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Ler e escrever na Educação Infantil: Análise de uma proposta curricular

Monografia apresentada para a obtenção do título de especialista em alfabetização Centro de Formação da Escola da Vila - São Paulo/SP

Monografia apresentada para a obtenção do título de especialista em alfabetização
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Centro <strong>de</strong> Formação da Escola da Vila<br />

Especialização em Alfabetização<br />

LER E ESCREVER NA EDUCAÇÃO INFANTIL:<br />

ANÁLISE DE UMA PROPOSTA CURRICULAR<br />

GIULIANNY RUSSO MARINHO<br />

SÃO PAULO<br />

2012


Centro <strong>de</strong> Formação da Escola da Vila<br />

Especialização em Alfabetização<br />

LER E ESCREVER NA EDUCAÇÃO INFANTIL:<br />

ANÁLISE DE UMA PROPOSTA CURRICULAR<br />

GIULIANNY RUSSO MARINHO<br />

Monografia <strong>de</strong> conclusão do curso<br />

<strong>de</strong><br />

Especialização em Alfabetização<br />

PROFA. ORIENTADORA: ANDRÉA LUIZE<br />

SÃO PAULO<br />

2012


Escola da Vila - Pós Graduação - Avaliação da Monografia<br />

Prezada Giulianny Russo Marinho<br />

As consi<strong>de</strong>rações sobre sua monografia intitulada “<strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> <strong>na</strong> educação infantil:<br />

análise <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> <strong>curricular</strong>”, feitas pela avaliação exter<strong>na</strong> apontam a extrema<br />

qualida<strong>de</strong> do trabalho fi<strong>na</strong>l, cuja nota é 10,0 (<strong>de</strong>z), conforme justifica o parecer que se<br />

segue.<br />

“O tema eleito é bastante relevante tendo em vista as comuns e recentes discussões sobre<br />

o papel alfabetizador da educação infantil. Os dois capítulos iniciais apresentam aspectos<br />

que fundamentam a análise posterior e ainda justificam a vertente tomada como referência:<br />

as práticas construtivistas <strong>de</strong> ensino inicial da leitura e da escrita. Também trazem<br />

importantes colocações sobre as características do <strong>de</strong>senvolvimento das crianças ao longo<br />

<strong>de</strong>ste segmento da escolarida<strong>de</strong> e sobre a história do próprio segmento.<br />

A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> a<strong>na</strong>lisar, minuciosamente, <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> <strong>curricular</strong> mostrou-se <strong>de</strong>safiadora, mas<br />

foi abarcada em sua totalida<strong>de</strong>: houve um cuidado em a<strong>na</strong>lisar não ape<strong>na</strong>s as situações<br />

didáticas ali presentes, mas também os conteúdos que as envolvem, algo feito à luz <strong>de</strong><br />

diferentes autores, pesquisadores <strong>de</strong> base e estudiosos da didática da língua.<br />

A conclusão apresenta corretamente a retomada das hipóteses e objetivos em confronto<br />

com a análise feita.<br />

O trabalho contém todas as partes necessárias a <strong>uma</strong> monografia. O texto apresenta<br />

linguagem formal, ajustada às <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> um texto acadêmico, inserção <strong>de</strong> citações e <strong>de</strong><br />

referências a<strong>de</strong>quadas às normas da ABNT.<br />

Pela qualida<strong>de</strong> do trabalho, recomenda-se a organização <strong>de</strong> artigos, a partir dos capítulos<br />

iniciais e <strong>de</strong> análise, que po<strong>de</strong>rá ser enviados para publicação em revistas especializadas em<br />

educação ou mesmo em educação infantil.”<br />

Cordialmente,<br />

Zélia Cavalcanti<br />

Coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção <strong>de</strong> Pós graduação<br />

5


Había u<strong>na</strong> vez un niño...<br />

que estava con un adulto...<br />

y el adulto tenía un libro...<br />

y el adulto leía.<br />

Y el niño, fasci<strong>na</strong>do, escuchaba<br />

cómo la lengua oral se hace<br />

lengua escrita.<br />

La fasci<strong>na</strong>ción <strong>de</strong>l lugar preciso<br />

don<strong>de</strong> lo conocido se hace<br />

<strong>de</strong>sconocido. El punto exacto<br />

para asumir<br />

el <strong>de</strong>safío <strong>de</strong> conocer y crecer.<br />

(FERREIRO, 2008, p. 64)


