13.03.2015 Views

Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa

Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa

Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Sexta-feira<br />

9 Julho 2010<br />

www.ipsilon.pt<br />

<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong><br />

E a realida<strong>de</strong> entrou por Serralves a<strong>de</strong>ntro<br />

PAULO PIMENTA ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 7400 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE<br />

Vergílio Ferreira Miles Cleret Charlotte Rampling


Flash<br />

Sumário<br />

<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> 6<br />

A aventura <strong>de</strong> uma pintora<br />

atenta à realida<strong>de</strong><br />

Vergílio Ferreira 12<br />

O que ele não publicou, mas<br />

também não <strong>de</strong>struiu<br />

Dave Eggers 14<br />

Escritor com causas<br />

São José Almeida 18<br />

Abriu o armário da<br />

homossexualida<strong>de</strong> na<br />

ditadura<br />

Mi Ami 22<br />

O rock como celebração<br />

tribal<br />

Miles Cleret 26<br />

O homem que reinventou<br />

África para o século XXI<br />

Charlotte Rampling 28<br />

Entrevista com a actriz<br />

Ficha Técnica<br />

Directora Bárbara Reis<br />

Editor Vasco Câmara, Inês Nadais<br />

(adjunta)<br />

Conselho editorial Isabel<br />

Coutinho, Óscar Faria, Cristina<br />

Fernan<strong>de</strong>s, Vítor Belanciano<br />

Design Mark Porter, Simon<br />

Esterson, Kuchar Swara<br />

Directora <strong>de</strong> arte Sónia Matos<br />

Designers Ana Carvalho, Carla<br />

Noronha, Mariana Soares<br />

Editor <strong>de</strong> fotografia Miguel<br />

Ma<strong>de</strong>ira<br />

E-mail: ipsilon@publico.pt<br />

Alguém adopta um<br />

Hitchcock mudo?<br />

A iniciativa foi já experimentada em<br />

diferentes áreas, nomeadamente<br />

em museus, bibliotecas e... jardins<br />

zoológicos. Trata-se <strong>de</strong> propor a<br />

alguém — uma empresa ou um<br />

privado — que, ao abrigo do<br />

mecenato, “adopte” e cui<strong>de</strong> do<br />

restauro ou da sobrevivência <strong>de</strong> um<br />

quadro antigo, <strong>de</strong> um livro raro ou<br />

<strong>de</strong>... um animal da sua estimação.<br />

Coube agora ao British Film<br />

Institute (BFI) recorrer a este<br />

expediente para tentar restaurar os<br />

primeiros filmes <strong>de</strong> Alfred<br />

Hitchcock (1899-1980). Com o mote<br />

“Adopte um Hitchcock”, a<br />

campanha arranca com uma lista<br />

<strong>de</strong> nove títulos, entre os quais está<br />

“The Lodger: A Story of the London<br />

Fog”, tido como obra-prima na<br />

altura do seu lançamento (1926). Os<br />

outros oito são igualmente filmes da<br />

fase inicial da carreira do gran<strong>de</strong><br />

mestre do suspense, ainda em<br />

versão muda e realizados em<br />

Inglaterra, e que têm em comum<br />

estarem a precisar <strong>de</strong> restauro para<br />

po<strong>de</strong>rem voltar a ser visionados<br />

com mais qualida<strong>de</strong>. Os restantes<br />

títulos em causa são “The Pleasure<br />

Gar<strong>de</strong>n”, (1925), “The Ring” (1927),<br />

“Downhill” (1927), “Easy Virtue”<br />

(1927), “The Farmers Wife” (1927),<br />

“Champagne” (1928), “The<br />

Manxman” (1929) e “Blackmail”<br />

(1929).<br />

O montante <strong>de</strong>sta operação é<br />

estimado pelo BFI em cerca <strong>de</strong> 1,2<br />

milhões <strong>de</strong> euros, e po<strong>de</strong>-se ace<strong>de</strong>r<br />

a mais informação sobre a<br />

campanha no “site” do BFI:<br />

(www.bfi.org.uk/nationalarchive/<br />

hitchcock), on<strong>de</strong> todo o tipo <strong>de</strong><br />

contribuições são “most welcome”.<br />

Por exemplo, um quarto <strong>de</strong> libra<br />

(30 cêntimos) chega para restaurar<br />

50 centímetros <strong>de</strong> filme; uma<br />

contribuição <strong>de</strong> 5 mil libras (6 mil<br />

euros) já dá direito a que o nome do<br />

dador passe a figurar nos créditos<br />

<strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cimento; 100 mil libras<br />

(120 mil euros) chega para restaurar<br />

todo um filme, diz o BFI, que<br />

consi<strong>de</strong>ra os nove títulos <strong>de</strong><br />

Hitchcock “uma parte crucial da<br />

história britânica”. E sublinha:<br />

Hitchcock<br />

Afinal,<br />

Bacon<br />

<strong>de</strong>senhavaa<br />

Francis Bacon dizia que não<br />

sabia <strong>de</strong>senhar. Mas os<br />

cerca <strong>de</strong> 41 <strong>de</strong>senhos da<br />

autoria do pintor angloirlandês<br />

(1909-1992) que<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> o dia 5 po<strong>de</strong>m ser<br />

vistos na Fundação Eugénio<br />

Almeida, em Évora, na<br />

exposição “Bacon: A Ponta<br />

do Iceberg”, <strong>de</strong>smentem<br />

essa i<strong>de</strong>ia. São os<br />

chamados “Desenhos<br />

Italianos”, produzidos nos<br />

anos 1980 por um Bacon<br />

já septuagenário, e<br />

oferecidos a um jovem<br />

jornalista italiano,<br />

Cristiano Ravarino, com<br />

o qual Bacon manteve uma<br />

relação durante um período<br />

que passou em Itália.<br />

Despreocupado,<br />

<strong>de</strong>scontraído, longe da<br />

fama e das atenções que o<br />

incomodavam em<br />

Inglaterra, Bacon<br />

<strong>de</strong>senhava — e distribuía os<br />

seus <strong>de</strong>senhos por<br />

Ravarino, mas também por<br />

“homens e mulheres que<br />

não podiam sequer<br />

imaginar o valor do<br />

presente, donos <strong>de</strong> bares,<br />

restaurantes e pequenas<br />

pousadas, ao que parece<br />

como pedido <strong>de</strong> <strong>de</strong>sculpa<br />

pelos seus estados <strong>de</strong><br />

embriaguez”, conta<br />

Alessandro Riva num texto<br />

do catálogo.<br />

O inglês Eduard Lucie-<br />

Smith, comissário da<br />

exposição e um dos<br />

principais estudiosos <strong>de</strong><br />

Bacon, explicou ao Ipsílon<br />

que existiu uma gran<strong>de</strong><br />

controvérsia sobre a<br />

autenticida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes<br />

<strong>de</strong>senhos, em parte<br />

motivada pelo facto <strong>de</strong> o<br />

pintor ter assumido<br />

publicamente,<br />

variadíssimas vezes, não<br />

<strong>de</strong>senhar, mas também por<br />

ser normal <strong>de</strong>itar fora<br />

trabalhos ou oferecê-los a<br />

amigos, entre os quais o<br />

Os <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong> Francis Bacon não eram feitos para<br />

escritor ven<strong>de</strong>r. O pintor distribuía-os por donos <strong>de</strong> bares<br />

Steven<br />

como pedido <strong>de</strong> <strong>de</strong>sculpa pela sua embriaguez<br />

Spen<strong>de</strong>r e<br />

oactor<br />

Paul<br />

Danquah.<br />

Segundo<br />

Lucie-<br />

Smith, a<br />

Ravarino<br />

terá dado<br />

“250<br />

<strong>de</strong>senhos,<br />

talvez mais”.<br />

São<br />

<strong>de</strong>senhos em<br />

vários<br />

formatos <strong>de</strong><br />

papel, a cores<br />

e a preto e<br />

branco, a<br />

maior parte<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

dimensão,<br />

assinados e<br />

autónomos.<br />

Os <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong><br />

célebre<br />

Bacon não<br />

retrato do Papa Inocêncio X<br />

eram feitos para ven<strong>de</strong>r, (a partir <strong>de</strong> Velázquez),<br />

pelo contrário: uma gran<strong>de</strong> crucificações e autoretratos.<br />

parte do trabalho foi<br />

escondida do público. Sendo hoje evi<strong>de</strong>nte que a<br />

“Alguns <strong>de</strong>senhos repensam obra <strong>de</strong> Bacon é fértil em<br />

e recapitulam” trabalhos <strong>de</strong>senhos, o que se po<strong>de</strong><br />

anteriores, explica ainda o <strong>de</strong>duzir da repetida<br />

comissário. “Mais velho e afirmação do pintor, e <strong>de</strong><br />

com mais experiência”, outros, <strong>de</strong> que nunca criou<br />

Bacon regressa a temas que qualquer tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho?<br />

já tinha trabalhado, como o Maria <strong>Lisboa</strong><br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 3


Flash<br />

Música<br />

Antony cantou duas<br />

canções em “Volta”,<br />

<strong>de</strong> Björk, e a islan<strong>de</strong>sa<br />

<strong>de</strong>volve agora a cortesia.<br />

No alinhamento <strong>de</strong><br />

“Swanlights”, álbum <strong>de</strong><br />

Antony & The Johnsons<br />

com edição marcada<br />

para 11 <strong>de</strong> Outubro,<br />

encontramos um dueto<br />

entre os dois, “Fletta”. O<br />

álbum é uma<br />

edição<br />

especial,<br />

um livrodisco<br />

<strong>de</strong><br />

144 páginas<br />

com pinturas,<br />

fotografias e<br />

textos assinados por<br />

Antony Hegarty.<br />

Meryl Streep vai ser Margaret Thatcher no cinema<br />

“Cada cêntimo conta”.<br />

Para além <strong>de</strong>stes, o BFI está a lançar<br />

uma campanha paralela para<br />

encontrar 75 filmes <strong>de</strong>saparecidos<br />

<strong>de</strong> vários realizadores britânicos.<br />

Entre os “most wanted”, há<br />

também um Hitchcock, “The<br />

Mountain Eagle” (1926), tido como<br />

o “Santo Graal” da filmografia do<br />

realizador; segundo o BFI, trata-se<br />

do único da mais <strong>de</strong> meia centena<br />

<strong>de</strong> filmes que terá realizado que se<br />

consi<strong>de</strong>ra hoje perdido.<br />

Não é preciso<br />

esperar 11 anos por<br />

um novo álbum dos<br />

Portishead<br />

Já estávamos preparados para nova<br />

longa espera, mas alegrem-se os<br />

corações: não será necessário. Os<br />

Portishead estão prestes a entrar<br />

em estúdio para começar a<br />

trabalhar no sucessor <strong>de</strong> “Third” e é<br />

certo que não se repetirão os 11 anos<br />

que o separaram <strong>de</strong> “Portishead”, o<br />

segundo álbum da banda britânica,<br />

editado em 1997. A revelação foi<br />

feita por Geoff Barrow à BBC 6<br />

Music, numa entrevista em que o<br />

multi-instrumentista e produtor da<br />

banda adiantou ainda que o novo<br />

álbum será editado por uma<br />

multinacional, a Universal.<br />

“Disseram-nos que po<strong>de</strong>mos fazer o<br />

que quisermos. Ven<strong>de</strong>mos discos<br />

suficientes para os manter<br />

contentes.”<br />

Fazer o que quiserem significa que,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong>sse “Third” em que<br />

mandaram às malvas o trip-hop que<br />

ajudaram a <strong>de</strong>finir em favor <strong>de</strong><br />

electrónica mais rugosa e dos<br />

ritmos kraut rock dos Can ou Neu!,<br />

não há retrocesso possível. “Estarei<br />

a compor para os Portishead entre<br />

Julho e Agosto e só quero pôr outro<br />

álbum cá fora. Tenho esperança<br />

que seja bem mais rápido [que<br />

anteriormente] porque estamos<br />

todos mais velhos e mais sábios.”<br />

Se tomarmos como referência<br />

“Chase The Tear”, o “single” <strong>de</strong><br />

beneficência<br />

para a<br />

Amnistia<br />

Martin Scorsese não pára: está a rodar “A Invenção<br />

<strong>de</strong> Hugo Cabret”, a que se seguirá “Silêncio” e um<br />

“biopic” <strong>de</strong> Frank Sinatra<br />

Internacional que editaram em<br />

Dezembro, o novo álbum<br />

aprofundará a hibri<strong>de</strong>z electrónicoorgânica<br />

e a força propulsora <strong>de</strong><br />

“Third”. “É isso que somos agora.<br />

Quebrámos o mol<strong>de</strong> daquilo que as<br />

pessoas esperavam <strong>de</strong> nós”,<br />

confessou Barrow.<br />

Antes do trabalho no novo álbum,<br />

Adrian Utley, guitarrista, baixista,<br />

teclista e também produtor dos<br />

Portishead, gravou com Will<br />

Gregory, dos Goldfrapp, uma nova<br />

banda sonora para “A Paixão <strong>de</strong><br />

Joana D’Arc”, o histórico filme <strong>de</strong><br />

Carl Dreyer, apresentada ao vivo em<br />

Bristol, em Maio. Geoff Barrow, por<br />

sua vez, lançou em Novembro <strong>de</strong><br />

2009 o álbum <strong>de</strong> estreia homónimo<br />

da sua nova banda, os BEAK>, que<br />

vem apresentando em digressão. E<br />

a discreta Beth Gibbons? Mantém-se<br />

na sombra? “Está ocupada a<br />

compor”,<br />

esclareceu<br />

Barrow à BBC6.<br />

Martin Scorsese para<br />

crianças<br />

Depois <strong>de</strong> “Shutter Island”, Martin<br />

Scorsese está a adaptar ao cinema<br />

3D o romance “A Invenção <strong>de</strong> Hugo<br />

Cabret”, com texto e ilustrações <strong>de</strong><br />

Brian Selznick (ed. Gailivro). A<br />

rodagem já começou em Londres, e<br />

a estreia está marcada para 9 <strong>de</strong><br />

Dezembro <strong>de</strong> 2011 nos Estados<br />

Unidos, estando também prevista<br />

uma versão 2D.<br />

“A Invenção <strong>de</strong> Hugo Cabret” é a<br />

história <strong>de</strong> um órfão <strong>de</strong> 12 anos,<br />

Hugo, que vive na Gare <strong>de</strong><br />

Montparnasse, a movimentada<br />

estação <strong>de</strong> comboios parisiense,<br />

on<strong>de</strong> a sua sobrevivência <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong><br />

segredos e do anonimato.<br />

Pela estação passam<br />

uma excêntrica<br />

rapariga amante<br />

<strong>de</strong> livros e um<br />

velho amargo,<br />

dono <strong>de</strong> uma<br />

lojinha <strong>de</strong><br />

brinquedos (que se <strong>de</strong>scobre ser o<br />

cineasta Georges Méliès), um<br />

<strong>de</strong>senho misterioso, uma chave<br />

roubada, um homem mecânico e<br />

uma mensagem escondida. É a<br />

primeira adaptação que Scorsese<br />

faz <strong>de</strong> uma história infanto-juvenil.<br />

Ben Kingsley, Chloe Moretz, Sacha<br />

Baron Cohen, Ju<strong>de</strong> Law,<br />

Christopher Lee e Mathieu Amalric<br />

integram o elenco<br />

A seguir, o realizador irá adaptar<br />

“Silêncio”, romance <strong>de</strong> Shusaku<br />

Endo, e rodar um “biopic” sobre o<br />

cantor e actor Frank Sinatra.<br />

Meryl Streep vai<br />

ser A Dama <strong>de</strong><br />

Ferro?<br />

Meryl Streep po<strong>de</strong>rá estar<br />

prestes a voltar a trabalhar com<br />

a realizadora <strong>de</strong> “Mamma<br />

Mia!”, Phyllida Lloyd,<br />

<strong>de</strong>pois do sucesso <strong>de</strong><br />

2008 com as músicas<br />

dos Abba. Segundo o<br />

“Hollywood<br />

Reporter”, a actriz, com dois<br />

Óscares e 61 anos, mostrou<br />

interesse em interpretar o papel da<br />

Dama <strong>de</strong> Ferro e os seus agentes<br />

estão a negociar a sua participação<br />

no “biopic” “Thatcher”, on<strong>de</strong><br />

interpretaria Margaret Thatcher. O<br />

actor Jim Broadbent po<strong>de</strong>rá vir a<br />

interpretar Denis, o marido da exprimeira-ministra<br />

britânica.<br />

A rodagem está prevista para o final<br />

do ano. O filme baseia-se num<br />

argumento escrito por Abi Morgan,<br />

que escreveu as séries <strong>de</strong> televisão<br />

“Brick Lane” e “Sex Traffic”, e fala<br />

do “po<strong>de</strong>r e do preço que se paga<br />

pelo po<strong>de</strong>r”, sendo “um retrato<br />

surpreen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> uma mulher<br />

extraordinária e complexa.”<br />

Conta o “Hollywood Reporter” que<br />

esta biografia filmada <strong>de</strong> Thatcher<br />

se situa nos 17 dias que<br />

antece<strong>de</strong>ram a Guerra das<br />

Malvinas, em 1982. E mostra como<br />

aquela a quem chamam “Dama <strong>de</strong><br />

Ferro” lutou para salvar a sua<br />

carreira.<br />

James Cameron<br />

filma os Black Eyed<br />

Peas em 3D<br />

A seguir a “Avatar”, James Cameron<br />

vai realizar um documentário em<br />

3D sobre os Black Eyed Peas. A<br />

novida<strong>de</strong> foi dada por Will.I.Am à<br />

revista “Vibe”. “Temos o melhor<br />

realizador porque somos o melhor<br />

grupo do planeta”, disse, sem<br />

modéstias, o lí<strong>de</strong>r da banda norteamericana.<br />

O filme mostrará o<br />

grupo em digressão e em concerto.<br />

Ainda não se sabe se vai<br />

ser rodado em 3D ou se<br />

vai ser convertido<br />

<strong>de</strong>pois. A rodagem<br />

será na América do<br />

Sul e a estreia está<br />

prevista para 2011.<br />

James Cameron tem um “feeling”<br />

Os Portishead só querem “pôr outro álbum cá fora”<br />

4 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


AGENDA CULTURAL FNAC<br />

entrada livre<br />

entrada livre<br />

APRESENTAÇÃO AO VIVO LANÇAMENTO EXPOSIÇÃO<br />

LANÇAMENTO<br />

AS VIAGENS DE LOIS - PORTUGAL<br />

Livro <strong>de</strong> Jacques Martin e Luís Diferr<br />

Chama-se Portugal e será o quinto volume criado em torno <strong>de</strong> Loïs, um herói do século XVII que foi das últimas<br />

personagens imaginadas pelo recentemente falecido Jacques Martin, autor das famosas aventuras <strong>de</strong> Alix.<br />

10.07. 17H00 FNAC CASCAISHOPPING<br />

LANÇAMENTO | INAUGURAÇÃO<br />

OS POSTAIS DA PRIMEIRA REPÚBLICA<br />

Professor António Ventura<br />

No ano da comemoração do centenário da República, a FNAC inaugura uma exposição que revisita os tempos<br />

da Primeira República em Portugal e convida-o a participar numa conversa em torno do tema O Bilhete Postal<br />

Ilustrado na Propaganda Política, no âmbito da Tertúlia Letras Com(n)Vida.<br />

12.07. 18H30 FNAC CHIADO<br />

AO VIVO<br />

MADAME GODARD<br />

Galapagos<br />

Galapagos é o título do longa-duração <strong>de</strong> estreia da banda <strong>de</strong> Viana do Castelo. O single Atlas 1977, divulgado<br />

nas rádios nacionais, será um dos temas em <strong>de</strong>staque no Fórum FNAC.<br />

10.07. 22H00 FNAC LEIRIASHOPPING<br />

11.07. 17H00 FNAC COIMBRA<br />

APRESENTAÇÃO<br />

VIVA O VINIL<br />

Henrique Amaro, João Lopes, Nuno Galopim,<br />

Paulo Furtado e Vítor Belanciano<br />

A FNAC convida alguns dos "pesos-pesados" da música, do jornalismo e da rádio para um "combate" on<strong>de</strong><br />

cada um terá <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a sua selecção musical.<br />

15.07. 18H00 FNAC CHIADO<br />

EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA<br />

RETROSPECTIVA CINEMA PORTUGUÊS<br />

Composta por material pertencente ao Arquivo Fotográfico da Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema,<br />

esta série <strong>de</strong> fotografias <strong>de</strong> rodagem, feitas entre os anos 20 e os anos 70, focaliza-se sobretudo em<br />

dois períodos: o período clássico do cinema português, nos anos 30 e 40, e o Cinema Novo, nos anos 60.<br />

03.06. - 03.09.2010 FNAC VISEU<br />

Consulte todos os eventos da Agenda Fnac,<br />

assim como outros conteúdos culturais em http://cultura.fnac.pt<br />

Apoio:


<strong>Marlene</strong> D<br />

uma pintora da<br />

The Wall, <strong>de</strong><br />

2009, que<br />

representa o<br />

muro erigido por<br />

Israel para isolar<br />

a Cisjordânia,<br />

po<strong>de</strong>rá ser<br />

interpretada<br />

como uma obra<br />

própalestiniana.<br />

Capa<br />

6 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


<strong>Dumas</strong><br />

vida mo<strong>de</strong>rna<br />

“Contra o Muro”, no<br />

Museu <strong>de</strong> Serralves,<br />

não é apenas uma<br />

viagem à obra e ao<br />

percurso <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong><br />

<strong>Dumas</strong>. É uma das mais<br />

importantes exposições<br />

<strong>de</strong> pintura dos últimos<br />

anos. E um reencontro,<br />

sempre renovado, com<br />

algumas das questões<br />

que marcam a vida da<br />

pintura contemporânea.<br />

José Marmeleira<br />

(textos) e Paulo<br />

Pimenta (fotos)<br />

Numa das salas <strong>de</strong> “Contra o Muro”,<br />

pinturas <strong>de</strong> cabeças e rostos acompanham,<br />

entre a circunspecção e a indiferença,<br />

a conversa do Ípsilon com<br />

<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> (Cida<strong>de</strong> do Cabo,<br />

1953). A artista respon<strong>de</strong> <strong>de</strong>sembaraçada<br />

e com humor às perguntas. Por<br />

vezes, surpreen<strong>de</strong>-se, divaga, mas<br />

não per<strong>de</strong> o rumo, regressa sempre.<br />

Afinal, está num mundo cujos segredos<br />

conhece como ninguém: a sua<br />

pintura. De resto, o cenário da entrevista<br />

não foi casual: foi a própria artista<br />

que propôs a realização da entrevista<br />

junto às suas obras.<br />

Esclarecido o contexto, convém<br />

dizer que <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> é uma das<br />

mais relevantes pintoras contemporâneas.<br />

Alcançou um sucesso crítico<br />

que, embora não sendo consensual,<br />

é acompanhado por sucesso comercial<br />

e “Contra o Muro”, no Museu <strong>de</strong><br />

Serralves até Outubro, promete ser<br />

um dos momentos mais singulares<br />

da sua carreira. Ao todo são 40 obras<br />

feitas na última década, incluindo<br />

algumas já <strong>de</strong>ste ano – a gran<strong>de</strong> maioria<br />

revelada em Abril, na Galeria David<br />

Zwirner, em Nova Iorque – e nunca<br />

antes mostradas na Europa. É<br />

provável até que dificilmente voltem<br />

ser apreciadas nestas condições num<br />

país europeu. Culpa <strong>de</strong> constrangimentos<br />

financeiros e logísticos do<br />

actual contexto internacional que<br />

muito provavelmente impedirão que<br />

voltem a ser reunidas.<br />

Mas estes são assuntos relativamente<br />

mundanos. “Contra o Muro”<br />

é uma exposição marcante e, enquanto<br />

individual <strong>de</strong> pintura, um acontecimento.<br />

Por duas razões. A primeira<br />

revela-se naquilo que mostra <strong>de</strong> inédito<br />

da obra da artista: elementos<br />

arquitectónicos e construções humanas<br />

que i<strong>de</strong>ntificam o conflito israelopalestiniano<br />

como motivo pictórico;<br />

e pinturas que representam a na-<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 7


“Child Waving”<br />

(Criança a<br />

acenar), <strong>de</strong> 2010<br />

“The Mother”<br />

(A mãe), <strong>de</strong><br />

2009<br />

Pormenor da<br />

série<br />

“Blindfol<strong>de</strong>d”<br />

(Vendados),<br />

<strong>de</strong> 2002,<br />

durante a<br />

montagem <strong>de</strong><br />

“Contra o<br />

Muro”, em<br />

Serralves<br />

tureza-morta, tema que durante décadas<br />

<strong>Dumas</strong> se recusou a trabalhar.<br />

A segunda é a obra, com as suas preocupações,<br />

<strong>de</strong>sencontros e progressos,<br />

numa aventura individual que é<br />

também a aventura <strong>de</strong> toda a arte<br />

contemporânea atenta à realida<strong>de</strong>.<br />

Representar o muro<br />

A representação do mundo pela pintura,<br />

ou a pintura como forma <strong>de</strong><br />

representar o mundo: comece-se por<br />

aqui. Porquê Israel e a Palestina?<br />

“E porque não? Não sou historiadora<br />

ou política, mas penso que na<br />

nossa socieda<strong>de</strong> global continua a ser<br />

um drama muito importante, indissociável<br />

até <strong>de</strong> outros mais traumáticos<br />

como a II Guerra Mundial ou o<br />

Holocausto. Em 2010 ainda testemunhamos<br />

muitas coisas relacionadas<br />

com o que se vive no Médio Oriente.<br />

Não acho <strong>de</strong>spropositado trazer o<br />

tema para a minha pintura.”<br />

Foi a partir <strong>de</strong> 1976 que a artista,<br />

já a viver na Europa, vinda da África<br />

do Sul, <strong>de</strong>scobriu as raízes europeias<br />

do conflito. Na verda<strong>de</strong>, o assunto<br />

tinha aflorado na série “Man Kind”<br />

(2002-2006), inspirada em fotografias<br />

<strong>de</strong> corpos e rostos muçulmanos<br />

– a série está em Serralves. Em “Contra<br />

o Muro”, porém, estamos diante<br />

<strong>de</strong> um cenário político mais explícito<br />

e <strong>de</strong> uma posição, assinalada pela<br />

representação do muro erigido por<br />

Israel (e <strong>de</strong> imagens da repressão<br />

exercida pelo exército israelita), que<br />

muitos interpretarão como pró-palestiniana.<br />

Por exemplo, o governo<br />

se<strong>de</strong>ado em Jerusalém, é um comprador<br />

improvável das pinturas “po-<br />

“Não sou uma<br />

historiadora ou<br />

política, mas penso<br />

que na nossa<br />

socieda<strong>de</strong> global<br />

[o conflito israelopalestiniano]<br />

continua a ser um<br />

drama muito<br />

importante”<br />

líticas” <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong>. Ou<br />

não?<br />

“Não sei [risos]. Quando inaugurei<br />

a exposição em Nova Iorque ouvi<br />

críticas. Disseram-me que este não<br />

era o caminho. Que eu não estivera<br />

lá, não conhecia a realida<strong>de</strong>. Compreendo<br />

essa perspectiva, mas não<br />

a aceito. Vivi o ‘apartheid’ na África<br />

do Sul, mas, por ter lutado contra<br />

esse regime, não faço <strong>de</strong> todos os<br />

negros anjos e <strong>de</strong> todos os branco<br />

<strong>de</strong>mónios. O mesmo acontece aqui.<br />

Apenas quis representar um muro.<br />

Quando se vê o outro como inimigo,<br />

o efeito é <strong>de</strong>vastador. Não apenas a<br />

um nível político mas num plano<br />

mais existencial”.<br />

<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> viveu e estudou<br />

na África do Sul até 1976, contornando<br />

como podia as limitações impostas<br />

pela censura, nomeadamente no<br />

meio estudantil britânico da Michaelis<br />

School of Fine Arts da University<br />

of Cape Town.<br />

“Foram anos formativos, muito<br />

importantes. Estávamos longe da<br />

socieda<strong>de</strong> e era fácil escapar aos censores.<br />

Víamos coisas proibidas no<br />

clube <strong>de</strong> cinema [da escola]. Filmes<br />

do [Ingmar] Bergman, do Godard,<br />

do Alain Resnais”.<br />

A relação com pintura era, entretanto,<br />

vivida <strong>de</strong> forma dolorosa, confusa.<br />

Mais natural parecia o afecto<br />

por certos fotógrafos: “Nessa altura<br />

não havia muitos pintores <strong>de</strong> que<br />

gostasse. Não conseguia gostar <strong>de</strong><br />

Rembrandt. Não me ajudava na minha<br />

arte, ao contrário da fotografia<br />

da Diane Arbus e do Richard Avedon<br />

com quem sentia partilhar sensibilida<strong>de</strong>s<br />

comuns e que me permitiam<br />

chegar à pintura <strong>de</strong> outra maneira.<br />

Da Arbus gostava da intensida<strong>de</strong>, o<br />

Avedon influenciou-me formalmente.<br />

Gostava dos seus fundos neutrais,<br />

sobretudos os das fotografias do pai<br />

antes <strong>de</strong> morrer. Tinha um distanciamento<br />

face aos retratados que me<br />

lembrava o Andy Warhol.”<br />

O <strong>de</strong>sejo da realida<strong>de</strong><br />

A relação <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> com a<br />

pintura iniciou-se assim por vias<br />

<strong>Marlene</strong><br />

<strong>Dumas</strong><br />

fotografada<br />

em Serralves<br />

em frente a<br />

“The Sleep of<br />

Reason”, <strong>de</strong><br />

2009, um<br />

auto-retrato<br />

da artista<br />

8 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 9


Figure in a<br />

Landscape<br />

(Figura numa<br />

paisagem,<br />

2010)<br />

exteriores, “estrangeiras”. Na opinião<br />

da artista, não existiam outros<br />

caminhos: “Vivia inserida numa socieda<strong>de</strong><br />

que não valorizava a pintura<br />

ou que a submetia a um ensino<br />

caduco. Não respondia aos meus<br />

<strong>de</strong>sejos e aspirações. Chegava a sentir-me<br />

culpada por ser uma pintora,<br />

activida<strong>de</strong> que na África do Sul todos<br />

achavam insignificante e não tinha<br />

mo<strong>de</strong>los. Vivia um conflito com<br />

aquilo <strong>de</strong> que gostava. Por isso, criei<br />

a minha própria história pessoal<br />

com o suporte.”<br />

“Contra o Muro” parece retomar<br />

essa velha e difícil relação, reconciliando<br />

a pintora com géneros e temas<br />

como a abstracção que se insinua no<br />

muro <strong>de</strong> “Em Construção” (2009) e<br />

nos blocos azuis <strong>de</strong> “Barreira mentais”<br />

(2009).<br />

“Sempre quis ser uma pintora abstracta,<br />

adorava os expressionistasabstractos,<br />

mas a abstracção não era<br />

suficiente para mim, pois também<br />

queria a realida<strong>de</strong>. Esse foi outro conflito<br />

que experimentei”, conta. O impasse<br />

acabou resolvido, ou pelo menos<br />

atenuado, com o cinema da Nouvelle<br />

Vague. “Não <strong>de</strong>ixo <strong>de</strong> pensar a<br />

pintura enquanto abstracção, enquanto<br />

construção <strong>de</strong> uma realida<strong>de</strong>.<br />

Não pretendo testemunhar a realida<strong>de</strong>,<br />

apenas confrontar-me com ela.<br />

Daí, para mim, nos meus tempos <strong>de</strong><br />

estudante, a importância <strong>de</strong> filmes<br />

como ‘Hiroshima mon amour’, do<br />

Alain Resnais. Combinava uma história<br />

<strong>de</strong> amor, uma dimensão política<br />

ou documental e uma reflexão sobre<br />

a linguagem artística, que naquele<br />

caso se tratava do cinema. Era essa<br />

“Sempre quis ser uma<br />

pintora abstracta,<br />

mas a abstracção não<br />

era suficiente para<br />

mim, pois também<br />

queria a realida<strong>de</strong>.<br />

Não pretendo<br />

testemunhar<br />

a realida<strong>de</strong>, apenas<br />

confrontar-me<br />

com ela”<br />

coexistência que queria encontrar na<br />

pintura”.<br />

Uma arte ou uma pintura que possa<br />

representar, também, o que é estar<br />

apaixonado, como sugeriu numa entrevista?<br />

“Ah [risos], aí queria apenas<br />

mostrar os meus ciúmes em relação<br />

ao cinema e à música pop. Gosto <strong>de</strong><br />

uma arte inteligente, tanto estética<br />

como conceptualmente, mas [que<br />

seja] também sensual e emocional.<br />

Encontro-a em artistas como Luc Tuymans,<br />

Louise Bourgeois, Francis Bacon<br />

ou Steve McQueen.”<br />

O interesse pela representação e a<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> abordar motivos narrativos<br />

não implicaram um afastamento das<br />

premissas do conceptualismo, abraçadas<br />

no início da carreira. Pelo contrário.<br />

A reflexão sobre as possibilida<strong>de</strong>s<br />

da pintura, e a relação <strong>de</strong>sta com<br />

a fotografia, bem como o questionar<br />

das imagens, foram atitu<strong>de</strong>s cultivadas<br />

e com frequência passadas para o papel<br />

em pequenos textos assinados pela<br />

pintora. O canadiano Jeff Wall, conhecido<br />

pelas suas fotografias <strong>de</strong> situações<br />

do dia-a-dia, foi, nesse sentido,<br />

uma inspiração. “Quando se interroga<br />

sobre o lugar e a condição do pintor<br />

da vida mo<strong>de</strong>rna, e faz do médium<br />

fotográfico um instrumento pictórico,<br />

[o Jeff Wall] enuncia algumas das minhas<br />

preocupações e i<strong>de</strong>ias. [Ele mostrou-me<br />

que] era possível e legítimo<br />

aceitar o <strong>de</strong>safio que certos temas nos<br />

colocam” e, <strong>de</strong>ssa forma, abordar o<br />

“For Whom<br />

the Bell Tolls “<br />

(Por quem os<br />

sinos<br />

dobram), <strong>de</strong><br />

2008<br />

Mortos e vivos, grupos <strong>de</strong><br />

pessoas, bebés, mo<strong>de</strong>los<br />

femininos, mulheres em<br />

lágrimas. A obra <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong><br />

<strong>Dumas</strong> é uma galeria <strong>de</strong> figuras,<br />

corpos e rostos, construída<br />

através da pintura e do <strong>de</strong>senho,<br />

num confronto repetido com<br />

o conceito <strong>de</strong> retrato e com o<br />

próprio espectador.<br />

Um mundo <strong>de</strong> retratos<br />

Na obra <strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong>, o retrato não é apenas um motivo para levar a realida<strong>de</strong> à tela ou ao papel. É também um meio<br />

<strong>de</strong> questionar a construção <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s, a empatia do espectador e a própria pintura.<br />

Em “Contra o Muro” há uma<br />

série que se <strong>de</strong>staca nesse<br />

confronto: “Man Kind”, com os<br />

seus anónimos homens árabes,<br />

sob os títulos <strong>de</strong> “The Semite”,<br />

“The Mediator” (um Cristo<br />

tímido ou indiferente?) ou “The<br />

Lookalike”. São pinturas a óleo<br />

<strong>de</strong> um mundo pós-11 <strong>de</strong> Setembro<br />

– as imagens originais reportam<br />

à guerra no Iraque e em Gaza<br />

– e propõem mais do que uma<br />

posição política, propõem um<br />

questionamento da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

privada e pública. Ou não fossem<br />

rostos abertos ao sentido, nesse<br />

espaço <strong>de</strong> tensão psicológica que<br />

é superfície pintada segundo<br />

<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong>.<br />

Em 1986, no conjunto <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senhos e litografias “Fear<br />

of Babies”, a artista quebrou a<br />

familiar docilida<strong>de</strong> dos bebés<br />

em esgares inquietantes, antes<br />

<strong>de</strong> regressar ao tema, cinco<br />

anos <strong>de</strong>pois, com “The First<br />

People I-V” (1991), retratando<br />

querubins em poses adultas,<br />

rectas e frontais. No início dos<br />

anos 90, foi a vez dos “Black<br />

Drawings [Desenhos negros]”,<br />

e, pela primeira vez, <strong>Dumas</strong> fez<br />

Propõe-se mais do<br />

que uma posição<br />

política, propõe-se<br />

um questionamento<br />

da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

privada e pública<br />

das pessoas negras assunto da<br />

sua obra. Em diferentes tons <strong>de</strong><br />

preto, sobre papel, cada rosto<br />

numa folha à espera da empatia<br />

do espectador.<br />

Depois da representação<br />

do medo e dos rostos negros,<br />

o <strong>de</strong>sejo e a pornografia com<br />

“Porno as Collage (1993) e<br />

“Porno Blues” (1993), grupos<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>senhos feitos a partir<br />

fotografias <strong>de</strong> revistas<br />

pornográficas. O traço,<br />

levemente expressionista,<br />

compunha corpos anónimos<br />

em actos sexuais e que se<br />

aproximavam da abstracção.<br />

Nos anos seguintes, chegou o<br />

erotismo com “Group Show”<br />

(1994) ou “We Were All All in<br />

Love with Cyclopes (1997)”,<br />

obras inspiradas em fotografias<br />

<strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los femininos.<br />

A vida pessoal acaba<br />

igualmente transportada<br />

para a pintura. Em “The First<br />

People I-V” – <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong><br />

foi mãe pouco antes iniciar este<br />

trabalho – e sobretudo em “The<br />

Eyes of Night Creatures”, uma<br />

série <strong>de</strong> 16 telas, on<strong>de</strong> reuniu<br />

imagens encontradas em<br />

revistas e polarói<strong>de</strong>s <strong>de</strong> amigos,<br />

familiares e conhecidos. São<br />

retratos <strong>de</strong> rostos, por <strong>de</strong>trás<br />

dos quais não há nada para<br />

ver: o palco pertence às faces,<br />

aos olhares, à pintura na sua<br />

dimensão mais “autoritária” e<br />

sensual. É o que acontece noutra<br />

série revelada no Museu <strong>de</strong><br />

Serralves: a das mulheres que<br />

choram, em “For Whom the Bell<br />

Tolls”, “Selfportrait at Noon”<br />

ou “Crying at Public”. Mais do<br />

que a realida<strong>de</strong> do sofrimento<br />

humano, a artista evoca a<br />

realida<strong>de</strong>, a dimensão física e<br />

interior da pintura. Com que o<br />

espectador se confronta.<br />

“Living on<br />

your Knees”<br />

(A vida <strong>de</strong><br />

joelhos), <strong>de</strong><br />

2010<br />

10 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


A pintura, a fotografia<br />

e o efeito Tuymans<br />

Embora próxima das motivações <strong>de</strong> outros artistas que<br />

utilizaram a fotografia enquanto material da pintura, como<br />

Luc Tuymans, <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> não dispensa o gestualismo e<br />

a dimensão física do acto <strong>de</strong> pintar.<br />

quotidiano sem produzir imagens anedóticas<br />

ou propaganda.<br />

Pensar as imagens<br />

com a pintura<br />

O gesto porém acarretou críticas, algumas<br />

dirigidas à técnica <strong>de</strong> <strong>Dumas</strong>.<br />

“Há pintores acham que sou uma má<br />

pintora. Dizem que a minha pintura<br />

não tem ‘pintura’ suficiente. Mas para<br />

mim tem sido um <strong>de</strong>safio fazê-la<br />

com meios mínimos. Talvez seja melhor<br />

<strong>de</strong>senhadora que pintora. Aliás,<br />

as minhas melhores pinturas são como<br />

<strong>de</strong>senhos. Estou mais próxima do<br />

Picasso do que do Matisse.”<br />

Outra crítica (injusta) tem a ver com<br />

a selecção das imagens fotográficas<br />

que antece<strong>de</strong> o trabalho sobre a tela.<br />

“Faço-a <strong>de</strong>s<strong>de</strong> jovem, sempre gostei<br />

<strong>de</strong> imagens. É um método e um gosto<br />

que partilhei com o Richard Prince e<br />

a Barbara Kruger e outros artistas da<br />

Pictures Generation. Mas, talvez por<br />

ter ficado na Europa, não <strong>de</strong>senvolvi<br />

a mesma atracção pela publicida<strong>de</strong> e<br />

o <strong>de</strong>sign que eles.”<br />

Data <strong>de</strong>ste período um certo afastamento<br />

<strong>de</strong> <strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> <strong>de</strong> práticas<br />

e processos como a apropriação, a colagem<br />

e o uso do texto, que havia experimentado<br />

entre os anos 70 e 80 do<br />

século XX. “Quando fiz as primeiras<br />

pinturas <strong>de</strong> cabeças e rostos, em meados<br />

da década <strong>de</strong> 80, quis logo pôr o<br />

título por baixo da tela [risos]. Não sei<br />

o que teria acontecido se tivesse ido<br />

para Nova Iorque. Se calhar, tinha ficado<br />

parecida com a arte do John Bal<strong>de</strong>ssari<br />

ou da Barbara Kruger”. E isso<br />

seria mau? “Não sei, havia ali um formalismo<br />

<strong>de</strong>masiado frio e rígido,<br />

quando eu queria o calor, a emoção<br />

da pintura dos loucos ou do expressionismo-abstracto.<br />

Mas a reflexão<br />

sobre as imagens sempre me interessou<br />

e continua a interessar-me. Por<br />

exemplo, que tipo <strong>de</strong> imagem é hoje<br />

a do homem mais temido? O rosto do<br />

‘criminoso’? Aquele que tememos? É<br />

o muçulmano, como há sessenta anos<br />

era o negro. Quero fazer uma pintura<br />

tradicional, ‘parecida’ com a do século<br />

XIX, mas também quero pensar a<br />

forma como as imagens influenciam<br />

o nosso pensamento.”<br />

Tornemos à natureza-morta, género<br />

que durante décadas <strong>Dumas</strong> se<br />

recusou a pintar e que em “Contra o<br />

Muro” está representado em “Carida<strong>de</strong>”<br />

(2010), “As Vinhas da Ira”<br />

(2009) e “As Vinhas da Abundância”<br />

(2009). “Quando era estudante, <strong>de</strong>testava-o.<br />

Não significava nada para<br />

mim. Era uma coisa burguesa, ‘kitsch’,<br />

sem valor. Uma composição com<br />

a qual não conseguia lidar. Mais tar<strong>de</strong><br />

apercebi-me que não era minha inimiga.<br />

Lembro-me <strong>de</strong> ver, num catálogo,<br />

uma natureza-morta com três<br />

pedaços <strong>de</strong> salmão [“Tres rodajas <strong>de</strong><br />

salmón”]. Era uma pintura do Goya<br />

(1746 – 1828), muito simples, com todos<br />

os elementos formais do género,<br />

muito comovente. E percebi que era<br />

possível fazer naturezas-mortas com<br />

a mesma força e emoção”.<br />

Uma reconciliação, portanto?<br />

“Quando somos jovens artistas queremos<br />

fazer sempre coisas diferentes,<br />

novas, mas à medida que envelhecemos,<br />

se tivermos sorte, aquilo que procuramos,<br />

por vezes inconscientemente,<br />

surge <strong>de</strong> uma forma inesperada”.<br />

Assim, também se <strong>de</strong>itam abaixo<br />

(velhos) muros.<br />

Em cima,<br />

“Charity “<br />

(Carida<strong>de</strong>), <strong>de</strong><br />

2010, <strong>de</strong><br />

<strong>Marlene</strong><br />

<strong>Dumas</strong>; em<br />

baixo, “Tres<br />

rodajas <strong>de</strong><br />

salmón (1808-<br />

12), <strong>de</strong> Goya,<br />

que inspirou<br />

<strong>Dumas</strong> a<br />

trabalhar o<br />

tema da<br />

naturezamorta<br />

<strong>Marlene</strong> <strong>Dumas</strong> não é a primeira<br />

artista a usar a fotografia como<br />

mo<strong>de</strong>lo ou alimento principal<br />

da pintura. No primeiro caso,<br />

existiram antes Van Gogh ou<br />

Degas, no segundo, Gerhard<br />

Richter. Também não está<br />

sozinha na resposta à apregoada<br />

dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> pintura em<br />

expressar as “verda<strong>de</strong>s” do<br />

seu tempo. Lembre-se (outra<br />

vez) Richter, mas também Luc<br />

Tuymans, Wilhelm Sasnal,<br />

Eberhard Havekost ou Peter<br />

Doig e, no contexto português,<br />

Bruno Pacheco, Diogo Pimentão<br />

e Carlos Correia.<br />

Será no entanto justo afirmar<br />

que, nessa <strong>de</strong>manda, a pintora<br />

encontrou o seu território. Como<br />

alguns dos nomes referidos,<br />

negou e aceitou a pintura, foi<br />

influenciada por Luc Tuymans<br />

e fez da imagem fotográfica<br />

(encontrada ou produzida<br />

originalmente) um campo <strong>de</strong><br />

experimentação que esten<strong>de</strong><br />

as possibilida<strong>de</strong>s formais<br />

e conceptuais da prática<br />

pictórica.<br />

Mas a sua assinatura<br />

dificilmente po<strong>de</strong> ser associada<br />

ao conjunto <strong>de</strong> artistas que<br />

Jordan Kantor agregou no artigo<br />

“O Efeito Tuymans”, publicado<br />

em 2004 na revista americana<br />

Artforum. Faltam à pintura <strong>de</strong><br />

<strong>Dumas</strong> alguns dos aspectos<br />

i<strong>de</strong>ntificados pelo crítico e<br />

ensaísta: as cores pálidas,<br />

o trabalho com as imagens<br />

em movimento da televisão<br />

e do cinema (e não apenas<br />

com os “stills” dos filmes) e,<br />

principalmente, falta á pintura<br />

<strong>de</strong> <strong>Dumas</strong> a indiferença violenta<br />

que caracteriza a obra do artista<br />

belga. Em comum, permanecem<br />

somente certos temas que<br />

remetem para a cultura e<br />

história europeias, embora<br />

sem a presença espectral das<br />

telas <strong>de</strong> Sasnal ou Tuymans. O<br />

que sobressai nesse encontro<br />

da pintora com a fotografia<br />

é antes um gestualismo que<br />

distorce e satura as formas – um<br />

trabalho físico diante da tela<br />

como se fosse uma dança – e<br />

uma atracção pela superfície<br />

plana da imagem fotográfica.<br />

Cores, expressão, sensualida<strong>de</strong>,<br />

empatia e excesso em vez <strong>de</strong><br />

uma impenetrabilida<strong>de</strong> suave e<br />

congelada.<br />

A propósito das relações<br />

entre a fotografia e pintura, a<br />

artista discorre: “Não digo que,<br />

usando a fotografia, a pintura<br />

inventa uma realida<strong>de</strong> superior<br />

à fotografia ou que torna a<br />

fotografia melhor. Eu limito-me<br />

a usar a fotografia, gosto da sua<br />

bidimensionalida<strong>de</strong>, do facto<br />

<strong>de</strong> ser plana. Não me interessa<br />

a tridimensionalida<strong>de</strong>”. E<br />

profetiza: “A pintura vai<br />

continuar como uma forma<br />

artística, como forma <strong>de</strong><br />

expressão visual. Será um pouco<br />

tradicional, quase primitiva,<br />

mas vai ficar entre nós. E vai<br />

continuar porque estamos<br />

cheios <strong>de</strong> ecrãs. Nas televisão,<br />

nos computadores. Estão em<br />

todo o lado”.<br />

Petrus &<br />

Paulus (1998),<br />

<strong>de</strong> Luc<br />

Tuymans<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 11


Livros<br />

Manuscritos<br />

da novela “A<br />

Curva <strong>de</strong> Uma<br />

Vida”, agora<br />

editado<br />

Eça <strong>de</strong> Queirós achava<br />

que se <strong>de</strong>viam pu-<br />

blicar <strong>de</strong> um homem<br />

célebre até as “contas<br />

do alfaiate”. Quem con-<br />

ta isto é o escritor Vergílio<br />

Ferreira num dos<br />

volumes do seu diário<br />

“Conta-Corrente”, a propósito<br />

<strong>de</strong> uma discussão que teve com<br />

a sua mulher, Regina Kasprzykowski,<br />

sobre se é lícito ou não publicar-se o<br />

que um autor rejeitou. Para Vergílio<br />

Ferreira, “um autor não dá garantias trabalhado, <strong>de</strong>ixado<br />

para a posterida<strong>de</strong>. Tive<br />

quase nenhumas (mormente quando<br />

gran<strong>de</strong> autor) sobre a valia do que realiza.<br />

E não há obra medíocre alguma <strong>de</strong> mexer em papéis <strong>de</strong> vários autores<br />

oportunida<strong>de</strong> na Biblioteca Nacional<br />

<strong>de</strong> um autor que lhe <strong>de</strong>strua a obra e nem todos têm essa consciência <strong>de</strong><br />

superior.”<br />

os <strong>de</strong>ixar arrumadinhos”, conta. Através<br />

do estudo do espólio a investiga-<br />

O escritor foi mais longe: “Saber<br />

como se errou, progrediu, hesitou — dora percebeu que Vergílio Ferreira<br />

tudo são modos <strong>de</strong> ampliar o conhecimento<br />

<strong>de</strong> um autor. De qualquer e, às vezes, até datava essas visitas.<br />

ia revisitando os seus papéis. “Mexia<br />

modo, se um artista não quer que se Às vezes chegamos lá pelos instrumentos<br />

utilizados, pelas canetas, pe-<br />

lhe conheça a obra, <strong>de</strong>strua-a ele”.<br />

Vergílio Ferreira não <strong>de</strong>struiu a sua e las tintas.”<br />

<strong>de</strong>ixou o acervo tão organizado que “Ele estava a preparar o espólio para<br />

o futuro. Tinha essa noção <strong>de</strong> que<br />

só po<strong>de</strong>ria estar a pensar no futuro.<br />

Dois inéditos do autor chegam agora<br />

às livrarias, editados pela Quetzal: um escritor fez para substanciar a<br />

era necessário conhecer tudo o que<br />

uma novela (“A Curva <strong>de</strong> Uma Vida”, apreciação que fazemos <strong>de</strong>le”, acrescenta<br />

Hel<strong>de</strong>r Godinho.<br />

1938) e um romance (“Promessa”, <strong>de</strong><br />

1947). Passados tantos anos <strong>de</strong>pois da<br />

publicação <strong>de</strong> “Cartas a Sandra”, o As hesitações do autor<br />

último romance do Prémio Camões Vergílio Ferreira morreu aos 80 anos,<br />

1992, já saíram do seu espólio “Escrever”<br />

(livro em que estava a trabalhar cadas, muitos dos seus títulos foram<br />

a 1 <strong>de</strong> Março <strong>de</strong> 1996. Nas últimas dé-<br />

quando morreu), um “Diário Inédito” <strong>de</strong>saparecendo das livrarias. “A publicação<br />

dos inéditos veio agitar as<br />

e estas duas obras. “Promessa”, que<br />

teve como primeiro título “Sequência”,<br />

é o único romance inédito com-<br />

adormecimento”, consi<strong>de</strong>ra o inves-<br />

águas e ter o efeito contrário a esse<br />

pleto que existe no espólio e a <strong>de</strong>cisão tigador. “Houve uma má gestão da<br />

<strong>de</strong> o trazer a público não foi fácil <strong>de</strong> edição e do catálogo. Há muitos livros<br />

tomar para a equipa <strong>de</strong> investigadores que se <strong>de</strong>ixaram esgotar”, lamenta.<br />

e professores que está a estudar, catalogar<br />

e anotar a sua obra.<br />

Em 1997, a família <strong>de</strong> Vergílio Ferreira<br />

doou o espólio do escritor à Biblioteca<br />

Nacional e, por sua sugestão,<br />

foi criada uma equipa para o estudar<br />

dirigida pelo académico Hel<strong>de</strong>r Godinho,<br />

seu aluno e amigo, que fez a<br />

tese sobre a sua obra.<br />

A investigadora Ana Isabel Turíbio,<br />

“Se um artista não<br />

que faz parte do grupo <strong>de</strong> estudo e<br />

inventariou o espólio, diz que este<br />

quer que se lhe<br />

estava organizado a pensar nos estudiosos<br />

futuros. “O espólio vinha muito<br />

organizado, com as abreviaturas<br />

conheça a obra,<br />

<strong>de</strong>senvolvidas, com alguns comentários<br />

para ele próprio (‘anotei outra<br />

<strong>de</strong>strua-a ele”,<br />

cópia e agora não sei on<strong>de</strong> está’; ‘críticos<br />

<strong>de</strong> lábia fácil não imaginam o<br />

escreveu Vergílio<br />

Ferreira<br />

esforço...’). Vê-se que é um espólio<br />

LUÍS RAMOS/ARQUIVO<br />

Vergílio Ferreira <strong>de</strong>ixou o seu<br />

acervo tão organizado que só<br />

po<strong>de</strong>ria estar a pensar no futuro<br />

Como Vergílio Ferreira<br />

preparou o fut<br />

Uma novela e um romance inéditos, que Vergílio Ferreira optou por não publicar em vida, saíram<br />

completa. A equipa <strong>de</strong> investigadores que está a trabalhar o seu espólio conta ao Ípsilon as razões<br />

12 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


NAMING SPONSOR PRESENTING SPONSOR OFFICIAL SPONSOR OFFICIAL CAR INSTITUTIONAL SPONSOR<br />

MEDIA PARTNERS PARTNERS<br />

Francisco José Viegas, editor da<br />

Quetzal, está a reeditar a obra completa<br />

e a publicar os inéditos encontrados<br />

no espólio. A reedição <strong>de</strong> “Na<br />

Tua Face” sai este mês, as reedições<br />

“Cartas a Sandra” e “Carta ao Futuro”<br />

estão previstas para Setembro. No<br />

próximo ano <strong>de</strong>verão publicar a edição<br />

crítica <strong>de</strong> “O Caminho Fica Longe”<br />

(por Ana Isabel Turíbio). Em preparação<br />

está a edição genética <strong>de</strong><br />

“On<strong>de</strong> Tudo Foi Morrendo”, bem como<br />

uma edição <strong>de</strong> “Sobre o humorismo<br />

<strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós” — no espólio<br />

existe uma segunda edição completamente<br />

preparada que <strong>de</strong>veria ter<br />

saído em 1945, mas que Vergílio Ferreira<br />

não chegou a publicar. Em negociação<br />

está um contrato com uma<br />

agente literária internacional que ficará<br />

com os direitos da obra para o<br />

mundo inteiro.<br />

Esta equipa que estuda o espólio,<br />

e que inclui ainda Fernanda Irene<br />

Fonseca e Cátia Barroso, assumiu a<br />

responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trazer a público<br />

o romance e a novela que o autor<br />

não publicou em vida por várias razões.<br />

Uma <strong>de</strong>las é o facto <strong>de</strong> Vergílio<br />

Ferreira ter emprestado há 30 anos<br />

o original dactiloscrito do romance<br />

“Promessa” (1947) a Hel<strong>de</strong>r Godinho<br />

quando ele estava fazer a sua tese.<br />

“Portanto, ele não rejeitava o livro”,<br />

afirma o académico. “Eu estava a<br />

fazer a tese <strong>de</strong> doutoramento e o<br />

Vergílio Ferreira disse-me que havia<br />

um romance que não tinha publicado<br />

mas que achava que eu <strong>de</strong>via ler.<br />

Li-o e percebi por que não o publicou.”<br />

Os investigadores têm consciência<br />

do “carácter datado” <strong>de</strong>ste romance<br />

escrito antes <strong>de</strong> “Mudança” (1949).<br />

“‘Promessa’ é um romance em que<br />

falta o equilíbrio do sentimento, a<br />

emoção poética na escrita que ‘Mudança’<br />

já tem. Mas é importante porque<br />

é o primeiro romance <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias,<br />

escrito na época em que o autor acabara<br />

<strong>de</strong> ler Hegel e Sartre. Escreveu a<br />

seguir ‘Mudança’, que na obra publicada<br />

passou a ser o primeiro romance<br />

<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias”, explica o investigador.<br />

