</strong>stinado a assinalar o<br />
bicentenário <strong>de</strong> Schumann era, pois,<br />
uma escolha óbvia e pertinente. No dia<br />
13, Éric Le Sage tocará no Auditório<br />
<strong>Municipal</strong> as “Blumenstück” op. 19, os<br />
três Romances op. 28, a “Humoresque”<br />
op. 20 e os Estudos Sinfónicos op. 13.<br />
A sensibilida<strong>de</strong>, a subtileza <strong>de</strong><br />
fraseados, o lirismo poético e a<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> variar o colorido da<br />
sonorida<strong>de</strong> fazem <strong>de</strong> Le Sage um<br />
intérprete <strong>de</strong> eleição do universo<br />
schumaniano. Apesar <strong>de</strong> o seu<br />
repertório ser bastante mais extenso,<br />
nos últimos tempos tem sido<br />
sobretudo um embaixador do<br />
compositor alemão no mundo<br />
através <strong>de</strong> concertos em numerosos<br />
países. Éric Le Sage tem tocado nos<br />
mais importantes festivais e salas <strong>de</strong><br />
concertos internacionais e já foi<br />
dirigido por maestros tão ilustres<br />
como Armin Jordan, Louis Langrée,<br />
Michel Plasson ou Sir Simon Rattle.<br />
Além da etiqueta Alpha, já gravou<br />
para a RCA-BMG, a Naïve e a EMI,<br />
<strong>de</strong>stacando-se os seus registos da<br />
música <strong>de</strong> Francis Poulenc. C.F.<br />
Ensemble Fretwork<br />
Espinho. Auditório. Rua 34, 884. 2ª, 12, às 22h00.<br />
Tel.: 227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
36.º Festival Internacional <strong>de</strong><br />
Música <strong>de</strong> Espinho.<br />
O agrupamento britânico Fretwork<br />
não é apenas mais um “consort” <strong>de</strong><br />
violas da gamba especializado em<br />
música do Renascimento e do<br />
Barroco. É um projecto artístico<br />
abrangente que ao longo das duas<br />
últimas décadas tem procurado<br />
quebrar barreirras entre géneros<br />
Os britânicos Fretwork têm procurado quebrar<br />
barreiras entre géneros musicais<br />
Éric Le Sage interpreta Schumann na Póvoa <strong>de</strong> Varzim<br />
40 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Concertos<br />
Ben Harper e os seus Relentless 7 vão estar no Festival Marés Vivas<br />
<strong>de</strong>les, o Marés Vivas conta no<br />
palco principal com concertos <strong>de</strong><br />
Edward Maya (dia 15), A Silent Film<br />
(dia 16) e Nikolaj Grandjean (dia 17).<br />
O palco secundário, cem por cento<br />
português, recebe Dr1ve e Lobo (dia<br />
15), Azeitonas, André Indiana e<br />
Mónica Ferraz (dia 16), e João Só E<br />
Os Abandonados e Caim (dia 17).<br />
M.L.<br />
Clássica<br />
Viagem<br />
musical à<br />
volta do<br />
globo<br />
O conjunto <strong>de</strong> violas da<br />
gamba Fretwork apresenta<br />
em Espinho o projecto<br />
“The World Encompassed”,<br />
recriação musical da<br />
viagem <strong>de</strong> Francis Drake<br />
entre 1577 e 1580. Cristina<br />
Fernan<strong>de</strong>s<br />
musicais e experimentar novos<br />
repertórios. Des<strong>de</strong> as mais antigas<br />
obras instrumentais impressas em<br />
Veneza em 1501 à música<br />
contemporânea, passando pelos<br />
compositores ingleses dos séculos<br />
XVI e XVII (Byrd, Gibbons, Lawes,<br />
Purcell, Locke, Dowland), por J. S.<br />
Bach ou pelas sonorida<strong>de</strong>s da<br />
música “klezmer”, o grupo tem<br />
explorado em concerto e em disco<br />
uma vasta gama <strong>de</strong> estilos e épocas.<br />
Tem assumido também um<br />
importante papel no incentivo à<br />
criação <strong>de</strong> novas peças através <strong>de</strong><br />
encomendas a compositores tão<br />
importantes como George<br />
Benjamin, Michael Nyman, John<br />
Tavener, Gavin Bryars, Elvis<br />
Costello, Alexan<strong>de</strong>r Goehr, Tan<br />
Dun, Barry Guy, Thea Musgrave ou<br />
Simon Bainbridge.<br />
Na sua estreia no Festival<br />
Internacional <strong>de</strong> Música <strong>de</strong> Espinho<br />
(dia 12, às 22h), o grupo irá<br />
apresentar precisamente um dos<br />
seus últimos projectos criativos,<br />
<strong>de</strong>senvolvido em parceria com o<br />
compositor Orlando Gough (n.<br />
1953). Sob o título “The World<br />
Encompassed”, será realizado um<br />
percurso musical alusivo às viagens<br />
marítimas <strong>de</strong> Francis Drake entre<br />
1577 e 1580. Sabe-se que o corsário e<br />
explorador inglês foi acompanhado<br />
durante a sua épica jornada por<br />
quatro intérpretes <strong>de</strong> viola da<br />
gamba, que tocavam nos momentos<br />
<strong>de</strong> culto religioso, serviam <strong>de</strong><br />
acompanhamento a hinos<br />
e canções e o entretinham<br />
durante as refeições, para<br />
além <strong>de</strong> terem servido para<br />
impressionar os nativos da Ámerica<br />
do Sul e <strong>de</strong> Java. A obra <strong>de</strong><br />
Orlando Gough, compositor<br />
que se tem <strong>de</strong>dicado sobretudo a<br />
escrever para espectáculos <strong>de</strong><br />
dança e teatro, combina trechos<br />
musicais originais do século XVI (<strong>de</strong><br />
John Taverner, Robert Parsons ou<br />
Alonso Mudarra) com peças<br />
novas e com a recriação dos<br />
exóticos ambientes <strong>de</strong>sta viagem à<br />
volta do mundo. Este programa já<br />
foi apresentado em vários países,<br />
incluindo numa digressão<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>z concertos à América do<br />
Norte.<br />
Éric Le Sage e os<br />
segredos da música<br />
<strong>de</strong> Schumann<br />
Éric Le Sage<br />
Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Auditório <strong>Municipal</strong>. R. D. Maria<br />
I, 56. 3ª, 13, às 21h45. Tel.: 252614145. 6€ (sujeito a<br />
<strong>de</strong>sconto). Passe Festival: 35€.<br />
32º Festival Internacional <strong>de</strong> Música da<br />
Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Obras <strong>de</strong> Schumann.<br />
Para Éric Le Sage, a música <strong>de</strong> Robert<br />
Schumann parece não ter segredos.<br />
Po<strong>de</strong> mesmo dizer-se que se trata do<br />
pianista do momento no que diz<br />
respeito à interpretação do extenso<br />
repertório <strong>de</strong>ste compositor<br />
romântico nascido há 200 anos.<br />
Vencedor dos concursos<br />
internacionais <strong>de</strong> piano do Porto<br />
(1985) e Robert Schumann <strong>de</strong> Zwickau<br />
(1989), o pianista francês encontra-se<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2006 a realizar a gravação<br />
integral da produção para piano <strong>de</strong><br />
Schumann na etiqueta Alpha, tendo<br />
obtido por esse trabalho alguns<br />
importantes prémios da crítica<br />
discográfica internacional. A sua<br />
presença no Festival Internacional <strong>de</strong><br />
Música da Póvoa <strong>de</strong> Varzim com um<br />
recital <strong>de</strong>stinado a assinalar o<br />
bicentenário <strong>de</strong> Schumann era, pois,<br />
uma escolha óbvia e pertinente. No dia<br />
13, Éric Le Sage tocará no Auditório<br />
<strong>Municipal</strong> as “Blumenstück” op. 19, os<br />
três Romances op. 28, a “Humoresque”<br />
op. 20 e os Estudos Sinfónicos op. 13.<br />
A sensibilida<strong>de</strong>, a subtileza <strong>de</strong><br />
fraseados, o lirismo poético e a<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> variar o colorido da<br />
sonorida<strong>de</strong> fazem <strong>de</strong> Le Sage um<br />
intérprete <strong>de</strong> eleição do universo<br />
schumaniano. Apesar <strong>de</strong> o seu<br />
repertório ser bastante mais extenso,<br />
nos últimos tempos tem sido<br />
sobretudo um embaixador do<br />
compositor alemão no mundo<br />
através <strong>de</strong> concertos em numerosos<br />
países. Éric Le Sage tem tocado nos<br />
mais importantes festivais e salas <strong>de</strong><br />
concertos internacionais e já foi<br />
dirigido por maestros tão ilustres<br />
como Armin Jordan, Louis Langrée,<br />
Michel Plasson ou Sir Simon Rattle.<br />
Além da etiqueta Alpha, já gravou<br />
para a RCA-BMG, a Naïve e a EMI,<br />
<strong>de</strong>stacando-se os seus registos da<br />
música <strong>de</strong> Francis Poulenc. C.F.<br />
Ensemble Fretwork<br />
Espinho. Auditório. Rua 34, 884. 2ª, 12, às 22h00.<br />
Tel.: 227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />
36.º Festival Internacional <strong>de</strong><br />
Música <strong>de</strong> Espinho.<br />
O agrupamento britânico Fretwork<br />
não é apenas mais um “consort” <strong>de</strong><br />
violas da gamba especializado em<br />
música do Renascimento e do<br />
Barroco. É um projecto artístico<br />
abrangente que ao longo das duas<br />
últimas décadas tem procurado<br />
quebrar barreirras entre géneros<br />
Os britânicos Fretwork têm procurado quebrar<br />
barreiras entre géneros musicais<br />
Éric Le Sage interpreta Schumann na Póvoa <strong>de</strong> Varzim<br />
40 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
42 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon<br />
Cinema<br />
Sábado Domingo 11h, 13h20, 14h10, 15h30, 16h30,<br />
17h40, 18h40, 19h50, 21h20, 22h, 23h30, 00h10 (V.<br />
Port./3D) 3ª 14h10, 16h30, 18h40, 19h50, 21h20, 22h,<br />
23h30, 00h10 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
14h30, 17h, 19h20, 22h, 00h15 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª<br />
13h30, 16h10, 18h50, 21h10, 23h30 (V.Port./3D)<br />
Domingo 11h, 13h30, 16h10, 18h50, 21h10, 23h30<br />
(V.Port./3D); ZON Lusomundo CascaiShopping: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h10, 18h40,<br />
21h30, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />
15h10, 17h25, 19h40, 22h, 00h15 (V.Port./3D)<br />
Domingo 11h, 12h50, 15h10, 17h25, 19h40, 22h, 00h15<br />
(V.Port./3D); ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h15, 17h35,<br />
21h50, 00h10 (3D); ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h, 18h20, 21h10, 23h30 (V.<br />
Port./3D) Domingo 11h, 13h30, 16h, 18h20, 21h10,<br />
23h30 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Dolce Vita<br />
Miraflores: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 15h30, 17h40,<br />
19h50, 22h, 00h10 (V.Port./3D) Domingo 11h, 15h30,<br />
17h40, 19h50, 22h, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Odivelas Parque: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h,<br />
13h30, 15h, 16h, 17h15, 18h10, 19h30, 21h, 21h40, 24h<br />
(V.Port./3D) 6ª 13h, 13h30, 15h, 16h, 17h15, 18h10,<br />
19h30, 21h, 21h40, 23h30(V.Port./3D) Sábado 11h,<br />
13h, 13h30, 15h, 16h, 17h15, 18h10, 19h30, 21h, 21h40,<br />
23h30(V.Port./3D) Domingo 11h, 13h, 13h30, 15h, 16h,<br />
17h15, 18h10, 19h30, 21h, 21h40 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª<br />
13h, 15h10, 17h30, 19h50, 22h10 (V.Port./3D) Domingo<br />
10h45, 13h, 15h10, 17h30, 19h50, 22h10 (V.<br />
Port./3D); ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 14h, 16h20, 18h40, 21h15, 23h40 (V.<br />
Port./3D) Domingo 11h15, 14h, 16h20, 18h40, 21h15,<br />
23h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Torres Vedras:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 15h30, 18h,<br />
21h, 23h20 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Torres<br />
Vedras: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h15, 18h45,<br />
21h45, 00h05 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h45, 16h15,<br />
18h45, 21h45, 00h05 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
Vasco da Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h30, 16h, 18h50, 21h10, 23h50 (3D); ZON<br />
Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h10,<br />
15h25, 17h35, 19h45, 21h50, 24h (V.Port./3D) Sábado<br />
Domingo 11h, 13h10, 15h25, 17h35, 19h45, 21h50, 24h<br />
(V.Port./3D); Auditório Charlot: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª<br />
4ª 21h30 (V.Port.) Sábado Domingo 16h, 21h30 (V.<br />
Port.); Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 17h20, 19h30, 21h40<br />
(V.Port./3D) 6ª Sábado 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />
21h40, 23h50 (V.Port./3D); Castello Lopes - Fórum<br />
Barreiro: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10,<br />
17h20, 19h30, 21h40 (V.Port./3D) 6ª Sábado 12h50,<br />
15h10, 17h20, 19h30, 21h40, 23h40 (V.<br />
Port./3D); Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 4:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 17h20,<br />
19h20, 21h20, 24h (V.Port./3D); UCI Freeport: Sala 1:<br />
5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 18h10, 21h10 (V.Port.) 6ª 15h30,<br />
18h10, 21h10, 23h15 (V.Port.) Sábado 13h15, 15h30,<br />
18h10, 21h10, 23h15 (V.Port.) Domingo 13h15, 15h30,<br />
18h10, 21h10 (V.Port.); ZON Lusomundo Almada<br />
Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h55,<br />
15h05, 17h15, 19h20, 21h50, 00h15 (3D); ZON<br />
Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />
4ª 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40, 23h55 (V.Port.)<br />
Domingo 11h, 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40,<br />
23h55 (V.Port.); ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª<br />
6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h25, 15h40, 18h15, 21h, 23h25<br />
(V.Port./3D) Domingo 11h, 13h25,<br />
15h40, 18h15, 21h,<br />
23h25<br />
(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 13h30, 15h30, 17h, 18h30,<br />
19h20, 21h, 21h40, 23h30, 00h10 (V.Port./3D)<br />
Domingo 10h30, 11h, 13h, 13h30, 15h30, 17h, 18h30,<br />
19h20, 21h, 21h40, 23h30, 00h10 (V.Port./3D);<br />
Porto: Arrábida 20: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 14h, 16h25, 18h50, 21h20, 24h (V.<br />
Port./3D); Arrábida 20: Sala 20: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 14h15, 16h50, 22h15, 00h45 (V.<br />
Port./3D) 3ª 4ª 16h50, 22h15, 00h45 (V.<br />
Port./3D); Arrábida 20: Sala 15: 5ª 6ª 2ª 3ª 14h30,<br />
17h, 19h (V.Port./3D), 22h, 00h25 Sábado Domingo<br />
4ª 14h30 (V.Port./3D), 22h, 00h25; Cinemax -<br />
Penafiel: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h50 (V.Port.)<br />
6ª 15h30, 21h50, 23h50 (V.Port.) Sábado 15h, 17h30,<br />
21h50, 23h50 (V.Port.) Domingo 15h, 17h30, 21h50<br />
(V.Port.); Nun`Álvares: Sala 1: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 16h30, 19h30; Vivacine -<br />
Maia: Sala 1: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h10,<br />
18h30, 21h20, 23h40 (V.Port./3D) Domingo 11h10,<br />
13h40, 16h10, 18h30, 21h20, 23h40 (V.<br />
Port./3D); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h, 18h30,<br />
21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Dolce<br />
Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />
16h30, 19h, 21h50, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Ferrara Plaza: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
15h, 17h20, 19h40, 22h (V.Port./3D) 6ª Sábado 15h,<br />
17h20, 19h40, 22h, 00h20 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Ferrara Plaza: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
15h50, 18h10, 21h20 (V.Port./3D) 6ª Sábado 15h50,<br />
18h10, 21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
GaiaShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
12h50, 13h20, 15h, 15h50, 17h20, 18h20, 19h40, 21h,<br />
21h50, 23h30, 24h (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
MaiaShopping: 5ª 3ª 4ª 13h15, 16h, 18h30, 21h15<br />
(V.Port./3D) 6ª Sábado 13h15, 16h, 18h30, 21h15,<br />
23h45 (V.Port./3D) Domingo 10h45, 13h15, 16h,<br />
18h30, 21h15, 23h45 (V.Port./3D) 2ª 10h45, 13h15,<br />
16h, 18h30, 21h15 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
MaiaShopping: 5ª 3ª 4ª 14h, 16h45, 19h15, 22h (V.<br />
Port./3D) 6ª Sábado 14h, 16h45, 19h15, 22h, 00h30<br />
(V.Port./3D) Domingo 11h15, 14h, 16h45, 19h15, 22h,<br />
00h30 (V.Port./3D) 2ª 11h15, 14h, 16h45, 19h15, 22h<br />
(V.Port./3D); ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h30, 17h50,<br />
20h10, 22h30, 00h40 (3D); ZON Lusomundo<br />
Marshopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40,<br />
16h10, 18h50, 21h30, 24h (V.Port./3D) Domingo 11h,<br />
13h40, 16h10, 18h50, 21h30, 24h (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 10h20, 12h30, 14h50, 17h20,<br />
19h50, 22h10, 00h30 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
NorteShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h30, 16h, 18h30, 21h30, 24h (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />
4ª 12h40, 15h, 17h30, 19h50, 22h, 00h25 (V.<br />
Port./3D) Domingo 10h50, 12h40, 15h, 17h30, 19h50,<br />
22h, 00h25 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Parque<br />
Nascente: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h,<br />
21h10, 23h40 (V.Port./3D) Domingo 10h30, 13h,<br />
15h20, 18h, 21h10, 23h40 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />
4ª 13h30, 15h50, 18h30, 21h40, 00h10 (V.Port./3D)<br />
Domingo 11h, 13h30, 15h50, 18h30, 21h40, 00h10<br />
(V.Port./3D); Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 1: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
12h45, 15h,<br />
17h10,<br />
19h20, 21h20 (V.<br />
Port./3D) 6ª Sábado 12h45,<br />
15h, 17h10, 19h20, 21h20, 23h40<br />
(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum<br />
Aveiro: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h05, 18h40, 21h10 (V.<br />
Port./3D) 6ª Sábado 13h30, 16h05, 18h40, 21h10,<br />
23h50 (V.Port./3D) Domingo 10h30, 13h30, 16h05,<br />
18h40, 21h10 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum<br />
Aveiro: 5ª 2ª 3ª 4ª 14h15, 16h50, 19h25, 22h (V.<br />
Port./3D) 6ª Sábado 14h15, 16h50, 19h25, 22h,<br />
00h35 (V.Port./3D) Domingo 11h, 14h15, 16h50,<br />
19h25, 22h (V.Port./3D); ZON Lusomundo Glicínias:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h20,<br />
18h55, 21h30, 00h05 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />
Glicínias: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h55,<br />
19h30, 22h, 00h35 (V.Port./3D) Domingo 11h, 14h20,<br />
16h55, 19h30, 22h, 00h35 (V.Port./3D);<br />
As expectativas não eram gran<strong>de</strong>s<br />
para a quarta (e, anuncia-se<br />
<strong>de</strong>finitivamente, última) aventura do<br />
ogre ver<strong>de</strong>, <strong>de</strong>pois do capital<br />
realizado com o primeiro filme ter<br />
sido <strong>de</strong>sperdiçado progressivamente<br />
mais com “Shrek 2” (2004) e “Shrek,<br />
o Terceiro” (2007). É, precisamente,<br />
por isso que “Shrek para Sempre!” é<br />
uma pequena surpresa. Sem estar à<br />
altura da estreia (ainda a melhor<br />
longa saída até hoje da Dreamworks<br />
Animation), este quarto episódio — o<br />
primeiro a escapar ao controle dos<br />
criativos do filme original — sobe o<br />
nível abandonando a tendência para<br />
resumir tudo a gagues <strong>de</strong> “sitcom” e,<br />
literalmente, “reescrevendo a<br />
história” do filme original.<br />
Numa pirueta <strong>de</strong> argumento que<br />
remete para o clássico <strong>de</strong> Frank<br />
Capra “Do Céu Caiu uma Estrela”<br />
(1946), o filme coloca um Shrek em<br />
crise <strong>de</strong> meia-ida<strong>de</strong> a viver num<br />
Reino <strong>de</strong> Bué Bué Longe alternativo<br />
on<strong>de</strong> nunca chegou a nascer, o<br />
pérfido Rumpelstilzschen usurpou o<br />
trono e Fiona li<strong>de</strong>ra a resistência ao<br />
tirano — forçando o ogre a<br />
reconquistar a amada que não sabe<br />
quem ele é para anular o feitiço e<br />
repor tudo no <strong>de</strong>vido lugar.<br />
Exalando um peculiar aroma <strong>de</strong><br />
melancolia que o torna no mais<br />
adulto dos quatro filmes, “Shrek Para<br />
Sempre!” não resolve o problema<br />
central das sequelas — o que começou<br />
como uma <strong>de</strong>smontagem subversiva<br />
dos contos <strong>de</strong> fadas acomodou-se nos<br />
próprios lugares-comuns <strong>de</strong> que fazia<br />
troça — mas pelo<br />
menos tem<br />
consciência <strong>de</strong>le,<br />
ao usá-lo como<br />
ponto <strong>de</strong> partida<br />
para uma última<br />
aventura que fornece<br />
um final digno para a<br />
série.<br />
Continuam<br />
A Teta Assustada<br />
La Teta Asustada<br />
De Claudia Llosa<br />
com Magaly Solier, Susi<br />
Sánchez, Efraín Solís. M/12<br />
MMNNN<br />
<strong>Lisboa</strong>: UCI Cinemas - El Corte<br />
Inglés: Sala 8: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª<br />
14h15, 16h30, 19h, 21h35, 24h Domingo<br />
11h30, 14h15, 16h30, 19h, 21h35, 24h<br />
Goste-se mais ou menos do<br />
resultado final, não po<strong>de</strong><br />
Estreiam<br />
Final digno<br />
para uma<br />
série<br />
“Shrek Para Sempre!” exala<br />
uma melancolia que o torna<br />
no mais adulto dos quatro<br />
filmes. Jorge Mourinha<br />
Shrek Para Sempre<br />
Shrek Forever After<br />
De Mike Mitchell<br />
com Mike Myers (Voz), Eddie Murphy<br />
(Voz), Cameron Diaz (Voz), Antonio<br />
Ban<strong>de</strong>ras (Voz). M/6<br />
MMMNN<br />
<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 5: 5ª 2ª<br />
3ª 4ª 14h50, 17h, 19h10, 21h10 (V.Port.) 6ª 14h50,<br />
17h, 19h10, 21h10, 23h40 (V.Port.) Sábado 12h40,<br />
14h50, 17h, 19h10, 21h10, 23h40 (V.Port.) Domingo<br />
12h40, 14h50, 17h, 19h10, 21h10 (V.Port.); Castello<br />
Lopes - Londres: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />
16h30, 19h, 21h30 (V.Port./3D) 6ª Sábado 14h, 16h30,<br />
19h, 21h30, 24h (V.Port./3D); Castello Lopes - Loures<br />
Shopping: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
13h, 15h, 17h, 19h, 21h, 23h30 (V.Port.); Castello Lopes<br />
- Loures Shopping: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 13h15, 15h20, 17h25, 19h30, 21h35, 24h (V.<br />
Port./3D); CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 3: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h45 (V.<br />
Port./3D); CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 4: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 21h30,<br />
23h40; CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 2: 5ª 6ª<br />
2ª 3ª 4ª 13h35, 15h30, 17h30, 19h30, 21h55, 24h (V.<br />
Port./3D) Sábado Domingo 11h40, 13h35, 15h30,<br />
17h30, 19h30, 21h55, 24h (V.Port./3D); CinemaCity<br />
Beloura Shopping: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h40,<br />
