Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa
Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa
Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Discos<br />
Pop<br />
Ninguém<br />
cala M.I.A.<br />
É o álbum mais contrastante<br />
da polémica cantora. Há<br />
canções dançantes e lúdicas,<br />
mas também momentos <strong>de</strong><br />
catarse claustrofóbica. Vítor<br />
Belanciano<br />
M.I.A.<br />
Maya<br />
XL Recordings, distri. PopStock<br />
mmmmn<br />
Des<strong>de</strong> que <strong>de</strong>u nas<br />
vistas, em 2005, o<br />
percurso <strong>de</strong> Maya<br />
Arulpragasam, ou<br />
seja, M.I.A., tem<br />
estado envolto em<br />
polémicas. Só nos últimos meses,<br />
foram os sucessivos problemas com<br />
o governo americano por causa do<br />
seu cartão <strong>de</strong> resi<strong>de</strong>nte; ameaças do<br />
governo do Sri Lanka para que não<br />
se meta em assuntos <strong>de</strong> Estado; um<br />
“vi<strong>de</strong>oclip” para “Born free”, que foi<br />
censurado pelo Google por causa do<br />
seu alegado conteúdo violento; ou<br />
uma troca <strong>de</strong> piropos hostil com o<br />
“New York Times” por causa <strong>de</strong> uma<br />
entrevista em que terá sido citada<br />
fora <strong>de</strong> contexto.<br />
No meio <strong>de</strong>ste ruído, é fácil<br />
esquecermo-nos da música. E no<br />
entanto, ao longo <strong>de</strong> dois álbuns<br />
(“Arular”, <strong>de</strong> 2005 e “Kala”, <strong>de</strong><br />
2007), M.I.A. conseguiu criar uma<br />
sonorida<strong>de</strong> nova feita <strong>de</strong><br />
sobreposições inesperadas num<br />
ambiente sincrético colorido. Foi<br />
uma das primeiras a perceber o<br />
potencial que existia em criar um<br />
vocabulário o pop a partir <strong>de</strong> algumas<br />
das linguagens gens urbanas emergentes,<br />
como o dubstep, baile funk, kuduro<br />
ou dancehall. all.<br />
“Maya” não contém,<br />
naturalmente, nte, o travo <strong>de</strong> novida<strong>de</strong><br />
dos seus antecessores, mas é mais<br />
arriscado e<br />
diverso. Como outros<br />
nomes marcantes da cultura<br />
pop<br />
actual, <strong>de</strong> James<br />
Murphy (LCD<br />
Soundsystem)<br />
M.I.A. cria um caldo<br />
pop a partir da mais<br />
estimulante música<br />
urbana da actualida<strong>de</strong><br />
Espaço<br />
Público<br />
Este espaço vai ser<br />
seu. Que filme, peça <strong>de</strong><br />
teatro, livro, exposição,<br />
disco, álbum, canção,<br />
concerto, DVD viu e<br />
gostou tanto que lhe<br />
apeteceu escrever<br />
aos Animal Collective, M.I.A. é<br />
alguém capaz <strong>de</strong> prenunciar o<br />
tempo, tornando-se representação<br />
<strong>de</strong>le em simultâneo. A faceta<br />
politizada, o controle sobre a<br />
imagem e a forma como utiliza as<br />
potencialida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> difusão da<br />
Internet fazem <strong>de</strong>la um ícone do<br />
nosso tempo, mas também um alvo<br />
fácil <strong>de</strong> críticas. E não será com este<br />
álbum que isso se <strong>de</strong>svanecerá.<br />
No primeiro tema, “The message”,<br />
faz questão <strong>de</strong> dizer <strong>de</strong> imediato ao<br />
que vem, abordando as facetas<br />
sombrias da Internet através <strong>de</strong> um<br />
som electronicamente saturado.<br />
Quase todas as características<br />
nucleares dos dois álbuns anteriores<br />
estão presentes no novo registo —<br />
misto <strong>de</strong> balanço digital, subgraves,<br />
batidas gordurosas, climas exóticos e<br />
electrónica encardida — embora os<br />
cenários sejam mais claustrofóbicos.<br />
Há convidados repetentes (Diplo e<br />
Switch), mas também novida<strong>de</strong>s,<br />
como Rusko, Derek E. Miller dos<br />
Sleigh Bells, Blaqstrarr e Igor<br />
Cavalera, dos Sepultura.<br />
Como nos anteriores álbuns, há<br />
uma canção assumidamente <strong>de</strong><br />
gosto duvidoso (“XXX0”), incursões<br />
pelo dancehall mais lúdico (“It takes<br />
a muscle” ou “It iz what it iz”),<br />
tentativas <strong>de</strong> repetir o sucesso <strong>de</strong><br />
“Paper planes” (“Tell me why”), mas<br />
os temas que acabam por marcar<br />