“Promessa” mostra também que a<br />

ruptura <strong>de</strong> Vergílio Ferreira com a<br />

temática neo-realista foi anterior a<br />

“Mudança”.<br />

“A leitura <strong>de</strong> ‘Promessa’ po<strong>de</strong> ser<br />

difícil para o leitor comum. É um livro<br />

cheio <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias secamente expostas<br />

sem aquela dimensão poética com<br />

que ele vai <strong>de</strong>pois adoçar as i<strong>de</strong>ias”,<br />

afirma Hel<strong>de</strong>r Godinho. “Há muitos<br />

turo<br />

diálogos, mais do que ele fará posteriormente.<br />

‘Promessa’ é o momento<br />

<strong>de</strong> mudança <strong>de</strong> um tipo <strong>de</strong> romance<br />

neo-realista para um romance <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ias. Vê-se que ele está à procura do<br />

estilo, no sentido forte do termo.”<br />

Em 1956, Vergílio Ferreira escreveu<br />

na página <strong>de</strong> rosto do dactiloscrito <strong>de</strong><br />

“Promessa”: “Releio trechos. O livro<br />

não é precisamente uma tolice. Está<br />

quase certo, embora à sua maneira.<br />

Com pequenas emendas…” Anos <strong>de</strong>pois,<br />

em 1980, contam os investigadores<br />

no prefácio do livro agora publicado,<br />

o escritor voltou a reler o<br />

romance e acrescentou um outro comentário:<br />

“Livro medíocre e precipitado.<br />

Talvez re-escrito possa aguentar-se.<br />

Ou talvez não muito ‘medíocre’,<br />

mas apenas ultrapassado. Se o<br />

tivesse publicado antes <strong>de</strong> ‘Mudança’,<br />

estaria certo, talvez.”<br />

Ao longo do tempo, Vergílio Ferreira<br />

vai mudando <strong>de</strong> opinião em relação<br />

aos seus livros. O escritor contou a<br />

Hel<strong>de</strong>r Godinho que quando publicou<br />

“Alegria Breve”, andou preocupado<br />

uns dias a pensar que se calhar o livro<br />

não prestava. “Este livro, que é talvez<br />

o maior <strong>de</strong> Vergílio Ferreira, foi publicado<br />

em francês na colecção Gallimard<br />

e penso que foi até Jean Bloch-<br />

Michel que disse que ao ler-se aquele<br />

livro via-se que um dos gran<strong>de</strong>s escritores<br />

europeus vivia em <strong>Lisboa</strong>. As<br />

hesitações <strong>de</strong>le, opinativas, não eram<br />

significativas”, afirma Godinho.<br />

O primeiro escrito<br />

Quando Ana Isabel Turíbio pegou no<br />

espólio <strong>de</strong> Vergílio Ferreira para o inventariar<br />

teve <strong>de</strong> dar várias voltas<br />

para organizar os papéis. Foi nessa<br />

altura que encontrou o manuscrito<br />

da novela “A Curva <strong>de</strong> Uma Vida”, que<br />

é o primeiro escrito <strong>de</strong> Vergílio Ferreira,<br />

e foi agora publicada.<br />

“É difícil pegar nos papéis porque<br />

temos a presença do autor, física, ainda<br />

muito próxima. À medida que o<br />

tempo vai passando conseguimos<br />

criar distância e espaço para reflectir,<br />

e já sem emoção trabalhar com os<br />

critérios que a Biblioteca Nacional<br />

utiliza”, explica a investigadora, que<br />

fez a edição genética e crítica da novela<br />

com Cátia Barroso, bolseira no<br />

Centro <strong>de</strong> Estudos do Imaginário Literário,<br />

e que se tornou “uma ilustre<br />

vergiliana aos 22 anos”.<br />

As especialistas consi<strong>de</strong>ram que em<br />

“A Curva <strong>de</strong> Uma Vida” se encontra<br />

muito do que irá ser a maneira como<br />

Vergílio escreverá no futuro. Estão lá<br />

na Quetzal, que está a reeditar a obra<br />

da <strong>de</strong>cisão. Isabel Coutinho<br />

Alguns dos investigadores que<br />

estão a trabalhar no espólio <strong>de</strong><br />

Vergilio Ferreira: Ana Isabel<br />

Turíbio, Hel<strong>de</strong>r Godinho e Cátia<br />

Barroso<br />

Em 1956, Vergílio<br />

escreveu sobre<br />

“Promessa”: “O livro<br />

está quase certo.”<br />

E, em 1980, quando o<br />

releu: “Livro medíocre<br />

e precipitado”<br />

apresenta<br />

ANTÓNIO PINHO VARGAS LAURENT FILIPE GROOVE4TET<br />

PQ.MARECHAL CARMONA CASCAIS<br />

NOITE DE JAZZ<br />

EM PORTUGUÊS<br />

17JUL<br />

HIPÓDROMO CASCAIS<br />

MARIA BETHÂNIA<br />

CELSO FONSECA<br />

22JUL<br />

CASCAIS HIPÓDROMO 13JUL NORAH JONES<br />

25JUL DIANA KRALL PQ.MARECHAL CARMONA<br />

24JUL CORINNE BAILEY RAE 28JUL ELVIS COSTELLO & THE<br />

SUGARCANES 29JUL SOLOMON BURKE Special Guest JOSS<br />

STONE MAFRA JARDIM DO CERCO 23JUL ORQUESTRA<br />

BUENA VISTA SOCIAL CLUB® Feat. OMARA PORTUONDO<br />

Bilhetes à venda na Ticketline (www.ticketline.pt) e locais habituais<br />

MIGUEL MANSO<br />

JARDIM CERCO MAFRA<br />

DEOLINDA<br />

20JUL<br />

temas como a morte, a partida, a relação<br />

com os pais. “Vergílio Ferreira<br />

integrou na novela outros tipos <strong>de</strong><br />

registo: o diarístico, o epistolar e o<br />

lírico, que serão géneros que o vão<br />

acompanhando <strong>de</strong>pois em outras<br />

obras”, explica Ana Isabel para quem<br />

a publicação <strong>de</strong>sta novela se justifica<br />

em função da obra que veio <strong>de</strong>pois.<br />

“Isto era publicável quando ele tinha<br />

22 anos, hoje é publicável como documento<br />

histórico”, acrescenta Hel<strong>de</strong>r<br />

Godinho. “E como prova <strong>de</strong> coerência,<br />

já aqui se encontra muito daquilo<br />

que foi a sua obra”, nota Ana<br />

Isabel.<br />

No espólio encontra-se correspondência<br />

que ainda não foi publicada.<br />

“Nem será”, dizem os investigadores.<br />

É muito privada, faz referências pessoais<br />

e envolve pessoas vivas. Gran<strong>de</strong><br />

parte da correspondência é trocada<br />

com Eduardo Lourenço (que Vergílio<br />

consi<strong>de</strong>rava ser o seu melhor amigo),<br />

Jorge <strong>de</strong> Sena, Mário Dionísio, André<br />

Malraux, com brasileiros que fizeram<br />

teses sobre a sua obra, com o pintor<br />

Júlio Resen<strong>de</strong>, etc.<br />

No espólio também estão as fotografias<br />

que Vergílio Ferreira usava na<br />

construção dos seus romances.<br />

“É muito interessante visitar o ‘dossier’<br />

genético <strong>de</strong> ‘Para Sempre’ e <strong>de</strong><br />

outros romances. Vê-se que ele tirava<br />

fotografias às ruas para <strong>de</strong>pois as <strong>de</strong>screver”,<br />

conta Hel<strong>de</strong>r Godinho. Vergílio<br />

fotografou “a zona do Saldanha,<br />

da Casal Ribeiro [<strong>Lisboa</strong>], e para a<br />

<strong>de</strong>screver com rigor” na obra “Em<br />

Nome da Terra”. “Em ‘Rápida, a Sombra’<br />

usou uma fotografia <strong>de</strong> um calendário<br />

com uma rapariga com uma<br />

camisola transparente para <strong>de</strong>screver<br />

a situação em que a personagem sai<br />

das águas como uma Vénus.”<br />

Depois <strong>de</strong> reunir essa documentação,<br />

conta Ana Isabel Turíbio, Vergílio<br />

perguntava “Para quê, se tudo o<br />

mais está na imaginação?”. Mas logo<br />

a seguir explicava que era para não<br />

cometer “gaffes”.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> livros pág. 46 e segs.<br />

PQ.MARECHAL CARMONA CASCAIS<br />

CLUB DES BELUGAS<br />

Orchestra<br />

27JUL<br />

www.cooljazzfest.com<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 13


Dave Eggers, Nova<br />

e o empreiteiro Z<br />

Um dos meninos <strong>de</strong> ouro da nova literatura americana pôs mais uma vez o seu talento (enorme) ao s<br />

resultado, inquietante, é uma narrativa não-ficcional que se lê com a avi<strong>de</strong>z <strong>de</strong> um romance. Sobre os me c<br />

ROBERT GALBRAIT/REUTERS<br />

Livros<br />

Em 2005 Nova Orleães<br />

transformou-se num cenário<br />

pós-apocalíptico<br />

Em 2004, o escritor norte-americano<br />

Dave Eggers (n. 1970) – fundador da<br />

editora McSweeney’s, autor <strong>de</strong> livros<br />

que já foram finalistas do Pulitzer<br />

Prize e do National Book Critics Circle<br />

Award, e nesse ano consi<strong>de</strong>rado pela<br />

“Time” uma das 100 pessoas mais<br />

influentes no mundo – <strong>de</strong>u algumas<br />

aulas no curso <strong>de</strong> jornalismo da Universida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Berkeley (Califórnia).<br />

Foi nessa altura que, com a professora<br />

e activista dos direitos humanos<br />

Lola Vollen, criou a colecção <strong>de</strong> livros<br />

“Voice of Witness” que se propunha<br />

recorrer à história oral, narrada na<br />

primeira pessoa, para ilustrar crises<br />

<strong>de</strong> direitos humanos um pouco por<br />

todo o mundo. O primeiro volume<br />

da série coligiu testemunhos <strong>de</strong> norte-americanos<br />

que tinham sido vítimas<br />

<strong>de</strong> erros judiciais, a que se seguiu<br />

outro <strong>de</strong>dicado a refugiados<br />

sudaneses. No final <strong>de</strong> 2005 surgiu<br />

“Voices from <strong>de</strong> Storm” (Vozes da<br />

Tempesta<strong>de</strong>), que recolhia dúzias <strong>de</strong><br />

narrativas <strong>de</strong> habitantes <strong>de</strong> Nova Orleães<br />

acerca das suas vidas antes,<br />

durante e após o furacão Katrina;<br />

entre essas vidas encontravam-se as<br />

<strong>de</strong> Abdulrahman e Kathy Zeitoun, um<br />

casal muçulmano – ele americano <strong>de</strong><br />

origem síria, ela americana do Louisiana<br />

convertida ao islamismo ainda<br />

antes <strong>de</strong> ter conhecido o marido –<br />

pais <strong>de</strong> quatro crianças e donos <strong>de</strong><br />

uma bem sucedida empresa <strong>de</strong> construção<br />

civil, a Zeitoun A. Pinturas e<br />

Empreitadas Lda.<br />

Já no pós-livro, a história do pesa<strong>de</strong>lo<br />

“kafkiano” vivido por esta família<br />

não saía da cabeça <strong>de</strong> Eggers, e na<br />

primeira oportunida<strong>de</strong> o escritor visitou<br />

os Zeitoun em Nova Orleães. Era<br />

para ele evi<strong>de</strong>nte que havia ali muito<br />

mais do que aquilo que fora incluído<br />

em “Voices from <strong>de</strong> Storm”, e por<br />

isso <strong>de</strong>u início a um processo <strong>de</strong> entrevistas<br />

e <strong>de</strong> investigações, em Nova<br />

Orleães e na Síria, que durou três<br />

anos. Passado esse período, Dave Eggers<br />

escreveu “Zeitoun”, publicado<br />

originalmente em 2009 (a tradução<br />

portuguesa acaba <strong>de</strong> sair), uma surpreen<strong>de</strong>nte<br />

obra não-ficcional em<br />

DARRON CUMMINGS<br />

“De certa maneira,<br />

era um mundo novo,<br />

sem mapa. Ele<br />

[Abdulrahman] podia<br />

ser um explorador.<br />

Podia ver tudo<br />

em primeira-mão”<br />

Alguns dos habitantes que não<br />

abandonaram a cida<strong>de</strong><br />

ajudaram nos trabalhos <strong>de</strong><br />

limpeza<br />

que todos os factos, segundo o autor,<br />

“foram confirmados por fontes in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes,<br />

bem como nos registos<br />

históricos”. O dinheiro obtido com<br />

os direitos <strong>de</strong>ste livro reverte a favor<br />

da Fundação Zeitoun – entretanto<br />

criada pela família, por Dave Eggers<br />

e pela editora McSweeney’s – cujo<br />

objectivo é contribuir para a reconstrução<br />

<strong>de</strong> Nova Orleães e promover<br />

o respeito pelos direitos humanos nos<br />

EUA e no mundo.<br />

Debaixo do furacão<br />

Do principio: a 27 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 2005<br />

o Centro Nacional <strong>de</strong> furacões avisa<br />

que o Katrina po<strong>de</strong>rá atingir a categoria<br />

5 quando chegar a terra e que<br />

se dirige em direcção a Nova Orleães.<br />

Kathy Zeitoun <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> sair da cida<strong>de</strong><br />

com os quatro filhos e alojar-se em<br />

casa <strong>de</strong> familiares. O marido teima<br />

em ficar. Quer olhar pela casa e pelas<br />

outras proprieda<strong>de</strong>s, alguns prédios<br />

com inquilinos. Um dia <strong>de</strong>pois chega<br />

o furacão. Durante a madrugada Zeitoun<br />

consegue ir remendando as brechas<br />

que se abrem na casa. A água<br />

escoa-se das ruas. Mas um dia <strong>de</strong>pois<br />

rompem-se os diques da cida<strong>de</strong> e o<br />

nível da água atinge os quatro metros.<br />

Ele mudara entretanto alguns dos<br />

seus pertences do andar <strong>de</strong> baixo para<br />

o <strong>de</strong> cima, e lembra-se que há alguns<br />

anos comprara em segunda mão<br />

uma canoa <strong>de</strong> cinco metros, feita <strong>de</strong><br />

alumínio, que quase nunca utilizara.<br />

Foi buscá-la à garagem. “Imaginou-se<br />

a flutuar, sozinho, pelas ruas da cida<strong>de</strong>.<br />

De certa maneira era um novo<br />

mundo, sem mapa. Ele podia ser um<br />

explorador. Podia ver tudo em primeira-mão.”<br />

Abdulrahman aventura-se naque-<br />

RICK WILKIN/REUTERS<br />

14 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


a Orleães<br />

Zeitoun<br />

música<br />

serviço <strong>de</strong> uma causa, a dos direitos humanos no seu país. O<br />

e canismos “kafkianos” da justiça americana. José Riço Direitinho<br />

A zona <strong>de</strong> Treme, sob vários<br />

metros <strong>de</strong> água, a 29 <strong>de</strong> Agosto<br />

<strong>de</strong> 2005<br />

le cenário pós-apocalíptico. Começa<br />

a navegar e a salvar pessoas. A primeira<br />

foi uma mulher que estava<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> casa, a flutuar perto do<br />

tecto, agarrada ao topo <strong>de</strong> uma estante<br />

havia um dia. “O vestido axadrezado<br />

<strong>de</strong>la estava espalhado sobre<br />

a superfície da água como uma gran<strong>de</strong><br />

flor flutuante.”<br />

Sem nunca per<strong>de</strong>r o rigor da forma<br />

do relato verídico, Eggers não <strong>de</strong>ixa<br />

<strong>de</strong> usar o seu talento <strong>de</strong> romancista<br />

nas <strong>de</strong>scrições que faz, como a da<br />

citação anterior. Toda a história, apesar<br />

<strong>de</strong> seguir uma or<strong>de</strong>m cronológica<br />

com enumeração das datas, está repleta<br />

<strong>de</strong> analepses, <strong>de</strong> lembranças<br />

da infância e da juventu<strong>de</strong> <strong>de</strong> ambos,<br />

<strong>de</strong> pormenores laterais que fazem<br />

<strong>de</strong>sta gran<strong>de</strong> narrativa não-ficcional<br />

um romance (no sentido mais lato da<br />

palavra).<br />

Eggers sabe como pren<strong>de</strong>r o leitor,<br />

adiando <strong>de</strong>sfechos ou tornando-os<br />

imprevisíveis. É assim que a meio do<br />

livro, e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> vários salvamentos<br />

e encontros com outros homens que<br />

se recusaram a abandonar a cida<strong>de</strong>,<br />

assistimos à prisão <strong>de</strong> Zeitoun, e <strong>de</strong><br />

outros três homens, e ao seu transporte<br />

para um estranho campo militar<br />

montado no Terminal <strong>de</strong> Passageiros<br />

<strong>de</strong> Nova Orleães. “(…) Detido<br />

à boca das armas numa casa que era<br />

sua, trazido para uma base militar <strong>de</strong><br />

campanha montada <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma<br />

estação <strong>de</strong> carros, acusado <strong>de</strong> terrorismo<br />

e fechado numa jaula ao ar livre.”<br />

Só muitas páginas adiante se lêem<br />

as palavras “al-Qaeda” e “talibãs” e<br />

nos apercebemos <strong>de</strong> que no campo<br />

os guardas utilizam gás pimenta contra<br />

os prisioneiros mais mal-comportados<br />

(mais tar<strong>de</strong> balas <strong>de</strong> borracha);<br />

também a <strong>de</strong>scrição do lugar não <strong>de</strong>ixa<br />

prever nada <strong>de</strong> bom. “Já antes vira<br />

estruturas semelhantes àquela, nas<br />

proprieda<strong>de</strong>s dos seus clientes que<br />

criavam cães. Esta gaiola, tal como<br />

essas outras, era um recinto vedado<br />

e dividido em recintos mais pequenos.<br />

Parecia um canil gigante, e no<br />

entanto tinha um aspecto ainda mais<br />

familiar que isso. Parecia-se mais precisamente<br />

com as imagens que ele já<br />

vira da baía <strong>de</strong> Guantánamo.”<br />

Depois <strong>de</strong> alguns dias neste campo,<br />

Zeitoun é levado para uma prisão <strong>de</strong><br />

alta segurança. Depois da <strong>de</strong>tenção<br />

não foi autorizado a fazer um único<br />

telefonema, nem à mulher nem a um<br />

advogado.<br />

Eggers tem o cuidado <strong>de</strong> mencionar<br />

que este relato reflecte a visão<br />

dos eventos por parte da família Zeitoun,<br />

o que não torna este livro excepcional<br />

menos inquietante. O autor<br />

chegou a entrevistar os polícias que<br />

pren<strong>de</strong>ram os quatro homens.<br />

Filantropia do autor<br />

Mas esta história “kafkiana” do empreiteiro<br />

Zeitoun, não é a primeira<br />

que apela ao lado filantrópico <strong>de</strong> Dave<br />

Eggers – autor do recente “O Sítio<br />

das Coisas Selvagens” (Quetzal, 2010).<br />

Já em 2002, e por achar que a escola<br />

não promove <strong>de</strong>vidamente o acto da<br />

escrita, ajudou a criar em São Francisco<br />

uma organização sem fins lucrativos,<br />

a 826 Valencia, que se <strong>de</strong>stina<br />

a ensinar crianças e jovens entre<br />

os seis e os <strong>de</strong>zoito anos a escrever<br />

ficção, uma espécie <strong>de</strong> cursos <strong>de</strong> escrita<br />

criativa para os mais novos. (Recentemente<br />

doou para esta organização<br />

cerca <strong>de</strong> 250 mil dólares.) O<br />

que nasceu em São Francisco como<br />

um projecto local esten<strong>de</strong>u-se em<br />

poucos anos a outras cida<strong>de</strong>s como<br />

Los Angeles, Nova Iorque, Seattle,<br />

Chicago e Boston. Ainda nesta área<br />

da promoção da escrita e da leitura,<br />

e também <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2002, Dave Eggers<br />

é o editor <strong>de</strong> uma antologia anual<br />

(uma das mais vendidas nos EUA) intitulada<br />

“The Best American Nonrequired<br />

Readings”, que publica os<br />

melhores trabalhos <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong><br />

alunos do ensino secundário que periodicamente<br />

se reúne com ele nos<br />

escritórios da McSweeney’s para ler<br />

e <strong>de</strong>bater textos.<br />

Esta costela filantrópica <strong>de</strong> Eggers,<br />

que parece querer fazer carreira como<br />

“escritor com causas”, tem ainda<br />

uma forte expressão literária: um dia,<br />

conheceu Valentino Achak Deng, um<br />

refugiado sudanês, e durante meses<br />

conversou com ele (à semelhança do<br />

que viria a fazer com os Zeitoun), ouviu<br />

as suas muitas histórias <strong>de</strong> menino<br />

perdido na guerra civil do Sudão, nos<br />

vários campos <strong>de</strong> refugiados por on<strong>de</strong><br />

passou, como chegou aos Estados<br />

Unidos e como foi a sua difícil adaptação<br />

a um mundo que <strong>de</strong>sconhecia.<br />

Depois pôs mãos à obra e com a sua<br />

talentosa criativida<strong>de</strong> escreveu um<br />

romance brilhante, “What Is the<br />

What” (“O Que É o Quê”, Casa das<br />

Letras, 2009), uma autobiografia ficcionada<br />

que se tornou num “bestseller”<br />

e que foi finalista do “National<br />

Book Critics Circle Award”. O dinheiro<br />

obtido com os direitos do livro<br />

entregou-o a Achak Deng, que criou<br />

uma fundação que se propõe construir<br />

escolas secundárias no sul do<br />

Sudão; a primeira foi inaugurada em<br />

Maio do ano passado.<br />

Para breve está anunciado um volume<br />

do “Voice Witness” <strong>de</strong>dicado a<br />

vítimas do regime do Zimbabué. Que<br />

mais se seguirá?<br />

Hanne Hukkelberg<br />

Blood from a stone<br />

14 Julho 22h00 M/6<br />

palestra-performance<br />

Jeremy Xido<br />

Cabula6<br />

The Angola Project<br />

16 Julho 21h30 M/12<br />

Em inglês, sem legendagem<br />

www.teatromariamatos.pt<br />

© Carina Musk-An<strong>de</strong>rsen<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 15


Há uma piada eclesiástica que diz que<br />

nem o Espírito Santo sabe quantas<br />

or<strong>de</strong>ns e congregações femininas<br />

existem na Igreja. A partir <strong>de</strong> agora,<br />

esse problema está resolvido, pelo<br />

menos no que a Portugal se refere. A<br />

Gradiva acaba <strong>de</strong> publicar o “Dicionário<br />

Histórico das Or<strong>de</strong>ns e Instituições<br />

Afins em Portugal”, realizado<br />

por uma equipa <strong>de</strong> 136 autores, coor<strong>de</strong>nados<br />

pelo Centro <strong>de</strong> Literaturas e<br />

Culturas Lusófonas e Europeias e pelo<br />

Centro <strong>de</strong> História da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Letras <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>.<br />

Dirigido por José Eduardo Franco,<br />

José Augusto Mourão e Ana Cristina<br />

da Costa Gomes, o dicionário inclui<br />

376 entradas, divididas em sete capítulos:<br />

or<strong>de</strong>ns cristãs (o maior, com<br />

240, incluindo uma or<strong>de</strong>m protestante/evangélica);<br />

hindus e budistas (duas);<br />

esotéricas (11); maçónicas (77);<br />

templárias, neotemplárias e míticas<br />

(13); honoríficas e civis (21); e profissionais<br />

(12). No total, são mil páginas,<br />

incluindo introduções a cada capítulo,<br />

índices antroponímicos, bibliografias<br />

específicas e uma profusão <strong>de</strong><br />

ilustrações.<br />

Ficamos, assim, a saber tudo sobre<br />

a história, dados, objectivos e regras<br />

<strong>de</strong> instituições tão diferentes quanto<br />

os jesuítas ou franciscanos, a Or<strong>de</strong>m<br />

dos Advogados ou a Or<strong>de</strong>m <strong>de</strong> Malta,<br />

a Ogyen Kunzang budista ou a Or<strong>de</strong>m<br />

dos Pastores Baptistas, a Or<strong>de</strong>m dos<br />

Trovadores ou a Fe<strong>de</strong>ração Maçónica<br />

Portuguesa, a Or<strong>de</strong>m Templária <strong>de</strong><br />

Portugal, a Or<strong>de</strong>m Hebraica ou a Or<strong>de</strong>m<br />

do Infante Dom Henrique.<br />

O pioneirismo e novida<strong>de</strong> do projecto<br />

traduziram-se já no seu acolhimento<br />

positivo pela comunida<strong>de</strong> científica.<br />

De tal modo que a sua concretização<br />

DANIEL ROCHA<br />

RUI GAUDÊNCIO<br />

Em cima: monjas carmelitas do<br />

Mosteiro <strong>de</strong> Ban<strong>de</strong>. Em baixo:<br />

os fra<strong>de</strong>s da Or<strong>de</strong>m dos<br />

Cartuxos em Évora<br />

em Portugal levou investigadores <strong>de</strong><br />

outros países a iniciar ou programar<br />

iniciativas semelhantes. É o caso <strong>de</strong><br />

Espanha, França, Angola, Moçambique<br />

e Brasil (on<strong>de</strong> o projecto tem já cerca<br />

<strong>de</strong> mil entradas).<br />

Em ano <strong>de</strong> centenário da República,<br />

po<strong>de</strong> pensar-se que o Dicionário<br />

aparece também como forma <strong>de</strong> celebrar<br />

a efeméri<strong>de</strong>. Sim e não: os organizadores<br />

assinalam apenas a “feliz<br />

coincidência”. Iniciado em 2000, o<br />

projecto foi pensado para estar concluído<br />

cinco anos <strong>de</strong>pois, mas alguns<br />

atrasos acabaram por ditar a <strong>de</strong>cisão<br />

<strong>de</strong> o publicar em 2010.<br />

Feliz coincidência, já que o dicionário<br />

reflecte agora a evolução plural<br />

da socieda<strong>de</strong> portuguesa neste último<br />

século. Há 100 anos, um projecto <strong>de</strong>stes<br />

seria impensável: já com a República<br />

instaurada, membros <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns<br />

maçónicas protagonizaram perseguições<br />

e humilhações <strong>de</strong> membros <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>ns religiosas — é conhecida a foto<br />

dos republicanos a “medir” o cérebro<br />

<strong>de</strong> padres jesuítas. Hoje, realida<strong>de</strong>s<br />

como essa seriam inconcebíveis e intoleráveis.<br />

Diferentes grupos e sectores que<br />

estiveram em conflito estão, agora,<br />

juntos num mesmo volume. O que<br />

remete para o que os coor<strong>de</strong>nadores<br />

caracterizam como “ecumenismo<br />

cultural” e aprofundamento da <strong>de</strong>mocracia<br />

“também no plano cultural<br />

e científico”.<br />

Na introdução geral, escrevem a<br />

propósito os responsáveis do dicionário:<br />

“Alguns perguntarão pelas razões<br />

que presi<strong>de</strong>m à integração numa<br />

mesma obra <strong>de</strong> instituições aparentemente<br />

tão diversas como as or<strong>de</strong>ns<br />

religiosas católicas e as or<strong>de</strong>ns maçónicas.<br />

Tanto mais que, nomeadamente<br />

estes dois tipos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns, viveram,<br />

num <strong>de</strong>terminado período do curso<br />

da sua história, experiências fracturantes<br />

<strong>de</strong> hostilida<strong>de</strong> grave e estiveram<br />

<strong>de</strong> costas voltadas umas para as<br />

outras, digladiando-se em polémicas<br />

<strong>de</strong> carácter i<strong>de</strong>ológico, disputando<br />

espaços <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, particularmente<br />

ao longo do séc. XIX e primeiras décadas<br />

do séc. XX, período em que a<br />

questão religiosa subiu ao rubro!”<br />

O que une, então, esta tão gran<strong>de</strong><br />

diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instituições? Des<strong>de</strong><br />

logo, o nome (or<strong>de</strong>m, congregação,<br />

associação em alguns casos) e os aspectos<br />

formais que as constituem<br />

(uma regra, uma constituição ou um<br />

estatuto).<br />

Num estudo publicado há quatro<br />

anos na revista “Brotéria”, em que se<br />

apresentava o projecto, José Augusto<br />

Mourão falava da noção <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m no<br />

discurso e no sentido <strong>de</strong> pertença às<br />

instituições religiosas: “A noção <strong>de</strong><br />

or<strong>de</strong>m evoca <strong>de</strong> imediato a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

relação entre um antes (‘prius’) e um<br />

<strong>de</strong>pois (‘posterius’), as partes e o todo.<br />

Em matemática como em tudo.<br />

Os valores trazem a ganga da história<br />

que os <strong>de</strong>u à luz. (…) A noção <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m<br />

apela à noção <strong>de</strong> tempo, <strong>de</strong> espaço,<br />

<strong>de</strong> normativo, <strong>de</strong> comum, <strong>de</strong><br />

conexão.”<br />

Para além <strong>de</strong>sses aspectos, há ainda,<br />

no universo <strong>de</strong>stas organizações,<br />

uma dimensão ritual, iniciática e integradora<br />

comuns a todas elas. O tempo,<br />

aliás, é uma nota dominante no<br />

universo das or<strong>de</strong>ns religiosas — das<br />

quais serão reproduzidos outros mo<strong>de</strong>los,<br />

como adiante se verá: é o tempo<br />

que organiza a vida <strong>de</strong>ssas comunida<strong>de</strong>s,<br />

à volta <strong>de</strong> momentos rituais<br />

como a oração, a refeição ou a liturgia.<br />

Um tempo que se impregna <strong>de</strong><br />

quotidiano, mas que está para além<br />

<strong>de</strong>le. Um tempo vivido sem pressas,<br />

na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> harmonizar circunstância<br />

e intemporalida<strong>de</strong>, conjuntura e eternida<strong>de</strong>.<br />

Um mundo que mudou<br />

Não é por acaso que predominam no<br />

dicionário as or<strong>de</strong>ns religiosas católicas.<br />

O i<strong>de</strong>ário que organiza estas instituições,<br />

nota José Eduardo Franco<br />

em conversa com o Ípsilon, bem co-<br />

RUI GAUDÊNCIO<br />

Um dicionário<br />

que vem<br />

pôr or<strong>de</strong>m nas<br />

or<strong>de</strong>ns<br />

Or<strong>de</strong>ns religiosas junto <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns<br />

maçónicas e esotéricas, or<strong>de</strong>ns<br />

profissionais e militares. Um<br />

dicionário inédito acaba <strong>de</strong> ser<br />

publicado em Portugal, recenseando<br />

todas as or<strong>de</strong>ns e instituições afins.<br />

O projecto será imitado em vários<br />

países. António Marujo<br />

16 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


mo as etapas do processo <strong>de</strong> integração,<br />

apresentam processos semelhantes<br />

entre diferentes tipos <strong>de</strong> or<strong>de</strong>ns.<br />

Aos votos religiosos correspon<strong>de</strong>m,<br />

por exemplo, os graus maçónicos ou<br />

os diferentes processos <strong>de</strong> integração<br />

profissional.<br />

“São processos <strong>de</strong>calcados da experiência<br />

monástica, mais evi<strong>de</strong>ntes<br />

no caso da maçonaria”, diz o investigador.<br />

No caso das or<strong>de</strong>ns civis ou<br />

honoríficas, é o tipo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ário que as<br />

organiza — seja regra, constituição ou<br />

estatuto — que se assemelha ao das<br />

or<strong>de</strong>ns religiosas. “O religioso continua<br />

a mo<strong>de</strong>lar muitas experiências<br />

sociais contemporâneas”, diz José<br />

Eduardo Franco. Mas esta diversida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> instituições evi<strong>de</strong>ncia também<br />

um mundo que mudou: <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong><br />

“unificada pelo religioso”<br />

para uma era <strong>de</strong> secularização e <strong>de</strong><br />

autonomização da vida social em relação<br />

ao sagrado.<br />

Apesar <strong>de</strong>ssa evolução, percebe-se<br />

a relação <strong>de</strong> diálogo ou tensão em que<br />

estas instituições se foram estabelecendo<br />

com o restante corpo social.<br />

Bastará, aliás, folhear a obra num primeiro<br />

olhar para se perceber essa<br />

relação na diversida<strong>de</strong> dos factores:<br />

a influência na arquitectura ou nas<br />

artes, os fundos patrimoniais, a acção<br />

social ou caritativa, a participação em<br />

<strong>de</strong>bates culturais ou políticos da socieda<strong>de</strong><br />

portuguesa…<br />

Deslizes e excessos<br />

O rigor factual, histórico e documental<br />

das entradas é apreciável. Mas há pequenos<br />

<strong>de</strong>slizes <strong>de</strong> linguagem que <strong>de</strong>veriam<br />

ter sido evitados: a utilização<br />

<strong>de</strong> expressões como “Santo Padre”<br />

(mais própria do interior do catolicismo)<br />

em vez <strong>de</strong> Papa, por exemplo (p.<br />

662); ou a adjectivação por vezes utilizada,<br />

sobretudo quando se fala da actualida<strong>de</strong><br />

e não existe ainda suficiente<br />

distância histórica (“gran<strong>de</strong> figura <strong>de</strong><br />

referência espiritual”, p. 644).<br />

Aliás, no que respeita aos mais recentes<br />

movimentos católicos, a controvérsia<br />

que essas instituições ainda hoje<br />

levantam é quase omitida. É o exemplo<br />

da entrada sobre a Comunhão e<br />

Libertação, grupo nascido nos meios<br />

universitários italianos, que se i<strong>de</strong>ntifica,<br />

entre outras coisas, pelo anúncio<br />

militante do cristianismo, pela afirmação<br />

da unida<strong>de</strong> em torno do Papa e<br />

pela a<strong>de</strong>são à moral tradicional veiculada<br />

pela hierarquia católica.<br />

Noutro caso como a Opus Dei, apenas<br />

se apresentam as críticas genéricas<br />

que se fazem à instituição e os<br />

argumentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa que esta costuma<br />

utilizar: o secretismo confundido<br />

com o recato, o conservadorismo<br />

e as elites contra o trabalho em “todos<br />

os meios sociais”, o po<strong>de</strong>r económico<br />

versus “os orçamentos muito mo<strong>de</strong>stos”<br />

<strong>de</strong> parte dos membros, as críticas<br />

a “O Código Da Vinci” que “erradamente<br />

fantasia e colabora” para a<br />

“lenda negra” da Opus Dei… Mas tudo<br />

isto é enumerado sem qualquer aprofundamento<br />

<strong>de</strong> dados que sustentem<br />

os argumentos evocados.<br />

Se a distância é mais difícil em relação<br />

a aspectos actuais, a adjectivação<br />

ou a formulação genérica sem os<br />

factos que a fundamentem <strong>de</strong>veriam<br />

ter sido evitadas.<br />

Estes movimentos e associações<br />

contemporâneas são aqui apresentados<br />

também com razões que se justificam<br />

na respectiva introdução — e<br />

que se aceitam. Elas “são her<strong>de</strong>iras,<br />

Diferentes grupos e<br />

sectores que<br />

estiveram em conflito<br />

estão, agora, juntos<br />

num mesmo volume.<br />

Esta diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

instituições evi<strong>de</strong>ncia<br />

um mundo que<br />

mudou: <strong>de</strong> uma<br />

socieda<strong>de</strong> “unificada<br />

pelo religioso” para<br />

uma era <strong>de</strong><br />

autonomização da<br />

vida social em relação<br />

ao sagrado<br />

ou comungam, <strong>de</strong> elementos representativos,<br />

colhidos na milenar experiência<br />

ascética e institucional do<br />

monaquismo católico”.<br />

Se há excessos em alguns casos,<br />

noutros, como na entrada respeitante<br />

ao Gran<strong>de</strong> Oriente Lusitano, pecase<br />

por <strong>de</strong>feito, ficando-se com a sensação<br />

<strong>de</strong> que muito ficou por dizer.<br />

Com tudo o que já há publicado sobre<br />

a instituição e a sua história, a entrada<br />

respectiva <strong>de</strong>veria ser mais completa.<br />

Durante este ano serão ainda publicados<br />

os primeiros <strong>de</strong> oito dicionários<br />

reunindo os diferentes temas:<br />

or<strong>de</strong>ns católicas; or<strong>de</strong>ns <strong>de</strong> inspiração<br />

franciscana; or<strong>de</strong>ns maçónicas;<br />

or<strong>de</strong>ns honoríficas; or<strong>de</strong>ns profissionais;<br />

or<strong>de</strong>ns hindus e budistas; or<strong>de</strong>ns<br />

esotéricas; or<strong>de</strong>ns templárias.<br />

Cada um <strong>de</strong>stes volumes a publicar<br />

em separado terá entradas mais <strong>de</strong>senvolvidas<br />

em relação à versão original.<br />

A Aletheia acaba <strong>de</strong> publicar<br />

também um volume <strong>de</strong>dicado apenas<br />

à Or<strong>de</strong>m dos Pregadores, ou Dominicanos,<br />

da responsabilida<strong>de</strong> do mesmo<br />

Gabinete <strong>de</strong> Estudos das Or<strong>de</strong>ns criado<br />

para assegurar a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong>stes<br />

projectos.<br />

Este Dicionário das Or<strong>de</strong>ns terá<br />

uma outra continuação: entre os dias<br />

2 e 5 <strong>de</strong> Novembro próximo, um gran<strong>de</strong><br />

congresso internacional aprofundará<br />

a “Memória, Presença e Diásporas”<br />

das or<strong>de</strong>ns e congregações religiosas<br />

em Portugal. A dimensão po<strong>de</strong><br />

medir-se também pelo facto <strong>de</strong>, inicialmente,<br />

o congresso estar previsto<br />

para dois dias. Há 200 intervenções<br />

já previstas entre 700 participantes<br />

inscritos, sobre áreas tão distintas<br />

quanto a história da arte, a assistência,<br />

a cultura, a missionação ou a relação<br />

com a política.<br />

A última etapa será, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> publicados<br />

os diferentes volumes, a disponibilização<br />

da informação em suporte<br />

digital, com actualização permanente.<br />

Uma nota sobre a iconografia e o<br />

tratamento gráfico: como, em muitos<br />

casos, a ilustração esteve <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />

dos arquivos das instituições, acabam<br />

por coexistir bons exemplos <strong>de</strong><br />

tratamento (icono)gráfico, a par <strong>de</strong><br />

outros menos interessantes.<br />

No primeiro caso, estão sobretudo<br />

as or<strong>de</strong>ns mais antigas, on<strong>de</strong> é possível<br />

recorrer a peças <strong>de</strong> arte, monumentos<br />

ou símbolos mais marcantes<br />

(é o caso <strong>de</strong> algumas or<strong>de</strong>ns religiosas,<br />

mas também maçónicas). No segundo,<br />

<strong>de</strong>vem referir-se sobretudo<br />

instituições mais contemporâneas,<br />

como suce<strong>de</strong> com as or<strong>de</strong>ns profissionais.<br />

Por exemplo, o friso <strong>de</strong> bastonários<br />

da Or<strong>de</strong>m dos Médicos Veterinários<br />

era evitável. Deveria mesmo<br />

ter-se optado por não reproduzir fotos<br />

<strong>de</strong> actuais dirigentes das diferentes<br />

instituições, evitando o aspecto<br />

“<strong>de</strong>sactualizado” que a obra po<strong>de</strong>rá<br />

aparentar assim que um <strong>de</strong>sses dirigentes<br />

mu<strong>de</strong>.<br />

Esta limitação reflecte-se também<br />

no <strong>de</strong>senho gráfico <strong>de</strong> algumas páginas,<br />

menos cuidadoso. E não ajuda o<br />

facto <strong>de</strong> a bibliografia não aparecer<br />

num corpo <strong>de</strong> letra diferente do resto<br />

do texto — o que marcaria uma ruptura<br />

mais evi<strong>de</strong>nte entre as diferentes<br />

entradas.<br />

Outro pormenor: em alguns casos,<br />

as legendas <strong>de</strong> fotos ou ilustrações<br />

<strong>de</strong>notam falta <strong>de</strong> edição: on<strong>de</strong> se lê<br />

apenas “Fundador” ou um mais extenso<br />

“Soberano Gran<strong>de</strong> Comendador<br />

do Supremo Conselho <strong>de</strong> Portugal”<br />

<strong>de</strong>veriam, antes, ler-se os nomes<br />

respectivos.<br />

Nota final: fala-se, ainda, em instituições<br />

“dicionarizadas” e em “siglários”.<br />

Numa época em que a língua<br />

portuguesa é tão pontapeada em tantos<br />

lados, uma obra como esta <strong>de</strong>veria<br />

ter tido a cautela <strong>de</strong> evitar neologismos<br />

feios e <strong>de</strong>snecessários.<br />

Pormenores, todos eles, a merecer<br />

revisão nas futuras edições parciais,<br />

mas que só reafirmam o ineditismo,<br />

relevância e abrangência <strong>de</strong>sta obra.<br />

Livros<br />

SÁB 24 JUL<br />

22:00 PRAÇA | € 15<br />

Camané tem feito um percurso<br />

singular como intérprete <strong>de</strong><br />

eleição do fado contemporâneo.<br />

Foram muitos os prémios que<br />

recebeu e muitas as colaborações<br />

com músicos das áreas mais<br />

diversas. Com um novo álbum na<br />

calha, esta voz fundamental da<br />

música portuguesa apresenta<br />

um concerto recheado <strong>de</strong><br />

êxitos <strong>de</strong> carreira.<br />

JANTAR+CONCERTO € 30<br />

No dicionário<br />

agora<br />

publicado<br />

predominam<br />

as or<strong>de</strong>ns<br />

religiosas<br />

católicas<br />

APOIO<br />

PATROCINADOR<br />

VERÃO NA CASA<br />

MECENAS CASA DA MÚSICA<br />

APOIO INSTITUCIONAL<br />

MECENAS PRINCIPAL CASA DA MÚSICA<br />

PATROCINADOR VERÃO NA CASA<br />

SEJA UM DOS PRIMEIROS A APRESENTAR HOJE ESTE JORNAL NA CASA DA MÚSICA E GANHE UM CONVITE DUPLO<br />

PARA O CONCERTO DE CAMANÉ. OFERTA LIMITADA AOS PRIMEIROS 10 LEITORES.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 17


São José Almeida abriu<br />

dos homossexuais na<br />

“Os Homossexuais no Estado Novo” traça a homossexualida<strong>de</strong> (masculina e feminina) d<br />

do século XX português. Raquel Ribeiro<br />

Livros<br />

Na apresentação do livro “Os Homossexuais<br />

no Estado Novo”, <strong>de</strong> São José<br />

Almeida (ed. Sextante), há um mês,<br />

no Porto, a poeta e professora universitária<br />

Ana Luísa Amaral começava<br />

por questionar, citando Judith Butler<br />

(uma das mais proeminentes investigadoras<br />

americanas em estudos “queer”<br />

e activista <strong>de</strong> direitos LGBT), qual<br />

a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se falar em direitos<br />

dos homossexuais quando a Palestina<br />

ainda estava sob domínio israelita.<br />

Resposta <strong>de</strong> Butler: “Tudo tem a ver<br />

com a violência, por isso é impossível<br />

estabelecer priorida<strong>de</strong>s.”<br />

Ao Ípsilon, Ana Luísa Amaral completou<br />

esta i<strong>de</strong>ia, explicando, a propósito<br />

do livro da jornalista do PÚBLI-<br />

CO São José Almeida, que “a forma<br />

mais conservadora <strong>de</strong> dar priorida<strong>de</strong><br />

a <strong>de</strong>terminados assuntos é dizer que<br />

assuntos políticos, como a crise económica,<br />

são mais importantes”. “Não<br />

me parece: todos eles exibem violência.<br />

Uma socieda<strong>de</strong> que resolve as<br />

suas crises económicas, mas não resolve<br />

as suas crises sociais e <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>,<br />

é uma socieda<strong>de</strong> injusta também.”<br />

Nesse sentido, continua Amaral,<br />

“Os Homossexuais no Estado<br />

Novo” é um livro “completamente<br />

político, porque os assuntos <strong>de</strong> visibilida<strong>de</strong><br />

são sempre políticos, digam<br />

respeito aos sem-abrigo, aos homossexuais<br />

ou às mulheres”.<br />

Esta obra começou por ser uma<br />

investigação jornalística <strong>de</strong> São José<br />

Almeida sobre como viviam os homossexuais<br />

durante o Estado Novo,<br />

publicada na revista “Pública” no Verão<br />

<strong>de</strong> 2009. A autora explica na introdução<br />

que a investigação não parou<br />

aí, ainda que este seja um princípio,<br />

“um livro inacabado”, ou até<br />

uma porta que se abre para um caminho<br />

que a socieda<strong>de</strong> portuguesa<br />

<strong>de</strong>verá percorrer <strong>de</strong> forma a “revisitar<br />

a história”, e “se reencontrar consigo<br />

mesma”. É altura, escreve, “<strong>de</strong><br />

Portugal começar a ajustar contas<br />

com a História”.<br />

Uma história <strong>de</strong> Portugal<br />

São José Almeida colige uma pesquisa<br />

totalmente original reunindo uma<br />

série <strong>de</strong> vozes <strong>de</strong> especialistas portugueses<br />

e estrangeiros, <strong>de</strong> testemunhos<br />

pessoais, <strong>de</strong> investigações, mas<br />

também recorrendo a um enquadramento<br />

teórico, científico e jurídico<br />

das problemáticas envolvendo a homossexualida<strong>de</strong><br />

no século XX português.<br />

António Fernando Cascais, professor<br />

na Universida<strong>de</strong> Nova <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong><br />

e especialista em história da<br />

homossexualida<strong>de</strong> em Portugal , é<br />

uma das fontes fundamentais usadas<br />

pela jornalista para compor a história<br />

dos homossexuais durante a ditadura.<br />

Ao Ípsilon afirma que esta investigação<br />

“é uma incursão num terreno<br />

que não estava pura e simplesmente<br />

<strong>de</strong>sbravado”.<br />

Almeida traça a história da homossexualida<strong>de</strong><br />

em Portugal entre 1912<br />

(ano da Lei sobre a Mendicida<strong>de</strong>) e<br />

1982, quando entra em vigor o novo<br />

Código Penal (<strong>de</strong> que foram eliminados<br />

os artigos 70º e 71º, referentes<br />

àqueles que “se entreguem habitualmente<br />

à pratica <strong>de</strong> vícios contra a natureza”).<br />

A autora mostra como a<br />

homossexualida<strong>de</strong> é a “sexualida<strong>de</strong><br />

transgressora numa socieda<strong>de</strong> patriarcal”,<br />

sublinhando dois eixos no<br />

contexto português: um referente à<br />

“diferença <strong>de</strong> classe social, a diversida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> tratamento para quem é das<br />

elites e das aristocracias do regime e<br />

para quem é do povo”; e outro relacionado<br />

com os não-ditos, os silenciamentos,<br />

a “inexistência <strong>de</strong> uma<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>” que permita uma noção<br />

<strong>de</strong> comunida<strong>de</strong>, “partilha <strong>de</strong> grupo”,<br />

Mário Cesariny Figura maior do surrealismo português, “foi um<br />

dos homossexuais portugueses que mais se expôs publicamente na<br />

assunção plena da sua homossexualida<strong>de</strong>”, transformando-se “numa<br />

figura <strong>de</strong> referência da homossexualida<strong>de</strong> portuguesa durante o Estado<br />

Novo”. O poeta “sempre se assumiu como um ser com uma sexualida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sviante, como um ser estigmatizado <strong>de</strong>vido à sua não-inserção no<br />

padrão <strong>de</strong> família patriarcal e heterosexual”.<br />

ADRIANO MIRANDA<br />

18 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


o armário<br />

ditadura<br />

PEDRO CUNHA<br />

) durante o Estado Novo, reescrevendo a história<br />

PEDRO CUNHA<br />

A história dos<br />

homossexuais no<br />

Estado Novo é<br />

coinci<strong>de</strong>nte com a<br />

história do país nesse<br />

período. A repressão e<br />

exclusão social a que<br />

estavam sujeitos<br />

relegou-os para uma<br />

semi-clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong><br />

comum durante estes anos. Ouvindo<br />

um número consi<strong>de</strong>rável <strong>de</strong> testemunhas<br />

que contam, em primeira mão,<br />

as suas experiências vividas sob a ditadura,<br />

São José Almeida <strong>de</strong>monstra<br />

os dois pesos e as duas medidas do<br />

regime relativamente aos homossexuais<br />

(das elites e das classes baixas),<br />

tendo em conta como a “repressão e<br />

a exclusão social a que estavam votados<br />

no Estado Novo levavam a que a<br />

sua vivência — em que a sexualida<strong>de</strong><br />

ocupa um lugar central, como em todas<br />

as pessoas — fosse relegada para<br />

uma semi-clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong>, uma espécie<br />

<strong>de</strong> submundo, muitas vezes<br />

i<strong>de</strong>ntificados como os ‘bas-fonds’ e o<br />

crime”.<br />

Este trabalho mostra, assim, como<br />

a história dos homossexuais no Estado<br />

Novo é, no fundo, coinci<strong>de</strong>nte com<br />

a história do próprio país durante esse<br />

período e da resistência ao regime.<br />

“Evi<strong>de</strong>ntemente que os homossexuais,<br />

enquanto grupo, nunca é apenas<br />

aquilo que é: é aquilo que é mais o<br />

que lhe acontece. É uma história do<br />

país durante esse período, uma história<br />

do regime e das suas características”,<br />

explica Cascais.<br />

Ana Luísa Amaral diz que a obra<br />

“dá voz às vozes que estiveram em<br />

silêncio durante esse período”, e são<br />

os testemunhos que a professora diz<br />

po<strong>de</strong>rem vir a ser úteis nas suas aulas<br />

<strong>de</strong> Introdução aos Estudos Feministas,<br />

na Universida<strong>de</strong> do Porto, por<br />

exemplo: “Alguns testemunhos são<br />

muito importantes, pungentes, até.<br />

Esta disciplina po<strong>de</strong> sensibilizar os<br />

alunos para questões sobre o outro,<br />

apren<strong>de</strong>r a ver o outro como um semelhante.<br />

Quem está ali podia ser<br />

eu. Mas [os testemunhos] também<br />

[servem] para os alunos se chocarem<br />

e se sensibilizarem com a estupi<strong>de</strong>z<br />

da violência pela qual estas pessoas<br />

tiveram <strong>de</strong> passar.” A noção <strong>de</strong> testemunho<br />

é sublinhada por Cascais<br />

que diz que “Os Homossexuais no<br />

Estado Novo” é, em termos metodológicos,<br />

“uma história oral, na primeira<br />

pessoa”. Mas há uma “relevância<br />

histórico-política” que tem que<br />

ver com a “dar voz a quem não a tinha,<br />

reescrever a história noutros<br />

termos que não nos existentes: os<br />

do silenciamento, do enviesamento,<br />

dando rosto a estereótipos, humanizando-os.”<br />

Natália Correia É um dos exemplos da “clan<strong>de</strong>stinida<strong>de</strong> em que era<br />

vivido o lesbianismo e a sua invisibilida<strong>de</strong> pública era uma realida<strong>de</strong><br />

mesmo no meio artístico”. A poeta frequentava o círculo <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong>s na<br />

casa <strong>de</strong> Fernanda <strong>de</strong> Castro (mulher <strong>de</strong> António Ferro, chefe <strong>de</strong><br />

propaganda do regime) “que se juntava em férias no Algarve, [e que] era<br />

claramente um círculo <strong>de</strong> relações homossexuais”, conta António<br />

Fernando Cascais no livro.<br />

Poetas e escritores, pioneiros<br />

Salientando sempre a diferença <strong>de</strong><br />

classes que se estabelecia na “comunida<strong>de</strong>”<br />

homossexual em Portugal<br />

(entre aspas porque, precisamente,<br />

essa comunida<strong>de</strong> não existia enquanto<br />

tal), a autora recorre a exemplos<br />

das artes e da literatura que, até certo<br />

ponto, foram pioneiros <strong>de</strong> uma<br />

forma <strong>de</strong> sentir a sexualida<strong>de</strong> durante<br />

a ditadura (António Botto, Eugénio<br />

<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>, Mário <strong>de</strong> Cesariny, Natália<br />

Correia, João Villaret, entre muitos<br />

outros). Essa é também a leitura<br />

<strong>de</strong> Eduardo Pitta no livro “Fractura<br />

— A condição homossexual na literatura<br />

portuguesa contemporânea”<br />

(2003), on<strong>de</strong> textos <strong>de</strong> autores portugueses<br />

são analisados segundo uma<br />

perspectiva “gay” ou “queer”.<br />

Nos anos 20, “uma nova or<strong>de</strong>m se<br />

anuncia”, com a censura dos livros e<br />

posterior ostracização dos poetas Judith<br />

Teixeira, Raul Leal e António Botto.<br />

Botto foi saneado e exilou-se no<br />

Brasil no final dos anos 40. Citando<br />

Cascais, a autora escreve: “A partir<br />

daí, a homossexualida<strong>de</strong> exprime-se<br />

na literatura <strong>de</strong> forma cifrada, críptica.<br />

[...] Ninguém queria ter a sorte <strong>de</strong><br />

Botto e <strong>de</strong> Teixeira, o próprio Eugénio<br />

<strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> disse que não queria pagar<br />

em vida o que Botto pagou.” Só<br />

mais tar<strong>de</strong>, na geração dos surrealistas<br />

com Cesariny (o “único homossexual<br />

português?”, pergunta ironicamente<br />

Almeida), com Natália Correia<br />

e Ary dos Santos haveria uma maior<br />

abertura (social e até política) relativamente<br />

à homossexualida<strong>de</strong>.<br />

A referência a figuras <strong>de</strong> proa da<br />

literatura portuguesa po<strong>de</strong> ser polémica,<br />

nomeadamente no que diz<br />

respeito ao caso Jorge <strong>de</strong> Sena, já<br />

falecido, mas cuja família está ainda<br />

hoje viva. Ana Luísa Amaral diz que<br />

o livro <strong>de</strong> Almeida levanta a questão<br />

dos limites entre o público e o privado<br />

<strong>de</strong> “forma interessante”: até<br />

que ponto, pergunta Amaral, “é que<br />

se <strong>de</strong>ve questionar a eventual homossexualida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Jorge <strong>de</strong> Sena<br />

partindo ou <strong>de</strong> entrevistas, ou do<br />

texto do autor? É complexo e polémico.<br />

Essa questão é saudável porque<br />

po<strong>de</strong> levantar um <strong>de</strong>bate interessante<br />

sobre a crítica literária em<br />

Portugal.”<br />

Fernando Lopes Graça Músico e compositor, pertenceu ao PCP e<br />

foi um opositor do regime <strong>de</strong> Salazar. Cesariny apren<strong>de</strong>u música com<br />

ele. Era amigo <strong>de</strong> Ary dos Santos, “homossexual absolutamente<br />

assumido e explícito na noite lisboeta”, nos anos 60. O dirigente do PCP<br />

Ruben <strong>de</strong> Carvalho conta no livro: “Fernando Lopes Graça <strong>de</strong>scobriu-se<br />

comunista e homossexual ao mesmo tempo; o Ary, primeiro, percebeu<br />

que era homossexual e, <strong>de</strong>pois, que era comunista”.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 19


MANUEL ROBERTO<br />

Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> Nunca afirmou a sua homossexualida<strong>de</strong>,<br />

mas era pública. Foi provavelmente marcado pela ostracização do poeta<br />

António Botto (no final dos anos 40) <strong>de</strong>vido à assunção da sua<br />

homossexualida<strong>de</strong>. António Fernando Cascais diz, no livro, que<br />

“ninguém queria ter a sorte <strong>de</strong> Botto (...), o próprio Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong><br />

disse que não queria pagar em vida o que Botto pagou”.<br />

O “caso” Sena diz respeito à suposta<br />

homossexualida<strong>de</strong> do autor <strong>de</strong><br />

“Sinais <strong>de</strong> Fogo”, ainda hoje tido por<br />

vários especialistas como um dos romances<br />

pioneiros da literatura “queer”<br />

em Portugal. Citando Fernando<br />

Dacosta, a autora escreve: “[Sena]<br />

casou. Fazia, praticamente, um filho<br />

por ano, o que é uma atitu<strong>de</strong> muito<br />

normal nos homossexuais. Conhecio”.<br />

Dacosta conta (corroborado por<br />

Eduardo Pitta) que Sena foi expulso<br />

da Marinha por ter sido apanhado<br />

com um rapaz. O conto <strong>de</strong> Sena,<br />

“Grã-Canária”, incluído em “As Andanças<br />

do Demónio” é, “nesse sentido,<br />

autobiográfico”, conta Pitta à<br />

autora. São José Almeida explica como<br />

a polémica estalou em 1982 quando<br />

o “Expresso” apresentou um trabalho<br />

<strong>de</strong> Arnaldo Saraiva sobre a<br />

homossexualida<strong>de</strong> em Jorge <strong>de</strong> Sena.<br />

Grupos <strong>de</strong> intelectuais escreveram<br />

cartas inflamadas (e indignadas) sobre<br />

o assunto. Para a autora, o “caso”<br />

Sena é, por isso, exemplar <strong>de</strong> toda a<br />

sua investigação: “Pela forma como<br />

tem sido interpretado e pelas polémicas<br />

que tem gerado, [Sena] é <strong>de</strong>monstrativo<br />

<strong>de</strong> como os passos para<br />

i<strong>de</strong>ntificar as referências que permitam<br />

a construção <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

‘gay’ em Portugal são, muitas vezes,<br />

impossíveis <strong>de</strong> dar até muito tar<strong>de</strong><br />

no século XX português”.<br />

“Os Homossexuais no<br />

Estado Novo” é “uma<br />

história oral, na<br />

primeira pessoa”, que<br />

dá voz a quem esteve<br />

em silêncio nesse<br />

período<br />

Mulheres e linguagem<br />

Além da história oral, o enquadramento<br />

científico e jurídico do homossexual<br />

é uma das mais-valias do livro<br />

<strong>de</strong> Almeida. Com base nas teorias <strong>de</strong><br />

Egas Moniz e Asdrúbal António <strong>de</strong><br />

Aguiar, da década <strong>de</strong> 20 do século<br />

passado, a autora explica que a homossexualida<strong>de</strong><br />

era “vista como doença,<br />

que po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser tratada, e<br />

como perversão, que tem <strong>de</strong> ser corrigida,<br />

a bem da nova or<strong>de</strong>m social<br />

burguesa”. Essa percepção (e as categorias<br />

<strong>de</strong>senvolvidas a partir <strong>de</strong>sta)<br />

dominou o discurso oficial na ditadura.<br />

Para Ana Luísa Amaral, este enquadramento<br />

é uma primeira contribuição<br />

para a criação <strong>de</strong> “um léxico inclusivo<br />

para a cidadania”. Isto quer<br />

dizer que “<strong>de</strong>signações, categorias,<br />

o próprio conceito <strong>de</strong> homossexual<br />

e a sua naturalização, conceitos que<br />

dizem respeito às sexualida<strong>de</strong>s, tornam-se<br />

abertos a toda a socieda<strong>de</strong>”.<br />

O livro mostra, portanto, “como se<br />

esboroaram essas categorias e é um<br />

novo léxico que se vai construir”.<br />

Cascais concorda: “Normalmente, os<br />

homossexuais não têm história, têm<br />

uma tipologia <strong>de</strong> doença, têm uma<br />

patologia.” Com este livro, “isto está<br />

<strong>de</strong>sfeito. A outra coisa que está <strong>de</strong>sfeita<br />

é o preconceito histórico <strong>de</strong> que<br />

uma história dos homossexuais diz<br />

apenas respeito aos homossexuais, é<br />

uma micro-história ou a história <strong>de</strong><br />

uma minoria. Ora, não há histórias<br />

só <strong>de</strong> minorias, porque as minorias<br />

nunca estão isoladas.”<br />

Anna Klobucka, investigadora <strong>de</strong><br />

Estudos Portugueses na Universida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> Massachusetts-Dartmouth, nos<br />

Estados Unidos, tem-se <strong>de</strong>bruçado<br />

sobre questões <strong>de</strong> género e teorias<br />

feminista e “queer” na literatura portuguesa.<br />

“Do meu ponto <strong>de</strong> vista,<br />

que é também o da minha agenda<br />

<strong>de</strong> pesquisa e daquilo que me interessa<br />

pessoalmente, o que me parece<br />

mais útil e original [neste livro] é<br />

que permite <strong>de</strong>senvolver uma perspectiva<br />

<strong>de</strong> análise muito mais bem<br />

informada sobre o que se po<strong>de</strong>ria<br />

chamar, segundo o livro <strong>de</strong> Eve<br />

Sedgwick, a ‘epistemologia do armário<br />

português’.” A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> “armário”<br />

(ou neste caso da sua “abertura”,<br />

com o livro <strong>de</strong> Almeida) é, diz Klobucka,<br />

“um fenómeno universal no<br />

oci<strong>de</strong>nte” que tem a ver com a relação<br />

que a homossexualida<strong>de</strong> estabelece<br />

com o (in)cumprimento “das<br />

regras em vários contextos culturais”.<br />

Mas há diferenças entre países<br />

e épocas: “Usar fontes que se baseiam<br />

na realida<strong>de</strong> dos EUA ou da<br />

Inglaterra, ou mesmo <strong>de</strong> Espanha,<br />

para pensar e analisar o caso português<br />

é <strong>de</strong>slocado.” O contexto português<br />

“é bastante distinto <strong>de</strong> outros<br />

que tenho estudado em obras teóricas<br />

e isso é muito precioso”.<br />

O “armário” aqui aberto está na<br />

voz dos testemunhos, mas também<br />

no facto <strong>de</strong> Almeida tentar estabelecer<br />

sempre uma certa parida<strong>de</strong><br />

entre a homossexualida<strong>de</strong> feminina<br />

e masculina. A autora escreve que,<br />

na história, a “mulher surge sempre<br />

como segunda figura”, e a “concepção<br />

do lesbianismo” é <strong>de</strong>calcada da<br />

dos homens. Nesse sentido, tanto<br />

para Klobucka como para Ana Luísa<br />

Amaral o capítulo <strong>de</strong>dicado ao lesbianismo,<br />

“Mas isso existe?”, é relevante.<br />

Klobucka afirma que a autora<br />

“faz muito com o pouco material que<br />

tem”, dando máxima “inclusivida<strong>de</strong><br />

à esfera do lesbianismo que é particularmente<br />

invisível e usualmente<br />

mal documentada por comparação<br />

à homossexualida<strong>de</strong> masculina na<br />

Pedro Homem <strong>de</strong> Mello O autor do poema<br />

“O rapaz da camisola ver<strong>de</strong>” (1954), cantado por<br />

Amália <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong>pois, “vê os [seus] versos em que<br />

o homoerotismo é cristalinamente assumido serem<br />

silenciados pela censura do pudor hipócrita da<br />

cultura social vigente”. Ainda assim, era protegido<br />

pelo regime, mesmo no “ambiente fechado da<br />

socieda<strong>de</strong> portuense na época”: “A única pessoa que<br />

tinha coragem <strong>de</strong> não se retirar se lhe atirassem<br />

alguma boca era o Eugénio <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. No Pedro<br />