15h35, 17h30, 19h30, 21h50, 23h55 (V.Port./3D)<br />
Domingo 11h30, 13h40, 15h35, 17h30, 19h30, 21h50,<br />
23h55 (V.Port./3D); CinemaCity Campo Pequeno<br />
Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 6: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />
3ª 4ª 16h (V.Port./3D); CinemaCity Campo Pequeno<br />
Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h45,<br />
15h45, 17h40, 19h35, 21h35, 24h (V.Port.) Sábado<br />
Domingo 11h35, 13h45, 15h45, 17h40, 19h35, 21h35,<br />
24h (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Fonte Nova: Sala 1: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h15, 18h10,<br />
20h05, 22h (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 4 -<br />
Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />
16h, 18h, 20h, 22h, 00h30 (3D); UCI Cinemas - El<br />
Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h05,<br />
16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />
11h30, 14h05, 16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.<br />
Port./3D); UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 9: 5ª<br />
6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 18h55,<br />
21h45, 00h10 (3D) Domingo 11h30, 14h10,<br />
16h30, 18h55, 21h45, 00h10 (3D); UCI<br />
Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
13h45, 16h, 18h15, 21h15 (V.Port./3D)<br />
6ª Sábado 13h45, 16h, 18h15,<br />
21h15, 23h30<br />
(V.Port./3D)<br />
Domingo<br />
11h30, 13h45,<br />
16h, 18h15,<br />
21h15<br />
(V.Port./3D); UCI<br />
Dolce Vita Tejo: Sala 3: 5ª<br />
2ª 3ª 4ª 14h, 16h15,<br />
18h45, 21h50 (3D) 6ª<br />
Sábado 14h, 16h15, 18h45,<br />
21h50, 00h10 (3D)<br />
Domingo 11h30, 14h,<br />
16h15, 18h45, 21h50<br />
(3D); ZON Lusomundo<br />
Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado 2ª<br />
3ª 4ª 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />
23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />
11h15, 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />
23h50 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Alvaláxia: 5ª<br />
6ª 2ª 4ª 13h20, 14h10,<br />
15h30, 16h30, 17h40,<br />
18h40, 19h50, 21h20,<br />
22h, 23h30, 00h10<br />
(V.Port./3D)<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
15h05, 17h15, 19h20, 21h50, 00h15 (3D); ZON<br />
Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />
4ª 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40, 23h55 (V.Port.)<br />
Domingo 11h, 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40,<br />
23h55 (V.Port.); ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª<br />
6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h25, 15h40, 18h15, 21h, 23h25<br />
(V.Port./3D) Domingo 11h, 13h25,<br />
15h40, 18h15, 21h,<br />
23h25<br />
(V.Port./3D); Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 1: 5ª<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª<br />
12h45, 15h,<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h<br />
7h<br />
7h<br />
7h<br />
17h1<br />
17h<br />
7h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h<br />
7h<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
7<br />
17h1<br />
17<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h<br />
17h1<br />
17h<br />
17h<br />
17h1<br />
h1<br />
17h1<br />
17h<br />
17h<br />
7h1<br />
7<br />
17h1<br />
7h<br />
7h1<br />
7h1<br />
17h<br />
17h<br />
7<br />
17h1<br />
7h1<br />
7h1<br />
17h<br />
17h1<br />
7h1<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
7h1<br />
7h1<br />
h1<br />
17h1<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
7<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h1<br />
17h<br />
17h1<br />
1 h 0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h<br />
19h2<br />
9<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
h<br />
19h2<br />
h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9<br />
19h<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
h2<br />
19h2<br />
h2<br />
h2<br />
h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
19<br />
19h<br />
9h<br />
9h<br />
9h2<br />
9h2<br />
h2<br />
9h2<br />
9 2<br />
h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9 2<br />
9h2<br />
9h<br />
9h2<br />
9h2<br />
9 2<br />
9 20, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
,2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 21h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h2<br />
h20<br />
h20<br />
h20<br />
20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h2<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
h20<br />
2<br />
h20<br />
20<br />
1h2<br />
1h2<br />
1h2<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
20<br />
1h20<br />
20<br />
20<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
2<br />
h20<br />
h20<br />
20<br />
1h20<br />
1h20<br />
2<br />
1h2<br />
1h2<br />
h20<br />
20<br />
20<br />
20<br />
20<br />
1h20<br />
20<br />
20<br />
1h2<br />
1h2<br />
1h20<br />
20<br />
h20<br />
1h20<br />
h20<br />
h2<br />
1h2<br />
1h20<br />
20<br />
1h20<br />
h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
20<br />
h20<br />
20<br />
1 2<br />
h20<br />
20<br />
h20<br />
20<br />
1h20<br />
20<br />
h20<br />
2<br />
1h20<br />
1h20<br />
h20<br />
20<br />
h20<br />
h20<br />
20<br />
1h2<br />
h20<br />
1 20<br />
h20 (V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V<br />
(V.<br />
V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
V.<br />
(V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
V.<br />
V<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V.<br />
V<br />
(V.<br />
(V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V.<br />
(V<br />
(V<br />
(V<br />
(<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Por<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Po<br />
Port<br />
Po<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Por<br />
Por<br />
Port<br />
Port<br />
r<br />
Por<br />
Por<br />
Po<br />
Port<br />
Por<br />
Port<br />
Po<br />
Po<br />
Por<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
or<br />
Por<br />
Port<br />
Po<br />
Por<br />
ort<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
ort<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
Port<br />
o<br />
Port<br />
or<br />
ort<br />
o<br />
Por<br />
o<br />
Por<br />
Port<br />
rt<br />
Port<br />
Port<br />
or<br />
or<br />
ort<br />
Port<br />
ort<br />
r /3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
3D<br />
/3D<br />
3D<br />
./3D<br />
3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
/3<br />
/3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
3<br />
/3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
/3<br />
./3<br />
./3D<br />
3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
/<br />
./3D<br />
/3<br />
/3<br />
/3D<br />
./3D<br />
./3<br />
/3<br />
/3D<br />
/3D<br />
/<br />
./3<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
3D<br />
/3D<br />
3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
/3<br />
/3<br />
./3D<br />
/3D<br />
/3<br />
/3D<br />
3<br />
/3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
3D<br />
3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3<br />
/3<br />
./3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
/3D<br />
3D<br />
/3D<br />
./3D<br />
./3D<br />
3<br />
./3D<br />
/3D<br />
. 3D<br />
/3D<br />
/ D<br />
/3<br />
/3D<br />
/ ) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
6<br />
)6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
) 6<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
6<br />
) 6<br />
)6<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
) 6<br />
)6ª<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
)6<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
)6ª<br />
)6<br />
) 6ª<br />
)6<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
)6ª<br />
)6ª<br />
) 6ª<br />
)6<br />
)6ª<br />
) 6<br />
) 6ª<br />
)6<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
)6<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
)6ª<br />
6<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
) 6<br />
) 6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
6ª<br />
) 6ª<br />
) 6<br />
) 6<br />
)6<br />
) 6<br />
)6<br />
) 6<br />
) 6<br />
) 6<br />
) Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sá<br />
Sába<br />
ba<br />
bad<br />
bad<br />
bad<br />
b d<br />
bado<br />
b d<br />
bado<br />
d<br />
bad<br />
a<br />
bad<br />
bad<br />
ado<br />
ado<br />
ad<br />
bad<br />
b d<br />
bado<br />
bado<br />
d<br />
bado<br />
bado<br />
ba<br />
bad<br />
bado<br />
bad<br />
bado<br />
bad<br />
ado<br />
bad<br />
bado<br />
d<br />
ad<br />
bado<br />
do<br />
bado<br />
d<br />
bado<br />
bado<br />
ado<br />
ba<br />
bad<br />
bado<br />
bad<br />
ba<br />
bad<br />
bad<br />
bad<br />
bado<br />
bado<br />
ado<br />
bad<br />
ado<br />
ado<br />
ad<br />
ado<br />
do<br />
do<br />
bado<br />
bado<br />
bad<br />
bado<br />
d<br />
bad<br />
bado<br />
d<br />
bado<br />
d<br />
bado<br />
bado<br />
ba<br />
ba<br />
bado<br />
bad<br />
ba<br />
bad<br />
bad<br />
bad<br />
ad<br />
ad<br />
bado<br />
do<br />
ado<br />
bad<br />
bado<br />
bado<br />
bado<br />
bado<br />
bad<br />
bado<br />
bado<br />
do<br />
bad<br />
bad<br />
ba<br />
bado<br />
do<br />
bado<br />
do<br />
do<br />
bado<br />
ado<br />
d<br />
ad<br />
bado<br />
bado<br />
ado<br />
bado<br />
ba<br />
bad<br />
ba<br />
bado<br />
bado<br />
a<br />
bad<br />
bad<br />
bad<br />
bad<br />
bado<br />
do<br />
do<br />
do<br />
bad<br />
ba<br />
ba<br />
bado<br />
do<br />
d<br />
bado<br />
ado<br />
ado<br />
bado<br />
bado<br />
bad<br />
ba<br />
bado<br />
do<br />
bad<br />
bad<br />
bado<br />
do<br />
bad<br />
ado<br />
bado<br />
bado<br />
do<br />
do<br />
bad<br />
ado<br />
bado<br />
ado<br />
bad<br />
ado<br />
ba<br />
bado<br />
ado<br />
bado<br />
bad<br />
bado<br />
bado 12h<br />
2h<br />
2h<br />
2h<br />
2h<br />
2h<br />
12h<br />
2h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
2h<br />
2h<br />
12<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
12h<br />
2h<br />
2h<br />
2h<br />
12h<br />
12h<br />
2h<br />
2h<br />
2h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
12<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
2h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
2h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
2h<br />
2h<br />
2<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
2h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
2h<br />
12h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
2<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
2h<br />
2h<br />
12h<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12<br />
12h<br />
12h<br />
12<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12h<br />
12<br />
12h<br />
2h<br />
12h<br />
12h<br />
2h<br />
12h<br />
12h<br />
2h<br />
12h<br />
12h<br />
12h45<br />
45,<br />
5<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
45,<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
45<br />
45,<br />
5<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
5,<br />
5,<br />
5,<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
45,<br />
45<br />
45,<br />
45<br />
45,<br />
45,<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
45,<br />
5,<br />
5<br />
45<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
5,<br />
5<br />
45<br />
45<br />
45,<br />
45,<br />
45,<br />
5,<br />
45,<br />
45<br />
45,<br />
5,<br />
45,<br />
45,<br />
5,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
h,<br />
15h<br />
5h<br />
15<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h<br />
15h,<br />
15h<br />
15h,<br />
15h<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h<br />
15h<br />
15h<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
5<br />
15h,<br />
15h<br />
15h<br />
15h,<br />
15h<br />
15h,<br />
5<br />
15h,<br />
15h<br />
15h<br />
5h<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h<br />
15<br />
15h,<br />
15h,<br />
h<br />
15h,<br />
h<br />
15h,<br />
h,<br />
15h,<br />
15h,<br />
15h<br />
5h,<br />
15h<br />
15h,<br />
15h<br />
15h<br />
15h,<br />
h<br />
15h,<br />
15h,<br />
5h<br />
1 h<br />
15h,<br />
h<br />
1 h<br />
15h<br />
1 h<br />
15h<br />
5h<br />
5h<br />
15h<br />
15h<br />
5h<br />
15h<br />
5h,<br />
15h<br />
15h,<br />
h,<br />
1 h,<br />
h,<br />
15h,<br />
15h<br />
5 , 17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
7<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
7h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
7h<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
7h<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
7h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
7h<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
7<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
7<br />
17h<br />
17h<br />
7<br />
17h<br />
17<br />
1 h<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17h<br />
17<br />
17<br />
17h<br />
17h<br />
7<br />
17h<br />
17<br />
17 10<br />
10,<br />
10<br />
10,<br />
10<br />
10,<br />
10<br />
10<br />
10<br />
10,<br />
0<br />
10,<br />
10<br />
10,<br />
10,<br />
10<br />
10<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10<br />
10<br />
10,<br />
10,<br />
0,<br />
0,<br />
10,<br />
0,<br />
0,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
0<br />
10,<br />
10,<br />
0,<br />
10,<br />
10<br />
10,<br />
0,<br />
10,<br />
10,<br />
10<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
0<br />
10<br />
10,<br />
10,<br />
0<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
0,<br />
10,<br />
0,<br />
10,<br />
10,<br />
0<br />
10,<br />
0,<br />
0<br />
10,<br />
10,<br />
0,<br />
0,<br />
10,<br />
10<br />
10,<br />
0<br />
10,<br />
10,<br />
10,<br />
0,<br />
10<br />
10,<br />
10<br />
10,<br />
10,<br />
0,<br />
10<br />
10,<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0, 9<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h<br />
19h2<br />
19h2<br />
9<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h<br />
19h2<br />
9h2<br />
9<br />
19<br />
19h<br />
19<br />
19h<br />
19h2<br />
19h2<br />
9<br />
19<br />
19h2<br />
19<br />
19<br />
19h2<br />
19h2<br />
h<br />
9h<br />
19h2<br />
h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
19h<br />
19<br />
19<br />
19h2<br />
19h2<br />
9<br />
19<br />
19h<br />
9<br />
19h<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h<br />
19h<br />
9<br />
19h<br />
19h<br />
9h2<br />
9<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h<br />
19h<br />
19h<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h<br />
19h2<br />
h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19<br />
19h<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h<br />
9h2<br />
9<br />
19h2<br />
9h2<br />
h2<br />
h2<br />
19h2<br />
19h<br />
19h2<br />
19<br />
19h<br />
19h2<br />
19<br />
19<br />
19h<br />
19h<br />
9h<br />
19h2<br />
h2<br />
h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19<br />
19h<br />
9h2<br />
h2<br />
19h2<br />
19<br />
19h<br />
19<br />
19h<br />
9h2<br />
19h2<br />
h2<br />
h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h<br />
19h2<br />
9h<br />
9h<br />
19h<br />
19h<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h<br />
9h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
19h<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
19<br />
19h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h2<br />
19h<br />
9h2<br />
h2<br />
19h2<br />
19<br />
19h2<br />
9h2<br />
9h<br />
9h2<br />
h2<br />
19h2<br />
9h2<br />
9 0,<br />
0,<br />
0,<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
, 2<br />
0 2<br />
0,<br />
0 2<br />
0,<br />
0,<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0,<br />
0, 2<br />
0,<br />
0 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0,<br />
0,<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0 2<br />
0,<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
,2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0,<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
, 2<br />
0,<br />
0,<br />
0, 2<br />
0,<br />
0, 2<br />
0, 2<br />
0,<br />
0,<br />
0, 2<br />
, h2<br />
h20<br />
20<br />
1h20<br />
h2<br />
1h2<br />
1h20<br />
1h20<br />
1h20<br />
h2<br />
h<br />
1h20<br />
20<br />
20<br />
h20<br />
20<br />
20<br />
1h2<br />
1h20<br />
1h<br />
1h2<br />
h2<br />
h20<br />
1h2<br />
1h20<br />
1h<br />
1h2<br />
1h20<br />
h20<br />
h20<br />
h2<br />
h2<br />
h20<br />
1h2<br />
1h20<br />
1h2<br />
1h20<br />
h20<br />
h<br />
1h2<br />
h20<br />
h2<br />
h20<br />
20<br />
20<br />
2<br />
h2<br />
h20<br />
1h2<br />
1h2<br />
1h20<br />
h2<br />
1h2<br />
h20<br />
h<br />
1h2<br />
h20<br />
20<br />
2<br />
1h20<br />
h2<br />
h20<br />
20<br />
h20<br />
h20<br />
1h20<br />
1h<br />
1h2<br />
h20<br />
h2<br />
h2<br />
h20<br />
20<br />
20<br />
20<br />
20<br />
20<br />
1h20<br />
h20<br />
h20<br />
h2<br />
h20<br />
h20<br />
20<br />
1h20<br />
h20<br />
1h20<br />
1h2<br />
h2<br />
h2<br />
h<br />
1h2<br />
1h2<br />
1h20<br />
20<br />
1h20<br />
1h<br />
1h<br />
1h20<br />
h2<br />
h20<br />
2<br />
1h20<br />
h20<br />
1h20<br />
1h<br />
1h20<br />
1h2<br />
h20<br />
1h20<br />
1h<br />
1h<br />
1h20<br />
h20<br />
2<br />
h20<br />
20<br />
20<br />
1h20<br />
20<br />
1h20<br />
1h2<br />
h20<br />
h2<br />
1h2<br />
h20<br />
1h20<br />
20<br />
1h2<br />
h20<br />
1h20<br />
2<br />
h20<br />
20<br />
20<br />
1h20<br />
1h2<br />
h20<br />
1h20<br />
20<br />
h20<br />
1h20<br />
h2<br />
h20<br />
h20<br />
h20<br />
1h2<br />
1h2<br />
h20<br />
1h2<br />
h20 23<br />
2<br />
,23<br />
, 23<br />
2<br />
, 2<br />
, 23<br />
, 23<br />
23<br />
2<br />
,23<br />
,23<br />
23<br />
23<br />
23<br />
2<br />
, 23<br />
2<br />
, 23<br />
, 23<br />
, 2<br />
,23<br />
, 23<br />
, 23<br />
, 23<br />
23<br />
,2<br />
, 2<br />
, 23<br />
2<br />
, 23<br />
23<br />
2<br />
, 23<br />
, 23<br />
, 23<br />
, 23<br />
23<br />
,23<br />
23<br />
, 2<br />
, 2<br />
,23<br />
, 2<br />
, 2<br />
, 2<br />
, 23<br />
23<br />
2<br />
, 2<br />
, 23<br />
2<br />
, 23<br />
23<br />
, 23<br />
23<br />
23<br />
23<br />
, 2<br />
, 23<br />
23<br />
23<br />
, 23<br />
23<br />
, 2<br />
, 23<br />
, 23<br />
23<br />
, 23<br />
23<br />
, 2<br />
, 2<br />
, 23<br />
, 23<br />
, 2<br />
, 23<br />
, 23<br />
, h40<br />
40<br />
h40<br />
40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
4<br />
h40<br />
40<br />
40<br />
h4<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h4<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
40<br />
40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
40<br />
h40<br />
h40<br />
40<br />
h 0<br />
h40<br />
40<br />
h40<br />
h 0<br />
h40<br />
h40<br />
h40<br />
40<br />
h40<br />
h40<br />
h4<br />
h40<br />
h 0<br />
h4<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V<br />
(V.P<br />
V.P<br />
(V.P<br />
(V P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
V.P<br />
V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
V.P<br />
(V<br />
(V.P<br />
(V P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
VP<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
VP<br />
V.P<br />
V<br />
(V P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V P<br />
VP<br />
VP<br />
V.P<br />
(V P<br />
(V P<br />
V.P<br />
(V<br />
(V.P<br />
V P<br />
VP<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
(V P<br />
(VP<br />
V.P<br />
(V.P<br />
(V.P<br />
VP<br />
VP<br />
V.P<br />
(V.<br />
V P<br />
VP<br />
(V.P<br />
(V P<br />
V.P<br />
V.P<br />
V<br />
(V.P<br />
(V P<br />
V.P<br />
(V<br />
(V.P<br />
V.P<br />
(V.P<br />
(V P<br />
V.P<br />
(V P<br />
(V.P<br />
V.P<br />
V.P<br />
V<br />
ort<br />
or<br />
or<br />
ort<br />
ort<br />
or<br />
ort.<br />
ort.<br />
ort.<br />
or<br />
ort.<br />
ort<br />
ort.<br />
rt<br />
ort<br />
ort.<br />
ort.<br />
ort.<br />
ort<br />
rt.<br />
ort<br />
ort<br />
ort.<br />
or<br />
ort<br />
ort<br />
ort<br />
ort.<br />
ort<br />
ort.<br />
rt.<br />
t<br />
ort<br />
ort.<br />
ort<br />
r<br />
ort<br />
or<br />
or<br />
ort<br />
ort<br />
ort<br />
rt<br />
ort.<br />
t.<br />
ort<br />
ort<br />
or<br />
ort<br />
rt<br />
ort<br />
ort<br />
ort<br />
or<br />
ort<br />
rt<br />
ort.<br />
rt<br />
rt<br />
or<br />
ort<br />
rt<br />
ort<br />
ort<br />
ort<br />
rt<br />
ort<br />
rt<br />
ort<br />
ort.<br />
ort.<br />
ort.<br />
ort.<br />
o t./3D<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
D)<br />
3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
3D<br />
3D)<br />
/3<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
3D<br />
/3D<br />
3D<br />
/3D)<br />
D)<br />
/3D)<br />
/3<br />
/3<br />
/3D<br />
3<br />
/3D<br />
3D)<br />
3D<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D<br />
/3<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D<br />
3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
D<br />
/3D)<br />
D<br />
/3D)<br />
3D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
3D)<br />
/3D)<br />
3D)<br />
/3D<br />
3D)<br />
D)<br />
D)<br />
D)<br />
D)<br />
D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
3D<br />
3D<br />
3D)<br />
/3<br />
/3D)<br />
/3D<br />
3D<br />
/3D)<br />
3D<br />
3D<br />
3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
D)<br />
/3D)<br />
/3D<br />
3D<br />
3<br />
/3D)<br />
D)<br />
D)<br />
D)<br />
D)<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3<br />
/3D<br />
/3D)<br />
3<br />
/3<br />
/3D)<br />
D)<br />
3D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
3D)<br />
D)<br />
D)<br />
D<br />
3D)<br />
/3D<br />
/3<br />
/3<br />
/3D)<br />
D<br />
3D<br />
/3D)<br />
D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
3D)<br />
D<br />
3D)<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
3D)<br />
/ D)<br />
D<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
3D)<br />
3D)<br />
/3D)<br />
D)<br />
3D)<br />
/3D<br />
3D)<br />
3D)<br />
D<br />
/3D)<br />
/3D)<br />
/3D<br />
/ )<br />
/ ); ZO<br />
;ZO<br />
; Z<br />
;Z<br />
;Z<br />
; Z<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
Z<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
