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Revista Curinga Edição 12

Revista Laboratorial do Curso de Graduação em Jornalismo da Universidade Federal de Ouro Preto.

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FOTO ARQUIVO PESSOAL<br />

Próxima edição<br />

Texto: Nuno Manna<br />

Foto: Marllon Bento<br />

Arte: Janine Reis<br />

Se tivesse aberto um Jornal do Brasil no dia 03 de abril de 1943,<br />

Zacarias teria encontrado uma legião de combatentes que se lançaram ao mar diante da<br />

invasão do inimigo, o falecimento de um eminente homem público, a contratação de um<br />

jogador por um time da primeira divisão, a condenação de um homem que aumentou indevidamente<br />

o preço do carvão, um cadáver que mesmo depois de quatro anos inhumado<br />

permanecia intacto, a Bolsa que seguia regular pela falta de negócios de grande vulto...<br />

Quando recorreu ao jornalismo, o pirotécnico urgia por informações que o orientassem pelo<br />

caminho entre a vida e a morte, mas nenhuma daquelas histórias solucionavam o paradoxo<br />

particular que lhe afligia. Ao sofrer um acidente fatal dias antes, não entendia como podia<br />

estar ainda de pé: “Em verdade morri, o que vem ao encontro da versão dos que crêem na<br />

minha morte. Por outro lado, também não estou morto, pois faço tudo o que antes fazia”.<br />

A ambiguidade fantástica do ocorrido clamava por uma explicação. Buscá-la nas narrativas<br />

jornalísticas pareceu-lhe, então, uma solução possível: “obrigava-me a buscar, ansioso,<br />

nos jornais, qualquer notícia que elucidasse o mistério que cercava o meu falecimento.”<br />

O conto O pirotécnico Zacarias de Murilo Rubião (escritor e jornalista) foi publicado pela<br />

primeira vez naquele 03 de abril. Nos noticiários do dia não haveria, de fato, a notícia sobre<br />

tal insólito incidente. Certamente se desenharia por ali um mapa sistematicamente organizado<br />

para guiar Zacarias e todos nós por uma realidade que é e que pode ser, composto nos<br />

devidos limites do possível e do dizível, com as instruções necessárias sobre as formas de<br />

viver e de morrer. No entanto, pelas narrativas jornalísticas encontramos inevitavelmente<br />

os caminhos obtusos pelos quais a sociedade percorre para narrar sua própria história e<br />

compreender a si mesma. Se por elas operamos nossa vontade de domínio sobre nosso<br />

destino e regulação de nossas lógicas, também percebemos sempre se constituir a quimera<br />

de uma sociedade normalizada e livre do caos. Mas aqui estaremos novamente, repetindo<br />

incessavelmente o ritual, tentando encontrar a nós mesmos pelas próximas edições.<br />

Nuno Manna, nosso autor convidado, é jornalista e doutorando em Comunicação<br />

pela UFMG, estudioso das ficções do mundo e no mundo. Autor do livro “A tessitura do fantástico:<br />

narrativa, saber moderno e as crises do homem sério” (Editora Intermeios, 2014).<br />

CURINGA | EDIÇÃO <strong>12</strong><br />

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