Homem <strong>de</strong> Mello também não se atreviam a tocar”,<br />

diz, no livro, o artista plástico Óscar Alves.<br />

Jorge <strong>de</strong> Sena A suposta homossexualida<strong>de</strong> do<br />

autor <strong>de</strong> “Sinais <strong>de</strong> Fogo” é levantada num trabalho<br />

no “Expresso” em 1982, coor<strong>de</strong>nado por Arnaldo<br />

Saraiva, que <strong>de</strong>u origem a reacções acesas <strong>de</strong><br />

grupos <strong>de</strong> intelectuais portugueses. “Pelos vistos, em<br />

1982, e para alguns intelectuais, a simples alusão à<br />

hipótese <strong>de</strong> homossexualida<strong>de</strong> — imediatamente<br />

excluída com elementos plausíveis — é ainda um<br />

sinal <strong>de</strong> suspeita e perversida<strong>de</strong>. Quem é que é<br />

perverso? Quem simplifica? Quem é o puritano?”,<br />

escreveu Saraiva na altura.<br />

cultura portuguesa”. Klobucka acrescenta<br />

ainda que “a situação das mulheres<br />

portuguesas durante o Estado<br />

Novo era muito diferente do estatuto<br />

social dos homens e naturalmente<br />

a questão homossexual também<br />

tem <strong>de</strong> ser construída <strong>de</strong> uma forma<br />

diferente”.<br />

20 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Mi Ami<br />

Este punk não é<br />

aquilo que pensamos<br />

Os Mi Ami são um ritmo que jorra <strong>de</strong> forma incessante, como se o rock’n’roll se<br />

transformasse em celebração tribal, em funk dilacerado, em violento psica<strong>de</strong>lismo.<br />

Em “Steal Your Face”, o segundo álbum, põem Bob Marley na capa para lançar uma<br />

pergunta: “Como viver num mundo em que tudo é trivializado e transformado<br />

em lixo?” Mário Lopes<br />

Música<br />

Daniel Martin-McCormick, à<br />

esquerda, irrita-se quando lhe<br />

falam em supostas influências<br />

africanas na música dos Mi Ami<br />

Antes, entre 2001 e 2004, existiram<br />

os Black Eyes. Canções <strong>de</strong> guitarras<br />

nervosas e ritmo tenso, com um vocalista<br />

cuja estridência do canto, quase<br />

<strong>de</strong>mencial, potenciava uma sensação<br />

<strong>de</strong> catarse neurótica. Os Black<br />

Eyes, da mesma Washington <strong>de</strong> Fugazi<br />

e Q And Not U, eram uma banda<br />

perfeitamente alinhada numa época<br />

<strong>de</strong> re<strong>de</strong>scoberta e apropriação criativa<br />

<strong>de</strong> pós-punk e da no-wave. Agora<br />

existem os Mi Ami, que continuam a<br />

revelar muita da catarse neurótica dos<br />

Black Eyes, mas são completamente<br />

diferentes, inclassificáveis. Um ritmo<br />

que jorra <strong>de</strong> forma incessante, como<br />

se o rock’n’roll se transformasse em<br />

celebração tribal, em funk dilacerado,<br />

em violento psica<strong>de</strong>lismo que nos<br />

transporta na sua voragem.<br />

Daniel Martin-McCormick, guitarrista<br />

e vocalista dos Mi Ami, ex-guitarrista<br />

e vocalista dos Black Eyes,<br />

canta da mesma forma, mas atinge<br />

uma dimensão diferente. Quando ouvimos<br />

o segundo álbum da banda,<br />

“Steal Your Face”, imaginamos um<br />

trio (Daniel, o baixista Jacob Long,<br />

também vindo dos Black Eyes, e o baterista<br />

Damon Palermo) que aprofundou<br />

a empatia musical ao estado <strong>de</strong><br />

“jam” <strong>de</strong> músicos clássicos <strong>de</strong> jazz:<br />

não há pontes ou refrães, antes música<br />

como um fluxo contínuo que se<br />

vai modulando dinamicamente, enquanto<br />

a guitarra se ergue num turbilhão,<br />

enquanto o “cowbell” surge e<br />

sugere contenção eléctrica para que<br />

o “groove” diabólico se <strong>de</strong>staque.<br />

Daniel Martin-McCormick, agora a<br />

viver em São Francisco mas formado<br />

na fértil e influente cena punk <strong>de</strong> Washington<br />

D.C. — a dos supracitados<br />

Fugazi e da sua mítica editora, a Dischord<br />

—, é um homem que <strong>de</strong>nuncia<br />

no discurso a ética em que cresceu.<br />

Fala <strong>de</strong> forma pausada, pesando as<br />

palavras, tentando assegurar que<br />

transmite com exactidão as i<strong>de</strong>ias que<br />

quer fazer passar. Tem a sua grelha <strong>de</strong><br />

valores bem <strong>de</strong>finida, tão bem <strong>de</strong>finida<br />

quanto a visão musical. “O disco<br />

mostra-nos a tocar ao vivo no estúdio,<br />

é uma ‘performance’ ao vivo e é apenas<br />

nesse sentido que haverá algo <strong>de</strong><br />

‘jazzmen’ na nossa forma <strong>de</strong> operar.”<br />

Dito isto, acrescenta rapidamente,<br />

para não <strong>de</strong>ixar espaço a dúvidas:<br />

“Não funcionamos, <strong>de</strong> todo, em ‘fluxo<br />

<strong>de</strong> consciência’. Isso implicaria reproduzir<br />

o que quer que nos passasse<br />

pela cabeça naquele momento, quando<br />

o que acontece é precisamente o<br />

contrário”. Cada uma das seis longas<br />

canções <strong>de</strong> “Steal Your Face” foi <strong>de</strong>senvolvida<br />

em ensaios durante um<br />

mês antes <strong>de</strong> chegar a estúdio. “Temos<br />

muito bem <strong>de</strong>finido o que estamos a<br />

fazer e aquilo que será a canção antes<br />

<strong>de</strong> a gravarmos. O que fazemos no estúdio<br />

é dar-lhe vida.”<br />

Quando o punk se irrita<br />

Paralelamente a um percurso discográfico<br />

que, em longa duração, conta<br />

com a estreia “Watersports”, editada<br />

em 2009, e o “Steal Your Face” que<br />

agora lançam, os Mi Ami vão mantendo<br />

activida<strong>de</strong> contínua, quer em palco<br />

— o vocalista assegura que as constantes<br />

digressões foram indispensáveis<br />

para que a música “ganhasse<br />

22 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


VIVA A SARDINHA!<br />

14 MAIO / 15 JULHO<br />

contornos muito intensos” —, quer<br />

através da edição <strong>de</strong> “singles” <strong>de</strong> 12<br />

polegadas. Títulos como “African<br />

rhythms”, uma remistura para os<br />

nova-iorquinos Telepathe (“Devil’s<br />

tri<strong>de</strong>nt”) e os padrões rítmicos circulares<br />

que compõem as suas canções,<br />

a par do fascínio recente por toda a<br />

música exterior ao padrão anglo-saxónico,<br />

fazem com que Daniel Martin-McCormick<br />

seja confrontado mais<br />

vezes do que gostaria com supostas<br />

influências africanas. Abordar tal<br />

questão é ver o homem com quem o<br />

Ípsilon conversa irritar-se com o facilitismo<br />

da comparação. É ver o velho<br />

punk <strong>de</strong> Washington passar ao<br />

ataque. “Nos últimos anos todos temos<br />

mais consciência da ‘world music’,<br />

porque antes era difícil obtê-la e<br />

agora está muito disponível. É excitante<br />

ter acesso a toda essa música,<br />

mas chegámos a um ponto em que a<br />

vemos referida constantemente e a<br />

<strong>de</strong>spropósito. Claro que os Konono<br />

nº1 <strong>de</strong>ram alguns dos melhores concertos<br />

que vi na vida e é provável que<br />

alguns dos meus motivos <strong>de</strong> guitarra<br />

sejam influenciados por eles. Mas<br />

quando ouço a nossa música parece<br />

tão óbvio que não estamos a tentar<br />

<strong>de</strong> forma alguma soar africanos que<br />

essas referências <strong>de</strong>ixam-me perplexo.<br />

O Damon [Palermo] não toca bateria<br />

da forma habitual num baterista<br />

rock, mas não anda à procura <strong>de</strong><br />

polirritmos nigerianos. Parece-me<br />

que as pessoas querem ouvi-los na<br />

nossa música, mas nós não procuramos<br />

segui-los.”<br />

Percebemos o <strong>de</strong>sconforto <strong>de</strong> Martin-McCormick.<br />

Não existe realmente<br />

nada <strong>de</strong> “africano” ou <strong>de</strong> “world music”<br />

na música dos Mi Ami. As suas<br />

canções nascem num espaço íntimo,<br />

partilhado por três músicos. É o som<br />

<strong>de</strong> quem <strong>de</strong>scobriu nessa empatia<br />

partilhada a ignição para que algo novo,<br />

feérico, fosse <strong>de</strong>spoletado. É a<br />

música <strong>de</strong> punks que enten<strong>de</strong>m o<br />

punk como espaço <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> total,<br />

que não têm pachorra para discursos<br />

puristas e são avessos a que os cristalizem<br />

numa imagem. “Não sei quão<br />

relevante é o punk como estilo <strong>de</strong>finido<br />

historicamente. Quando comecei<br />

a tocar [em Washington] havia<br />

uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong> bandas vagamente enraizada<br />

na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> punk mas para<br />

quem a noção <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> era mais<br />

importante do que a história do movimento.”<br />

E é aqui que regressamos<br />

a “Steal Your Face”.<br />

O vocalista dos Mi<br />

Ami não gosta <strong>de</strong><br />

Doors nem <strong>de</strong> Bob<br />

Marley. “Não consigo<br />

ouvir a música <strong>de</strong><br />

nenhum <strong>de</strong>sses tipos<br />

sem ver tudo aquilo<br />

que foi construído à<br />

sua volta <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a<br />

morte. Já não tem<br />

qualquer relação com<br />

música”<br />

A piada Bob Marley<br />

Na capa, um Bob Marley retalhado<br />

ganha <strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> vampiro. Na contracapa,<br />

Jerry Garcia, guitarrista dos<br />

Grateful Dead, surge <strong>de</strong>sfigurado. No<br />

interior, Jim Morrison é um fantasma<br />

irreconhecível, um contorno <strong>de</strong> face<br />

sobre o qual foi sobreposta uma figura<br />

feminina. As colagens fotográficas<br />

são, explica Daniel Martin-McCormick,<br />

a ilustração <strong>de</strong> uma pergunta:<br />

“Como viver num mundo em que tudo<br />

é trivializado e transformado em<br />

lixo?”<br />

Ele não gosta <strong>de</strong> Jerry Garcia, acha<br />

que Jim Morrison terá sido um ser humano<br />

intragável e diz que Bob Marley<br />

é uma piada recorrente na banda.<br />

“Não consigo ouvir a música <strong>de</strong> nenhum<br />

<strong>de</strong>sses tipos sem ver tudo aquilo<br />

que foi construído à sua volta <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

a morte. Já não tem qualquer relação<br />

com música”. Os Doors: “Não penso<br />

neles como poesia, penso na cultura<br />

que lhes presta <strong>de</strong>voção, que é repugnante<br />

e pateta.” Bob Marley: “Nem sei<br />

se gosto da música <strong>de</strong>le, sei que o culto<br />

dos fãs é <strong>de</strong>primente. A noção <strong>de</strong><br />

que aquilo correspon<strong>de</strong> a uma i<strong>de</strong>ia<br />

grandiosa <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> quando não<br />

passa <strong>de</strong> um produto vendido aos milhões...<br />

Toda essa conversa revolucionária,<br />

neste contexto, transforma-se<br />

num monte <strong>de</strong> esterco.” Daniel não<br />

chega a abordar Jerry Garcia, mas está<br />

imparável: “E esse processo não<br />

termina ali. Agora temos os Red Hot<br />

Chili Peppers como a nova escola <strong>de</strong><br />

tudo isto. Com um ‘twist’. Música <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> notoriamente inferior que<br />

atinge o mesmo estatuto.”<br />

O vocalista dos Mi Ami, o ex-Black<br />

Eyes que trocou Washington por São<br />

Francisco com uma bolsa para estudar<br />

guitarra clássica — “não toco guitarra<br />

clássica e não era isso que me<br />

interessava para a banda, mas [os estudos]<br />

mudaram a forma como abordo<br />

o instrumento e como me relaciono<br />

com a música como um todo”—,<br />

irá falar-nos então <strong>de</strong> como o aborrece<br />

música que seja “tudo tensão ou<br />

tudo re<strong>de</strong>nção”, sem zonas cinzentas.<br />

Irá dizer-nos que, neste momento,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> todos os concertos e do<br />

tempo passado em ensaios, raramente<br />

discute questões musicais com os<br />

companheiros <strong>de</strong> banda: “Desenvolvemos<br />

uma empatia suficientemente<br />

intensa para dispensar discursos filosóficos”.<br />

Reafirma que vê a música como algo<br />

“muito volátil e abstracto, sem regras”,<br />

e conclui: “Interessa-nos estabelecer<br />

uma ligação forte com o público,<br />

sentir que o hipnotizamos”. O<br />

espaço íntimo que se abre <strong>de</strong> forma<br />

intensa e incontrolável ao exterior.<br />

Sem mediações e sem mistificações.<br />

“It’s the music, man”, diria Jerry Garcia.<br />

Seria das poucas frases que Daniel<br />

Martin-McCormick aprovaria ao lí<strong>de</strong>r<br />

dos Grateful Dead.<br />

Ver crítica pág. 34 e segs.<br />

CINECONCHAS<br />

CINEMA AO AR LIVRE<br />

JULHO, 21H45<br />

QUINTAS, SEXTAS E SÁBADOS<br />

PARQUE DAS CONCHAS<br />

9<br />

10<br />

15<br />

16<br />

17<br />

<br />

<br />

22<br />

23<br />

24<br />

ENTRADA LIVRE / PARA TODAS AS IDADES<br />

A REPÚBLICA<br />

É UMA MULHER<br />

CONCERTO DE ENCERRAMENTO<br />

15 JULHO, 22H<br />

CARMINHO, LURA, MART’NÁLIA<br />

PARTICIPAÇÃO ESPECIAL CARLOS DO CARMO<br />

ALAMEDA D. AFONSO HENRIQUES<br />

ENTRADA LIVRE / M/3<br />

TODA A PROGRAMAÇÃO EM<br />

WWW.FESTASDELISBOA.COM<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

<br />

silva!<strong>de</strong>signers / andré da loba<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 23


Ao terceiro<br />

álbum,<br />

continua a<br />

haver uma<br />

atmosfera <strong>de</strong><br />

intimida<strong>de</strong>,<br />

mas as<br />

canções são<br />

mais<br />

enérgicas<br />

Há três anos, a norueguesa Hanne<br />

Hukkelberg foi responsável por um<br />

concerto inesquecível no Lux, em <strong>Lisboa</strong>.<br />

A sua música é complexa, pequenas<br />

sinfonias pop com jazz, electrónica<br />

e vários exotismos lá <strong>de</strong>ntro.<br />

Po<strong>de</strong>r-se-ia imaginar que na passagem<br />

para palco se iria per<strong>de</strong>r qualquer<br />

coisa <strong>de</strong> essencial, <strong>de</strong> tal maneira a<br />

sua música é habitada por <strong>de</strong>talhes.<br />

Mas não. Não só as proprieda<strong>de</strong>s se<br />

mantiveram intactas, como foram até<br />

apuradas.<br />

Nessa altura, a norueguesa tinha<br />

lançado dois álbuns, “Little Things”<br />

(2005) e “Rykestrasse 68” (2007). Des<strong>de</strong><br />

então criou mais uma obra, “Blood<br />

From Stone” (2009), e será sobre esta<br />

última que o concerto da próxima<br />

quarta-feira, no Teatro Maria Matos,<br />

em <strong>Lisboa</strong>, irá incidir. Se os dois primeiros<br />

registos eram constituídos por<br />

canções minuciosas, <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> insinuação<br />

melódica, retocadas por instrumentos<br />

convencionais mas também<br />

por materiais sónicos menos<br />

convencionais (rodas <strong>de</strong> bicicleta, velhas<br />

máquinas <strong>de</strong> escrever, sinos, copos<br />

e outros apetrechos <strong>de</strong> cozinha),<br />

o novo álbum é diferente.<br />

“Está mais <strong>de</strong> acordo com aquilo<br />

que são as convenções da pop e do<br />

rock, embora também não seja exactamente<br />

isso”, ri-se ela, tentando explicar<br />

o que lhe ia na mente quando<br />

gravou o último álbum. “Estava saturada<br />

<strong>de</strong> fazer música com todos aqueles<br />

instrumentos estranhos que comecei<br />

por utilizar por acaso, e queria<br />

criar qualquer coisa mais convencional,<br />

mas sem esse peso <strong>de</strong> ter <strong>de</strong> ser<br />

segundo a medida padrão. É um álbum<br />

rock, talvez. É um disco <strong>de</strong> grupo,<br />

mais pensado para ser exposto<br />

em palco.”<br />

A formação que vem tocar com ela<br />

reflecte-o. Há três anos pareciam um<br />

bando <strong>de</strong> saltimbancos multi-instrumentistas<br />

em palco. Agora, serão apenas<br />

três. Hanne canta e toca guitarra.<br />

Ivar Grv<strong>de</strong>land ocupa-se da guitarra,<br />

do baixo e dos “samplers”, enquanto<br />

Kenneth Kapstad estará na bateria e<br />

na percussão. “É mais confortável<br />

viajar apenas com dois músicos e é<br />

também, <strong>de</strong> alguma forma, mais <strong>de</strong>safiante.<br />

As canções dos dois primeiros<br />

álbuns eram muito exigentes ao<br />

nível dos pormenores. Estas são mais<br />

<strong>de</strong>scarnadas e mais inteligíveis na<br />

transposição para palco.”<br />

Nas canções dos dois primeiros álbuns<br />

havia uma voz esguia que se<br />

movia por entre um torvelinho <strong>de</strong><br />

pianadas, violinos, banjos, acor<strong>de</strong>ões,<br />

harpas e manipulação <strong>de</strong> sons concretos.<br />

No terceiro, existe uma i<strong>de</strong>ia<br />

<strong>de</strong> composição mais <strong>de</strong>finida. Continua<br />

a haver uma atmosfera <strong>de</strong> intimida<strong>de</strong>,<br />

mas as canções são mais enérgicas<br />

e musculadas. Até a sua forma<br />

<strong>de</strong> cantar está diferente. Menos introspectiva<br />

e sussurrada. Agora sobressai<br />

e é virada para o exterior. Há<br />

três anos, em entrevista, dizia-nos que<br />

preferia ser comparada aos Radiohead<br />

do que à islan<strong>de</strong>sa Björk, como<br />

acontece normalmente. O terceiro<br />

álbum veio dar-lhe razão.<br />

“Na preparação para este disco ouvi<br />

uma série <strong>de</strong> coisas dos anos 80,<br />

Cocteau Twins, Sonic Youth ou Pixies,<br />

que eram algumas das bandas que me<br />

marcaram quando fiz parte <strong>de</strong> bandas<br />

rock antes <strong>de</strong> enveredar por um percurso<br />

solo.” Para além da música,<br />

existe um ou outro elemento que teve<br />

influência na feitura <strong>de</strong> qualquer<br />

disco: lugares, cida<strong>de</strong>s, países. O primeiro<br />

álbum era marcado pela atmosfera<br />

<strong>de</strong> Oslo, “pelas longas viagens <strong>de</strong><br />

bicicleta” pela cida<strong>de</strong>. O segundo era<br />

uma alusão directa aos seis meses que<br />

habitou em Berlim. O terceiro foi concebido<br />

num dos recantos mais isolados<br />

da Noruega, na ilha <strong>de</strong> Senja, 300<br />

quilómetros a norte do círculo polar<br />

Há três anos dizia<br />

que preferia<br />

ser comparada aos<br />

Radiohead do que<br />

à islan<strong>de</strong>sa Björk.<br />

O novo álbum veio<br />

dar-lhe razão<br />

árctico, on<strong>de</strong> permaneceu durante<br />

sete meses.<br />

“Depois <strong>de</strong> ter composto um disco<br />

numa cida<strong>de</strong> tão vibrante como Berlim,<br />

e <strong>de</strong> viajar um pouco por todo o<br />

lado, tinha necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estar num<br />

lugar sossegado. Talvez por isso, como<br />

reacção ao facto <strong>de</strong> estar num<br />

lugar tão tranquilo, o álbum acabou<br />

por adquirir uma forma mais enérgica<br />

do que pensava no início.”<br />

Agora está, outra vez, numa cida<strong>de</strong><br />

agitada. Vive há seis meses em Nova<br />

Iorque, mais exactamente em<br />

Brooklyn, o bairro on<strong>de</strong> parece viver<br />

toda a gente que é gente na música.<br />

Em gestação está um novo álbum.<br />

“Tem sido óptimo estar aqui, dar concertos,<br />

conhecer pessoas, mergulhar<br />

no ambiente, mas não vim para<br />

Brooklyn com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> fazer qualquer<br />

coisa <strong>de</strong> específico. Aconteceu,<br />

apenas. O ambiente on<strong>de</strong> se cria é<br />

importante, mas o mais <strong>de</strong>terminante<br />

é aquilo que se quer, as pessoas<br />

com quem estamos, as possibilida<strong>de</strong>s<br />

e as ferramentas que se têm à mão.”<br />

O seu percurso tem sido feito <strong>de</strong><br />

aparentes contradições. Começou a<br />

cantar no coro da igreja, passou por<br />

bandas <strong>de</strong> metal, acabou a criar fantasias<br />

pop. O disco que vem apresentar<br />

a Portugal é mais pragmático que<br />

os anteriores, mas aquilo que lhe interessa<br />

é a criação <strong>de</strong> um universo<br />

encantado, inspirado em lugares reais.<br />

De preferência, sítios que preencham<br />

uma condição importante — on<strong>de</strong><br />

se possa circular à-vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> bicicleta.<br />

“Não posso viver sem isso.”<br />

Ver agenda <strong>de</strong> concertos pág. 38 e segs.<br />

Música<br />

Os lugares <strong>de</strong><br />

Hanne Hukkelberg<br />

Oslo, Berlim, Ilha <strong>de</strong> Senja, Brooklyn. É esta a geografia íntima <strong>de</strong> Hanne Hukkelberg, a cantora<br />

norueguesa que cria fantasias pop a partir dos lugares on<strong>de</strong> habita. Quarta-feira é a vez <strong>de</strong><br />

<strong>Lisboa</strong>. Vítor Belanciano<br />

24 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


A Optimus Discos lança “Os Dias <strong>de</strong> Raiva”, um projecto original do Pacman.<br />

Vai a www.optimusdiscos.com no teu computador ou telemóvel e faz<br />

download grátis. Aproveita também as edições limitadas nas lojas Fnac<br />

por apenas €4,90. Há um novo som na área.


Miles Cleret <strong>de</strong>u bom<br />

ao Panamá e à Colô<br />

Nunca ninguém tinha posto tão ao claro a gran<strong>de</strong>za da música africana e da América Latina.<br />

SoundWay, Miles Cleret mostrou que os negros estavam muito à frente. Foi ele que nos reedu<br />

Um tipo<br />

precoce, Miles<br />

Cleret tornouse<br />

DJ aos 14<br />

anos e<br />

investiga<br />

música<br />

africana<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os 17<br />

Música<br />

“Em Inglaterra,<br />

a ‘world music’ era<br />

o cúmulo do ‘uncool’.<br />

Eu mostrei-lhes<br />

que não era assim,<br />

que era música com a<br />

qual se podiam<br />

i<strong>de</strong>ntificar”<br />

Ao leme da sua editora SoundWay,<br />

Miles Cleret <strong>de</strong>itou cá para fora alguma<br />

da mais extraordinária música<br />

alguma vez feita: cumbias, salsas,<br />

calypsos, highlife, disco, géneros obscuros<br />

mesmo nos seus países <strong>de</strong> origem,<br />

como o Gana, a Nigéria, a Colômbia<br />

e o Panamá. O príncipe da<br />

“world music” não purista esteve entre<br />

nós.<br />

Seis da tar<strong>de</strong> <strong>de</strong> sábado passado e<br />

ali para os lados da esplanada do Centro<br />

<strong>de</strong> Arte Mo<strong>de</strong>rna da Fundação<br />

Gulbenkian, em <strong>Lisboa</strong>, tudo ia bem:<br />

os passantes apessoavam-se do pequeno<br />

espaço e <strong>de</strong>ixavam-se embalar<br />

pela estranha música que um tipo<br />

com ar pachola ia escolhendo meticulosamente.<br />

Era um cenário familiar — no sentido<br />

em que famílias (pai, mãe, filhos,<br />

avós também) passavam, ouviam,<br />

gostavam e por ali ficavam mais um<br />

pouco. Ao todo, não <strong>de</strong>vem ter estado<br />

mais <strong>de</strong> 30 pessoas <strong>de</strong> cada vez, mas<br />

do que vimos não houve ninguém que<br />

passasse e ficasse indiferente.<br />

Tudo graças ao apurado ouvido do<br />

sujeito que cuidava da selecção dos<br />

vinis, um moço alto, <strong>de</strong> cabelo a ameaçar<br />

chegar aos ombros (com pontas<br />

rebel<strong>de</strong>s “ma non troppo”), vestido<br />

<strong>de</strong> boné e uma camisa preta que nos<br />

dias seguintes trocaria por padrões<br />

havaianos.<br />

O nome <strong>de</strong>le é Miles Cleret e não é<br />

um DJ qualquer a quem a Fundação<br />

Gulbenkian pediu que entretesse os<br />

passantes <strong>de</strong> sábado à tar<strong>de</strong>. Ele é o<br />

fundador e i<strong>de</strong>ólogo da SoundWay,<br />

possivelmente a melhor editora do<br />

mundo no negócio <strong>de</strong> reedições <strong>de</strong><br />

música africana e da América Latina<br />

— ou seja, aquilo a que hoje, com medo,<br />

chamamos música preta.<br />

Miles dobrava-se para as suas malas<br />

e <strong>de</strong> lá saltava um vinil raro, isto vez<br />

após vez após vez, levando as gentes<br />

não a um estado <strong>de</strong> euforia (não há<br />

euforias à tar<strong>de</strong>), mas sim <strong>de</strong> libertação<br />

do corpo sem recurso a drogas<br />

ou excesso <strong>de</strong> álcool. Bastou, para tal,<br />

recorrer a cumbias, salsas, psica<strong>de</strong>lismos,<br />

funks e que mais. Nigérias,<br />

Ganas, Colômbias, Panamás.<br />

Um mundo admirável que, já antes<br />

da SoundWay aparecer, <strong>de</strong>sconfiávamos<br />

existir, mas só graças à editora<br />

<strong>de</strong> Miles pu<strong>de</strong>mos fruir na sua inteireza.<br />

E não coisa pequena: foi Cleret<br />

que tornou homens Victor Olaya, Oscar<br />

Sulley ou Joe Mensah em heróis.<br />

Foi ele quem mais fez pela total reescrita<br />

do cânone musical da segunda<br />

meta<strong>de</strong> do século XX, com as suas<br />

constantes compilações temáticas,<br />

resgatando “singles” esquecidos ou<br />

nunca editados, na sua maior parte<br />

gravados nas décadas <strong>de</strong> 1960 e 1970.<br />

Foi ele que nos mostrou que os negros<br />

estavam muito à frente. Foi ele que<br />

nos reeducou na arte da dança.<br />

O primeiro gran<strong>de</strong> sucesso da SoundWay<br />

surgiu logo<br />

ao primeiro ro CD (antes<br />

só tinha havido “singles”): “Ghana<br />

Soundz”, editado em 2002, mostrava<br />

ao mundo as maravilhas <strong>de</strong> um género<br />

chamado ado “highlife”, feito <strong>de</strong> guitarras<br />

rendilhadas e ritmos em constante<br />

tropeção. Não era uma obraprima<br />

absoluta como “Guitar and The<br />

Gun”, a melhor compilação <strong>de</strong> pre <strong>de</strong>dicada ao “highlife” do Gana,<br />

mas estava perto. E não teria existido<br />

se não fosse a obsessão <strong>de</strong> Cleret.<br />

sem-<br />

Em 200101 Miles estava no Gana, “na<br />

casa <strong>de</strong> um amigo” e o amigo “punha<br />

disco após disco <strong>de</strong> música do Gana”<br />

e os discos eram “ todos espantosos”.<br />

Logo ali, contou-nos Miles, ficou “com<br />

vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> editar aquele material”.<br />

Seguiu-se e o óbvio: “Falei com várias<br />

editoras mas elas não quiseram editar<br />

aquelas canções”. Como é que fazem<br />

aqueles que foram educados na tura punk? DIY, não é? Exacto: “Por<br />

isso, resolvi editar eu próprio”.<br />

cul-<br />

E assim nasceu a SoundWay, apenas<br />

e só para que o mundo, uma pequena<br />

parte do mundo pu<strong>de</strong>sse ouvir<br />

aquelas canções.<br />

Perfil <strong>de</strong> ven<strong>de</strong>dor<br />

Mas mesmo mo isto foi, <strong>de</strong> certa forma,<br />

um acaso. Foi o Gana, como podia ter<br />

sido outro país qualquer. Acontece<br />

que há uma década Cleret “viajava<br />

muito”. Queria “conhecer África” e,<br />

sem saber a que país ir primeiro, op-<br />

tou pelo Gana por uma razão simples:<br />

“Todas as pessoas que eu conhecia<br />

do Gana eram extremamente simpáticas”.<br />

Mal recebeu as negas das editoras,<br />

Cleret, assombrado pela beleza <strong>de</strong><br />

tudo o que ouvira, sou ao Gana <strong>de</strong>cidido<br />

a compilar material<br />

regres-<br />

para editar. Isto,<br />

note-se, não<br />

era a vida <strong>de</strong>le,<br />

mas há<br />

muito que<br />

ele sabia<br />

que mais cedo ou mais tar<strong>de</strong> seria a<br />

sua vida. Durante anos tinha aguentado<br />

com “trabalhos <strong>de</strong> merda só para<br />

po<strong>de</strong>r viajar e comprar discos”. Na<br />

altura em que <strong>de</strong>scobriu o Gana “trabalhava<br />

à comissão, em vendas”. “O<br />

meu pai trabalhava em publicida<strong>de</strong>,<br />

por isso acho que tenho um lado <strong>de</strong><br />

ven<strong>de</strong>dor, que é essencial num negócio<br />

<strong>de</strong>stes”, conta, sem pudores nem<br />

manias (Miles é um tipo absolutamente<br />

à-vonta<strong>de</strong>).<br />

Dessa segunda vez, esteve no Gana<br />

um mês — foi só aí que percebeu “a<br />

quantida<strong>de</strong> enorme <strong>de</strong> música extraordinária<br />

ria que nunca nca tinha saído <strong>de</strong><br />

lá”. Tinha os dias<br />

mais que ocupados:<br />

os:<br />

havia que “fazer listas <strong>de</strong> pessoas soas<br />

com<br />

quem <strong>de</strong>via falar, bater a portas,<br />

ouvir gravações <strong>de</strong> discos<br />

que nunca tinha ouvido”.<br />

Tudo para reunir<br />

suficiente material<br />

para uma compila-<br />

ção.<br />

“Começava a<br />

minha saga às sete<br />

da manhã e acaba<br />

doze ou catorze ho-<br />

ras <strong>de</strong>pois”, conta.<br />

“Em certos dias não<br />

encontrava nada,<br />

enquanto noutros<br />

dava <strong>de</strong> caras<br />

com<br />

um tipo<br />

que<br />

tinha 50<br />

discos. Ia<br />

juntando as pe-<br />

ças e construinn<br />

do uma narrativa<br />

do que foi<br />

aquela música.”<br />

Um mês <strong>de</strong>pois,<br />

“Ghana<br />

Soundz” estava<br />

pronto. Em oito<br />

anos ven<strong>de</strong>u 15 mil<br />

exemplares — ele só<br />

queria que ven<strong>de</strong>sse<br />

quatro mil, <strong>de</strong> modo a<br />

pagar as <strong>de</strong>spesas, “com<br />

as viagens incluídas”.<br />

Do Gana foi para a Nigéria,<br />

a seguir Colômbia e<br />

Panamá. A lista <strong>de</strong> discos<br />

da SoundWay foi-se tornando<br />

gradualmente<br />

mais preciosa:<br />

em 2004<br />

lançou “Afro-Baby: The Revolution of<br />

the Afro-Sound In Nigeria 1970-1979”.<br />

No mesmo ano editou o segundo volume<br />

<strong>de</strong> “Ghana Soundz” e o extraordinário<br />

“The Kings of Benin Urban<br />

Groove 1972-1980”, uma compilação<br />

do melhor da Orchestre Poly-Rhytmo,<br />

que ainda recentemente tocou em<br />

Portugal.<br />

Mas a gran<strong>de</strong> novida<strong>de</strong> veio em<br />

2006, quando lançou “Panama!”, uma<br />

colectânea dos milhentos géneros bastardos<br />

que fizeram furor nas caves do<br />

país durante as décadas <strong>de</strong> 1960 e<br />

1970. Nunca ninguém tinha posto tão<br />

ao claro a gran<strong>de</strong>za da música da Amé-<br />

rica<br />

do<br />

Sul (ex-<br />

26 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


nome<br />

ômbia<br />

Fundador e i<strong>de</strong>ólogo da editora<br />

cou na arte da dança. João Bonifácio<br />

ceptuando os tangos e os sambas dos<br />

países do costume). “Panama!” foi um<br />

sucesso tão gran<strong>de</strong> que, entretanto,<br />

já saíram “Panama! 2” e Panama! 3”,<br />

qual <strong>de</strong>les o melhor.<br />

A seguir veio “Colombia!”, outro<br />

estrondo <strong>de</strong> miscigenação musical.<br />

Seguiram-se várias compilações <strong>de</strong>dicadas<br />

à Nigéria (ao blues, ao highlife,<br />

ao disco local) e um disco inteiro<br />

só com temas do genial guitarrista Sir<br />

Victor Uwaifo, “Guitar-Boy Superstar<br />

1970-1976”. Destaque ainda para o<br />

fabuloso “Tumbelélé”, para “Palenque<br />

Palenque” e para as magistrais<br />

reedições do enorme Geraldo Pino.<br />

Isto, obviamente, é uma obra <strong>de</strong><br />

amor.<br />

“Não sei fazer mais nada”, dizia-nos<br />

Miles no seu jeito <strong>de</strong>sassombrado <strong>de</strong><br />

olhar o mundo. “O meu pai era melómano.<br />

Tornei-me DJ aos 14 anos,<br />

mas não fazia dinheiro nenhum. Isto<br />

é o que sempre me interessou: procurar<br />

discos. Investigo este tipo <strong>de</strong><br />

música <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os 17 anos. Mas mesmo<br />

em Londres, com todas as comunida<strong>de</strong>s<br />

africanas que lá existem, era difícil<br />

ter acesso a estes discos. Só se encontrava<br />

a ponta do icebergue. Na<br />

altura ouvia muito funk americano e<br />

hip-hop. Interessei-me por afrobeat<br />

e foi a partir daí que comecei a ouvir<br />

música africana.”<br />

Durante anos, tudo o que dizia respeito<br />

à SoundWay era feito por Miles.<br />

“Era eu que viajava, escolhia, encontrava<br />

pessoas <strong>de</strong>saparecidas há 35<br />

anos, fazia os contratos, colava as embalagens,<br />

enviava os discos.”<br />

De entre as múltiplas tarefas <strong>de</strong>correntes<br />

da sua função, uma é mais importante<br />

que as outras: escrever os<br />

textos. “Hoje, para ven<strong>de</strong>r os discos,<br />

é preciso oferecer mais que música.<br />

Os textos das nossas compilações são<br />

essenciais para explicar a história da<br />

música, das migrações, da colonização.”<br />

Andar atrás da música<br />

Apenas para que se perceba como<br />

esta indústria é pequena, conte-se a<br />

história que levou à feitura <strong>de</strong> “Panama!”.<br />

“Eu tinha encontrado uns discos<br />

no eBay e, mal os ouvi, comprei<br />

bilhetes <strong>de</strong> avião para ir lá. Depois,<br />

acabei por falar com o tipo a quem<br />

tinha comprado coisas no eBay, o Enrico,<br />

que morava na Costa Rica e me<br />

ajudou a procurar as coisas certas.”<br />

Tão simples quanto isto: um tipo que<br />

ele nunca tinha visto ajudou-o a encontrar<br />

os discos certos. “Não tenho<br />

dúvidas que não teria este sucesso<br />

sem a Internet”, conta.<br />

“Isto é um mercado muito pequeno,<br />

mas alguns <strong>de</strong>stes tipos que agora reeditamos<br />

eram gran<strong>de</strong>s estrelas antigamente.<br />

Alguns não acreditam que<br />

na melhor das hipóteses só ven<strong>de</strong>mos<br />

10 mil discos. Porque antes vendiam<br />

facilmente 100 mil. Claro que não estão<br />

cheios <strong>de</strong> dinheiro, porque em muitos<br />

casos foram enganados por produtores<br />

que só queriam o dinheiro.”<br />

O mais porreiro <strong>de</strong>stes anos a divulgar<br />

música “é que algumas faixas<br />

foram usadas em filmes ou sampladas<br />

por tipos do hip-hop em canções que<br />

acabaram vendidas em anúncios —<br />

tipos como Usher. Graças a ele, já pu<strong>de</strong><br />

entregar um cheque <strong>de</strong> 40 mil<br />

dólares a músicos que não faziam dinheiro<br />

há muitos anos”.<br />

O curioso é verificar como entretanto<br />

as coisas mudaram: “Voltei ao<br />

Gana há pouco tempo e os discos agora<br />

valem <strong>de</strong>z vezes mais na rua”. Sempre<br />

<strong>de</strong> pés na terra, Miles <strong>de</strong>sconfia<br />

que a febre actual com Ganas e Nigérias<br />

“não vai durar, como a febre com<br />

o reggae ou o funk não duraram”. E,<br />

sem vergonhas, diz que vai “ficar cansado<br />

disto”. “Não da música”, acrescenta,<br />

“mas <strong>de</strong> andar atrás <strong>de</strong>la”.<br />

Mas, ao menos, já <strong>de</strong>ixou um legado.<br />

“Em Inglaterra, a ‘world music’<br />

era o cúmulo do ‘uncool’. As pessoas<br />

pensavam em música <strong>de</strong> África e da<br />

América Latina como ‘world music’<br />

e eu mostrei-lhes que não era assim,<br />

mostrei-lhes que era música com a<br />

qual se podiam i<strong>de</strong>ntificar.”<br />

Os brancos “cool” agora po<strong>de</strong>m<br />

dançar ao som <strong>de</strong> pretos “uncool”<br />

que ninguém conhece. E isso só dá<br />

saú<strong>de</strong>.<br />

Ver crítica <strong>de</strong> discos pág. 34 e segs.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 27


Teatro<br />

À frente do importante Théâtre <strong>de</strong> le<br />

Ville, em Paris, Emmanuel Demarcy-<br />

Mota, 40 anos, filho <strong>de</strong> pai francês e<br />

mãe portuguesa, habita o teatro <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

cedo. A sua relação com os textos<br />

fundamentais da dramaturgia mundial,<br />

dos quais já vimos “Seis personagens<br />

em busca <strong>de</strong> um autor”, <strong>de</strong><br />

Piran<strong>de</strong>llo (CCB, 2003), “Rinoceronte”,<br />

<strong>de</strong> Ionesco (S. João e D. Maria,<br />

2006), “Tanto Amor Desperdiçado<br />

(D. Maria, 2007), <strong>de</strong> Shakespeare e<br />

“Homem por Homem”, <strong>de</strong> Brecht (D.<br />

Maria, 2007), está novamente presente<br />

em “Casimiro e Carolina”, <strong>de</strong> Odon<br />

von Horvath, peça com a qual regressa<br />

ao Festival <strong>de</strong> Almada, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

Piran<strong>de</strong>llo e Ionesco.<br />

Estreada em 2009, mas pensada<br />

“muito antes da crise”, diz-nos em<br />

entrevista, “é uma peça que prevê o<br />

que se vai passar”. Situada em 1929,<br />

portanto, anunciando a ascensão do<br />

nazismo, reflecte sobre as relações<br />

entre diferentes figuras que Demarcy-<br />

Mota não quer ver tratadas “pela melancolia”,<br />

numa festa da cerveja numa<br />

floresta. Temas como o <strong>de</strong>semprego<br />

e as dificulda<strong>de</strong>s económicas, a ambição<br />

e a inveja, estão presentes num<br />

texto que, segundo o encenador “não<br />

precisa ser actualizado, é actual”. A<br />

pequena história cruza-se com a gran<strong>de</strong><br />

história, num exercício <strong>de</strong> reflexão<br />

que o encenador utiliza para se dirigir<br />

à responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cada um na<br />

previsão da catástrofe.<br />

A escolha, diz Demarcy-Mota, “implica<br />

uma responsabilida<strong>de</strong>”. “Fazer<br />

teatro também”, acrescenta.<br />

É comum encontrarmos no<br />

seu trabalho uma distância<br />

em relação ao que é proposto<br />

pelo autor, mas não estamos<br />

exactamente perante uma<br />

simplificação dos textos,<br />

que facilite a sua inscrição<br />

contemporânea. É uma<br />

preocupação?<br />

Não me interessa falar senão das intuições.<br />

Esta peça interessa-me por<br />

isso, primeiro as intuições, <strong>de</strong>pois o<br />

trabalho sobre elas. Discuto muito<br />

com François Regnault, o tradutor,<br />

vemos as versões em inglês, em alemão,<br />

e escolhemos as palavras em<br />

francês que sirvam o que queremos<br />

dizer. Há uma responsabilida<strong>de</strong> e é<br />

por isso que é um trabalho esgotante<br />

que dura dois ou três meses. Depois<br />

retiro todas as didascálias, todas as<br />

<strong>de</strong>scrições, nem mesmo os actores as<br />

sabem, ficam só os diálogos.<br />

Nessa recusa <strong>de</strong> transposição<br />

para a contemporaneida<strong>de</strong>,<br />

permanecemos num território<br />

abstracto, sem um tempo, quase<br />

imaginário. Como se todas as<br />

suas peças habitassem uma terra<br />

<strong>de</strong> ninguém.<br />

A questão me interessa, nesta peça,<br />

é o que significa 1929 hoje. Não me<br />

apetece recriar 1929, não sei o que é,<br />

não estava lá. E o hoje, por si só, também<br />

não me interessa, preciso dos<br />

dois. Preciso do concreto. No caso dos<br />

figurinos, por exemplo — e tenho<br />

gran<strong>de</strong>s discussões com a figurinista<br />

—, há personagens que têm ténis comprados<br />

na feira da ladra e, ao lado,<br />

uma que tem um chapéu do fim do<br />

século XIX.<br />

Sugerindo um diálogo com o<br />

tempo teatral e não com o tempo<br />

real?<br />

É uma questão difícil para mim. É o<br />

tempo teatral que me leva à realida<strong>de</strong>,<br />

é o tempo teatral que também dá conta<br />

da realida<strong>de</strong>. O que me interessa<br />

nesta peça não é a melancolia, mas o<br />

pessimismo que a peça transporta.<br />

De qualquer forma, há sempre<br />

um lugar privilegiado para o<br />

sentido das palavras. A escolha<br />

dos autores é feita sabendo<br />

também o po<strong>de</strong>r das palavras,<br />

como as trabalhar e apresentar?<br />

Sentimos sempre que, no fim,<br />

o essencial, o que se queria dar<br />

a ver, era o texto, e as imagens<br />

estão lá para servir...<br />

Para servir ou estar ao lado, não estou<br />

certo.<br />

Li numa entrevista que se tivesse<br />

feito esta peça há uns anos seria<br />

sobre a juventu<strong>de</strong>.<br />

É verda<strong>de</strong>. É uma peça que conheço<br />

há muito tempo. Que gostava <strong>de</strong> ter<br />

montado quando tinha 25 anos.<br />

Po<strong>de</strong>m montar-se textos <strong>de</strong>stes<br />

quando não se tem ainda uma<br />

experiência <strong>de</strong> vida tão rica, tão<br />

múltipla?<br />

Se aos 25 ou 30 tivesse feito esta peça,<br />

seria, <strong>de</strong> facto, sobre a juventu<strong>de</strong>, o<br />

protagonista seria um jovem, e não<br />

um actor <strong>de</strong> 60 anos, que é frágil apenas<br />

aparentemente. Talvez não resultasse,<br />

não sei. Não haveria uma pesquisa<br />

precisa sobre o peso <strong>de</strong> uma<br />

existência, e sobretudo existência no<br />

início do século XX. Para mim, todas<br />

as questões da peça estão presentes<br />

na imagem inicial, podíamos terminar<br />

o espectáculo ali. Aqui estão eles, em<br />

Emmanuel Demarcy-Mota<br />

O teatro sem artifícios<br />

Emmanuel Demarcy-Mota faz <strong>de</strong> “Casimiro e Carolina”, <strong>de</strong> Odon von Horvath, um gran<strong>de</strong><br />

fresco teatral, impondo uma leitura pessimista no que podia ser só melancolia. Hoje no S. João,<br />

e dias 15 e 16 no D. Maria, o futuro que não se imaginava em 1929 alerta-nos para o presente<br />

em que vivemos. Tiago Bartolomeu Costa, em Paris<br />

28 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


“Para mim, o teatro<br />

está entre a infância<br />

e o científico, nas<br />

questões que coloca<br />

ao mundo. Não há<br />

senão hipóteses.<br />

Um espectáculo<br />

transporta uma nova<br />

hipótese sobre<br />

uma questão”<br />

grupo, atrás umas sombras, um fresco.<br />

Podíamos agra<strong>de</strong>cer, dizer “boa<br />

noite”, fazer <strong>de</strong>scer a cortina e ir embora.<br />

Porque procura, também, um<br />

trabalho ao nível da imagem,<br />

mas uma imagem rente à carne,<br />

perto do osso?<br />

Sim, on<strong>de</strong> os actores se expõem. É<br />

um espectáculo fisicamente muito<br />

duro. Mas é preciso que isso passe<br />

pelo cenário, pela maquinaria <strong>de</strong> cena,<br />

pelo actor, que exista em todo o<br />

espectáculo e não apenas num aspecto.<br />

O cenário não me interessa. Fiz<br />

espectáculos on<strong>de</strong> o cenário falhou,<br />

não era o que queria. Há coisas <strong>de</strong> que<br />

gosto e outras <strong>de</strong> que não gosto. Nesta<br />

gosto <strong>de</strong> quase tudo. É como se o<br />

cenário fosse uma máquina <strong>de</strong> <strong>de</strong>struição.<br />

É preciso que se passe qualquer<br />

coisa física entre a maquinaria<br />

e o actor.<br />

Para que se torne real?<br />

[longa pausa] Para que encontre uma<br />

realida<strong>de</strong>, se é para ser real, não sei.<br />

Não sei o que é o real.<br />

Porque quando falamos <strong>de</strong><br />

artificial, e <strong>de</strong> artificialida<strong>de</strong>,<br />

é sempre ambicionando uma<br />

proximida<strong>de</strong> com o real.<br />

Absolutamente. Gosto imenso do que<br />

dizia Grotowski sobre o artificial. Na<br />

mesma palavra está contido o termo<br />

“arte” e “fictício”. É uma palavra com<br />

diferentes significados. Há o lado do<br />

artifício, que é falso, que está longe<br />

da realida<strong>de</strong>, há “artefacto”, e é partindo<br />

disso que trabalho. A imagem<br />

está ao serviço do texto, talvez. Mas<br />

eu não o diria, ou pelo menos não<br />

<strong>de</strong>sse modo. De qualquer forma, não<br />

acredito num teatro on<strong>de</strong> exista uma<br />

fabricação da imagem, o teatro <strong>de</strong>ve<br />

sustentar-se numa outra coisa. Já o<br />

experimentei, em três ou quatro momentos,<br />

mas são dois campos paralelos.<br />

O que se sente nas suas peças é<br />

que se pe<strong>de</strong> aos espectadores<br />

para procurarem não tanto<br />

compreen<strong>de</strong>r, mas estarem<br />

presentes e dialogar com o que<br />

é proposto. Como se fosse mais<br />

importante ser-se intuitivo antes<br />

<strong>de</strong> se ser racional.<br />

Sim, e isso passa muito pela minha<br />

experiência <strong>de</strong> espectador. Comecei<br />

a ver espectáculos muito novo, e houve<br />

muitos que, mesmo não os compreen<strong>de</strong>ndo,<br />

me <strong>de</strong>ixavam muito<br />

feliz, porque me perguntavam o que<br />

havia ali que eu pu<strong>de</strong>sse investir. Só<br />

mais tar<strong>de</strong> é que surge a elaboração<br />

a partir da intuição.<br />

Há, ao mesmo tempo, um<br />

trabalho sobre a hierarquia dos<br />

elementos cénicos, anulando<br />

uma construção em pirâmi<strong>de</strong>?<br />

Completamente. Mas eu gosto <strong>de</strong> contar<br />

histórias. E gosto que mas contem.<br />

Po<strong>de</strong>mos contá-las <strong>de</strong> diferentes formas,<br />

pelo inverso, linearmente, mas<br />

as histórias são importantes. E essa é<br />

uma noção que foi muito criticada,<br />

por exemplo, em França, porque implicava<br />

contar as histórias entendidas<br />

como valores tradicionais. Eu não<br />

acredito nisso. O efeito teatral po<strong>de</strong><br />

passar por contar as histórias.<br />

Quando falamos <strong>de</strong> texto<br />

falamos <strong>de</strong> um texto enquanto<br />

elemento escrito porque, <strong>de</strong>pois,<br />

há todo o texto que existe no<br />

corpo, na luz...<br />

Sim, quando falo do texto falo no sentido<br />

primário das palavras, a presença<br />

das palavras, a sonorida<strong>de</strong> das palavras.<br />

Adoro as sonorida<strong>de</strong>s, as vozes<br />

diferentes dos actores que contrastam,<br />

que são particulares. Quando<br />

ensaio penso no som e no modo como<br />

<strong>de</strong>senha uma arquitectura espacial.<br />

Depois há o sentido da frase e o sentido<br />

geral. Mas gosto <strong>de</strong> contar histórias<br />

e <strong>de</strong> voltar a elas. Por exemplo,<br />

no próximo ano voltarei a “Rinoceronte”,<br />

<strong>de</strong> Ionesco. Quero contá-la,<br />

mas ao contrário.<br />

Porque a sua relação com o texto<br />

mudou?<br />

Mudou a minha relação com o próprio<br />

espectáculo. A peça conta uma<br />

catástrofe, e quero partir, não da previsão<br />

<strong>de</strong>ssa catástrofe, mas do fim,<br />

quando o homem está sozinho. Quero<br />

trabalhar sobre a i<strong>de</strong>ia da cumplicida<strong>de</strong>,<br />

quando já se sabe o que aconteceu<br />

e qual a nossa responsabilida<strong>de</strong><br />

hoje, quando já conhecemos a catástrofe.<br />

Penso que a conhecemos, não<br />

vale a pena lamentarmo-nos. Os franceses<br />

lamentam-se muito, os portugueses<br />

também. É uma questão que<br />

diz muito a autores da Europa Central,<br />

como Ionesco, <strong>de</strong> pai romeno e<br />

mãe francesa, mas também Horvath<br />

e Kafka.<br />

Pegando nessa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

cumplicida<strong>de</strong> e catástrofe:<br />

em “Casimiro e Carolina”,<br />

se reconhecemos que há a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolher,<br />

não po<strong>de</strong>mos dizer que fomos<br />

surpreendidos pelo que<br />

aconteceu. A sua apresentação<br />

é uma reflexão sobre o modo<br />

como o teatro, ou o dispositivo<br />

teatral, se po<strong>de</strong> dirigir aos<br />

outros e clamar que a inocência<br />

não é uma <strong>de</strong>sculpa?<br />

Sim. A inocência, pelo menos em<br />

francês tem um sentido ligado à infância<br />

e que está ligado à capacida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> maravilhamento. Interessa-me a<br />

ingenuida<strong>de</strong> no sentido não pejorativo<br />

mas no gran<strong>de</strong> sentido do termo.<br />

Da gran<strong>de</strong> ingenuida<strong>de</strong> do homem<br />

perante as gran<strong>de</strong>s questões: o que é<br />

o céu, o que são as estrelas, porque é<br />

que a terra é redonda? Os cientistas<br />

fazem as mesmas perguntas que as<br />

crianças quando olham o mundo. Para<br />

mim, o teatro está entre a infância<br />

e o científico, nas questões que coloca<br />

ao mundo. Não há senão hipóteses.<br />

E um espectáculo transporta uma nova<br />

hipótese sobre uma questão. Ionesco<br />

e Horvath tinham, para mim,<br />

guardada uma parte da infância. Horvath<br />

ainda tem uma parte da infância<br />

nele, que vai ser <strong>de</strong>struída. Quando<br />

Ionesco escreve que viu o seu pai<br />

transformar-se em monstro, na Roménia<br />

fascista, é <strong>de</strong> alguém que, em<br />

criança, vê a infância ser transformada.<br />

Isso é uma questão muito pessoal<br />

que se relaciona com o olhar que<br />

achamos que as crianças têm, mas<br />

que não é o olhar que elas mesmas<br />

têm sobre o mundo.<br />

“Casimiro e<br />

Carolina”:<br />

Demarcy-<br />

Mota diz que<br />

“é como se o<br />

cenário fosse<br />

uma máquina<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>struição”<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 29


