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CRÓNICA<br />
<strong>Novembro</strong> 2017<br />
27<br />
A fogueira da sobrevivência<br />
ANTÓNIO M. RIBEIRO (UHF)<br />
SE EU FOSSE<br />
PM, NÃO USAVA<br />
A MINISTRA DO<br />
MAI COMO BODE<br />
EXPIATÓRIO, ISSO<br />
É O COSTUME<br />
QUE NADA<br />
ACRESCENTA.<br />
A imagem que ilustra esta reflexão pessoal pertence à edição do Público de ontem. Vale mais que mil palavras.<br />
Sou cada vez mais independente neste espectro político declarado. Não sou de esquerda, nem<br />
sou de direita, sou independente, pico o que acho justo; penso.<br />
Nestes tempos chamuscados, em que dezenas de pessoas morreram por tanta incúria, volto-<br />
-me para a ética da social-democracia nórdica, aquelas sociedades em que os eleitos visitam ao<br />
fim-de-semana o seu círculo eleitoral para ouvir os eleitores: os do governo vão de transporte<br />
público para os ministérios, ou de bicicleta, e nem sonham usufruir das viaturas que os impostos<br />
pagam para deslocações corriqueiras – ir para o trabalho. Aqueles deputados que partilham um<br />
apartamento na capital para tudo sair em conta, sem o devaneio da apropriação e do abuso.<br />
Se fosse governo o PSD que ganhou as últimas legislativas, Passos Coelho tinha sido fritado em<br />
azeite no seguimento da tragédia de Pedrógão. E ressuscitado no dia 15 de Outubro para voltar<br />
a ser queimado em auto de fé. Contudo.<br />
Ouvi as palavras do Presidente Marcelo. Finalmente. O capital social dos afectos – que enjoa<br />
alguns pensantes – iria servir um dia; serviu no dia 17 de Outubro. Em duas frases. Precisamos<br />
de ouvir um pedido de desculpa (às vítimas e à nação), e chegou o tempo da AR dizer se este<br />
governo tem condições para continuar a governar, disse.<br />
Se eu fosse PM, não usava a ministra do MAI como bode expiatório, isso é o costume que nada<br />
acrescenta.<br />
Se eu fosse PM interpretaria o coro da indignação da sociedade portuguesa e apresentava um<br />
pedido de demissão em bloco, propondo eleições antecipadas – esta AR não gera outra maioria.<br />
Voltava a candidatar-me e verifica se os portugueses confiavam em mim. Mas o BE e o PCP<br />
rejeitam este cenário, num momento de debilidade autárquica e proximidade ao poder.<br />
Se eu fosse PM aceitaria a avaliação dos portugueses nas urnas, aquém do arranjo parlamentar<br />
que ninguém antecipadamente votou.<br />
Coreografia e semântica triste à parte, no norte da Europa onde a social-democracia distribui riqueza<br />
e bem-estar, e por isso os migrantes a procuram abandonando o acolhimento português,<br />
qualquer político saberia tirar a devida lição do inferno que varreu Portugal, apesar do PIB, do<br />
sorriso do ministro das Finanças, do turismo que o terrorismo nos ofereceu e da nova bolha<br />
imobiliária. O serviço público exige ética e coragem, e a demissão em bloco seria um exemplo de<br />
nobreza política. Deixar aos portugueses (o povo) a escolha, a decisão democrática.