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LEAL, Victor Nunes. Coronelismo Enxada e Voto

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sétima, do livro. No entanto, não quero terminar sem acrescentar razão adicional. Preencher os requisitos<br />

para ocupar a cátedra foi o motivo imediato do trabalho. Há na tese e, por sinal, em toda a obra e na<br />

vida pública de <strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong>, uma como metateoria, um valor mais alevantado, que vai expresso no<br />

título original, rebaixado, por razões editoriais, a subtítulo “O município e o regime representativo no<br />

Brasil”. Para além do coronelismo que, por sua denição, já era coisa do passado, havia a preocupação<br />

maior com a implantação no Brasil de um autêntico sistema representativo, isto é, da democracia<br />

política. Escrevendo ao nal do Estado Novo, quando renasciam as esperanças de avanços democráticos,<br />

<strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong> via no coronelismo muito mais do que um tema de pesquisa. Via nele um dos sintomas do<br />

falseamento da representação. O momento político lhe transmitia ainda otimismo em relação ao futuro<br />

da democracia, distanciando-o da maioria dos pensadores da década de 1930. Estes, ou não acreditavam<br />

na democracia, caso de defensores do Estado Novo como Francisco Campos, Azevedo Amaral, Oliveira<br />

Viana, ou eram céticos a seu respeito, como Sérgio Buarque de Holanda.<br />

<strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong>, embora tivesse sido funcionário do Estado Novo, também se afastou dos defensores<br />

do regime ao não colocar nas mãos do Estado a liderança de nosso processo de modernização. De acordo<br />

com suas premissas, o processo dependia da transformação do mundo rural, da urbanização, da<br />

libertação, pela educação e pela abertura do mercado de trabalho, da massa dos trabalhadores e<br />

pequenos proprietários rurais do domínio econômico e político dos coronéis. A democratização plena,<br />

podemos acrescentar hoje, só será alcançada quando estiver plenamente constituído um corpo de<br />

cidadãos independentes capaz de dirigir os governos pela representação. Longo caminho foi percorrido,<br />

mas o alvo ainda está longe de ser atingido, na medida em que a plenitude da cidadania ainda não<br />

chegou a todos os recantos e a toda a população do país. Enquanto isso não se vericar, os valores<br />

democráticos que informaram <strong>Coronelismo</strong> continuarão vivos a nos desaar com novas tarefas. <strong>Victor</strong><br />

<strong>Nunes</strong> mirava mais além que sair, analiticamente, do igarapé do município para o mar alto da vida<br />

nacional, mirava o mundo dos valores universais da liberdade e da democracia. Em 1969, pagou com a<br />

aposentadoria compulsória a fidelidade a esses valores.<br />

Como observou Orlando Carvalho, esse universalismo de <strong>Victor</strong> <strong>Nunes</strong>, por surpreendente que a<br />

armação possa parecer, seria um traço comum aos mineiros. É o que expressam os versos de um colega<br />

do autor de <strong>Coronelismo</strong> no Ministério da Educação, também mineiro de uma cidadezinha do interior:<br />

“Tenho apenas duas mãos/ e o sentimento do mundo”.<br />

Janeiro de 2012

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