O que propõe<br />

é uma reflexão<br />

do papel do<br />

espectador, da sua<br />

responsabilida<strong>de</strong><br />

em trabalhar<br />

com aquilo que lhe<br />

é apresentado, não se<br />

colocando à margem?<br />

Exactamente. Quando fiz “Homem<br />

por Homem” houve pessoas que saíram<br />

e me disseram que era complicado,<br />

perguntaram-me o que <strong>de</strong>viam<br />

pensar. Foi a primeira vez que me irritei<br />

a sério. “Que quer Galy Gay? Ele<br />

quer ser outro homem, ele quer ser<br />

um monstro?”, disseram-me. “Atenção,<br />

tens o direito <strong>de</strong> reflectir”, respondi.<br />

Estamos numa época on<strong>de</strong> o<br />

teatro, pelo texto — e falo por mim<br />

que não sou coreógrafo, não sou artista<br />

visual, e preciso do texto, não o<br />

sei fazer <strong>de</strong> outra forma — me permite<br />

interrogar o outro sobre o que eu<br />

penso que po<strong>de</strong> ser importante. Ou<br />

então dizemos que Horvath não tem<br />

interesse, nem Ionesco, nem Brecht,<br />

e que as questões que eles colocam<br />

não são pertinentes.<br />

Seria necessário encontrar<br />

autores contemporâneos que<br />

trabalhassem sobre os mesmos<br />

temas com um ponto <strong>de</strong> vista<br />

diferente.<br />

Mas essa questão do lugar do espectador<br />

face a essas imagens está no<br />

modo como o espectáculo é construído,<br />

nesse lugar que é o teatro-edifício.<br />

E isso é o mais importante. Às<br />

vezes saio e penso que os espectadores<br />

não estavam lá. Não quero ser<br />

dogmático mas se isso persistir, esse<br />

abaixamento do nível <strong>de</strong> exigência,<br />

então será o político que vai ganhar<br />

na discussão do lugar da arte na socieda<strong>de</strong>.<br />

E o papel do espectador é<br />

fundamental. É preciso um pouco <strong>de</strong><br />

arrojo.<br />

Discutem-se apenas as formas, mas<br />

poucas vezes o sentido. Não estou a<br />

falar da qualida<strong>de</strong> artística, mas do<br />

<strong>de</strong>bate artístico.<br />

Isso porque as pessoas têm uma<br />

memória <strong>de</strong> peixe...?<br />

Sim, é por isso que monto estas peças,<br />

porque tenho a impressão que as pessoas<br />

ficam surpresas quando se fala<br />

<strong>de</strong> crise, que se esquecem que houve<br />

uma II Guerra Mundial, que a Shoah<br />

aconteceu. Paremos. Um pouco <strong>de</strong><br />

dignida<strong>de</strong>, por favor. Há escolhas difíceis<br />

a fazer e <strong>de</strong>vem ser difíceis — se<br />

forem fáceis não são importantes.<br />

A escolha pe<strong>de</strong>-nos uma<br />

posição?<br />

Sim, uma posição que vai criar contrastes<br />

e dificulda<strong>de</strong>s em cada um. As<br />

coisas discutem-se. A televisão impõe<br />

a ausência <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> individual,<br />

mas a escolha <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>finida pelas<br />

dificulda<strong>de</strong>s. Quando Bérenger diz<br />

em “Rinoceronte”, que não po<strong>de</strong> ser<br />

um rinoceronte, quer mas não po<strong>de</strong>,<br />

isso interessa-me. Se uma pessoa diz<br />

que não po<strong>de</strong> ser racista ou anti-semita<br />

em vez <strong>de</strong> dizer que não o quer<br />

ser, essa é uma escolha moral. E, aí,<br />

preciso <strong>de</strong> um autor que trabalhe isto<br />

<strong>de</strong> verda<strong>de</strong>, e estes autores tiveram<br />

tempo <strong>de</strong> as pensar.<br />

Há uma distância temporal em<br />

relação ao texto que nos permite<br />

i<strong>de</strong>ntificar esse tratamento dado<br />

ao pensamento.<br />

Sim. Por vezes gosto que as coisas não<br />

sejam completamente realistas, e que<br />

existam formas que quando as vemos<br />

não resultem numa discussão natu-<br />

Casimiro<br />

e Carolina<br />

De Odon von Horvath<br />

Encenação <strong>de</strong> Emmanuel<br />

Demarcy-Mota<br />

6ª, 9, no Teatro S. João<br />

Dias 15 e 16 no Teatro<br />

D. Maria II<br />

ralista e teatral. É<br />

isso que procuro.<br />

Há um natural no<br />

teatro?<br />

Não. Preciso que as coisas<br />

tenham uma forma.<br />

Quando aos 18 anos vi “O Sétimo<br />

Selo”, do Bergman, ou os filmes<br />

do Visconti, estava perante uma<br />

“mise-en-forme”, mas hoje o que se<br />

discute é o gosto, a estética. Há espectáculos<br />

dos quais gosto imenso mas<br />

que <strong>de</strong>testo. Gosto da forma mas não<br />

gosto da estética, porque reconheço<br />

a intenção. Que pluralida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> sentido<br />

são pesquisadas? À força <strong>de</strong> se<br />

criarem etiquetas, como em Avignon<br />

— teatro-dança, teatro-texto, teatropoema,<br />

teatro-visual —, quando é só<br />

teatro parece uma coisa jurássica, são<br />

dinossauros. Quando Clau<strong>de</strong> Régy<br />

faz isso [com “O<strong>de</strong> Marítima”], fá-lo<br />

porque tem 85 anos, mas se tivesse<br />

40 ia ter um problema. Escolher fazer<br />

Régy para 600 pessoas no Théâtre <strong>de</strong><br />

la Ville é um acto político, porque não<br />

é uma peça, é um poema que as pessoas<br />

conhecem mal — mesmo em Portugal,<br />

on<strong>de</strong> todos dizem ter lido Pessoa<br />

mas não o leram realmente —, que<br />

merece 600 pessoas e não 200. Tenho<br />

a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> o fazer, não<br />

apenas como encenador, mas como<br />

director <strong>de</strong>sse teatro. Houve sete mil<br />

pessoas na Place du Châtelet que o<br />

viram, em Avignon foram quatro mil.<br />

Como fazer o nosso trabalho, então?<br />

Devemos respon<strong>de</strong>r às coisas, <strong>de</strong>vemos<br />

ser responsáveis — adoro essa<br />

palavra.<br />

A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> ritual, que o<br />

teatro carregou, é algo que<br />

lhe interessa? Olhando para<br />

algumas das imagens que cria,<br />

fica a sensação <strong>de</strong> estarmos<br />

perante quadros, <strong>de</strong> encenações<br />

ritualistas. E, no entanto, parece<br />

haver uma proximida<strong>de</strong> ao ritual<br />

que <strong>de</strong>pois nos leva para outra<br />

zona, menos clara.<br />

Po<strong>de</strong>ria dizer que isso não me interessa,<br />

mas é isso. Há um ritual profundo<br />

na pintura, por exemplo, cujos<br />

ecos das minhas influências pictóricas<br />

estão presentes, <strong>de</strong> Rembrant a Brueghel,<br />

autores que tinham uma gran<strong>de</strong><br />

liberda<strong>de</strong> e que explodiram com a<br />

imagem. Mas não quero fazer crer que<br />

há um ritual. É um artificio que não<br />

me interessa e falseia as coisas porque<br />

as legitima <strong>de</strong> forma errada. Vejo teatro<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os cinco anos. Tirar os sapatos<br />

antes <strong>de</strong> subir ao palco, como<br />

na tenda da Ariane Mnouchkine, fazer<br />

as pessoas esperar à porta do Théâtre<br />

<strong>de</strong>s Bouffes du Nord para que se veja<br />

que há um ritual, são rituais que estão<br />

já <strong>de</strong>sconstruídos e <strong>de</strong>scodificados,<br />

para mim. Isso não me interessa. É<br />

muito claro que é preciso uma distância<br />

para se ser verda<strong>de</strong>iro, e que é<br />

isso que dá a liberda<strong>de</strong>. É preciso criar<br />

formas para as coisas aparecerem, e<br />

digo-o tanto em relação ao futuro do<br />

teatro como ao seu sentido actual.<br />

Mas é verda<strong>de</strong> que não é o discurso<br />

contemporâneo que me interessa. Há<br />

uma ritualização, sim, mas não a fabricação<br />

<strong>de</strong> um ritual. É preciso ir<br />

mais longe, o ritual existe <strong>de</strong>pois, não<br />

é antes, não se convoca um ritual. É<br />

uma questão muito pessoal, muito<br />

profunda, que dita também uma forma<br />

<strong>de</strong> fazer um espectáculo, <strong>de</strong> preparar<br />

uma peça.<br />

O Ípsilon viajou a convite do Festival <strong>de</strong><br />

Teatro <strong>de</strong> Almada<br />

VINCENT KESSLER/REUTERS<br />

Enigmática, distante e<br />

fria são i<strong>de</strong>ias que se<br />

colaram ao corpo e ao<br />

rosto — mas sobretudo<br />

à figura — <strong>de</strong> Charlotte<br />

Rampling, actriz<br />

<strong>de</strong> “O Porteiro da Noite”<br />

(1974, Liliana Cavani),<br />

“Os Malditos” (1969,<br />

Luchino Visconti) ou “Max,<br />

mon amour” (1986, Nagisa Oshima).<br />

Chega ao Porto e a <strong>Lisboa</strong> por<br />

via do Festival <strong>de</strong> Teatro <strong>de</strong> Almada,<br />

com uma peça que não é, pelo menos<br />

Charlot<br />

São raras e recentes as experiências teatrais d<br />

provoque”, diz, nesta entrevista, em que <strong>de</strong>ixa q<br />

Yourcenar/<br />

Cavafy<br />

Encenação <strong>de</strong> Jean-<br />

Clau<strong>de</strong> Feugnet, dia 16 <strong>de</strong><br />

Julho no Teatro Nacional<br />

S. João, dias 17 e 18 no<br />

Teatro Nacional<br />

D. Maria II.<br />

para ela, um espectáculo, mas “um<br />

encontro” entre<br />

Marguerite<br />

Yourcenar e<br />

nos Constanti-<br />

Cava-<br />

fy, conduzido pela força das palavras<br />

<strong>de</strong>stas duas figuras.<br />

A sua experiência no teatro é bastante<br />

mais reduzida e recente: “La<br />

Fause Suivante”, <strong>de</strong> Marivaux, por<br />

Martin Crimp, “A Dança da Morte”,<br />

<strong>de</strong> Strindberg, e “Pequenos<br />

Crimes Conjugais”, <strong>de</strong> Eric-Emmanuel<br />

Schmitt, são escolhas que reflectem<br />

essa procura <strong>de</strong> um encontro<br />

com personagens, mais do que<br />

uma carreira. Tal como o disco<br />

“Comme Une Femme” (2002), on<strong>de</strong><br />

as letras falam <strong>de</strong> uma mulher que<br />

se pergunta quem é, e <strong>de</strong>ixa que se<br />

confunda actriz, personagem e mu-<br />

lher.<br />

Ao longo do seu percurso, tem<br />

interpretado personagens<br />

fortes, mesmo se fictícias. Como<br />

foi entrar nos universos, reais,<br />

<strong>de</strong> Marguerite Yourcenar e<br />

Contantinos Cavafy, também<br />

eles figuras com personalida<strong>de</strong>s<br />

marcantes?<br />

São, efectivamente, personagens for-<br />

tes e é necessário encontrar um modo<br />

<strong>de</strong> as trabalhar a partir das palavras<br />

escritas do autor. De qualquer forma,<br />

e no caso específico <strong>de</strong> “Yourcenar/<br />

Cavafy”, não se trata <strong>de</strong> interpretar<br />

uma personagem, mas, através da<br />

récita dos seus textos, fazê-la viver e<br />

evoluir a partir do que escreveu<br />

e ir<br />

mais além.<br />

Vendo os filmes que interpretou,<br />

é característica uma distância<br />

entre a personagem e a actriz.<br />

Especulou-se que essa seria uma<br />

característica biográfica sua.<br />

Mas o que acontece quando o<br />

que se lhe pe<strong>de</strong> é para se colocar<br />

ao serviço <strong>de</strong> uma figura<br />

real, ela própria com uma<br />

biografia, e num exercício<br />

que exige ao actor um<br />

<strong>de</strong>spojamento da sua<br />

própria vida?<br />

Para mim, o que é interes-<br />

sante é o modo como o<br />

faço.<br />

E faço-o interpretando os<br />

dois papéis ao mesmo<br />

tempo, o da actriz e<br />

o da<br />

personagem. Quando<br />

interpreto, invisto em<br />

mim m e na persona-<br />

gem e isso emana<br />

da força das<br />

pala-<br />

vras <strong>de</strong> Yource-<br />

nar. São essas<br />

palavras que<br />

alimentam<br />

essa i<strong>de</strong>ia e<br />

constro-<br />

em<br />

um<br />

universo<br />

on<strong>de</strong> o<br />

possa fa-<br />

zer.<br />

Um<br />

universo<br />

que se<br />

sustenta<br />

numa<br />

pesquisa, ou<br />

uma procura<br />

constante, certo?<br />

Sim, a poesia é uma<br />

pes-<br />

quisa emocional absoluta,<br />

a literatura também. São<br />

via-<br />

30 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


tte, absolutamente<br />

s <strong>de</strong> Charlotte Rampling. “Só faço coisas quando sei que me vou confrontar com algo que me<br />

a que se confunda actriz, personagem e mulher. Tiago Bartolomeu Costa<br />

Charlotte Rampling e Polydoros<br />

Vogiatzis na peça “Yourcenar/<br />

Cavafy”<br />

“A interpretação<br />

surge <strong>de</strong> um encontro<br />

emocional.<br />

É, sobretudo, uma<br />

viagem com<br />

uma pessoa”<br />

gens. E são encontros através das viagens,<br />

feitas com um material que é a<br />

vida <strong>de</strong> outra pessoa. A interpretação<br />

surge <strong>de</strong> um encontro emocional, que<br />

parte do coração, e prossegue através<br />

da linguagem, e da palavra. É, sobretudo,<br />

uma viagem com uma pessoa.<br />

Ao mesmo tempo, é-lhe pedido<br />

que se ponha em causa, ou seja,<br />

que parta da sua experiência<br />

para nos conduzir nessa viagem.<br />

Sim, absolutamente. Penso que as<br />

coisas só po<strong>de</strong>m ser tratadas — se as<br />

quisermos tratar <strong>de</strong> forma inteligente<br />

e interessante — se nos colocarmos<br />

em causa face à personagem. É uma<br />

parceria fundamental e a única forma<br />

que tenho <strong>de</strong> trabalhar.<br />

E como faz as suas escolhas?<br />

Procurando personagens que<br />

queiram fazer um pacto consigo?<br />

Ao longo da minha vida, fui encontrando<br />

personagens no caminho. Personagens,<br />

realizadores, poetas. Nunca<br />

as procurei, e não o faço hoje. A<br />

dado momento da viagem, junto-me<br />

a uma personagem que encontro, não<br />

sei porquê, nunca soube, mas foi sempre<br />

assim.<br />

É isso que explica a colagem<br />

eterna a uma imagem fria e<br />

gelada, que se coloca numa<br />

posição <strong>de</strong> distância em relação<br />

ao espectador? É uma protecção<br />

da actriz?<br />

É como eu sou. Eu sou uma actriz, é<br />

certo, mas sou, realmente, assim. E é<br />

assim no teatro, e no cinema, sou<br />

sempre eu, e a personagem acompanha-me.<br />

Se me diz que sou fria — infelizmente,<br />

não gosto <strong>de</strong>ssa palavra<br />

— mas se me diz que sou impenetrável,<br />

não posso achar isso senão como<br />

um contra-senso para um actor. Trabalho<br />

a um nível mais profundo, se<br />

as pessoas acham isso, lamento por<br />

elas.<br />

O que me agrada nessa i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

frieza, <strong>de</strong> gelo, é a sua própria<br />

ambiguida<strong>de</strong>, porque é algo<br />

provisório que se esfuma.<br />

Ouvindo as suas canções, por<br />

exemplo, ficamos sempre<br />

na dúvida se a estamos a<br />

ouvir falar <strong>de</strong> si, se há uma<br />

personagem que fala sobre<br />

coisas que lhe acontecem, ou se<br />

é algo distante. E essa mistura,<br />

quadridimensional diria, é mais<br />

do que real porque não se <strong>de</strong>ixa<br />

cair numa só categorização. É,<br />

por isso mesmo, um corpo que,<br />

apresentando-se, não <strong>de</strong>ixa<br />

nunca <strong>de</strong> ser abstracto.<br />

Você fez uma muito bela <strong>de</strong>scrição<br />

[risos].<br />

Pergunto-lhe isto porque se<br />

tornou frequente encontrar<br />

actrizes que traçam projectos<br />

<strong>de</strong> carreira que também passam<br />

pela música, ou por trabalhos<br />

com realizadores menos<br />

evi<strong>de</strong>ntes, com o objectivo <strong>de</strong><br />

escaparem a uma padronização<br />

e a um mo<strong>de</strong>lo. Até mesmo<br />

tentando escapar a uma imagem<br />

que se lhes colou. O que está a<br />

dizer é que as coisas são fruto do<br />

acaso e não <strong>de</strong> um planeamento<br />

estratégico?<br />

É isso, absolutamente. Só faço aquilo<br />

em que sei que posso investir. É a única<br />

forma <strong>de</strong> me apresentar ao mundo<br />

exterior. A carreira não me interessa,<br />

interessa-me a viagem. E uma estratégia<br />

não é, certamente, a viagem que<br />

quero fazer.<br />

As experiências teatrais<br />

chegaram mais tar<strong>de</strong>. E<br />

chegaram como?<br />

Sim, bastante mais tar<strong>de</strong>. Fi-las para<br />

saber como funcionaria esta minha<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> envolvimento face a um público,<br />

com um texto, e aten<strong>de</strong>ndo ao<br />

rigor do teatro. Encontrei três peças,<br />

duas em França e uma em Inglaterra.<br />

Só faço coisas quando sei que me vou<br />

confrontar com algo que me provoque<br />

e com alguém que me entusiasme.<br />

De qualquer forma, não é o teatro<br />

tradicional que me interessa.<br />

É por isso que as escolhas que<br />

fez não são evi<strong>de</strong>ntes?<br />

Sim, enfrento a vida como uma falta<br />

e uma prova. Como se fosse uma representação<br />

todos os dias. Quando<br />

escolho o que vou fazer, quando mer-<br />

gulho no que vou fazer, procuro ver<br />

se vou passar essa prova, e, <strong>de</strong>pois,<br />

não me interessa repeti-la. É preciso<br />

ser muito inventiva, para não me<br />

aborrecer nem cair numa rotina. Não<br />

é evi<strong>de</strong>nte nem é muito confortável,<br />

mas é como é, é o que me satisfaz. Ao<br />

mesmo tempo, é recompensador<br />

quando acontecem coisas que se correspon<strong>de</strong>m<br />

e que dialogam com o que<br />

procuro. Mas esta é só uma forma <strong>de</strong><br />

estar aqui. E é só a minha.<br />

É um percurso, <strong>de</strong> vida<br />

e profissional, que se<br />

complementa através da música,<br />

do teatro e do cinema, ou que<br />

alimenta, e se complementa,<br />

com a vida?<br />

Nunca po<strong>de</strong>remos dizer se o que veio<br />

primeiro foi a galinha ou o ovo. É uma<br />

coreografia constante. “Faço, não faço”,<br />

“quero fazer, não quero fazer”.<br />

E <strong>de</strong>pois há coisas que me forçam a<br />

encontros, como no caso <strong>de</strong> Yourcenar<br />

e Kavafi. É algo que é visceral e<br />

que me dá imenso medo.<br />

Essa era a palavra que me<br />

ocorria, medo. Quer combater o<br />

medo que as provas lhe causam?<br />

Sim, sim.<br />

Sem medo <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r?<br />

Sim, sobretudo sem medo <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r.<br />

É outra coisa.<br />

É o prazer <strong>de</strong> jogar?<br />

É o prazer <strong>de</strong> me expor.<br />

Expor-se, procurando dar e<br />

receber?<br />

Sim, absolutamente, porque o acto<br />

<strong>de</strong> se expor em cena tem <strong>de</strong> ser, para<br />

CONCURSO<br />

JOVENS CRIADORES<br />

2010<br />

.ARTES PLÁSTICAS.<br />

.BANDA DESENHADA.<br />

.ILUSTRAÇÃO.<br />

.ARTES DIGITAIS.<br />

.FOTOGRAFIA. FI<br />

.VÍDEO.<br />

.DANÇA.<br />

TEATRO<br />

.MÚSICA.<br />

.DESIGN DE EQUIPAMENTO.<br />

.DESIGN GRÁFICO.<br />

.JOALHARIA.<br />

.MODA.<br />

.LITERATURA.<br />

<br />

INSCRIÇÕES S ATÉ<br />

26 DE JULHO<br />

REGULAMENTOS EM<br />

ARTESIDEIAS.COM<br />

JUVENTUDE.GOV.PT<br />

mim, absoluto. Eu entro, absolutamente.<br />

Sou assim, é preciso que eu o<br />

sinta. Se não o sentir estou morta.<br />

No teatro há exposição mais<br />

próxima do real, porque existe<br />

todas as noites, enquanto no<br />

cinema é uma exposição mais<br />

distante, é isso?<br />

Não, é apenas diferente. Mas o processo<br />

para lá chegar é o mesmo.<br />

E no caso das canções?<br />

Eu não as canto em cena. Não consi<strong>de</strong>ro<br />

que tenha voz para cantar em<br />

cena. É algo muito íntimo, sou eu em<br />

frente a um microfone.<br />

Mas também é uma exposição.<br />

É uma exposição sim, mas que é à<br />

porta fechada, sou eu e três músicos<br />

num estúdio.<br />

Ao ouvirmos as canções,<br />

imaginamos que seja você,<br />

Charlotte, a expor-se?<br />

É um pouco isso, sim. É por isso que,<br />

neste momento, não faço questão <strong>de</strong><br />

as cantar em público. São para mim<br />

um diário. É uma experiência que não<br />

é para ser partilhada com os outros,<br />

nem é para os outros. Quando as pessoas<br />

me falam do disco, acabo por<br />

oferecê-lo, não tenho objectivos comerciais.<br />

Talvez um dia o coloque<br />

“online”. Mas é <strong>de</strong> uma outra or<strong>de</strong>m<br />

<strong>de</strong> partilha este disco, é mais pessoal.<br />

Mas quem é que se expõe:<br />

a Charlotte Rampling ou a<br />

Charlotte?<br />

[risos] Good question, I have no<br />

answer for that!<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 31


Matthias Langhoff<br />

Tesouro nacional vivo<br />

“Cabaret Hamlet” é um espectáculo que não se conta, vive-se. O encenador é alguém que não<br />

se <strong>de</strong>screve, sente-se. No CCB, dias 14 e 15, vamos po<strong>de</strong>r estar mais perto <strong>de</strong> uma lenda viva do<br />

teatro. Tiago Bartolomeu Costa, em Paris<br />

DA MAIA NOGUEIRA<br />

Matthias<br />

Langhoff<br />

regressa ao<br />

Festival <strong>de</strong><br />

Teatro <strong>de</strong><br />

Almada pelo<br />

segundo ano<br />

consecutivo<br />

Matthias Langhoff é um tesouro nacional<br />

vivo. A expressão foi cunhada<br />

pelo crítico francês Bruno Tackels na<br />

revista “Mouvement”, e diz bem da<br />

grandiosida<strong>de</strong> <strong>de</strong>ste homem, figura<br />

maior do teatro, discípulo <strong>de</strong> Brecht,<br />

her<strong>de</strong>iro <strong>de</strong> um passado com o qual<br />

“nem sempre soube lidar”.<br />

“Tudo o que me move, tudo aquilo<br />

em que sempre acreditei, foi exactamente<br />

o que tentei colocar nas minhas<br />

peças, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início. E não tenho<br />

a certeza <strong>de</strong> alguma vez o ter<br />

conseguido.”<br />

O pretexto do encontro é “Cabaret<br />

Hamlet”, monumental obra panteísta,<br />

“um resquício do que Shakespeare<br />

escreveu”, a apresentar no Centro<br />

Cultural <strong>de</strong> Belém, em <strong>Lisboa</strong>, no âmbito<br />

do Festival <strong>de</strong> Teatro <strong>de</strong> Almada,<br />

que visita pelo segundo ano consecutivo,<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter mostrado “Dieu<br />

comme patient — ainsi parlait Isidore<br />

Ducasse”, a partir <strong>de</strong> Lautréamont. É<br />

uma peça longa — “o tempo precisa<br />

<strong>de</strong> tempo para acontecer” —, que trabalha<br />

os antagonismos das personagens<br />

<strong>de</strong> Shakesperare, que podiam<br />

ser entendidas como um espelho do<br />

mundo, como diria Shakespeare,<br />

“mas que são só sombras preparadas<br />

para serem <strong>de</strong>scobertas”. “Como<br />

nós”, acrescenta Langhoff.<br />

Esta peça é apenas uma janela para<br />

um universo feito “<strong>de</strong> escolhas programadas”,<br />

respon<strong>de</strong> o encenador,<br />

que já dirigiu teatros, e escolheu Brecht,<br />

Büchner, Schnitzler, Kafka ou<br />

Eurípi<strong>de</strong>s para “falar<br />

sempre com o<br />

passado, tando imagi-<br />

tennar<br />

ser possível<br />

viver<br />

um futuro”.<br />

“A intuição<br />

é importante<br />

para outras<br />

coisas: a intuição<br />

está na<br />

“O teatro foi sempre<br />

solitário, porque<br />

as escolhas levam<br />

à solidão. Falar<br />

do que<br />

fazemos com<br />

alguém que faça<br />

o mesmo não significa<br />

que falemos<br />

da mesma coisa”<br />

pesquisa proporcionada pela peça,<br />

não está na escolha da peça. As peças<br />

são escolhidas para respon<strong>de</strong>rem a<br />

dúvidas que temos. São escolhas pes-<br />

soais, não são abstractas.” “A prepa-<br />

ração <strong>de</strong><br />

um trabalho é um momen-<br />

to para questionar tudo, uma situa-<br />

ção muito complexa e ambígua.” “É<br />

preciso ter paciência”, alerta. E é<br />

preciso “estar sempre à espera <strong>de</strong><br />

tudo.” Cada apresentação “é uma<br />

oportunida<strong>de</strong> para não <strong>de</strong>ixar cair<br />

a pergunta, mais do que para respon<strong>de</strong>r.”<br />

O <strong>de</strong>safio está “na pró-<br />

pria persistência, no fazer face<br />

ao medo. Queiramos ou não, o<br />

medo é a vida. Quando a tomamos,<br />

temos <strong>de</strong> nos <strong>de</strong>ixar ir.<br />

Fazer um espectáculo é como<br />

uma vida, nasce-se e morrese.<br />

E morre-se como se é.<br />

Fazemos uma <strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> nós, dos<br />

nossos medos, está tudo lá <strong>de</strong>ntro. É<br />

preciso ter paciência. E isso vem com<br />

o tempo”.<br />

Hamlet sou eu<br />

“O drama do príncipe da Dinamarca<br />

é o meu próprio drama”, lança para<br />

cima da mesa. “Com Hamlet enfrento<br />

a minha própria memória, a <strong>de</strong> regressar<br />

a um país ao qual não pertenço,<br />

obrigado a seguir uma herança<br />

que não quero e com a qual não estou<br />

<strong>de</strong> acordo.”<br />

De origem suíça, Langhoff mudouse<br />

cedo para a Alemanha — “on<strong>de</strong><br />

habitam todos os meus mortos” — vivendo<br />

há anos em França, o país que<br />

o <strong>de</strong>via consi<strong>de</strong>rar como um tesouro.<br />

“O exílio <strong>de</strong> Hamlet é o meu exílio” ,<br />

diz. “Penso nos meus pais, penso nos<br />

que já cá não estão, coloco-me em<br />

frente à minha memória”, confessa<br />

este homem “já sem pares”.<br />

“O teatro foi sempre solitário, porque<br />

as escolhas levam à solidão. Falar<br />

do que fazemos com alguém que faça<br />

o mesmo não significa que falemos<br />

da mesma coisa.” Recorda que este<br />

Hamlet é tão <strong>de</strong>le quanto a sua vida<br />

lhe pertence — “e disso estou pouco<br />

certo”.<br />

A peça surge “da impossibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> dialogar com um passado <strong>de</strong> 500<br />

anos”. “Não é para saber se há espaço<br />

para Hamlet no presente, é para perguntar<br />

se há presente em Hamlet”,<br />

diz. “Procurei Hamlet toda a minha<br />

vida. Esperei por ele.” A primeira vez<br />

que ele se apresentou foi ao telefone.<br />

Era Heiner Muller, seu companheiro<br />

na direcção do Berliner Ensemble.<br />

“Ligou-me e disse: Não venhas já para<br />

o ensaio. Quando chegares tenho<br />

uma peça pronta para ti.” A peça<br />

chamava-se “Máquina Hamlet”. Estávamos<br />

em 1977. “Este regresso é uma<br />

coisa muito especial”, diz Langhoff.<br />

“O objectivo não é tornar a coisa acessível.<br />

As questões estão ao nível da<br />

impossibilida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> não saber o que<br />

vamos fazer com as consequências<br />

da escolha, mas saber que essas consequências<br />

resultam da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

se po<strong>de</strong>r escolher”, resume.<br />

“O que é tocante é que, mesmo sendo<br />

difícil, as pessoas são capazes <strong>de</strong><br />

encontrar as coisas que lhe tocam,<br />

on<strong>de</strong> o teatro as leva a um outro<br />

lugar, e que produzem um<br />

<strong>de</strong>bate, que as engran<strong>de</strong>ce.<br />

De tempos a tempos<br />

po<strong>de</strong> mesmo aparecer<br />

alguém que se diz profundamente<br />

alterado<br />

e, nessas alturas,<br />

achamos que po<strong>de</strong>mos<br />

prosseguir.” Por<br />

isso, Langhoff não acredita<br />

num regresso aos<br />

clássicos que impliquem<br />

uma inscrição do texto na contemporaneida<strong>de</strong>.<br />

“Tornar algo compreensível<br />

po<strong>de</strong> ser um problema.<br />

Mudar uma história não a torna, por<br />

si só, compreensível. Porque, muitas<br />

vezes, se o é, é outra coisa.”<br />

O Ípsilon viajou a convite do Festival <strong>de</strong><br />

Teatro <strong>de</strong> Almada<br />

François<br />

Chattot e<br />

Agnès Dewitte<br />

em “Cabaret<br />

Hamlet”<br />

Cabaret<br />

Hamlet<br />

Encenação <strong>de</strong> Matthias<br />

Langhoff<br />

Dias 14 e 15, no CCB,<br />

<strong>Lisboa</strong><br />

32 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Saul Bellow Se isto é um<br />

“homem mo<strong>de</strong>rno” Pág. 46<br />

Laurie An<strong>de</strong>rson<br />

Recomeçar, <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong>pois Pág. 35<br />

M.I.A.<br />

Porque é que ela é<br />

um ícone do nosso<br />

tempo Pág. 34<br />

m/18<br />

Pedro Abrunhosa<br />

& Comité Caviar<br />

8-jul<br />

Mafalda Veiga<br />

15-jul<br />

Jorge Palma<br />

22-jul<br />

Mayra Andra<strong>de</strong><br />

29-jul<br />

www.casino-estoril.pt<br />

DJ até às 03H00<br />

Reservas:<br />

info@dlounge.net | +351 919 938 114<br />

Programa sujeito a alterações


Discos<br />

Pop<br />

Ninguém<br />

cala M.I.A.<br />

É o álbum mais contrastante<br />

da polémica cantora. Há<br />

canções dançantes e lúdicas,<br />

mas também momentos <strong>de</strong><br />

catarse claustrofóbica. Vítor<br />

Belanciano<br />

M.I.A.<br />

Maya<br />

XL Recordings, distri. PopStock<br />

mmmmn<br />

Des<strong>de</strong> que <strong>de</strong>u nas<br />

vistas, em 2005, o<br />

percurso <strong>de</strong> Maya<br />

Arulpragasam, ou<br />

seja, M.I.A., tem<br />

estado envolto em<br />

polémicas. Só nos últimos meses,<br />

foram os sucessivos problemas com<br />

o governo americano por causa do<br />

seu cartão <strong>de</strong> resi<strong>de</strong>nte; ameaças do<br />

governo do Sri Lanka para que não<br />

se meta em assuntos <strong>de</strong> Estado; um<br />

“vi<strong>de</strong>oclip” para “Born free”, que foi<br />

censurado pelo Google por causa do<br />

seu alegado conteúdo violento; ou<br />

uma troca <strong>de</strong> piropos hostil com o<br />

“New York Times” por causa <strong>de</strong> uma<br />

entrevista em que terá sido citada<br />

fora <strong>de</strong> contexto.<br />

No meio <strong>de</strong>ste ruído, é fácil<br />

esquecermo-nos da música. E no<br />

entanto, ao longo <strong>de</strong> dois álbuns<br />

(“Arular”, <strong>de</strong> 2005 e “Kala”, <strong>de</strong><br />

2007), M.I.A. conseguiu criar uma<br />

sonorida<strong>de</strong> nova feita <strong>de</strong><br />

sobreposições inesperadas num<br />

ambiente sincrético colorido. Foi<br />

uma das primeiras a perceber o<br />

potencial que existia em criar um<br />

vocabulário o pop a partir <strong>de</strong> algumas<br />

das linguagens gens urbanas emergentes,<br />

como o dubstep, baile funk, kuduro<br />

ou dancehall. all.<br />

“Maya” não contém,<br />

naturalmente, nte, o travo <strong>de</strong> novida<strong>de</strong><br />

dos seus antecessores, mas é mais<br />

arriscado e<br />

diverso. Como outros<br />

nomes marcantes da cultura<br />

pop<br />

actual, <strong>de</strong> James<br />

Murphy (LCD<br />

Soundsystem)<br />

M.I.A. cria um caldo<br />

pop a partir da mais<br />

estimulante música<br />

urbana da actualida<strong>de</strong><br />

Espaço<br />

Público<br />

Este espaço vai ser<br />

seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />

teatro, livro, exposição,<br />

disco, álbum, canção,<br />

concerto, DVD viu e<br />

gostou tanto que lhe<br />

apeteceu escrever<br />

aos Animal Collective, M.I.A. é<br />

alguém capaz <strong>de</strong> prenunciar o<br />

tempo, tornando-se representação<br />

<strong>de</strong>le em simultâneo. A faceta<br />

politizada, o controle sobre a<br />

imagem e a forma como utiliza as<br />

potencialida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> difusão da<br />

Internet fazem <strong>de</strong>la um ícone do<br />

nosso tempo, mas também um alvo<br />

fácil <strong>de</strong> críticas. E não será com este<br />

álbum que isso se <strong>de</strong>svanecerá.<br />

No primeiro tema, “The message”,<br />

faz questão <strong>de</strong> dizer <strong>de</strong> imediato ao<br />

que vem, abordando as facetas<br />

sombrias da Internet através <strong>de</strong> um<br />

som electronicamente saturado.<br />

Quase todas as características<br />

nucleares dos dois álbuns anteriores<br />

estão presentes no novo registo —<br />

misto <strong>de</strong> balanço digital, subgraves,<br />

batidas gordurosas, climas exóticos e<br />

electrónica encardida — embora os<br />

cenários sejam mais claustrofóbicos.<br />

Há convidados repetentes (Diplo e<br />

Switch), mas também novida<strong>de</strong>s,<br />

como Rusko, Derek E. Miller dos<br />

Sleigh Bells, Blaqstrarr e Igor<br />

Cavalera, dos Sepultura.<br />

Como nos anteriores álbuns, há<br />

uma canção assumidamente <strong>de</strong><br />

gosto duvidoso (“XXX0”), incursões<br />

pelo dancehall mais lúdico (“It takes<br />

a muscle” ou “It iz what it iz”),<br />

tentativas <strong>de</strong> repetir o sucesso <strong>de</strong><br />

“Paper planes” (“Tell me why”), mas<br />

os temas que acabam por marcar<br />

são aqueles on<strong>de</strong> aposta num som<br />

ruidoso, misto <strong>de</strong> electrónica<br />

musculada e <strong>de</strong>formação roqueira,<br />

como “Born free” — o tal do<br />

“vi<strong>de</strong>oclip” polémico, inspirado nos<br />

Suici<strong>de</strong> — “Steppin up” e,<br />

principalmente, “Meds and feds”,<br />

admirável catarse <strong>de</strong> agitação<br />

dançante para guitarra distorcida.<br />

O melhor do pós-punk dos anos<br />

80 aconteceu quando o rock<br />

encontrou nos sons físicos do funk,<br />

disco ou dub, a sua possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

recriação. M.I.A. tem aplicado os<br />

mesmos princípios, mas<br />

noutro contexto,<br />

criando um caldo<br />

pop a partir <strong>de</strong><br />

alguma da mais<br />

estimulante<br />

música física e<br />

urbana da<br />

actualida<strong>de</strong>.<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

sobre ele, concordando<br />

ou não concordando<br />

com o que escrevemos?<br />

Envie-nos uma nota até<br />

500 caracteres para<br />

ipsilon@publico.pt. E<br />

nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />

Os Mi Ami fazem<br />

música on<strong>de</strong> tudo o que<br />

interessa é o ritmo<br />

Um violento<br />

ataque aos<br />

sentidos<br />

Álbum negro, canções<br />

que vergastam em vez <strong>de</strong><br />

acariciar, que distorcem em<br />

vez <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir. Mário Lopes<br />

Mi Ami<br />

Steal Your Face<br />

Thrill Jockey; distri. Mbari<br />

mmmmn<br />

Tudo é<br />

incrivelmente<br />

intenso, <strong>de</strong> forma<br />

extenuante, em<br />

“Steal Your Face”.<br />

A secção rítmica<br />

que se pren<strong>de</strong> num “groove” para<br />

não mais largar, as guitarras que<br />

expelem ruído em golfadas, a voz<br />

andrógina que berra e berra, entre a<br />

catarse e a paranóia, entre a<br />

excitação e a ironia nada discreta: “I<br />

want to dance with somebody / I<br />

wanna feel the heat with<br />

somebody”, ouve-se em “Latin<br />

lover”, para a qual nunca<br />

pensaríamos convocar a imagem da<br />

jovem Whitney Houston. Este<br />

pormenor, contudo, é importante<br />

para apreciar <strong>de</strong>vidamente o novo<br />

álbum dos Mi Ami.<br />

Aquilo que às primeiras audições<br />

soa a um violento ataque aos<br />

sentidos (que é), a uma orgia <strong>de</strong><br />

ruído que apenas os movimentos<br />

circulares da secção rítmica<br />

impe<strong>de</strong>m <strong>de</strong> resvalar para o caos,<br />

vai-se pouco a pouco revelando<br />

como algo mais. Álbum negro,<br />

iminentemente nocturno, “Steal<br />

Your Face” faz-se <strong>de</strong> divagação<br />

psicadélica e <strong>de</strong> choques eléctricos<br />

pós-punk. Sugere algo <strong>de</strong> dub na<br />

reverberação constante que o<br />

atravessa mas não <strong>de</strong>ixa qualquer<br />

espaço para serenida<strong>de</strong> —<br />

psica<strong>de</strong>lismo, certamente, mas nada<br />

<strong>de</strong> sonhos cósmicos <strong>de</strong> “hippies” <strong>de</strong><br />

olhos nas estrelas.<br />

Quando o vocalista Daniel Martin-<br />

McCormick canta “Is it cool? I get<br />

excited”, na supracitada “Latin<br />

lover”, não está a apelar a euforia<br />

dançante: este é o som <strong>de</strong> uma<br />

acusação e se dançamos<br />

furiosamente, é porque essa parece<br />

ser a única forma <strong>de</strong> resistir<br />

incólume a canções que vergastam<br />

em vez <strong>de</strong> acariciar, que distorcem<br />

em vez <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir, que se eximem a<br />

qualquer tipo <strong>de</strong> conforto. Mesmo<br />

“Dreamers”, com as suas guitarras<br />

estelares e os timbalões percutidos<br />

em ondulação, com a voz perdida<br />

entre os instrumentos, qual sussurro<br />

<strong>de</strong> “jam” opiácea, não mantém o<br />

tom encantatório muito tempo. A<br />

distorção há-<strong>de</strong> crescer até nada<br />

restar da placi<strong>de</strong>z anterior e a<br />

canção há-<strong>de</strong> encarrilar naquele que<br />

é o tom <strong>de</strong> “Steal Your Face”: música<br />

on<strong>de</strong> tudo o que interessa é o ritmo,


Fela Kuti e Paulson<br />

Kalu: a diversida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> abordagens ao<br />

afro-beat é imensa<br />

música que cobre <strong>de</strong> matéria<br />

perigosa e <strong>de</strong>safiante esse esqueleto<br />

que dança furiosamente.<br />

Quando, em “Secrets”, prestamos<br />

atenção à linha <strong>de</strong> sintetizador que<br />

se <strong>de</strong>senha em fundo, é como se<br />

estivéssemos perante um<br />

surpreen<strong>de</strong>nte híbrido <strong>de</strong> Caravan,<br />

Health e At The Drive In. O resultado<br />

é tão magnífico quanto<br />

<strong>de</strong>sconcertante. Exactamente como<br />

o álbum que o alberga.<br />

Mais um dia<br />

na América<br />

A América olhada pela<br />

lente <strong>de</strong> Laurie An<strong>de</strong>rson,<br />

numa das suas obras mais<br />

conseguidas <strong>de</strong> sempre.<br />

Vítor Belanciano<br />

Laurie An<strong>de</strong>rson<br />

Homeland<br />

Nonesuch Records, distri. Warner<br />

mmmmn<br />

Tematicamente, é<br />

a América olhada<br />

ao microscópico.<br />

Sonoramente, são<br />

temas lentos,<br />

feitos <strong>de</strong><br />

ambientes electrónicos,<br />

envolvimentos <strong>de</strong> violino e aquela<br />

forma particular <strong>de</strong> dizer as<br />

palavras, entre o falado e o cantado.<br />

Nenhum local que não tenha já<br />

visitado inúmeras vezes. Mas a<br />

verda<strong>de</strong> é que o novo álbum <strong>de</strong><br />

Laurie An<strong>de</strong>rson — o seu primeiro na<br />

última década — é capaz <strong>de</strong> ser o seu<br />

melhor <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a estreia com “Big<br />

Science” (1982).<br />

Essa extraordinária obra inaugural<br />

foi criada a partir <strong>de</strong> excertos das<br />

suas “performances” da época.<br />

Entre a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> concerto, a<br />

narração <strong>de</strong> histórias e a criação<br />

audiovisual, nas apresentações<br />

ao vivo <strong>de</strong>ssa fase interrogava a<br />

socieda<strong>de</strong> do consumo ou as<br />

reacções pré-computador aos<br />

<strong>de</strong>senvolvimentos ntos tecnológicos.<br />

Agora regressa com um disco<br />

também ele resultante <strong>de</strong> um<br />

espectáculo (“United<br />

States”), que passou há<br />

três anos por <strong>Lisboa</strong> e<br />

Braga, uma espécie <strong>de</strong><br />

concerto-poema, on<strong>de</strong><br />

encarnava uma<br />

personagem que<br />

evocava a autorida<strong>de</strong><br />

dos homens, e<br />

funcionava como<br />

consciência da<br />

América conflituosa<br />

que se ergueu no pós-11<br />

<strong>de</strong> Setembro.<br />

A confiança cega na<br />

autorida<strong>de</strong>, a apetência<br />

dos meios <strong>de</strong><br />

comunicação pelo<br />

espectáculo, o colapso<br />

financeiro ou a política externa<br />

da Administração Bush são<br />

reflectidos num registo que<br />

consegue ser tão cómico como<br />

trágico. Produzido pela própria e<br />

pelo marido Lou Reed, e contando<br />

com um naipe <strong>de</strong> importantes<br />

convidados (Antony, Hal Willner,<br />

Alva Noto, Steven Bernstein ou Four<br />

Tet), é uma obra <strong>de</strong> meditações<br />

envolvidas por uma certa aura <strong>de</strong><br />

mistério, entrecortadas pela sua voz<br />

— angélica umas vezes, processada<br />

digitalmente noutros casos — e por<br />

ocasionais incursões pelo tecno e<br />

jazz, mas convergindo sobretudo<br />

para uma sonorida<strong>de</strong> electrónica<br />

expansiva, mas grave e melancólica.<br />

O tema que domina o álbum é<br />

“Another day in América”, longa<br />

reflexão <strong>de</strong> 11 minutos — feita <strong>de</strong><br />

climas sombrios, orquestração<br />

dissonante e voz robotizada — que é,<br />

ao mesmo tempo, uma divagação<br />

pelo lixo e glória, actuação política<br />

precoce e hesitação cívica da<br />

socieda<strong>de</strong> americana, questionando<br />

“how do we begin again?”. An<strong>de</strong>rson<br />

soube como recomeçar numa obra<br />

que exige total disponibilida<strong>de</strong>, mas<br />

da qual se sai satisfeito.<br />

Vários<br />

Nigeria Special:<br />

Volume 2, Mo<strong>de</strong>rn<br />

High life, Afro<br />

Sounds & Nigerian<br />

Blues<br />

SoundWay; distri. Massala<br />

mmmmn<br />

Massala<br />

Laurie An<strong>de</strong>rson não<br />

gravava um álbum há<br />

uma década<br />

Vários<br />

Nigeria AfroBeat<br />

Special: The New<br />

Explosive Sound In<br />

1970’s Nigeria<br />

SoundWay; distri.<br />

mmmmn<br />

É curioso como os<br />

nomes evoluem.<br />

Como o próprio nome<br />

indica, o género<br />

musical “highlife”,<br />

(“high” pela parte da<br />

mãe Nigéria e “life”<br />

pela parte do<br />

pai Gana) não<br />

era<br />

exactamente<br />

música <strong>de</strong><br />

gente<br />

pobre.<br />

Estes, numa<br />

espécie <strong>de</strong><br />

ânsia <strong>de</strong><br />

igualda<strong>de</strong><br />

social<br />

começaram a<br />

nomear a sua<br />

música como<br />

“highlife”, pelo<br />

que a música hoje<br />

assim conhecida (e que é música<br />

rural do Gana ou da Nigéria feita<br />

com guitarras eléctricas e combos <strong>de</strong><br />

percussão) está longe do que era o<br />

“highlife” original (mais próximo do<br />

conceito <strong>de</strong> orquestra africana). A<br />

partir da belíssima compilação<br />

“Nigeria Special: Volume 2, Mo<strong>de</strong>rn<br />

High life, Afro Sounds & Nigerian<br />

Blues” po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>terminar as<br />

diferenças face ao “highlife” ganês:<br />

este último <strong>de</strong>ve mais a guitarras<br />

<strong>de</strong>dilhadas e ritmos em constantes<br />

quebrantes, enquanto no caso<br />

nigeriano a mistura dos géneros é<br />

maior e menos estratificada. Não<br />

<strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> ser um extraordinário<br />

conjunto <strong>de</strong> canções, fica a dois<br />

palmos <strong>de</strong> “Guitar and The Gun”, a<br />

melhor compilação <strong>de</strong> “highlife” que<br />

alguma vez ouvimos (e on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m<br />

ouvir o magnífico guitarrista Jean<br />

Noel). Já “Nigeria Afrobeat Special” é<br />

conceptualmente mais forte. Tem<br />

um único <strong>de</strong>feito: incluir um tema<br />

<strong>de</strong> Fela Kuti, homem por <strong>de</strong>mais<br />

versado em compilações do género.<br />

Por outro lado po<strong>de</strong> ser a primeira<br />

oportunida<strong>de</strong> para quem não<br />

conhece este género (que se baseia<br />

num “beat” simultaneamente<br />

quebrado e propulsor da dança) <strong>de</strong><br />

ouvir a extraordinária música <strong>de</strong><br />

Orlando Julius. Melhor que tudo:<br />

aqui se <strong>de</strong>monstra que a diversida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> abordagens ao afro-beat é imensa<br />

e que o género está longe <strong>de</strong> se<br />

reduzir a Fela Kuti. Certos autores<br />

preferem pôr órgãos “vintage” à<br />

frente, outros confiam mais nas<br />

guitarras, por vezes há “jams”,<br />

noutras confia-se nos arranjos <strong>de</strong><br />

metais. Nem só <strong>de</strong> suor se fez o afrobeat<br />

e aqui há psica<strong>de</strong>lismo <strong>de</strong> todas<br />

as cores. Uma gran<strong>de</strong> compilação.<br />

João Bonifácio<br />

Tame Impala<br />

Innerspeaker<br />

Modular Records<br />

mmmmn<br />

Uma audição<br />

apressada <strong>de</strong><br />

“Innerspeaker”, o<br />

disco <strong>de</strong> estreia dos<br />

Tame Impala, po<strong>de</strong><br />

levar os mais<br />

distraídos a, <strong>de</strong> súbito, qualificá-los<br />

como nostálgicos <strong>de</strong> um certo<br />

psica<strong>de</strong>lismo arroxeado da década<br />

<strong>de</strong> 1960 com uma possível tendência<br />

para a citação — tendência<br />

suficientemente lata para abarcar<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os United States of America<br />

aos Stone Roses. E, <strong>de</strong> facto, os<br />

homens psica<strong>de</strong>lizam e citam (os<br />

19ª edição<br />

10, 17, 24 JUL<br />

2010, 18h00<br />

Ténis do Parque <strong>de</strong> Serralves<br />

Programação: António Curvelo<br />

10 JUL<br />

VIJAY IYER TRIO<br />

17 JUL<br />

BERNARDO SASSETTI TRIO<br />

COM PERICO SAMBEAT<br />

24 JUL<br />

“CONTACT”<br />

Dave Liebman / John Abercrombie /<br />

Marc Copeland / Drew Gress / Billy Hart<br />

Bilhetes à venda na recepção <strong>de</strong> Serralves e em www.serralves.pt<br />

Apoio Institucional<br />

Apoio à Internacionalização<br />

Apoio<br />

Apoio Media<br />

Patrocinador do Jazz do Parque<br />

Fundação <strong>de</strong> Serralves / Rua D. João <strong>de</strong> Castro, 210 - Porto<br />

o/ww<br />

www.serralves.pt / serralves@serralves.pt / Informações: 808 200 543<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 35


Discos<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

Ratatat: a “trip” nunca se concretiza<br />

Tame Impala<br />

United States of America, os Stone<br />

Roses e muitos mais). Mas isso não<br />

os menoriza <strong>de</strong> todo. Tome-se, por<br />

exemplo, “Alter Ego”, a estupenda<br />

quarta canção do disco: pilha um<br />

“beat” usado milhares <strong>de</strong> vezes na<br />

electrónica mo<strong>de</strong>rna, ro<strong>de</strong>ia-o <strong>de</strong><br />

guitarras “glam” e dá-lhe um “rouge<br />

soul” na face: estamos tanto em<br />

território dos Broadcast como num<br />

lado B dos Beatles (fase<br />

“Revolution”) nunca lançado, um pé<br />

na melodia clássica, outro na pista<br />

<strong>de</strong> dança. O rei aqui é a guitarra, ora<br />

em “riffs” ora em <strong>de</strong>dilhados, ambos<br />

psicadélicos e etéreos. Quando a<br />

melodia se apruma lembramo-nos<br />

dos Stone Roses, até porque o baixo<br />

não está só a fazer figura <strong>de</strong> corpo<br />

presente. Quase sempre as vozes são<br />

“naives” e filtradas e podíamos jurar<br />

que, em “It’s not meant to be”, a<br />

bateria é passada pelos mesmos ecos<br />

e filtros usados pelos United States<br />

of America (e as guitarras usam os<br />

mesmos efeitos que os Byrds em<br />

“Eight Miles High”) . Ora mais pop,<br />

ora mais dançável, ora mais<br />

púrpura, o gran<strong>de</strong> mérito dos Tame<br />

Impala é juntar todas essas<br />

influências numa voz adormecida no<br />

mar <strong>de</strong> gaze das guitarras. Vão ser,<br />

obviamente, os próximos gran<strong>de</strong>s<br />

qualquer-coisa e alguém <strong>de</strong> bom<br />

senso <strong>de</strong>via editá-los cá e trazê-los<br />

para uma <strong>de</strong>sbunda <strong>de</strong> seis cordas a<br />

berrar alto. Muito alto. J.B.<br />

Tudo negro neste<br />

“Dark Si<strong>de</strong> Of The<br />

Moon”<br />

The Flaming Lips & Stardust And<br />

White Dwarfs<br />

The Dark Si<strong>de</strong> Of The Moon<br />

Warner<br />

mmmnn<br />

A i<strong>de</strong>ia<br />

parece<br />

<strong>de</strong>scabida. a.<br />

Uma releitura,<br />

canção por canção,<br />

<strong>de</strong> “Dark Si<strong>de</strong> Of<br />

The Moon”, clássico<br />

dos clássicos dos<br />

Pink Floyd que, não<br />

sendo necessariamente o melhor<br />

disco da banda, é o mais<br />

emblemático. À primeira vista, não<br />

passa <strong>de</strong> uma perda <strong>de</strong> tempo que<br />

chamará a atenção durante 15<br />

minutos antes <strong>de</strong> <strong>de</strong>saparecer <strong>de</strong><br />

cena. Assim seria, não se <strong>de</strong>sse o<br />

caso <strong>de</strong> falarmos dos Flaming Lips,<br />

que gravaram em tempos um álbum<br />

quádruplo chamado “Zaireeka”, que<br />

só po<strong>de</strong>ríamos ouvir tal como<br />

i<strong>de</strong>alizado tocando os quatro CDs<br />

em simultâneo, em quatro<br />

aparelhagens diferentes. Ou seja, os<br />

Flaming Lips, que voltaram a soar<br />

urgentes e “psica<strong>de</strong>licamente”<br />

excessivos em “Embryonic” (o<br />

último álbum, <strong>de</strong> 2009), lançaramse<br />

às canções <strong>de</strong> “Dark Si<strong>de</strong> Of The<br />

Moon” porque, muito simplesmente,<br />

podiam fazê-lo.<br />

Convocaram Star<strong>de</strong>ath And White<br />

Dwarfs, a banda <strong>de</strong> Dennis Coyne,<br />

sobrinho <strong>de</strong> Wayne Coyne, <strong>de</strong>ram<br />

um toque a Henry Rollins e outro a<br />

Peaches e montaram uma bizarria<br />

que, ao contrário da maioria dos<br />

álbuns <strong>de</strong> versões, soa melhor na<br />

prática que em teoria.<br />

Editado em formato digital em<br />

Janeiro, conhece agora edição física.<br />

Nele, os Flaming Lips e os Star<strong>de</strong>ath<br />

And White Dwarfs transportam o<br />

psica<strong>de</strong>lismo “technicolor” e a<br />

limpi<strong>de</strong>z sonora do original para o seu<br />

próprio território. Ou seja, o ambiente<br />

torna-se <strong>de</strong>nso, as guitarras distorcem<br />

e planam em “feedback”, o<br />

existencialismo ganha contornos <strong>de</strong><br />

neurose. Henry Rollins, responsável<br />

pelo “spoken word” entre canções, dá<br />

o tom logo a início: “I’ve been mad for<br />

fucking years! I’m mad, I’ve always<br />

been mad!” E Peaches, mais à frente,<br />

ao recriar o solo vocal <strong>de</strong> “The great<br />

gig in the sky” em gritos enfurecidos,<br />

<strong>de</strong>mentes, prova que o “lunatic” <strong>de</strong>ste<br />

novo “Dark Si<strong>de</strong> Of The Moon” é<br />

realmente diferente do original<br />

imaginado por Roger Waters —<br />

digamos que, impulsionado pelo som<br />

dos Flaming Lips em “Embryonic”, foi<br />

criado da perspectiva da “cançãopsicose”<br />

dos Pink Floyd, “Careful with<br />

axe, Eugene”.<br />

Ao contrário da maioria dos álbuns <strong>de</strong> versões, a releitura dos Pink<br />

Floyd pelos Flaming Lips soa melhor na prática do que na teoria<br />

Mais curiosa que brilhante, a nova<br />

versão põe toques <strong>de</strong> telemóvel no<br />

lugar dos relógios <strong>de</strong> corda <strong>de</strong><br />

“Time”, transforma “On the run” em<br />

disco-funk “janado” (tudo<br />

reverberações e guitarras silvando<br />

como sirenes <strong>de</strong> nave espacial),<br />

transforma “Breath” em hino às<br />

maravilhas do “fuzz” aplicado ao<br />

som <strong>de</strong> baixo e faz <strong>de</strong> uma trôpega<br />

caixa <strong>de</strong> ritmos o suporte para a<br />

preguiçosa e falhada versão <strong>de</strong><br />

“Money” — o momento “ao lado” do<br />

álbum.<br />

“There’s no dark si<strong>de</strong> of the moon,<br />

really. As a matter of fact, it’s all<br />

dark”, <strong>de</strong>spe<strong>de</strong>-se Henry Rollins. Os<br />

Pink Floyd matizavam essa<br />

constatação com música grandiosa,<br />

<strong>de</strong> uma luminosida<strong>de</strong> reconfortante.<br />

Os Flaming Lips preferem brincar na<br />

escuridão. E, apesar <strong>de</strong><br />

continuarmos sem saber por que<br />

raio se aventuraram numa coisa<br />

<strong>de</strong>stas, saem-se bem. Não<br />

<strong>de</strong>slumbram, divagam livremente. E<br />

divertem. M.L.<br />

Psica<strong>de</strong>lismo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>signer<br />

Ratatat<br />

LP4<br />

XL Recordings; distri. Popstock<br />

mmmnn<br />

O álbum anterior<br />

tinha como título<br />

“LP3”. Este, o<br />

quarto, foi<br />

baptizado “LP4”,<br />

como se fosse a<br />

continuação da série. Faz todo o<br />

sentido. O som dos Ratatat, duo<br />

americano formado por Mike Stroud<br />

e Evan Mast, mantém-se inalterável<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> a edição do álbum homónimo<br />

em 2004.<br />

Neste momento, po<strong>de</strong>m ser nome<br />

em ascensão enquanto produtores<br />

hip-hop, tendo trabalhado com Kid<br />

Cudi no seu álbum <strong>de</strong> estreia, “Man<br />

On The Moon: The End Of Day”, mas<br />

enquanto Ratatat mantêm o rumo<br />

inalterado: prosseguem pela autoestrada<br />

cósmica pejada <strong>de</strong><br />

sintetizadores ambientais, guitarras<br />

planantes e ritmos <strong>de</strong> um<br />

minimalismo eficiente. São<br />

psica<strong>de</strong>lismo <strong>de</strong> <strong>de</strong>signer,<br />

impecavelmente construído. Mas a<br />

verda<strong>de</strong> é que, apesar das<br />

produções luxuriantes (até<br />

acrescentaram tablas ou percussões<br />

turcas à equação), não passam <strong>de</strong><br />

música <strong>de</strong> fundo (<strong>de</strong> bom gosto<br />

inatacável, mas música <strong>de</strong> fundo<br />

ainda assim).<br />

Apreciamos as guitarras<br />

floydianas e o som do<br />

“harpsichord”, gostamos dos Moogs,<br />

da elegância das batidas, das<br />

sugestões funk e das orquestrações<br />

apontando a Oriente; apreciamos<br />

tudo isso e esta i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> uns Daft<br />

Punk alegremente ven<strong>de</strong>ndo a alma<br />

ao “space-rock” (sem rock,<br />

naturalmente), mas a “trip” nunca<br />

se concretiza. Limita-se a ficar lá<br />

longe, incógnita, a acariciar o<br />

subconsciente. M.L.<br />

Uma questão<br />

<strong>de</strong> ritmo<br />

PAUS<br />

É uma Água<br />

Enchufada<br />

mmmmn<br />

O EP <strong>de</strong> estreia dos PAUS confirma<br />

os sinais muito<br />

positivos que os<br />

lisboetas andavam<br />

a transmitir nos<br />

palcos. União <strong>de</strong><br />

músicos dos If Lucy<br />

Fell e Linda Martini com um ex-<br />

Vicious Five, os PAUS inventam uma<br />

música <strong>de</strong> difícil classificação,<br />

fortemente ancorada no ritmo. A<br />

culpa é da “bateria siamesa” (dois<br />

bateristas tocam em duas baterias<br />

unidas pelo mesmo bombo), uma<br />

criação do grupo que é a força<br />

propulsora das quatro canções aqui<br />

reunidas. Acompanham-na cânticos<br />

comunais (com palavras, em “Pelo<br />

pulso”, ou sem elas, a lembrar os<br />

ritos vocais dos Animal Collective,<br />

como em “Mete as mãos à boca”),<br />

um baixo a <strong>de</strong>sempenhar as suas<br />

funções habituais e as <strong>de</strong> uma<br />

guitarra e sintetizadores.<br />

“Lupiter Deacon” é um espantoso<br />

momento <strong>de</strong> fervilhar percussivo,<br />

sintetizador alienígena e dinâmicas<br />

crescendo-explosão — e um<br />

divertido momento “na na na na<br />

na”, que sublinha o apelo lúdico<br />

<strong>de</strong>stas canções. “Mete as mãos à<br />

boca” lembra uns Battles sem os<br />

histerismos e mais dados aos<br />

encantos libertários da selva,<br />

enquanto “Mudo e surdo” inventa<br />

uma espécie <strong>de</strong> “stoner” suave, com<br />

teclados aos círculos e cantorias<br />

gloriosamente <strong>de</strong>sprovidas <strong>de</strong><br />

sentido. “É uma Água”, interessante<br />

cruzamento <strong>de</strong> referências com a<br />

dose certa <strong>de</strong> idiossincrasias, augura<br />

um futuro radiante para os PAUS.<br />

Pedro Rios<br />

PAUS: o futuro é radiante<br />

Afrobeat<br />

futurista<br />

Donso<br />

Donso<br />

Comet, distri. Megamúsica<br />

mmmnn<br />

Álbum <strong>de</strong> estreia <strong>de</strong><br />

um novo quarteto<br />

com um pé na<br />

cultura tradicional<br />

do Mali e outro na<br />

cena <strong>de</strong> dança <strong>de</strong><br />

colheita francesa. De um lado estão<br />

Ge<strong>de</strong>on Papa Diarra, cantor <strong>de</strong> voz<br />

carinhosa, Guimba Kouyate,<br />

virtuoso do n’goni e doutras cordas,<br />

reforçados por um punhado <strong>de</strong><br />

instrumentistas malis. Do outro há<br />

Thomas Guillaume, típico<br />

percussionista entre cá e lá, e Pierre-<br />

Antoine Grison, que na editora<br />

tecno Ed Banger respon<strong>de</strong> pelo<br />

nome artístico <strong>de</strong> KrazyBalhead.<br />

Juntos, o que fazem é música <strong>de</strong><br />

fusão raízes afro-electrónica, o que<br />

nos tempos que correm está longe<br />

<strong>de</strong> ser uma novida<strong>de</strong>.<br />

Não será muito original, portanto,<br />

mas os Donso exibem na estreia um<br />

leque <strong>de</strong> trunfos que também não<br />

são <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezar. Ge<strong>de</strong>on Papa<br />