;ZO<br />
;ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
Z<br />
;ZO<br />
Z<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
;ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
Z<br />
; ZO<br />
; Z<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
;ZO<br />
Z<br />
; ZO<br />
Z<br />
; Z<br />
;Z<br />
; ZO<br />
Z<br />
;Z<br />
; Z<br />
; ZO<br />
;ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
;Z<br />
;Z<br />
;ZO<br />
; ZO<br />
Z<br />
; Z<br />
;ZO<br />
Z<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
;ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; Z<br />
; ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
Z<br />
; Z<br />
;ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
;Z<br />
; ZO<br />
;ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
Z<br />
; ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
;ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
;Z<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
;ZO<br />
;ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
Z<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
;ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; Z<br />
; ZO<br />
Z<br />
;ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
Z<br />
; Z<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
;ZO<br />
; Z<br />
; ZO<br />
;ZO<br />
;ZO<br />
;ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
ZO<br />
ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; ZO<br />
; NLu<br />
NL<br />
NLu<br />
NL<br />
NLu<br />
Lu<br />
Lu<br />
NLu<br />
NLu<br />
NL<br />
NL<br />
NL<br />
N L<br />
N Lu<br />
Lu<br />
NL<br />
NLu<br />
NLu<br />
Lu<br />
NL<br />
NLu<br />
NLu<br />
NL<br />
N Lu<br />
Lu<br />
L<br />
NL<br />
NL<br />
NL<br />
NL<br />
NLu<br />
N Lu<br />
NLu<br />
NL<br />
NLu<br />
NLu<br />
NLu<br />
Lu<br />
L<br />
NLu<br />
Lu<br />
N Lu<br />
NLu<br />
NLu<br />
NL<br />
NLu<br />
Lu<br />
L<br />
NL<br />
NL<br />
NLu<br />
Lu<br />
NLu<br />
N L<br />
N Lu<br />
NL<br />
NLu<br />
N L<br />
NLu<br />
NL<br />
NLu<br />
NLu<br />
N Lu<br />
L<br />
N Lu<br />
Lu<br />
Lu<br />
N Lu<br />
NL<br />
NL<br />
NLu<br />
N L<br />
NLu<br />
Lu<br />
L<br />
NLu<br />
Lu<br />
NLu<br />
Lu<br />
NLu<br />
NLu<br />
NL<br />
NL<br />
NLu<br />
L<br />
N Lu<br />
Lu<br />
NL<br />
N Lu<br />
NLu<br />
N Lu<br />
NLu<br />
NLu<br />
NL<br />
N Lu<br />
N Lu<br />
Lu<br />
NL<br />
NLu<br />
NL<br />
N L<br />
N L<br />
NLu<br />
Lu<br />
Lu<br />
NLu<br />
Lu<br />
Lu<br />
NLu<br />
NLu<br />
NL<br />
NLu<br />
NL<br />
N Lu<br />
L<br />
NLu<br />
Lu<br />
NLu<br />
Lu<br />
N Lu<br />
NL<br />
N Lu<br />
NLu<br />
Lu<br />
N Lu<br />
Lu<br />
Lu<br />
NL<br />
N Lu<br />
Lu<br />
N Lu<br />
N Luso<br />
som<br />
so<br />
somu<br />
somu<br />
om<br />
som<br />
om<br />
omu<br />
omu<br />
mu<br />
mu<br />
omu<br />
som<br />
so<br />
so<br />
so<br />
so<br />
somu<br />
somu<br />
omu<br />
som<br />
som<br />
som<br />
som<br />
som<br />
somu<br />
somu<br />
omu<br />
mu<br />
somu<br />
somu<br />
somu<br />
mu<br />
som<br />
som<br />
somu<br />
som<br />
omu<br />
om<br />
som<br />
somu<br />
omu<br />
somu<br />
somu<br />
mu<br />
omu<br />
mu<br />
somu<br />
somu<br />
so<br />
som<br />
omu<br />
somu<br />
mu<br />
mu<br />
m<br />
som<br />
omu<br />
mu<br />
omu<br />
mu<br />
somu<br />
som<br />
som<br />
somu<br />
so<br />
somu<br />
omu<br />
om<br />
somu<br />
mu<br />
mu<br />
somu<br />
so<br />
som<br />
somu<br />
m<br />
omu<br />
omu<br />
omu<br />
so<br />
som<br />
omu<br />
omu<br />
m<br />
om<br />
om<br />
om<br />
omu<br />
somu<br />
som<br />
so<br />
somu<br />
som<br />
om<br />
omu<br />
mu<br />
mu<br />
mu<br />
mu<br />
mu<br />
omu<br />
som<br />
som<br />
som<br />
om<br />
som<br />
om<br />
somu<br />
omu<br />
somu<br />
somu<br />
so<br />
som<br />
somu<br />
mu<br />
somu<br />
somu<br />
som<br />
om<br />
om<br />
omu<br />
somu<br />
mu<br />
som<br />
omu<br />
omu<br />
mu<br />
omu<br />
somu<br />
somu<br />
somu<br />
somu do<br />
do<br />
ndo<br />
do<br />
ndo<br />
ndo<br />
do<br />
d<br />
nd<br />
ndo<br />
do<br />
do<br />
ndo<br />
do<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
do<br />
ndo<br />
ndo<br />
do<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo<br />
ndo Fóru<br />
Fór<br />
Fór<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
óru<br />
ór<br />
ór<br />
ó<br />
Fór<br />
Fóru<br />
óru<br />
óru<br />
Fóru<br />
Fór<br />
óru<br />
Fór<br />
ór<br />
Fóru<br />
Fór<br />
Fóru<br />
Fór<br />
ór<br />
Fóru<br />
Fó<br />
Fór<br />
óru<br />
Fóru<br />
r<br />
óru<br />
Fór<br />
Fór<br />
Fór<br />
Fór<br />
Fóru<br />
ru<br />
ru<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
Fór<br />
F ru<br />
Fór<br />
Fóru<br />
Fór<br />
ór<br />
ór<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
Fór<br />
óru<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
Fór<br />
Fór<br />
óru<br />
Fór<br />
Fó<br />
Fór<br />
Fór<br />
ó<br />
Fó<br />
Fór<br />
óru<br />
Fó<br />
Fó<br />
Fó<br />
Fó<br />
Fó<br />
Fóru<br />
Fóru<br />
Fó<br />
Fór<br />
óru<br />
Fó<br />
Fór<br />
óru<br />
Fóru<br />
F<br />
u<br />
Fórum<br />
dos contos <strong>de</strong> fadas acomodoupróprios<br />
lugares-comuns <strong>de</strong> qu<br />
troça — mas pel<br />
menos tem<br />
consciência<br />
ao usá-lo co<br />
ponto <strong>de</strong> par<br />
para uma últim<br />
aventura que for<br />
um final digno p<br />
série.<br />
Continuam<br />
A Teta Assustada<br />
La Teta Asustada<br />
De Claudia Llosa<br />
com Magaly Solier, Su<br />
Sánchez, Efraín Solís<br />
MMNNN<br />
<strong>Lisboa</strong>: UCI Cinemas - El Corte<br />
Inglés: Sala 8: 5ª 6ª Sábado 2<br />
14h15, 16h30, 19h, 21h35, 24h D<br />
11h30, 14h15, 16h30, 19h, 21h35<br />
Goste-se mais ou men<br />
resultado final, não p<br />
Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />
16h, 18h, 20h, 22h, 00h30 (3D); UCI Cinemas - El<br />
Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h05,<br />
16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />
11h30, 14h05, 16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.<br />
Port./3D); UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 9: 5ª<br />
6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 18h55,<br />
21h45, 00h10 (3D) Domingo 11h30, 14h10,<br />
16h30, 18h55, 21h45, 00h10 (3D); UCI<br />
Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />
13h45, 16h, 18h15, 21h15 (V.Port./3D)<br />
6ª Sábado 13h45, 16h, 18h15,<br />
21h15, 23h30<br />
(V.Port./3D)<br />
Domingo<br />
11h30, 13h45,<br />
16h, 18h15,<br />
21h15<br />
(V.Port./3D); UCI<br />
Dolce Vita Tejo: Sala 3: 5ª<br />
2ª 3ª 4ª 14h, 16h15,<br />
18h45, 21h50 (3D) 6ª<br />
Sábado 14h, 16h15, 18h45,<br />
21h50, 00h10 (3D)<br />
Domingo 11h30, 14h,<br />
16h15, 18h45, 21h50<br />
(3D); ZON Lusomundo<br />
Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado 2ª<br />
3ª 4ª 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />
23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />
11h15, 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />
23h50 (V.Port./3D); ZON<br />
Lusomundo Alvaláxia: 5ª<br />
6ª 2ª 4ª 13h20, 14h10,<br />
15h30, 16h30, 17h40,<br />
18h40, 19h50, 21h20,<br />
22h, 23h30, 00h10<br />
(V.Port./3D)<br />
“Shrek Para Sempre”: não estando ao nível do filme original,<br />
também não resume tudo a gagues <strong>de</strong> “sitcom”<br />
série ípsilon II<br />
Todas as sextas,<br />
por €1,95. 20<br />
anos<br />
+8 DVD<br />
Sexta-feira,<br />
dia 16 <strong>de</strong> Julho,<br />
o DVD “Shattered<br />
Glass”, <strong>de</strong> Billy Ray
As estrelas do público<br />
Jorge<br />
Mourinha<br />
Luís M.<br />
Oliveira<br />
Mário<br />
J. Torres<br />
Vasco<br />
Câmara<br />
Atraídos pelo Crime mnnnn nnnnn mmnnn nnnnn<br />
Duas Mulheres mmnnn nnnnn mmmnn nnnnn<br />
Eu Sou o Amor mmmmm mnnnn mmmmn mnnnn<br />
Louise-Michel mmmnn nnnnn mmnnn nnnnn<br />
Partir mmnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />
Shirin mmmmn mmmmn mmmmn mmmmm<br />
Shrek Para Sempre! mmmnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />
A Teta Assustada mmmmn mmnnn mmnnn nnnnn<br />
Whisky mmmnn nnnnn mmmnn nnnnn<br />
Cinemateca Portuguesa R. Barata Salgueiro, 39 <strong>Lisboa</strong>. Tel. 213596200<br />
E.T.<br />
Sexta, 09<br />
Difamação<br />
Notorious<br />
De Alfred Hitchcock<br />
15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
Os Dias da Rádio<br />
Radio Days<br />
De Woody Allen<br />
19h - Sala Félix Ribeiro<br />
The Doctor’’s Dream + Perfect<br />
Film + Urban Peasants + Looting<br />
For Rodney<br />
De Ken Jacobs<br />
19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Homecoming<br />
De Jon Jost<br />
22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Desesperadamente Procurando<br />
Susana<br />
Desperately Seeking Susan<br />
De Susan Sei<strong>de</strong>lman<br />
22h30 - Esplanada<br />
Sábado, 10<br />
Uma Noite na Ópera<br />
A Night at the Opera<br />
De Sam Wood<br />
15h - Salão Foz<br />
Um Criminoso à Solta<br />
The Killer Is Loose<br />
De Budd Boetticher<br />
15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
Pessoal<br />
Personel<br />
De Krzysztof Kieslowski<br />
19h - Sala Félix Ribeiro<br />
Luís II, Rei da Baviera<br />
Ludwig <strong>de</strong>r Zweite, König in<br />
Bayern<br />
De Wilhelm Dieterle<br />
19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Acto da Primavera<br />
De Manoel <strong>de</strong> Oliveira<br />
21h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Selvagem e Perigosa<br />
Something Wild<br />
De Jonathan Demme<br />
22h30 - Esplanada<br />
Segunda, 12<br />
Sublime Abnegação<br />
Sister Kenny<br />
De Dudley Nichols<br />
15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
A Escada <strong>de</strong> Caracol<br />
The Spiral Staircase<br />
De Robert Siodmak<br />
19h - Sala Félix Ribeiro<br />
7 curtas <strong>de</strong> Ken Jacobs<br />
De Ken Jacobs<br />
19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Mulleres da Raia<br />
De Diana Gonçalves<br />
21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
Numéro Deux<br />
De Jean-Luc Godard<br />
22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Terça, 13<br />
Entre Nuvens<br />
Ceiling Zero<br />
De Howard Hawks<br />
15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
Há Lodo no Cais<br />
On the Waterfront<br />
De Elia Kazan<br />
19h - Sala Félix Ribeiro<br />
Coitado do Jorge<br />
De Jorge Silva Melo<br />
19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
O Acontecimento<br />
The Happening<br />
De M. Night Shyamalan<br />
21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
A Cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cassiano + O<br />
Trabalho Liberta? + Cine-Diários<br />
De Edgar Pêra<br />
22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Quarta, 14<br />
Um Certo Rapaz<br />
A Guy Named Joe<br />
De Victor Fleming<br />
15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
Volta Jimmy Dean, Volta Para<br />
Nós<br />
Come Back to the Five and Dime,<br />
Jimmy Dean, Jimmy Dean<br />
De Robert Altman<br />
19h - Sala Félix Ribeiro<br />
Star Spangled to Death<br />
De Ken Jacobs<br />
19h30 (parte 1 e 2) - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
Million Dollar Baby - Sonhos<br />
Vencidos<br />
Million Dollar Baby<br />
De Clint Eastwood<br />
21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
Quinta, 15<br />
O Mundo é Um Manicómio<br />
Arsenic and Old Lace<br />
De Frank Capra<br />
15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />
O Lutador da Rua<br />
Hard Times<br />
De Walter Hill<br />
19h - Sala Félix Ribeiro<br />
Star Spangled to Death<br />
De Ken Jacobs<br />
19h30 (parte 3 e 4) - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />
E.T. O Extraterrestre<br />
E.T. the Extra-Terrestrial<br />
De Steven Spielberg<br />
22h30 - Esplanada<br />
<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> se respeitar a coerência<br />
formal e o bom gosto representativo<br />
<strong>de</strong> “A Teta Assustada”, fábula<br />
complexa <strong>de</strong> uma jovem peruana<br />
que lida com a morte, com as suas<br />
próprias raízes e com as implicações<br />
políticas da existência, num mundo<br />
em que a diferença constitui<br />
estigma. O problema maior (nosso,<br />
com certeza) passa pela fórmula<br />
adoptada <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />
“realismo mágico”, praga literária<br />
que se esten<strong>de</strong> não poucas vezes ao<br />
cinema, <strong>de</strong>terminando uma visão<br />
algo folclórica do real, com uma<br />
ritualização que se esgota nas suas<br />
componentes. Dito isto há<br />
momentos inesquecíveis, como a<br />
função da língua quechua na lógica<br />
poética das canções do filme ou os<br />
planos orgiásticos <strong>de</strong> casamentos ou<br />
ainda actos quotidianos mínimos,<br />
Co-produção<br />
Estrutura financiada por<br />
Patrocinadores<br />
O problema maior do peruano<br />
“A Teta Assustada” passa pela<br />
adopção <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />
“realismo mágico”<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> as <strong>de</strong>ambulações da<br />
protagonista pela casa quase<br />
assombrada até à subida das<br />
intermináveis escadas para o bairro,<br />
a lembrar imaginários templos. Só<br />
que é tudo <strong>de</strong>masiado artificioso<br />
para servir a magia <strong>de</strong> um programa<br />
(apetecia dizer cartilha) préexistente.<br />
M.J.T.<br />
Whisky<br />
De Juan Pablo Rebella, Pablo Stoll<br />
com Andrés Pazos, Mirella Pascual,<br />
Jorge Bolani. M/12<br />
MMMNN<br />
<strong>Lisboa</strong>: Me<strong>de</strong>ia King: Sala 2: 5ª Domingo 3ª 4ª<br />
13h45, 15h45, 17h45, 19h45, 21h45 6ª Sábado 2ª<br />
13h45, 15h45, 17h45, 19h45, 21h45, 00h15<br />
“Whisky” aposta numa secura quase<br />
geométrica, num humor negro que<br />
TEXTOS E MÚSICA DOS SÉCULOS XV E XVI<br />
Dramaturgia e direcção: Ana Zamora; Arranjos e direcção musical: Alicia<br />
Lázaro; Figurinos: Deborah Macías; Cenário: David Faraco e Almu<strong>de</strong>na<br />
Bautista; Desenho <strong>de</strong> luz: Miguel Ángel Camacho e Pedro Yagüe; Coreografia:<br />
Javier García Ávila; Assessor <strong>de</strong> Verso: Vicente Fuentes<br />
Interpretação: Luis Miguel Cintra, Sofia Marques e Elena Rayos<br />
Interpretação musical: Eva Jornet, Juan Ramón Lara e Isabel Zamora<br />
De 6 a 13 <strong>de</strong> JULHO TEATRO DO BAIRRO ALTO De 2ª a Sábado às 21.30h. Domingo às 17.00h<br />
R.Tenente Raul Cascais, 1A. 1250 <strong>Lisboa</strong> Tel: 213961515<br />
http://www.teatro-cornucopia.pt M/12<br />
Colaboradores<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 43
Cinema<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
“Whisky”: um filme simples, solitário, sem tempo nem espaço,<br />
que vive do trabalho meticuloso <strong>de</strong> não-actores e <strong>de</strong> uma<br />
concepção artesanal<br />
“Shirin”, <strong>de</strong> Abbas Kiarostami<br />
incomoda e <strong>de</strong>sestabiliza, fazendo<br />
dos silêncios e do fechamento<br />
claustrofóbico a chave para enten<strong>de</strong>r<br />
o pequeno labirinto ficcional que se<br />
vai gizando sem quaisquer alar<strong>de</strong>s,<br />
nem cedências. É um filme simples,<br />
solitário, sem tempo nem espaço,<br />
que vive do trabalho meticuloso <strong>de</strong><br />
não-actores e <strong>de</strong> uma concepção<br />
artesanal que lembra alguns dos<br />
monumentos do neo-realismo<br />
italiano, embora sem qualquer<br />
preocupação <strong>de</strong> citar ou <strong>de</strong><br />
homenagear. O peso da memória<br />
sente-se nas referências à infância<br />
longínqua, com uma contenção que<br />
comove, <strong>de</strong> tão primordial, e com<br />
personagens sem gran<strong>de</strong>zas míticas,<br />
antes preferindo o escoar mínimo<br />
do tempo pelos rostos e pelas<br />
casas.M.J.T.<br />
Louise-Michel<br />
De Gustave <strong>de</strong> Kervern, Benoît<br />
Delépine<br />
com Mathieu Kassovitz, Yolan<strong>de</strong><br />
Moreau, Bouli Lanners. M/16<br />
MMMNN<br />
<strong>Lisboa</strong>: Me<strong>de</strong>ia Saldanha Resi<strong>de</strong>nce: Sala 7: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 15h40, 17h40,<br />
19h40,21h40, 00h10<br />
Porto: Arrábida 20: Sala 19: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 13h50, 16h25, 21h40, 00h10 3ª 4ª<br />
16h25, 21h40, 00h10<br />
Por trás da aparência <strong>de</strong> comédia<br />
absurdista e tópica sobre<br />
empregados ressabiados que<br />
<strong>de</strong>ci<strong>de</strong>m eliminar o patrão que os<br />
<strong>de</strong>spediu, está uma comédia satírica<br />
negra, surrealista e política, que não<br />
hesita em fazer humor com tópicos<br />
supostamente tabu e não pára nas<br />
fronteiras que para a maior parte da<br />
concorrência estão fora <strong>de</strong> alcance.<br />
É um filme que faz humor com<br />
doentes terminais, o tráfico humano<br />
“Louise-Michel” faz humor com coisas sérias<br />
e o 11 <strong>de</strong> Setembro, que está sempre<br />
pare<strong>de</strong>s-meias com o mau gosto e<br />
não tem problemas em estar rés-vés-<br />
Campo-<strong>de</strong>-Ourique com o ofensivo<br />
— mas que se salva sempre com uma<br />
pirueta “in extremis” resultante da<br />
entrega dos seus actores ou do risco<br />
estilístico <strong>de</strong> Benoît Delépine e<br />
Gustave Kervern rodarem todo o<br />
filme em Tatiescos planos fixos<br />
<strong>de</strong>ntro dos quais são os actores e os<br />
diálogos que constroem toda a<br />
acção.<br />
Percebe-se rapidamente que não<br />
há nunca nada <strong>de</strong> gratuito nem <strong>de</strong><br />
cínico em “Louise-Michel” (e seria<br />
tão fácil), apenas uma maneira<br />
claramente <strong>de</strong>scentrada <strong>de</strong> fazer<br />
humor com coisas muito sérias e <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>ixar a gargalhada <strong>de</strong>saparecer<br />
restando um travo amargo quando<br />
percebemos que não nos estamos a<br />
rir <strong>de</strong> dois candidatos a assassinos<br />
<strong>de</strong>sastrados, mas sim <strong>de</strong> uma<br />
situação económica que con<strong>de</strong>na as<br />
pessoas a fazerem coisas que nunca<br />
teriam pensado. J. M.<br />
Shirin<br />
De Abbas Kiarostami<br />
com Rana Azadivar, Vishka Asayesh,<br />
Darya Ashouri, Pegah Ahangarani,<br />
Shiva Ebrahimi, Niloofar Adibpour,<br />
Khatareh Asadi , Juliette Binoche.M/12<br />
MMMMN<br />
<strong>Lisboa</strong>: UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 6: 5ª 6ª<br />
Sábado 2ª 3ª 14h, 16h30, 19h, 21h45, 24h Domingo<br />
11h30, 14h, 16h30, 19h, 21h45, 24h 4ª 14h, 16h30,<br />
19h, 24h;<br />
Porto: Nun`Álvares: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 21h30;<br />
Des<strong>de</strong> há muito que o universo do<br />
iraniano Abbas Kiarostami se rarefez<br />
num formalismo quase maníaco que<br />
eli<strong>de</strong> personagens e fragmenta<br />
qualquer linha narrativa<br />
“Atraídos pelo Crime”<br />
<strong>de</strong>strinçável: em “Shirin”, a<br />
“história” está lá, mas aparece<br />
mediada por um aparato autoreflexivo<br />
que faz do cinema, da<br />
projecção, do ecrã invisível, o ponto<br />
<strong>de</strong> partida e <strong>de</strong> chegada. Enten<strong>de</strong>-se<br />
que a audácia da experiência (rostos<br />
sucessivos que <strong>de</strong>sfazem a hipótese<br />
da aparente reportagem) crie<br />
problemas a quem continue a<br />
privilegiar uma arte narrativa linear.<br />
Enten<strong>de</strong>-se até quem <strong>de</strong>fenda que se<br />
trata mais <strong>de</strong> um objecto plástico,<br />
por vezes próximo da instalação, do<br />
que <strong>de</strong> um filme no sentido<br />
tradicional do termo. O que está fora<br />
<strong>de</strong> questão é o seu rigor, a sua beleza<br />
algo perversa, a inteligência <strong>de</strong> uma<br />
intervenção pensada sobre o mundo<br />
das imagens e sobre as suas<br />
contradições ou ambiguida<strong>de</strong>s. Não<br />
é o cinema que nos entusiasma, mas<br />
que nos interroga. E não é pouco…<br />
Mário Jorge Torres<br />
Atraídos pelo Crime<br />
Brooklyn’s Finest<br />
De Antoine Fuqua,<br />
com Richard Gere, Ethan Hawke, Don<br />
Cheadle, Wesley Snipes. M/16<br />
MMNNN<br />
<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 4: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h35, 18h20,<br />
21h05, 23h50; Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 2: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h20, 18h55,<br />
21h30, 24h; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 1: 5ª Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 15h15, 18h15, 21h30 6ª Sábado 15h15,<br />
18h15, 21h30, 00h30; ZON Lusomundo Alvaláxia:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h40,<br />
21h20, 00h15; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h40, 18h40,<br />
21h30, 00h20; ZON Lusomundo CascaiShopping:<br />
5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h30,<br />
18h20, 21h10, 24h; ZON Lusomundo Colombo: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h40, 18h35,<br />
21h35, 00h30; ZON Lusomundo Dolce Vita<br />
Miraflores: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h10,<br />
21h10 6ª Sábado 15h10, 18h10, 21h10, 00h10; ZON<br />
Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h45, 18h35, 21h40,<br />
00h25; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h35, 18h25, 21h20,<br />
00h10; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 2: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h50, 18h40,<br />
21h30, 00h15; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª<br />
6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 17h, 20h50,<br />
23h50; ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª<br />
Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h, 21h10, 24h;<br />
Porto: Arrábida 20: Sala 13: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h15, 21h30, 00h35; ZON<br />
Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado<br />
Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h50, 21h10, 24h; ZON<br />
Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />
2ª 3ª 4ª 13h30, 16h30, 20h, 23h; ZON Lusomundo<br />
Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />
4ª 13h20, 16h20, 21h, 24h; ZON Lusomundo<br />
Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 16h40,<br />
19h50, 23h;<br />
Nova Iorque tem abundantes<br />
imagens cinematográficas que<br />
recriam uma cida<strong>de</strong> outra, que<br />
nunca existiu. “Atraídos pelo Crime”<br />
dá-nos a ver uma metrópole nos<br />
antípodas da Manhattan <strong>de</strong> Woody<br />
Allen, feia, viscosa, violenta e sem<br />
remissão possível. Sem que tal<br />
constitua novida<strong>de</strong> <strong>de</strong> maior (nem<br />
precisávamos <strong>de</strong> recorrer aos<br />
abismos <strong>de</strong> “Taxi Driver”), o filme<br />
<strong>de</strong> Antoine Fuqua evi<strong>de</strong>ncia uma<br />
certa força, feita <strong>de</strong> estereótipos (a<br />
doença, a injustiça social, o crime<br />
sem razão) e terá no trabalho dos<br />
actores (Richard Gere e Ethan<br />
Hawke) a sua justificação mais<br />
relevante. Não se espere, no<br />
entanto, <strong>de</strong>ste exercício mecânico<br />
<strong>de</strong> metafórica tensão, mais do que<br />
ele quer dar, fechado nos seus<br />
limites <strong>de</strong> “fita <strong>de</strong> pequenos<br />
gangsters” urbanos. M.J.T.<br />
44 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
ARENA<br />
Carla Filipe | João Tengarrinha | Paulo Brighenti<br />
Curadoria: Filipa Oliveira<br />
Exposição: 7 <strong>de</strong> Julho até 16 <strong>de</strong> Outubro <strong>de</strong> 2010<br />
Horário: <strong>de</strong> quarta-feira a sábado, das 15h às 20h<br />
Por ocasião da exposição será publicado um catálogo, co-edição fcc / assírio & alvim<br />
Ciclo <strong>de</strong> conversas:<br />
Filipa Oliveira – dia 25 <strong>de</strong> Setembro (sábado) às 17h00<br />
José Carlos Pereira – dia 2 <strong>de</strong> Outubro (sábado) às 17h00<br />
George Stolz – dia 16 <strong>de</strong> Outubro (sábado) às 17h00<br />
fundação carmona e costa<br />
Edifício Soeiro Pereira Gomes (antigo Edifício da Bolsa Nova <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>)<br />
Rua Soeiro Pereira Gomes, Lte 1- 6.ºD, 1600-196 <strong>Lisboa</strong><br />
(Bairro do Rego / Bairro Santos)<br />
Tel. 217 803 003 / 4<br />
www.fundacaocarmonaecosta.pt<br />
Metro: Sete Rios / Praça <strong>de</strong> Espanha / Cida<strong>de</strong> Universitária<br />
Autocarro: 31<br />
SÃO<br />
LUIZ<br />
JUL~1O<br />
© Isabel Pinto<br />
o são luiz<br />
no festival<br />
<strong>de</strong> almada<br />
9, 1O, 16 E 17 JUL<br />
ALDINA<br />
DUARTE<br />
POR OLGA RORIZ<br />
SEXTA E SÁBADO ÀS 21H00<br />
SALA PRINCIPAL M/3<br />
WWW.TEATROSAOLUIZ.PT<br />
SÃO LUIZ TEATRO MUNICIPAL<br />
RUA ANTÓNIO MARIA CARDOSO, 38; 1200-027 LISBOA<br />
GERAL@TEATROSAOLUIZ.PT / T: 213 257 640<br />
BILHETEIRA DAS 13H ÀS 20H<br />
T: 213 257 650; BILHETEIRA@TEATROSAOLUIZ.PT<br />
BILHETES À VENDA NA TICKETLINE E NOS LOCAIS HABITUAIS
Livros<br />
“O Original <strong>de</strong> Laura”, publicado<br />
agora em português, é o texto<br />
que Nabokov redigiu nos<br />
últimos dois ou três anos da sua<br />
vida<br />
Ficção<br />
O rascunho<br />
Nabokov or<strong>de</strong>nou à sua<br />
viúva que <strong>de</strong>struísse o<br />
manuscrito <strong>de</strong> “O Original<br />
<strong>de</strong> Laura”. Em vez disso, ela<br />
guardou-o num banco suíço.<br />
Gustavo Rubim<br />
O Original <strong>de</strong> Laura<br />
Vladimir Nabokov<br />
Tradução Telma Costa<br />
Teorema<br />
mmmmn<br />
O que há <strong>de</strong> mais<br />
precioso neste livro<br />
é a parte<br />
fotográfica.<br />
Construído segundo<br />
o mo<strong>de</strong>lo da edição<br />
original norteamericana<br />
(Novembro <strong>de</strong><br />
2009), o volume reproduz à<br />
dimensão <strong>de</strong> meia página as fichas<br />
<strong>de</strong> cartão on<strong>de</strong> Nabokov foi<br />
escrevendo um texto que projectava<br />
intitular “O Original <strong>de</strong> Laura”. Na<br />
meta<strong>de</strong> inferior das páginas vem a<br />
tradução exclusivamente do<br />
rascunho fotografado em cima,<br />
frente ou verso <strong>de</strong> uma ficha, a<br />
maior parte das vezes fazendo parte<br />
ou <strong>de</strong> um capítulo numerado ou <strong>de</strong><br />
uma série com título (“Wild”,<br />
“Dedos dos Pés”, “Aurora”, por<br />
exemplo).<br />
Trata-se, claro está, <strong>de</strong> uma<br />
solução <strong>de</strong> compromisso. Editar um<br />
rascunho, que o autor<br />
expressamente or<strong>de</strong>nou que fosse<br />
<strong>de</strong>struído caso não ficasse acabado à<br />
hora da sua morte, obriga a estas<br />
habilida<strong>de</strong>s. O habilidoso, neste<br />
caso, foi o filho <strong>de</strong> Vladimir (que<br />
morreu em 1977): Dmitri Nabokov,<br />
<strong>de</strong> quem se po<strong>de</strong>rá dizer tudo<br />
menos que não seja servidor<br />
<strong>de</strong>votado da obra <strong>de</strong> seu pai. A<br />
polémica à volta da publicação <strong>de</strong><br />
“O Original <strong>de</strong> Laura” apenas o<br />
confirma.<br />
Mas qual é então o interesse<br />
<strong>de</strong>stas fichas fac-similadas que<br />
Vladimir Nabokov foi redigindo nos<br />
últimos dois ou três anos da sua<br />
vida?<br />
Seguramente não o <strong>de</strong> revelar<br />
uma obra inédita ou, como inculca a<br />
badana, “o gran<strong>de</strong> livro final” do<br />
autor <strong>de</strong> “Lolita”. Não é também<br />
claro que as 138 fichas<br />
correspondam a um “romance em<br />
fragmentos”, frágil classificação <strong>de</strong><br />
género que vem na capa da edição<br />
Knopf e acertadamente <strong>de</strong>saparece<br />
nas traduções francesa e<br />
portuguesa. Afirmar pedantemente,<br />
como fez Martin Amis num artigo<br />
para o “Guardian”, que o texto é “<strong>de</strong><br />
imediato reconhecível como um<br />
conto mais longo que luta para se<br />
transformar numa novela” é só outra<br />
maneira <strong>de</strong> fugir às evidências, ou<br />
seja, àquilo que nas fichas aparece e<br />
que na literatura é o mais difícil <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>screver: a própria escrita.<br />
O melhor sinal <strong>de</strong>ssa evidência da<br />
escrita é uma folha quadriculada,<br />
aqui posta na portada do livro e no<br />
fim da série <strong>de</strong> fichas pautadas. Lêse<br />
nela uma série vertical <strong>de</strong> sete<br />
verbos ingleses que Telma Costa, a<br />
tradutora, converte nos seguintes<br />
verbos em português: “apagar,<br />
erradicar, suprimir, anular, <strong>de</strong>lir,<br />
limpar, obliterar” (o primeiro é<br />
“efface”). Não passa <strong>de</strong> uma lista <strong>de</strong><br />
sinónimos e no entanto olha-se para<br />
ela como se equivalesse <strong>de</strong> algum<br />
modo à or<strong>de</strong>m que Nabokov <strong>de</strong>u à<br />
sua viúva, Vera: <strong>de</strong>struir o<br />
manuscrito (em vez disso, ela<br />
guardou-o num banco suíço).<br />
Porque é o género <strong>de</strong> verbos (e <strong>de</strong><br />
atos) que se aplica muito bem ao que<br />
se escreve. Mas também porque o<br />
esqueleto <strong>de</strong> história que o rascunho<br />
constrói tem a ver com a escrita <strong>de</strong><br />
um livro chamado “Laura”, que<br />
ten<strong>de</strong> a apagar-se ou a anular-se<br />
perante o original da protagonista,<br />
ou seja, uma mulher chamada<br />
“Flora”.<br />
Esta mulher, no entanto, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as<br />
primeiras linhas em que aparece,<br />
tem tendência para se converter em<br />
livro. Descrita numa cena <strong>de</strong> sexo,<br />
diz o narrador: “Só i<strong>de</strong>ntificando-a<br />
com um não-escrito, meio escrito,<br />
reescrito livro difícil se po<strong>de</strong> enfim<br />
aspirar a conseguir o que as<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
<strong>de</strong>scrições contemporâneas do coito<br />
tão raramente transmitem (...)”.<br />
Mais adiante, sabemos que Flora na<br />
pré-adolescência ficava muitas vezes<br />
sozinha em casa com um<br />
“charmeur” chamado Hubert H.<br />
Hubert e aí a conversão literária <strong>de</strong><br />
Flora em Lolita torna-se inevitável<br />
apesar <strong>de</strong> todas as diferenças que<br />
separam Humbert Humbert, herói e<br />
narrador do romance <strong>de</strong> 1955, <strong>de</strong>ste<br />
“macho velho, meigo mas<br />
malcheiroso e ‘afoito’”. O nome<br />
produz os seus efeitos e o original <strong>de</strong><br />
“Laura” per<strong>de</strong>-se noutro livro (que<br />
é, em gran<strong>de</strong> parte, uma história <strong>de</strong><br />
origens perdidas).<br />
Do que o rascunho dá documento<br />
vivo é <strong>de</strong>ssa característica alusiva e<br />
entremeada da prosa <strong>de</strong> Nabokov no<br />
processo <strong>de</strong> se compor. O que resta<br />
do capítulo quatro narra a morte da<br />
mãe <strong>de</strong> Flora, que no início é Mrs.<br />
Lanskaya e no meio, <strong>de</strong>z linhas <strong>de</strong><br />
ficha abaixo, já é “‘Landskaya’ —<br />
‘land’ e ‘sky’, terra e céu e o eco<br />
melancólico do seu nome<br />
dançante.”<br />
Se há coisa que “O Original <strong>de</strong><br />
Laura” não é <strong>de</strong> certeza é o mero<br />
esboço <strong>de</strong> uma história mais ou<br />
menos sugestiva, que se <strong>de</strong>va avaliar<br />
pela soli<strong>de</strong>z do enredo ou pela<br />
verosimilhança psicológica das<br />
personagens, ainda que só<br />
adivinhadas. Como sempre acontece<br />
quando um texto dá acesso à escrita,<br />
é da literatura que se trata nestas<br />
linhas em que um livro está no<br />
centro dos acontecimentos. São<br />
linhas que falam do modo como na<br />
escrita se <strong>de</strong>sfaz aquilo que ela<br />
mesma inventa: “O ‘Eu’ do livro é<br />
um homem <strong>de</strong> letras neurótico e<br />
hesitante, que <strong>de</strong>strói a sua amante<br />
no acto <strong>de</strong> a retratar.”<br />
Esse mesmo “eu” emprega-se<br />
<strong>de</strong>pois num processo <strong>de</strong> autoeliminação<br />
que consiste em apagar<br />
mentalmente, <strong>de</strong> baixo para cima, a<br />
linha vertical do pronome pessoal<br />
inglês “I”. Recomenda-se a atenta<br />
leitura <strong>de</strong>ssas páginas apenas<br />
rascunhadas àqueles que ten<strong>de</strong>m,<br />
<strong>de</strong> modo quase maníaco, a não ler<br />
nos textos senão o que julgam já<br />
saber sobre quem os escreveu.<br />
O casal<br />
Publicado em 1987, “Morrem<br />
Mais <strong>de</strong> Mágoa” é a autópsia<br />
<strong>de</strong>sse apurado exemplar que<br />
é o homem refinadamente<br />
educado no século XX.<br />
Helena Vasconcelos<br />
Morrem Mais <strong>de</strong> Mágoa<br />
Saul Bellow<br />
Tradução Lucília Filipe<br />
Quetzal<br />
mmmmm<br />
Se Darwin tivesse lido Saul Bellow<br />
CHRISTOPHER FELVER/CORBIS<br />
Bellow, malabarista da palavra, conta<br />
histórias com um mínimo <strong>de</strong> acção<br />
e o máximo <strong>de</strong> referências filosóficas<br />
e literárias<br />
ficaria<br />
provavelmente<br />
intrigado com a<br />
forma como o autor<br />
<strong>de</strong> “Morrem Mais <strong>de</strong><br />
Mágoa”, romance<br />
<strong>de</strong> 1987, se <strong>de</strong>dica a<br />
autopsiar, mais uma<br />
vez, esse apurado<br />
exemplar que é o homem<br />
refinadamente educado do século<br />
XX. Des<strong>de</strong> os longínquos anos 40,<br />
quando publicou “Dangling Man”,<br />
que o gran<strong>de</strong> escritor canadiano —<br />
naturalizado americano — foi<br />
analisando as crises <strong>de</strong> meia-ida<strong>de</strong><br />
em homens ju<strong>de</strong>us cultos e<br />
sofisticados, a braços com paixões<br />
contraditórias, casamentos<br />
frustrados, divórcios complexos e<br />
avanços alarmantes (mas<br />
ansiosamente <strong>de</strong>sejados) <strong>de</strong><br />
mulheres impetuosas e sensuais. Ao<br />
revelar a fragilida<strong>de</strong> e os tormentos<br />
por que passam intelectuais<br />
aparentemente sólidos que, à<br />
partida, se apresentam como<br />
exemplos <strong>de</strong> um processo <strong>de</strong><br />
evolução civilizacional vitorioso e<br />
bem sucedido, Bellow retrata a<br />
frustração do “homem mo<strong>de</strong>rno”<br />
confrontado com situações que já<br />
não sabe controlar porque lhe<br />
falham o instinto e a cautela<br />
ancestrais.<br />
Em “Morrem Mais <strong>de</strong> Mágoa” (o<br />
título elegíaco contradiz o tom<br />
cómico e picaresco da narrativa),<br />
Bellow junta dois professores que,<br />
<strong>de</strong> uma forma muito particular,<br />
formam um par estreitamente unido<br />
como mais tar<strong>de</strong>, em 2000,<br />
acontecerá com Abe e Chick, os<br />
doutos académicos do seu último<br />
romance, “Ravelstein”. Aqui, a forte<br />
relação, não isenta <strong>de</strong> atritos, entre<br />
Kenneth Trachtenberg, o narrador<br />
<strong>de</strong> 35 anos, assistente <strong>de</strong> Literatura<br />
Russa numa remota Universida<strong>de</strong> do<br />
Midwest, e o seu tio pelo lado<br />
materno, Benn Cra<strong>de</strong>r, um<br />
académico e botânico famoso que<br />
46 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Espaço<br />
Público<br />
Este espaço vai ser<br />
seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />
teatro, livro, exposição,<br />
disco, álbum, canção,<br />
concerto, DVD viu e<br />
gostou tanto que lhe<br />
apeteceu escrever<br />
sobre ele, concordando<br />
ou não concordando<br />
com o que escrevemos?<br />
Envie-nos uma nota até<br />
500 caracteres para<br />
ipsilon@publico.pt. E<br />
nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />
Sebastian Barry é um dos mais talentosos<br />
autores <strong>de</strong> língua inglesa actuais<br />
anda pela casa dos 50 e se<br />
especializou em líquenes da<br />
Antárctida, assemelha-se, na sua<br />
essência, à <strong>de</strong> outros “casais”<br />
exemplares como Dom Quixote e<br />
Sancho Pança, Robinson Crusoé e<br />
Sexta-Feira ou Sherlock Holmes e<br />
Doutor Watson. Empenhados na<br />
pesquisa — cada um à sua maneira —<br />
das agruras nas relações humanas,<br />
das angústias do erotismo e das<br />
frustrações do amor, vêem-se a<br />
braços com o dilema expresso na<br />
seguinte frase: “Quando nos<br />
metemos na vida quotidiana, somos<br />
apanhados pelo pescoço mas se, por<br />
outro lado, nos recusamos a entrar<br />
nela, nunca perceberemos nada”<br />
(pág. 356). Dito isto, Bellow cita<br />
amplamente filósofos como<br />
Alexandre Kojève, mentor do seu<br />
amigo Allan Bloom e,<br />
principalmente, Nicolai Fyodorov,<br />
que é subtilmente satirizado pela<br />
sua crença num processo<br />
evolucionário em que o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento da inteligência<br />
implicaria um melhoramento da<br />
vida da humanida<strong>de</strong>. (Segundo<br />
Fyodorov, o ser humano, no auge do<br />
seu <strong>de</strong>senvolvimento, po<strong>de</strong>ria<br />
aspirar à imortalida<strong>de</strong>, uma vez que<br />
a luta contra a morte seria um traço<br />
<strong>de</strong> união entre os povos não olhando<br />
a credos, religiões, raças, riqueza ou<br />
condição social.)<br />
Em “Morrem Mais <strong>de</strong> Mágoa”, a<br />
“trama”, no sentido tradicional do<br />
termo, é quase inexistente. Kenneth<br />
cresceu em Paris, os pais são<br />
americanos expatriados,<br />
sofisticados e cosmopolitas — à sua<br />
mesa sentaram-se gran<strong>de</strong>s<br />
pensadores e artistas — mas prefere<br />
refugiar-se no coração da América,<br />
colocando-se a uma distância<br />
consi<strong>de</strong>rável do pai com o seu<br />
donjuanismo priápico, e da mãe que<br />
parte para a Somália como<br />
voluntária, <strong>de</strong>ixando para trás o<br />
brilho da Rive Gauche. Kenneth e<br />
Benn passam o tempo a conversar<br />
— Benn é bastante inconveniente na<br />
forma como convoca o sobrinho a<br />
qualquer hora do dia e da noite — e<br />
o casamento é uma peça tão<br />
fundamental na estrutura <strong>de</strong>ste<br />
romance como nos <strong>de</strong> Jane Austen.<br />
A vida <strong>de</strong> Kenneth, envolta na<br />
melancolia dos autores russos a que<br />
<strong>de</strong>dica o seu estudo, não é<br />
brilhante: tem uma filha <strong>de</strong> uma<br />
mulher que se mudou para Seattle e<br />
é sovada pelo amante — a pequena<br />
Treckie que exibe as suas nódoas<br />
negras como troféus —, e uma sogra<br />
que quer casar com ele para ter<br />
acesso à custódia da neta (filha<br />
<strong>de</strong>le), vive num quarto espartano na<br />
Universida<strong>de</strong> e encontra-se<br />
permanente envolvido nos dramas<br />
do tio Benn com a agravante <strong>de</strong><br />
nunca conseguir salvá-lo<br />
verda<strong>de</strong>iramente. Este, a quem<br />
chamam Professor Clorofila, <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong> viuvez tranquila, é<br />
arrastado pela sua libido e<br />
compelido a dar o nó com a bela,<br />
jovem, rica, sonolenta e sarcástica<br />
Matilda Layamon — casamento que<br />
se realiza sorrateiramente, na<br />
ausência <strong>de</strong> Kenneth —, o que, como<br />
seria <strong>de</strong> esperar, o vai submergir em<br />
preocupações e levá-lo a uma<br />
situação <strong>de</strong> impasse. O gran<strong>de</strong><br />
cientista, o homem bom, o<br />
observador do perfeito universo das<br />
plantas, o viajante com uma missão<br />
maior vê-se embrenhado numa<br />
comédia <strong>de</strong> costumes — Balzac é<br />
citado com proprieda<strong>de</strong> — em que o<br />
dinheiro é, obviamente, uma<br />
priorida<strong>de</strong>. É impensável manter<br />
Matilda com um salário <strong>de</strong> professor<br />
e os sogros <strong>de</strong> Benn têm gran<strong>de</strong>s<br />
planos para fazer <strong>de</strong>le um homem<br />
dignamente rico, capaz <strong>de</strong> aplacar a<br />
voracida<strong>de</strong> da sua bela esposa. (Os<br />
tormentos que se avizinham como<br />
nuvens negras <strong>de</strong> tempesta<strong>de</strong>, tão<br />
actuais e prementes como os que<br />
afligiram os peregrinos <strong>de</strong> Chaucer,<br />
transportam-nos directamente para<br />
os “Contos <strong>de</strong> Canterbury”).<br />
Dizer-se que “Morrem Mais <strong>de</strong><br />
Mágoa” é um romance implicaria<br />
uma longa meditação sobre as<br />
flutuações erráticas e as<br />
ramificações <strong>de</strong>ste género literário.<br />
Mas Bellow é um malabarista da<br />
palavra, capaz <strong>de</strong> contar uma<br />
história com um mínimo <strong>de</strong> acção e<br />
o máximo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias e referências<br />
filosóficas e literárias. O seu ritmo, a<br />
sua aparente discrição e as suas<br />
raízes judias e russas po<strong>de</strong>m não<br />
revelar, numa primeira impressão, o<br />
lado extremamente cómico das suas<br />
personagens, envolvidas em tramas<br />
sentimentais e angústias<br />
existenciais. Enganam-se<br />
(ligeiramente) os críticos que<br />
insistem em compará-lo a Henry<br />
James pela hábil e complexa<br />
tessitura das suas histórias, pelo que<br />
será mais acertado dizer-se que, por<br />
<strong>de</strong>trás da sua suavida<strong>de</strong>, Bellow foi<br />
um discípulo <strong>de</strong> Stendhal, Henry<br />
Fielding e Voltaire, amante <strong>de</strong> um<br />
lado “marginal” da socieda<strong>de</strong> — nos<br />
seus romances existe sempre a<br />
sombra dos “gangsters” típicos da<br />
sua cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> adopção, Chicago — e<br />
um observador exímio da mente<br />
humana.<br />
Falta acrescentar que Saul Bellow<br />
continua a ser, cinco anos após a<br />
sua morte, uma espécie <strong>de</strong> “guru”<br />
<strong>de</strong> (já) várias gerações <strong>de</strong> escritores.<br />
Basta ler o último livro <strong>de</strong> Ian<br />
McEwan, “Solar” (ed. Gradiva),<br />
para <strong>de</strong>tectar as suas fontes em<br />
“Herzog” e “ Ravelstein”, dois dos<br />
romances mais cómicos e<br />
simultaneamente mais<br />
melancólicos <strong>de</strong> Bellow, <strong>de</strong>dicados<br />
ao tema do envelhecimento<br />
masculino e à pressão <strong>de</strong> um<br />
universo caótico e dominado por<br />
forças <strong>de</strong>sumanizadas. Martin Amis,<br />
para citar mais um exemplo, nunca<br />
se esquece <strong>de</strong> mencionar a dívida<br />
para com este gran<strong>de</strong> senhor que<br />
cultivou a amiza<strong>de</strong> entre os homens<br />
e um persistente fascínio (e medo)<br />
pelas mulheres. Conhecido pelas<br />
suas i<strong>de</strong>ias exuberantes, ironia<br />
faiscante, comédia hilariante e<br />
compaixão compulsiva, Bellow<br />
escreveu: “um homem afirma,<br />
‘daqui em diante vou dizer sempre<br />
a verda<strong>de</strong>’. Mas a verda<strong>de</strong> ouve-o,<br />
foge e escon<strong>de</strong>-se ainda antes <strong>de</strong>le<br />
ter acabado <strong>de</strong> falar”. Neste mundo<br />
on<strong>de</strong> se persegue a felicida<strong>de</strong> como<br />
utopia e o conforto da <strong>de</strong>mocracia<br />
se paga bem caro, há mais gente a<br />
morrer <strong>de</strong> mágoa do que <strong>de</strong><br />
radiações atómicas. No universo <strong>de</strong><br />
Saul Bellow é assim.<br />
Elegia<br />
irlan<strong>de</strong>sa<br />
Exílio e re<strong>de</strong>nção <strong>de</strong> um<br />
anti-herói que o <strong>de</strong>stino quis<br />
no “lado errado” da História,<br />
escrita por um talentoso<br />
estilista da língua inglesa.<br />
José Riço Direitinho<br />
A História <strong>de</strong> Eneas<br />