AGRADECIMENTOS<br />

Agra<strong>de</strong>ço a Andréa Luize, inicialmente, pela maneira cuidadosa e<br />

criteriosa com que orientou esse trabalho. Agra<strong>de</strong>ço também toda a<br />

orientação que, generosamente, me ofereceu anos antes <strong>de</strong> meu ingresso<br />

no curso <strong>de</strong> pós-graduação: escutando, compartilhando e legitimando<br />

minhas reflexões, discutindo, temperando e fomentando-as, indicando-me<br />

caminhos, livros e outras direções.<br />

Contudo, agra<strong>de</strong>ço-a intensamente pelo jeito sutil, carinhoso e<br />

acolhedor com que me contagiou com a sua paixão pelo universo<br />

maravilhoso da alfabetização. Minha eter<strong>na</strong> admiração.<br />

E, a<strong>de</strong>mais <strong>de</strong> toda sua importância em minha formação enquanto<br />

educadora, professora e alfabetizadora (!!), como se ainda não bastasse, me<br />

contemplou com sua amiza<strong>de</strong> e parceria.<br />

Meu muito, muito, muito obrigada.<br />

Não posso <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cer também, meu querido e eterno<br />

<strong>na</strong>morado, meu marido André Marinho. Sua paciência, seu incentivo, seu<br />

investimento e sua aposta foram (são e sempre serão) inestimáveis: sem<br />

eles eu não disporia do ânimo, da força vital, do ímpeto e da coragem<br />

necessária para me lançar <strong>na</strong> formação que acredito que todo educador<br />

<strong>de</strong>veria ter. Sem você, faltaria algo, per<strong>de</strong>ria o brilho. Você traz a<br />

serenida<strong>de</strong>, a paz e a tranquilida<strong>de</strong> emocio<strong>na</strong>l e me nutri <strong>de</strong> todo amor,<br />

carinho, amiza<strong>de</strong> e companheirismo para que eu siga: “Meu melhor amigo é<br />

o meu amor”.<br />

Meus pais, Julio e Edinei<strong>de</strong>, e irmãos Neto e Karol, que fazem parte da<br />

mais forte e fiel torcida! Vocês são o meu coração e minha vida.<br />

À Escola da Vila por ser tão inspiradora e exemplo <strong>de</strong> um trabalho<br />

consistente e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a formação pedagógica e educacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong><br />

seus alunos à formação profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> seus professores e funcionários, bem<br />

como dos <strong>de</strong>mais alunos do Centro <strong>de</strong> Formação.


SUMÁRIO<br />

INTRODUÇÃO 5<br />

CAPÍTULO I – CONSTRUTIVISMO E EDUCAÇÃO INFANTIL:<br />

HISTÓRICO, DEFINIÇÕES E FUNDAMENTOS. 9<br />

1.1 Construtivismo: pressupostos e alicerces 9<br />

1.1.1 O impacto <strong>na</strong> educação escolar 12<br />

1.2 Um pouco sobre a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 15<br />

1.2.1 A <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> no Brasil 16<br />

1.2.2 De que <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> estamos falando? 18<br />

1.2.3 Características da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 19<br />

1.2.4 O que ensi<strong>na</strong>r <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> – os conteúdos 22<br />

CAPÍTULO II - LER E ESCREVER NA EDUCAÇÃO INFANTIL: A QUEM E<br />

À QUÊ SE DESTINA 27<br />

2.1 O trabalho com Linguagem Oral e Escrita <strong>na</strong> perspectiva construtivista 27<br />

2.1.1 <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> - a alfabetização <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 31<br />

2.1.2 Propósitos e <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>Educação</strong> infantil alfabetizadora 33<br />