Diarra é, para começar, um cantor<br />

notável num estilo a meio caminho<br />

entre o purificador dos espíritos e o<br />

encantor <strong>de</strong> serpentes, tão à<br />

vonta<strong>de</strong> nas gran<strong>de</strong>s paisagens<br />

<strong>de</strong>sérticas, como no espaço<br />

acanhado das caves dançantes<br />

europeias. A equação <strong>de</strong> ritmos<br />

africanos com prestigiditação<br />

electrónica raramente terá soado<br />

tão harmónica e natural como nesta<br />

sequência <strong>de</strong> misturas elásticas e<br />

pulsantes.<br />

Por vezes, o convite a dançar é<br />

irresistível, outras, porventura a<br />

maior parte, é uma coisa mais<br />

anímica, uma vibração que não anda<br />

longe do <strong>de</strong>vaneio e da hipnose.<br />

Po<strong>de</strong>rá não adiantar gran<strong>de</strong> coisa,<br />

mas a estreia dos Donso <strong>de</strong>staca-se<br />

por este “groove” contagioso, que<br />

(melhor que muita concorrência) faz<br />

justiça ao programa <strong>de</strong> um afrobeat<br />

futurista. Luís Maio<br />

36 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Jos van Immerseel: a sua interpretação <strong>de</strong> Berlioz<br />

diverge das propostas com orquestras mo<strong>de</strong>rnas<br />

Clássica<br />

Radiografia<br />

da “Sinfonia<br />

Fantástica”<br />

A magia tímbrica dos<br />

instrumentos <strong>de</strong> época e o<br />

rigor <strong>de</strong> Van Immerseel e<br />

da Anima Eterna acentuam<br />

ainda mais as inovações <strong>de</strong><br />

Berlioz. Cristina Fernan<strong>de</strong>s<br />

Berlioz<br />

Sinfonia Fantástica<br />

Anima Eterna Brugge<br />

Jos van Immerseel (direcção)<br />

Zig-Zag Territoires<br />

mmmmn<br />

Composta em<br />

1830, a “Sinfonia<br />

Fantástica”, <strong>de</strong><br />

Berlioz, é um<br />

exemplo<br />

revolucionário da<br />

arte da orquestração e um<br />

paradigma da música programática<br />

do Romantismo, mesmo se mais<br />

tar<strong>de</strong> o autor prescindiu do<br />

argumento que relatava a paixão<br />

obsessiva <strong>de</strong> um artista por uma<br />

jovem mulher (representada<br />

musicalmente por uma “i<strong>de</strong>ia fixa”<br />

que percorre toda a obra) e as suas<br />

alucinações motivados pelo ópio. As<br />

interpretações <strong>de</strong>sta obra em<br />

instrumentos <strong>de</strong> época não são<br />

inéditas, mas são escassas. Depois<br />

<strong>de</strong> Norrington, Gardiner e<br />

Minkowski, surgiu há pouco tempo a<br />

reveladora versão <strong>de</strong> Jos van<br />

Immerseel com a sua orquestra<br />

Anima Eterna. Conhecendo-se o<br />

perfil meticuloso do maestro belga,<br />

era previsível que o resultado fosse<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> rigor e se revestisse <strong>de</strong> um<br />

colorido e <strong>de</strong> uma transparência que<br />

diverge das propostas com<br />

orquestras mo<strong>de</strong>rnas, normalmente<br />

caracterizadas por uma massa<br />

sonora mais compacta. A direcção<br />

As composições <strong>de</strong> Pascal Dusapin têm sido<br />

dirigidas por Rostropovitch, Krivine, Simon Rattle<br />

ou Michel Plasson<br />

<strong>de</strong> Immerseel é <strong>de</strong> uma<br />

objectivida<strong>de</strong> quase anti-romântica,<br />

mas a obra nunca per<strong>de</strong> a sua força.<br />

Pelo contrário: a percepção <strong>de</strong> um<br />

tecido orquestral on<strong>de</strong> cada linha e<br />

pormenor se distinguem com<br />

enorme niti<strong>de</strong>z, assim como a<br />

sedução tímbrica — ouçam-se as<br />

ma<strong>de</strong>iras na “Cena nos Campos” ou<br />

os oficlei<strong>de</strong>s associados ao “Dies<br />

Irae” —, contribuem para tornar<br />

ainda mais evi<strong>de</strong>nte o carácter<br />

inovador da composição. No<br />

burlesco Sabbath das bruxas<br />

retratado no último andamento,<br />

Immerseel usa dois pianos Érard em<br />

lugar dos sinos, solução que teria<br />

sido seguida pelo próprio Berlioz<br />

nalgumas salas <strong>de</strong> concerto, e<br />

recorre à sugestiva técnica do “col<br />

legno” (as cordas são percutidas pela<br />

vara do arcos dos violinos) na<br />

evocação da grotesca dança dos<br />

esqueletos. É conhecida a atracção<br />

<strong>de</strong> Berlioz pelas orquestras <strong>de</strong><br />

dimensões megalómanas, mas<br />

Immerseel opta aqui por um efectivo<br />

médio (pouco mais <strong>de</strong> 60 músicos),<br />

apoiando-se no facto <strong>de</strong> o<br />

compositor ter ficado satisfeito com<br />

o resultado obtido com orquestras<br />

alemãs <strong>de</strong> 50 instrumentistas. É<br />

possível que esta opção se <strong>de</strong>va<br />

também a questões <strong>de</strong> economia,<br />

mas por outro lado vem ao encontro<br />

da estética habitual da Anima<br />

Eterna, caracterizada por uma<br />

clareza quase camarística que<br />

parece aspirar a obter uma<br />

radiografia da estrutura interna da<br />

música. A “Sinfonia Fantástica” é<br />

complementada por uma versão<br />

igualmente <strong>de</strong>purada da abertura “O<br />

Carnaval Romano”.<br />

Uma odisseia<br />

orquestral<br />

Pascal Dusapin<br />

7 Solos pour orchestre<br />

Orchestre Philharmonique <strong>de</strong> Liège<br />

Wallonie Bruxelles<br />

Pascal Rophé (direcção)<br />

Naive, 2 CD<br />

mmmmn<br />

Pascal Dusapin<br />

(França, 1955) é um<br />

dos mais <strong>de</strong>stacados<br />

compositores da<br />

actualida<strong>de</strong>, senhor<br />

<strong>de</strong> um extenso<br />

catálogo <strong>de</strong> obras, tocadas<br />

regularmente por prestigiados<br />

agrupamentos em todo o mundo, as<br />

quais se encontram, em gran<strong>de</strong><br />

parte, gravadas pela editora Naïve.<br />

Sendo indiscutível o seu sucesso no<br />

domínio da ópera e no da música<br />

concertante, Dusapin tem um<br />

inquestionável domínio da escrita<br />

orquestral, na qual <strong>de</strong>monstra a sua<br />

“verve” melódica e o largo espectro<br />

<strong>de</strong> influências no seu trabalho.<br />

Os “7 Solos para orquestra”<br />

resultam <strong>de</strong> um conjunto <strong>de</strong> obras<br />

escritas entre 1991 e 2008. Aquando<br />

das suas respectivas estreias, foram<br />

dirigidos por maestros da craveira<br />

<strong>de</strong> Rostropovitch, Krivine, Simon<br />

Rattle ou Michel Plasson, facto que<br />

atesta o reconhecimento<br />

internacional do compositor. Desta<br />

vez, foram todos gravados pela<br />

mesma orquestra, sob a direcção <strong>de</strong><br />

Pascal Rophé, maestro muito<br />

associado a Dusapin.<br />

No seu percurso <strong>de</strong> 18 anos, fica<br />

<strong>de</strong>monstrado um cunho pessoal <strong>de</strong><br />

escrita extremamente consistente e<br />

<strong>de</strong> gran<strong>de</strong> dramatismo. Sendo a<br />

origem das peças autónoma, mesmo<br />

se primordialmente consi<strong>de</strong>radas<br />

como parte <strong>de</strong> um conjunto maior, a<br />

sua audição na íntegra parte <strong>de</strong> um<br />

pressuposto legítimo mas<br />

extremamente ambicioso. É que as<br />

suas relações harmónicas e<br />

motívicas, ou a exploração <strong>de</strong> certos<br />

efeitos aparentados, po<strong>de</strong> tornar a<br />

experiência confusa ou cansativa,<br />

mesmo tendo em conta que umas<br />

obras são mais “harmónicas”, outras<br />

mais “melódicas” ou, ainda, que<br />

exploram atmosferas mais estáticas<br />

ou contrastantes. A direcção <strong>de</strong><br />

Pascal Rophé é atenta aos <strong>de</strong>talhes e<br />

perfeita no domínio das atmosferas,<br />

<strong>de</strong>ixando, contudo, a sensação <strong>de</strong><br />

ainda haver espaço para uma maior<br />

beleza no potencial das partituras <strong>de</strong><br />

Dusapin.<br />

Jazz<br />

Somos todos<br />

bicaenses<br />

O novo projecto <strong>de</strong> Carlos<br />

Bica supera as expectativas.<br />

Nuno Catarino<br />

Carlos Bica<br />

Matéria Prima<br />

Clean Feed<br />

mmmmn<br />

Carlos Bica<br />

andava<br />

satisfeito com o<br />

seu trio<br />

Azul,<br />

uma<br />

parceria com Jim<br />

Black e Frank<br />

Möbus, mas<br />

resolveu avançar ançar<br />

para um projecto<br />

alternativo.<br />

Juntou o<br />

bateristarevelação<br />

João<br />

Lobo, o<br />

experiente<br />

guitarrista<br />

Mário Delgado<br />

e o brilhante<br />

pianista João o<br />

Paulo<br />

(parceria<br />

reforçada<br />

com o<br />

disco<br />

“White Works”). Convidou ainda o<br />

jovem trompetista alemão Matthias<br />

Schriefl, para acrescentar dinâmica.<br />

Neste disco gravado ao vivo, o<br />

quinteto trabalha alguns temas do<br />

repertório <strong>de</strong> Bica, mas não só. Para<br />

além <strong>de</strong> reinventar temas antigos<br />

como “Believer”, “Iceland” ou<br />

“Roses for you” (entre outros),<br />

inclui ainda inesperadas versões:<br />

“For Malena”, <strong>de</strong> Marc Ribot, ou o<br />

tema principal do filme “Paris,<br />

Texas”, <strong>de</strong> Ry Coo<strong>de</strong>r. É inevitável<br />

fazer a comparação <strong>de</strong>sta música<br />

com o trio Azul, mas este projecto<br />

consegue surpreen<strong>de</strong>r: a guitarra <strong>de</strong><br />

Delgado faz esquecer a frieza <strong>de</strong><br />

Frank Möbus; João Lobo não será<br />

Jim Black, mas aguenta o ritmo<br />

sempre com segurança; o piano (e o<br />

pontual acor<strong>de</strong>ão) <strong>de</strong> João Paulo<br />

acrescenta novas cores; o trompete<br />

<strong>de</strong> Schriefl brilha quando solicitado;<br />

e Bica continua o irrepreensível<br />

mestre do contrabaixo, versátil,<br />

criativo. Nada a apontar às<br />

composições (apenas a ausência <strong>de</strong><br />

novida<strong>de</strong>s), mas o mais importante é<br />

ver o modo como são<br />

transformadas: cada canção é<br />

investida com uma intensa energia,<br />

todos os músicos revelam um<br />

impecável acerto e cada tema vai<br />

ganhando asas à medida que é<br />

<strong>de</strong>senvolvido, e a força das melodias<br />

(tão açucaradas que nos conquistam<br />

com facilida<strong>de</strong>) vão sendo<br />

reforçadas pelos arabescos<br />

individuais. Vivendo entre a<br />

sofisticação e o “kitsch”, a música<br />

balança mesmo até à fronteira do<br />

piroso, mas é tudo sabiamente<br />

controlado o pelo lí<strong>de</strong>r contrabaixista.<br />

Este disco não é (só) jazz,<br />

esbate fronteiras <strong>de</strong><br />

estilo: é pop, é rock, é<br />

afro-cubana, é<br />

latina, tanta coisa<br />

ao mesmo tempo.<br />

Bica tem aqui um<br />

gran<strong>de</strong> disco, muito<br />

bem <strong>de</strong>senhado,<br />

muito bem<br />

executado, muito<br />

acessível.<br />

O novo projecto <strong>de</strong> Carlos Bica<br />

consegue surpreen<strong>de</strong>r<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 37


Concertos<br />

Vijay Iyer, um pianista jazz capaz<br />

<strong>de</strong> enveredar por múltiplos rumos,<br />

<strong>de</strong> M.I.A. aos clássicos<br />

Jazz<br />

Parque &<br />

Jazz<br />

O jazz regressa ao campo<br />

<strong>de</strong> ténis <strong>de</strong> Serralves. Nuno<br />

Catarino<br />

Jazz No Parque 2010<br />

Vijay Iyer Trio / Bernardo Sassetti<br />

Trio & Perico Sambeat / Contact<br />

Porto. Parque <strong>de</strong> Serralves. R. Serralves, 997. Tel:<br />

226156500. Sáb., 10, às 18h. De 10/07 a 24/07.<br />

Bilhetes entre €5 e €10.<br />

O palco é original, já bem conhecido<br />

para os fregueses do costume: o<br />

campo <strong>de</strong> ténis do Parque <strong>de</strong><br />

Serralves. Mais um ano, mais uma<br />

edição do Jazz No Parque, o festival<br />

<strong>de</strong> jazz <strong>de</strong> Serralves, três concertos<br />

em três sábados consecutivos: 10, 17<br />

e 24 <strong>de</strong> Julho, sempre às 18h. A<br />

programação <strong>de</strong>ste ano volta a ser<br />

da responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> António<br />

Curvelo e serão apresentadas três<br />

propostas do melhor jazz que se vai<br />

fazendo por aí.<br />

No primeiro dia do festival, 10 <strong>de</strong><br />

Julho, actua o trio do pianista Vijay<br />

Iyer, que recentemente editou<br />

“Historicity”. Este disco, que foi<br />

reconhecido como um dos melhores<br />

do ano transacto, mostra um<br />

pianista em excelente forma a<br />

enveredar por múltiplos rumos e<br />

capaz <strong>de</strong> absorver a mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>:<br />

veja-se esse exemplo supremo que é<br />

a versão <strong>de</strong> “Galang” <strong>de</strong> M.I.A., a<br />

conviver bem ao lado <strong>de</strong><br />

reinterpretações<br />

<strong>de</strong> clássicos<br />

como Andrew Hill (“Smoke<br />

Stack”) ou Julius<br />

Hemphill<br />

(“Dogon A.D.”).<br />

No dia 17 actua o trio <strong>de</strong><br />

Bernardo Sassetti, com um<br />

convidado especial, o<br />

espanhol Perico Sambeat.<br />

Sassetti acaba <strong>de</strong> editar o disco<br />

“Motion”, mais uma vez muito<br />

bem acompanhado pelo<br />

contrabaixista Carlos<br />

Barretto e<br />

pelo baterista<br />

Alexandre Frazão,<br />

que já se afirmou<br />

como um dos<br />

gran<strong>de</strong>s<br />

marcos<br />

discográficos<br />

do ano. Além<br />

do convidado<br />

saxofonista, este<br />

concerto vai ser<br />

marcado pela<br />

estreia <strong>de</strong> novas<br />

composições do<br />

pianista. O Jazz no<br />

Parque<br />

encerra com<br />

a actuação, no dia 24<br />

<strong>de</strong> Julho, do grupo<br />

Contact, que reúne um<br />

quinteto <strong>de</strong> intérpretes<br />

<strong>de</strong> primeira linha: Dave<br />

Omar Souleyman<br />

Liebman (saxofone), John<br />

Abercrombie (guitarra), Marc<br />

Copeland (piano), Drew Gress<br />

(contrabaixo) e Billy Hart (bateria).<br />

Com músicos brilhantes como estes,<br />

será difícil conter as expectativas.<br />

Pop<br />

Omar para dançar<br />

Omar Souleyman<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />

Albuquerque. Tel.: 220120220. 3ª, 13, às 22h. 10€.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Lux Frágil. Av. Infante D. Henrique -<br />

Armazém A (Cais da Pedra a Santa Apolónia). 5ª,<br />

15, às 23h. Tel.: 218820890. 10€.<br />

Há cerca <strong>de</strong> um ano, o sírio Omar<br />

Souleyman e o seu colectivo <strong>de</strong><br />

músicos converteram o Anfiteatro<br />

da Gulbenkian, em <strong>Lisboa</strong>, numa<br />

invulgar pista <strong>de</strong> dança, através <strong>de</strong><br />

uma música física e sintética. Não<br />

custa acreditar que po<strong>de</strong>rá<br />

acontecer o mesmo na Casa da<br />

Música (com os Coup <strong>de</strong>Bam) e no<br />

Lux. Autêntica lenda pop na Síria, a<br />

música <strong>de</strong> Souleyman só agora tem<br />

sido dada a conhecer no oci<strong>de</strong>nte. A<br />

sua sonorida<strong>de</strong> <strong>de</strong> combina<br />

influências turcas, curdas e<br />

árabes, dissolvidas numa<br />

abordagem electrónica ectrónica<br />

repleta <strong>de</strong> cordas e<br />

percussão. É uma<br />

sonorida<strong>de</strong> no fio da<br />

navalha do cor-<strong>de</strong>-rosa<br />

para ouvidos<br />

oci<strong>de</strong>ntais, mas é<br />

precisamente o<br />

à-vonta<strong>de</strong> dos<br />

músicos, e a<br />

dinâmica <strong>de</strong><br />

festa que é<br />

imposta, que<br />

acabam por<br />

conquistar.<br />

Pertencente aos<br />

quadros da<br />

Sublime<br />

Frequencies,<br />

editora americana especialista em<br />

lançar músicos <strong>de</strong>sconhecidos do<br />

continente africano e asiático,<br />

Souleyman lançou este ano o álbum<br />

“Jazeera Nights: folk and pop sounds<br />

of Syria”, compilação <strong>de</strong> temas<br />

anteriormente apenas disponível em<br />

cassete. Não <strong>de</strong>ve ter sido fácil<br />

compilar uma dúzia <strong>de</strong> canções<br />

provenientes <strong>de</strong>ssas cassetes — é que<br />

nos últimos anos, lançou cerca <strong>de</strong><br />

500, apenas na Síria. Vítor<br />

Belanciano<br />

Os imperdíveis<br />

Strange Boys<br />

The Strange Boys<br />

<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do<br />

Sodré. 4ª, 14, às 22h30. Tel.: 213430107. 8€.<br />

Os Strange Boys são das bandas mais<br />

entusiasmantes que o rock’n’roll nos<br />

ofereceu nos últimos anos e isso é<br />

óbvio para quem lhes conhece “The<br />

Strange Boys And Girls Club” e “Be<br />

Brave”, os dois álbuns que<br />

compõem a sua discografia. Isso é<br />

ainda mais óbvio para quem já os viu<br />

em concerto. Sobem a palco para ser<br />

sonho Dylanesco alimentado a<br />

hormonas <strong>de</strong> adolescente, para ser<br />

elo mo<strong>de</strong>rno<br />

numa<br />

ca<strong>de</strong>ia<br />

muito<br />

antiga (e<br />

sai uma<br />

versão <strong>de</strong><br />

The Strange Boys: canções urgentes e imediatas no MusicBox<br />

Cree<strong>de</strong>nce<br />

Clearwater<br />

Revival).<br />

Eles que<br />

Morcheeba<br />

veremos no<br />

Musicbox, em<br />

<strong>Lisboa</strong>, na<br />

próxima quartafeira<br />

(o ano<br />

passado<br />

passaram pelo<br />

Lounge e pelo<br />

festival Pare<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Coura), recuam<br />

às raízes sem pulsões puristas: it<br />

interessa-lhes aquele momento em<br />

que uma canção se reduz à sua<br />

forma mais urgente e imediata, sem<br />

filtro, e captam nesse movimento<br />

uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> presente, <strong>de</strong> agora, que<br />

reconhecemos nos melhores. E os<br />

Strange Boys <strong>de</strong> Ryan Sambol, o<br />

vocalista/guitarrista <strong>de</strong> voz<br />

estri<strong>de</strong>nte, imediatamente<br />

reconhecível, são claramente uns<br />

dos melhores.<br />

Filtraram toda a história <strong>de</strong><br />

garage-rock, perceberam ao ver os<br />

Black Lips em concerto a força<br />

incorruptível do rock’n’roll e,<br />

quando lhe <strong>de</strong>ram voz própria, a<br />

pessoalíssima voz <strong>de</strong> Ryan Sambol,<br />

cantautor <strong>de</strong>salinhado em banda<br />

eléctrica, tornaram-se vitais. O<br />

concerto é, obviamente, imperdível.<br />

Mário Lopes<br />

Os consagrados e a<br />

nostalgia do Festival<br />

Marés Vivas<br />

Festival Marés Vivas 2010<br />

Vila Nova <strong>de</strong> Gaia. No recinto junto à foz do Rio<br />

Douro (Cabe<strong>de</strong>lo). 5ª, 15, às 18h00 (portas). 25€<br />

(dia). Passe Festival: 45€. Informações: 223703735<br />

(Posto Turismo Gaia).<br />

Palco TMN: GNR, Goldfrapp,<br />

Morcheeba, Edward Maya. Palco<br />

Moche: Dr1ve, Lobo.<br />

A partir da próxima quinta-feira<br />

haverá Marés Vivas no Cabe<strong>de</strong>lo, em<br />

Gaia. Marés Vivas, o festival,<br />

entenda-se. Chega este ano à oitava<br />

edição e mantém-se fiel ao espírito<br />

que o vem<br />

caracterizando.<br />

Ou seja, aposta<br />

38 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Norah Jones no<br />

Cool Jazz Fest<br />

Dead Combo em trio com o realizador Bruno <strong>de</strong><br />

Almeida no Festival <strong>de</strong> Curtas <strong>de</strong> Vila do Con<strong>de</strong><br />

James Murphy vai<br />

aos pratos no Lux<br />

Dee Dee<br />

Bridgewater<br />

Quinteto<br />

Agenda<br />

em consagrados pelo gran<strong>de</strong><br />

público e na carga nostálgica <strong>de</strong><br />

nomes do passado.<br />

Na próxima quinta-feira, primeiro<br />

dia <strong>de</strong> um festival que terminará<br />

sábado, dia 17, veremos os GNR,<br />

cabeças <strong>de</strong> cartaz do primeiro dia, e<br />

Goldfrapp apresentarem os seus<br />

novos álbuns, “Retropolitana” e<br />

“Head First”. Ouvir-se-ão os<br />

regressados Morcheeba,<br />

recentemente reunidos, mostrar o<br />

novo álbum, “Blood Like<br />

Lemona<strong>de</strong>”, e passar em revista<br />

uma carreira que começou no triphop<br />

antes <strong>de</strong> ganhar protagonismo<br />

com a conversão a uma pop tingida<br />

<strong>de</strong> motivos soul (não faltará<br />

certamente “Rome wasn’t built<br />

in a day”).<br />

Depois chegarão os Placebo,<br />

cabeças <strong>de</strong> cartaz <strong>de</strong> sexta-feira, e o<br />

seu glam, versão anos 1990, <strong>de</strong><br />

“Without you I’m nothing”,<br />

chegarão o furacão Peaches e o<br />

espectáculo <strong>de</strong> David Fonseca, no<br />

mesmo dia, e o habitué Ben Harper,<br />

presença habitual em palcos<br />

portugueses e que para encerrar<br />

o festival traz consigo os Relentless<br />

7, a banda que o vem<br />

acompanhando em estúdio e em<br />

palco <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2008, e com quem<br />

gravou “White Lies for Dark Times”<br />

(regresso ao rock mais agreste dos<br />

primeiros tempos) e “Live From<br />

The Montreal International Jazz<br />

Festival”. A noite <strong>de</strong> Sábado conta<br />

ainda com os dEUS, banda querida<br />

dos indies portugueses <strong>de</strong> há duas<br />

décadas, e com os Editors, os mais<br />

bem-sucedidos representantes do<br />

revivalismo pós-punk p britânico.<br />

Para além<br />

Goldfrapp no Festival<br />

Marés Vivas<br />

sexta 9<br />

Optimus Alive! 10<br />

Algés. Passeio Marítimo <strong>de</strong> Algés. Às 17h00. 50€<br />

(dia). Passe Festival: 90€.<br />

Palco Optimus: Jet (18h30), Mão<br />

Morta (19h50), Manic Street<br />

Preachers (21h10), Skunk Anansie<br />

(22h50), Deftones (00h30). Palco<br />

Super Bock: Hurts (17h), Holy Ghost!<br />

(18h10), The Maccabees (19h20),<br />

New Young Pony Club (20h35),<br />

Gossip (21h55), Booka Sha<strong>de</strong><br />

(23h20), Bloody Beetroots Death<br />

Crew 77 (00h55), Steve Aoki (02h).<br />

Palco Optimus Clubbing: Enchufada<br />

DJs (17h), Macacos do Chinês<br />

(18h40), Paus (19h55), Zombies for<br />

Money (20h50), Octa Push (22h05),<br />

Sin<strong>de</strong>n (23h), Buraka Som Sistema<br />

(24h), Benga (01h), Laidback Luke<br />

(02h30).<br />

Aldina Duarte por Olga Roriz<br />

Direcção Musical: Olga Roriz. Com<br />

Aldina Duarte (voz), José Manuel<br />

Neto (guitarra portuguesa), Carlos<br />

Manuel Proença (viola), Pedro<br />

Wallenstein (contrabaixo), Manuel<br />

Paulo (piano), João Lucas<br />

(acor<strong>de</strong>ão), Sebastian Scheriff<br />

(percussão), Ana Isabel Dias (harpa).<br />

<strong>Lisboa</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> S. Luiz. R. Antº Maria<br />

Cardoso, 38-58. 6ª e sáb. às 21h00. Tel.: 213257650.<br />

10€ a 20€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

Dee Dee Bridgewater Quinteto<br />

Estoril. Casino. Pç. José Teodoro dos Santos. Às 22h.<br />

Tel.: 214667700. 30€ (dia). Assinatura: 90€. No<br />

D.Lounge.<br />

XXIX Estoril Jazz - Jazz Num Dia <strong>de</strong><br />

Verão 2010. Informações: 214827862.<br />

Opera(ções) Barrocas<br />

Encenação: Catarina Mol<strong>de</strong>r,<br />

Etienne Lamaison. Direcção<br />

Musical: Marcos Magalhães. Com<br />

Catarina Mol<strong>de</strong>r (soprano), Luis<br />

Rodrigues (barítono), Etienne<br />

Lamaison (clarinete), Marcos<br />

Magalhães (cravo), António Carrilho<br />

(flauta <strong>de</strong> bisel), Catherine Strynckx<br />

(violoncelo). Com Companhia <strong>de</strong><br />

Ópera do Castelo.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Castelo. Às 22h00. Tel.: 218800620. 7,5€.<br />

Crianças: 5€.<br />

Obras <strong>de</strong> Rameau, Haen<strong>de</strong>l,<br />

Pergolesi, Rebel e Couperin.<br />

Bill Orcutt<br />

Porto. Culturgest. Av. dos Aliados, 104 - Ed. da CGD.<br />

Às 22h00. Tel.: 222098116. 5€.<br />

Horse Meat Disco + James<br />

Murphy + Luke Howard +<br />

Severino<br />

<strong>Lisboa</strong>. Lux Frágil. Av. Infante D. Henrique -<br />

Armazém A (Cais da Pedra a Santa Apolónia). Às<br />

23h00. Tel.: 218820890.<br />

Consumo mínimo.<br />

Sérgio Godinho<br />

Aveiro. Teatro Aveirense. Pç. República. Às 22h00.<br />

Tel.: 234400922. 12€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

Bernardo Sassetti, Jean-<br />

François Lézé e Orquestra<br />

Nacional do Porto<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />

Albuquerque. Às 21h00. Tel.: 220120220. 10€.<br />

Ciclo Jazz Galp/Verão na Casa 2010.<br />

Obras <strong>de</strong> Sassetti, Jarre, Freitas,<br />

Massenet, Barry e Falla.<br />

Orquestra Juvenil da Bahia<br />

<strong>Lisboa</strong>. CCB. Pç. do Império. Às 21h00. Tel.:<br />

213612400. 5,5€ a 15,5€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

Miklós Perényi e Jenö Jandó<br />

Espinho. Auditório. R. 34, 884. Às 22h00. Tel.:<br />

227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

36.º Festival Internacional <strong>de</strong> Música<br />

<strong>de</strong> Espinho.<br />

Freddy Cole Quartet<br />

Figueira da Foz. Centro <strong>de</strong> Artes e Espectáculos. R.<br />

Aba<strong>de</strong> Pedro. Às 22h00. Tel.: 233407200. 5€ a 15€.<br />

3D - Festival Internacional <strong>de</strong> Jazz da<br />

Figueira da Foz.<br />

Lura + Zé Pedro dos Xutos + Las<br />

Gafas + Lovemakers<br />

Torres Novas. Jardim das Rosas. Av. Principal. Às<br />

22h00. Entrada livre.<br />

Jane Duboc + Al Di Meola World<br />

Sinfonia<br />

Funchal. Pq. <strong>de</strong> Santa Catarina. Av. do Infante. Às<br />

21h30. Tel.: 291200930. 15€ (dia). Passe Festival: 30€.<br />

11.º Funchal Jazz Festival.<br />

Cacus<br />

Com José Peixoto (guitarra), Carlos<br />

Zíngaro (violino), Ulrich Mitzlaff<br />

(violoncelo).<br />

<strong>Lisboa</strong>. Galeria Arthobler - <strong>Lisboa</strong>. R. Rodrigues<br />

Faria, 103 - Lx Factory (Ed. G. 03). Às 22h30. Tel.:<br />

965865186. 5€.<br />

The Un<strong>de</strong>rdogs + Cacique’97<br />

Aveiro. Rossio. Às 21h30.Entrada livre. Tel: 234406300.<br />

Sean Riley & The Slowri<strong>de</strong>rs +<br />

Contraband<br />

Vilar Formoso. Pavilhão Multiusos. Via Estruturante.<br />

Às 21h30. Tel.: 271571080. Entrada livre.<br />

Diabo Na Cruz<br />

Com Jorge Cruz (guitarra e voz), B<br />

Fachada (viola braguesa e voz),<br />

Bernardo Barata (baixo e voz), João<br />

Gil (sintes), João Pinheiro (bateria e<br />

percussão).<br />

Freamun<strong>de</strong>. Paços <strong>de</strong> Ferreira. Às 22h00. Entrada<br />

livre.<br />

Quaiss Kitir+Julian<br />

Marley+Finley Quaye.<br />

Cascais. Pq. Marechal Carmona. Às 20h00. 20€.<br />

Júlio Pereira<br />

Com Júlio Pereira (bandolim), Miguel<br />

Veras (viola), Sofia Vitória (voz e<br />

teclados).<br />

Castelo Branco. Cine-Teatro. Av. General Humberto<br />

Delgado. Às 21h30. Tel.: 272349560. 5€ (sujeito a<br />

<strong>de</strong>sconto).<br />

Emily Jane White<br />

Aveiro. Mercado Negro. R. João Mendonça, 17. Às<br />

22h00. Tel.: 234100052.<br />

El Gran Silencio<br />

<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do<br />

Sodré. Às 00h00. Tel.: 213430107. 8€.<br />

sábado 10<br />

Optimus Alive! 10<br />

Algés. Passeio Marítimo <strong>de</strong> Algés. Às 17h. 50€ (dia).<br />

Passe Festival: 90€.<br />

Palco Optimus: Gomez (18h30),<br />

Dropkick Murphys (19h50), Gogol<br />

Bor<strong>de</strong>llo (21h20), Pearl Jam (23h),<br />

LCD Soundsystem (01h30). Palco<br />

Super Bock: Girls (17h), Sean Riley +<br />

The Slowri<strong>de</strong>rs (18h05), Miike<br />

Snow (19h20), The Big Pink<br />

(20h45), Peaches (22h05), Simian<br />

Mobile Disco (23h30), Crookers<br />

(00h45), Boys Noize (02h15).<br />

Palco Optimus Clubbing:<br />

Enday (17h), The Kaviar<br />

(17h45), Noiserv (18h30),<br />

Becky Lee e Drunkfoot<br />

(19h30), Cibelle (20h30),<br />

The Legendary<br />

Tigerman e Convidados<br />

(21h45), Micro Audio<br />

Waves (23h40), Phoebe<br />

Norberto Lobo<br />

Kill<strong>de</strong>er + The Short Straws<br />

(00h45), The Bellrays<br />

(01h50), Homens da Luta<br />

(03h10).<br />

Trio 3: Oliver Lake + Reggie<br />

Workman + Andrew Cyrille<br />

Com Oliver Lake (saxofone), Reggie<br />

Workman (contrabaixo), Andrew<br />

Cyrille (bateria).<br />

Estoril. Casino. Pç. José Teodoro dos Santos. Às<br />

22h00. Tel.: 214667700. 30€ (dia). Assinatura: 90€.<br />

XXIX Estoril Jazz - Jazz Num Dia <strong>de</strong><br />

Verão 2010.<br />

Freddy Cole Quartet<br />

Sintra. CC Olga Cadaval. Pç. Dr. Francisco Sá<br />

Carneiro. Às 22h00. Tel.: 219107110. 15€ a 20€<br />

(sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

B Fachada<br />

Faro. Teatro Lethes. R. Portugal, 58. Às 21h30. Tel.:<br />

289820300. 7€.<br />

Bernardo Sassetti, Jean-François<br />

Lézé e Orquestra Nacional do<br />

Porto<br />

Caldas da Rainha. CC e Congressos. R. Doutor Leonel<br />

Sotto Mayor. Às 21h00. Tel.: 262889650.10€ a 15€.<br />

Obras <strong>de</strong> Sassetti, Jarre, Freitas,<br />

Massenet, Barry e Falla.<br />

Barclay James Harvest<br />

Vila Nova <strong>de</strong> Gaia. Miradouro da Serra do Pilar.<br />

Santa Marinha. Às 22h00. Entrada livre.<br />

Informações: 223742400.<br />

Bill Orcutt<br />

<strong>Lisboa</strong>. Museu do Chiado. R. Serpa Pinto, 4. Às<br />

22h30. Tel.: 213432148. 5€.<br />

Melech Mechaya<br />

Sesimbra. Cine-Teatro <strong>Municipal</strong> João Mota. Av.<br />

Liberda<strong>de</strong>, 46. Às 22h00. Tel.: 212234034. 5€.<br />

Sérgio Godinho<br />

Viana do Castelo. Jardim da Marina. Av. Marginal. Às<br />

21h45. Entrada livre.<br />

Ana Moura<br />

Águeda. Lg. 1º <strong>de</strong> Maio. Às 22h30. Entrada livre.<br />

Jordi Savall<br />

Com Jordi Savall (rebab; lira <strong>de</strong> arco e<br />

viela), Driss El Maloumi (oud),<br />

Dimitris Psonis s (santur e moresca),<br />

Pedro Estevan (darbouka; <strong>de</strong>f;<br />

tambor e pan<strong>de</strong>ireita).<br />

Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Igreja <strong>de</strong> N. Sra. da Conceição,<br />

Matriz. R. Igreja e R. São<br />

Pedro.<br />

Às 21h45. Tel.: 252615791. 5791. 6€<br />

(sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

Passe Festival: 35€.<br />

Informações:<br />

252614145.<br />

Festival<br />

Internacional <strong>de</strong><br />

Música da<br />

Póvoa <strong>de</strong><br />

Varzim.<br />

Emily Jane<br />

White<br />

Braga. Velha-a-<br />

Branca, Estaleiro<br />

Cultural. Lg.<br />

Senhora a Branca,<br />

23.<br />

Às 22h00. Tel.:<br />

253618234.<br />

Bruno <strong>de</strong><br />

Almeida<br />

+ Dead<br />

Combo<br />

Esperanza<br />

Spalding<br />

Vila do Con<strong>de</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> –<br />

Sala 1. Av. Dr. João Canavarro. Às<br />

00h30. Tel.: 252290050. 10€.<br />

Concerto-instalação “Esse Olhar Que<br />

Era Só Teu”. Remixed. Curtas - 18.º<br />

Festival Internacional <strong>de</strong> Cinema.<br />

DJ Jazzanova + Mike Stellar<br />

<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho, 24 - Cais do<br />

Sodré. Às 02h00. Tel.: 213430107. 8€.<br />

domingo 11<br />

Cyro Baptista<br />

Coimbra. Pç. do Comércio. Às 22h00. Entrada livre.<br />

Esperanza Spalding Quarteto<br />

Com Esperanza Spalding<br />

(contrabaixo e voz), Leo Genovese<br />

(piano), Ricardo Vogt (guitarra),<br />

Dana Hawkins (bateria).<br />

Estoril. Casino. Pç. José Teodoro dos Santos. Às<br />

22h00. Tel.: 214667700. 30€ (dia). Assinatura: 90€.<br />

XXIX Estoril Jazz - Jazz Num Dia <strong>de</strong><br />

Verão 2010.<br />

segunda 12<br />

Tiken Jah Fakoly + Terrakota<br />

Porto. Casa da Música. Pç. Mouzinho <strong>de</strong><br />

Albuquerque. Às 21h00. Tel.: 220120220. 10€.<br />

Mor Karbasi<br />

Manta Rota. Praia <strong>de</strong> Manta Rota - Vila Real <strong>de</strong><br />

Santo António. Às 22h00. Entrada livre.<br />

Informações: 214408565.<br />

Festival Sete Sóis Sete Luas 2010.<br />

terça 13<br />

Norah Jones<br />

Gandarinha. Hipódromo Manuel Possolo. R.<br />

Viscon<strong>de</strong> da Gandarinha. Às 22h00. Tel.:<br />

214844299. 20€ a 60€.<br />

Cool Jazz Fest 2010.<br />

quarta 14<br />

Deep Purple<br />

<strong>Lisboa</strong>. Coliseu. R. Portas St. Antão, 96. Às 21h30<br />

(portas abrem às 20h30). Tel.: 213240580. 28€ a<br />

32€. Camarotes: 150€ a 192€.<br />

Hanne Hukkelberg<br />

<strong>Lisboa</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> Maria Matos. Av. Frei<br />

Miguel<br />

Contreiras, 52. Às 22h00. Tel.: 218438801.<br />

15€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

Norberto Lobo<br />

<strong>Lisboa</strong>. A Barraca - Teatro Cinearte. Lg Santos, 2.<br />

Às 22h00. Tel.: 213965360. 6€.<br />

Sei Miguel<br />

<strong>Lisboa</strong>. Galeria Zé dos Bois. R. da Barroca, 59 -<br />

Bairro Alto. Às 22h00. Tel.: 213430205. 5€.<br />

quinta 15<br />

Samuel Úria<br />

Ton<strong>de</strong>la. Cine Tejá - Novo Ciclo ACERT. R. Dr.<br />

Ricardo Mota. Às 22h00. Tel.: 232814400. 10€.<br />

Passe Festival: 22,5€. Desconto para sócios.<br />

Phill Niblock + Katherine<br />

Liberovskaya<br />

Guarda. Teatro <strong>Municipal</strong>. R. Batalha Reis,<br />

12. Às 21h30. Tel.: 271205241. 5€.<br />

Quarteto<br />

Com Pedro Burmester (piano),<br />

Fausto Neves (piano), Miquel<br />

Bernat (percussão), Manuel<br />

Campos (percussão).<br />

Espinho. Auditório. R. 34, 884. Às 22h00.<br />

Tel.: 227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

36.º Festival Internacional <strong>de</strong><br />

Música <strong>de</strong> Espinho.<br />

Pop Dell’Arte + Corsage<br />

<strong>Lisboa</strong>. MusicBox. R. Nova do Carvalho,<br />

24 - Cais do Sodré. Às 23h00. Tel.:<br />

213430107. 10€.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 39


Concertos<br />

Ben Harper e os seus Relentless 7 vão estar no Festival Marés Vivas<br />

<strong>de</strong>les, o Marés Vivas conta no<br />

palco principal com concertos <strong>de</strong><br />

Edward Maya (dia 15), A Silent Film<br />

(dia 16) e Nikolaj Grandjean (dia 17).<br />

O palco secundário, cem por cento<br />

português, recebe Dr1ve e Lobo (dia<br />

15), Azeitonas, André Indiana e<br />

Mónica Ferraz (dia 16), e João Só E<br />

Os Abandonados e Caim (dia 17).<br />

M.L.<br />

Clássica<br />

Viagem<br />

musical à<br />

volta do<br />

globo<br />

O conjunto <strong>de</strong> violas da<br />

gamba Fretwork apresenta<br />

em Espinho o projecto<br />

“The World Encompassed”,<br />

recriação musical da<br />

viagem <strong>de</strong> Francis Drake<br />

entre 1577 e 1580. Cristina<br />

Fernan<strong>de</strong>s<br />

musicais e experimentar novos<br />

repertórios. Des<strong>de</strong> as mais antigas<br />

obras instrumentais impressas em<br />

Veneza em 1501 à música<br />

contemporânea, passando pelos<br />

compositores ingleses dos séculos<br />

XVI e XVII (Byrd, Gibbons, Lawes,<br />

Purcell, Locke, Dowland), por J. S.<br />

Bach ou pelas sonorida<strong>de</strong>s da<br />

música “klezmer”, o grupo tem<br />

explorado em concerto e em disco<br />

uma vasta gama <strong>de</strong> estilos e épocas.<br />

Tem assumido também um<br />

importante papel no incentivo à<br />

criação <strong>de</strong> novas peças através <strong>de</strong><br />

encomendas a compositores tão<br />

importantes como George<br />

Benjamin, Michael Nyman, John<br />

Tavener, Gavin Bryars, Elvis<br />

Costello, Alexan<strong>de</strong>r Goehr, Tan<br />

Dun, Barry Guy, Thea Musgrave ou<br />

Simon Bainbridge.<br />

Na sua estreia no Festival<br />

Internacional <strong>de</strong> Música <strong>de</strong> Espinho<br />

(dia 12, às 22h), o grupo irá<br />

apresentar precisamente um dos<br />

seus últimos projectos criativos,<br />

<strong>de</strong>senvolvido em parceria com o<br />

compositor Orlando Gough (n.<br />

1953). Sob o título “The World<br />

Encompassed”, será realizado um<br />

percurso musical alusivo às viagens<br />

marítimas <strong>de</strong> Francis Drake entre<br />

1577 e 1580. Sabe-se que o corsário e<br />

explorador inglês foi acompanhado<br />

durante a sua épica jornada por<br />

quatro intérpretes <strong>de</strong> viola da<br />

gamba, que tocavam nos momentos<br />

<strong>de</strong> culto religioso, serviam <strong>de</strong><br />

acompanhamento a hinos<br />

e canções e o entretinham<br />

durante as refeições, para<br />

além <strong>de</strong> terem servido para<br />

impressionar os nativos da Ámerica<br />

do Sul e <strong>de</strong> Java. A obra <strong>de</strong><br />

Orlando Gough, compositor<br />

que se tem <strong>de</strong>dicado sobretudo a<br />

escrever para espectáculos <strong>de</strong><br />

dança e teatro, combina trechos<br />

musicais originais do século XVI (<strong>de</strong><br />

John Taverner, Robert Parsons ou<br />

Alonso Mudarra) com peças<br />

novas e com a recriação dos<br />

exóticos ambientes <strong>de</strong>sta viagem à<br />

volta do mundo. Este programa já<br />

foi apresentado em vários países,<br />

incluindo numa digressão<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>z concertos à América do<br />

Norte.<br />

Éric Le Sage e os<br />

segredos da música<br />

<strong>de</strong> Schumann<br />

Éric Le Sage<br />

Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Auditório <strong>Municipal</strong>. R. D. Maria<br />

I, 56. 3ª, 13, às 21h45. Tel.: 252614145. 6€ (sujeito a<br />

<strong>de</strong>sconto). Passe Festival: 35€.<br />

32º Festival Internacional <strong>de</strong> Música da<br />

Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Obras <strong>de</strong> Schumann.<br />

Para Éric Le Sage, a música <strong>de</strong> Robert<br />

Schumann parece não ter segredos.<br />

Po<strong>de</strong> mesmo dizer-se que se trata do<br />

pianista do momento no que diz<br />

respeito à interpretação do extenso<br />

repertório <strong>de</strong>ste compositor<br />

romântico nascido há 200 anos.<br />

Vencedor dos concursos<br />

internacionais <strong>de</strong> piano do Porto<br />

(1985) e Robert Schumann <strong>de</strong> Zwickau<br />

(1989), o pianista francês encontra-se<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2006 a realizar a gravação<br />

integral da produção para piano <strong>de</strong><br />

Schumann na etiqueta Alpha, tendo<br />

obtido por esse trabalho alguns<br />

importantes prémios da crítica<br />

discográfica internacional. A sua<br />

presença no Festival Internacional <strong>de</strong><br />

Música da Póvoa <strong>de</strong> Varzim com um<br />

recital <strong>de</strong>stinado a assinalar o<br />

bicentenário <strong>de</strong> Schumann era, pois,<br />

uma escolha óbvia e pertinente. No dia<br />

13, Éric Le Sage tocará no Auditório<br />

<strong>Municipal</strong> as “Blumenstück” op. 19, os<br />

três Romances op. 28, a “Humoresque”<br />

op. 20 e os Estudos Sinfónicos op. 13.<br />

A sensibilida<strong>de</strong>, a subtileza <strong>de</strong><br />

fraseados, o lirismo poético e a<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> variar o colorido da<br />

sonorida<strong>de</strong> fazem <strong>de</strong> Le Sage um<br />

intérprete <strong>de</strong> eleição do universo<br />

schumaniano. Apesar <strong>de</strong> o seu<br />

repertório ser bastante mais extenso,<br />

nos últimos tempos tem sido<br />

sobretudo um embaixador do<br />

compositor alemão no mundo<br />

através <strong>de</strong> concertos em numerosos<br />

países. Éric Le Sage tem tocado nos<br />

mais importantes festivais e salas <strong>de</strong><br />

concertos internacionais e já foi<br />

dirigido por maestros tão ilustres<br />

como Armin Jordan, Louis Langrée,<br />

Michel Plasson ou Sir Simon Rattle.<br />

Além da etiqueta Alpha, já gravou<br />

para a RCA-BMG, a Naïve e a EMI,<br />

<strong>de</strong>stacando-se os seus registos da<br />

música <strong>de</strong> Francis Poulenc. C.F.<br />

Ensemble Fretwork<br />

Espinho. Auditório. Rua 34, 884. 2ª, 12, às 22h00.<br />

Tel.: 227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

36.º Festival Internacional <strong>de</strong><br />

Música <strong>de</strong> Espinho.<br />

O agrupamento britânico Fretwork<br />

não é apenas mais um “consort” <strong>de</strong><br />

violas da gamba especializado em<br />

música do Renascimento e do<br />

Barroco. É um projecto artístico<br />

abrangente que ao longo das duas<br />

últimas décadas tem procurado<br />

quebrar barreirras entre géneros<br />

Os britânicos Fretwork têm procurado quebrar<br />

barreiras entre géneros musicais<br />

Éric Le Sage interpreta Schumann na Póvoa <strong>de</strong> Varzim<br />

40 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Concertos<br />

Ben Harper e os seus Relentless 7 vão estar no Festival Marés Vivas<br />

<strong>de</strong>les, o Marés Vivas conta no<br />

palco principal com concertos <strong>de</strong><br />

Edward Maya (dia 15), A Silent Film<br />

(dia 16) e Nikolaj Grandjean (dia 17).<br />

O palco secundário, cem por cento<br />

português, recebe Dr1ve e Lobo (dia<br />

15), Azeitonas, André Indiana e<br />

Mónica Ferraz (dia 16), e João Só E<br />

Os Abandonados e Caim (dia 17).<br />

M.L.<br />

Clássica<br />

Viagem<br />

musical à<br />

volta do<br />

globo<br />

O conjunto <strong>de</strong> violas da<br />

gamba Fretwork apresenta<br />

em Espinho o projecto<br />

“The World Encompassed”,<br />

recriação musical da<br />

viagem <strong>de</strong> Francis Drake<br />

entre 1577 e 1580. Cristina<br />

Fernan<strong>de</strong>s<br />

musicais e experimentar novos<br />

repertórios. Des<strong>de</strong> as mais antigas<br />

obras instrumentais impressas em<br />

Veneza em 1501 à música<br />

contemporânea, passando pelos<br />

compositores ingleses dos séculos<br />

XVI e XVII (Byrd, Gibbons, Lawes,<br />

Purcell, Locke, Dowland), por J. S.<br />

Bach ou pelas sonorida<strong>de</strong>s da<br />

música “klezmer”, o grupo tem<br />

explorado em concerto e em disco<br />

uma vasta gama <strong>de</strong> estilos e épocas.<br />

Tem assumido também um<br />

importante papel no incentivo à<br />

criação <strong>de</strong> novas peças através <strong>de</strong><br />

encomendas a compositores tão<br />

importantes como George<br />

Benjamin, Michael Nyman, John<br />

Tavener, Gavin Bryars, Elvis<br />

Costello, Alexan<strong>de</strong>r Goehr, Tan<br />

Dun, Barry Guy, Thea Musgrave ou<br />

Simon Bainbridge.<br />

Na sua estreia no Festival<br />

Internacional <strong>de</strong> Música <strong>de</strong> Espinho<br />

(dia 12, às 22h), o grupo irá<br />

apresentar precisamente um dos<br />

seus últimos projectos criativos,<br />

<strong>de</strong>senvolvido em parceria com o<br />

compositor Orlando Gough (n.<br />

1953). Sob o título “The World<br />

Encompassed”, será realizado um<br />

percurso musical alusivo às viagens<br />

marítimas <strong>de</strong> Francis Drake entre<br />

1577 e 1580. Sabe-se que o corsário e<br />

explorador inglês foi acompanhado<br />

durante a sua épica jornada por<br />

quatro intérpretes <strong>de</strong> viola da<br />

gamba, que tocavam nos momentos<br />

<strong>de</strong> culto religioso, serviam <strong>de</strong><br />

acompanhamento a hinos<br />

e canções e o entretinham<br />

durante as refeições, para<br />

além <strong>de</strong> terem servido para<br />

impressionar os nativos da Ámerica<br />

do Sul e <strong>de</strong> Java. A obra <strong>de</strong><br />

Orlando Gough, compositor<br />

que se tem <strong>de</strong>dicado sobretudo a<br />

escrever para espectáculos <strong>de</strong><br />

dança e teatro, combina trechos<br />

musicais originais do século XVI (<strong>de</strong><br />

John Taverner, Robert Parsons ou<br />

Alonso Mudarra) com peças<br />

novas e com a recriação dos<br />

exóticos ambientes <strong>de</strong>sta viagem à<br />

volta do mundo. Este programa já<br />

foi apresentado em vários países,<br />

incluindo numa digressão<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>z concertos à América do<br />

Norte.<br />

Éric Le Sage e os<br />

segredos da música<br />

<strong>de</strong> Schumann<br />

Éric Le Sage<br />

Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Auditório <strong>Municipal</strong>. R. D. Maria<br />

I, 56. 3ª, 13, às 21h45. Tel.: 252614145. 6€ (sujeito a<br />

<strong>de</strong>sconto). Passe Festival: 35€.<br />

32º Festival Internacional <strong>de</strong> Música da<br />

Póvoa <strong>de</strong> Varzim. Obras <strong>de</strong> Schumann.<br />

Para Éric Le Sage, a música <strong>de</strong> Robert<br />

Schumann parece não ter segredos.<br />

Po<strong>de</strong> mesmo dizer-se que se trata do<br />

pianista do momento no que diz<br />

respeito à interpretação do extenso<br />

repertório <strong>de</strong>ste compositor<br />

romântico nascido há 200 anos.<br />

Vencedor dos concursos<br />

internacionais <strong>de</strong> piano do Porto<br />

(1985) e Robert Schumann <strong>de</strong> Zwickau<br />

(1989), o pianista francês encontra-se<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 2006 a realizar a gravação<br />

integral da produção para piano <strong>de</strong><br />

Schumann na etiqueta Alpha, tendo<br />

obtido por esse trabalho alguns<br />

importantes prémios da crítica<br />

discográfica internacional. A sua<br />

presença no Festival Internacional <strong>de</strong><br />

Música da Póvoa <strong>de</strong> Varzim com um<br />

recital <strong>de</strong>stinado a assinalar o<br />

bicentenário <strong>de</strong> Schumann era, pois,<br />

uma escolha óbvia e pertinente. No dia<br />

13, Éric Le Sage tocará no Auditório<br />

<strong>Municipal</strong> as “Blumenstück” op. 19, os<br />

três Romances op. 28, a “Humoresque”<br />

op. 20 e os Estudos Sinfónicos op. 13.<br />

A sensibilida<strong>de</strong>, a subtileza <strong>de</strong><br />

fraseados, o lirismo poético e a<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> variar o colorido da<br />

sonorida<strong>de</strong> fazem <strong>de</strong> Le Sage um<br />

intérprete <strong>de</strong> eleição do universo<br />

schumaniano. Apesar <strong>de</strong> o seu<br />

repertório ser bastante mais extenso,<br />

nos últimos tempos tem sido<br />

sobretudo um embaixador do<br />

compositor alemão no mundo<br />

através <strong>de</strong> concertos em numerosos<br />

países. Éric Le Sage tem tocado nos<br />

mais importantes festivais e salas <strong>de</strong><br />

concertos internacionais e já foi<br />

dirigido por maestros tão ilustres<br />

como Armin Jordan, Louis Langrée,<br />

Michel Plasson ou Sir Simon Rattle.<br />

Além da etiqueta Alpha, já gravou<br />

para a RCA-BMG, a Naïve e a EMI,<br />

<strong>de</strong>stacando-se os seus registos da<br />

música <strong>de</strong> Francis Poulenc. C.F.<br />

Ensemble Fretwork<br />

Espinho. Auditório. Rua 34, 884. 2ª, 12, às 22h00.<br />

Tel.: 227340469. 7€ (sujeito a <strong>de</strong>sconto).<br />

36.º Festival Internacional <strong>de</strong><br />

Música <strong>de</strong> Espinho.<br />

O agrupamento britânico Fretwork<br />

não é apenas mais um “consort” <strong>de</strong><br />

violas da gamba especializado em<br />

música do Renascimento e do<br />

Barroco. É um projecto artístico<br />

abrangente que ao longo das duas<br />

últimas décadas tem procurado<br />

quebrar barreirras entre géneros<br />

Os britânicos Fretwork têm procurado quebrar<br />

barreiras entre géneros musicais<br />

Éric Le Sage interpreta Schumann na Póvoa <strong>de</strong> Varzim<br />

40 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


42 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon<br />

Cinema<br />

Sábado Domingo 11h, 13h20, 14h10, 15h30, 16h30,<br />

17h40, 18h40, 19h50, 21h20, 22h, 23h30, 00h10 (V.<br />

Port./3D) 3ª 14h10, 16h30, 18h40, 19h50, 21h20, 22h,<br />

23h30, 00h10 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

Amoreiras: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

14h30, 17h, 19h20, 22h, 00h15 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª<br />

13h30, 16h10, 18h50, 21h10, 23h30 (V.Port./3D)<br />

Domingo 11h, 13h30, 16h10, 18h50, 21h10, 23h30<br />

(V.Port./3D); ZON Lusomundo CascaiShopping: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h10, 18h40,<br />

21h30, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

CascaiShopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 12h50,<br />

15h10, 17h25, 19h40, 22h, 00h15 (V.Port./3D)<br />

Domingo 11h, 12h50, 15h10, 17h25, 19h40, 22h, 00h15<br />

(V.Port./3D); ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h15, 17h35,<br />

21h50, 00h10 (3D); ZON Lusomundo Colombo: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h, 18h20, 21h10, 23h30 (V.<br />

Port./3D) Domingo 11h, 13h30, 16h, 18h20, 21h10,<br />

23h30 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Dolce Vita<br />

Miraflores: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 15h30, 17h40,<br />

19h50, 22h, 00h10 (V.Port./3D) Domingo 11h, 15h30,<br />

17h40, 19h50, 22h, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Odivelas Parque: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h,<br />

13h30, 15h, 16h, 17h15, 18h10, 19h30, 21h, 21h40, 24h<br />

(V.Port./3D) 6ª 13h, 13h30, 15h, 16h, 17h15, 18h10,<br />

19h30, 21h, 21h40, 23h30(V.Port./3D) Sábado 11h,<br />

13h, 13h30, 15h, 16h, 17h15, 18h10, 19h30, 21h, 21h40,<br />

23h30(V.Port./3D) Domingo 11h, 13h, 13h30, 15h, 16h,<br />

17h15, 18h10, 19h30, 21h, 21h40 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª<br />

13h, 15h10, 17h30, 19h50, 22h10 (V.Port./3D) Domingo<br />

10h45, 13h, 15h10, 17h30, 19h50, 22h10 (V.<br />

Port./3D); ZON Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 14h, 16h20, 18h40, 21h15, 23h40 (V.<br />

Port./3D) Domingo 11h15, 14h, 16h20, 18h40, 21h15,<br />

23h40 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Torres Vedras:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 15h30, 18h,<br />

21h, 23h20 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Torres<br />

Vedras: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h15, 18h45,<br />

21h45, 00h05 (V.Port./3D) Domingo 11h, 13h45, 16h15,<br />

18h45, 21h45, 00h05 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

Vasco da Gama: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h30, 16h, 18h50, 21h10, 23h50 (3D); ZON<br />

Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h10,<br />

15h25, 17h35, 19h45, 21h50, 24h (V.Port./3D) Sábado<br />

Domingo 11h, 13h10, 15h25, 17h35, 19h45, 21h50, 24h<br />

(V.Port./3D); Auditório Charlot: Sala 1: 5ª 6ª 2ª 3ª<br />

4ª 21h30 (V.Port.) Sábado Domingo 16h, 21h30 (V.<br />

Port.); Castello Lopes - C. C. Jumbo: Sala 1: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 17h20, 19h30, 21h40<br />

(V.Port./3D) 6ª Sábado 13h, 15h10, 17h20, 19h30,<br />

21h40, 23h50 (V.Port./3D); Castello Lopes - Fórum<br />

Barreiro: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h10,<br />

17h20, 19h30, 21h40 (V.Port./3D) 6ª Sábado 12h50,<br />

15h10, 17h20, 19h30, 21h40, 23h40 (V.<br />

Port./3D); Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 4:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h, 15h10, 17h20,<br />

19h20, 21h20, 24h (V.Port./3D); UCI Freeport: Sala 1:<br />

5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 18h10, 21h10 (V.Port.) 6ª 15h30,<br />

18h10, 21h10, 23h15 (V.Port.) Sábado 13h15, 15h30,<br />

18h10, 21h10, 23h15 (V.Port.) Domingo 13h15, 15h30,<br />

18h10, 21h10 (V.Port.); ZON Lusomundo Almada<br />

Fórum: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h55,<br />

15h05, 17h15, 19h20, 21h50, 00h15 (3D); ZON<br />

Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />

4ª 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40, 23h55 (V.Port.)<br />

Domingo 11h, 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40,<br />

23h55 (V.Port.); ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª<br />

6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h25, 15h40, 18h15, 21h, 23h25<br />

(V.Port./3D) Domingo 11h, 13h25,<br />

15h40, 18h15, 21h,<br />

23h25<br />

(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 13h30, 15h30, 17h, 18h30,<br />

19h20, 21h, 21h40, 23h30, 00h10 (V.Port./3D)<br />

Domingo 10h30, 11h, 13h, 13h30, 15h30, 17h, 18h30,<br />

19h20, 21h, 21h40, 23h30, 00h10 (V.Port./3D);<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 14h, 16h25, 18h50, 21h20, 24h (V.<br />

Port./3D); Arrábida 20: Sala 20: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 14h15, 16h50, 22h15, 00h45 (V.<br />

Port./3D) 3ª 4ª 16h50, 22h15, 00h45 (V.<br />

Port./3D); Arrábida 20: Sala 15: 5ª 6ª 2ª 3ª 14h30,<br />

17h, 19h (V.Port./3D), 22h, 00h25 Sábado Domingo<br />

4ª 14h30 (V.Port./3D), 22h, 00h25; Cinemax -<br />

Penafiel: Sala 1: 5ª 2ª 3ª 4ª 15h30, 21h50 (V.Port.)<br />

6ª 15h30, 21h50, 23h50 (V.Port.) Sábado 15h, 17h30,<br />

21h50, 23h50 (V.Port.) Domingo 15h, 17h30, 21h50<br />

(V.Port.); Nun`Álvares: Sala 1: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 14h30, 16h30, 19h30; Vivacine -<br />

Maia: Sala 1: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h10,<br />

18h30, 21h20, 23h40 (V.Port./3D) Domingo 11h10,<br />

13h40, 16h10, 18h30, 21h20, 23h40 (V.<br />

Port./3D); ZON Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h, 18h30,<br />

21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Dolce<br />

Vita Porto: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />

16h30, 19h, 21h50, 00h10 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Ferrara Plaza: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

15h, 17h20, 19h40, 22h (V.Port./3D) 6ª Sábado 15h,<br />

17h20, 19h40, 22h, 00h20 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Ferrara Plaza: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

15h50, 18h10, 21h20 (V.Port./3D) 6ª Sábado 15h50,<br />

18h10, 21h20, 23h50 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

GaiaShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

12h50, 13h20, 15h, 15h50, 17h20, 18h20, 19h40, 21h,<br />

21h50, 23h30, 24h (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

MaiaShopping: 5ª 3ª 4ª 13h15, 16h, 18h30, 21h15<br />

(V.Port./3D) 6ª Sábado 13h15, 16h, 18h30, 21h15,<br />

23h45 (V.Port./3D) Domingo 10h45, 13h15, 16h,<br />

18h30, 21h15, 23h45 (V.Port./3D) 2ª 10h45, 13h15,<br />

16h, 18h30, 21h15 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

MaiaShopping: 5ª 3ª 4ª 14h, 16h45, 19h15, 22h (V.<br />

Port./3D) 6ª Sábado 14h, 16h45, 19h15, 22h, 00h30<br />

(V.Port./3D) Domingo 11h15, 14h, 16h45, 19h15, 22h,<br />

00h30 (V.Port./3D) 2ª 11h15, 14h, 16h45, 19h15, 22h<br />

(V.Port./3D); ZON Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h30, 17h50,<br />

20h10, 22h30, 00h40 (3D); ZON Lusomundo<br />

Marshopping: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h40,<br />

16h10, 18h50, 21h30, 24h (V.Port./3D) Domingo 11h,<br />

13h40, 16h10, 18h50, 21h30, 24h (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo NorteShopping: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 10h20, 12h30, 14h50, 17h20,<br />

19h50, 22h10, 00h30 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

NorteShopping: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h30, 16h, 18h30, 21h30, 24h (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />

4ª 12h40, 15h, 17h30, 19h50, 22h, 00h25 (V.<br />

Port./3D) Domingo 10h50, 12h40, 15h, 17h30, 19h50,<br />

22h, 00h25 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Parque<br />

Nascente: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h, 15h20, 18h,<br />