Sebastian Barry<br />
Tradução Fernanda Pinto Rodrigues<br />
Bertrand Editora<br />
MMmmN<br />
O irlandês Sebastian<br />
Barry (n. 1955),<br />
duas vezes finalista<br />
do Booker Prize — a<br />
última com o<br />
belíssimo romance<br />
“Escritos Secretos”<br />
(Bertrand, 2009)<br />
— para além <strong>de</strong><br />
romancista, é também um prolífico<br />
dramaturgo e poeta. O lirismo da<br />
sua prosa, o quase inebriante estilo<br />
elegíaco, e a exactidão poética,<br />
associados ao cuidado <strong>de</strong> ourives<br />
com que ur<strong>de</strong> as suas histórias,<br />
fazem <strong>de</strong> Barry um dos mais<br />
talentosos autores <strong>de</strong> língua inglesa<br />
da sua geração.<br />
“A História <strong>de</strong> Eneas”,<br />
originalmente publicado em 1998,<br />
narra-nos a vida atribulada <strong>de</strong> Eneas<br />
McNulty, nascido no lugar <strong>de</strong> Sligo,<br />
APOIO<br />
PATROCINADOR<br />
VERÃO NA CASA<br />
na Irlanda rural dos “velhos muros<br />
sombrios” e das “azinhagas<br />
assombradas”, nos começos do<br />
século XX, filho <strong>de</strong> um alfaiate (e<br />
músico amador) e <strong>de</strong> uma<br />
costureira, ambos a trabalharem<br />
num manicómio. A vida <strong>de</strong>sta<br />
espécie <strong>de</strong> anti-herói irlandês,<br />
começa <strong>de</strong> maneira conturbada,<br />
pois quer o <strong>de</strong>stino que logo<br />
bastante novo ele viva numa espécie<br />
<strong>de</strong> “lado errado” da História e das<br />
atribulações dos tempos que então<br />
corriam: quando os<br />
“in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntistas” <strong>de</strong> Michael<br />
Collins, mais tar<strong>de</strong> o herói da<br />
in<strong>de</strong>pendência irlan<strong>de</strong>sa, se<br />
começam a afirmar contra os<br />
britânicos, ele tem a má sorte <strong>de</strong> por<br />
essa altura se ir alistar na marinha<br />
mercante inglesa, e mais tar<strong>de</strong>,<br />
ainda, nas forças policiais britânicas<br />
que reprimiam na Irlanda os<br />
“irregulares” católicos do “exército”<br />
republicano pré-in<strong>de</strong>pendência. Os<br />
homens <strong>de</strong> Sligo, incluindo o seu<br />
maior amigo <strong>de</strong> infância, não lhe<br />
perdoam a “traição” e o seu nome é<br />
<strong>de</strong> imediato incluído nas listas<br />
TER 27 JUL<br />
22:00 PRAÇA | € 20<br />
A electrónica toma conta da<br />
Praça com o concerto <strong>de</strong> Tricky.<br />
Músico <strong>de</strong> referência do trip–<br />
–hop inglês, esteve ligado ao<br />
período inicial da carreira dos<br />
Massive Attack. A sua carreira<br />
explodiu em 1995 com o premiado<br />
Maxinquaye, primeiro álbum a<br />
solo recentemente reeditado.<br />
JANTAR+CONCERTO € 35<br />
MECENAS CASA DA MÚSICA<br />
APOIO INSTITUCIONAL<br />
MECENAS PRINCIPAL CASA DA MÚSICA<br />
PATROCINADOR VERÃO NA CASA<br />
SEJA UM DOS PRIMEIROS A APRESENTAR HOJE ESTE JORNAL NA CASA DA MÚSICA E GANHE UM CONVITE DUPLO<br />
PARA O CONCERTO DE TRICKY. OFERTA LIMITADA AOS PRIMEIROS 10 LEITORES.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 47
Livros<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
negras dos apoiantes <strong>de</strong> Michael<br />
Collins (e, mais tar<strong>de</strong>, também nas<br />
do IRA, como numa espécie <strong>de</strong><br />
herança) como homem a abater.<br />
Transforma-se num ser acossado, e<br />
o resto da sua vida vai ser moldado<br />
pelas forças em luta, pois os<br />
“homens dos casacos escuros” <strong>de</strong><br />
Sligo não apagam o nome <strong>de</strong>le das<br />
listas e a sentença <strong>de</strong> morte não é<br />
revogada. O passado nunca <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong><br />
ser um terreno minado, porque o<br />
passado afinal ainda não passou. O<br />
que se segue é uma longa história <strong>de</strong><br />
exílio.<br />
Há nisto tudo uma espécie <strong>de</strong><br />
paradoxo: a vida <strong>de</strong> um homem<br />
apolítico, que apenas queria ganhar<br />
o seu sustento, é toda ela moldada<br />
por aquilo que menos lhe interessa<br />
— até o gran<strong>de</strong> amor da sua vida, a<br />
linda Vic, que é obrigado a <strong>de</strong>ixar<br />
para sempre em Sligo.<br />
Como num jogo <strong>de</strong> espelhos,<br />
Sebastian Barry serve-se <strong>de</strong> um antiherói<br />
para nos mostrar como a<br />
História da Irlanda, <strong>de</strong> maneira<br />
maligna, po<strong>de</strong> perturbar e alastrar<br />
como uma mancha na vida dos<br />
irlan<strong>de</strong>ses quando estes menos<br />
esperam; mas não apenas a sua<br />
vertente política, também a religião<br />
(estavam ambas bastante ligadas)<br />
actuou — e actua (note-se as disputas<br />
entre católicos e protestantes no<br />
norte da ilha — como um estigma<br />
social na Irlanda. Assim surge a<br />
personagem Roseanne Clear, que<br />
vamos encontrar mais tar<strong>de</strong> no<br />
romance “Escritos Secretos”, com<br />
quase cem anos, internada num<br />
hospício há décadas por disputas<br />
político-religiosas (separatistas /<br />
unionistas, católicos / protestantes).<br />
Escorraçado da sua terra natal e<br />
da família, começa a sua<br />
<strong>de</strong>ambulação em busca <strong>de</strong> uma<br />
re<strong>de</strong>nção que talvez nunca chegue.<br />
Durante <strong>de</strong>z anos trabalha num<br />
pesqueiro nos mares da<br />
Gronelândia, perseguindo cardumes<br />
<strong>de</strong> arenques, mas as recordações e o<br />
<strong>de</strong>sprezo com que foi tratado nunca<br />
o abandonam, antes o fazem<br />
continuar. “Naquele imaculado<br />
mundo <strong>de</strong>serto <strong>de</strong> gelo, mar e<br />
arenques, com as sociáveis baleias e<br />
raramente um narval a passar por<br />
eles, on<strong>de</strong> os animais são pretos ou<br />
brancos, só a Lua e as auroras<br />
boreais extravagantes, geladas e<br />
altas, são sombras, lembranças <strong>de</strong><br />
cores, é <strong>de</strong> alguma maneira possível<br />
conservar Sligo na sua cabeça. E o<br />
ódio que os seus compatriotas<br />
sentem por ele é uma espécie <strong>de</strong><br />
guia, uma espécie <strong>de</strong> explicação<br />
para a <strong>de</strong>cadência da ternura <strong>de</strong>les.<br />
Anos brutais entre um povo<br />
civilizado fizeram-lhes isso porque<br />
quando há assassínio e mais<br />
assassínio o coração morre como um<br />
rato com veneno na soleira <strong>de</strong> uma<br />
casa <strong>de</strong> quinta, ofegante.”<br />
Depois dos trabalhos piscatórios<br />
na Gronelândia e nos mares do<br />
Norte, vem a II Guerra Mundial, e<br />
Eneas McNulty estará em<br />
Dunquerque, on<strong>de</strong> quase se lhe fina<br />
a vida. Depois vem a África, Nigéria,<br />
Lagos, os perigos <strong>de</strong> um continente<br />
<strong>de</strong>sconhecido. Mas a re<strong>de</strong>nção<br />
parece chegar na forma <strong>de</strong> um hotel,<br />
numa pequena ilha inglesa, que<br />
funciona como último porto <strong>de</strong><br />
abrigo para alguns que, como ele,<br />
quase foram <strong>de</strong>serdados da vida.<br />
Convocando um imaginário<br />
tipicamente irlandês — as casas<br />
senhoriais em ruínas com<br />
aparecimentos <strong>de</strong> antigos fantasmas<br />
<strong>de</strong> crianças, as matas <strong>de</strong> aveleiras, o<br />
“cheiro húmido dos musgos”, os<br />
ulmeiros, os riachos, os pátios em<br />
ruínas, as histórias <strong>de</strong> náufragos que<br />
aparecem ainda em enseadas<br />
escondidas — Barry consegue<br />
compor, em ritmo dolente e<br />
elegíaco, uma história que<br />
dificilmente <strong>de</strong>ixará a memória do<br />
leitor.<br />
Ser menor<br />
A curva <strong>de</strong> uma<br />
vida<br />
Vergílio Ferreira<br />
Obra Completa -<br />
Espólio<br />
Edição <strong>de</strong> Ana<br />
Isabel Turíbio e<br />
Cátia Barroso<br />
Quetzal, 54 págs.<br />
mmnnn<br />
Promessa<br />
Vergílio Ferreira<br />
Obra Completa -<br />
Espólio<br />
Edição <strong>de</strong> Fernanda<br />
Irene Fonseca e<br />
Hel<strong>de</strong>r Godinho<br />
Quetzal, 279 págs.<br />
mmmnn<br />
Duas obras “completas”, até agora<br />
inéditas, do espólio <strong>de</strong> Vergílio<br />
Ferreira: “A Curva <strong>de</strong> Uma Vida”<br />
novela <strong>de</strong>butante, e “Promessa”,<br />
romance <strong>de</strong> 1947. Nenhuma editada<br />
em vida do autor, que todavia se lhe<br />
refere nos “Diários”, nem por este<br />
dada como pronta a editar. O que<br />
levanta hoje problemas éticos. ‘Na<br />
aparência resolvidos’ (?) sob a capa<br />
<strong>de</strong> uma citação do próprio Vergilio<br />
Ferreira (“Conta-Corrente”) que os<br />
organizadores colocam em epígrafe,<br />
em ambos os volumes: “A minha<br />
opinião é que um autor não dá<br />
garantias quase nenhumas (…) sobre<br />
a valia do que realiza. E não há obra<br />
mediocre alguma que lhe <strong>de</strong>strua a<br />
obra superior (…) Mas há mil<br />
problemas a seduzir-nos (…) saber<br />
como se errou, progrediu, hesitou”.<br />
Problemas que tentam uma minoria.<br />
O aparato crítico, como já havia sido<br />
o <strong>de</strong> “Diário Inédito”, é cuidado e<br />
completo. O prefácio do romance,<br />
da autoria <strong>de</strong> Fernanda Irene<br />
Fonseca e Hel<strong>de</strong>r Godinho, é<br />
rigoroso (assim como o <strong>de</strong> Ana<br />
LUÍS RAMOS/ARQUIVO<br />
Isabel Turíbio e Cátia Barroso, no<br />
caso da novela) no que diz respeito à<br />
explicação exaustiva dos critérios da<br />
publicação e do trabalho crítico<br />
sobre o espólio, explicação esta não<br />
inocentemente subsumida sob o<br />
recurso ao argumento <strong>de</strong> autoria<strong>de</strong><br />
filiado na citação do autor. Nas<br />
últimas linhas escreve-se:<br />
“‘Promessa’ não é um livro<br />
supérfluo” na obra <strong>de</strong> Vergílio<br />
Ferreira “e muito menos um livro<br />
simplesmente menor”.<br />
Curiosamente, ergue outras<br />
interrogações além do seu ser<br />
menor que indiscutivelmente é. Tido<br />
como texto <strong>de</strong> mudança, marca <strong>de</strong><br />
afastamento no neo-realismo que só<br />
ao <strong>de</strong> leve assoma, é sobretudo<br />
“romance <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias”, o que já não<br />
seria hoje bom augúrio. Duas<br />
personagens nucleares: Flávio, o<br />
narrador (um perfil hegeliano ou<br />
marxista) que se criou na rua e se fez<br />
engenheiro, tem um conhecimento<br />
directo da história que conta,<br />
interpelando regularmente um tal<br />
<strong>de</strong> Rodrigo, vulto ausente, suporte<br />
tecnicamente eficaz <strong>de</strong><br />
perplexida<strong>de</strong>s e interrogações<br />
narrativas. Sérgio (perfil<br />
existencialista) é a outra<br />
personagem nuclear, é o centro<br />
<strong>de</strong>sconcertante <strong>de</strong> uma constelação<br />
<strong>de</strong> acções e reacções, por quem os<br />
sentimentos do narrador também<br />
diferem: do rancor, à<br />
incompreensão, ao ódio quase, até à<br />
compaixão e cordialida<strong>de</strong>, comoção<br />
perante o seu corpo. Esta <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong><br />
sentimental trai, aliás, o intuito <strong>de</strong><br />
ser objectivo. Flávio era aluno num<br />
liceu em que Sérgio leccionava. Por<br />
razões políticas, o pai daquele<br />
ausenta-se. Então Sérgio, que é<br />
também, à noite, pintor, propõe ser<br />
ele a orientar e financiar os estudos<br />
do rapaz, que acabará por se tornar<br />
engenheiro inscrevendo entre eles,<br />
naturalmente, relações ambíguas <strong>de</strong><br />
po<strong>de</strong>r.<br />
Começo por imaginar a recepção<br />
<strong>de</strong>ste romance por dois públicos<br />
diferentes: os que já conhecem,<br />
leram e admiram o autor; e os que<br />
numa livraria cruzam pela primeira<br />
vez o nome (re)conhecido, o título<br />
— “Promessa” — e são incitados a<br />
pegar nele pela aura que o ter estado<br />
inédito transporta, qual “Laura”, <strong>de</strong><br />
Nabokov. Como exercício, <strong>de</strong>sdobrome<br />
e vou supor que o lêem até ao<br />
fim.<br />
Comecemos pelos primeiros,<br />
aqueles que sublinham um ou outro<br />
traço já visível neste romance<br />
daquilo que alicerçará “Para<br />
Sempre” ou “Em Nome da Terra”. O<br />
início — “Agora que Sérgio morreu<br />
contarei tudo como se passou. Tanto<br />
mais que para alguns o assassino fui<br />
eu”; O fim — “Sérgio sangra-me a<br />
memória. São três da madrugada e<br />
há silêncio no mundo. (...) Olho, por<br />
isso, e esqueço. Vejo-te apenas nu,<br />
<strong>de</strong>sgraçado entre o luxo do teu<br />
quarto, caído, sem <strong>de</strong>sespero (...).<br />
Agora que há silêncio, eu quero<br />
admitir que para ti já não houvesse<br />
outro remédio no mundo, e porque<br />
o admito. A tua miséria comoveme”.<br />
Entre os dois momentos toda<br />
uma história é convocada. O<br />
narrador invoca e evoca a partir do<br />
presente da narrativa o real que<br />
transcen<strong>de</strong>. Estas linhas repercutem<br />
já a nota <strong>de</strong> um Virgílio Ferreira por<br />
vir, até na sua dimensão celiniana.<br />
“Promessa” dá já sinal do que há-<strong>de</strong><br />
vir aperfeiçoado, vibrátil, ‘sublime’.<br />
Consi<strong>de</strong>remos agora a segunda<br />
categoria <strong>de</strong> leitores, aqueles para<br />
quem Vergílio Ferreira não passa <strong>de</strong><br />
mais um nome sem espessura no<br />
mercado e na memória. Esses talvez<br />
exasperem (com razão) aquelas<br />
páginas que os primeiros apressam,<br />
isto é, as muitas e artificiais<br />
discussões filosóficas e estéticas <strong>de</strong><br />
uma tertúlia, pretexto para “i<strong>de</strong>ias<br />
postas em romance” ficcionalmente<br />
<strong>de</strong>scarnadas. Porque ingénuo e<br />
excessivamente transparente o<br />
intuito, o i<strong>de</strong>ário que se quer pôr em<br />
confronto. Lembremos que ao<br />
mesmo tempo o autor lia os filósofos<br />
que se iriam tornar constitutivos do<br />
escritor e do ensaísta, <strong>de</strong> Bergson a<br />
Sartre passando por Hegel, entre<br />
outros. Assim, “Promessa” tem<br />
<strong>de</strong>masiada filosofia à mostra, mal<br />
tecida, o que se torna quase<br />
caricatural. Uma epígrafe <strong>de</strong><br />
abertura, citação <strong>de</strong> Hegel que vai<br />
subsumir o todo: “é na vida <strong>de</strong> um<br />
povo que o conceito <strong>de</strong> actualização<br />
da razão consciente tem a sua<br />
perfeita realida<strong>de</strong>”. Temos no<br />
romance a contradição explícita <strong>de</strong><br />
dois pólos opostos: Sérgio e<br />
Edmundo. “Sérgio parecia-me<br />
<strong>de</strong>sinteressado da vida e Edmundo<br />
preso a ela, mor<strong>de</strong>ndo-lhe,<br />
cravando-lhe os <strong>de</strong>ntes no pescoço.<br />
Quando não lhes entendia as<br />
palavras, eu entendia o que as<br />
tornava oportunas: os gestos, a<br />
mímica. Sérgio era lento e cansado.<br />
Mas Edmundo era activo.” Flávio<br />
seria uma síntese <strong>de</strong> ambos. Por <strong>de</strong><br />
mais previsível.<br />
Vergílio Ferreira escreve “A Curva<br />
<strong>de</strong> Uma Vida” com 22 anos acabados<br />
os seus estudos <strong>de</strong> Filologia Clássica,<br />
o que é <strong>de</strong> ter em conta já que tem<br />
um toque juvenil <strong>de</strong> tragédia<br />
clássica, embora o final, que uns<br />
zumzuns <strong>de</strong> percurso, qual coro, vão<br />
anunciando, e uma boa intriga não<br />
esteja à altura <strong>de</strong> um Eurípe<strong>de</strong>s:<br />
Fernando, cujo pai ele cria ter<br />
morrido, era afinal um tio.<br />
Tanto este romance, como a<br />
novela, assim como em muitas<br />
outras obras maiores (e na própria<br />
vida real do autor) testemunham<br />
algo que é constante no autor (<strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />
“Vagão J”) : a figura masculina e do<br />
pai ser psicologicamente mal<br />
resolvida (não confundir com<br />
ficcionalmente). Os pais nunca<br />
conseguem transmitir o legado<br />
simbólico aos filhos, há sempre<br />
tensão.<br />
A edição da Obra Completa <strong>de</strong><br />
Vergílio Ferreira é <strong>de</strong> aplaudir.<br />
Sobretudo por especialistas ou<br />
investigadores em crítica genética,<br />
que po<strong>de</strong>riam porém consultá-la<br />
“online”. Para um público menos<br />
minoritário, não seria mais profícuo,<br />
em termos <strong>de</strong> divulgação e<br />
inteligência do autor, reeditar em<br />
paralelo, ou alternância, as obras<br />
maiores talvez prefaciadas por<br />
autores capazes <strong>de</strong> as iluminarem?<br />
Maria da Conceição Caleiro<br />
Poesia<br />
Duas vezes<br />
nada<br />
Antologia <strong>de</strong> uma poesia<br />
niilista. Pedro Mexia<br />
A Última Porta<br />
Manuel <strong>de</strong> Freitas<br />
Assírio & Alvim<br />
mmmmn<br />
Dez anos e 20<br />
títulos <strong>de</strong>pois<br />
(incluindo<br />
“plaquettes” e<br />
colectâneas<br />
confi<strong>de</strong>nciais),<br />
temos enfim uma<br />
substancial<br />
antologia <strong>de</strong><br />
Manuel <strong>de</strong> Freitas, o mais<br />
48 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Mestrado em Ciências da Comunicação (5 especializações)<br />
Comunicação, Organização e Li<strong>de</strong>rança<br />
Media e Jornalismo<br />
Internet e Novos Media<br />
Comunicação e Gestão Cultural<br />
Comunicação, Marketing e Publicida<strong>de</strong><br />
Mestrado em Ciências da Família (3 especializações)<br />
Políticas <strong>de</strong> Família<br />
Orientação e Mediação Familiar<br />
Contextos Familiares <strong>de</strong> Risco<br />
2010/2011<br />
Secretariado<br />
Mestrado em Estudos <strong>de</strong> Cultura - integrado na Re<strong>de</strong> THE LISBON CONSORTIUM*<br />
Estudos <strong>de</strong> Cultura<br />
Performance e Criativida<strong>de</strong> NOVO<br />
*em parceria com várias instituições culturais da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>.<br />
Mestrado em Línguas Estrangeiras Aplicadas:<br />
TEFL (Teaching English as a Foreign Language)<br />
Business and Languages - Línguas e Negócios NOVO<br />
Mestrado em Tradução NOVO<br />
Mestrado em Serviço Social (2 especializações)<br />
Serviço Social<br />
Acompanhamento Social e Inserção<br />
Mestrado em Filosofia (3 especializações)<br />
Filosofia da Linguagem e Ciências Cognitivas<br />
Estética e Filosofia da Arte NOVO<br />
Filosofia Ibérica<br />
<br />
Doutoramento em Ciências da Comunicação<br />
Doutoramento em Estudos <strong>de</strong> Cultura - integrado na Re<strong>de</strong><br />
THE LISBON CONSORTIUM*<br />
*em parceria com várias instituições culturais da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong><br />
Doutoramento em Serviço Social<br />
Cristina Nunes e Ana Morais | Tel: 217214194 | 217214202<br />
Email: cnunes@fch.lisboa.ucp.pt | amorais@fch.lisboa.ucp.pt<br />
www.fch.lisboa.ucp.pt
Livros<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
Isabel<br />
Coutinho<br />
“Casca <strong>de</strong> banana não<br />
é tão ruim como a<br />
gente pensa”<br />
Moacyr Scliar<br />
http://scliar.org/<br />
moacyr/<br />
Moacyr Scliar no<br />
Twitter<br />
http://twitter.<br />
com/moacyr_<br />
scliar<br />
Ciberescritas<br />
De pai para filho,<br />
<strong>de</strong> filho para pai<br />
Lembrei-me <strong>de</strong>sta história quando <strong>de</strong>scobri o novo<br />
“site” do escritor brasileiro Moacyr Scliar que está<br />
a ser feito pelo seu filho. Ele contou-a há uns anos<br />
no Correntes d’Escritas, o encontro literário <strong>de</strong><br />
escritores <strong>de</strong> expressão ibérica na Póvoa <strong>de</strong><br />
Varzim. Nunca mais a esqueci. É uma lição <strong>de</strong> literatura.<br />
Numa tar<strong>de</strong> na Póvoa, o autor <strong>de</strong> “A mulher que<br />
escreveu a Bíblia” (ed. Livros <strong>de</strong> Seda) contou que o seu<br />
pai emigrou para um país <strong>de</strong>sconhecido quando tinha<br />
<strong>de</strong>z anos. Saiu da Rússia no período da guerra civil que<br />
se seguiu a 1917, meteu-se num navio em direcção ao<br />
Brasil, atravessou o oceano e foi parar ao Rio Gran<strong>de</strong> do<br />
Sul.<br />
Não fazia a mínima i<strong>de</strong>ia do que o esperava. Chegou<br />
a um país completamente <strong>de</strong>sconhecido mas isso não<br />
o impedia <strong>de</strong> ver o Brasil como uma coisa maravilhosa.<br />
Sonhava com o clima ameno, com um país <strong>de</strong> gente<br />
amável e com as frutas. Nunca tinha visto um abacaxi,<br />
nunca tinha visto uma manga, nunca tinha visto uma<br />
banana. E foi apresentado a uma banana, exactamente<br />
no dia em que chegou a Porto Alegre.<br />
Quando embarcou, o pai <strong>de</strong> Moacyr já era “um<br />
menino magrinho”. No barco passou fome, ficou um<br />
esqueleto. E quando finalmente o navio atracou na<br />
cida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sembarcou. A população inteira <strong>de</strong> Porto<br />
Alegre estava no cais à espera do barco que trazia os<br />
europeus e um gaúcho percebeu que o pai <strong>de</strong> Moacyr<br />
tinha fome e ofereceu-lhe uma banana. “O meu pai<br />
imaginou que era uma coisa para comer. Mas não tinha<br />
sido treinado para comer banana e, como não falava<br />
português, ficou com perplexida<strong>de</strong> a mexer na banana”,<br />
disse o também médico Moacyr Scliar.<br />
Descobriu então que a banana se <strong>de</strong>scascava, tal como<br />
a laranja. Imaginou que seria igual e que teria também<br />
casca e caroços. “Ao <strong>de</strong>scascar a banana apareceu uma<br />
coisa que ele pensou que<br />
era o caroço da banana. E<br />
jogou fora o caroço. Comeu<br />
a casca <strong>de</strong> banana até ao fim<br />
para surpresa do gaúcho”,<br />
continuou o escritor a quem<br />
