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OPINIÃO<br />
<strong>Novembro</strong> 2017<br />
25<br />
Juízes trogloditas<br />
desculpam a moca<br />
Por J ú l i o<br />
Os juízes Neto de Moura e Maria Luísa<br />
Arantes, do Tribunal da Relação do Porto,<br />
chumbaram o recurso contra uma<br />
sentença do Tribunal de Felgueiras que<br />
punia apenas com pena suspensa dois<br />
criminosos que sequestraram e agrediram<br />
gravemente uma mulher na cabeça<br />
e no corpo com uma moca de pregos.<br />
Quando da agressão, a vítima estava separada<br />
há quatro meses de um deles, o<br />
marido, a quem fora infiel, e tinha sido<br />
amante do outro durante um mês, após<br />
o que o tinha deixado também. Meses<br />
volvidos, e depois de repetidas ameaças<br />
de morte tanto por parte do marido<br />
como do ex-amante, os dois homens<br />
encontraram-se e resolveram em conjunto<br />
sequestrar a mulher e agredi-la<br />
com uma moca de pregos. O Tribunal de<br />
Felgueiras condenou os dois homens a<br />
prisão, mas com pena suspensa.<br />
No acórdão que negou provimento ao<br />
recurso, os juízes da Relação do Porto<br />
escreveram nomeadamente o seguinte:<br />
“Este caso está longe de ter a gravidade<br />
com que, geralmente, se apresentam os<br />
casos de maus tratos no quadro da violência<br />
doméstica. Por outro lado, a conduta<br />
do arguido ocorreu num contexto de<br />
adultério praticado pela assistente. Ora,<br />
o adultério da mulher é um gravíssimo<br />
atentado à honra e dignidade do homem.<br />
Sociedades existem em que a mulher<br />
adúltera é alvo de lapidação até à morte.<br />
Na Bíblia, podemos ler que a mulher adúltera<br />
deve ser punida com a morte. Ainda<br />
não foi há muito tempo que a lei penal<br />
(Código Penal de 1886, artigo 372.º) punia<br />
com uma pena pouco mais que simbólica<br />
o homem que, achando sua mulher<br />
em adultério, nesse acto a matasse. Com<br />
estas referências pretende-se, apenas,<br />
acentuar que o adultério da mulher é uma<br />
conduta que a sociedade sempre condenou<br />
e condena fortemente (e são as mulheres<br />
honestas as primeiras a estigmatizar<br />
as adúlteras) e por isso vê com alguma<br />
compreensão a violência exercida pelo<br />
homem traído, vexado e humilhado pela<br />
mulher. Foi a deslealdade e a imoralidade<br />
sexual da assistente que fez o arguido X<br />
cair em profunda depressão e foi nesse<br />
estado depressivo e toldado pela revolta<br />
que praticou o acto de agressão, como<br />
bem se considerou na sentença recorrida.”<br />
(Pág. 19 do acórdão datado de 11 de<br />
Outubro de 2017, que se pode ler aqui<br />
http://bit.do/acordao).<br />
Isto passa-se em Portugal, não no Irão<br />
ou na Arábia Saudita, onde também se<br />
considera o adultério da mulher muito<br />
mais grave do que o do homem e onde<br />
“a sociedade” também “vê com alguma<br />
compreensão a violência exercida pelo<br />
homem traído”. A alusão dos juízes trogloditas<br />
à Bíblia também é curiosa, pois<br />
aludem veladamente ao Antigo Testamento<br />
e não ao Novo, onde a conversa<br />
é totalmente diferente, como é sabido<br />
(João 8, 1-11). E que dizer das saudades<br />
que os juízes do Porto têm do Código<br />
Penal de 1886? Será que também têm<br />
saudades das lapidações?<br />
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