21h10, 23h40 (V.Port./3D) Domingo 10h30, 13h,<br />

15h20, 18h, 21h10, 23h40 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />

4ª 13h30, 15h50, 18h30, 21h40, 00h10 (V.Port./3D)<br />

Domingo 11h, 13h30, 15h50, 18h30, 21h40, 00h10<br />

(V.Port./3D); Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 1: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

12h45, 15h,<br />

17h10,<br />

19h20, 21h20 (V.<br />

Port./3D) 6ª Sábado 12h45,<br />

15h, 17h10, 19h20, 21h20, 23h40<br />

(V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum<br />

Aveiro: 5ª 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h05, 18h40, 21h10 (V.<br />

Port./3D) 6ª Sábado 13h30, 16h05, 18h40, 21h10,<br />

23h50 (V.Port./3D) Domingo 10h30, 13h30, 16h05,<br />

18h40, 21h10 (V.Port./3D); ZON Lusomundo Fórum<br />

Aveiro: 5ª 2ª 3ª 4ª 14h15, 16h50, 19h25, 22h (V.<br />

Port./3D) 6ª Sábado 14h15, 16h50, 19h25, 22h,<br />

00h35 (V.Port./3D) Domingo 11h, 14h15, 16h50,<br />

19h25, 22h (V.Port./3D); ZON Lusomundo Glicínias:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h45, 16h20,<br />

18h55, 21h30, 00h05 (V.Port./3D); ZON Lusomundo<br />

Glicínias: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h55,<br />

19h30, 22h, 00h35 (V.Port./3D) Domingo 11h, 14h20,<br />

16h55, 19h30, 22h, 00h35 (V.Port./3D);<br />

As expectativas não eram gran<strong>de</strong>s<br />

para a quarta (e, anuncia-se<br />

<strong>de</strong>finitivamente, última) aventura do<br />

ogre ver<strong>de</strong>, <strong>de</strong>pois do capital<br />

realizado com o primeiro filme ter<br />

sido <strong>de</strong>sperdiçado progressivamente<br />

mais com “Shrek 2” (2004) e “Shrek,<br />

o Terceiro” (2007). É, precisamente,<br />

por isso que “Shrek para Sempre!” é<br />

uma pequena surpresa. Sem estar à<br />

altura da estreia (ainda a melhor<br />

longa saída até hoje da Dreamworks<br />

Animation), este quarto episódio — o<br />

primeiro a escapar ao controle dos<br />

criativos do filme original — sobe o<br />

nível abandonando a tendência para<br />

resumir tudo a gagues <strong>de</strong> “sitcom” e,<br />

literalmente, “reescrevendo a<br />

história” do filme original.<br />

Numa pirueta <strong>de</strong> argumento que<br />

remete para o clássico <strong>de</strong> Frank<br />

Capra “Do Céu Caiu uma Estrela”<br />

(1946), o filme coloca um Shrek em<br />

crise <strong>de</strong> meia-ida<strong>de</strong> a viver num<br />

Reino <strong>de</strong> Bué Bué Longe alternativo<br />

on<strong>de</strong> nunca chegou a nascer, o<br />

pérfido Rumpelstilzschen usurpou o<br />

trono e Fiona li<strong>de</strong>ra a resistência ao<br />

tirano — forçando o ogre a<br />

reconquistar a amada que não sabe<br />

quem ele é para anular o feitiço e<br />

repor tudo no <strong>de</strong>vido lugar.<br />

Exalando um peculiar aroma <strong>de</strong><br />

melancolia que o torna no mais<br />

adulto dos quatro filmes, “Shrek Para<br />

Sempre!” não resolve o problema<br />

central das sequelas — o que começou<br />

como uma <strong>de</strong>smontagem subversiva<br />

dos contos <strong>de</strong> fadas acomodou-se nos<br />

próprios lugares-comuns <strong>de</strong> que fazia<br />

troça — mas pelo<br />

menos tem<br />

consciência <strong>de</strong>le,<br />

ao usá-lo como<br />

ponto <strong>de</strong> partida<br />

para uma última<br />

aventura que fornece<br />

um final digno para a<br />

série.<br />

Continuam<br />

A Teta Assustada<br />

La Teta Asustada<br />

De Claudia Llosa<br />

com Magaly Solier, Susi<br />

Sánchez, Efraín Solís. M/12<br />

MMNNN<br />

<strong>Lisboa</strong>: UCI Cinemas - El Corte<br />

Inglés: Sala 8: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª<br />

14h15, 16h30, 19h, 21h35, 24h Domingo<br />

11h30, 14h15, 16h30, 19h, 21h35, 24h<br />

Goste-se mais ou menos do<br />

resultado final, não po<strong>de</strong><br />

Estreiam<br />

Final digno<br />

para uma<br />

série<br />

“Shrek Para Sempre!” exala<br />

uma melancolia que o torna<br />

no mais adulto dos quatro<br />

filmes. Jorge Mourinha<br />

Shrek Para Sempre<br />

Shrek Forever After<br />

De Mike Mitchell<br />

com Mike Myers (Voz), Eddie Murphy<br />

(Voz), Cameron Diaz (Voz), Antonio<br />

Ban<strong>de</strong>ras (Voz). M/6<br />

MMMNN<br />

<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Cascais Villa: Sala 5: 5ª 2ª<br />

3ª 4ª 14h50, 17h, 19h10, 21h10 (V.Port.) 6ª 14h50,<br />

17h, 19h10, 21h10, 23h40 (V.Port.) Sábado 12h40,<br />

14h50, 17h, 19h10, 21h10, 23h40 (V.Port.) Domingo<br />

12h40, 14h50, 17h, 19h10, 21h10 (V.Port.); Castello<br />

Lopes - Londres: Sala 1: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />

16h30, 19h, 21h30 (V.Port./3D) 6ª Sábado 14h, 16h30,<br />

19h, 21h30, 24h (V.Port./3D); Castello Lopes - Loures<br />

Shopping: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

13h, 15h, 17h, 19h, 21h, 23h30 (V.Port.); Castello Lopes<br />

- Loures Shopping: Sala 5: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 13h15, 15h20, 17h25, 19h30, 21h35, 24h (V.<br />

Port./3D); CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 3: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h45 (V.<br />

Port./3D); CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 4: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 21h30,<br />

23h40; CinemaCity Alegro Alfragi<strong>de</strong>: Sala 2: 5ª 6ª<br />

2ª 3ª 4ª 13h35, 15h30, 17h30, 19h30, 21h55, 24h (V.<br />

Port./3D) Sábado Domingo 11h40, 13h35, 15h30,<br />

17h30, 19h30, 21h55, 24h (V.Port./3D); CinemaCity<br />

Beloura Shopping: Sala 2: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h40,<br />

15h35, 17h30, 19h30, 21h50, 23h55 (V.Port./3D)<br />

Domingo 11h30, 13h40, 15h35, 17h30, 19h30, 21h50,<br />

23h55 (V.Port./3D); CinemaCity Campo Pequeno<br />

Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 6: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª<br />

3ª 4ª 16h (V.Port./3D); CinemaCity Campo Pequeno<br />

Praça <strong>de</strong> Touros: Sala 3: 5ª 6ª 2ª 3ª 4ª 13h45,<br />

15h45, 17h40, 19h35, 21h35, 24h (V.Port.) Sábado<br />

Domingo 11h35, 13h45, 15h45, 17h40, 19h35, 21h35,<br />

24h (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Fonte Nova: Sala 1: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h20, 16h15, 18h10,<br />

20h05, 22h (V.Port.); Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 4 -<br />

Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />

16h, 18h, 20h, 22h, 00h30 (3D); UCI Cinemas - El<br />

Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h05,<br />

16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />

11h30, 14h05, 16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.<br />

Port./3D); UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 9: 5ª<br />

6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 18h55,<br />

21h45, 00h10 (3D) Domingo 11h30, 14h10,<br />

16h30, 18h55, 21h45, 00h10 (3D); UCI<br />

Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

13h45, 16h, 18h15, 21h15 (V.Port./3D)<br />

6ª Sábado 13h45, 16h, 18h15,<br />

21h15, 23h30<br />

(V.Port./3D)<br />

Domingo<br />

11h30, 13h45,<br />

16h, 18h15,<br />

21h15<br />

(V.Port./3D); UCI<br />

Dolce Vita Tejo: Sala 3: 5ª<br />

2ª 3ª 4ª 14h, 16h15,<br />

18h45, 21h50 (3D) 6ª<br />

Sábado 14h, 16h15, 18h45,<br />

21h50, 00h10 (3D)<br />

Domingo 11h30, 14h,<br />

16h15, 18h45, 21h50<br />

(3D); ZON Lusomundo<br />

Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado 2ª<br />

3ª 4ª 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />

23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />

11h15, 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />

23h50 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Alvaláxia: 5ª<br />

6ª 2ª 4ª 13h20, 14h10,<br />

15h30, 16h30, 17h40,<br />

18h40, 19h50, 21h20,<br />

22h, 23h30, 00h10<br />

(V.Port./3D)<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

15h05, 17h15, 19h20, 21h50, 00h15 (3D); ZON<br />

Lusomundo Almada Fórum: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª<br />

4ª 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40, 23h55 (V.Port.)<br />

Domingo 11h, 13h05, 15h15, 17h25, 19h35, 21h40,<br />

23h55 (V.Port.); ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª<br />

6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 13h25, 15h40, 18h15, 21h, 23h25<br />

(V.Port./3D) Domingo 11h, 13h25,<br />

15h40, 18h15, 21h,<br />

23h25<br />

(V.Port./3D); Castello Lopes - 8ª Avenida: Sala 1: 5ª<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª<br />

12h45, 15h,<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h<br />

7h<br />

7h<br />

7h<br />

17h1<br />

17h<br />

7h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h<br />

7h<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

7<br />

17h1<br />

17<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h<br />

17h1<br />

17h<br />

17h<br />

17h1<br />

h1<br />

17h1<br />

17h<br />

17h<br />

7h1<br />

7<br />

17h1<br />

7h<br />

7h1<br />

7h1<br />

17h<br />

17h<br />

7<br />

17h1<br />

7h1<br />

7h1<br />

17h<br />

17h1<br />

7h1<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

7h1<br />

7h1<br />

h1<br />

17h1<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

7<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h1<br />

17h<br />

17h1<br />

1 h 0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h<br />

19h2<br />

9<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

h<br />

19h2<br />

h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9<br />

19h<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

h2<br />

19h2<br />

h2<br />

h2<br />

h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

19<br />

19h<br />

9h<br />

9h<br />

9h2<br />

9h2<br />

h2<br />

9h2<br />

9 2<br />

h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9 2<br />

9h2<br />

9h<br />

9h2<br />

9h2<br />

9 2<br />

9 20, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

,2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 21h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h2<br />

h20<br />

h20<br />

h20<br />

20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h2<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

h20<br />

2<br />

h20<br />

20<br />

1h2<br />

1h2<br />

1h2<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

20<br />

1h20<br />

20<br />

20<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

2<br />

h20<br />

h20<br />

20<br />

1h20<br />

1h20<br />

2<br />

1h2<br />

1h2<br />

h20<br />

20<br />

20<br />

20<br />

20<br />

1h20<br />

20<br />

20<br />

1h2<br />

1h2<br />

1h20<br />

20<br />

h20<br />

1h20<br />

h20<br />

h2<br />

1h2<br />

1h20<br />

20<br />

1h20<br />

h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

20<br />

h20<br />

20<br />

1 2<br />

h20<br />

20<br />

h20<br />

20<br />

1h20<br />

20<br />

h20<br />

2<br />

1h20<br />

1h20<br />

h20<br />

20<br />

h20<br />

h20<br />

20<br />

1h2<br />

h20<br />

1 20<br />

h20 (V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V<br />

(V.<br />

V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

V.<br />

(V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

V.<br />

V<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V.<br />

V<br />

(V.<br />

(V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V.<br />

(V<br />

(V<br />

(V<br />

(<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Por<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Po<br />

Port<br />

Po<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Por<br />

Por<br />

Port<br />

Port<br />

r<br />

Por<br />

Por<br />

Po<br />

Port<br />

Por<br />

Port<br />

Po<br />

Po<br />

Por<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

or<br />

Por<br />

Port<br />

Po<br />

Por<br />

ort<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

ort<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

Port<br />

o<br />

Port<br />

or<br />

ort<br />

o<br />

Por<br />

o<br />

Por<br />

Port<br />

rt<br />

Port<br />

Port<br />

or<br />

or<br />

ort<br />

Port<br />

ort<br />

r /3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

3D<br />

/3D<br />

3D<br />

./3D<br />

3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

/3<br />

/3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

3<br />

/3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

/3<br />

./3<br />

./3D<br />

3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

/<br />

./3D<br />

/3<br />

/3<br />

/3D<br />

./3D<br />

./3<br />

/3<br />

/3D<br />

/3D<br />

/<br />

./3<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

3D<br />

/3D<br />

3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

/3<br />

/3<br />

./3D<br />

/3D<br />

/3<br />

/3D<br />

3<br />

/3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

3D<br />

3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3<br />

/3<br />

./3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

/3D<br />

3D<br />

/3D<br />

./3D<br />

./3D<br />

3<br />

./3D<br />

/3D<br />

. 3D<br />

/3D<br />

/ D<br />

/3<br />

/3D<br />

/ ) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

6<br />

)6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

) 6<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

6<br />

) 6<br />

)6<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

) 6<br />

)6ª<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

)6<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

)6ª<br />

)6<br />

) 6ª<br />

)6<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

)6ª<br />

)6ª<br />

) 6ª<br />

)6<br />

)6ª<br />

) 6<br />

) 6ª<br />

)6<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

)6<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

)6ª<br />

6<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

) 6<br />

) 6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

6ª<br />

) 6ª<br />

) 6<br />

) 6<br />

)6<br />

) 6<br />

)6<br />

) 6<br />

) 6<br />

) 6<br />

) Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sá<br />

Sába<br />

ba<br />

bad<br />

bad<br />

bad<br />

b d<br />

bado<br />

b d<br />

bado<br />

d<br />

bad<br />

a<br />

bad<br />

bad<br />

ado<br />

ado<br />

ad<br />

bad<br />

b d<br />

bado<br />

bado<br />

d<br />

bado<br />

bado<br />

ba<br />

bad<br />

bado<br />

bad<br />

bado<br />

bad<br />

ado<br />

bad<br />

bado<br />

d<br />

ad<br />

bado<br />

do<br />

bado<br />

d<br />

bado<br />

bado<br />

ado<br />

ba<br />

bad<br />

bado<br />

bad<br />

ba<br />

bad<br />

bad<br />

bad<br />

bado<br />

bado<br />

ado<br />

bad<br />

ado<br />

ado<br />

ad<br />

ado<br />

do<br />

do<br />

bado<br />

bado<br />

bad<br />

bado<br />

d<br />

bad<br />

bado<br />

d<br />

bado<br />

d<br />

bado<br />

bado<br />

ba<br />

ba<br />

bado<br />

bad<br />

ba<br />

bad<br />

bad<br />

bad<br />

ad<br />

ad<br />

bado<br />

do<br />

ado<br />

bad<br />

bado<br />

bado<br />

bado<br />

bado<br />

bad<br />

bado<br />

bado<br />

do<br />

bad<br />

bad<br />

ba<br />

bado<br />

do<br />

bado<br />

do<br />

do<br />

bado<br />

ado<br />

d<br />

ad<br />

bado<br />

bado<br />

ado<br />

bado<br />

ba<br />

bad<br />

ba<br />

bado<br />

bado<br />

a<br />

bad<br />

bad<br />

bad<br />

bad<br />

bado<br />

do<br />

do<br />

do<br />

bad<br />

ba<br />

ba<br />

bado<br />

do<br />

d<br />

bado<br />

ado<br />

ado<br />

bado<br />

bado<br />

bad<br />

ba<br />

bado<br />

do<br />

bad<br />

bad<br />

bado<br />

do<br />

bad<br />

ado<br />

bado<br />

bado<br />

do<br />

do<br />

bad<br />

ado<br />

bado<br />

ado<br />

bad<br />

ado<br />

ba<br />

bado<br />

ado<br />

bado<br />

bad<br />

bado<br />

bado 12h<br />

2h<br />

2h<br />

2h<br />

2h<br />

2h<br />

12h<br />

2h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

2h<br />

2h<br />

12<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

12h<br />

2h<br />

2h<br />

2h<br />

12h<br />

12h<br />

2h<br />

2h<br />

2h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

12<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

2h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

2h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

2h<br />

2h<br />

2<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

2h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

2h<br />

12h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

2<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

2h<br />

2h<br />

12h<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12<br />

12h<br />

12h<br />

12<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12h<br />

12<br />

12h<br />

2h<br />

12h<br />

12h<br />

2h<br />

12h<br />

12h<br />

2h<br />

12h<br />

12h<br />

12h45<br />

45,<br />

5<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

45,<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

45<br />

45,<br />

5<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

5,<br />

5,<br />

5,<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

45,<br />

45<br />

45,<br />

45<br />

45,<br />

45,<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

45,<br />

5,<br />

5<br />

45<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

5,<br />

5<br />

45<br />

45<br />

45,<br />

45,<br />

45,<br />

5,<br />

45,<br />

45<br />

45,<br />

5,<br />

45,<br />

45,<br />

5,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

h,<br />

15h<br />

5h<br />

15<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h<br />

15h,<br />

15h<br />

15h,<br />

15h<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h<br />

15h<br />

15h<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

5<br />

15h,<br />

15h<br />

15h<br />

15h,<br />

15h<br />

15h,<br />

5<br />

15h,<br />

15h<br />

15h<br />

5h<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h<br />

15<br />

15h,<br />

15h,<br />

h<br />

15h,<br />

h<br />

15h,<br />

h,<br />

15h,<br />

15h,<br />

15h<br />

5h,<br />

15h<br />

15h,<br />

15h<br />

15h<br />

15h,<br />

h<br />

15h,<br />

15h,<br />

5h<br />

1 h<br />

15h,<br />

h<br />

1 h<br />

15h<br />

1 h<br />

15h<br />

5h<br />

5h<br />

15h<br />

15h<br />

5h<br />

15h<br />

5h,<br />

15h<br />

15h,<br />

h,<br />

1 h,<br />

h,<br />

15h,<br />

15h<br />

5 , 17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

7<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

7h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

7h<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

7h<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

7h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

7h<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

7<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

7<br />

17h<br />

17h<br />

7<br />

17h<br />

17<br />

1 h<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17h<br />

17<br />

17<br />

17h<br />

17h<br />

7<br />

17h<br />

17<br />

17 10<br />

10,<br />

10<br />

10,<br />

10<br />

10,<br />

10<br />

10<br />

10<br />

10,<br />

0<br />

10,<br />

10<br />

10,<br />

10,<br />

10<br />

10<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10<br />

10<br />

10,<br />

10,<br />

0,<br />

0,<br />

10,<br />

0,<br />

0,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

0<br />

10,<br />

10,<br />

0,<br />

10,<br />

10<br />

10,<br />

0,<br />

10,<br />

10,<br />

10<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

0<br />

10<br />

10,<br />

10,<br />

0<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

0,<br />

10,<br />

0,<br />

10,<br />

10,<br />

0<br />

10,<br />

0,<br />

0<br />

10,<br />

10,<br />

0,<br />

0,<br />

10,<br />

10<br />

10,<br />

0<br />

10,<br />

10,<br />

10,<br />

0,<br />

10<br />

10,<br />

10<br />

10,<br />

10,<br />

0,<br />

10<br />

10,<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0, 9<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h<br />

19h2<br />

19h2<br />

9<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h<br />

19h2<br />

9h2<br />

9<br />

19<br />

19h<br />

19<br />

19h<br />

19h2<br />

19h2<br />

9<br />

19<br />

19h2<br />

19<br />

19<br />

19h2<br />

19h2<br />

h<br />

9h<br />

19h2<br />

h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

19h<br />

19<br />

19<br />

19h2<br />

19h2<br />

9<br />

19<br />

19h<br />

9<br />

19h<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h<br />

19h<br />

9<br />

19h<br />

19h<br />

9h2<br />

9<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h<br />

19h<br />

19h<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h<br />

19h2<br />

h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19<br />

19h<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h<br />

9h2<br />

9<br />

19h2<br />

9h2<br />

h2<br />

h2<br />

19h2<br />

19h<br />

19h2<br />

19<br />

19h<br />

19h2<br />

19<br />

19<br />

19h<br />

19h<br />

9h<br />

19h2<br />

h2<br />

h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19<br />

19h<br />

9h2<br />

h2<br />

19h2<br />

19<br />

19h<br />

19<br />

19h<br />

9h2<br />

19h2<br />

h2<br />

h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h<br />

19h2<br />

9h<br />

9h<br />

19h<br />

19h<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h<br />

9h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

19h<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

19<br />

19h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h2<br />

19h<br />

9h2<br />

h2<br />

19h2<br />

19<br />

19h2<br />

9h2<br />

9h<br />

9h2<br />

h2<br />

19h2<br />

9h2<br />

9 0,<br />

0,<br />

0,<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

, 2<br />

0 2<br />

0,<br />

0 2<br />

0,<br />

0,<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0,<br />

0, 2<br />

0,<br />

0 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0,<br />

0,<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0 2<br />

0,<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

,2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0,<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

, 2<br />

0,<br />

0,<br />

0, 2<br />

0,<br />

0, 2<br />

0, 2<br />

0,<br />

0,<br />

0, 2<br />

, h2<br />

h20<br />

20<br />

1h20<br />

h2<br />

1h2<br />

1h20<br />

1h20<br />

1h20<br />

h2<br />

h<br />

1h20<br />

20<br />

20<br />

h20<br />

20<br />

20<br />

1h2<br />

1h20<br />

1h<br />

1h2<br />

h2<br />

h20<br />

1h2<br />

1h20<br />

1h<br />

1h2<br />

1h20<br />

h20<br />

h20<br />

h2<br />

h2<br />

h20<br />

1h2<br />

1h20<br />

1h2<br />

1h20<br />

h20<br />

h<br />

1h2<br />

h20<br />

h2<br />

h20<br />

20<br />

20<br />

2<br />

h2<br />

h20<br />

1h2<br />

1h2<br />

1h20<br />

h2<br />

1h2<br />

h20<br />

h<br />

1h2<br />

h20<br />

20<br />

2<br />

1h20<br />

h2<br />

h20<br />

20<br />

h20<br />

h20<br />

1h20<br />

1h<br />

1h2<br />

h20<br />

h2<br />

h2<br />

h20<br />

20<br />

20<br />

20<br />

20<br />

20<br />

1h20<br />

h20<br />

h20<br />

h2<br />

h20<br />

h20<br />

20<br />

1h20<br />

h20<br />

1h20<br />

1h2<br />

h2<br />

h2<br />

h<br />

1h2<br />

1h2<br />

1h20<br />

20<br />

1h20<br />

1h<br />

1h<br />

1h20<br />

h2<br />

h20<br />

2<br />

1h20<br />

h20<br />

1h20<br />

1h<br />

1h20<br />

1h2<br />

h20<br />

1h20<br />

1h<br />

1h<br />

1h20<br />

h20<br />

2<br />

h20<br />

20<br />

20<br />

1h20<br />

20<br />

1h20<br />

1h2<br />

h20<br />

h2<br />

1h2<br />

h20<br />

1h20<br />

20<br />

1h2<br />

h20<br />

1h20<br />

2<br />

h20<br />

20<br />

20<br />

1h20<br />

1h2<br />

h20<br />

1h20<br />

20<br />

h20<br />

1h20<br />

h2<br />

h20<br />

h20<br />

h20<br />

1h2<br />

1h2<br />

h20<br />

1h2<br />

h20 23<br />

2<br />

,23<br />

, 23<br />

2<br />

, 2<br />

, 23<br />

, 23<br />

23<br />

2<br />

,23<br />

,23<br />

23<br />

23<br />

23<br />

2<br />

, 23<br />

2<br />

, 23<br />

, 23<br />

, 2<br />

,23<br />

, 23<br />

, 23<br />

, 23<br />

23<br />

,2<br />

, 2<br />

, 23<br />

2<br />

, 23<br />

23<br />

2<br />

, 23<br />

, 23<br />

, 23<br />

, 23<br />

23<br />

,23<br />

23<br />

, 2<br />

, 2<br />

,23<br />

, 2<br />

, 2<br />

, 2<br />

, 23<br />

23<br />

2<br />

, 2<br />

, 23<br />

2<br />

, 23<br />

23<br />

, 23<br />

23<br />

23<br />

23<br />

, 2<br />

, 23<br />

23<br />

23<br />

, 23<br />

23<br />

, 2<br />

, 23<br />

, 23<br />

23<br />

, 23<br />

23<br />

, 2<br />

, 2<br />

, 23<br />

, 23<br />

, 2<br />

, 23<br />

, 23<br />

, h40<br />

40<br />

h40<br />

40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

4<br />

h40<br />

40<br />

40<br />

h4<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h4<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

40<br />

40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

40<br />

h40<br />

h40<br />

40<br />

h 0<br />

h40<br />

40<br />

h40<br />

h 0<br />

h40<br />

h40<br />

h40<br />

40<br />

h40<br />

h40<br />

h4<br />

h40<br />

h 0<br />

h4<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V<br />

(V.P<br />

V.P<br />

(V.P<br />

(V P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

V.P<br />

V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

V.P<br />

(V<br />

(V.P<br />

(V P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

VP<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

VP<br />

V.P<br />

V<br />

(V P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V P<br />

VP<br />

VP<br />

V.P<br />

(V P<br />

(V P<br />

V.P<br />

(V<br />

(V.P<br />

V P<br />

VP<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

(V P<br />

(VP<br />

V.P<br />

(V.P<br />

(V.P<br />

VP<br />

VP<br />

V.P<br />

(V.<br />

V P<br />

VP<br />

(V.P<br />

(V P<br />

V.P<br />

V.P<br />

V<br />

(V.P<br />

(V P<br />

V.P<br />

(V<br />

(V.P<br />

V.P<br />

(V.P<br />

(V P<br />

V.P<br />

(V P<br />

(V.P<br />

V.P<br />

V.P<br />

V<br />

ort<br />

or<br />

or<br />

ort<br />

ort<br />

or<br />

ort.<br />

ort.<br />

ort.<br />

or<br />

ort.<br />

ort<br />

ort.<br />

rt<br />

ort<br />

ort.<br />

ort.<br />

ort.<br />

ort<br />

rt.<br />

ort<br />

ort<br />

ort.<br />

or<br />

ort<br />

ort<br />

ort<br />

ort.<br />

ort<br />

ort.<br />

rt.<br />

t<br />

ort<br />

ort.<br />

ort<br />

r<br />

ort<br />

or<br />

or<br />

ort<br />

ort<br />

ort<br />

rt<br />

ort.<br />

t.<br />

ort<br />

ort<br />

or<br />

ort<br />

rt<br />

ort<br />

ort<br />

ort<br />

or<br />

ort<br />

rt<br />

ort.<br />

rt<br />

rt<br />

or<br />

ort<br />

rt<br />

ort<br />

ort<br />

ort<br />

rt<br />

ort<br />

rt<br />

ort<br />

ort.<br />

ort.<br />

ort.<br />

ort.<br />

o t./3D<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

D)<br />

3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

3D<br />

3D)<br />

/3<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

3D<br />

/3D<br />

3D<br />

/3D)<br />

D)<br />

/3D)<br />

/3<br />

/3<br />

/3D<br />

3<br />

/3D<br />

3D)<br />

3D<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D<br />

/3<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D<br />

3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

D<br />

/3D)<br />

D<br />

/3D)<br />

3D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

3D)<br />

/3D)<br />

3D)<br />

/3D<br />

3D)<br />

D)<br />

D)<br />

D)<br />

D)<br />

D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

3D<br />

3D<br />

3D)<br />

/3<br />

/3D)<br />

/3D<br />

3D<br />

/3D)<br />

3D<br />

3D<br />

3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

D)<br />

/3D)<br />

/3D<br />

3D<br />

3<br />

/3D)<br />

D)<br />

D)<br />

D)<br />

D)<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3<br />

/3D<br />

/3D)<br />

3<br />

/3<br />

/3D)<br />

D)<br />

3D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

3D)<br />

D)<br />

D)<br />

D<br />

3D)<br />

/3D<br />

/3<br />

/3<br />

/3D)<br />

D<br />

3D<br />

/3D)<br />

D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

3D)<br />

D<br />

3D)<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

3D)<br />

/ D)<br />

D<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

3D)<br />

3D)<br />

/3D)<br />

D)<br />

3D)<br />

/3D<br />

3D)<br />

3D)<br />

D<br />

/3D)<br />

/3D)<br />

/3D<br />

/ )<br />

/ ); ZO<br />

;ZO<br />

; Z<br />

;Z<br />

;Z<br />

; Z<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

Z<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

;ZO<br />

;ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

Z<br />

;ZO<br />

Z<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

;ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

Z<br />

; ZO<br />

; Z<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

;ZO<br />

Z<br />

; ZO<br />

Z<br />

; Z<br />

;Z<br />

; ZO<br />

Z<br />

;Z<br />

; Z<br />

; ZO<br />

;ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

;Z<br />

;Z<br />

;ZO<br />

; ZO<br />

Z<br />

; Z<br />

;ZO<br />

Z<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

;ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; Z<br />

; ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

Z<br />

; Z<br />

;ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

;Z<br />

; ZO<br />

;ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

Z<br />

; ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

;ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

;Z<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

;ZO<br />

;ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

Z<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

;ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; Z<br />

; ZO<br />

Z<br />

;ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

Z<br />

; Z<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

;ZO<br />

; Z<br />

; ZO<br />

;ZO<br />

;ZO<br />

;ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

ZO<br />

ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; ZO<br />

; NLu<br />

NL<br />

NLu<br />

NL<br />

NLu<br />

Lu<br />

Lu<br />

NLu<br />

NLu<br />

NL<br />

NL<br />

NL<br />

N L<br />

N Lu<br />

Lu<br />

NL<br />

NLu<br />

NLu<br />

Lu<br />

NL<br />

NLu<br />

NLu<br />

NL<br />

N Lu<br />

Lu<br />

L<br />

NL<br />

NL<br />

NL<br />

NL<br />

NLu<br />

N Lu<br />

NLu<br />

NL<br />

NLu<br />

NLu<br />

NLu<br />

Lu<br />

L<br />

NLu<br />

Lu<br />

N Lu<br />

NLu<br />

NLu<br />

NL<br />

NLu<br />

Lu<br />

L<br />

NL<br />

NL<br />

NLu<br />

Lu<br />

NLu<br />

N L<br />

N Lu<br />

NL<br />

NLu<br />

N L<br />

NLu<br />

NL<br />

NLu<br />

NLu<br />

N Lu<br />

L<br />

N Lu<br />

Lu<br />

Lu<br />

N Lu<br />

NL<br />

NL<br />

NLu<br />

N L<br />

NLu<br />

Lu<br />

L<br />

NLu<br />

Lu<br />

NLu<br />

Lu<br />

NLu<br />

NLu<br />

NL<br />

NL<br />

NLu<br />

L<br />

N Lu<br />

Lu<br />

NL<br />

N Lu<br />

NLu<br />

N Lu<br />

NLu<br />

NLu<br />

NL<br />

N Lu<br />

N Lu<br />

Lu<br />

NL<br />

NLu<br />

NL<br />

N L<br />

N L<br />

NLu<br />

Lu<br />

Lu<br />

NLu<br />

Lu<br />

Lu<br />

NLu<br />

NLu<br />

NL<br />

NLu<br />

NL<br />

N Lu<br />

L<br />

NLu<br />

Lu<br />

NLu<br />

Lu<br />

N Lu<br />

NL<br />

N Lu<br />

NLu<br />

Lu<br />

N Lu<br />

Lu<br />

Lu<br />

NL<br />

N Lu<br />

Lu<br />

N Lu<br />

N Luso<br />

som<br />

so<br />

somu<br />

somu<br />

om<br />

som<br />

om<br />

omu<br />

omu<br />

mu<br />

mu<br />

omu<br />

som<br />

so<br />

so<br />

so<br />

so<br />

somu<br />

somu<br />

omu<br />

som<br />

som<br />

som<br />

som<br />

som<br />

somu<br />

somu<br />

omu<br />

mu<br />

somu<br />

somu<br />

somu<br />

mu<br />

som<br />

som<br />

somu<br />

som<br />

omu<br />

om<br />

som<br />

somu<br />

omu<br />

somu<br />

somu<br />

mu<br />

omu<br />

mu<br />

somu<br />

somu<br />

so<br />

som<br />

omu<br />

somu<br />

mu<br />

mu<br />

m<br />

som<br />

omu<br />

mu<br />

omu<br />

mu<br />

somu<br />

som<br />

som<br />

somu<br />

so<br />

somu<br />

omu<br />

om<br />

somu<br />

mu<br />

mu<br />

somu<br />

so<br />

som<br />

somu<br />

m<br />

omu<br />

omu<br />

omu<br />

so<br />

som<br />

omu<br />

omu<br />

m<br />

om<br />

om<br />

om<br />

omu<br />

somu<br />

som<br />

so<br />

somu<br />

som<br />

om<br />

omu<br />

mu<br />

mu<br />

mu<br />

mu<br />

mu<br />

omu<br />

som<br />

som<br />

som<br />

om<br />

som<br />

om<br />

somu<br />

omu<br />

somu<br />

somu<br />

so<br />

som<br />

somu<br />

mu<br />

somu<br />

somu<br />

som<br />

om<br />

om<br />

omu<br />

somu<br />

mu<br />

som<br />

omu<br />

omu<br />

mu<br />

omu<br />

somu<br />

somu<br />

somu<br />

somu do<br />

do<br />

ndo<br />

do<br />

ndo<br />

ndo<br />

do<br />

d<br />

nd<br />

ndo<br />

do<br />

do<br />

ndo<br />

do<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

do<br />

ndo<br />

ndo<br />

do<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo<br />

ndo Fóru<br />

Fór<br />

Fór<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

óru<br />

ór<br />

ór<br />

ó<br />

Fór<br />

Fóru<br />

óru<br />

óru<br />

Fóru<br />

Fór<br />

óru<br />

Fór<br />

ór<br />

Fóru<br />

Fór<br />

Fóru<br />

Fór<br />

ór<br />

Fóru<br />

Fó<br />

Fór<br />

óru<br />

Fóru<br />

r<br />

óru<br />

Fór<br />

Fór<br />

Fór<br />

Fór<br />

Fóru<br />

ru<br />

ru<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

Fór<br />

F ru<br />

Fór<br />

Fóru<br />

Fór<br />

ór<br />

ór<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

Fór<br />

óru<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

Fór<br />

Fór<br />

óru<br />

Fór<br />

Fó<br />

Fór<br />

Fór<br />

ó<br />

Fó<br />

Fór<br />

óru<br />

Fó<br />

Fó<br />

Fó<br />

Fó<br />

Fó<br />

Fóru<br />

Fóru<br />

Fó<br />

Fór<br />

óru<br />

Fó<br />

Fór<br />

óru<br />

Fóru<br />

F<br />

u<br />

Fórum<br />

dos contos <strong>de</strong> fadas acomodoupróprios<br />

lugares-comuns <strong>de</strong> qu<br />

troça — mas pel<br />

menos tem<br />

consciência<br />

ao usá-lo co<br />

ponto <strong>de</strong> par<br />

para uma últim<br />

aventura que for<br />

um final digno p<br />

série.<br />

Continuam<br />

A Teta Assustada<br />

La Teta Asustada<br />

De Claudia Llosa<br />

com Magaly Solier, Su<br />

Sánchez, Efraín Solís<br />

MMNNN<br />

<strong>Lisboa</strong>: UCI Cinemas - El Corte<br />

Inglés: Sala 8: 5ª 6ª Sábado 2<br />

14h15, 16h30, 19h, 21h35, 24h D<br />

11h30, 14h15, 16h30, 19h, 21h35<br />

Goste-se mais ou men<br />

resultado final, não p<br />

Cine Teatro: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 14h,<br />

16h, 18h, 20h, 22h, 00h30 (3D); UCI Cinemas - El<br />

Corte Inglés: Sala 12: 5ª 6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h05,<br />

16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />

11h30, 14h05, 16h15, 18h40, 21h30, 23h50 (V.<br />

Port./3D); UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 9: 5ª<br />

6ª Sábado 2ª 3ª 4ª 14h10, 16h30, 18h55,<br />

21h45, 00h10 (3D) Domingo 11h30, 14h10,<br />

16h30, 18h55, 21h45, 00h10 (3D); UCI<br />

Dolce Vita Tejo: Sala 2: 5ª 2ª 3ª 4ª<br />

13h45, 16h, 18h15, 21h15 (V.Port./3D)<br />

6ª Sábado 13h45, 16h, 18h15,<br />

21h15, 23h30<br />

(V.Port./3D)<br />

Domingo<br />

11h30, 13h45,<br />

16h, 18h15,<br />

21h15<br />

(V.Port./3D); UCI<br />

Dolce Vita Tejo: Sala 3: 5ª<br />

2ª 3ª 4ª 14h, 16h15,<br />

18h45, 21h50 (3D) 6ª<br />

Sábado 14h, 16h15, 18h45,<br />

21h50, 00h10 (3D)<br />

Domingo 11h30, 14h,<br />

16h15, 18h45, 21h50<br />

(3D); ZON Lusomundo<br />

Alvaláxia: 5ª 6ª Sábado 2ª<br />

3ª 4ª 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />

23h50 (V.Port./3D) Domingo<br />

11h15, 13h50, 16h, 18h10, 21h,<br />

23h50 (V.Port./3D); ZON<br />

Lusomundo Alvaláxia: 5ª<br />

6ª 2ª 4ª 13h20, 14h10,<br />

15h30, 16h30, 17h40,<br />

18h40, 19h50, 21h20,<br />

22h, 23h30, 00h10<br />

(V.Port./3D)<br />

“Shrek Para Sempre”: não estando ao nível do filme original,<br />

também não resume tudo a gagues <strong>de</strong> “sitcom”<br />

série ípsilon II<br />

Todas as sextas,<br />

por €1,95. 20<br />

anos<br />

+8 DVD<br />

Sexta-feira,<br />

dia 16 <strong>de</strong> Julho,<br />

o DVD “Shattered<br />

Glass”, <strong>de</strong> Billy Ray


As estrelas do público<br />

Jorge<br />

Mourinha<br />

Luís M.<br />

Oliveira<br />

Mário<br />

J. Torres<br />

Vasco<br />

Câmara<br />

Atraídos pelo Crime mnnnn nnnnn mmnnn nnnnn<br />

Duas Mulheres mmnnn nnnnn mmmnn nnnnn<br />

Eu Sou o Amor mmmmm mnnnn mmmmn mnnnn<br />

Louise-Michel mmmnn nnnnn mmnnn nnnnn<br />

Partir mmnnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

Shirin mmmmn mmmmn mmmmn mmmmm<br />

Shrek Para Sempre! mmmnn nnnnn nnnnn nnnnn<br />

A Teta Assustada mmmmn mmnnn mmnnn nnnnn<br />

Whisky mmmnn nnnnn mmmnn nnnnn<br />

Cinemateca Portuguesa R. Barata Salgueiro, 39 <strong>Lisboa</strong>. Tel. 213596200<br />

E.T.<br />

Sexta, 09<br />

Difamação<br />

Notorious<br />

De Alfred Hitchcock<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Os Dias da Rádio<br />

Radio Days<br />

De Woody Allen<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

The Doctor’’s Dream + Perfect<br />

Film + Urban Peasants + Looting<br />

For Rodney<br />

De Ken Jacobs<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Homecoming<br />

De Jon Jost<br />

22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Desesperadamente Procurando<br />

Susana<br />

Desperately Seeking Susan<br />

De Susan Sei<strong>de</strong>lman<br />

22h30 - Esplanada<br />

Sábado, 10<br />

Uma Noite na Ópera<br />

A Night at the Opera<br />

De Sam Wood<br />

15h - Salão Foz<br />

Um Criminoso à Solta<br />

The Killer Is Loose<br />

De Budd Boetticher<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Pessoal<br />

Personel<br />

De Krzysztof Kieslowski<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

Luís II, Rei da Baviera<br />

Ludwig <strong>de</strong>r Zweite, König in<br />

Bayern<br />

De Wilhelm Dieterle<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Acto da Primavera<br />

De Manoel <strong>de</strong> Oliveira<br />

21h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Selvagem e Perigosa<br />

Something Wild<br />

De Jonathan Demme<br />

22h30 - Esplanada<br />

Segunda, 12<br />

Sublime Abnegação<br />

Sister Kenny<br />

De Dudley Nichols<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

A Escada <strong>de</strong> Caracol<br />

The Spiral Staircase<br />

De Robert Siodmak<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

7 curtas <strong>de</strong> Ken Jacobs<br />

De Ken Jacobs<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Mulleres da Raia<br />

De Diana Gonçalves<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Numéro Deux<br />

De Jean-Luc Godard<br />

22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Terça, 13<br />

Entre Nuvens<br />

Ceiling Zero<br />

De Howard Hawks<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Há Lodo no Cais<br />

On the Waterfront<br />

De Elia Kazan<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

Coitado do Jorge<br />

De Jorge Silva Melo<br />

19h30 - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

O Acontecimento<br />

The Happening<br />

De M. Night Shyamalan<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

A Cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Cassiano + O<br />

Trabalho Liberta? + Cine-Diários<br />

De Edgar Pêra<br />

22h - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Quarta, 14<br />

Um Certo Rapaz<br />

A Guy Named Joe<br />

De Victor Fleming<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Volta Jimmy Dean, Volta Para<br />

Nós<br />

Come Back to the Five and Dime,<br />

Jimmy Dean, Jimmy Dean<br />

De Robert Altman<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

Star Spangled to Death<br />

De Ken Jacobs<br />

19h30 (parte 1 e 2) - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

Million Dollar Baby - Sonhos<br />

Vencidos<br />

Million Dollar Baby<br />

De Clint Eastwood<br />

21h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

Quinta, 15<br />

O Mundo é Um Manicómio<br />

Arsenic and Old Lace<br />

De Frank Capra<br />

15h30 - Sala Félix Ribeiro<br />

O Lutador da Rua<br />

Hard Times<br />

De Walter Hill<br />

19h - Sala Félix Ribeiro<br />

Star Spangled to Death<br />

De Ken Jacobs<br />

19h30 (parte 3 e 4) - Sala Luís <strong>de</strong> Pina<br />

E.T. O Extraterrestre<br />

E.T. the Extra-Terrestrial<br />

De Steven Spielberg<br />

22h30 - Esplanada<br />

<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> se respeitar a coerência<br />

formal e o bom gosto representativo<br />

<strong>de</strong> “A Teta Assustada”, fábula<br />

complexa <strong>de</strong> uma jovem peruana<br />

que lida com a morte, com as suas<br />

próprias raízes e com as implicações<br />

políticas da existência, num mundo<br />

em que a diferença constitui<br />

estigma. O problema maior (nosso,<br />

com certeza) passa pela fórmula<br />

adoptada <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />

“realismo mágico”, praga literária<br />

que se esten<strong>de</strong> não poucas vezes ao<br />

cinema, <strong>de</strong>terminando uma visão<br />

algo folclórica do real, com uma<br />

ritualização que se esgota nas suas<br />

componentes. Dito isto há<br />

momentos inesquecíveis, como a<br />

função da língua quechua na lógica<br />

poética das canções do filme ou os<br />

planos orgiásticos <strong>de</strong> casamentos ou<br />

ainda actos quotidianos mínimos,<br />

Co-produção<br />

Estrutura financiada por<br />

Patrocinadores<br />

O problema maior do peruano<br />

“A Teta Assustada” passa pela<br />

adopção <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />

“realismo mágico”<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> as <strong>de</strong>ambulações da<br />

protagonista pela casa quase<br />

assombrada até à subida das<br />

intermináveis escadas para o bairro,<br />

a lembrar imaginários templos. Só<br />

que é tudo <strong>de</strong>masiado artificioso<br />

para servir a magia <strong>de</strong> um programa<br />

(apetecia dizer cartilha) préexistente.<br />

M.J.T.<br />

Whisky<br />

De Juan Pablo Rebella, Pablo Stoll<br />

com Andrés Pazos, Mirella Pascual,<br />

Jorge Bolani. M/12<br />

MMMNN<br />

<strong>Lisboa</strong>: Me<strong>de</strong>ia King: Sala 2: 5ª Domingo 3ª 4ª<br />

13h45, 15h45, 17h45, 19h45, 21h45 6ª Sábado 2ª<br />

13h45, 15h45, 17h45, 19h45, 21h45, 00h15<br />

“Whisky” aposta numa secura quase<br />

geométrica, num humor negro que<br />

TEXTOS E MÚSICA DOS SÉCULOS XV E XVI<br />

Dramaturgia e direcção: Ana Zamora; Arranjos e direcção musical: Alicia<br />

Lázaro; Figurinos: Deborah Macías; Cenário: David Faraco e Almu<strong>de</strong>na<br />

Bautista; Desenho <strong>de</strong> luz: Miguel Ángel Camacho e Pedro Yagüe; Coreografia:<br />

Javier García Ávila; Assessor <strong>de</strong> Verso: Vicente Fuentes<br />

Interpretação: Luis Miguel Cintra, Sofia Marques e Elena Rayos<br />

Interpretação musical: Eva Jornet, Juan Ramón Lara e Isabel Zamora<br />

De 6 a 13 <strong>de</strong> JULHO TEATRO DO BAIRRO ALTO De 2ª a Sábado às 21.30h. Domingo às 17.00h<br />

R.Tenente Raul Cascais, 1A. 1250 <strong>Lisboa</strong> Tel: 213961515<br />

http://www.teatro-cornucopia.pt M/12<br />

Colaboradores<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 43


Cinema<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

“Whisky”: um filme simples, solitário, sem tempo nem espaço,<br />

que vive do trabalho meticuloso <strong>de</strong> não-actores e <strong>de</strong> uma<br />

concepção artesanal<br />

“Shirin”, <strong>de</strong> Abbas Kiarostami<br />

incomoda e <strong>de</strong>sestabiliza, fazendo<br />

dos silêncios e do fechamento<br />

claustrofóbico a chave para enten<strong>de</strong>r<br />

o pequeno labirinto ficcional que se<br />

vai gizando sem quaisquer alar<strong>de</strong>s,<br />

nem cedências. É um filme simples,<br />

solitário, sem tempo nem espaço,<br />

que vive do trabalho meticuloso <strong>de</strong><br />

não-actores e <strong>de</strong> uma concepção<br />

artesanal que lembra alguns dos<br />

monumentos do neo-realismo<br />

italiano, embora sem qualquer<br />

preocupação <strong>de</strong> citar ou <strong>de</strong><br />

homenagear. O peso da memória<br />

sente-se nas referências à infância<br />

longínqua, com uma contenção que<br />

comove, <strong>de</strong> tão primordial, e com<br />

personagens sem gran<strong>de</strong>zas míticas,<br />

antes preferindo o escoar mínimo<br />

do tempo pelos rostos e pelas<br />

casas.M.J.T.<br />

Louise-Michel<br />

De Gustave <strong>de</strong> Kervern, Benoît<br />

Delépine<br />

com Mathieu Kassovitz, Yolan<strong>de</strong><br />

Moreau, Bouli Lanners. M/16<br />

MMMNN<br />

<strong>Lisboa</strong>: Me<strong>de</strong>ia Saldanha Resi<strong>de</strong>nce: Sala 7: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 15h40, 17h40,<br />

19h40,21h40, 00h10<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 19: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 13h50, 16h25, 21h40, 00h10 3ª 4ª<br />

16h25, 21h40, 00h10<br />

Por trás da aparência <strong>de</strong> comédia<br />

absurdista e tópica sobre<br />

empregados ressabiados que<br />

<strong>de</strong>ci<strong>de</strong>m eliminar o patrão que os<br />

<strong>de</strong>spediu, está uma comédia satírica<br />

negra, surrealista e política, que não<br />

hesita em fazer humor com tópicos<br />

supostamente tabu e não pára nas<br />

fronteiras que para a maior parte da<br />

concorrência estão fora <strong>de</strong> alcance.<br />

É um filme que faz humor com<br />

doentes terminais, o tráfico humano<br />

“Louise-Michel” faz humor com coisas sérias<br />

e o 11 <strong>de</strong> Setembro, que está sempre<br />

pare<strong>de</strong>s-meias com o mau gosto e<br />

não tem problemas em estar rés-vés-<br />

Campo-<strong>de</strong>-Ourique com o ofensivo<br />

— mas que se salva sempre com uma<br />

pirueta “in extremis” resultante da<br />

entrega dos seus actores ou do risco<br />

estilístico <strong>de</strong> Benoît Delépine e<br />

Gustave Kervern rodarem todo o<br />

filme em Tatiescos planos fixos<br />

<strong>de</strong>ntro dos quais são os actores e os<br />

diálogos que constroem toda a<br />

acção.<br />

Percebe-se rapidamente que não<br />

há nunca nada <strong>de</strong> gratuito nem <strong>de</strong><br />

cínico em “Louise-Michel” (e seria<br />

tão fácil), apenas uma maneira<br />

claramente <strong>de</strong>scentrada <strong>de</strong> fazer<br />

humor com coisas muito sérias e <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ixar a gargalhada <strong>de</strong>saparecer<br />

restando um travo amargo quando<br />

percebemos que não nos estamos a<br />

rir <strong>de</strong> dois candidatos a assassinos<br />

<strong>de</strong>sastrados, mas sim <strong>de</strong> uma<br />

situação económica que con<strong>de</strong>na as<br />

pessoas a fazerem coisas que nunca<br />

teriam pensado. J. M.<br />

Shirin<br />

De Abbas Kiarostami<br />

com Rana Azadivar, Vishka Asayesh,<br />

Darya Ashouri, Pegah Ahangarani,<br />

Shiva Ebrahimi, Niloofar Adibpour,<br />

Khatareh Asadi , Juliette Binoche.M/12<br />

MMMMN<br />

<strong>Lisboa</strong>: UCI Cinemas - El Corte Inglés: Sala 6: 5ª 6ª<br />

Sábado 2ª 3ª 14h, 16h30, 19h, 21h45, 24h Domingo<br />

11h30, 14h, 16h30, 19h, 21h45, 24h 4ª 14h, 16h30,<br />

19h, 24h;<br />

Porto: Nun`Álvares: Sala 1: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 21h30;<br />

Des<strong>de</strong> há muito que o universo do<br />

iraniano Abbas Kiarostami se rarefez<br />

num formalismo quase maníaco que<br />

eli<strong>de</strong> personagens e fragmenta<br />

qualquer linha narrativa<br />

“Atraídos pelo Crime”<br />

<strong>de</strong>strinçável: em “Shirin”, a<br />

“história” está lá, mas aparece<br />

mediada por um aparato autoreflexivo<br />

que faz do cinema, da<br />

projecção, do ecrã invisível, o ponto<br />

<strong>de</strong> partida e <strong>de</strong> chegada. Enten<strong>de</strong>-se<br />

que a audácia da experiência (rostos<br />

sucessivos que <strong>de</strong>sfazem a hipótese<br />

da aparente reportagem) crie<br />

problemas a quem continue a<br />

privilegiar uma arte narrativa linear.<br />

Enten<strong>de</strong>-se até quem <strong>de</strong>fenda que se<br />

trata mais <strong>de</strong> um objecto plástico,<br />

por vezes próximo da instalação, do<br />

que <strong>de</strong> um filme no sentido<br />

tradicional do termo. O que está fora<br />

<strong>de</strong> questão é o seu rigor, a sua beleza<br />

algo perversa, a inteligência <strong>de</strong> uma<br />

intervenção pensada sobre o mundo<br />

das imagens e sobre as suas<br />

contradições ou ambiguida<strong>de</strong>s. Não<br />

é o cinema que nos entusiasma, mas<br />

que nos interroga. E não é pouco…<br />

Mário Jorge Torres<br />

Atraídos pelo Crime<br />

Brooklyn’s Finest<br />

De Antoine Fuqua,<br />

com Richard Gere, Ethan Hawke, Don<br />

Cheadle, Wesley Snipes. M/16<br />

MMNNN<br />

<strong>Lisboa</strong>: Castello Lopes - Loures Shopping: Sala 4: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h35, 18h20,<br />

21h05, 23h50; Me<strong>de</strong>ia Monumental: Sala 2: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h30, 16h20, 18h55,<br />

21h30, 24h; UCI Dolce Vita Tejo: Sala 1: 5ª Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 15h15, 18h15, 21h30 6ª Sábado 15h15,<br />

18h15, 21h30, 00h30; ZON Lusomundo Alvaláxia:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h35, 16h40,<br />

21h20, 00h15; ZON Lusomundo Amoreiras: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h40, 18h40,<br />

21h30, 00h20; ZON Lusomundo CascaiShopping:<br />

5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h45, 15h30,<br />

18h20, 21h10, 24h; ZON Lusomundo Colombo: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 12h40, 15h40, 18h35,<br />

21h35, 00h30; ZON Lusomundo Dolce Vita<br />

Miraflores: 5ª Domingo 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h10,<br />

21h10 6ª Sábado 15h10, 18h10, 21h10, 00h10; ZON<br />

Lusomundo Oeiras Parque: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 12h50, 15h45, 18h35, 21h40,<br />

00h25; ZON Lusomundo Vasco da Gama: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h35, 18h25, 21h20,<br />

00h10; Castello Lopes - Rio Sul Shopping: Sala 2: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h10, 15h50, 18h40,<br />

21h30, 00h15; ZON Lusomundo Almada Fórum: 5ª<br />

6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 13h15, 17h, 20h50,<br />

23h50; ZON Lusomundo Fórum Montijo: 5ª 6ª<br />

Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 15h15, 18h, 21h10, 24h;<br />

Porto: Arrábida 20: Sala 13: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 15h10, 18h15, 21h30, 00h35; ZON<br />

Lusomundo Dolce Vita Porto: 5ª 6ª Sábado<br />

Domingo 2ª 3ª 4ª 13h40, 16h50, 21h10, 24h; ZON<br />

Lusomundo Marshopping: 5ª 6ª Sábado Domingo<br />

2ª 3ª 4ª 13h30, 16h30, 20h, 23h; ZON Lusomundo<br />

Parque Nascente: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª<br />

4ª 13h20, 16h20, 21h, 24h; ZON Lusomundo<br />

Glicínias: 5ª 6ª Sábado Domingo 2ª 3ª 4ª 16h40,<br />

19h50, 23h;<br />

Nova Iorque tem abundantes<br />

imagens cinematográficas que<br />

recriam uma cida<strong>de</strong> outra, que<br />

nunca existiu. “Atraídos pelo Crime”<br />

dá-nos a ver uma metrópole nos<br />

antípodas da Manhattan <strong>de</strong> Woody<br />

Allen, feia, viscosa, violenta e sem<br />

remissão possível. Sem que tal<br />

constitua novida<strong>de</strong> <strong>de</strong> maior (nem<br />

precisávamos <strong>de</strong> recorrer aos<br />

abismos <strong>de</strong> “Taxi Driver”), o filme<br />

<strong>de</strong> Antoine Fuqua evi<strong>de</strong>ncia uma<br />

certa força, feita <strong>de</strong> estereótipos (a<br />

doença, a injustiça social, o crime<br />

sem razão) e terá no trabalho dos<br />

actores (Richard Gere e Ethan<br />

Hawke) a sua justificação mais<br />

relevante. Não se espere, no<br />

entanto, <strong>de</strong>ste exercício mecânico<br />

<strong>de</strong> metafórica tensão, mais do que<br />

ele quer dar, fechado nos seus<br />

limites <strong>de</strong> “fita <strong>de</strong> pequenos<br />

gangsters” urbanos. M.J.T.<br />

44 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


ARENA<br />

Carla Filipe | João Tengarrinha | Paulo Brighenti<br />

Curadoria: Filipa Oliveira<br />

Exposição: 7 <strong>de</strong> Julho até 16 <strong>de</strong> Outubro <strong>de</strong> 2010<br />

Horário: <strong>de</strong> quarta-feira a sábado, das 15h às 20h<br />

Por ocasião da exposição será publicado um catálogo, co-edição fcc / assírio & alvim<br />

Ciclo <strong>de</strong> conversas:<br />

Filipa Oliveira – dia 25 <strong>de</strong> Setembro (sábado) às 17h00<br />

José Carlos Pereira – dia 2 <strong>de</strong> Outubro (sábado) às 17h00<br />

George Stolz – dia 16 <strong>de</strong> Outubro (sábado) às 17h00<br />

fundação carmona e costa<br />

Edifício Soeiro Pereira Gomes (antigo Edifício da Bolsa Nova <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>)<br />

Rua Soeiro Pereira Gomes, Lte 1- 6.ºD, 1600-196 <strong>Lisboa</strong><br />

(Bairro do Rego / Bairro Santos)<br />

Tel. 217 803 003 / 4<br />

www.fundacaocarmonaecosta.pt<br />

Metro: Sete Rios / Praça <strong>de</strong> Espanha / Cida<strong>de</strong> Universitária<br />

Autocarro: 31<br />

SÃO<br />

LUIZ<br />

JUL~1O<br />

© Isabel Pinto<br />

o são luiz<br />

no festival<br />

<strong>de</strong> almada<br />

9, 1O, 16 E 17 JUL<br />

ALDINA<br />

DUARTE<br />

POR OLGA RORIZ<br />

SEXTA E SÁBADO ÀS 21H00<br />

SALA PRINCIPAL M/3<br />

WWW.TEATROSAOLUIZ.PT<br />

SÃO LUIZ TEATRO MUNICIPAL<br />

RUA ANTÓNIO MARIA CARDOSO, 38; 1200-027 LISBOA<br />

GERAL@TEATROSAOLUIZ.PT / T: 213 257 640<br />

BILHETEIRA DAS 13H ÀS 20H<br />

T: 213 257 650; BILHETEIRA@TEATROSAOLUIZ.PT<br />

BILHETES À VENDA NA TICKETLINE E NOS LOCAIS HABITUAIS


Livros<br />

“O Original <strong>de</strong> Laura”, publicado<br />

agora em português, é o texto<br />

que Nabokov redigiu nos<br />

últimos dois ou três anos da sua<br />

vida<br />

Ficção<br />

O rascunho<br />

Nabokov or<strong>de</strong>nou à sua<br />

viúva que <strong>de</strong>struísse o<br />

manuscrito <strong>de</strong> “O Original<br />

<strong>de</strong> Laura”. Em vez disso, ela<br />

guardou-o num banco suíço.<br />

Gustavo Rubim<br />

O Original <strong>de</strong> Laura<br />

Vladimir Nabokov<br />

Tradução Telma Costa<br />

Teorema<br />

mmmmn<br />

O que há <strong>de</strong> mais<br />

precioso neste livro<br />

é a parte<br />

fotográfica.<br />

Construído segundo<br />

o mo<strong>de</strong>lo da edição<br />

original norteamericana<br />

(Novembro <strong>de</strong><br />

2009), o volume reproduz à<br />

dimensão <strong>de</strong> meia página as fichas<br />

<strong>de</strong> cartão on<strong>de</strong> Nabokov foi<br />

escrevendo um texto que projectava<br />

intitular “O Original <strong>de</strong> Laura”. Na<br />

meta<strong>de</strong> inferior das páginas vem a<br />

tradução exclusivamente do<br />

rascunho fotografado em cima,<br />

frente ou verso <strong>de</strong> uma ficha, a<br />

maior parte das vezes fazendo parte<br />

ou <strong>de</strong> um capítulo numerado ou <strong>de</strong><br />

uma série com título (“Wild”,<br />

“Dedos dos Pés”, “Aurora”, por<br />

exemplo).<br />

Trata-se, claro está, <strong>de</strong> uma<br />

solução <strong>de</strong> compromisso. Editar um<br />

rascunho, que o autor<br />

expressamente or<strong>de</strong>nou que fosse<br />

<strong>de</strong>struído caso não ficasse acabado à<br />

hora da sua morte, obriga a estas<br />

habilida<strong>de</strong>s. O habilidoso, neste<br />

caso, foi o filho <strong>de</strong> Vladimir (que<br />

morreu em 1977): Dmitri Nabokov,<br />

<strong>de</strong> quem se po<strong>de</strong>rá dizer tudo<br />

menos que não seja servidor<br />

<strong>de</strong>votado da obra <strong>de</strong> seu pai. A<br />

polémica à volta da publicação <strong>de</strong><br />

“O Original <strong>de</strong> Laura” apenas o<br />

confirma.<br />

Mas qual é então o interesse<br />

<strong>de</strong>stas fichas fac-similadas que<br />

Vladimir Nabokov foi redigindo nos<br />

últimos dois ou três anos da sua<br />

vida?<br />

Seguramente não o <strong>de</strong> revelar<br />

uma obra inédita ou, como inculca a<br />

badana, “o gran<strong>de</strong> livro final” do<br />

autor <strong>de</strong> “Lolita”. Não é também<br />

claro que as 138 fichas<br />

correspondam a um “romance em<br />

fragmentos”, frágil classificação <strong>de</strong><br />

género que vem na capa da edição<br />

Knopf e acertadamente <strong>de</strong>saparece<br />

nas traduções francesa e<br />

portuguesa. Afirmar pedantemente,<br />

como fez Martin Amis num artigo<br />

para o “Guardian”, que o texto é “<strong>de</strong><br />

imediato reconhecível como um<br />

conto mais longo que luta para se<br />

transformar numa novela” é só outra<br />

maneira <strong>de</strong> fugir às evidências, ou<br />

seja, àquilo que nas fichas aparece e<br />

que na literatura é o mais difícil <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>screver: a própria escrita.<br />