até morrer, já <strong>de</strong>pois dos 80<br />
anos, o pai disse sempre:<br />
“Casca <strong>de</strong> banana não é tão ruim como a gente pensa”.<br />
Para Moacyr Scliar, o escritor é “o emigrante que vê a<br />
banana e que come a casca” e a tarefa da literatura é<br />
“transformar o <strong>de</strong>sconhecido em magia”.<br />
No “site” que o seu filho Beto está a <strong>de</strong>senvolver na<br />
Internet ficamos a conhecê-lo melhor. Não só por causa<br />
das fotografias que mostram o escritor a trabalhar no seu<br />
escritório em frente ao computador, mas também pelo<br />
blogue on<strong>de</strong> têm sido colocados os textos e crónicas que<br />
tem publicado na imprensa brasileira. Não <strong>de</strong>ixem <strong>de</strong><br />
ler a crónica intitulada “Felicida<strong>de</strong> não se compra. Nem<br />
mesmo pela Internet”.<br />
Pouco a pouco está a ser disponibilizado material<br />
<strong>de</strong> arquivo sobre o escritor e querem mostrar também<br />
ví<strong>de</strong>os das suas conferências. Numa das secções é<br />
possível enviar mensagens para o escritor. Noutra po<strong>de</strong>m<br />
ler-se citações das críticas aos seus livros, consultar o seu<br />
currículo, ler algumas entrevistas (ao jornal “Estado <strong>de</strong><br />
Minas”, à Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul e à<br />
revista “Época”), <strong>de</strong>ixar mensagens no Livro <strong>de</strong> Visitas e<br />
ver as capas e as <strong>de</strong>scrições dos seus livros. Criaram uma<br />
conta no Twitter on<strong>de</strong> se anunciam as novida<strong>de</strong>s que<br />
vão colocando no “site”.<br />
isabel.coutinho@publico.pt<br />
(Ciberescritas também é um blogue http://blogs.publico.pt/<br />
ciberescritas)<br />
“influente” e “polémico” poeta da<br />
sua geração, aspas nessas palavras<br />
tão equívocas. O seu amigo José<br />
Miguel Silva escolheu textos que vão<br />
das colectâneas “Todos Contentes e<br />
Eu Também” (2000) a “Boa Morte”<br />
(2008). É uma antologia<br />
assumidamente pessoal, que talvez<br />
sobre-represente os primeiros livros<br />
e tenha poucos poemas <strong>de</strong> obras<br />
maiores como “Beau Séjour” (2003).<br />
Des<strong>de</strong> 2000 que Manuel <strong>de</strong><br />
Freitas vem apresentando (e<br />
<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo, em textos críticos) uma<br />
poesia que po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>finir como<br />
niilista. Não é um niilismo <strong>de</strong><br />
programa, mas <strong>de</strong> impulso, embora<br />
em alguns momentos Freitas resvale<br />
para o moralismo dos<br />
“intransigentes”. Estes poemas só<br />
acreditam no álcool, na música e na<br />
morte. A “vida”, essa, é uma coisa<br />
que se suporta, e mal, entre copos,<br />
canções e dias <strong>de</strong>scontados. Manuel<br />
<strong>de</strong> Freitas começou por assumir um<br />
pose mais ultra-romântica, mas esse<br />
<strong>de</strong>feito atenuou-se, e agora acreditase<br />
mais naquele cansaço<br />
antiquíssimo, naquela inexorável<br />
tristeza, naquele gosto pela <strong>de</strong>rrota.<br />
Não esperem consolação da poesia:<br />
aqui não se acredita em <strong>de</strong>uses,<br />
i<strong>de</strong>ologias, mitos salvíficos. Nem se<br />
acredita no sublime estético, pelo<br />
menos na poesia, arte marginal, que<br />
caiu na sarjeta, e lá continua,<br />
agra<strong>de</strong>cendo que não a incomo<strong>de</strong>m.<br />
A divisão <strong>de</strong> águas é nítida. Basta<br />
pensar que ainda vigora em altas<br />
esferas um entendimento<br />
tonitruante, junqueiriano, do que é<br />
a poesia. Não esperem essa pompa<br />
<strong>de</strong> uma geração que acredita em<br />
pouco ou nada e que tem à sua<br />
frente a crónica <strong>de</strong> vidas<br />
quotidianas. Freitas especializou-se,<br />
como diz a dado passo, nos<br />
“antónimos da beleza”, e muitos<br />
<strong>de</strong>stes poemas são como andar por<br />
<strong>Lisboa</strong> <strong>de</strong> madrugada, após uma<br />
noite <strong>de</strong> boémia. Detritos, eis o que<br />
mais há nestes poemas, <strong>de</strong>tritos <strong>de</strong><br />
coisas e <strong>de</strong> gente.<br />
A taberna, até pelo seu quase<br />
arcaísmo, foi <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início o sítio <strong>de</strong><br />
on<strong>de</strong> Freitas quis ver o mundo.<br />
Entre velhotes gastos, passadores <strong>de</strong><br />
droga, mulheres da rua, intelectuais<br />
<strong>de</strong> terceira, ven<strong>de</strong><strong>de</strong>iras quase<br />
mitológicas, entre balcões<br />
gordurosos, tédio, jogatana, “a<br />
apagada e vil cerveja”. A taberna é<br />
um abrigo, mas é também um<br />
encosto, lugar <strong>de</strong> observação e não<br />
<strong>de</strong> acção, e sobretudo lugar <strong>de</strong><br />
esquecimento, como naquelas<br />
noites <strong>de</strong> estupor alcoólico que<br />
Freitas inveja às cida<strong>de</strong>s nórdicas.<br />
Como se disse, pelas tabernas e<br />
<strong>de</strong>mais estabelecimentos passa gente<br />
concreta, e Freitas suspen<strong>de</strong> o<br />
<strong>de</strong>sprezo geral que tem pela<br />
humanida<strong>de</strong>, a ponto <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar<br />
verda<strong>de</strong>ira empatia por essa fauna<br />
que arrasta a vidinha como códigos<br />
<strong>de</strong> barras. Se nalguns momentos a<br />
vida é <strong>de</strong>scrita nestes poemas com<br />
asco, como assunto <strong>de</strong> “procriação” e<br />
Manuel <strong>de</strong> Freitas: os seus<br />
poemas só acreditam no<br />
álcool, na música e na morte<br />
“taxas <strong>de</strong> juro”, também é visível que<br />
as existências difíceis comovem o<br />
poeta. O que ele não suporta é tudo<br />
aquilo a que associamos com a vida<br />
“burguesa”, embora as suas<br />
inclinações anarquizantes o levem a<br />
supor, erradamente, que a<br />
procriação e as taxas <strong>de</strong> juro sejam<br />
um assunto que apenas diz respeito à<br />
burguesia.<br />
Porque é que um niilista escreve?<br />
Eis um poema logo do primeiro<br />
livro: “A noite passou, sem sono nem<br />
alegria. / E eu esqueci-me <strong>de</strong> lavar a<br />
louça / e <strong>de</strong> encontrar um sentido<br />
para a vida / (truque poético<br />
bastante conhecido). / O amor não<br />
bateu à porta com as suas mãos /<br />
frágeis e <strong>de</strong>sonestas, nenhum amigo<br />
/ — <strong>de</strong>sses que não tenho — quis<br />
ludibriar / a sua solidão bebendo um<br />
copo comigo. / Limitei-me a folhear<br />
alguns livros, / com o cansaço prévio<br />
<strong>de</strong> saber / que os vou ler. Pus em dia<br />
a correspondência / cada vez mais<br />
escassa, ofício <strong>de</strong> afectos / fingidos,<br />
calculados silêncios, fórmulas /<br />
feitas. E ouvi música <strong>de</strong>solada, que /<br />
é a parte <strong>de</strong> Deus que melhor<br />
conheço” (pág. 35).<br />
Quem não aprecia a poesia <strong>de</strong><br />
Freitas, insiste habitualmente no<br />
eterno retorno a esta angústia, a este<br />
vazio, àquilo a que o próprio poeta<br />
chama “duas vezes nada”.<br />
Mas esse retrato é incompleto e<br />
erróneo. Basta lermos com atenção.<br />
Quando escreve sobre discos ou<br />
concertos, por exemplo, Freitas<br />
recupera a crença no sublime: “a<br />
música tem sempre razão”. E a<br />
amiza<strong>de</strong>? Poucos poetas elogiam<br />
tanto a amiza<strong>de</strong> como Freitas, tanto<br />
nos versos como nas<br />
abundantíssimas <strong>de</strong>dicatórias.<br />
Também as evocações familiares<br />
respiram afecto, no retrato <strong>de</strong><br />
personagens perdidas no passado,<br />
marcantes, rústicas, carismáticas,<br />
tristes, como o avô: “É aqui que as<br />
palavras faltam, irremediavelmente. /<br />
Abraçava-o por razão nenhuma /<br />
numa tar<strong>de</strong> igual às outras. /<br />
Estávamos todos na sala, / numa sala<br />
tão diferente / daquela em que mais<br />
gosto <strong>de</strong> o ver, / em jeito <strong>de</strong> plácido<br />
arquiduque. / Fotografia <strong>de</strong> autor<br />
DAVID CLIFFORD/ARQUIVO<br />
<strong>de</strong>sconhecido, / princípios do século<br />
passado. / Acabara talvez <strong>de</strong> ler em<br />
francês / as aventuras e <strong>de</strong>sventuras /<br />
dos filhos do capitão Grant” (pág.<br />
84). Os familiares tiveram “um<br />
enredo banal: morreram”, mas <strong>de</strong>les<br />
ficou obviamente mais do que esse<br />
“entulho do passado” <strong>de</strong> que o poeta<br />
tanto se queixa, ficou uma memória<br />
que se confun<strong>de</strong> com a própria<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. E finalmente, apesar <strong>de</strong><br />
todo o nojo pela juventu<strong>de</strong>, o niilista<br />
está apaixonado e escreve poemas à<br />
sua amada.<br />
Voltamos então à pergunta:<br />
porque é que um niilista escreve?<br />
Porque a morte é a última palavra<br />
mas não é única palavra. E se a<br />
“literatura” é vã, inútil, um pouco<br />
ridícula, a poesia não é, a poesia vale<br />
alguma coisa. E vemos como, texto<br />
após texto, Freitas fala daquele<br />
poema que está a escrever naquele<br />
momento, e assim confessa que a<br />
escrita é a única possibilida<strong>de</strong>.<br />
Possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quê? De uma<br />
comunicação directa, prosaica,<br />
genuína, vivida, através <strong>de</strong> uma<br />
linguagem que contraria a estética<br />
da dificulda<strong>de</strong>, porque difícil é a<br />
vida, e dizê-la com as palavras certas<br />
é tudo o que temos da felicida<strong>de</strong>.<br />
Dança<br />
Notas <strong>de</strong><br />
rodapé<br />
Uma biografia que é um<br />
diário que é um relato e não<br />
diz mais do que já sabíamos<br />
sobre Pina Bausch. Tiago<br />
Bartolomeu Costa<br />
Pina Bausch – Sentir mais<br />
Claudia Galhós<br />
D. Quixote<br />
mnnnn<br />
Num país que não<br />
tem prática regular<br />
<strong>de</strong> edições sobre<br />
criação<br />
contemporânea, o<br />
primeiro<br />
aniversário da<br />
morte <strong>de</strong> Pina<br />
Bausch afigurava-se<br />
como a oportunida<strong>de</strong> indicada para<br />
o mercado dar, em português,<br />
matéria que registasse o papel da<br />
coreógrafa alemã na história<br />
recente.<br />
Da imensa bibliografia disponível<br />
para ser traduzida, a aposta foi num<br />
“ensaio biográfico” <strong>de</strong> Claudia<br />
Galhós, jornalista do “Expresso”,<br />
que <strong>de</strong>cidiu acelerar o seu<br />
“profundo <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> reinventar as<br />
relações humanas, <strong>de</strong>senhando<br />
sucessivos esboços, na crença e na<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vivermos juntos”<br />
50 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
(p. 9), e fazer “Pina Bausch – Sentir<br />
Mais”, 279 páginas <strong>de</strong> um olhar<br />
pessoal sobre alguém com quem<br />
contactou fugazmente (“consegui<br />
que me pronunciasse umas palavras<br />
num camarim em 1998”, p. 277).<br />
A autora esclarece que este relato<br />
“<strong>de</strong>corre ao sabor irregular <strong>de</strong> uma<br />
experiência amorosa, em que ao<br />
amor caberá o período mais longo da<br />
nossa existência.” (p. 278). É o<br />
justificativo necessário para não<br />
esperarmos <strong>de</strong>ste livro uma biografia,<br />
mas um percurso, pessoal e limitado<br />
— porque <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do olhar <strong>de</strong><br />
quem escreve — do que pensa que<br />
sabe sobre Pina Bausch. Há aqui uma<br />
tentativa <strong>de</strong> compreensão do método<br />
<strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> alguém que dizia não<br />
ter técnica (p. 125), usando a autora a<br />
emoção e a sua sensibilida<strong>de</strong> para<br />
<strong>de</strong>screver o que sentiu, ou o que<br />
<strong>de</strong>veríamos ter sentido. Com, e por<br />
Pina, diz Galhós, “<strong>de</strong>ambulamos por<br />
entre as nuvens do ver e do ouvir, em<br />
percursos <strong>de</strong> ilusão on<strong>de</strong> a utopia<br />
ainda é possível” (p. 262), ela que<br />
“com a mesma discrição, sem se<br />
fazer notar como revolução, ganha<br />
um corpo e um comportamento que<br />
põem em causa as estruturas mas<br />
basilares da socieda<strong>de</strong>, do indivíduo<br />
e da arte” (p. 27).<br />
Será aqui, neste território<br />
especulativo, que Claudia Galhós vai<br />
encontrar matéria para preencher<br />
um livro que não acrescenta nada <strong>de</strong><br />
novo ao que já sabíamos sobre Pina<br />
Bausch. E nem sequer me refiro aos<br />
especialistas, <strong>de</strong> cada vez que Pina<br />
veio a <strong>Lisboa</strong> repetiram-se as<br />
mesmas imagens feitas da violência<br />
transformada em poesia, dos corpos<br />
suspensos, da imagem que projecta<br />
e recebe, da luminosida<strong>de</strong> dos seus<br />
movimentos, na capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pina<br />
em tocar “na essência da alma<br />
humana” (p. 27).<br />
Generalizações agora exacerbadas<br />
sem a reflexão que <strong>de</strong>veria respeitar<br />
um discurso que se foi completando<br />
e, como a própria autora emana <strong>de</strong><br />
alguém que “nunca foi dócil ou<br />
conformada. E não se queira agora<br />
reduzir a uma coisa só” (p. 207). E,<br />
no entanto, Galhós reduz Bausch ao<br />
grau zero da criticalida<strong>de</strong>, rejeitando<br />
um olhar que não esteja viciado pela<br />
i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sobre ele<br />
falar (não falta a imagem gasta <strong>de</strong><br />
que não se po<strong>de</strong> fazer poesia <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> Auschwitz), sobretudo <strong>de</strong>pois da<br />
morte.<br />
Dividido, no essencial, em três<br />
partes — “Primeiras impressões”,<br />
“Namoro” e “Amor” —, o texto, feito<br />
<strong>de</strong> brevíssimos capítulos com títulos<br />
igualmente programáticos que<br />
nunca esclarecem o que os<br />
singulariza (por exemplo: “Acto <strong>de</strong><br />
fé”, “Noite <strong>de</strong>ntro”, “Conta-me a tua<br />
história”, “A menina dança”, “Elogio<br />
da insegurança”...), vagueia por<br />
entre algumas obras <strong>de</strong> Bausch,<br />
fazendo das que foram apresentadas<br />
em <strong>Lisboa</strong> (12 <strong>de</strong> um total <strong>de</strong> 45) o<br />
essencial da sua obra, à qual junta<br />
mais meia dúzia, sem nunca se<br />
perceber se a autora as viu ou se<br />
relata a partir do que leu.<br />
Este é o problema principal <strong>de</strong><br />
uma obra monocórdica, <strong>de</strong> escrita<br />
confusa e errante, sem memória e<br />
repetitiva, que se coloca a um nível<br />
para o qual não tem altura, e<br />
substituindo a distância que se <strong>de</strong>ve<br />
ter em relação às obras, <strong>de</strong> modo a<br />
po<strong>de</strong>r dialogar com o seu discurso,<br />
por uma <strong>de</strong>terminação tão obstinada<br />
como tocante (como o são todas as<br />
paixões cegas). “Cada um respon<strong>de</strong> a<br />
cada estímulo com uma resposta,<br />
que a seu modo dá sentido àquilo<br />
que está a ver” (p. 85), <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>-se a<br />
autora.<br />
Não é porque Claudia Galhós não<br />
saiba, mas é porque, <strong>de</strong> cada vez que<br />
acha que expõe um lado mais crítico,<br />
daí <strong>de</strong>corre uma ausência <strong>de</strong><br />
emoção. “A crítica, propriamente<br />
dita, para além <strong>de</strong> ser praticamente<br />
uma miragem na actualida<strong>de</strong>, se<br />
disponibiliza um olhar julgador<br />
sobre as suas impressões do mundo,<br />
na postura arrogante <strong>de</strong> senhora da<br />
verda<strong>de</strong>, está a negar o sentido<br />
profundamente humano e complexo<br />
da própria natureza da obra <strong>de</strong> Pina”<br />
(p. 89). Pina, diz a autora, activava<br />
“reflexos interiores <strong>de</strong><br />
redistribuição, como imagem<br />
reflectida <strong>de</strong> espelho, <strong>de</strong>liciosamente<br />
distorcida pela vivência interior<br />
<strong>de</strong>sses mesmos estímulos” (p. 85), e,<br />
por isso, Galhós acha que as suas<br />
obras escapam “à nossa<br />
compreensão, escapam ao mo<strong>de</strong>lo<br />
<strong>de</strong>finido <strong>de</strong> como viver nesta era da<br />
imagem e da reproductibilida<strong>de</strong>” (p.<br />
235).<br />
Galhós prefere impor-se à obra <strong>de</strong><br />
Bausch, ao que ela diz, numa<br />
tentativa <strong>de</strong> interpretação obcecada<br />
pela paixão, sugerindo<br />
interpretações acríticas e sectárias.<br />
Não sentir profundamente a obra <strong>de</strong><br />
Bausch significa “querer<br />
continuar a ser<br />
ignorante”<br />
(p.112), é<br />
produzir<br />
uma<br />
“reacção<br />
frustrada”<br />
(p. 179),<br />
“seria a<br />
mais<br />
triste<br />
forma <strong>de</strong><br />
cegueira, a<br />
que não quer<br />
ver, cobar<strong>de</strong>”<br />
(p. 207), é, em<br />
suma, “não a<br />
perceber” (p. 235).<br />
Mais: é recusar o<br />
convite a “a abandonar a<br />
sua posição <strong>de</strong> alheado do<br />
que está a acontecer”, porque<br />
o espectador “é convidado a<br />
reclamar mais para si do<br />
que esta evasão para um<br />
mundo <strong>de</strong> fingimento,<br />
on<strong>de</strong> existe em estado comatoso,<br />
que se limita a prolongar o papel <strong>de</strong><br />
espectador que vive no seu<br />
quotidiano” (p. 117).<br />
Consi<strong>de</strong>rando o seu conhecimento<br />
sobre a matéria — exposto nas<br />
<strong>de</strong>rivações teóricas que faz sobre o<br />
teatro pós-dramático, a dançateatral,<br />
a importância da<br />
dramaturgia, a geneologia<br />
coreográfica —, só se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar<br />
como uma oportunida<strong>de</strong> perdida<br />
uma obra que se escon<strong>de</strong> atrás <strong>de</strong><br />
uma paixão. E, atrás <strong>de</strong>ssa paixão,<br />
um esforço hercúleo para aguentar o<br />
que não <strong>de</strong>veria ter sido mais do que<br />
um obituário, ainda que extenso,<br />
numa edição especial <strong>de</strong> um jornal.<br />
Sendo um diário, e por isso,<br />
pessoal, é certo que este livro não se<br />
obriga ao rigor académico que<br />
sujeitam as biografias à confirmação<br />
dos factos e menos, ainda, ao brio<br />
jornalístico que <strong>de</strong>ve caracterizar<br />
quem é profissional do meio. E, no<br />
entanto, nunca em momento algum<br />
a autora nos faz esquecer que é<br />
jornalista e que esse olhar guia o<br />
livro e, na verda<strong>de</strong>, dá os melhores<br />
momentos <strong>de</strong>le, mesmo que<br />
enfermados pelo mesmo estilo<br />
melado e con<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte — as<br />
relações do universo <strong>de</strong> Pina com os<br />
criadores nacionais; o relato da<br />
experiência em <strong>Lisboa</strong> para<br />
“Masurca Fogo”, as memórias <strong>de</strong><br />
alguns bailarinos — ou seja, quando<br />
Claudia Galhós <strong>de</strong>ixa que sejam os<br />
outros a falar. Porque, sendo patente<br />
— pelas citações usadas e pela<br />
<strong>de</strong>scrição da própria autora — que o<br />
seu contacto directo com a<br />
coreógrafa foi fugaz, para não dizer<br />
nulo, espanta que Galhós queira<br />
sustentar 279 páginas em <strong>de</strong>rivações<br />
poéticas, respigando citações<br />
avulsas, sempre secundárias na sua<br />
visão, e ignorando outras (a conversa<br />
<strong>de</strong> duas horas que Bausch teve<br />
com o público aquando da<br />
sua presença em 2007<br />
em <strong>Lisboa</strong>, no Teatro<br />
Camões — coisa que<br />
nunca fez nas<br />
suas outras seis<br />
vezes — é<br />
ignorada, o<br />
que teria<br />
poupado à<br />
autora a<br />
permanente<br />
citação das<br />
mesmas<br />
fontes).<br />
As<br />
fontes<br />
Pina Bausch por Cláudia Galhós: só se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar como uma<br />
oportunida<strong>de</strong> perdida uma obra que se escon<strong>de</strong> atrás <strong>de</strong> uma paixão<br />
usadas são pobres e limitadas,<br />
servindo apenas para caucionar os<br />
objectivos da obra e não para<br />
ampliarem o discurso <strong>de</strong> Bausch. No<br />
essencial, o olhar <strong>de</strong> Galhós ignora o<br />
vasto corpo coreográfico <strong>de</strong> Pina, os<br />
contextos por on<strong>de</strong> ela se<br />
movimentou e as comparações com<br />
outras escolas que surgiram e com<br />
quem Pina dialogou, mesmo que as<br />
recusasse ou <strong>de</strong>las se distanciasse.<br />
Ignora ainda as diversas pontes no<br />
interior da obra <strong>de</strong> Bausch (e daí<br />
remontagens que implicavam<br />
alterações), nunca questionando,<br />
por exemplo, a importância da série<br />
<strong>de</strong> peças sobre cida<strong>de</strong>s, sobretudo<br />
nos seus aspectos <strong>de</strong> produção, ela<br />
que nunca os ignorou e a eles sempre<br />
procurou respon<strong>de</strong>r. É vaga também<br />
na análise do isolamento <strong>de</strong> Pina,<br />
refugiando-se sempre na sua<br />
extrema sensibilida<strong>de</strong>, e aceitando<br />
ser vista como uma esfinge em vez<br />
“da mulher-artista das palavras<br />
dançadas e não ditas” (p.177).<br />
Sabe-se que às obras dos artistas<br />
maiores se tenta sempre colar uma<br />
poética que fica sempre aquém do<br />
objecto, num exercício <strong>de</strong> colagem<br />
patética que limita a recepção da<br />
obra à capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reacção e<br />
retórica. Um exemplo, apenas, diz<br />
bem da ligeireza da abordagem<br />
proposta neste livro: sobre a<br />
revolução proposta por Pina, a<br />
jornalista diz que a coreógrafa<br />