são aqueles on<strong>de</strong> aposta num som<br />
ruidoso, misto <strong>de</strong> electrónica<br />
musculada e <strong>de</strong>formação roqueira,<br />
como “Born free” — o tal do<br />
“vi<strong>de</strong>oclip” polémico, inspirado nos<br />
Suici<strong>de</strong> — “Steppin up” e,<br />
principalmente, “Meds and feds”,<br />
admirável catarse <strong>de</strong> agitação<br />
dançante para guitarra distorcida.<br />
O melhor do pós-punk dos anos<br />
80 aconteceu quando o rock<br />
encontrou nos sons físicos do funk,<br />
disco ou dub, a sua possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
recriação. M.I.A. tem aplicado os<br />
mesmos princípios, mas<br />
noutro contexto,<br />
criando um caldo<br />
pop a partir <strong>de</strong><br />
alguma da mais<br />
estimulante<br />
música física e<br />
urbana da<br />
actualida<strong>de</strong>.<br />
aMaumMedíocremmRazoávelmmmBommmmmMuito BommmmmmExcelente<br />
sobre ele, concordando<br />
ou não concordando<br />
com o que escrevemos?<br />
Envie-nos uma nota até<br />
500 caracteres para<br />
ipsilon@publico.pt. E<br />
nós <strong>de</strong>pois publicamos.<br />
Os Mi Ami fazem<br />
música on<strong>de</strong> tudo o que<br />
interessa é o ritmo<br />
Um violento<br />
ataque aos<br />
sentidos<br />
Álbum negro, canções<br />
que vergastam em vez <strong>de</strong><br />
acariciar, que distorcem em<br />
vez <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir. Mário Lopes<br />
Mi Ami<br />
Steal Your Face<br />
Thrill Jockey; distri. Mbari<br />
mmmmn<br />
Tudo é<br />
incrivelmente<br />
intenso, <strong>de</strong> forma<br />
extenuante, em<br />
“Steal Your Face”.<br />
A secção rítmica<br />
que se pren<strong>de</strong> num “groove” para<br />
não mais largar, as guitarras que<br />
expelem ruído em golfadas, a voz<br />
andrógina que berra e berra, entre a<br />
catarse e a paranóia, entre a<br />
excitação e a ironia nada discreta: “I<br />
want to dance with somebody / I<br />
wanna feel the heat with<br />
somebody”, ouve-se em “Latin<br />
lover”, para a qual nunca<br />
pensaríamos convocar a imagem da<br />
jovem Whitney Houston. Este<br />
pormenor, contudo, é importante<br />
para apreciar <strong>de</strong>vidamente o novo<br />
álbum dos Mi Ami.<br />
Aquilo que às primeiras audições<br />
soa a um violento ataque aos<br />
sentidos (que é), a uma orgia <strong>de</strong><br />
ruído que apenas os movimentos<br />
circulares da secção rítmica<br />
impe<strong>de</strong>m <strong>de</strong> resvalar para o caos,<br />
vai-se pouco a pouco revelando<br />
como algo mais. Álbum negro,<br />
iminentemente nocturno, “Steal<br />
Your Face” faz-se <strong>de</strong> divagação<br />
psicadélica e <strong>de</strong> choques eléctricos<br />
pós-punk. Sugere algo <strong>de</strong> dub na<br />
reverberação constante que o<br />
atravessa mas não <strong>de</strong>ixa qualquer<br />
espaço para serenida<strong>de</strong> —<br />
psica<strong>de</strong>lismo, certamente, mas nada<br />
<strong>de</strong> sonhos cósmicos <strong>de</strong> “hippies” <strong>de</strong><br />
olhos nas estrelas.<br />
Quando o vocalista Daniel Martin-<br />
McCormick canta “Is it cool? I get<br />
excited”, na supracitada “Latin<br />
lover”, não está a apelar a euforia<br />
dançante: este é o som <strong>de</strong> uma<br />
acusação e se dançamos<br />
furiosamente, é porque essa parece<br />
ser a única forma <strong>de</strong> resistir<br />
incólume a canções que vergastam<br />
em vez <strong>de</strong> acariciar, que distorcem<br />
em vez <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir, que se eximem a<br />
qualquer tipo <strong>de</strong> conforto. Mesmo<br />
“Dreamers”, com as suas guitarras<br />
estelares e os timbalões percutidos<br />
em ondulação, com a voz perdida<br />
entre os instrumentos, qual sussurro<br />
<strong>de</strong> “jam” opiácea, não mantém o<br />
tom encantatório muito tempo. A<br />
distorção há-<strong>de</strong> crescer até nada<br />
restar da placi<strong>de</strong>z anterior e a<br />
canção há-<strong>de</strong> encarrilar naquele que<br />
é o tom <strong>de</strong> “Steal Your Face”: música<br />
on<strong>de</strong> tudo o que interessa é o ritmo,