O melhor sinal <strong>de</strong>ssa evidência da<br />

escrita é uma folha quadriculada,<br />

aqui posta na portada do livro e no<br />

fim da série <strong>de</strong> fichas pautadas. Lêse<br />

nela uma série vertical <strong>de</strong> sete<br />

verbos ingleses que Telma Costa, a<br />

tradutora, converte nos seguintes<br />

verbos em português: “apagar,<br />

erradicar, suprimir, anular, <strong>de</strong>lir,<br />

limpar, obliterar” (o primeiro é<br />

“efface”). Não passa <strong>de</strong> uma lista <strong>de</strong><br />

sinónimos e no entanto olha-se para<br />

ela como se equivalesse <strong>de</strong> algum<br />

modo à or<strong>de</strong>m que Nabokov <strong>de</strong>u à<br />

sua viúva, Vera: <strong>de</strong>struir o<br />

manuscrito (em vez disso, ela<br />

guardou-o num banco suíço).<br />

Porque é o género <strong>de</strong> verbos (e <strong>de</strong><br />

atos) que se aplica muito bem ao que<br />

se escreve. Mas também porque o<br />

esqueleto <strong>de</strong> história que o rascunho<br />

constrói tem a ver com a escrita <strong>de</strong><br />

um livro chamado “Laura”, que<br />

ten<strong>de</strong> a apagar-se ou a anular-se<br />

perante o original da protagonista,<br />

ou seja, uma mulher chamada<br />

“Flora”.<br />

Esta mulher, no entanto, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as<br />

primeiras linhas em que aparece,<br />

tem tendência para se converter em<br />

livro. Descrita numa cena <strong>de</strong> sexo,<br />

diz o narrador: “Só i<strong>de</strong>ntificando-a<br />

com um não-escrito, meio escrito,<br />

reescrito livro difícil se po<strong>de</strong> enfim<br />

aspirar a conseguir o que as<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

<strong>de</strong>scrições contemporâneas do coito<br />

tão raramente transmitem (...)”.<br />

Mais adiante, sabemos que Flora na<br />

pré-adolescência ficava muitas vezes<br />

sozinha em casa com um<br />

“charmeur” chamado Hubert H.<br />

Hubert e aí a conversão literária <strong>de</strong><br />

Flora em Lolita torna-se inevitável<br />

apesar <strong>de</strong> todas as diferenças que<br />

separam Humbert Humbert, herói e<br />

narrador do romance <strong>de</strong> 1955, <strong>de</strong>ste<br />

“macho velho, meigo mas<br />

malcheiroso e ‘afoito’”. O nome<br />

produz os seus efeitos e o original <strong>de</strong><br />

“Laura” per<strong>de</strong>-se noutro livro (que<br />

é, em gran<strong>de</strong> parte, uma história <strong>de</strong><br />

origens perdidas).<br />

Do que o rascunho dá documento<br />

vivo é <strong>de</strong>ssa característica alusiva e<br />

entremeada da prosa <strong>de</strong> Nabokov no<br />

processo <strong>de</strong> se compor. O que resta<br />

do capítulo quatro narra a morte da<br />

mãe <strong>de</strong> Flora, que no início é Mrs.<br />

Lanskaya e no meio, <strong>de</strong>z linhas <strong>de</strong><br />

ficha abaixo, já é “‘Landskaya’ —<br />

‘land’ e ‘sky’, terra e céu e o eco<br />

melancólico do seu nome<br />

dançante.”<br />

Se há coisa que “O Original <strong>de</strong><br />

Laura” não é <strong>de</strong> certeza é o mero<br />

esboço <strong>de</strong> uma história mais ou<br />

menos sugestiva, que se <strong>de</strong>va avaliar<br />

pela soli<strong>de</strong>z do enredo ou pela<br />

verosimilhança psicológica das<br />

personagens, ainda que só<br />

adivinhadas. Como sempre acontece<br />

quando um texto dá acesso à escrita,<br />

é da literatura que se trata nestas<br />

linhas em que um livro está no<br />

centro dos acontecimentos. São<br />

linhas que falam do modo como na<br />

escrita se <strong>de</strong>sfaz aquilo que ela<br />

mesma inventa: “O ‘Eu’ do livro é<br />

um homem <strong>de</strong> letras neurótico e<br />

hesitante, que <strong>de</strong>strói a sua amante<br />

no acto <strong>de</strong> a retratar.”<br />

Esse mesmo “eu” emprega-se<br />

<strong>de</strong>pois num processo <strong>de</strong> autoeliminação<br />

que consiste em apagar<br />

mentalmente, <strong>de</strong> baixo para cima, a<br />

linha vertical do pronome pessoal<br />

inglês “I”. Recomenda-se a atenta<br />

leitura <strong>de</strong>ssas páginas apenas<br />

rascunhadas àqueles que ten<strong>de</strong>m,<br />

<strong>de</strong> modo quase maníaco, a não ler<br />

nos textos senão o que julgam já<br />

saber sobre quem os escreveu.<br />

O casal<br />

Publicado em 1987, “Morrem<br />

Mais <strong>de</strong> Mágoa” é a autópsia<br />

<strong>de</strong>sse apurado exemplar que<br />

é o homem refinadamente<br />

educado no século XX.<br />

Helena Vasconcelos<br />

Morrem Mais <strong>de</strong> Mágoa<br />

Saul Bellow<br />

Tradução Lucília Filipe<br />

Quetzal<br />

mmmmm<br />

Se Darwin tivesse lido Saul Bellow<br />

CHRISTOPHER FELVER/CORBIS<br />

Bellow, malabarista da palavra, conta<br />

histórias com um mínimo <strong>de</strong> acção<br />

e o máximo <strong>de</strong> referências filosóficas<br />

e literárias<br />

ficaria<br />

provavelmente<br />

intrigado com a<br />

forma como o autor<br />

<strong>de</strong> “Morrem Mais <strong>de</strong><br />

Mágoa”, romance<br />

<strong>de</strong> 1987, se <strong>de</strong>dica a<br />

autopsiar, mais uma<br />

vez, esse apurado<br />

exemplar que é o homem<br />

refinadamente educado do século<br />

XX. Des<strong>de</strong> os longínquos anos 40,<br />

quando publicou “Dangling Man”,<br />

que o gran<strong>de</strong> escritor canadiano —<br />

naturalizado americano — foi<br />

analisando as crises <strong>de</strong> meia-ida<strong>de</strong><br />

em homens ju<strong>de</strong>us cultos e<br />

sofisticados, a braços com paixões<br />

contraditórias, casamentos<br />

frustrados, divórcios complexos e<br />

avanços alarmantes (mas<br />

ansiosamente <strong>de</strong>sejados) <strong>de</strong><br />

mulheres impetuosas e sensuais. Ao<br />

revelar a fragilida<strong>de</strong> e os tormentos<br />

por que passam intelectuais<br />

aparentemente sólidos que, à<br />

partida, se apresentam como<br />

exemplos <strong>de</strong> um processo <strong>de</strong><br />

evolução civilizacional vitorioso e<br />

bem sucedido, Bellow retrata a<br />

frustração do “homem mo<strong>de</strong>rno”<br />

confrontado com situações que já<br />

não sabe controlar porque lhe<br />

falham o instinto e a cautela<br />

ancestrais.<br />

Em “Morrem Mais <strong>de</strong> Mágoa” (o<br />

título elegíaco contradiz o tom<br />

cómico e picaresco da narrativa),<br />

Bellow junta dois professores que,<br />

<strong>de</strong> uma forma muito particular,<br />

formam um par estreitamente unido<br />

como mais tar<strong>de</strong>, em 2000,<br />

acontecerá com Abe e Chick, os<br />

doutos académicos do seu último<br />

romance, “Ravelstein”. Aqui, a forte<br />

relação, não isenta <strong>de</strong> atritos, entre<br />

Kenneth Trachtenberg, o narrador<br />

<strong>de</strong> 35 anos, assistente <strong>de</strong> Literatura<br />

Russa numa remota Universida<strong>de</strong> do<br />

Midwest, e o seu tio pelo lado<br />

materno, Benn Cra<strong>de</strong>r, um<br />

académico e botânico famoso que<br />

46 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Espaço<br />

Público<br />

Este espaço vai ser<br />

seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />

teatro, livro, exposição,<br />

disco, álbum, canção,<br />

concerto, DVD viu e<br />

gostou tanto que lhe<br />

apeteceu escrever<br />

sobre ele, concordando<br />

ou não concordando<br />

com o que escrevemos?<br />

Envie-nos uma nota até<br />

500 caracteres para<br />

ipsilon@publico.pt. E<br />

nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />

Sebastian Barry é um dos mais talentosos<br />

autores <strong>de</strong> língua inglesa actuais<br />

anda pela casa dos 50 e se<br />

especializou em líquenes da<br />

Antárctida, assemelha-se, na sua<br />

essência, à <strong>de</strong> outros “casais”<br />

exemplares como Dom Quixote e<br />

Sancho Pança, Robinson Crusoé e<br />

Sexta-Feira ou Sherlock Holmes e<br />

Doutor Watson. Empenhados na<br />

pesquisa — cada um à sua maneira —<br />

das agruras nas relações humanas,<br />

das angústias do erotismo e das<br />

frustrações do amor, vêem-se a<br />

braços com o dilema expresso na<br />

seguinte frase: “Quando nos<br />

metemos na vida quotidiana, somos<br />

apanhados pelo pescoço mas se, por<br />

outro lado, nos recusamos a entrar<br />

nela, nunca perceberemos nada”<br />

(pág. 356). Dito isto, Bellow cita<br />

amplamente filósofos como<br />

Alexandre Kojève, mentor do seu<br />

amigo Allan Bloom e,<br />

principalmente, Nicolai Fyodorov,<br />

que é subtilmente satirizado pela<br />

sua crença num processo<br />

evolucionário em que o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento da inteligência<br />

implicaria um melhoramento da<br />

vida da humanida<strong>de</strong>. (Segundo<br />

Fyodorov, o ser humano, no auge do<br />

seu <strong>de</strong>senvolvimento, po<strong>de</strong>ria<br />

aspirar à imortalida<strong>de</strong>, uma vez que<br />

a luta contra a morte seria um traço<br />

<strong>de</strong> união entre os povos não olhando<br />

a credos, religiões, raças, riqueza ou<br />

condição social.)<br />

Em “Morrem Mais <strong>de</strong> Mágoa”, a<br />

“trama”, no sentido tradicional do<br />

termo, é quase inexistente. Kenneth<br />

cresceu em Paris, os pais são<br />

americanos expatriados,<br />

sofisticados e cosmopolitas — à sua<br />

mesa sentaram-se gran<strong>de</strong>s<br />

pensadores e artistas — mas prefere<br />

refugiar-se no coração da América,<br />

colocando-se a uma distância<br />

consi<strong>de</strong>rável do pai com o seu<br />

donjuanismo priápico, e da mãe que<br />

parte para a Somália como<br />

voluntária, <strong>de</strong>ixando para trás o<br />

brilho da Rive Gauche. Kenneth e<br />

Benn passam o tempo a conversar<br />

— Benn é bastante inconveniente na<br />

forma como convoca o sobrinho a<br />

qualquer hora do dia e da noite — e<br />

o casamento é uma peça tão<br />

fundamental na estrutura <strong>de</strong>ste<br />

romance como nos <strong>de</strong> Jane Austen.<br />

A vida <strong>de</strong> Kenneth, envolta na<br />

melancolia dos autores russos a que<br />

<strong>de</strong>dica o seu estudo, não é<br />

brilhante: tem uma filha <strong>de</strong> uma<br />

mulher que se mudou para Seattle e<br />

é sovada pelo amante — a pequena<br />

Treckie que exibe as suas nódoas<br />

negras como troféus —, e uma sogra<br />

que quer casar com ele para ter<br />

acesso à custódia da neta (filha<br />

<strong>de</strong>le), vive num quarto espartano na<br />

Universida<strong>de</strong> e encontra-se<br />

permanente envolvido nos dramas<br />

do tio Benn com a agravante <strong>de</strong><br />

nunca conseguir salvá-lo<br />

verda<strong>de</strong>iramente. Este, a quem<br />

chamam Professor Clorofila, <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>z anos <strong>de</strong> viuvez tranquila, é<br />

arrastado pela sua libido e<br />

compelido a dar o nó com a bela,<br />

jovem, rica, sonolenta e sarcástica<br />

Matilda Layamon — casamento que<br />

se realiza sorrateiramente, na<br />

ausência <strong>de</strong> Kenneth —, o que, como<br />

seria <strong>de</strong> esperar, o vai submergir em<br />

preocupações e levá-lo a uma<br />

situação <strong>de</strong> impasse. O gran<strong>de</strong><br />

cientista, o homem bom, o<br />

observador do perfeito universo das<br />

plantas, o viajante com uma missão<br />

maior vê-se embrenhado numa<br />

comédia <strong>de</strong> costumes — Balzac é<br />

citado com proprieda<strong>de</strong> — em que o<br />

dinheiro é, obviamente, uma<br />

priorida<strong>de</strong>. É impensável manter<br />

Matilda com um salário <strong>de</strong> professor<br />

e os sogros <strong>de</strong> Benn têm gran<strong>de</strong>s<br />

planos para fazer <strong>de</strong>le um homem<br />

dignamente rico, capaz <strong>de</strong> aplacar a<br />

voracida<strong>de</strong> da sua bela esposa. (Os<br />

tormentos que se avizinham como<br />

nuvens negras <strong>de</strong> tempesta<strong>de</strong>, tão<br />

actuais e prementes como os que<br />

afligiram os peregrinos <strong>de</strong> Chaucer,<br />

transportam-nos directamente para<br />

os “Contos <strong>de</strong> Canterbury”).<br />

Dizer-se que “Morrem Mais <strong>de</strong><br />

Mágoa” é um romance implicaria<br />

uma longa meditação sobre as<br />

flutuações erráticas e as<br />

ramificações <strong>de</strong>ste género literário.<br />

Mas Bellow é um malabarista da<br />

palavra, capaz <strong>de</strong> contar uma<br />

história com um mínimo <strong>de</strong> acção e<br />

o máximo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias e referências<br />

filosóficas e literárias. O seu ritmo, a<br />

sua aparente discrição e as suas<br />

raízes judias e russas po<strong>de</strong>m não<br />

revelar, numa primeira impressão, o<br />

lado extremamente cómico das suas<br />

personagens, envolvidas em tramas<br />

sentimentais e angústias<br />

existenciais. Enganam-se<br />

(ligeiramente) os críticos que<br />

insistem em compará-lo a Henry<br />

James pela hábil e complexa<br />

tessitura das suas histórias, pelo que<br />

será mais acertado dizer-se que, por<br />

<strong>de</strong>trás da sua suavida<strong>de</strong>, Bellow foi<br />

um discípulo <strong>de</strong> Stendhal, Henry<br />

Fielding e Voltaire, amante <strong>de</strong> um<br />

lado “marginal” da socieda<strong>de</strong> — nos<br />

seus romances existe sempre a<br />

sombra dos “gangsters” típicos da<br />

sua cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> adopção, Chicago — e<br />

um observador exímio da mente<br />

humana.<br />

Falta acrescentar que Saul Bellow<br />

continua a ser, cinco anos após a<br />

sua morte, uma espécie <strong>de</strong> “guru”<br />

<strong>de</strong> (já) várias gerações <strong>de</strong> escritores.<br />

Basta ler o último livro <strong>de</strong> Ian<br />

McEwan, “Solar” (ed. Gradiva),<br />

para <strong>de</strong>tectar as suas fontes em<br />

“Herzog” e “ Ravelstein”, dois dos<br />

romances mais cómicos e<br />

simultaneamente mais<br />

melancólicos <strong>de</strong> Bellow, <strong>de</strong>dicados<br />

ao tema do envelhecimento<br />

masculino e à pressão <strong>de</strong> um<br />

universo caótico e dominado por<br />

forças <strong>de</strong>sumanizadas. Martin Amis,<br />

para citar mais um exemplo, nunca<br />

se esquece <strong>de</strong> mencionar a dívida<br />

para com este gran<strong>de</strong> senhor que<br />

cultivou a amiza<strong>de</strong> entre os homens<br />

e um persistente fascínio (e medo)<br />

pelas mulheres. Conhecido pelas<br />

suas i<strong>de</strong>ias exuberantes, ironia<br />

faiscante, comédia hilariante e<br />

compaixão compulsiva, Bellow<br />

escreveu: “um homem afirma,<br />

‘daqui em diante vou dizer sempre<br />

a verda<strong>de</strong>’. Mas a verda<strong>de</strong> ouve-o,<br />

foge e escon<strong>de</strong>-se ainda antes <strong>de</strong>le<br />

ter acabado <strong>de</strong> falar”. Neste mundo<br />

on<strong>de</strong> se persegue a felicida<strong>de</strong> como<br />

utopia e o conforto da <strong>de</strong>mocracia<br />

se paga bem caro, há mais gente a<br />

morrer <strong>de</strong> mágoa do que <strong>de</strong><br />

radiações atómicas. No universo <strong>de</strong><br />

Saul Bellow é assim.<br />

Elegia<br />

irlan<strong>de</strong>sa<br />

Exílio e re<strong>de</strong>nção <strong>de</strong> um<br />

anti-herói que o <strong>de</strong>stino quis<br />

no “lado errado” da História,<br />

escrita por um talentoso<br />

estilista da língua inglesa.<br />

José Riço Direitinho<br />

A História <strong>de</strong> Eneas<br />

Sebastian Barry<br />

Tradução Fernanda Pinto Rodrigues<br />

Bertrand Editora<br />

MMmmN<br />

O irlandês Sebastian<br />

Barry (n. 1955),<br />

duas vezes finalista<br />

do Booker Prize — a<br />

última com o<br />

belíssimo romance<br />

“Escritos Secretos”<br />

(Bertrand, 2009)<br />

— para além <strong>de</strong><br />

romancista, é também um prolífico<br />

dramaturgo e poeta. O lirismo da<br />

sua prosa, o quase inebriante estilo<br />

elegíaco, e a exactidão poética,<br />

associados ao cuidado <strong>de</strong> ourives<br />

com que ur<strong>de</strong> as suas histórias,<br />

fazem <strong>de</strong> Barry um dos mais<br />

talentosos autores <strong>de</strong> língua inglesa<br />

da sua geração.<br />

“A História <strong>de</strong> Eneas”,<br />

originalmente publicado em 1998,<br />

narra-nos a vida atribulada <strong>de</strong> Eneas<br />

McNulty, nascido no lugar <strong>de</strong> Sligo,<br />

APOIO<br />

PATROCINADOR<br />

VERÃO NA CASA<br />

na Irlanda rural dos “velhos muros<br />

sombrios” e das “azinhagas<br />

assombradas”, nos começos do<br />

século XX, filho <strong>de</strong> um alfaiate (e<br />

músico amador) e <strong>de</strong> uma<br />

costureira, ambos a trabalharem<br />

num manicómio. A vida <strong>de</strong>sta<br />

espécie <strong>de</strong> anti-herói irlandês,<br />

começa <strong>de</strong> maneira conturbada,<br />

pois quer o <strong>de</strong>stino que logo<br />

bastante novo ele viva numa espécie<br />

<strong>de</strong> “lado errado” da História e das<br />

atribulações dos tempos que então<br />

corriam: quando os<br />

“in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntistas” <strong>de</strong> Michael<br />

Collins, mais tar<strong>de</strong> o herói da<br />

in<strong>de</strong>pendência irlan<strong>de</strong>sa, se<br />

começam a afirmar contra os<br />

britânicos, ele tem a má sorte <strong>de</strong> por<br />

essa altura se ir alistar na marinha<br />

mercante inglesa, e mais tar<strong>de</strong>,<br />

ainda, nas forças policiais britânicas<br />

que reprimiam na Irlanda os<br />

“irregulares” católicos do “exército”<br />

republicano pré-in<strong>de</strong>pendência. Os<br />

homens <strong>de</strong> Sligo, incluindo o seu<br />

maior amigo <strong>de</strong> infância, não lhe<br />

perdoam a “traição” e o seu nome é<br />

<strong>de</strong> imediato incluído nas listas<br />

TER 27 JUL<br />

22:00 PRAÇA | € 20<br />

A electrónica toma conta da<br />

Praça com o concerto <strong>de</strong> Tricky.<br />

Músico <strong>de</strong> referência do trip–<br />

–hop inglês, esteve ligado ao<br />

período inicial da carreira dos<br />

Massive Attack. A sua carreira<br />

explodiu em 1995 com o premiado<br />

Maxinquaye, primeiro álbum a<br />

solo recentemente reeditado.<br />

JANTAR+CONCERTO € 35<br />

MECENAS CASA DA MÚSICA<br />

APOIO INSTITUCIONAL<br />

MECENAS PRINCIPAL CASA DA MÚSICA<br />

PATROCINADOR VERÃO NA CASA<br />

SEJA UM DOS PRIMEIROS A APRESENTAR HOJE ESTE JORNAL NA CASA DA MÚSICA E GANHE UM CONVITE DUPLO<br />

PARA O CONCERTO DE TRICKY. OFERTA LIMITADA AOS PRIMEIROS 10 LEITORES.<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 47


Livros<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

negras dos apoiantes <strong>de</strong> Michael<br />

Collins (e, mais tar<strong>de</strong>, também nas<br />

do IRA, como numa espécie <strong>de</strong><br />

herança) como homem a abater.<br />

Transforma-se num ser acossado, e<br />

o resto da sua vida vai ser moldado<br />

pelas forças em luta, pois os<br />

“homens dos casacos escuros” <strong>de</strong><br />

Sligo não apagam o nome <strong>de</strong>le das<br />

listas e a sentença <strong>de</strong> morte não é<br />

revogada. O passado nunca <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong><br />

ser um terreno minado, porque o<br />

passado afinal ainda não passou. O<br />

que se segue é uma longa história <strong>de</strong><br />

exílio.<br />

Há nisto tudo uma espécie <strong>de</strong><br />

paradoxo: a vida <strong>de</strong> um homem<br />

apolítico, que apenas queria ganhar<br />

o seu sustento, é toda ela moldada<br />

por aquilo que menos lhe interessa<br />

— até o gran<strong>de</strong> amor da sua vida, a<br />

linda Vic, que é obrigado a <strong>de</strong>ixar<br />

para sempre em Sligo.<br />

Como num jogo <strong>de</strong> espelhos,<br />

Sebastian Barry serve-se <strong>de</strong> um antiherói<br />

para nos mostrar como a<br />

História da Irlanda, <strong>de</strong> maneira<br />

maligna, po<strong>de</strong> perturbar e alastrar<br />

como uma mancha na vida dos<br />

irlan<strong>de</strong>ses quando estes menos<br />

esperam; mas não apenas a sua<br />

vertente política, também a religião<br />

(estavam ambas bastante ligadas)<br />

actuou — e actua (note-se as disputas<br />

entre católicos e protestantes no<br />

norte da ilha — como um estigma<br />

social na Irlanda. Assim surge a<br />

personagem Roseanne Clear, que<br />

vamos encontrar mais tar<strong>de</strong> no<br />

romance “Escritos Secretos”, com<br />

quase cem anos, internada num<br />

hospício há décadas por disputas<br />

político-religiosas (separatistas /<br />

unionistas, católicos / protestantes).<br />

Escorraçado da sua terra natal e<br />

da família, começa a sua<br />

<strong>de</strong>ambulação em busca <strong>de</strong> uma<br />

re<strong>de</strong>nção que talvez nunca chegue.<br />

Durante <strong>de</strong>z anos trabalha num<br />

pesqueiro nos mares da<br />

Gronelândia, perseguindo cardumes<br />

<strong>de</strong> arenques, mas as recordações e o<br />

<strong>de</strong>sprezo com que foi tratado nunca<br />

o abandonam, antes o fazem<br />

continuar. “Naquele imaculado<br />

mundo <strong>de</strong>serto <strong>de</strong> gelo, mar e<br />

arenques, com as sociáveis baleias e<br />

raramente um narval a passar por<br />

eles, on<strong>de</strong> os animais são pretos ou<br />

brancos, só a Lua e as auroras<br />

boreais extravagantes, geladas e<br />

altas, são sombras, lembranças <strong>de</strong><br />

cores, é <strong>de</strong> alguma maneira possível<br />

conservar Sligo na sua cabeça. E o<br />

ódio que os seus compatriotas<br />

sentem por ele é uma espécie <strong>de</strong><br />

guia, uma espécie <strong>de</strong> explicação<br />

para a <strong>de</strong>cadência da ternura <strong>de</strong>les.<br />

Anos brutais entre um povo<br />

civilizado fizeram-lhes isso porque<br />

quando há assassínio e mais<br />

assassínio o coração morre como um<br />

rato com veneno na soleira <strong>de</strong> uma<br />

casa <strong>de</strong> quinta, ofegante.”<br />

Depois dos trabalhos piscatórios<br />

na Gronelândia e nos mares do<br />

Norte, vem a II Guerra Mundial, e<br />

Eneas McNulty estará em<br />

Dunquerque, on<strong>de</strong> quase se lhe fina<br />

a vida. Depois vem a África, Nigéria,<br />

Lagos, os perigos <strong>de</strong> um continente<br />

<strong>de</strong>sconhecido. Mas a re<strong>de</strong>nção<br />

parece chegar na forma <strong>de</strong> um hotel,<br />

numa pequena ilha inglesa, que<br />

funciona como último porto <strong>de</strong><br />

abrigo para alguns que, como ele,<br />

quase foram <strong>de</strong>serdados da vida.<br />

Convocando um imaginário<br />

tipicamente irlandês — as casas<br />

senhoriais em ruínas com<br />

aparecimentos <strong>de</strong> antigos fantasmas<br />

<strong>de</strong> crianças, as matas <strong>de</strong> aveleiras, o<br />

“cheiro húmido dos musgos”, os<br />

ulmeiros, os riachos, os pátios em<br />

ruínas, as histórias <strong>de</strong> náufragos que<br />

aparecem ainda em enseadas<br />

escondidas — Barry consegue<br />

compor, em ritmo dolente e<br />

elegíaco, uma história que<br />

dificilmente <strong>de</strong>ixará a memória do<br />

leitor.<br />

Ser menor<br />

A curva <strong>de</strong> uma<br />

vida<br />

Vergílio Ferreira<br />

Obra Completa -<br />

Espólio<br />

Edição <strong>de</strong> Ana<br />

Isabel Turíbio e<br />

Cátia Barroso<br />

Quetzal, 54 págs.<br />

mmnnn<br />

Promessa<br />

Vergílio Ferreira<br />

Obra Completa -<br />

Espólio<br />

Edição <strong>de</strong> Fernanda<br />

Irene Fonseca e<br />

Hel<strong>de</strong>r Godinho<br />

Quetzal, 279 págs.<br />

mmmnn<br />

Duas obras “completas”, até agora<br />

inéditas, do espólio <strong>de</strong> Vergílio<br />

Ferreira: “A Curva <strong>de</strong> Uma Vida”<br />

novela <strong>de</strong>butante, e “Promessa”,<br />

romance <strong>de</strong> 1947. Nenhuma editada<br />

em vida do autor, que todavia se lhe<br />

refere nos “Diários”, nem por este<br />

dada como pronta a editar. O que<br />

levanta hoje problemas éticos. ‘Na<br />

aparência resolvidos’ (?) sob a capa<br />

<strong>de</strong> uma citação do próprio Vergilio<br />

Ferreira (“Conta-Corrente”) que os<br />

organizadores colocam em epígrafe,<br />

em ambos os volumes: “A minha<br />

opinião é que um autor não dá<br />

garantias quase nenhumas (…) sobre<br />

a valia do que realiza. E não há obra<br />

mediocre alguma que lhe <strong>de</strong>strua a<br />

obra superior (…) Mas há mil<br />

problemas a seduzir-nos (…) saber<br />

como se errou, progrediu, hesitou”.<br />

Problemas que tentam uma minoria.<br />

O aparato crítico, como já havia sido<br />

o <strong>de</strong> “Diário Inédito”, é cuidado e<br />

completo. O prefácio do romance,<br />

da autoria <strong>de</strong> Fernanda Irene<br />

Fonseca e Hel<strong>de</strong>r Godinho, é<br />

rigoroso (assim como o <strong>de</strong> Ana<br />

LUÍS RAMOS/ARQUIVO<br />

Isabel Turíbio e Cátia Barroso, no<br />

caso da novela) no que diz respeito à<br />

explicação exaustiva dos critérios da<br />

publicação e do trabalho crítico<br />

sobre o espólio, explicação esta não<br />

inocentemente subsumida sob o<br />

recurso ao argumento <strong>de</strong> autoria<strong>de</strong><br />

filiado na citação do autor. Nas<br />

últimas linhas escreve-se:<br />

“‘Promessa’ não é um livro<br />

supérfluo” na obra <strong>de</strong> Vergílio<br />

Ferreira “e muito menos um livro<br />

simplesmente menor”.<br />

Curiosamente, ergue outras<br />

interrogações além do seu ser<br />

menor que indiscutivelmente é. Tido<br />

como texto <strong>de</strong> mudança, marca <strong>de</strong><br />

afastamento no neo-realismo que só<br />

ao <strong>de</strong> leve assoma, é sobretudo<br />

“romance <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias”, o que já não<br />

seria hoje bom augúrio. Duas<br />

personagens nucleares: Flávio, o<br />

narrador (um perfil hegeliano ou<br />

marxista) que se criou na rua e se fez<br />

engenheiro, tem um conhecimento<br />

directo da história que conta,<br />

interpelando regularmente um tal<br />

<strong>de</strong> Rodrigo, vulto ausente, suporte<br />

tecnicamente eficaz <strong>de</strong><br />

perplexida<strong>de</strong>s e interrogações<br />

narrativas. Sérgio (perfil<br />

existencialista) é a outra<br />

personagem nuclear, é o centro<br />

<strong>de</strong>sconcertante <strong>de</strong> uma constelação<br />

<strong>de</strong> acções e reacções, por quem os<br />

sentimentos do narrador também<br />

diferem: do rancor, à<br />

incompreensão, ao ódio quase, até à<br />

compaixão e cordialida<strong>de</strong>, comoção<br />

perante o seu corpo. Esta <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong><br />

sentimental trai, aliás, o intuito <strong>de</strong><br />

ser objectivo. Flávio era aluno num<br />

liceu em que Sérgio leccionava. Por<br />

razões políticas, o pai daquele<br />

ausenta-se. Então Sérgio, que é<br />

também, à noite, pintor, propõe ser<br />

ele a orientar e financiar os estudos<br />

do rapaz, que acabará por se tornar<br />

engenheiro inscrevendo entre eles,<br />

naturalmente, relações ambíguas <strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong>r.<br />

Começo por imaginar a recepção<br />

<strong>de</strong>ste romance por dois públicos<br />

diferentes: os que já conhecem,<br />

leram e admiram o autor; e os que<br />

numa livraria cruzam pela primeira<br />

vez o nome (re)conhecido, o título<br />

— “Promessa” — e são incitados a<br />

pegar nele pela aura que o ter estado<br />

inédito transporta, qual “Laura”, <strong>de</strong><br />

Nabokov. Como exercício, <strong>de</strong>sdobrome<br />

e vou supor que o lêem até ao<br />

fim.<br />

Comecemos pelos primeiros,<br />

aqueles que sublinham um ou outro<br />

traço já visível neste romance<br />

daquilo que alicerçará “Para<br />

Sempre” ou “Em Nome da Terra”. O<br />

início — “Agora que Sérgio morreu<br />

contarei tudo como se passou. Tanto<br />

mais que para alguns o assassino fui<br />

eu”; O fim — “Sérgio sangra-me a<br />

memória. São três da madrugada e<br />

há silêncio no mundo. (...) Olho, por<br />

isso, e esqueço. Vejo-te apenas nu,<br />

<strong>de</strong>sgraçado entre o luxo do teu<br />

quarto, caído, sem <strong>de</strong>sespero (...).<br />

Agora que há silêncio, eu quero<br />

admitir que para ti já não houvesse<br />

outro remédio no mundo, e porque<br />

o admito. A tua miséria comoveme”.<br />

Entre os dois momentos toda<br />

uma história é convocada. O<br />

narrador invoca e evoca a partir do<br />

presente da narrativa o real que<br />

transcen<strong>de</strong>. Estas linhas repercutem<br />

já a nota <strong>de</strong> um Virgílio Ferreira por<br />

vir, até na sua dimensão celiniana.<br />

“Promessa” dá já sinal do que há-<strong>de</strong><br />

vir aperfeiçoado, vibrátil, ‘sublime’.<br />

Consi<strong>de</strong>remos agora a segunda<br />

categoria <strong>de</strong> leitores, aqueles para<br />

quem Vergílio Ferreira não passa <strong>de</strong><br />

mais um nome sem espessura no<br />

mercado e na memória. Esses talvez<br />

exasperem (com razão) aquelas<br />

páginas que os primeiros apressam,<br />

isto é, as muitas e artificiais<br />

discussões filosóficas e estéticas <strong>de</strong><br />

uma tertúlia, pretexto para “i<strong>de</strong>ias<br />

postas em romance” ficcionalmente<br />

<strong>de</strong>scarnadas. Porque ingénuo e<br />

excessivamente transparente o<br />

intuito, o i<strong>de</strong>ário que se quer pôr em<br />

confronto. Lembremos que ao<br />

mesmo tempo o autor lia os filósofos<br />

que se iriam tornar constitutivos do<br />

escritor e do ensaísta, <strong>de</strong> Bergson a<br />

Sartre passando por Hegel, entre<br />

outros. Assim, “Promessa” tem<br />

<strong>de</strong>masiada filosofia à mostra, mal<br />

tecida, o que se torna quase<br />

caricatural. Uma epígrafe <strong>de</strong><br />

abertura, citação <strong>de</strong> Hegel que vai<br />

subsumir o todo: “é na vida <strong>de</strong> um<br />

povo que o conceito <strong>de</strong> actualização<br />

da razão consciente tem a sua<br />

perfeita realida<strong>de</strong>”. Temos no<br />

romance a contradição explícita <strong>de</strong><br />

dois pólos opostos: Sérgio e<br />

Edmundo. “Sérgio parecia-me<br />

<strong>de</strong>sinteressado da vida e Edmundo<br />

preso a ela, mor<strong>de</strong>ndo-lhe,<br />

cravando-lhe os <strong>de</strong>ntes no pescoço.<br />

Quando não lhes entendia as<br />

palavras, eu entendia o que as<br />

tornava oportunas: os gestos, a<br />

mímica. Sérgio era lento e cansado.<br />

Mas Edmundo era activo.” Flávio<br />

seria uma síntese <strong>de</strong> ambos. Por <strong>de</strong><br />

mais previsível.<br />

Vergílio Ferreira escreve “A Curva<br />

<strong>de</strong> Uma Vida” com 22 anos acabados<br />

os seus estudos <strong>de</strong> Filologia Clássica,<br />

o que é <strong>de</strong> ter em conta já que tem<br />

um toque juvenil <strong>de</strong> tragédia<br />

clássica, embora o final, que uns<br />

zumzuns <strong>de</strong> percurso, qual coro, vão<br />

anunciando, e uma boa intriga não<br />

esteja à altura <strong>de</strong> um Eurípe<strong>de</strong>s:<br />

Fernando, cujo pai ele cria ter<br />

morrido, era afinal um tio.<br />

Tanto este romance, como a<br />

novela, assim como em muitas<br />

outras obras maiores (e na própria<br />

vida real do autor) testemunham<br />

algo que é constante no autor (<strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

“Vagão J”) : a figura masculina e do<br />

pai ser psicologicamente mal<br />

resolvida (não confundir com<br />

ficcionalmente). Os pais nunca<br />

conseguem transmitir o legado<br />

simbólico aos filhos, há sempre<br />

tensão.<br />

A edição da Obra Completa <strong>de</strong><br />

Vergílio Ferreira é <strong>de</strong> aplaudir.<br />

Sobretudo por especialistas ou<br />

investigadores em crítica genética,<br />

que po<strong>de</strong>riam porém consultá-la<br />

“online”. Para um público menos<br />

minoritário, não seria mais profícuo,<br />

em termos <strong>de</strong> divulgação e<br />

inteligência do autor, reeditar em<br />

paralelo, ou alternância, as obras<br />

maiores talvez prefaciadas por<br />

autores capazes <strong>de</strong> as iluminarem?<br />

Maria da Conceição Caleiro<br />

Poesia<br />

Duas vezes<br />

nada<br />

Antologia <strong>de</strong> uma poesia<br />

niilista. Pedro Mexia<br />

A Última Porta<br />

Manuel <strong>de</strong> Freitas<br />

Assírio & Alvim<br />

mmmmn<br />

Dez anos e 20<br />

títulos <strong>de</strong>pois<br />

(incluindo<br />

“plaquettes” e<br />

colectâneas<br />

confi<strong>de</strong>nciais),<br />

temos enfim uma<br />

substancial<br />

antologia <strong>de</strong><br />

Manuel <strong>de</strong> Freitas, o mais<br />

48 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Mestrado em Ciências da Comunicação (5 especializações)<br />

Comunicação, Organização e Li<strong>de</strong>rança<br />

Media e Jornalismo<br />

Internet e Novos Media<br />

Comunicação e Gestão Cultural<br />

Comunicação, Marketing e Publicida<strong>de</strong><br />

Mestrado em Ciências da Família (3 especializações)<br />

Políticas <strong>de</strong> Família<br />

Orientação e Mediação Familiar<br />

Contextos Familiares <strong>de</strong> Risco<br />

2010/2011<br />

Secretariado<br />

Mestrado em Estudos <strong>de</strong> Cultura - integrado na Re<strong>de</strong> THE LISBON CONSORTIUM*<br />

Estudos <strong>de</strong> Cultura<br />

Performance e Criativida<strong>de</strong> NOVO<br />

*em parceria com várias instituições culturais da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong>.<br />

Mestrado em Línguas Estrangeiras Aplicadas:<br />

TEFL (Teaching English as a Foreign Language)<br />

Business and Languages - Línguas e Negócios NOVO<br />

Mestrado em Tradução NOVO<br />

Mestrado em Serviço Social (2 especializações)<br />

Serviço Social<br />

Acompanhamento Social e Inserção<br />

Mestrado em Filosofia (3 especializações)<br />

Filosofia da Linguagem e Ciências Cognitivas<br />

Estética e Filosofia da Arte NOVO<br />

Filosofia Ibérica<br />

<br />

Doutoramento em Ciências da Comunicação<br />

Doutoramento em Estudos <strong>de</strong> Cultura - integrado na Re<strong>de</strong><br />

THE LISBON CONSORTIUM*<br />

*em parceria com várias instituições culturais da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Lisboa</strong><br />

Doutoramento em Serviço Social<br />

Cristina Nunes e Ana Morais | Tel: 217214194 | 217214202<br />

Email: cnunes@fch.lisboa.ucp.pt | amorais@fch.lisboa.ucp.pt<br />

www.fch.lisboa.ucp.pt


Livros<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

Isabel<br />

Coutinho<br />

“Casca <strong>de</strong> banana não<br />

é tão ruim como a<br />

gente pensa”<br />

Moacyr Scliar<br />

http://scliar.org/<br />

moacyr/<br />

Moacyr Scliar no<br />

Twitter<br />

http://twitter.<br />

com/moacyr_<br />

scliar<br />

Ciberescritas<br />

De pai para filho,<br />

<strong>de</strong> filho para pai<br />

Lembrei-me <strong>de</strong>sta história quando <strong>de</strong>scobri o novo<br />

“site” do escritor brasileiro Moacyr Scliar que está<br />

a ser feito pelo seu filho. Ele contou-a há uns anos<br />

no Correntes d’Escritas, o encontro literário <strong>de</strong><br />

escritores <strong>de</strong> expressão ibérica na Póvoa <strong>de</strong><br />

Varzim. Nunca mais a esqueci. É uma lição <strong>de</strong> literatura.<br />

Numa tar<strong>de</strong> na Póvoa, o autor <strong>de</strong> “A mulher que<br />

escreveu a Bíblia” (ed. Livros <strong>de</strong> Seda) contou que o seu<br />

pai emigrou para um país <strong>de</strong>sconhecido quando tinha<br />

<strong>de</strong>z anos. Saiu da Rússia no período da guerra civil que<br />

se seguiu a 1917, meteu-se num navio em direcção ao<br />

Brasil, atravessou o oceano e foi parar ao Rio Gran<strong>de</strong> do<br />

Sul.<br />

Não fazia a mínima i<strong>de</strong>ia do que o esperava. Chegou<br />

a um país completamente <strong>de</strong>sconhecido mas isso não<br />

o impedia <strong>de</strong> ver o Brasil como uma coisa maravilhosa.<br />

Sonhava com o clima ameno, com um país <strong>de</strong> gente<br />

amável e com as frutas. Nunca tinha visto um abacaxi,<br />

nunca tinha visto uma manga, nunca tinha visto uma<br />

banana. E foi apresentado a uma banana, exactamente<br />

no dia em que chegou a Porto Alegre.<br />

Quando embarcou, o pai <strong>de</strong> Moacyr já era “um<br />

menino magrinho”. No barco passou fome, ficou um<br />

esqueleto. E quando finalmente o navio atracou na<br />

cida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>sembarcou. A população inteira <strong>de</strong> Porto<br />

Alegre estava no cais à espera do barco que trazia os<br />

europeus e um gaúcho percebeu que o pai <strong>de</strong> Moacyr<br />

tinha fome e ofereceu-lhe uma banana. “O meu pai<br />

imaginou que era uma coisa para comer. Mas não tinha<br />

sido treinado para comer banana e, como não falava<br />

português, ficou com perplexida<strong>de</strong> a mexer na banana”,<br />

disse o também médico Moacyr Scliar.<br />

Descobriu então que a banana se <strong>de</strong>scascava, tal como<br />

a laranja. Imaginou que seria igual e que teria também<br />

casca e caroços. “Ao <strong>de</strong>scascar a banana apareceu uma<br />

coisa que ele pensou que<br />

era o caroço da banana. E<br />

jogou fora o caroço. Comeu<br />

a casca <strong>de</strong> banana até ao fim<br />

para surpresa do gaúcho”,<br />

continuou o escritor a quem<br />

até morrer, já <strong>de</strong>pois dos 80<br />

anos, o pai disse sempre:<br />

“Casca <strong>de</strong> banana não é tão ruim como a gente pensa”.<br />

Para Moacyr Scliar, o escritor é “o emigrante que vê a<br />

banana e que come a casca” e a tarefa da literatura é<br />

“transformar o <strong>de</strong>sconhecido em magia”.<br />

No “site” que o seu filho Beto está a <strong>de</strong>senvolver na<br />

Internet ficamos a conhecê-lo melhor. Não só por causa<br />

das fotografias que mostram o escritor a trabalhar no seu<br />

escritório em frente ao computador, mas também pelo<br />

blogue on<strong>de</strong> têm sido colocados os textos e crónicas que<br />

tem publicado na imprensa brasileira. Não <strong>de</strong>ixem <strong>de</strong><br />

ler a crónica intitulada “Felicida<strong>de</strong> não se compra. Nem<br />

mesmo pela Internet”.<br />

Pouco a pouco está a ser disponibilizado material<br />

<strong>de</strong> arquivo sobre o escritor e querem mostrar também<br />

ví<strong>de</strong>os das suas conferências. Numa das secções é<br />

possível enviar mensagens para o escritor. Noutra po<strong>de</strong>m<br />

ler-se citações das críticas aos seus livros, consultar o seu<br />

currículo, ler algumas entrevistas (ao jornal “Estado <strong>de</strong><br />

Minas”, à Universida<strong>de</strong> Fe<strong>de</strong>ral do Rio Gran<strong>de</strong> do Sul e à<br />

revista “Época”), <strong>de</strong>ixar mensagens no Livro <strong>de</strong> Visitas e<br />

ver as capas e as <strong>de</strong>scrições dos seus livros. Criaram uma<br />

conta no Twitter on<strong>de</strong> se anunciam as novida<strong>de</strong>s que<br />

vão colocando no “site”.<br />

isabel.coutinho@publico.pt<br />

(Ciberescritas também é um blogue http://blogs.publico.pt/<br />

ciberescritas)<br />

“influente” e “polémico” poeta da<br />

sua geração, aspas nessas palavras<br />

tão equívocas. O seu amigo José<br />

Miguel Silva escolheu textos que vão<br />

das colectâneas “Todos Contentes e<br />

Eu Também” (2000) a “Boa Morte”<br />

(2008). É uma antologia<br />

assumidamente pessoal, que talvez<br />

sobre-represente os primeiros livros<br />

e tenha poucos poemas <strong>de</strong> obras<br />

maiores como “Beau Séjour” (2003).<br />

Des<strong>de</strong> 2000 que Manuel <strong>de</strong><br />

Freitas vem apresentando (e<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo, em textos críticos) uma<br />

poesia que po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>finir como<br />

niilista. Não é um niilismo <strong>de</strong><br />

programa, mas <strong>de</strong> impulso, embora<br />

em alguns momentos Freitas resvale<br />

para o moralismo dos<br />

“intransigentes”. Estes poemas só<br />

acreditam no álcool, na música e na<br />

morte. A “vida”, essa, é uma coisa<br />

que se suporta, e mal, entre copos,<br />

canções e dias <strong>de</strong>scontados. Manuel<br />

<strong>de</strong> Freitas começou por assumir um<br />

pose mais ultra-romântica, mas esse<br />

<strong>de</strong>feito atenuou-se, e agora acreditase<br />

mais naquele cansaço<br />

antiquíssimo, naquela inexorável<br />

tristeza, naquele gosto pela <strong>de</strong>rrota.<br />

Não esperem consolação da poesia:<br />

aqui não se acredita em <strong>de</strong>uses,<br />

i<strong>de</strong>ologias, mitos salvíficos. Nem se<br />

acredita no sublime estético, pelo<br />

menos na poesia, arte marginal, que<br />

caiu na sarjeta, e lá continua,<br />

agra<strong>de</strong>cendo que não a incomo<strong>de</strong>m.<br />

A divisão <strong>de</strong> águas é nítida. Basta<br />

pensar que ainda vigora em altas<br />

esferas um entendimento<br />

tonitruante, junqueiriano, do que é<br />

a poesia. Não esperem essa pompa<br />

<strong>de</strong> uma geração que acredita em<br />

pouco ou nada e que tem à sua<br />

frente a crónica <strong>de</strong> vidas<br />

quotidianas. Freitas especializou-se,<br />

como diz a dado passo, nos<br />

“antónimos da beleza”, e muitos<br />

<strong>de</strong>stes poemas são como andar por<br />

<strong>Lisboa</strong> <strong>de</strong> madrugada, após uma<br />

noite <strong>de</strong> boémia. Detritos, eis o que<br />

mais há nestes poemas, <strong>de</strong>tritos <strong>de</strong><br />

coisas e <strong>de</strong> gente.<br />

A taberna, até pelo seu quase<br />

arcaísmo, foi <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início o sítio <strong>de</strong><br />

on<strong>de</strong> Freitas quis ver o mundo.<br />

Entre velhotes gastos, passadores <strong>de</strong><br />

droga, mulheres da rua, intelectuais<br />

<strong>de</strong> terceira, ven<strong>de</strong><strong>de</strong>iras quase<br />

mitológicas, entre balcões<br />

gordurosos, tédio, jogatana, “a<br />

apagada e vil cerveja”. A taberna é<br />

um abrigo, mas é também um<br />

encosto, lugar <strong>de</strong> observação e não<br />

<strong>de</strong> acção, e sobretudo lugar <strong>de</strong><br />

esquecimento, como naquelas<br />

noites <strong>de</strong> estupor alcoólico que<br />

Freitas inveja às cida<strong>de</strong>s nórdicas.<br />

Como se disse, pelas tabernas e<br />

<strong>de</strong>mais estabelecimentos passa gente<br />

concreta, e Freitas suspen<strong>de</strong> o<br />

<strong>de</strong>sprezo geral que tem pela<br />

humanida<strong>de</strong>, a ponto <strong>de</strong> <strong>de</strong>monstrar<br />

verda<strong>de</strong>ira empatia por essa fauna<br />

que arrasta a vidinha como códigos<br />

<strong>de</strong> barras. Se nalguns momentos a<br />

vida é <strong>de</strong>scrita nestes poemas com<br />

asco, como assunto <strong>de</strong> “procriação” e<br />

Manuel <strong>de</strong> Freitas: os seus<br />

poemas só acreditam no<br />

álcool, na música e na morte<br />

“taxas <strong>de</strong> juro”, também é visível que<br />

as existências difíceis comovem o<br />

poeta. O que ele não suporta é tudo<br />

aquilo a que associamos com a vida<br />

“burguesa”, embora as suas<br />

inclinações anarquizantes o levem a<br />

supor, erradamente, que a<br />

procriação e as taxas <strong>de</strong> juro sejam<br />

um assunto que apenas diz respeito à<br />

burguesia.<br />

Porque é que um niilista escreve?<br />

Eis um poema logo do primeiro<br />

livro: “A noite passou, sem sono nem<br />

alegria. / E eu esqueci-me <strong>de</strong> lavar a<br />

louça / e <strong>de</strong> encontrar um sentido<br />

para a vida / (truque poético<br />

bastante conhecido). / O amor não<br />

bateu à porta com as suas mãos /<br />

frágeis e <strong>de</strong>sonestas, nenhum amigo<br />

/ — <strong>de</strong>sses que não tenho — quis<br />

ludibriar / a sua solidão bebendo um<br />

copo comigo. / Limitei-me a folhear<br />

alguns livros, / com o cansaço prévio<br />

<strong>de</strong> saber / que os vou ler. Pus em dia<br />

a correspondência / cada vez mais<br />

escassa, ofício <strong>de</strong> afectos / fingidos,<br />

calculados silêncios, fórmulas /<br />

feitas. E ouvi música <strong>de</strong>solada, que /<br />

é a parte <strong>de</strong> Deus que melhor<br />

conheço” (pág. 35).<br />

Quem não aprecia a poesia <strong>de</strong><br />

Freitas, insiste habitualmente no<br />

eterno retorno a esta angústia, a este<br />

vazio, àquilo a que o próprio poeta<br />

chama “duas vezes nada”.<br />

Mas esse retrato é incompleto e<br />

erróneo. Basta lermos com atenção.<br />

Quando escreve sobre discos ou<br />

concertos, por exemplo, Freitas<br />

recupera a crença no sublime: “a<br />

música tem sempre razão”. E a<br />

amiza<strong>de</strong>? Poucos poetas elogiam<br />

tanto a amiza<strong>de</strong> como Freitas, tanto<br />

nos versos como nas<br />

abundantíssimas <strong>de</strong>dicatórias.<br />

Também as evocações familiares<br />

respiram afecto, no retrato <strong>de</strong><br />

personagens perdidas no passado,<br />

marcantes, rústicas, carismáticas,<br />

tristes, como o avô: “É aqui que as<br />

palavras faltam, irremediavelmente. /<br />

Abraçava-o por razão nenhuma /<br />

numa tar<strong>de</strong> igual às outras. /<br />

Estávamos todos na sala, / numa sala<br />

tão diferente / daquela em que mais<br />

gosto <strong>de</strong> o ver, / em jeito <strong>de</strong> plácido<br />

arquiduque. / Fotografia <strong>de</strong> autor<br />

DAVID CLIFFORD/ARQUIVO<br />

<strong>de</strong>sconhecido, / princípios do século<br />

passado. / Acabara talvez <strong>de</strong> ler em<br />

francês / as aventuras e <strong>de</strong>sventuras /<br />

dos filhos do capitão Grant” (pág.<br />

84). Os familiares tiveram “um<br />

enredo banal: morreram”, mas <strong>de</strong>les<br />

ficou obviamente mais do que esse<br />

“entulho do passado” <strong>de</strong> que o poeta<br />

tanto se queixa, ficou uma memória<br />

que se confun<strong>de</strong> com a própria<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. E finalmente, apesar <strong>de</strong><br />

todo o nojo pela juventu<strong>de</strong>, o niilista<br />

está apaixonado e escreve poemas à<br />

sua amada.<br />

Voltamos então à pergunta:<br />

porque é que um niilista escreve?<br />

Porque a morte é a última palavra<br />

mas não é única palavra. E se a<br />

“literatura” é vã, inútil, um pouco<br />

ridícula, a poesia não é, a poesia vale<br />

alguma coisa. E vemos como, texto<br />

após texto, Freitas fala daquele<br />

poema que está a escrever naquele<br />

momento, e assim confessa que a<br />

escrita é a única possibilida<strong>de</strong>.<br />

Possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> quê? De uma<br />

comunicação directa, prosaica,<br />

genuína, vivida, através <strong>de</strong> uma<br />

linguagem que contraria a estética<br />

da dificulda<strong>de</strong>, porque difícil é a<br />

vida, e dizê-la com as palavras certas<br />

é tudo o que temos da felicida<strong>de</strong>.<br />

Dança<br />

Notas <strong>de</strong><br />

rodapé<br />

Uma biografia que é um<br />

diário que é um relato e não<br />

diz mais do que já sabíamos<br />

sobre Pina Bausch. Tiago<br />

Bartolomeu Costa<br />

Pina Bausch – Sentir mais<br />

Claudia Galhós<br />

D. Quixote<br />

mnnnn<br />

Num país que não<br />

tem prática regular<br />

<strong>de</strong> edições sobre<br />

criação<br />

contemporânea, o<br />

primeiro<br />

aniversário da<br />

morte <strong>de</strong> Pina<br />

Bausch afigurava-se<br />

como a oportunida<strong>de</strong> indicada para<br />

o mercado dar, em português,<br />

matéria que registasse o papel da<br />

coreógrafa alemã na história<br />

recente.<br />

Da imensa bibliografia disponível<br />

para ser traduzida, a aposta foi num<br />

“ensaio biográfico” <strong>de</strong> Claudia<br />

Galhós, jornalista do “Expresso”,<br />

que <strong>de</strong>cidiu acelerar o seu<br />

“profundo <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> reinventar as<br />

relações humanas, <strong>de</strong>senhando<br />

sucessivos esboços, na crença e na<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vivermos juntos”<br />