“<strong>de</strong>sfaz-se <strong>de</strong>sse corpo artificial,<br />
mentiroso, impositivo <strong>de</strong> padrões <strong>de</strong><br />
beleza impossíveis — tal como a<br />
Barbie o fez mais tar<strong>de</strong> — e <strong>de</strong> uma<br />
suposta perfeição que projecta esse<br />
ser leve no ar” (p. 105).<br />
Não estando cá para se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r, e<br />
não havendo matéria directa <strong>de</strong><br />
contraponto, este livro maniqueísta<br />
corre o risco <strong>de</strong> se tornar uma<br />
referência. Se ao menos, como<br />
escreveu o seu marido, se aceitasse<br />
que “a obra <strong>de</strong> Pina Bausch vive e<br />
morre com ela” (p. 234), este livro<br />
po<strong>de</strong>ria fazer as vezes <strong>de</strong> um<br />
exercício <strong>de</strong> reflexão sobre o seu<br />
legado em vez <strong>de</strong> um penoso <strong>de</strong>sfiar<br />
<strong>de</strong> memorias secundárias e<br />
projectadas, a maior parte <strong>de</strong>las<br />
especulativas, a maior parte <strong>de</strong>las<br />
pequenas notas <strong>de</strong> rodapé.<br />
SÃO<br />
LUIZ<br />
TEATRO MUNICIPAL<br />
Está aberto o concurso para<br />
Direcção Artística do<br />
São Luiz Teatro <strong>Municipal</strong><br />
As candidaturas para a Direcção Artística do São Luiz<br />
Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong>vem ser realizadas até às 18h<br />
do dia 20 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 2010. Todos os candidatos<br />
<strong>de</strong>vem proce<strong>de</strong>r obrigatoriamente à sua inscrição<br />
na plataforma electrónica www.vortalgov.pt.<br />
Passos para a Inscrição em www.vortalgov.pt<br />
Quero A<strong>de</strong>rir > Vantagens Universais (Gratuito) > Plataforma electrónica<br />
<strong>de</strong> contratação Pública (A<strong>de</strong>rir Já) > Preencher Ficha <strong>de</strong> A<strong>de</strong>são (1 a 6)<br />
(Browser preferencial para a inscrição na plataforma: Internet Explorer).<br />
Os candidatos <strong>de</strong>verão proce<strong>de</strong>r à inscrição no<br />
site com a maior brevida<strong>de</strong> possível e associar a<br />
sua inscrição à seguinte <strong>de</strong>signação do contrato:<br />
“Prestação <strong>de</strong> Serviços <strong>de</strong> Direcção Artística do<br />
São Luiz Teatro <strong>Municipal</strong>”.<br />
O Júri do concurso é composto pelos seguintes elementos:<br />
Presi<strong>de</strong>nte – Miguel Honrado;<br />
Vogal – Ana Marin;<br />
Vogal – António Pinto Ribeiro;<br />
Vogal – Emmanuel Demarcy Mota;<br />
Vogal – Pedro Burmester.<br />
As condições específicas do concurso po<strong>de</strong>m ser consultadas em:<br />
www.egeac.pt<br />
www.teatrosaoluiz.pt<br />
Todas as questões relacionadas com o concurso <strong>de</strong>verão ser<br />
formuladas por escrito e enviadas para:<br />
concursosaoluiz@egeac.pt<br />
EGEAC – Empresa <strong>de</strong> Gestão <strong>de</strong> Equipamentos e Animação Cultural Tel: 218 820 090<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 51
Teatro/Dança<br />
NUNO OLIVEIRA<br />
As Danças Macabras eram uma forma popular <strong>de</strong> esconjurar o fim<br />
A morte<br />
<strong>de</strong> frente<br />
A encenadora Ana Zamora<br />
celebra a vida com as danças<br />
medievais criadas para<br />
esconjurar a morte. Ana<br />
Dias Cor<strong>de</strong>iro<br />
Dança da morte/Dança <strong>de</strong> la<br />
muerte<br />
Encenação <strong>de</strong> Ana Zamora.<br />
Com Luís Miguel Cintra, Sofia<br />
Marques, Elena Rayos, Eva Jornet,<br />
Juan Ramón Lara, Isabel Zamora<br />
<strong>Lisboa</strong>. Teatro do Bairro Alto/Cornucópia.<br />
Sáb., 2ª e 3ª, às 21h30. Dom., 11, às 17h00.<br />
A relação do teatro com o rito<br />
interessa especialmente a Ana<br />
Zamora. A encenadora e fundadora<br />
da companhia in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />
espanhola Nao d’Amores apresenta<br />
“Dança da Morte/Dança <strong>de</strong> la<br />
Muerte”, uma produção conjunta<br />
com o Teatro da Cornucópia, on<strong>de</strong> a<br />
peça está <strong>de</strong>s<strong>de</strong> terça-feira e até dia<br />
13 <strong>de</strong> Julho. É uma das estreias na<br />
edição do Festival <strong>de</strong> Almada e o<br />
título bilingue tem razão <strong>de</strong> ser.<br />
Explica-se pela cultura comum<br />
ibérica encontrada na simbologia da<br />
Ida<strong>de</strong> Média e do início do<br />
Renascimento à volta dos ritos da<br />
morte, explica a encenadora.<br />
Neste olhar <strong>de</strong> frente o absurdo da<br />
morte, Ana Zamora vai procurar,<br />
como em peças anteriores, o lado<br />
ancestral da teatralida<strong>de</strong> e recriar o<br />
espírito <strong>de</strong> uma época. Através do<br />
estudo e da investigação das<br />
reminiscências que ficaram nas<br />
expressões artísticas e populares<br />
<strong>de</strong>sse tempo, Zamora tenta<br />
“enten<strong>de</strong>r o espírito medieval e<br />
renascentista e recriar uma visão<br />
contemporânea”. Mas nunca com a<br />
intenção <strong>de</strong> reproduzir a sua<br />
estética.<br />
O resultado: “Um teatro<br />
puramente contemporâneo, <strong>de</strong> hoje<br />
e para o público <strong>de</strong> hoje”, acrescenta<br />
a encenadora. Mas certo é que os<br />
textos, as danças com coreografia <strong>de</strong><br />
Javier Garcia Ávila e a música tocada<br />
com réplicas <strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong><br />
época (viola <strong>de</strong> gamba, fídula, mas<br />
também flauta, órgão e percussão)<br />
transportam o espectador para esse<br />
universo.<br />
Os textos <strong>de</strong> Gil Vicente e <strong>de</strong><br />
anónimos do século XV e XVI,<br />
associados ao texto castelhano<br />
“Dança General <strong>de</strong> la Muerte”<br />
(século XV) são interpretados em<br />
castelhano antigo e um pouco em<br />
português antigo.<br />
Todos — <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mais po<strong>de</strong>roso,<br />
como o rei ou o Papa, ao<br />
representante mais humil<strong>de</strong> do povo<br />
— passam por ela, a morte, aqui<br />
personificada por uma só figura, o<br />
actor Luís Miguel Cintra. E encaramna,<br />
não como um problema pessoal,<br />
mas “como um eixo da<br />
humanida<strong>de</strong>”, diz Zamora. “Há um<br />
entendimento da morte como uma<br />
aceitação espiritual global.”<br />
Não há aceitação da morte; há<br />
celebração da vida. “É uma dança da<br />
morte mas também é, na verda<strong>de</strong>,<br />
uma dança da vida”, continua.<br />
A todos, se dirige a morte: “A<br />
vossa vida é sonhar / Que a morte é<br />
<strong>de</strong>spertar / Para nunca mais dormir<br />
e acordar.”<br />
As Danças Macabras eram uma<br />
forma popular <strong>de</strong> esconjurar o fim, o<br />
ciclo da vida. Assumiram uma<br />
expressão literária e plástica, na<br />
música, na dança, no folclore,<br />
sobretudo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 1347, quando a<br />
peste se instalou na Europa e, em<br />
dois anos, dizimou um terço da<br />
população. Havia dança um pouco<br />
por todo o continente europeu, mas<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
na Península Ibérica tinham “um<br />
carácter específico e diferente” pelas<br />
“influências muçulmanas e judaicas”.<br />
Na peça, que regressa ao palco da<br />
Cornucópia (entre 30 <strong>de</strong> Setembro a<br />
17 <strong>de</strong> Outubro), <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> uma<br />
passagem pelos festivais <strong>de</strong> teatro<br />
clássico <strong>de</strong> Almagro e <strong>de</strong> Olmedo,<br />
em Espanha, participam intérpretes<br />
<strong>de</strong> ambas as companhias (Luís<br />
Miguel Cintra, Sofia Marques, Elena<br />
Rayos, Eva Jornet, Juan Ramón Lara,<br />
Isabel Zamora). Alguns músicos são,<br />
ao mesmo tempo, actores. Todos, a<br />
dado momento, entram na dança ou<br />
no rito. O palco recria um espaço<br />
litúrgico, com a assistência disposta<br />
em bancos corridos como se <strong>de</strong> um<br />
coro <strong>de</strong> uma catedral se tratasse.<br />
Sobre o chão axadrezado — como o<br />
da Catedral <strong>de</strong> Segóvia —<br />
<strong>de</strong>senrolam-se os ritos populares e<br />
as danças históricas. Ainda hoje se<br />
faz a dança em cruz na Catalunha<br />
(Quinta-Feira Santa), numa das<br />
últimas reminiscências do que<br />
po<strong>de</strong>m ter sido as Danças da Morte<br />
na Europa.<br />
Este Portugal<br />
está nos cuidados<br />
intensivos<br />
O Dia <strong>de</strong> Todos os Pescadores<br />
De Francisco Luís Parreira.<br />
Co-produção Assédio e TNSJ.<br />
Encenação <strong>de</strong> João Cardoso. Com<br />
João Cardoso, Jorge Mota, Micaela<br />
Cardoso, Pedro Frias, Rosa Quiroga.<br />
Porto. Teatro Carlos Alberto. R. das Oliveiras, 43. De<br />
15 a 31/07. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. 10€ a 15€.<br />
Num dia <strong>de</strong> eleições, Clara <strong>de</strong>siste<br />
do suicídio e <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> ir votar. Movida<br />
por uma espécie <strong>de</strong> epifania matinal,<br />
vai visitar o ex-marido moribundo,<br />
Edmundo, internado nos cuidados<br />
intensivos <strong>de</strong> um hospital. É este<br />
ex-marido — agonizante mas capaz<br />
<strong>de</strong> maldizer tudo e todos — que veste<br />
a pele <strong>de</strong> um país inteiro em “O Dia<br />
<strong>de</strong> Todos os Pescadores”, que estreia<br />
no Teatro Carlos Alberto a 15 <strong>de</strong><br />
Julho.<br />
Edmundo, personagem<br />
interpretada pelo próprio<br />
encenador, João Cardoso, está numa<br />
cama articulada <strong>de</strong> hospital,<br />
acompanhado por uma enfermeira<br />
e, num momento fulcral da peça,<br />
pela ex-mulher. Clara tinha vonta<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> ver o ex-marido porque, na sala<br />
<strong>de</strong> voto <strong>de</strong> uma escola qualquer,<br />
ro<strong>de</strong>ada <strong>de</strong> pessoas e sons,<br />
reencontra o sentido do ser<br />
português e quer partilhá-lo com<br />
Edmundo, no único espaço <strong>de</strong><br />
re<strong>de</strong>nção que o texto permite.<br />
Edmundo que é, na verda<strong>de</strong>,<br />
Portugal, há muito <strong>de</strong>sistiu dos<br />
sonhos. Sozinho no quarto asséptico<br />
e <strong>de</strong>vidamente apetrechado <strong>de</strong><br />
materiais hospitalares, faz<br />
comentários corrosivos e<br />
apreciações sarcásticas da realida<strong>de</strong>.<br />
Divorciado há seis anos, não<br />
consegue apoiar-se nas experiências<br />
felizes que viveu durante o<br />
casamento com Clara.<br />
“O Dia...” é, segundo Rosa<br />
Quiroga, a actriz que dá corpo a<br />
Clara, uma “história nossa”,<br />
importante no “parco panorama da<br />
dramaturgia portuguesa”,<br />
acrescenta João Cardoso, para quem<br />
foi um “privilégio” po<strong>de</strong>r contar<br />
com o autor — o poeta e dramaturgo<br />
Francisco Luís Parreira — em todo o<br />
processo <strong>de</strong> criação.<br />
A colaboração do dramaturgo com<br />
a Assédio começou há cinco anos,<br />
quando o autor traduziu Ossário, um<br />
texto <strong>de</strong> Mark O’Rowe. Des<strong>de</strong> aí que a<br />
cumplicida<strong>de</strong> entre o elenco da<br />
companhia e o dramaturgo foi<br />
crescendo, razão pela qual João<br />
Cardoso consi<strong>de</strong>ra ter sido possível<br />
esta “espécie <strong>de</strong> encomenda” que<br />
teve em consi<strong>de</strong>ração os actores que<br />
por norma trabalham nesta formação<br />
teatral. “O Dia <strong>de</strong> Todos os<br />
Pescadores” marca o regresso da<br />
Assédio às comédias, cruzando,<br />
garante Rosa Quiroga, os registos<br />
PAULO RICCA<br />
“O Dia <strong>de</strong> Todos os<br />
Pescadores” marca o<br />
regresso da Assédio às<br />
comédias<br />
52 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
ESTRUTURA APOIADA POR<br />
APOIO<br />
Demarcy-Mota leva<br />
“Casimiro e Carolina”<br />
ao Festival <strong>de</strong> Almada<br />
“Cabaret Hamlet” ou a<br />
reinvenção dos clássicos<br />
“As Formigas”<br />
NUNO FERREIRA SANTOS<br />
Luís Miguel Cintra: “A<br />
leitura em voz alta po<strong>de</strong><br />
ajudar as pessoas a<br />
enten<strong>de</strong>r a poesia”<br />
poético, sarcástico e até farsante,<br />
reflexo da “cabeça <strong>de</strong> poeta e <strong>de</strong><br />
filósofo” do autor, que opta por<br />
comprometer-se com o mundo<br />
contemporâneo, satirizando a<br />
portugalida<strong>de</strong>. Ana Maria<br />
Henriques<br />
Amor e melancolia<br />
As 10 Canções <strong>de</strong> Camões<br />
De Luís <strong>de</strong> Camões.<br />
Com Luís Miguel Cintra.<br />
Almada. Fórum <strong>Municipal</strong> Romeu Correia. 4ª, 14,<br />
às 19h.<br />
Quando o director do Festival <strong>de</strong><br />
Almada, Joaquim Benite, pediu a<br />
Luís Miguel Cintra um recital <strong>de</strong><br />
poesia portuguesa para a edição<br />
<strong>de</strong>ste ano, o actor pensou que era<br />
altura <strong>de</strong> tentar ler em público não o<br />
mais fácil, mas o mais difícil.<br />
Escolheu “As 10 canções <strong>de</strong> Luís <strong>de</strong><br />
Camões”. Na verda<strong>de</strong>, voltou a elas<br />
porque em 1995, a propósito das<br />
Comemorações dos<br />
Descobrimentos, tinha já gravado<br />
um disco com as <strong>de</strong>z canções <strong>de</strong><br />
amor, que são também <strong>de</strong><br />
melancolia. Quis regressar a elas<br />
também para as enten<strong>de</strong>r um pouco<br />
melhor, com o público.<br />
A dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta poesia mais<br />
elaborada <strong>de</strong> Camões e dos seus<br />
versos mais longos é parte do que<br />
fascina o actor, assim como a<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conduzir o público<br />
na leitura: “A leitura em voz alta<br />
po<strong>de</strong> ajudar as pessoas a<br />
enten<strong>de</strong>rem-na e a segui-la”.<br />
Mais do que a corrente que<br />
procura uma biografia <strong>de</strong> Camões a<br />
partir dos seus poemas, o que<br />
interessa a Luís Miguel Cintra é<br />
“como através do trabalho das<br />
palavras, rimas, e ritmos, se cria um<br />
sentimento que se confun<strong>de</strong> com<br />
um pensamento sobre a própria<br />
natureza humana”, como “se o<br />
poeta estivesse a <strong>de</strong>finir o que é<br />
viver, o que é a efemerida<strong>de</strong> da<br />
vida”.<br />
As <strong>de</strong>z canções transformam-se<br />
“numa música melancólica”. Nelas,<br />
Camões dirige-se à amada. “Mas<br />
sempre numa perspectiva <strong>de</strong><br />
intelectualização da tensão erótica,<br />
que é dissecada sob diferentes<br />
formas em cada um dos poemas.”<br />
Mais ainda do que isso: “Aquilo que<br />
faz sofrer o poeta é a mesma coisa<br />
que lhe faz ter prazer na distância<br />
entre a i<strong>de</strong>ia e a concretização, nessa<br />
tensão nunca realizada do <strong>de</strong>sejo. E<br />
isso toca-me muito.” Para o actor,<br />
tudo se traduz num “estado <strong>de</strong> alma<br />
que tem a ver com a relação do ser<br />
humano com conceitos como a<br />
passagem do tempo ou a pequenez<br />
do individual perante a totalida<strong>de</strong><br />
do mundo, e numa melancolia<br />
muito típica da arte daquela época e<br />
da poesia maneirista”.<br />
Com a extinção da Comissão<br />
Nacional para os Descobrimentos, o<br />
disco das “10 Canções” gravado em<br />
1995 <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> estar disponível. O<br />
recital, esse, será único (dia 14, pelas<br />
19 horas no Fórum Romeu Correia,<br />
em Almada). A preparação, ou<br />
ensaio, é um exercício solitário. “É<br />
mais fácil recriar isto sozinho numa<br />
sala <strong>de</strong> gravação do que perante o<br />
público que espera uma exibição.”<br />
E não é <strong>de</strong> uma exibição que se<br />
trata. Luís Miguel Cintra lê poesia<br />
num processo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação não<br />
da personagem, mas do autor.<br />
“Imagino que <strong>de</strong>ixo o público<br />
assistir ao que está a passar-se em<br />
mim.” Como no teatro. A.D.C.<br />
Agenda<br />
Estreiam<br />
27º Festival <strong>de</strong> Almada<br />
Letra M<br />
Em francês, legendado em português.<br />
Encenação: Fernando Mora Ramos.<br />
Com Johannes Von Saaz, João Vieira.<br />
Almada. Socieda<strong>de</strong> Filarmónica Incrível Alma<strong>de</strong>nse.<br />
R. Capitão Leitão,3. De 15/07 a 17/07. 5ª e 6ª às 19h.<br />
Sáb. às 16h. Tel.: 212750929. M/16.<br />
Um Precipício no Mar<br />
De Simon Stephens. Encenação: Jorge<br />
Silva Melo. Com João Meireles.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. R. Arco do Cego - Ed. da CGD. De<br />
15/07 a 18/07. 5ª às 19h30. 6ª e Sáb. às 19h30 e 23h.<br />
Dom. às 16h e 18h30. Tel.: 217905155.<br />
O Quarto (Escuro)<br />
Companhia: Athra e Compagnie.<br />
Encenação: Julie Binot. Com Béatrice<br />
Charon, Claire Fristot, Olivier Papot.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Inst. Franco-Português. Av. Luís Bívar, 91. De<br />
14/07 a 17/07. 4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 19h. Tel.: 213111400.<br />
Cabaret Hamlet<br />
Companhia: Théâtre Dijon-Bourgogne.<br />
Encenação: Matthias Langhoff. Com<br />
Agnès Dewitte, Anatole Koama,<br />
Charlie Nelson, Delphine Zingg,<br />
Emmanuelle Wion, François Chattot,<br />
Frédéric Kunze, Gilles Geenen, Jean-<br />
Marc Stehlé, Marc Barnaud, Osvaldo<br />
Caló, Patricia Pottier, Patrick<br />
Buoncristiani, Philippe Marteau.<br />
<strong>Lisboa</strong>. CCB. Pç. do Império. De 14/07 a 15/07. 4ª e 5ª<br />
às 19h. Tel.: 213612400. Em francês, legendado em<br />
português.<br />
Ver texto pág. 28 e segs.<br />
O<strong>de</strong> Marítima<br />
De Fernando Pessoa. Encenação:<br />
Clau<strong>de</strong> Régy. Com Jean-Quentin<br />
Châtelain.<br />
Almada. Teatro <strong>Municipal</strong>. Av. Professor Egas Moniz.<br />
De 14/07 a 16/07. 4ª, 5ª e 6ª às 21h30. Tel.:<br />
212739360.<br />
Se o Mundo Fosse Bom, o Dono<br />
Morava Nele<br />
De Ariano Suassuna (a partir <strong>de</strong>),<br />
Januário <strong>de</strong> Oliveira (a partir <strong>de</strong>), Gil<br />
Vicente (a partir <strong>de</strong>).<br />
Évora. Lg. <strong>de</strong> São Mame<strong>de</strong>. De 13/07 a 31/07. 3ª, 4ª,<br />
5ª, 6ª e Sáb. às 22h. Entrada livre.<br />
As Formigas<br />
De Boris Vian. Encenação: Rogério <strong>de</strong><br />
Carvalho. Com Dulce Baptista,<br />
Meirinho Men<strong>de</strong>s.<br />
Almada. Fórum <strong>Municipal</strong> Romeu Correia. Pç.<br />
Liberda<strong>de</strong>. Dia 11/07. Dom. às 19h. Tel.: 212724928.<br />
Um Jantar Muito Original<br />
De Fernando Pessoa (a partir <strong>de</strong>).<br />
Encenação: Alex. Riener. Com Anna<br />
Morawetz, Eva Pröglhöf, Flo<br />
Staffelmayr, Florian Tröbinger, Karola<br />
Nie<strong>de</strong>rhuber, Stefanie Philipps,<br />
Susanna Hohlrie<strong>de</strong>r. Em alemão,<br />
legendado em português.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Teatro Nacional D. Maria II. Pç. D. Pedro IV.<br />
Dia 11/07. Dom. às 21h30. Tel.: 213250835.<br />
Matar Shakespeare<br />
De Tatiana Frolova. Encenação: Tatiana<br />
Frolova. Com Elena Bessonova, Dmitri<br />
Botcharov, Vladimir Dmitriev.<br />
Almada. Fórum <strong>Municipal</strong> Romeu Correia. Pç.<br />
Liberda<strong>de</strong>. Dia 10/07. Sáb. às 19h. Tel.: 212724928.<br />
Almada. Teatro <strong>Municipal</strong>. Av. Professor Egas Moniz.<br />
Dia 10/07. Sáb. às 20h30. Tel.: 212739360.<br />
Casimiro e Carolina<br />
De Odon von Horvath. Encenação:<br />
Emmanuel Demarcy-Mota. Com Alain<br />
Libolt, Ana das Chagas, Céline<br />
Carrère, Charles-Roger Bour,<br />
Constance Luzzati, Cyril Anrep,<br />
Elodie Bouchez, Gaëlle Guillou,<br />
Gerald Maillet, Hugues Quester,<br />
Jauris Casanova, Olivier Le Borgne,<br />
Pascal Vuillemot, Sandra Faure,<br />
Sarah Karbasnikoff, Stéphane<br />
Krähenbühl, Thomas Durand, Walter<br />
N’Guyen.<br />
Porto. Teatro Nacional São João. Pç. Batalha. Dia<br />
10/07. Sáb. às 21h30. Tel.: 223401910.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Teatro Nacional D. Maria II. Pç. D. Pedro IV.<br />
De 15/07 a 16/07. 5ª e 6ª às 21h30. Tel.: 213250835.<br />
Ver texto pág. 28 e segs.<br />
Uma Família Portuguesa<br />
De Filomena Oliveira, Miguel Real.<br />
Encenação: Cristina Carvalhal. Com<br />
Bruno Simões, Carlos Malvarez, João<br />
Maria Pinto, Luísa Salgueiro, Teresa<br />
Faria.<br />
Almada. Palco Gran<strong>de</strong> - Escola D. António da Costa.<br />
Av. Professor Egas Moniz. Dia 10/07. Sáb. às 22h30.<br />
Tel.: 212745294.<br />
Era Uma Vez um Crocodilo Ver<strong>de</strong><br />
Encenação: Coralia Rodríguez. Com<br />
Coralia Rodríguez.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Casa América Latina. Av. 24 <strong>de</strong> Julho, 118-B.<br />
Dia 09/07. 6ª às 19h. Tel.: 213955309. Em espanhol.<br />
Porque na Noite Terrena Sou<br />
Mais Fiel que Um Cão<br />
De Joana Craveiro. Encenação: Joana<br />
Craveiro. Com Inês Rosado, Rosinda<br />
Costa, Tânia Guerreiro. Festival<br />
Trans_Sintra.<br />
Sintra. Casa <strong>de</strong> Teatro. R. Veiga da Cunha, 20. De<br />
10/07 a 10/10. Sáb. às 21h30. Tel.: 219233719.<br />
O Humor é Coisa Séria<br />
De Onésimo Teotónio <strong>de</strong> Almeida.<br />
Com Bruno Nogueira, Maria Rueff.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> S. Luiz. R. Antº Maria<br />
Cardoso, 38-58. Dia 10/07. Sáb. às 17h30. Tel.:<br />
213257650. Entrada livre.<br />
Romeu e Julieta XVI - XXI<br />
Encenação: São José Lapa, Inês Lapa<br />
Lopes. Com Carlos Zacarias, Carolina<br />
Curado, Eva Pereira, Felicida<strong>de</strong> Matias,<br />
. “Tom <strong>de</strong> Festa 20 anos a miscigenar culturas”<br />
. “Cerâmica”<br />
