Marlene Dumas - Fonoteca Municipal de Lisboa
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nome<br />
ômbia<br />
Fundador e i<strong>de</strong>ólogo da editora<br />
cou na arte da dança. João Bonifácio<br />
ceptuando os tangos e os sambas dos<br />
países do costume). “Panama!” foi um<br />
sucesso tão gran<strong>de</strong> que, entretanto,<br />
já saíram “Panama! 2” e Panama! 3”,<br />
qual <strong>de</strong>les o melhor.<br />
A seguir veio “Colombia!”, outro<br />
estrondo <strong>de</strong> miscigenação musical.<br />
Seguiram-se várias compilações <strong>de</strong>dicadas<br />
à Nigéria (ao blues, ao highlife,<br />
ao disco local) e um disco inteiro<br />
só com temas do genial guitarrista Sir<br />
Victor Uwaifo, “Guitar-Boy Superstar<br />
1970-1976”. Destaque ainda para o<br />
fabuloso “Tumbelélé”, para “Palenque<br />
Palenque” e para as magistrais<br />
reedições do enorme Geraldo Pino.<br />
Isto, obviamente, é uma obra <strong>de</strong><br />
amor.<br />
“Não sei fazer mais nada”, dizia-nos<br />
Miles no seu jeito <strong>de</strong>sassombrado <strong>de</strong><br />
olhar o mundo. “O meu pai era melómano.<br />
Tornei-me DJ aos 14 anos,<br />
mas não fazia dinheiro nenhum. Isto<br />
é o que sempre me interessou: procurar<br />
discos. Investigo este tipo <strong>de</strong><br />
música <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os 17 anos. Mas mesmo<br />
em Londres, com todas as comunida<strong>de</strong>s<br />
africanas que lá existem, era difícil<br />
ter acesso a estes discos. Só se encontrava<br />
a ponta do icebergue. Na<br />
altura ouvia muito funk americano e<br />
hip-hop. Interessei-me por afrobeat<br />
e foi a partir daí que comecei a ouvir<br />
música africana.”<br />
Durante anos, tudo o que dizia respeito<br />
à SoundWay era feito por Miles.<br />
“Era eu que viajava, escolhia, encontrava<br />
pessoas <strong>de</strong>saparecidas há 35<br />
anos, fazia os contratos, colava as embalagens,<br />
enviava os discos.”<br />
De entre as múltiplas tarefas <strong>de</strong>correntes<br />
da sua função, uma é mais importante<br />
que as outras: escrever os<br />
textos. “Hoje, para ven<strong>de</strong>r os discos,<br />
é preciso oferecer mais que música.<br />
Os textos das nossas compilações são<br />
essenciais para explicar a história da<br />
música, das migrações, da colonização.”<br />
Andar atrás da música<br />
Apenas para que se perceba como<br />
esta indústria é pequena, conte-se a<br />
história que levou à feitura <strong>de</strong> “Panama!”.<br />
“Eu tinha encontrado uns discos<br />
no eBay e, mal os ouvi, comprei<br />
bilhetes <strong>de</strong> avião para ir lá. Depois,<br />
acabei por falar com o tipo a quem<br />
tinha comprado coisas no eBay, o Enrico,<br />
que morava na Costa Rica e me<br />
ajudou a procurar as coisas certas.”<br />
Tão simples quanto isto: um tipo que<br />
ele nunca tinha visto ajudou-o a encontrar<br />
os discos certos. “Não tenho<br />
dúvidas que não teria este sucesso<br />
sem a Internet”, conta.<br />
“Isto é um mercado muito pequeno,<br />
mas alguns <strong>de</strong>stes tipos que agora reeditamos<br />
eram gran<strong>de</strong>s estrelas antigamente.<br />
Alguns não acreditam que<br />
na melhor das hipóteses só ven<strong>de</strong>mos<br />
10 mil discos. Porque antes vendiam<br />
facilmente 100 mil. Claro que não estão<br />
cheios <strong>de</strong> dinheiro, porque em muitos<br />
casos foram enganados por produtores<br />
que só queriam o dinheiro.”<br />
O mais porreiro <strong>de</strong>stes anos a divulgar<br />
música “é que algumas faixas<br />
foram usadas em filmes ou sampladas<br />
por tipos do hip-hop em canções que<br />
acabaram vendidas em anúncios —<br />
tipos como Usher. Graças a ele, já pu<strong>de</strong><br />
entregar um cheque <strong>de</strong> 40 mil<br />
dólares a músicos que não faziam dinheiro<br />
há muitos anos”.<br />
O curioso é verificar como entretanto<br />
as coisas mudaram: “Voltei ao<br />
Gana há pouco tempo e os discos agora<br />
valem <strong>de</strong>z vezes mais na rua”. Sempre<br />
<strong>de</strong> pés na terra, Miles <strong>de</strong>sconfia<br />
que a febre actual com Ganas e Nigérias<br />
“não vai durar, como a febre com<br />
o reggae ou o funk não duraram”. E,<br />
sem vergonhas, diz que vai “ficar cansado<br />
disto”. “Não da música”, acrescenta,<br />
“mas <strong>de</strong> andar atrás <strong>de</strong>la”.<br />
Mas, ao menos, já <strong>de</strong>ixou um legado.<br />
“Em Inglaterra, a ‘world music’<br />
era o cúmulo do ‘uncool’. As pessoas<br />
pensavam em música <strong>de</strong> África e da<br />
América Latina como ‘world music’<br />
e eu mostrei-lhes que não era assim,<br />
mostrei-lhes que era música com a<br />
qual se podiam i<strong>de</strong>ntificar.”<br />
Os brancos “cool” agora po<strong>de</strong>m<br />
dançar ao som <strong>de</strong> pretos “uncool”<br />
que ninguém conhece. E isso só dá<br />
saú<strong>de</strong>.<br />
Ver crítica <strong>de</strong> discos pág. 34 e segs.<br />
Ípsilon • Sexta-feira 9 Julho 2010 • 27