50 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


(p. 9), e fazer “Pina Bausch – Sentir<br />

Mais”, 279 páginas <strong>de</strong> um olhar<br />

pessoal sobre alguém com quem<br />

contactou fugazmente (“consegui<br />

que me pronunciasse umas palavras<br />

num camarim em 1998”, p. 277).<br />

A autora esclarece que este relato<br />

“<strong>de</strong>corre ao sabor irregular <strong>de</strong> uma<br />

experiência amorosa, em que ao<br />

amor caberá o período mais longo da<br />

nossa existência.” (p. 278). É o<br />

justificativo necessário para não<br />

esperarmos <strong>de</strong>ste livro uma biografia,<br />

mas um percurso, pessoal e limitado<br />

— porque <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do olhar <strong>de</strong><br />

quem escreve — do que pensa que<br />

sabe sobre Pina Bausch. Há aqui uma<br />

tentativa <strong>de</strong> compreensão do método<br />

<strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong> alguém que dizia não<br />

ter técnica (p. 125), usando a autora a<br />

emoção e a sua sensibilida<strong>de</strong> para<br />

<strong>de</strong>screver o que sentiu, ou o que<br />

<strong>de</strong>veríamos ter sentido. Com, e por<br />

Pina, diz Galhós, “<strong>de</strong>ambulamos por<br />

entre as nuvens do ver e do ouvir, em<br />

percursos <strong>de</strong> ilusão on<strong>de</strong> a utopia<br />

ainda é possível” (p. 262), ela que<br />

“com a mesma discrição, sem se<br />

fazer notar como revolução, ganha<br />

um corpo e um comportamento que<br />

põem em causa as estruturas mas<br />

basilares da socieda<strong>de</strong>, do indivíduo<br />

e da arte” (p. 27).<br />

Será aqui, neste território<br />

especulativo, que Claudia Galhós vai<br />

encontrar matéria para preencher<br />

um livro que não acrescenta nada <strong>de</strong><br />

novo ao que já sabíamos sobre Pina<br />

Bausch. E nem sequer me refiro aos<br />

especialistas, <strong>de</strong> cada vez que Pina<br />

veio a <strong>Lisboa</strong> repetiram-se as<br />

mesmas imagens feitas da violência<br />

transformada em poesia, dos corpos<br />

suspensos, da imagem que projecta<br />

e recebe, da luminosida<strong>de</strong> dos seus<br />

movimentos, na capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Pina<br />

em tocar “na essência da alma<br />

humana” (p. 27).<br />

Generalizações agora exacerbadas<br />

sem a reflexão que <strong>de</strong>veria respeitar<br />

um discurso que se foi completando<br />

e, como a própria autora emana <strong>de</strong><br />

alguém que “nunca foi dócil ou<br />

conformada. E não se queira agora<br />

reduzir a uma coisa só” (p. 207). E,<br />

no entanto, Galhós reduz Bausch ao<br />

grau zero da criticalida<strong>de</strong>, rejeitando<br />

um olhar que não esteja viciado pela<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sobre ele<br />

falar (não falta a imagem gasta <strong>de</strong><br />

que não se po<strong>de</strong> fazer poesia <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong> Auschwitz), sobretudo <strong>de</strong>pois da<br />

morte.<br />

Dividido, no essencial, em três<br />

partes — “Primeiras impressões”,<br />

“Namoro” e “Amor” —, o texto, feito<br />

<strong>de</strong> brevíssimos capítulos com títulos<br />

igualmente programáticos que<br />

nunca esclarecem o que os<br />

singulariza (por exemplo: “Acto <strong>de</strong><br />

fé”, “Noite <strong>de</strong>ntro”, “Conta-me a tua<br />

história”, “A menina dança”, “Elogio<br />

da insegurança”...), vagueia por<br />

entre algumas obras <strong>de</strong> Bausch,<br />

fazendo das que foram apresentadas<br />

em <strong>Lisboa</strong> (12 <strong>de</strong> um total <strong>de</strong> 45) o<br />

essencial da sua obra, à qual junta<br />

mais meia dúzia, sem nunca se<br />

perceber se a autora as viu ou se<br />

relata a partir do que leu.<br />

Este é o problema principal <strong>de</strong><br />

uma obra monocórdica, <strong>de</strong> escrita<br />

confusa e errante, sem memória e<br />

repetitiva, que se coloca a um nível<br />

para o qual não tem altura, e<br />

substituindo a distância que se <strong>de</strong>ve<br />

ter em relação às obras, <strong>de</strong> modo a<br />

po<strong>de</strong>r dialogar com o seu discurso,<br />

por uma <strong>de</strong>terminação tão obstinada<br />

como tocante (como o são todas as<br />

paixões cegas). “Cada um respon<strong>de</strong> a<br />

cada estímulo com uma resposta,<br />

que a seu modo dá sentido àquilo<br />

que está a ver” (p. 85), <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>-se a<br />

autora.<br />

Não é porque Claudia Galhós não<br />

saiba, mas é porque, <strong>de</strong> cada vez que<br />

acha que expõe um lado mais crítico,<br />

daí <strong>de</strong>corre uma ausência <strong>de</strong><br />

emoção. “A crítica, propriamente<br />

dita, para além <strong>de</strong> ser praticamente<br />

uma miragem na actualida<strong>de</strong>, se<br />

disponibiliza um olhar julgador<br />

sobre as suas impressões do mundo,<br />

na postura arrogante <strong>de</strong> senhora da<br />

verda<strong>de</strong>, está a negar o sentido<br />

profundamente humano e complexo<br />

da própria natureza da obra <strong>de</strong> Pina”<br />

(p. 89). Pina, diz a autora, activava<br />

“reflexos interiores <strong>de</strong><br />

redistribuição, como imagem<br />

reflectida <strong>de</strong> espelho, <strong>de</strong>liciosamente<br />

distorcida pela vivência interior<br />

<strong>de</strong>sses mesmos estímulos” (p. 85), e,<br />

por isso, Galhós acha que as suas<br />

obras escapam “à nossa<br />

compreensão, escapam ao mo<strong>de</strong>lo<br />

<strong>de</strong>finido <strong>de</strong> como viver nesta era da<br />

imagem e da reproductibilida<strong>de</strong>” (p.<br />

235).<br />

Galhós prefere impor-se à obra <strong>de</strong><br />

Bausch, ao que ela diz, numa<br />

tentativa <strong>de</strong> interpretação obcecada<br />

pela paixão, sugerindo<br />

interpretações acríticas e sectárias.<br />

Não sentir profundamente a obra <strong>de</strong><br />

Bausch significa “querer<br />

continuar a ser<br />

ignorante”<br />

(p.112), é<br />

produzir<br />

uma<br />

“reacção<br />

frustrada”<br />

(p. 179),<br />

“seria a<br />

mais<br />

triste<br />

forma <strong>de</strong><br />

cegueira, a<br />

que não quer<br />

ver, cobar<strong>de</strong>”<br />

(p. 207), é, em<br />

suma, “não a<br />

perceber” (p. 235).<br />

Mais: é recusar o<br />

convite a “a abandonar a<br />

sua posição <strong>de</strong> alheado do<br />

que está a acontecer”, porque<br />

o espectador “é convidado a<br />

reclamar mais para si do<br />

que esta evasão para um<br />

mundo <strong>de</strong> fingimento,<br />

on<strong>de</strong> existe em estado comatoso,<br />

que se limita a prolongar o papel <strong>de</strong><br />

espectador que vive no seu<br />

quotidiano” (p. 117).<br />

Consi<strong>de</strong>rando o seu conhecimento<br />

sobre a matéria — exposto nas<br />

<strong>de</strong>rivações teóricas que faz sobre o<br />

teatro pós-dramático, a dançateatral,<br />

a importância da<br />

dramaturgia, a geneologia<br />

coreográfica —, só se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar<br />

como uma oportunida<strong>de</strong> perdida<br />

uma obra que se escon<strong>de</strong> atrás <strong>de</strong><br />

uma paixão. E, atrás <strong>de</strong>ssa paixão,<br />

um esforço hercúleo para aguentar o<br />

que não <strong>de</strong>veria ter sido mais do que<br />

um obituário, ainda que extenso,<br />

numa edição especial <strong>de</strong> um jornal.<br />

Sendo um diário, e por isso,<br />

pessoal, é certo que este livro não se<br />

obriga ao rigor académico que<br />

sujeitam as biografias à confirmação<br />

dos factos e menos, ainda, ao brio<br />

jornalístico que <strong>de</strong>ve caracterizar<br />

quem é profissional do meio. E, no<br />

entanto, nunca em momento algum<br />

a autora nos faz esquecer que é<br />

jornalista e que esse olhar guia o<br />

livro e, na verda<strong>de</strong>, dá os melhores<br />

momentos <strong>de</strong>le, mesmo que<br />

enfermados pelo mesmo estilo<br />

melado e con<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte — as<br />

relações do universo <strong>de</strong> Pina com os<br />

criadores nacionais; o relato da<br />

experiência em <strong>Lisboa</strong> para<br />

“Masurca Fogo”, as memórias <strong>de</strong><br />

alguns bailarinos — ou seja, quando<br />

Claudia Galhós <strong>de</strong>ixa que sejam os<br />

outros a falar. Porque, sendo patente<br />

— pelas citações usadas e pela<br />

<strong>de</strong>scrição da própria autora — que o<br />

seu contacto directo com a<br />

coreógrafa foi fugaz, para não dizer<br />

nulo, espanta que Galhós queira<br />

sustentar 279 páginas em <strong>de</strong>rivações<br />

poéticas, respigando citações<br />

avulsas, sempre secundárias na sua<br />

visão, e ignorando outras (a conversa<br />

<strong>de</strong> duas horas que Bausch teve<br />

com o público aquando da<br />

sua presença em 2007<br />

em <strong>Lisboa</strong>, no Teatro<br />

Camões — coisa que<br />

nunca fez nas<br />

suas outras seis<br />

vezes — é<br />

ignorada, o<br />

que teria<br />

poupado à<br />

autora a<br />

permanente<br />

citação das<br />

mesmas<br />

fontes).<br />

As<br />

fontes<br />

Pina Bausch por Cláudia Galhós: só se po<strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar como uma<br />

oportunida<strong>de</strong> perdida uma obra que se escon<strong>de</strong> atrás <strong>de</strong> uma paixão<br />

usadas são pobres e limitadas,<br />

servindo apenas para caucionar os<br />

objectivos da obra e não para<br />

ampliarem o discurso <strong>de</strong> Bausch. No<br />

essencial, o olhar <strong>de</strong> Galhós ignora o<br />

vasto corpo coreográfico <strong>de</strong> Pina, os<br />

contextos por on<strong>de</strong> ela se<br />

movimentou e as comparações com<br />

outras escolas que surgiram e com<br />

quem Pina dialogou, mesmo que as<br />

recusasse ou <strong>de</strong>las se distanciasse.<br />

Ignora ainda as diversas pontes no<br />

interior da obra <strong>de</strong> Bausch (e daí<br />

remontagens que implicavam<br />

alterações), nunca questionando,<br />

por exemplo, a importância da série<br />

<strong>de</strong> peças sobre cida<strong>de</strong>s, sobretudo<br />

nos seus aspectos <strong>de</strong> produção, ela<br />

que nunca os ignorou e a eles sempre<br />

procurou respon<strong>de</strong>r. É vaga também<br />

na análise do isolamento <strong>de</strong> Pina,<br />

refugiando-se sempre na sua<br />

extrema sensibilida<strong>de</strong>, e aceitando<br />

ser vista como uma esfinge em vez<br />

“da mulher-artista das palavras<br />

dançadas e não ditas” (p.177).<br />

Sabe-se que às obras dos artistas<br />

maiores se tenta sempre colar uma<br />

poética que fica sempre aquém do<br />

objecto, num exercício <strong>de</strong> colagem<br />

patética que limita a recepção da<br />

obra à capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reacção e<br />

retórica. Um exemplo, apenas, diz<br />

bem da ligeireza da abordagem<br />

proposta neste livro: sobre a<br />

revolução proposta por Pina, a<br />

jornalista diz que a coreógrafa<br />

“<strong>de</strong>sfaz-se <strong>de</strong>sse corpo artificial,<br />

mentiroso, impositivo <strong>de</strong> padrões <strong>de</strong><br />

beleza impossíveis — tal como a<br />

Barbie o fez mais tar<strong>de</strong> — e <strong>de</strong> uma<br />

suposta perfeição que projecta esse<br />

ser leve no ar” (p. 105).<br />

Não estando cá para se <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r, e<br />

não havendo matéria directa <strong>de</strong><br />

contraponto, este livro maniqueísta<br />

corre o risco <strong>de</strong> se tornar uma<br />

referência. Se ao menos, como<br />

escreveu o seu marido, se aceitasse<br />

que “a obra <strong>de</strong> Pina Bausch vive e<br />

morre com ela” (p. 234), este livro<br />

po<strong>de</strong>ria fazer as vezes <strong>de</strong> um<br />

exercício <strong>de</strong> reflexão sobre o seu<br />

legado em vez <strong>de</strong> um penoso <strong>de</strong>sfiar<br />

<strong>de</strong> memorias secundárias e<br />

projectadas, a maior parte <strong>de</strong>las<br />

especulativas, a maior parte <strong>de</strong>las<br />

pequenas notas <strong>de</strong> rodapé.<br />

SÃO<br />

LUIZ<br />

TEATRO MUNICIPAL<br />

Está aberto o concurso para<br />

Direcção Artística do<br />

São Luiz Teatro <strong>Municipal</strong><br />

As candidaturas para a Direcção Artística do São Luiz<br />

Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong>vem ser realizadas até às 18h<br />

do dia 20 <strong>de</strong> Julho <strong>de</strong> 2010. Todos os candidatos<br />

<strong>de</strong>vem proce<strong>de</strong>r obrigatoriamente à sua inscrição<br />

na plataforma electrónica www.vortalgov.pt.<br />

Passos para a Inscrição em www.vortalgov.pt<br />

Quero A<strong>de</strong>rir > Vantagens Universais (Gratuito) > Plataforma electrónica<br />

<strong>de</strong> contratação Pública (A<strong>de</strong>rir Já) > Preencher Ficha <strong>de</strong> A<strong>de</strong>são (1 a 6)<br />

(Browser preferencial para a inscrição na plataforma: Internet Explorer).<br />

Os candidatos <strong>de</strong>verão proce<strong>de</strong>r à inscrição no<br />

site com a maior brevida<strong>de</strong> possível e associar a<br />

sua inscrição à seguinte <strong>de</strong>signação do contrato:<br />

“Prestação <strong>de</strong> Serviços <strong>de</strong> Direcção Artística do<br />

São Luiz Teatro <strong>Municipal</strong>”.<br />

O Júri do concurso é composto pelos seguintes elementos:<br />

Presi<strong>de</strong>nte – Miguel Honrado;<br />

Vogal – Ana Marin;<br />

Vogal – António Pinto Ribeiro;<br />

Vogal – Emmanuel Demarcy Mota;<br />

Vogal – Pedro Burmester.<br />

As condições específicas do concurso po<strong>de</strong>m ser consultadas em:<br />

www.egeac.pt<br />

www.teatrosaoluiz.pt<br />

Todas as questões relacionadas com o concurso <strong>de</strong>verão ser<br />

formuladas por escrito e enviadas para:<br />

concursosaoluiz@egeac.pt<br />

EGEAC – Empresa <strong>de</strong> Gestão <strong>de</strong> Equipamentos e Animação Cultural Tel: 218 820 090<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 51


Teatro/Dança<br />

NUNO OLIVEIRA<br />

As Danças Macabras eram uma forma popular <strong>de</strong> esconjurar o fim<br />

A morte<br />

<strong>de</strong> frente<br />

A encenadora Ana Zamora<br />

celebra a vida com as danças<br />

medievais criadas para<br />

esconjurar a morte. Ana<br />

Dias Cor<strong>de</strong>iro<br />

Dança da morte/Dança <strong>de</strong> la<br />

muerte<br />

Encenação <strong>de</strong> Ana Zamora.<br />

Com Luís Miguel Cintra, Sofia<br />

Marques, Elena Rayos, Eva Jornet,<br />

Juan Ramón Lara, Isabel Zamora<br />

<strong>Lisboa</strong>. Teatro do Bairro Alto/Cornucópia.<br />

Sáb., 2ª e 3ª, às 21h30. Dom., 11, às 17h00.<br />

A relação do teatro com o rito<br />

interessa especialmente a Ana<br />

Zamora. A encenadora e fundadora<br />

da companhia in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte<br />

espanhola Nao d’Amores apresenta<br />

“Dança da Morte/Dança <strong>de</strong> la<br />

Muerte”, uma produção conjunta<br />

com o Teatro da Cornucópia, on<strong>de</strong> a<br />

peça está <strong>de</strong>s<strong>de</strong> terça-feira e até dia<br />

13 <strong>de</strong> Julho. É uma das estreias na<br />

edição do Festival <strong>de</strong> Almada e o<br />

título bilingue tem razão <strong>de</strong> ser.<br />

Explica-se pela cultura comum<br />

ibérica encontrada na simbologia da<br />

Ida<strong>de</strong> Média e do início do<br />

Renascimento à volta dos ritos da<br />

morte, explica a encenadora.<br />

Neste olhar <strong>de</strong> frente o absurdo da<br />

morte, Ana Zamora vai procurar,<br />

como em peças anteriores, o lado<br />

ancestral da teatralida<strong>de</strong> e recriar o<br />

espírito <strong>de</strong> uma época. Através do<br />

estudo e da investigação das<br />

reminiscências que ficaram nas<br />

expressões artísticas e populares<br />

<strong>de</strong>sse tempo, Zamora tenta<br />

“enten<strong>de</strong>r o espírito medieval e<br />

renascentista e recriar uma visão<br />

contemporânea”. Mas nunca com a<br />

intenção <strong>de</strong> reproduzir a sua<br />

estética.<br />

O resultado: “Um teatro<br />

puramente contemporâneo, <strong>de</strong> hoje<br />

e para o público <strong>de</strong> hoje”, acrescenta<br />

a encenadora. Mas certo é que os<br />

textos, as danças com coreografia <strong>de</strong><br />

Javier Garcia Ávila e a música tocada<br />

com réplicas <strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong><br />

época (viola <strong>de</strong> gamba, fídula, mas<br />

também flauta, órgão e percussão)<br />

transportam o espectador para esse<br />

universo.<br />

Os textos <strong>de</strong> Gil Vicente e <strong>de</strong><br />

anónimos do século XV e XVI,<br />

associados ao texto castelhano<br />

“Dança General <strong>de</strong> la Muerte”<br />

(século XV) são interpretados em<br />

castelhano antigo e um pouco em<br />

português antigo.<br />

Todos — <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o mais po<strong>de</strong>roso,<br />

como o rei ou o Papa, ao<br />

representante mais humil<strong>de</strong> do povo<br />

— passam por ela, a morte, aqui<br />

personificada por uma só figura, o<br />

actor Luís Miguel Cintra. E encaramna,<br />

não como um problema pessoal,<br />

mas “como um eixo da<br />

humanida<strong>de</strong>”, diz Zamora. “Há um<br />

entendimento da morte como uma<br />

aceitação espiritual global.”<br />

Não há aceitação da morte; há<br />

celebração da vida. “É uma dança da<br />

morte mas também é, na verda<strong>de</strong>,<br />

uma dança da vida”, continua.<br />

A todos, se dirige a morte: “A<br />

vossa vida é sonhar / Que a morte é<br />

<strong>de</strong>spertar / Para nunca mais dormir<br />

e acordar.”<br />

As Danças Macabras eram uma<br />

forma popular <strong>de</strong> esconjurar o fim, o<br />

ciclo da vida. Assumiram uma<br />

expressão literária e plástica, na<br />

música, na dança, no folclore,<br />

sobretudo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 1347, quando a<br />

peste se instalou na Europa e, em<br />

dois anos, dizimou um terço da<br />

população. Havia dança um pouco<br />

por todo o continente europeu, mas<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

na Península Ibérica tinham “um<br />

carácter específico e diferente” pelas<br />

“influências muçulmanas e judaicas”.<br />

Na peça, que regressa ao palco da<br />

Cornucópia (entre 30 <strong>de</strong> Setembro a<br />

17 <strong>de</strong> Outubro), <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> uma<br />

passagem pelos festivais <strong>de</strong> teatro<br />

clássico <strong>de</strong> Almagro e <strong>de</strong> Olmedo,<br />

em Espanha, participam intérpretes<br />

<strong>de</strong> ambas as companhias (Luís<br />

Miguel Cintra, Sofia Marques, Elena<br />

Rayos, Eva Jornet, Juan Ramón Lara,<br />

Isabel Zamora). Alguns músicos são,<br />

ao mesmo tempo, actores. Todos, a<br />

dado momento, entram na dança ou<br />

no rito. O palco recria um espaço<br />

litúrgico, com a assistência disposta<br />

em bancos corridos como se <strong>de</strong> um<br />

coro <strong>de</strong> uma catedral se tratasse.<br />

Sobre o chão axadrezado — como o<br />

da Catedral <strong>de</strong> Segóvia —<br />

<strong>de</strong>senrolam-se os ritos populares e<br />

as danças históricas. Ainda hoje se<br />

faz a dança em cruz na Catalunha<br />

(Quinta-Feira Santa), numa das<br />

últimas reminiscências do que<br />

po<strong>de</strong>m ter sido as Danças da Morte<br />

na Europa.<br />

Este Portugal<br />

está nos cuidados<br />

intensivos<br />

O Dia <strong>de</strong> Todos os Pescadores<br />

De Francisco Luís Parreira.<br />

Co-produção Assédio e TNSJ.<br />

Encenação <strong>de</strong> João Cardoso. Com<br />

João Cardoso, Jorge Mota, Micaela<br />

Cardoso, Pedro Frias, Rosa Quiroga.<br />

Porto. Teatro Carlos Alberto. R. das Oliveiras, 43. De<br />

15 a 31/07. 4ª a Sáb. às 21h30. Dom. às 16h. 10€ a 15€.<br />

Num dia <strong>de</strong> eleições, Clara <strong>de</strong>siste<br />

do suicídio e <strong>de</strong>ci<strong>de</strong> ir votar. Movida<br />

por uma espécie <strong>de</strong> epifania matinal,<br />

vai visitar o ex-marido moribundo,<br />

Edmundo, internado nos cuidados<br />

intensivos <strong>de</strong> um hospital. É este<br />

ex-marido — agonizante mas capaz<br />

<strong>de</strong> maldizer tudo e todos — que veste<br />

a pele <strong>de</strong> um país inteiro em “O Dia<br />

<strong>de</strong> Todos os Pescadores”, que estreia<br />

no Teatro Carlos Alberto a 15 <strong>de</strong><br />

Julho.<br />

Edmundo, personagem<br />

interpretada pelo próprio<br />

encenador, João Cardoso, está numa<br />

cama articulada <strong>de</strong> hospital,<br />

acompanhado por uma enfermeira<br />

e, num momento fulcral da peça,<br />

pela ex-mulher. Clara tinha vonta<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> ver o ex-marido porque, na sala<br />

<strong>de</strong> voto <strong>de</strong> uma escola qualquer,<br />

ro<strong>de</strong>ada <strong>de</strong> pessoas e sons,<br />

reencontra o sentido do ser<br />

português e quer partilhá-lo com<br />

Edmundo, no único espaço <strong>de</strong><br />

re<strong>de</strong>nção que o texto permite.<br />

Edmundo que é, na verda<strong>de</strong>,<br />

Portugal, há muito <strong>de</strong>sistiu dos<br />

sonhos. Sozinho no quarto asséptico<br />

e <strong>de</strong>vidamente apetrechado <strong>de</strong><br />

materiais hospitalares, faz<br />

comentários corrosivos e<br />

apreciações sarcásticas da realida<strong>de</strong>.<br />

Divorciado há seis anos, não<br />

consegue apoiar-se nas experiências<br />

felizes que viveu durante o<br />

casamento com Clara.<br />

“O Dia...” é, segundo Rosa<br />

Quiroga, a actriz que dá corpo a<br />

Clara, uma “história nossa”,<br />

importante no “parco panorama da<br />

dramaturgia portuguesa”,<br />

acrescenta João Cardoso, para quem<br />

foi um “privilégio” po<strong>de</strong>r contar<br />

com o autor — o poeta e dramaturgo<br />

Francisco Luís Parreira — em todo o<br />

processo <strong>de</strong> criação.<br />

A colaboração do dramaturgo com<br />

a Assédio começou há cinco anos,<br />

quando o autor traduziu Ossário, um<br />

texto <strong>de</strong> Mark O’Rowe. Des<strong>de</strong> aí que a<br />

cumplicida<strong>de</strong> entre o elenco da<br />

companhia e o dramaturgo foi<br />

crescendo, razão pela qual João<br />

Cardoso consi<strong>de</strong>ra ter sido possível<br />

esta “espécie <strong>de</strong> encomenda” que<br />

teve em consi<strong>de</strong>ração os actores que<br />

por norma trabalham nesta formação<br />

teatral. “O Dia <strong>de</strong> Todos os<br />

Pescadores” marca o regresso da<br />

Assédio às comédias, cruzando,<br />

garante Rosa Quiroga, os registos<br />

PAULO RICCA<br />

“O Dia <strong>de</strong> Todos os<br />

Pescadores” marca o<br />

regresso da Assédio às<br />

comédias<br />

52 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


ESTRUTURA APOIADA POR<br />

APOIO<br />

Demarcy-Mota leva<br />

“Casimiro e Carolina”<br />

ao Festival <strong>de</strong> Almada<br />

“Cabaret Hamlet” ou a<br />

reinvenção dos clássicos<br />

“As Formigas”<br />

NUNO FERREIRA SANTOS<br />

Luís Miguel Cintra: “A<br />

leitura em voz alta po<strong>de</strong><br />

ajudar as pessoas a<br />

enten<strong>de</strong>r a poesia”<br />

poético, sarcástico e até farsante,<br />

reflexo da “cabeça <strong>de</strong> poeta e <strong>de</strong><br />

filósofo” do autor, que opta por<br />

comprometer-se com o mundo<br />

contemporâneo, satirizando a<br />

portugalida<strong>de</strong>. Ana Maria<br />

Henriques<br />

Amor e melancolia<br />

As 10 Canções <strong>de</strong> Camões<br />

De Luís <strong>de</strong> Camões.<br />

Com Luís Miguel Cintra.<br />

Almada. Fórum <strong>Municipal</strong> Romeu Correia. 4ª, 14,<br />

às 19h.<br />

Quando o director do Festival <strong>de</strong><br />

Almada, Joaquim Benite, pediu a<br />

Luís Miguel Cintra um recital <strong>de</strong><br />

poesia portuguesa para a edição<br />

<strong>de</strong>ste ano, o actor pensou que era<br />

altura <strong>de</strong> tentar ler em público não o<br />

mais fácil, mas o mais difícil.<br />

Escolheu “As 10 canções <strong>de</strong> Luís <strong>de</strong><br />

Camões”. Na verda<strong>de</strong>, voltou a elas<br />

porque em 1995, a propósito das<br />

Comemorações dos<br />

Descobrimentos, tinha já gravado<br />

um disco com as <strong>de</strong>z canções <strong>de</strong><br />

amor, que são também <strong>de</strong><br />

melancolia. Quis regressar a elas<br />

também para as enten<strong>de</strong>r um pouco<br />

melhor, com o público.<br />

A dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta poesia mais<br />

elaborada <strong>de</strong> Camões e dos seus<br />

versos mais longos é parte do que<br />

fascina o actor, assim como a<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conduzir o público<br />

na leitura: “A leitura em voz alta<br />

po<strong>de</strong> ajudar as pessoas a<br />

enten<strong>de</strong>rem-na e a segui-la”.<br />

Mais do que a corrente que<br />

procura uma biografia <strong>de</strong> Camões a<br />

partir dos seus poemas, o que<br />

interessa a Luís Miguel Cintra é<br />

“como através do trabalho das<br />

palavras, rimas, e ritmos, se cria um<br />

sentimento que se confun<strong>de</strong> com<br />

um pensamento sobre a própria<br />

natureza humana”, como “se o<br />

poeta estivesse a <strong>de</strong>finir o que é<br />

viver, o que é a efemerida<strong>de</strong> da<br />

vida”.<br />

As <strong>de</strong>z canções transformam-se<br />

“numa música melancólica”. Nelas,<br />

Camões dirige-se à amada. “Mas<br />

sempre numa perspectiva <strong>de</strong><br />

intelectualização da tensão erótica,<br />

que é dissecada sob diferentes<br />

formas em cada um dos poemas.”<br />

Mais ainda do que isso: “Aquilo que<br />

faz sofrer o poeta é a mesma coisa<br />

que lhe faz ter prazer na distância<br />

entre a i<strong>de</strong>ia e a concretização, nessa<br />

tensão nunca realizada do <strong>de</strong>sejo. E<br />

isso toca-me muito.” Para o actor,<br />

tudo se traduz num “estado <strong>de</strong> alma<br />

que tem a ver com a relação do ser<br />

humano com conceitos como a<br />

passagem do tempo ou a pequenez<br />

do individual perante a totalida<strong>de</strong><br />

do mundo, e numa melancolia<br />

muito típica da arte daquela época e<br />

da poesia maneirista”.<br />

Com a extinção da Comissão<br />

Nacional para os Descobrimentos, o<br />

disco das “10 Canções” gravado em<br />

1995 <strong>de</strong>ixou <strong>de</strong> estar disponível. O<br />

recital, esse, será único (dia 14, pelas<br />

19 horas no Fórum Romeu Correia,<br />

em Almada). A preparação, ou<br />

ensaio, é um exercício solitário. “É<br />

mais fácil recriar isto sozinho numa<br />

sala <strong>de</strong> gravação do que perante o<br />

público que espera uma exibição.”<br />

E não é <strong>de</strong> uma exibição que se<br />

trata. Luís Miguel Cintra lê poesia<br />

num processo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificação não<br />

da personagem, mas do autor.<br />

“Imagino que <strong>de</strong>ixo o público<br />

assistir ao que está a passar-se em<br />

mim.” Como no teatro. A.D.C.<br />

Agenda<br />

Estreiam<br />

27º Festival <strong>de</strong> Almada<br />

Letra M<br />

Em francês, legendado em português.<br />

Encenação: Fernando Mora Ramos.<br />

Com Johannes Von Saaz, João Vieira.<br />

Almada. Socieda<strong>de</strong> Filarmónica Incrível Alma<strong>de</strong>nse.<br />

R. Capitão Leitão,3. De 15/07 a 17/07. 5ª e 6ª às 19h.<br />

Sáb. às 16h. Tel.: 212750929. M/16.<br />

Um Precipício no Mar<br />

De Simon Stephens. Encenação: Jorge<br />

Silva Melo. Com João Meireles.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. R. Arco do Cego - Ed. da CGD. De<br />

15/07 a 18/07. 5ª às 19h30. 6ª e Sáb. às 19h30 e 23h.<br />

Dom. às 16h e 18h30. Tel.: 217905155.<br />

O Quarto (Escuro)<br />

Companhia: Athra e Compagnie.<br />

Encenação: Julie Binot. Com Béatrice<br />

Charon, Claire Fristot, Olivier Papot.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Inst. Franco-Português. Av. Luís Bívar, 91. De<br />

14/07 a 17/07. 4ª, 5ª, 6ª e Sáb. às 19h. Tel.: 213111400.<br />

Cabaret Hamlet<br />

Companhia: Théâtre Dijon-Bourgogne.<br />

Encenação: Matthias Langhoff. Com<br />

Agnès Dewitte, Anatole Koama,<br />

Charlie Nelson, Delphine Zingg,<br />

Emmanuelle Wion, François Chattot,<br />

Frédéric Kunze, Gilles Geenen, Jean-<br />

Marc Stehlé, Marc Barnaud, Osvaldo<br />

Caló, Patricia Pottier, Patrick<br />

Buoncristiani, Philippe Marteau.<br />

<strong>Lisboa</strong>. CCB. Pç. do Império. De 14/07 a 15/07. 4ª e 5ª<br />

às 19h. Tel.: 213612400. Em francês, legendado em<br />

português.<br />

Ver texto pág. 28 e segs.<br />

O<strong>de</strong> Marítima<br />

De Fernando Pessoa. Encenação:<br />

Clau<strong>de</strong> Régy. Com Jean-Quentin<br />

Châtelain.<br />

Almada. Teatro <strong>Municipal</strong>. Av. Professor Egas Moniz.<br />

De 14/07 a 16/07. 4ª, 5ª e 6ª às 21h30. Tel.:<br />

212739360.<br />

Se o Mundo Fosse Bom, o Dono<br />

Morava Nele<br />

De Ariano Suassuna (a partir <strong>de</strong>),<br />

Januário <strong>de</strong> Oliveira (a partir <strong>de</strong>), Gil<br />

Vicente (a partir <strong>de</strong>).<br />

Évora. Lg. <strong>de</strong> São Mame<strong>de</strong>. De 13/07 a 31/07. 3ª, 4ª,<br />

5ª, 6ª e Sáb. às 22h. Entrada livre.<br />

As Formigas<br />

De Boris Vian. Encenação: Rogério <strong>de</strong><br />

Carvalho. Com Dulce Baptista,<br />

Meirinho Men<strong>de</strong>s.<br />

Almada. Fórum <strong>Municipal</strong> Romeu Correia. Pç.<br />

Liberda<strong>de</strong>. Dia 11/07. Dom. às 19h. Tel.: 212724928.<br />

Um Jantar Muito Original<br />

De Fernando Pessoa (a partir <strong>de</strong>).<br />

Encenação: Alex. Riener. Com Anna<br />

Morawetz, Eva Pröglhöf, Flo<br />

Staffelmayr, Florian Tröbinger, Karola<br />

Nie<strong>de</strong>rhuber, Stefanie Philipps,<br />

Susanna Hohlrie<strong>de</strong>r. Em alemão,<br />

legendado em português.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Teatro Nacional D. Maria II. Pç. D. Pedro IV.<br />

Dia 11/07. Dom. às 21h30. Tel.: 213250835.<br />

Matar Shakespeare<br />

De Tatiana Frolova. Encenação: Tatiana<br />

Frolova. Com Elena Bessonova, Dmitri<br />

Botcharov, Vladimir Dmitriev.<br />

Almada. Fórum <strong>Municipal</strong> Romeu Correia. Pç.<br />

Liberda<strong>de</strong>. Dia 10/07. Sáb. às 19h. Tel.: 212724928.<br />

Almada. Teatro <strong>Municipal</strong>. Av. Professor Egas Moniz.<br />

Dia 10/07. Sáb. às 20h30. Tel.: 212739360.<br />

Casimiro e Carolina<br />

De Odon von Horvath. Encenação:<br />

Emmanuel Demarcy-Mota. Com Alain<br />

Libolt, Ana das Chagas, Céline<br />

Carrère, Charles-Roger Bour,<br />

Constance Luzzati, Cyril Anrep,<br />

Elodie Bouchez, Gaëlle Guillou,<br />

Gerald Maillet, Hugues Quester,<br />

Jauris Casanova, Olivier Le Borgne,<br />

Pascal Vuillemot, Sandra Faure,<br />

Sarah Karbasnikoff, Stéphane<br />

Krähenbühl, Thomas Durand, Walter<br />

N’Guyen.<br />

Porto. Teatro Nacional São João. Pç. Batalha. Dia<br />

10/07. Sáb. às 21h30. Tel.: 223401910.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Teatro Nacional D. Maria II. Pç. D. Pedro IV.<br />

De 15/07 a 16/07. 5ª e 6ª às 21h30. Tel.: 213250835.<br />

Ver texto pág. 28 e segs.<br />

Uma Família Portuguesa<br />

De Filomena Oliveira, Miguel Real.<br />

Encenação: Cristina Carvalhal. Com<br />

Bruno Simões, Carlos Malvarez, João<br />

Maria Pinto, Luísa Salgueiro, Teresa<br />

Faria.<br />

Almada. Palco Gran<strong>de</strong> - Escola D. António da Costa.<br />

Av. Professor Egas Moniz. Dia 10/07. Sáb. às 22h30.<br />

Tel.: 212745294.<br />

Era Uma Vez um Crocodilo Ver<strong>de</strong><br />

Encenação: Coralia Rodríguez. Com<br />

Coralia Rodríguez.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Casa América Latina. Av. 24 <strong>de</strong> Julho, 118-B.<br />

Dia 09/07. 6ª às 19h. Tel.: 213955309. Em espanhol.<br />

Porque na Noite Terrena Sou<br />

Mais Fiel que Um Cão<br />

De Joana Craveiro. Encenação: Joana<br />

Craveiro. Com Inês Rosado, Rosinda<br />

Costa, Tânia Guerreiro. Festival<br />

Trans_Sintra.<br />

Sintra. Casa <strong>de</strong> Teatro. R. Veiga da Cunha, 20. De<br />

10/07 a 10/10. Sáb. às 21h30. Tel.: 219233719.<br />

O Humor é Coisa Séria<br />

De Onésimo Teotónio <strong>de</strong> Almeida.<br />

Com Bruno Nogueira, Maria Rueff.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Teatro <strong>Municipal</strong> <strong>de</strong> S. Luiz. R. Antº Maria<br />

Cardoso, 38-58. Dia 10/07. Sáb. às 17h30. Tel.:<br />

213257650. Entrada livre.<br />

Romeu e Julieta XVI - XXI<br />

Encenação: São José Lapa, Inês Lapa<br />

Lopes. Com Carlos Zacarias, Carolina<br />

Curado, Eva Pereira, Felicida<strong>de</strong> Matias,<br />

. “Tom <strong>de</strong> Festa 20 anos a miscigenar culturas”<br />

. “Cerâmica”<br />

. “20 anos, 20 cartazes” exposição nas ruas <strong>de</strong> Ton<strong>de</strong>la<br />

. “Cenografias em público” espaços na cida<strong>de</strong><br />

. Líquen intervenção plástica <strong>de</strong> grafíti em Ton<strong>de</strong>la<br />

. Contadores <strong>de</strong> estórias<br />

. Vistacurta – festival <strong>de</strong> curtas <strong>de</strong> Viseu / parceria Ccv<br />

. Oficinas <strong>de</strong> Olaria e Raku / parceria Cearte<br />

. O Cubo<br />

. Restaurante Novo Ciclo / 3 Pipos / Bar Tom_<strong>de</strong>_Festa<br />

[Bilhetes 4 dias: 22,50€ / 17,50€]<br />

[Bilhetes/dia - 14 Jun: 1,00€ / 15, 16 e 17: 10,00€ / 7,50€]<br />

Filipa Lourenço, Francisco Pereira,<br />

Jesus Al<strong>de</strong>ia, Lúcia Sousa, Luís<br />

Pacheco, Rodolfo Neta, Sandra Neta<br />

Fernan<strong>de</strong>s, Sara Matos, Vanessa Silva,<br />

Luís Fernan<strong>de</strong>s.<br />

Azóia. Espaço das Aguncheiras. R. das Aguncheiras.<br />

De 10/07 a 11/07. Sáb. e Dom. às 18h. Tel.: 212682430.<br />

Santa Joana dos Matadouros<br />

De Bertold Brecht. Encenação:<br />

Gustavo Trestini.<br />

Coimbra. Oficina <strong>Municipal</strong> do Teatro. (Vale das<br />

Flores) R. Pedro Nunes. De 09/07 a 18/07. 2ª, 3ª, 4ª,<br />

5ª, 6ª e Sáb. às 21h30 (excepto a 11/007). Dom. às<br />

19h. Tel.: 239718238.<br />

Dança<br />

Estreiam<br />

Um pouco <strong>de</strong> ternura, gran<strong>de</strong><br />

merda!<br />

Companhia: Compagnie Dave St-<br />

Pierre. Coreografia: Dave St-Pierre.<br />

Almada. Palco Gran<strong>de</strong> - Escola D. António da Costa.<br />

Av. Professor Egas Moniz. Dia 13/07. 3ª às 22h. Tel.:<br />

212745294. 20€ (c/ <strong>de</strong>scontos). 27.º Festival <strong>de</strong> Teatro<br />

<strong>de</strong> Almada 2010.<br />

Insustentável Leveza<br />

Com ACTA - A Companhia <strong>de</strong> Teatro<br />

do Algarve. Coreografia: Carlos Matos.<br />

Cenografia: Annett Hunger.<br />

Bailarino:Wencke Kriemer, Marie<br />

Schmie<strong>de</strong>r, Igor Kirov, Marijana<br />

Savovska, Fábio Liberti. Com Afonso<br />

Dias (voz). Encenação: Annett Hunger.<br />

Portimão. Teatro <strong>Municipal</strong>. Lg. 1.º <strong>de</strong> Dezembro.<br />

Dia 10/07. Sáb. às 21h30. Tel.: 282402475. 10€<br />

(sujeito a <strong>de</strong>scontos).<br />

A Casa<br />

De Paulo Curado (música).<br />

Coreografia: Aldara Bizarro.<br />

Cenografia: Patrícia Colunas.<br />

Bailarino:Albana Hall, Constanza<br />

Givone. Encenação: Patrícia Colunas.<br />

Montijo. Cinema Teatro Joaquim D’Almeida. R.<br />

Joaquim D’Almeida. Dia 10/07. Sáb. às 21h30. Tel.:<br />

212327882. Entrada livre.<br />

ACERT Associação Cultural e Recreativa <strong>de</strong> Ton<strong>de</strong>la<br />

Rua Dr. Ricardo Mota; 3460-592 Ton<strong>de</strong>la<br />

Tel. geral: 232 814 400 / Bilheteira: 232 814 410 / www.acert.pt<br />

14 New Sketch / PT<br />

concerto especial para gravação <strong>de</strong> DVD<br />

15 Desbundixie / PT<br />

Samuel Úria / PT<br />

Fernando Alvim dj set / PT<br />

16 Kimi Djabaté / Guiné B<br />

Ska Cubano / Cuba<br />

Freddy Locks / PT<br />

17 Deambuloscopie / FR - teatro <strong>de</strong> rua<br />

Proyecto Entre Cuerdas / ES<br />

Festicultores / ES<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 53


Exposições<br />

RUI GAUDÊNCIO<br />

Este povo<br />

que nos<br />

<strong>de</strong>fine<br />

O centenário da República<br />

é pretexto para uma difícil<br />

mega-exposição sobre o<br />

tema do povo. Luísa Soares<br />

<strong>de</strong> Oliveira<br />

Povo - people<br />

LISBOA. Museu da Electricida<strong>de</strong>. Central Tejo. Av. <strong>de</strong><br />

Brasília. De dom. a 6ª, das 10h às 18h. Sáb., das 10h<br />

às 20. Até 19/09.<br />

mmmmn<br />

Uma exposição com 4 comissários e 288 obras<br />

Quatro comissários, 288 obras,<br />

maioritariamente portuguesas e<br />

algumas estrangeiras, quase seis<br />

<strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s<br />

emprestadoras: a exposição ‘Povo -<br />

people’, a <strong>de</strong>correr no Museu da<br />

Electricida<strong>de</strong>, tem as características<br />

<strong>de</strong> um gran<strong>de</strong> evento internacional,<br />

e partiu do ambicioso conceito <strong>de</strong><br />

reunir no mesmo espaço abordagens<br />

ao tema nas mais diversas<br />

disciplinas, artísticas ou não. Da<br />

pintura à escultura e à música, da<br />

instalação ao cinema documental<br />

(on<strong>de</strong> se incluem montagens das<br />

fascinantes actualida<strong>de</strong>s locutadas<br />

por António Lopes Ribeiro durante<br />

todo o Estado Novo), dos<br />

documentos históricos aos<br />

testemunhos sociais, abrangendo<br />

um leque temporal <strong>de</strong> mais <strong>de</strong> dois<br />

séculos, trata-se aqui <strong>de</strong> reunir na<br />

sala imponente do primeiro andar<br />

todo o tipo <strong>de</strong> materializações,<br />

criações artísticas e testemunhos<br />

que o povo pô<strong>de</strong> provocar.<br />

Dividida em nove núcleos, com<br />

títulos como “O povo é sereno”, “o<br />

povo é quem mais or<strong>de</strong>na”, “casas<br />

do povo”, “se isto não é o povo,<br />

on<strong>de</strong> é que está o povo” ou “povo,<br />

povo, eu te pertenço”, a exposição<br />

não faz distinção <strong>de</strong> épocas,<br />

agrupando as obras – que tanto<br />

po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong> Rui Sanches, Ama<strong>de</strong>o,<br />

Almada, Roquemont ou Álvaro<br />

Cunhal, como documentos <strong>de</strong><br />

i<strong>de</strong>ntificação digitalizados ou<br />

imagens documentais da habitação<br />

tradicional portuguesa, cartazes do<br />

25 <strong>de</strong> Abril ou caricaturas <strong>de</strong><br />

Bordalo Pinheiro – consoante se<br />

inserem num ou noutro tipo <strong>de</strong><br />

leitura. Por isso, encontramos aqui<br />

boa parte da melhor arte portuguesa<br />

mo<strong>de</strong>rna, mo<strong>de</strong>rnista e<br />

contemporânea. Aliás, segundo João<br />

Pinharanda (comissariado artístico),<br />

a i<strong>de</strong>ia da exposição construiu-se em<br />

torno do quadro “Cinco Artistas em<br />

Sintra”, o manifesto <strong>de</strong> Cristino da<br />

Silva em que os artistas românticos<br />

se representavam na charneca,<br />

tendo ao fundo o palácio do rei<br />

coleccionador, D. Fernando, e<br />

personagens do povo em atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

admiração embasbacada. O quadro<br />

colocava já uma das duas gran<strong>de</strong>s<br />

questões que esta exposição levanta:<br />

é que a criação artística pressupõe<br />

uma distância conceptual entre<br />

criador e objecto da criação. Dito <strong>de</strong><br />

outra forma, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />

das origens <strong>de</strong> cada artista, olhar<br />

para o povo, representá-lo ou<br />

apresentá-lo implica um estar <strong>de</strong><br />

fora que exclui a pertença. Rosa<br />

Ramalho, também representada na<br />

exposição, é a única excepção.<br />

A segunda questão <strong>de</strong>corre da<br />

primeira. Se o povo é o tema da<br />

exposição, será que a <strong>de</strong>finição que<br />

damos a esta palavra é exactamente<br />

a mesma há duzentos e tal anos?<br />

Neste espaço <strong>de</strong> tempo, que é por<br />

alto a distância que nos separa da<br />

Revolução Francesa, aconteceu<br />

Marx, que <strong>de</strong>finiu politicamente a<br />

palavra, aconteceu o Estado Novo,<br />

que a quis encerrar num espartilho<br />

bonito, aconteceu a guerra colonial,<br />

a primeira guerra igualitária que<br />

tivemos, e a Revolução <strong>de</strong> Abril, a<br />

<strong>de</strong>mocracia. A exposição intui-o,<br />

reproduzindo diversas <strong>de</strong>finições da<br />

palavra no jornal que faz <strong>de</strong><br />

catálogo. Mas afirmar “povo, povo,<br />

eu te pertenço”, enquanto se<br />

convidam todos os visitantes a<br />

<strong>de</strong>ixar a sua imagem num painel à<br />

entrada, coloca aqui um voto<br />

simpático <strong>de</strong> igualda<strong>de</strong> que uma<br />

discussão mais aprofundada, a fazer<br />

paralelamente à exposição, po<strong>de</strong>ria<br />

esclarecer.<br />

As obras contemporâneas mais<br />

interessantes são justamente aquelas<br />

que problematizam estas questões.<br />

Muita fotografia, <strong>de</strong> que<br />

<strong>de</strong>stacaremos as <strong>de</strong> Manuel Botelho<br />

pertencentes à série “Confi<strong>de</strong>ncial<br />

Desclassificado”, em que o artista<br />

se auto-representa como soldado na<br />

guerra colonial; a escultura “Vista<br />

Interior”, <strong>de</strong> Joana Vasconcelos –<br />

uma casinha <strong>de</strong> classe média-baixa<br />

pronta a usar; o busto da República<br />

<strong>de</strong> Rui Sanches; e sobretudo o<br />

diaporama do colectivo<br />

Kameraphoto, um retrato global<br />

<strong>de</strong>sse outro a que alguns chamam<br />

povo, com que alguns se<br />

i<strong>de</strong>ntificam, mas que é sempre<br />

fascinante, na estranheza que nos<br />

aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />

<strong>de</strong>volve ao olhar. É pena que não<br />

tenhamos a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ver, na<br />

Cinemateca ou noutro lugar, a visão<br />

dos cineastas que correspon<strong>de</strong> à<br />

<strong>de</strong>stes artistas.<br />

A vida intensificada<br />

Action cinema<br />

<strong>de</strong> Ken Jacobs<br />

VILA DO CONDE Galeria Solar - Galeria <strong>de</strong> Arte<br />

Cinemática. Rua do Lidador. Tel.: 252 646516. De 3ª<br />

a 6ª das 14h30 às 18h. Sáb. e Dom. das 10h às 12h30<br />

e das 14h30 às 18h. Até 12/09<br />

mmmnn<br />

“Em 1893, Warburg perguntando-se<br />

acerca da maneira como os artistas<br />

da Renascença italiana<br />

representaram o movimento,<br />

constata que eles são<br />

inelutavelmente levados à <strong>de</strong>scrição<br />

<strong>de</strong> uma aparência: os signos da<br />

mobilida<strong>de</strong> concentram-se na<br />

periferia das figuras, na <strong>de</strong>formação<br />

dos contornos e dos traços, a<br />

dilatação dos vestidos e dos cabelos,<br />

sem afectar a sua estrutura: a origem<br />

do movimento é relacionado com<br />

uma causa exterior que modifica<br />

provisoriamente a configuração do<br />

corpo mas não o afecta em<br />

profundida<strong>de</strong>”, escreve Philippe-<br />

Alain Michaud em “Aby Warburg e a<br />

imagem em movimento” (Macula,<br />

Paris, 1998).<br />

Emprestar uma nova vida às<br />

imagens: este é a proposta <strong>de</strong> Ken<br />

Jacobs nas obras que escolheu<br />

apresentar em “Action Cinema”,<br />

exposição que se <strong>de</strong>sdobra pelos<br />

vários espaços da galeria Solar. A<br />

mostra é quase exclusivamente<br />

formada por imagens apropriadas,<br />

com excepção <strong>de</strong> trabalhos on<strong>de</strong><br />

retrata instantes da vida quer em<br />

família, quer com os amigos, neste<br />

caso <strong>de</strong>stacando-se “Bob Fleischner<br />

dying”, um retrato <strong>de</strong>sta figura<br />

mítica do cinema “un<strong>de</strong>rground”<br />

nova-iorquino. O resgatar à morte <strong>de</strong><br />

um instante, projectando para o<br />

futuro flashes <strong>de</strong>sse tempo perdido,<br />

como apenas fosse possível esse<br />

<strong>de</strong>sígnio – porque o olhar está<br />

alienado pelo presente perpétuo<br />

on<strong>de</strong> se encontra –, é tarefa própria<br />

<strong>de</strong> um <strong>de</strong>miurgo: e Jacobs parece<br />

encarnar bem esse papel.<br />

Na exposição da Solar há imagens<br />

<strong>de</strong> água, fotografias estereográficas,<br />

velhos filmes: as imagens ganham<br />

espessura, <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong>, aproximamse<br />

<strong>de</strong> nós enquanto fantasmas <strong>de</strong><br />

uma outra época. A duração é<br />

esticada: um minuto filmado em<br />

1901 é agora projectado em câmara<br />

lenta, muito lenta mesmo: são mais<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>z minutos <strong>de</strong> dilatação<br />

temporal, para que os olhos vejam,<br />

contra o presente. Ken Jacobs é uma<br />

espécie <strong>de</strong> arqueólogo, um<br />

historiador à maneira <strong>de</strong> Warburg.<br />

Aquilo que lhe interessa é a noção <strong>de</strong><br />

“pathosformel”, que se po<strong>de</strong><br />

enten<strong>de</strong>r como “vida mimicamente<br />

intensificada”. Estamos no domínio<br />

das intensida<strong>de</strong>s que animam a<br />

história, o seu <strong>de</strong>senrolar “nãocronológico”,<br />

visível na repetição,<br />

em diferentes períodos ou<br />

contextos, <strong>de</strong> uma mesma “forma ou<br />

fórmula <strong>de</strong> estilo emocional”.<br />

Veja-se “What Happened on 23rd<br />

Street in 1901”: um filme em que<br />

Jacobs recorre à animação digital <strong>de</strong><br />

três dimensões para dar uma nova<br />

vida a um momento captado pela<br />

câmara <strong>de</strong> Edwin S.Porter,<br />

realizador da companhia <strong>de</strong><br />

produção <strong>de</strong> Thomas Edison. A<br />

película muda-se em digital para nos<br />

mostrar a persistência <strong>de</strong> uma<br />

mesma fórmula, a <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sejo,<br />

quer na imagem captada no início<br />

do século passado - a passagem <strong>de</strong><br />

uma mulher sobre uma grelha <strong>de</strong><br />

ventilação, que faz com que a sua<br />

saia se levante –, quer no célebre<br />

instante protagonizado por Marilyn<br />

Monroe, quer ainda na pintura<br />

rococó <strong>de</strong> Fragonard, “Les hazards<br />

heureux <strong>de</strong> ‘l’escarpolette’” (1767,<br />

Wallace Collection, London). Esta<br />

recorrência tem a sua origem em<br />

expressões gestuais que se po<strong>de</strong>m<br />

<strong>de</strong>tectar por exemplo na estatuária<br />

da Grécia antiga, nomeadamente<br />

nas representações da ninfa.<br />

É curioso ver como o filme do casal<br />

a passear na Rua 23 – e o respectivo<br />

acontecimento, o esvoaçar do vestido<br />

– foi anunciado no catálogo Edison:<br />

“Um êxito que irá certamente<br />

agradar”, no qual se po<strong>de</strong> observar<br />

“a saia <strong>de</strong> uma rapariga que é<br />

levantada a uma altura quase<br />

perversa, para seu horror e diversão<br />

dos ven<strong>de</strong>dores <strong>de</strong> jornais,<br />

engraxadores e transeuntes.” A<br />

vergonha da involuntária<br />

protagonista (será assim?) em<br />

confronto com o mundo transformase,<br />

mais tar<strong>de</strong>, em eficaz produção<br />

do “star system” (Marilyn): a ida<strong>de</strong> da<br />

inocência cinematográfica, com ecos<br />

na pintura <strong>de</strong> Fragonard, per<strong>de</strong>u-se<br />

com o advento <strong>de</strong> Hollywood e, mais<br />

tar<strong>de</strong>, com a expansão da indústria<br />

pornográfica. Ken Jacobs faz dois<br />

passos atrás e aproxima-nos <strong>de</strong> uma<br />

outra esfera, on<strong>de</strong> os afectos são<br />

aquilo que conta. É um trabalho<br />

político, pleno <strong>de</strong> humanida<strong>de</strong>,<br />

o seu.<br />

Apenas uma nota para a<br />

exposição, que, em termos formais,<br />

é excessivamente repetitiva: o<br />

recorrente uso <strong>de</strong> uma espécie <strong>de</strong><br />

efeito “strobe” para potenciar a<br />

ilusão do movimento chega a ser<br />

cansativo e corre o risco <strong>de</strong> retirar<br />

alguma vitalida<strong>de</strong> às imagens a que<br />

Jacobs quis dar uma sobrevida.<br />

54 • Sexta-feira 9 Julho 2010 • Ípsilon


Agenda<br />

Inauguram<br />

A Banda Desenhada e o Álbum<br />

Ilustrado<br />

De Natalie Leté, Worf Erlbruch,<br />

Nadia Bud<strong>de</strong>, Klaus Ensikat, Volker<br />

Pfüller, Rotraut Susanne Berner,<br />

Sophie Dutertre, Goele Dewanckel,<br />

Jockum Nordström, Martin Jarrie.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Goethe-Institut. Cp. Mártires Pátria, 37. Tel.:<br />

218824510. De 09/07 a 28/07. 2ª a 6ª das 10h às 20h.<br />

Banda Desenhada.<br />

Donnerstag e Outros Desenhos<br />

De Jorge Queiroz.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Chiado 8 - Arte Contemporânea. Largo do<br />

Chiado, 8 - Edifício Se<strong>de</strong> da Mundial-Confiança.<br />

Tel.: 213237335. De 09/07 a 17/09. 2ª a 6ª das 12h às<br />

20h. Inaugura 9/7 às 22h.<br />

Desenho, Outros.<br />

Escultura Abstracta Nas<br />

Décadas <strong>de</strong> 1960-70. Colecção<br />

Fundação <strong>de</strong> Serralves<br />

De Alfredo Queiroz Ribeiro, Ângelo<br />

<strong>de</strong> Sousa, Armando Alves, João<br />

Machado, Joaquim Vieira, Jorge<br />

Pinheiro, José Rodrigues, Zulmiro <strong>de</strong><br />

Carvalho.<br />

Albufeira. EMA - Espaço Multiusos. Antigo Lidl <strong>de</strong><br />

Albufeira. Tel.: 289599512. De 10/07 a 05/09. 2ª a<br />

Dom. das 16h às 23h.<br />

Escultura. Allgarve’10.<br />

Tailândia: Rostos e Paisagens<br />

<strong>Lisboa</strong>. Casino <strong>Lisboa</strong>. Alam. dos Oceanos Lote<br />

1.03.01 - Parque das Nações. Tel.: 218929070. De<br />

13/07 a 29/07. 6ª e Sáb. das 16h às 04h. 2ª a 5ª e<br />

Dom. das 15h às 03h.<br />

Fotografia.<br />

Continuam<br />

<strong>Marlene</strong><br />

<strong>Dumas</strong>:<br />

Contra o<br />

Muro<br />

De <strong>Marlene</strong><br />

<strong>Dumas</strong>.<br />

Porto. Museu <strong>de</strong><br />

Serralves. R. Dom<br />

João <strong>de</strong> Castro,<br />

210. Tel.:<br />

226156500. Até<br />

10/10. 2ª a 6ª das<br />

10h às 17h. Sáb.,<br />

Dom. e Feriados<br />

das 10h às 20h.<br />

Pintura.<br />

Ver texto págs.<br />

6 e segs.<br />

Sem Limites - Nadir Afonso<br />

De Nadir Afonso.<br />

<strong>Lisboa</strong>. MNAC - Museu do Chiado. R. Serpa Pinto, 4.<br />

Tel.: 213432148. Até 03/10. 3ª a Dom. das 10h às 18h.<br />

Pintura.<br />

Tudo O Que é Sólido Dissolve-Se no<br />

Ar: O Social na Colecção Berardo<br />

<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Praça do Império<br />

- Centro Cultural <strong>de</strong> Belém. Tel.: 213612878. Até<br />

12/09. Sáb. das 10h às 22h (última admissão às<br />

21h30). 2ª a 6ª e Dom. das 10h às 19h (última<br />

admissão às 18h30).<br />

Pintura, Outros.<br />

Mais Que a Vida<br />

De Vasco Araújo, Javier Téllez.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian.<br />

Avenida <strong>de</strong> Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até 06/09.<br />

3ª a Dom. das 10h às 18h.<br />

Ví<strong>de</strong>o, Fotografia, Instalação,<br />

Outros.<br />

Zao Wou-Ki<br />

<strong>Lisboa</strong>. Fundação Arpad Szenes - Vieira da Silva.<br />

Pç. das Amoreiras, 56/58. Tel.: 213880044. De<br />

24/06 a 26/09. 2ª, 4ª, 5ª, 6ª, Sáb. e Dom. das 10h<br />

às 18h.<br />

Pintura.<br />

Nasreen Mohamedi: Notas -<br />

Reflexões Sobre o Mo<strong>de</strong>rnismo<br />

Indiano<br />

De Nasreen Mohamedi.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Culturgest. R. Arco do Cego - Ed. da CGD.<br />

Tel.: 217905155. Até 29/08. 2ª, 4ª, 5ª e 6ª das 11h às<br />

19h (última admissão às 18h30). Sáb., Dom. e<br />

Feriados das 14h às 20h (última admissão às<br />

19h30).<br />

Pintura, Fotografia.<br />

Natureza Morta (Próximo<br />

Futuro Next Future)<br />

De Barrão.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Fundação e Museu Calouste Gulbenkian.<br />

Av. <strong>de</strong> Berna, 45A. Tel.: 217823700. Até 30/09.<br />

Programa Gulbenkian Próximo Futuro/Next<br />

Future.<br />

Instalação, Escultura.<br />

Arena<br />

De Carla Filipe, João Tengarrinha,<br />

Paulo Brighenti.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Fundação Carmona e Costa. Ed <strong>de</strong> Espanha<br />

- R. Soeiro Pereira Gomes L1 - 6º A/C/D. Tel.:<br />

217803003. De 06/07 a 16/10. 4ª a Sáb. das 15h às<br />

20h. Ciclo <strong>de</strong> Conversas: Filipa Oliveira 26/9 às 17h;<br />

José Carlos Pereira 2/10 às 17h; George Stolz 16/10 às<br />

17h.<br />

Desenho, Outros.<br />

Der Geist Unserer Zeit<br />

De Fernando Brito.<br />

Guimarães. CC Vila Flor. Av. D. Afonso Henriques,<br />

701. T. 253424700. Até 27/6. 3ª a sáb das 10h às<br />

12h30 e das 14h às 19h. Domingo e feriados das 14h<br />

às 19h.<br />

Escultura, Pintura, Outros.<br />

A Voz do Mar<br />

De Pancho Gue<strong>de</strong>s.<br />

Sagres. Fortaleza. Tel.: 282620140. De 03/07 a<br />

30/11. 2ª a Dom. das 09h30 às 20h. Allgarve’10.<br />

Instalação.<br />

René Bertholo<br />

Estói. Ruínas Romanas <strong>de</strong> Milreu. R. <strong>de</strong> Faro. Tel.:<br />

289997823. Até 29/09. 3ª a Dom. das 09h30 às 18h.<br />

Allgarve 2010.<br />

Azulejos.<br />

This Is My Condition<br />

Jack Pierson<br />

De Ryan McGinley, Ryan McNamara,<br />

Ryan Trecartin, Slater Bradley, Jack<br />

Pierson.<br />

<strong>Lisboa</strong>. Galeria Filomena Soares. R. da<br />

Manutenção, 80. Tel.: 218624122. Até 11/09. 3ª a<br />

Sáb. das 10h às 20h.<br />

Pintura, Ví<strong>de</strong>o, Instalação,<br />

Fotografia, Escultura, Outros.<br />

Pra Quem Mora Lá, O Céu é Lá -<br />

OSGEMEOS<br />

De Gustavo Pandolfo, Otávio<br />

Pandolfo (OSGEMEOS).<br />

<strong>Lisboa</strong>. Museu Colecção Berardo. Pç. do Império<br />

- CCB. Tel.: 213612878. Até 19/09. Sáb. das 10h às<br />

22h (última admissão às 21h30). 2ª a 6ª, Dom. e<br />

Feriados das 10h às 19h (última admissão às 18h30).<br />

Pintura, Outros.<br />

apresenta<br />

TRICOTA<br />

UM PROJECTO DE ELECTROTANGO DOS ARGENTINOS<br />

OTROS AIRES ONDE COEXISTE A TÍPICA ORQUESTRA ARGENTINA<br />

E A ACTUAL MÚSICA ELECTRÓNICA<br />

// 22 <strong>de</strong> Julho_ Concerto | 21h30<br />

// 20 e 21 <strong>de</strong> Julho_ Masterclasses | 12h30<br />

(saiba mais em www.bes.pt)<br />

/// ENTRADA LIVRE LIMITADA À LOTAÇÃO DA SALA<br />

// MORADA<br />

Praça Marquês <strong>de</strong> Pombal<br />

nº3, 1250-161 <strong>Lisboa</strong><br />

// TELEFONE<br />

21 359 73 58<br />

// HORÁRIO<br />

Segunda a Sexta<br />

das 9h às 21h<br />

// EMAIL<br />

besarte.financa@bes.pt<br />

Programação e produção<br />

Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 55

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!