Como observa a autora, a exclusão social é um termo relacional, isto é, cujadefinição de uma situação dada se dá em relação a outra. Assim, à exclusão noâmbito socio-familiar - fragilidade nos laços familiares, de amizade e vizinhança -opõe-se a inserção que os vínculos sóli<strong>do</strong>s com a família e as relações decompanheirismo oferecem na mobilização de “...apoios frente à situações delabilidade <strong>do</strong>s vínculos econômicos ou políticos”(op.cit.:142).No eixo econômico-ocupacional, à inserção estável e regular expressa pelobinômio assalariamento/proteção social, típica das sociedades de trabalho <strong>do</strong>spaíses centrais, corresponde uma situação de exclusão que é...mais <strong>do</strong> que ocupar uma posição marginalizada no processo deprodução e acumulação capitalista – e é a condição contemporâneade ser supérfluo e desnecessário. Entre uma situação e outra háinúmeras possibilidades de vulnerabilidade, precarização,instabilidade, irregularidade, desemprego recorrente, ocasional,cíclico, rendimentos decrescentes e informalidade (p.142).Assim, nessa esfera, o que confere a legitimidade e a dignidade <strong>do</strong> indivíduo é aexistência <strong>do</strong> trabalho, deven<strong>do</strong> ser analisada tanto a posição que o trabalha<strong>do</strong>rocupa na estratificação socio-econômica quanto na estratificação simbólica, ouseja a valorização social da sua função (p.143).Na esfera política (<strong>cidadania</strong>), analisa-se a “...formalização e a experiência <strong>do</strong>sdireitos, identifican<strong>do</strong> a amplitude de situações que são apreendidas e aigualdade no acesso e usufruto”(p.143). Integram, também este eixo, aspossibilidades existentes aos diversos grupos de fazerem representar seusinteresses e direitos na esfera pública, bem como a ação política. No la<strong>do</strong> opostoa esse espectro positivo que é a <strong>cidadania</strong> plena universal, estaria, então, ochama<strong>do</strong> “território da infra<strong>cidadania</strong>” onde estariam situa<strong>do</strong>s certos grupos, emgeral pobres, evidencian<strong>do</strong>-se a impossibilidade de instituição de regrasigualitárias de reciprocidade. Ao longo desse processo, observam-se situaçõesque revelam a existência de uma “<strong>cidadania</strong> fragmentada”, como por exemplo, ousufruto de alguns direitos a partir da mediação daqueles que detêm poder(clientelismo).68
Na dimensão cultural, as trajetórias de desvinculação podem levar à“...experiência de não encontrar nenhum estatuto e nenhum reconhecimento nasrepresentações sociais, ou só encontrá-los em negativo” (Escorel, 2000:144). Oscaminhos podem abarcar a indiferença, a discriminação, a estigmatização, o nãoreconhecimento,a negação da identidade ou identidade negativa, a naturalizaçãoe a banalização. Segun<strong>do</strong> Escorel, as reações à radical diferença <strong>do</strong> outro vão daacentuação de similitudes (relações de proximidade e igualdade) à acentuaçãodas diferenças (relações de distância e estranheza). A distância máxima éatingida ao recusar qualquer similitude – até a mais geral, a condição depertencimento à comunidade <strong>do</strong>s homens, proceden<strong>do</strong>-se, assim, àdesumanização <strong>do</strong> outro.Na dimensão da vida, analisam-se os fenômenos liga<strong>do</strong>s à saúde/<strong>do</strong>ença e àviolência. Entre uma vida saudável e longa e a morte encontram-se uma série defenômenos (as diferenças de expectativa de vida, gravidade de patologias,incidência ‘preferencial’ de causas de <strong>do</strong>enças e mortes em determina<strong>do</strong>s grupossociais, as iniquidades existentes quanto ao acesso a serviços de saúde comqualidade) que revelam “...tanto a distinção que há entre viver e sobreviver quantoo grau de dificuldades encontradas por uns e por outros para permaneceremvivos. Eis que surgem então pessoas que sobrevivem de teimosas” (p.145),revelan<strong>do</strong> sua forte determinação pessoal face à condições de vida precárias.Nascimento, aponta para a existência de uma geografia da exclusão social, emum duplo senti<strong>do</strong> espacial. Em primeiro lugar, porque há lugares em que ela seprocessa com maior nitidez e em um outro senti<strong>do</strong>, porque os excluí<strong>do</strong>s não têmlugar, “...vagabundeiam pelos interstícios das cidades ou entre cidades...”(2000:66).Como observa Escorel, assim como há diferentes trajetórias de vida quepermitem a vivência de experiências heterogêneas de exclusão, “...também hádiferenciações de configuração <strong>do</strong> fenômeno da exclusão segun<strong>do</strong> os contextossociais em que se desenvolvem”. Toman<strong>do</strong>-se a situação francesa comocontraponto, nota-se que a problemática contemporânea é a “precarização <strong>do</strong>69
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