Março 2009Revista <strong>Adusp</strong>Choques elétricos, afogamentos,palmatória,socos, espancamentos,empurrões, pau-dearara,cadeira do dragão,roleta russa. Deuma sucessão de suplícios comoesses se compunham os “interrogatórios”reservados por agentesdo DOI-CODI do II Exército, emSão Paulo, aos militantes ligados àimprensa do então clandestino PartidoComunista do Brasil (PCdoB),Maria Amélia de Almeida Teles eCésar Augusto Teles, presos naquele28 de dezembro de 1972. No diaseguinte, a polícia ainda invadiriasua casa e traria ao DOI-CODI osfilhos do casal, Janaína, de quatroanos, e Edson Luís, de cinco, juntocom a tia, Criméia Alice Schmidt deAlmeida, egressa da Guerrilha doAraguaia e, à época, grávida de oitomeses. Nos dias que se seguiram àsprisões, as crianças tiveram de veros pais com o corpo coberto de hematomasapós as sessões de tortura,38os rostos quase irreconhecíveis. Agravidez não deteve, tampouco, assevícias contra Criméia, torturadapor vezes ao lado da irmã.Naquele período, comandava oDOI-CODI, sigla que designa o infameDestacamento de Operaçõesde Informações do Centro de Operaçõesde Defesa Interna, o major CarlosAlberto Brilhante Ustra, o “MajorTibiriçá”, apontado nos relatos da famíliacomo pessoalmente responsávelpor alguns dos “interrogatórios”.Os Teles não foram os primeirosnem os últimos a sofrer os crimesperpetrados pela Ditadura militar,nem tampouco os únicos a acusarUstra de participar ativamente detorturas, seqüestros e morte de militantes.Contudo, passados 36 anos,sua história torna-se emblemática:foram os autores da ação judicial queculminou na primeira sentença judiciala declarar culpado por crimes detortura um agente do Estado.“É uma vitória da sociedade brasileira,pelo menos de todos os segmentosda sociedade que lutam porjustiça, por dignidade. É uma formade manifestar ‘chega de tortura’, dedizer que o Brasil que quer ser democráticonão pode conviver com atortura, sob pena de um retrocessohistórico”, avalia Maria Amélia, representanteda Comissão de Familiaresde Mortos e DesaparecidosPolíticos.A ação contra Ustra, impetradaem 2005, é de âmbito cível e teve caráterdeclaratório, o que afasta puniçãopenal ou de cunho financeiro.Proferida em 9 de outubro de 2008,pelo juiz Gustavo Santini Teodoro,a sentença afirma que “não é crívelque os presos ouvissem os gritos dostorturados, mas não o réu. Se não odolo, por condescendência criminosa,ficou caracterizada pelo menosa culpa, por omissão quanto à graveviolação dos direitos humanos fundamentaisdos autores César Augusto,Maria Amélia e Criméia”.Apesar de destacar com veemênciaa importância histórica da
Revista <strong>Adusp</strong>Coronel torturador Ustra discursa durante "desagravo", em 2008Luiz EduardoMerlino foi levadode casa por agentesdo DOI-CODI,restando à famíliaa promessa de que não tardariaa voltar. Não voltou.Torturado no pau-dearara,morreu quatrodias depoisFábio Motta/AEdecisão, e esperar que crie um precedentepara outras de igual teor,Maria Amélia rejeita o que chamade “judicialização” do tema. “Àsvezes vejo o pessoal do própriogoverno sugerindo que se entrecom ação. A questão dapunição, da responsabilização,eles jogam para a judicialização.O tratamento maisdireto e eficiente seria peloExecutivo”. Até porque, analisa,a via judicial reserva muitas dificuldades.“É preciso relacionar testemunhas,mostrar que é importantepoliticamente, historicamente. Eé doloroso para cada uma delas terque lembrar esses episódios, falardiante do juiz. O ônus recai todinhosobre nós, do ponto de vista pessoal,político, afetivo”, desabafa.Hoje coronel da reserva, CarlosAlberto Brilhante Ustra esteve àfrente da unidade paulista do DOI-CODI, o maior e mais importantedispositivo militar de combate àsorganizações de esquerda, entre setembrode 1970 e janeiro de 1974.Somente nesse período, estima-seque as práticas ilícitas na “casa dehorrores”, como ficou conhecido oórgão, tenham resultado na mortede mais de 50 pessoas e na torturade mais de 500. Em 1985, quandoatuava como adido militar no Uruguai,Ustra foi reconhecido pela entãodeputada Bete Mendes (PT-SP)Março 2009como seu algoz no período em queesteve presa, em 1970. O caso tevegrande repercussão na imprensa.Uma das muitas histórias que envolvemUstra remonta a 1971, e seencontra registrada no livro Direitoà Memória e à Verdade, publicadopela Secretaria Especial de DireitosHumanos (SEDH) da Presidênciada República. Na noite de 15 de julhodaquele mês, na cidade de Santos,três homens batiam à porta deIracema Rocha da Silva Merlino,perguntando por seu filho Luiz Eduardo.Diziam ser amigos dele.O jovem Luiz Eduardo, jornalistae estudante de história na USP,militava no clandestino PartidoOperário Comunista (POC), e poucosdias antes chegara da França,onde estivera com Ângela Mendesde Almeida, sua companheira,para estudar e fazer contatospolíticos. Quando acorreu àporta, os “amigos” já haviammudado de tom, a ponto deagredirem sua irmã, Regina.Luiz Eduardo foi levado pelosagentes, restando à famíliaa promessa de que não tardaria avoltar para casa.O jornalista foi levado à sede doDOI-CODI da Rua Tutóia, onde foitorturado seguidamente por 24 horas.Ao cabo da longa permanênciano pau-de-arara, sentia dores fortíssimasnas pernas — sinais da gangrenaque lhe tiraria a vida no dia19 de julho, quatro dias após suaprisão. Mas a versão forjada pelosmilitares foi de que o jovem morreuatropelado numa estrada ao tentarfugir quando era transportado aoRio Grande do Sul para identificarcompanheiros.39
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