Matéria Prima 102 - Julho 2018 - web

— Sem dúvida, menina, ele só atende
por esse apelido e pelo mesmo é conhecido
na cidade inteira. Não se preocupe.
É com este epíteto que o profissional
é recebido e passa a verificar os
defeitos transmitidos pelo telefone e
fazer o orçamento necessário para a
prestação de seu trabalho.
— Você conhece a história do Garapa,
Picolé? - pergunto-lhe provocantemente.
Ante a negativa passo a contá-la. Como
o vigário proibira a garotada de chamar o
maluco pelo apelido, tramou-se uma maneira,
ante sua aproximação: três deles
estrategicamente escondidos, um numa
esquina da praça, outro atrás de um
poste e o terceiro detrás de uma árvore,
invisíveis, a gritar sucessivamente:
— Água! o primeiro; — Limão! o
segundo; — Açúcar! o último — ao
que o insultado, possesso, começava
a berrar desafiante:
— Mustura, cambada de fia da
puta! Mustura procês vê, laia de corno!
Vai, mustura, tropa de sacana!
Estava proposta a garapa e o nosso
Picolé, que não conhecia a velha brincadeira
interiorana pôs-se a rir desbragadamente.
Só depois que ele estabeleceu seu
preço e condições para a execução da
tarefa e se retirou, marcando o dia do
início, é que me veio à mente a feitura
de um picolé, uma verdadeira garapa e
das gulodices mais vendidas pelo
mundo a fora, ou seja, em vez de pedir
a mistura dos ingredientes sugeridos,
era só o apelidado, se insatisfeito, gritar
raivoso:
— Congela, cambada de filhos da
puta! Congela, para vocês verem, laia de
cornos! Vai, tropa de sacana, congela,
congela, congela...
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