. “20 anos, 20 cartazes” exposição nas ruas <strong>de</strong> Ton<strong>de</strong>la<br />
. “Cenografias em público” espaços na cida<strong>de</strong><br />
. Líquen intervenção plástica <strong>de</strong> grafíti em Ton<strong>de</strong>la<br />
. Contadores <strong>de</strong> estórias<br />
. Vistacurta – festival <strong>de</strong> curtas <strong>de</strong> Viseu / parceria Ccv<br />
. Oficinas <strong>de</strong> Olaria e Raku / parceria Cearte<br />
. O Cubo<br />
. Restaurante Novo Ciclo / 3 Pipos / Bar Tom_<strong>de</strong>_Festa<br />
[Bilhetes 4 dias: 22,50€ / 17,50€]<br />
[Bilhetes/dia - 14 Jun: 1,00€ / 15, 16 e 17: 10,00€ / 7,50€]<br />
Filipa Lourenço, Francisco Pereira,<br />
Jesus Al<strong>de</strong>ia, Lúcia Sousa, Luís<br />
Pacheco, Rodolfo Neta, Sandra Neta<br />
Fernan<strong>de</strong>s, Sara Matos, Vanessa Silva,<br />
Luís Fernan<strong>de</strong>s.<br />
Azóia. Espaço das Aguncheiras. R. das Aguncheiras.<br />
De 10/07 a 11/07. Sáb. e Dom. às 18h. Tel.: 212682430.<br />
Santa Joana dos Matadouros<br />
De Bertold Brecht. Encenação:<br />
Gustavo Trestini.<br />
Coimbra. Oficina <strong>Municipal</strong> do Teatro. (Vale das<br />
Flores) R. Pedro Nunes. De 09/07 a 18/07. 2ª, 3ª, 4ª,<br />
5ª, 6ª e Sáb. às 21h30 (excepto a 11/007). Dom. às<br />
19h. Tel.: 239718238.<br />
Dança<br />
Estreiam<br />
Um pouco <strong>de</strong> ternura, gran<strong>de</strong><br />
merda!<br />
Companhia: Compagnie Dave St-<br />
Pierre. Coreografia: Dave St-Pierre.<br />
Almada. Palco Gran<strong>de</strong> - Escola D. António da Costa.<br />
Av. Professor Egas Moniz. Dia 13/07. 3ª às 22h. Tel.:<br />
212745294. 20€ (c/ <strong>de</strong>scontos). 27.º Festival <strong>de</strong> Teatro<br />
<strong>de</strong> Almada 2010.<br />
Insustentável Leveza<br />
Com ACTA - A Companhia <strong>de</strong> Teatro<br />
do Algarve. Coreografia: Carlos Matos.<br />
Cenografia: Annett Hunger.<br />
Bailarino:Wencke Kriemer, Marie<br />
Schmie<strong>de</strong>r, Igor Kirov, Marijana<br />
Savovska, Fábio Liberti. Com Afonso<br />
Dias (voz). Encenação: Annett Hunger.<br />
Portimão. Teatro <strong>Municipal</strong>. Lg. 1.º <strong>de</strong> Dezembro.<br />
Dia 10/07. Sáb. às 21h30. Tel.: 282402475. 10€<br />
(sujeito a <strong>de</strong>scontos).<br />
A Casa<br />
De Paulo Curado (música).<br />
Coreografia: Aldara Bizarro.<br />
Cenografia: Patrícia Colunas.<br />
Bailarino:Albana Hall, Constanza<br />
Givone. Encenação: Patrícia Colunas.<br />
Montijo. Cinema Teatro Joaquim D’Almeida. R.<br />
Joaquim D’Almeida. Dia 10/07. Sáb. às 21h30. Tel.:<br />
212327882. Entrada livre.<br />
ACERT Associação Cultural e Recreativa <strong>de</strong> Ton<strong>de</strong>la<br />
Rua Dr. Ricardo Mota; 3460-592 Ton<strong>de</strong>la<br />
Tel. geral: 232 814 400 / Bilheteira: 232 814 410 / www.acert.pt<br />
14 New Sketch / PT<br />
concerto especial para gravação <strong>de</strong> DVD<br />
15 Desbundixie / PT<br />
Samuel Úria / PT<br />
Fernando Alvim dj set / PT<br />
16 Kimi Djabaté / Guiné B<br />
Ska Cubano / Cuba<br />
Freddy Locks / PT<br />
17 Deambuloscopie / FR - teatro <strong>de</strong> rua<br />
Proyecto Entre Cuerdas / ES<br />
Festicultores / ES<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 53
Exposições<br />
RUI GAUDÊNCIO<br />
Este povo<br />
que nos<br />
<strong>de</strong>fine<br />
O centenário da República<br />
é pretexto para uma difícil<br />
mega-exposição sobre o<br />
tema do povo. Luísa Soares<br />
<strong>de</strong> Oliveira<br />
Povo - people<br />
LISBOA. Museu da Electricida<strong>de</strong>. Central Tejo. Av. <strong>de</strong><br />
Brasília. De dom. a 6ª, das 10h às 18h. Sáb., das 10h<br />
às 20. Até 19/09.<br />
mmmmn<br />
Uma exposição com 4 comissários e 288 obras<br />
Quatro comissários, 288 obras,<br />
maioritariamente portuguesas e<br />
algumas estrangeiras, quase seis<br />
<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s<br />
emprestadoras: a exposição ‘Povo -<br />
people’, a <strong>de</strong>correr no Museu da<br />
Electricida<strong>de</strong>, tem as características<br />
<strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> evento internacional,<br />
e partiu do ambicioso conceito <strong>de</strong><br />
reunir no mesmo espaço abordagens<br />
ao tema nas mais diversas<br />
disciplinas, artísticas ou não. Da<br />
pintura à escultura e à música, da<br />
instalação ao cinema documental<br />
(on<strong>de</strong> se incluem montagens das<br />
fascinantes actualida<strong>de</strong>s locutadas<br />
por António Lopes Ribeiro durante<br />
todo o Estado Novo), dos<br />
documentos históricos aos<br />
testemunhos sociais, abrangendo<br />
um leque temporal <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> dois<br />
séculos, trata-se aqui <strong>de</strong> reunir na<br />
sala imponente do primeiro andar<br />
todo o tipo <strong>de</strong> materializações,<br />
criações artísticas e testemunhos<br />
que o povo pô<strong>de</strong> provocar.<br />
Dividida em nove núcleos, com<br />
títulos como “O povo é sereno”, “o<br />
povo é quem mais or<strong>de</strong>na”, “casas<br />
do povo”, “se isto não é o povo,<br />
on<strong>de</strong> é que está o povo” ou “povo,<br />
povo, eu te pertenço”, a exposição<br />
não faz distinção <strong>de</strong> épocas,<br />
agrupando as obras – que tanto<br />
po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong> Rui Sanches, Ama<strong>de</strong>o,<br />
Almada, Roquemont ou Álvaro<br />
Cunhal, como documentos <strong>de</strong><br />
i<strong>de</strong>ntificação digitalizados ou<br />
imagens documentais da habitação<br />
tradicional portuguesa, cartazes do<br />
25 <strong>de</strong> Abril ou caricaturas <strong>de</strong><br />
Bordalo Pinheiro – consoante se<br />
inserem num ou noutro tipo <strong>de</strong><br />
leitura. Por isso, encontramos aqui<br />
boa parte da melhor arte portuguesa<br />
mo<strong>de</strong>rna, mo<strong>de</strong>rnista e<br />
contemporânea. Aliás, segundo João<br />
Pinharanda (comissariado artístico),<br />
a i<strong>de</strong>ia da exposição construiu-se em<br />
torno do quadro “Cinco Artistas em<br />
Sintra”, o manifesto <strong>de</strong> Cristino da<br />
Silva em que os artistas românticos<br />
se representavam na charneca,<br />
tendo ao fundo o palácio do rei<br />
coleccionador, D. Fernando, e<br />
personagens do povo em atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
admiração embasbacada. O quadro<br />
colocava já uma das duas gran<strong>de</strong>s<br />
questões que esta exposição levanta:<br />
é que a criação artística pressupõe<br />
uma distância conceptual entre<br />
criador e objecto da criação. Dito <strong>de</strong><br />
outra forma, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />
das origens <strong>de</strong> cada artista, olhar<br />
para o povo, representá-lo ou<br />
apresentá-lo implica um estar <strong>de</strong><br />
fora que exclui a pertença. Rosa<br />
Ramalho, também representada na<br />
exposição, é a única excepção.<br />
A segunda questão <strong>de</strong>corre da<br />
primeira. Se o povo é o tema da<br />
exposição, será que a <strong>de</strong>finição que<br />
damos a esta palavra é exactamente<br />
a mesma há duzentos e tal anos?<br />
Neste espaço <strong>de</strong> tempo, que é por<br />
alto a distância que nos separa da<br />
Revolução Francesa, aconteceu<br />
Marx, que <strong>de</strong>finiu politicamente a<br />
palavra, aconteceu o Estado Novo,<br />
que a quis encerrar num espartilho<br />
bonito, aconteceu a guerra colonial,<br />
a primeira guerra igualitária que<br />
tivemos, e a Revolução <strong>de</strong> Abril, a<br />
<strong>de</strong>mocracia. A exposição intui-o,<br />
reproduzindo diversas <strong>de</strong>finições da<br />
palavra no jornal que faz <strong>de</strong><br />
catálogo. Mas afirmar “povo, povo,<br />
eu te pertenço”, enquanto se<br />
convidam todos os visitantes a<br />
<strong>de</strong>ixar a sua imagem num painel à<br />
entrada, coloca aqui um voto<br />
simpático <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong> que uma<br />
discussão mais aprofundada, a fazer<br />
paralelamente à exposição, po<strong>de</strong>ria<br />
esclarecer.<br />
As obras contemporâneas mais<br />
interessantes são justamente aquelas<br />
que problematizam estas questões.<br />
Muita fotografia, <strong>de</strong> que<br />
<strong>de</strong>stacaremos as <strong>de</strong> Manuel Botelho<br />
pertencentes à série “Confi<strong>de</strong>ncial<br />
Desclassificado”, em que o artista<br />
se auto-representa como soldado na<br />
guerra colonial; a escultura “Vista<br />
Interior”, <strong>de</strong> Joana Vasconcelos –<br />
uma casinha <strong>de</strong> classe média-baixa<br />
pronta a usar; o busto da República<br />
<strong>de</strong> Rui Sanches; e sobretudo o<br />
diaporama do colectivo<br />
Kameraphoto, um retrato global<br />
<strong>de</strong>sse outro a que alguns chamam<br />
povo, com que alguns se<br />
i<strong>de</strong>ntificam, mas que é sempre<br />
fascinante, na estranheza que nos<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
<strong>de</strong>volve ao olhar. É pena que não<br />
tenhamos a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ver, na<br />
Cinemateca ou noutro lugar, a visão<br />
dos cineastas que correspon<strong>de</strong> à<br />
<strong>de</strong>stes artistas.<br />
A vida intensificada<br />
Action cinema<br />
<strong>de</strong> Ken Jacobs<br />
VILA DO CONDE Galeria Solar - Galeria <strong>de</strong> Arte<br />
Cinemática. Rua do Lidador. Tel.: 252 646516. De 3ª<br />
a 6ª das 14h30 às 18h. Sáb. e Dom. das 10h às 12h30<br />
e das 14h30 às 18h. Até 12/09<br />
mmmnn<br />
“Em 1893, Warburg perguntando-se<br />
acerca da maneira como os artistas<br />
da Renascença italiana<br />
representaram o movimento,<br />
constata que eles são<br />
inelutavelmente levados à <strong>de</strong>scrição<br />
<strong>de</strong> uma aparência: os signos da<br />
mobilida<strong>de</strong> concentram-se na<br />
periferia das figuras, na <strong>de</strong>formação<br />
dos contornos e dos traços, a<br />
dilatação dos vestidos e dos cabelos,<br />
sem afectar a sua estrutura: a origem<br />
do movimento é relacionado com<br />
uma causa exterior que modifica<br />
provisoriamente a configuração do<br />
corpo mas não o afecta em<br />
profundida<strong>de</strong>”, escreve Philippe-<br />
Alain Michaud em “Aby Warburg e a<br />
imagem em movimento” (Macula,<br />
Paris, 1998).<br />
Emprestar uma nova vida às<br />
imagens: este é a proposta <strong>de</strong> Ken<br />
Jacobs nas obras que escolheu<br />
apresentar em “Action Cinema”,<br />
exposição que se <strong>de</strong>sdobra pelos<br />
vários espaços da galeria Solar. A<br />
mostra é quase exclusivamente<br />
formada por imagens apropriadas,<br />
com excepção <strong>de</strong> trabalhos on<strong>de</strong><br />
retrata instantes da vida quer em<br />
família, quer com os amigos, neste<br />
caso <strong>de</strong>stacando-se “Bob Fleischner<br />
dying”, um retrato <strong>de</strong>sta figura<br />
mítica do cinema “un<strong>de</strong>rground”<br />
nova-iorquino. O resgatar à morte <strong>de</strong><br />
um instante, projectando para o<br />
futuro flashes <strong>de</strong>sse tempo perdido,<br />
como apenas fosse possível esse<br />
<strong>de</strong>sígnio – porque o olhar está<br />
alienado pelo presente perpétuo<br />
on<strong>de</strong> se encontra –, é tarefa própria<br />
<strong>de</strong> um <strong>de</strong>miurgo: e Jacobs parece<br />
encarnar bem esse papel.<br />
Na exposição da Solar há imagens<br />
<strong>de</strong> água, fotografias estereográficas,<br />
velhos filmes: as imagens ganham<br />
espessura, <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>, aproximamse<br />
<strong>de</strong> nós enquanto fantasmas <strong>de</strong><br />
uma outra época. A duração é<br />
esticada: um minuto filmado em<br />
1901 é agora projectado em câmara<br />
lenta, muito lenta mesmo: são mais<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>z minutos <strong>de</strong> dilatação<br />
temporal, para que os olhos vejam,<br />
contra o presente. Ken Jacobs é uma<br />
espécie <strong>de</strong> arqueólogo, um<br />
historiador à maneira <strong>de</strong> Warburg.<br />
Aquilo que lhe interessa é a noção <strong>de</strong><br />
“pathosformel”, que se po<strong>de</strong><br />
enten<strong>de</strong>r como “vida mimicamente<br />
intensificada”. Estamos no domínio<br />
das intensida<strong>de</strong>s que animam a<br />
história, o seu <strong>de</strong>senrolar “nãocronológico”,<br />
visível na repetição,<br />
em diferentes períodos ou<br />
contextos, <strong>de</strong> uma mesma “forma ou<br />
fórmula <strong>de</strong> estilo emocional”.<br />
Veja-se “What Happened on 23rd<br />
Street in 1901”: um filme em que<br />
Jacobs recorre à animação digital <strong>de</strong><br />
três dimensões para dar uma nova<br />
vida a um momento captado pela<br />
câmara <strong>de</strong> Edwin S.Porter,<br />
realizador da companhia <strong>de</strong><br />
produção <strong>de</strong> Thomas Edison. A<br />
película muda-se em digital para nos<br />
mostrar a persistência <strong>de</strong> uma<br />
mesma fórmula, a <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sejo,<br />
quer na imagem captada no início<br />
do século passado - a passagem <strong>de</strong><br />
uma mulher sobre uma grelha <strong>de</strong><br />
ventilação, que faz com que a sua<br />
saia se levante –, quer no célebre<br />
instante protagonizado por Marilyn<br />
Monroe, quer ainda na pintura<br />
rococó <strong>de</strong> Fragonard, “Les hazards<br />
heureux <strong>de</strong> ‘l’escarpolette’” (1767,<br />
Wallace Collection, London). Esta<br />
recorrência tem a sua origem em<br />
expressões gestuais que se po<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong>tectar por exemplo na estatuária<br />
da Grécia antiga, nomeadamente<br />
nas representações da ninfa.<br />
É curioso ver como o filme do casal<br />
a passear na Rua 23 – e o respectivo<br />
acontecimento, o esvoaçar do vestido<br />
– foi anunciado no catálogo Edison:<br />
“Um êxito que irá certamente<br />
agradar”, no qual se po<strong>de</strong> observar<br />
“a saia <strong>de</strong> uma rapariga que é<br />
levantada a uma altura quase<br />
perversa, para seu horror e diversão<br />
dos ven<strong>de</strong>dores <strong>de</strong> jornais,<br />
engraxadores e transeuntes.” A<br />
vergonha da involuntária<br />
protagonista (será assim?) em<br />
confronto com o mundo transformase,<br />
mais tar<strong>de</strong>, em eficaz produção<br />
do “star system” (Marilyn): a ida<strong>de</strong> da<br />
inocência cinematográfica, com ecos<br />
na pintura <strong>de</strong> Fragonard, per<strong>de</strong>u-se<br />
com o advento <strong>de</strong> Hollywood e, mais<br />
tar<strong>de</strong>, com a expansão da indústria<br />
pornográfica. Ken Jacobs faz dois<br />
passos atrás e aproxima-nos <strong>de</strong> uma<br />
outra esfera, on<strong>de</strong> os afectos são<br />
aquilo que conta. É um trabalho<br />
político, pleno <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong>,<br />
o seu.<br />
Apenas uma nota para a<br />
exposição, que, em termos formais,<br />
é excessivamente repetitiva: o<br />
recorrente uso <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />
efeito “strobe” para potenciar a<br />
ilusão do movimento chega a ser<br />
cansativo e corre o risco <strong>de</strong> retirar<br />
alguma vitalida<strong>de</strong> às imagens a que<br />
Jacobs quis dar uma sobrevida.<br />
54 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon
Agenda<br />
Inauguram<br />
A Banda Desenhada e o Álbum<br />
Ilustrado<br />
De Natalie Leté, Worf Erlbruch,<br />
Nadia Bud<strong>de</strong>, Klaus Ensikat, Volker<br />
Pfüller, Rotraut Susanne Berner,<br />
Sophie Dutertre, Goele Dewanckel,<br />
Jockum Nordström, Martin Jarrie.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Goethe-Institut. Cp. Mártires Pátria, 37. Tel.:<br />
218824510. De 09/07 a 28/07. 2ª a 6ª das 10h às 20h.<br />
Banda Desenhada.<br />
Donnerstag e Outros Desenhos<br />
De Jorge Queiroz.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Chiado 8 - Arte Contemporânea. Largo do<br />
Chiado, 8 - Edifício Se<strong>de</strong> da Mundial-Confiança.<br />
Tel.: 213237335. De 09/07 a 17/09. 2ª a 6ª das 12h às<br />
20h. Inaugura 9/7 às 22h.<br />
Desenho, Outros.<br />
Escultura Abstracta Nas<br />
Décadas <strong>de</strong> 1960-70. Colecção<br />
Fundação <strong>de</strong> Serralves<br />
De Alfredo Queiroz Ribeiro, Ângelo<br />
<strong>de</strong> Sousa, Armando Alves, João<br />
Machado, Joaquim Vieira, Jorge<br />
Pinheiro, José Rodrigues, Zulmiro <strong>de</strong><br />
Carvalho.<br />
Albufeira. EMA - Espaço Multiusos. Antigo Lidl <strong>de</strong><br />
Albufeira. Tel.: 289599512. De 10/07 a 05/09. 2ª a<br />
Dom. das 16h às 23h.<br />
Escultura. Allgarve’10.<br />
Tailândia: Rostos e Paisagens<br />
<strong>Lisboa</strong>. Casino <strong>Lisboa</strong>. Alam. dos Oceanos Lote<br />
1.03.01 - Parque das Nações. Tel.: 218929070. De<br />
13/07 a 29/07. 6ª e Sáb. das 16h às 04h. 2ª a 5ª e<br />
Dom. das 15h às 03h.<br />
Fotografia.<br />
Continuam<br />
<strong>Marlene</strong><br />
<strong>Dumas</strong>:<br />
Contra o<br />
Muro<br />
De <strong>Marlene</strong><br />
<strong>Dumas</strong>.<br />
Porto. Museu <strong>de</strong><br />
Serralves. R. Dom<br />
João <strong>de</strong> Castro,<br />
210. Tel.:<br />
226156500. Até<br />
10/10. 2ª a 6ª das<br />
10h às 17h. Sáb.,<br />
Dom. e Feriados<br />
das 10h às 20h.<br />
Pintura.<br />
Ver texto págs.<br />
6 e segs.<br />
Sem Limites - Nadir Afonso<br />
De Nadir Afonso.<br />
<strong>Lisboa</strong>. MNAC - Museu do Chiado. R. Serpa Pinto, 4.<br />
Tel.: 213432148. Até 03/10. 3ª a Dom. das 10h às 18h.<br />
Pintura.<br />
Tudo O Que é Sólido Dissolve-Se no<br />
Ar: O Social na Colecção Berardo<br />
<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Praça do Império<br />
- Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até<br />
12/09. Sáb. das 10h às 22h (última admissão às<br />
21h30). 2ª a 6ª e Dom. das 10h às 19h (última<br />
admissão às 18h30).<br />
Pintura, Outros.<br />
Mais Que a Vida<br />
De Vasco Araújo, Javier Téllez.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian.<br />
Avenida <strong>de</strong> Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até 06/09.<br />
3ª a Dom. das 10h às 18h.<br />
Ví<strong>de</strong>o, Fotografia, Instalação,<br />
Outros.<br />
Zao Wou-Ki<br />
<strong>Lisboa</strong>. Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva.<br />
Pç. das Amoreiras, 56/58. Tel.: 213880044. De<br />
24/06 a 26/09. 2ª, 4ª, 5ª, 6ª, Sáb. e Dom. das 10h<br />
às 18h.<br />
Pintura.<br />
Nasreen Mohamedi: Notas -<br />
Reflexões Sobre o Mo<strong>de</strong>rnismo<br />
Indiano<br />
De Nasreen Mohamedi.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. R. Arco do Cego - Ed. da CGD.<br />
Tel.: 217905155. Até 29/08. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das 11h às<br />
19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />
Feriados das 14h às 20h (última admissão às<br />
19h30).<br />
Pintura, Fotografia.<br />
Natureza Morta (Próximo<br />
Futuro Next Future)<br />
De Barrão.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian.<br />
Av. <strong>de</strong> Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até 30/09.<br />
Programa Gulbenkian Próximo Futuro/Next<br />
Future.<br />
Instalação, Escultura.<br />
Arena<br />
De Carla Filipe, João Tengarrinha,<br />
Paulo Brighenti.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Fundação Carmona e Costa. Ed <strong>de</strong> Espanha<br />
- R. Soeiro Pereira Gomes L1 - 6º A/C/D. Tel.:<br />
217803003. De 06/07 a 16/10. 4ª a Sáb. das 15h às<br />
20h. Ciclo <strong>de</strong> Conversas: Filipa Oliveira 26/9 às 17h;<br />
José Carlos Pereira 2/10 às 17h; George Stolz 16/10 às<br />
17h.<br />
Desenho, Outros.<br />
Der Geist Unserer Zeit<br />
De Fernando Brito.<br />
Guimarães. CC Vila Flor. Av. D. Afonso Henriques,<br />
701. T. 253424700. Até 27/6. 3ª a sáb das 10h às<br />
12h30 e das 14h às 19h. Domingo e feriados das 14h<br />
às 19h.<br />
Escultura, Pintura, Outros.<br />
A Voz do Mar<br />
De Pancho Gue<strong>de</strong>s.<br />
Sagres. Fortaleza. Tel.: 282620140. De 03/07 a<br />
30/11. 2ª a Dom. das 09h30 às 20h. Allgarve’10.<br />
Instalação.<br />
René Bertholo<br />
Estói. Ruínas Romanas <strong>de</strong> Milreu. R. <strong>de</strong> Faro. Tel.:<br />
289997823. Até 29/09. 3ª a Dom. das 09h30 às 18h.<br />
Allgarve 2010.<br />
Azulejos.<br />
This Is My Condition<br />
Jack Pierson<br />
De Ryan McGinley, Ryan McNamara,<br />
Ryan Trecartin, Slater Bradley, Jack<br />
Pierson.<br />
<strong>Lisboa</strong>. Galeria Filomena Soares. R. da<br />
Manutenção, 80. Tel.: 218624122. Até 11/09. 3ª a<br />
Sáb. das 10h às 20h.<br />
Pintura, Ví<strong>de</strong>o, Instalação,<br />
Fotografia, Escultura, Outros.<br />
Pra Quem Mora Lá, O Céu é Lá -<br />
OSGEMEOS<br />
De Gustavo Pandolfo, Otávio<br />
Pandolfo (OSGEMEOS).<br />
<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Pç. do Império<br />
- CCB. Tel.: 213612878. Até 19/09. Sáb. das 10h às<br />
22h (última admissão às 21h30). 2ª a 6ª, Dom. e<br />
Feriados das 10h às 19h (última admissão às 18h30).<br />
Pintura, Outros.<br />
apresenta<br />
TRICOTA<br />
UM PROJECTO DE ELECTROTANGO DOS ARGENTINOS<br />
OTROS AIRES ONDE COEXISTE A TÍPICA ORQUESTRA ARGENTINA<br />
E A ACTUAL MÚSICA ELECTRÓNICA<br />
// 22 <strong>de</strong> Julho_ Concerto | 21h30<br />
// 20 e 21 <strong>de</strong> Julho_ Masterclasses | 12h30<br />
(saiba mais em www.bes.pt)<br />
/// ENTRADA LIVRE LIMITADA À LOTAÇÃO DA SALA<br />
// MORADA<br />
Praça Marquês <strong>de</strong> Pombal<br />
nº3, 1250-161 <strong>Lisboa</strong><br />
// TELEFONE<br />
21 359 73 58<br />
// HORÁRIO<br />
Segunda a Sexta<br />
das 9h às 21h<br />
// EMAIL<br />
besarte.financa@bes.pt<br />
Programação e produção<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 55