2.2 Re<strong>de</strong>finindo a questão 37<br />

CAPÍTULO III – ANÁLISE DE UMA PROPOSTA CURRICULAR PARA A<br />

FORMAÇÃO DE LEITURAS E ESCRITORES DESDE A EDUCAÇÃO<br />

INFANTIL 41<br />

3.1 A Escola da Vila 41<br />

3.1.1 Estrutura Curricular 43<br />

3.1.2 Organização Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem 44<br />

3.2 Gra<strong>de</strong> Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem 46<br />

3.2.1 Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário 46<br />

3.2.2 Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para 53<br />

3.2.3 Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar 61<br />

3.3. A transversalida<strong>de</strong> no currículo 65<br />

3.4 Sobre o fazer leitor/escritor: refletir sobre o sistema <strong>de</strong> escrita avançando<br />

rumo à leitura e à escrita convencio<strong>na</strong>l 68<br />

IV - ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 71<br />

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 79


Introdução<br />

Como comumente a aprendizagem da leitura e<br />

da escrita não tem sido sequer consi<strong>de</strong>rada <strong>na</strong><br />

educação infantil, o que existe é um total<br />

<strong>de</strong>sconhecimento do assunto. O resultado mais<br />

imediato é que os professores diante do evi<strong>de</strong>nte<br />

interesse <strong>de</strong>monstrado pelas crianças em querer<br />

apren<strong>de</strong>r a ler e <strong>escrever</strong> ficam sem saber o que<br />

fazer, e em muitos casos, acabam por reproduzir<br />

práticas <strong>de</strong> ensino a que eles próprios estiveram<br />

submetidos em suas experiências escolares, sem,<br />

no entanto, terem o conhecimento necessário<br />

para compreen<strong>de</strong>r as razões do que fazem e sem<br />

subsídio teórico algum para alicerçar suas<br />

práticas.<br />

(STEMMER, 2007, p. 136)<br />

Há muitos anos o tema da alfabetização ocupa o centro dos <strong>de</strong>bates<br />

educacio<strong>na</strong>is e cada vez mais a socieda<strong>de</strong> tem discutido e se indig<strong>na</strong>do com a<br />

qualida<strong>de</strong> do ensino no país. É justo afirmar, no entanto, que os investimentos<br />

políticos feitos nesta área limitam-se a remediar as consequências, não tratando<br />

dos problemas estruturais que as <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>iam. Em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong>ste pouco caso<br />

e da falta <strong>de</strong> comprometimento, alguns dos profissio<strong>na</strong>is da área se vêm à <strong>de</strong>riva<br />

<strong>de</strong> em um sistema que não os forma a<strong>de</strong>quadamente, não os remunera<br />

satisfatoriamente e tão pouco fornece a infraestrutura necessária para o trabalho.<br />

Como resultados <strong>de</strong>sse processo, muitos professores colocam-se à espera <strong>de</strong><br />

“lançamentos pedagógicos” que solucionem todos os seus problemas didáticos -<br />

professores que estão assujeitados <strong>de</strong> seu próprio processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong><br />

conhecimento, que aplicam acriticamente aquilo que julgam compreen<strong>de</strong>r sobre as<br />

pesquisas, <strong>proposta</strong>s, mo<strong>de</strong>los e novida<strong>de</strong>s educacio<strong>na</strong>is. Em outros casos,<br />

encontramos profissio<strong>na</strong>is comprometidos que buscam estruturar suas práticas<br />

docentes consi<strong>de</strong>rando as pesquisas teóricas e as didáticas, que tomam o aluno<br />

como sujeito do processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> conhecimentos. Tais profissio<strong>na</strong>is,<br />

porém, não encontram, por vezes, um ambiente <strong>de</strong> interlocução e tampouco um<br />

respaldo para refletir, avaliar e repensar as situações <strong>de</strong> ensino e suas<br />

intervenções.<br />

O mais grave é que estes modus operandi generalizaram-se em nossa<br />

socieda<strong>de</strong>, chegando mesmo a ser reconhecido como próprio da cultura escolar,<br />

tanto no âmbito público quanto no privado.<br />

5


Po<strong>de</strong>-se avaliar como alarmante, também, a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolas que são<br />

<strong>de</strong>finidas a partir <strong>de</strong> um suposto referencial teórico adotado, sem que, no entanto,<br />

haja preocupação com a coerência <strong>de</strong> suas práticas em relação a ele. Mais ainda,<br />

quando não se responsabilizam pelas diferentes “correntes” que seus professores<br />

adotam, quando estes o fazem – em <strong>uma</strong> mesma escola, é possível encontrar salas<br />

<strong>de</strong> aula com professores atuando a partir <strong>de</strong> concepções <strong>de</strong> ensino tão<br />

diferenciadas que até se colocam como divergentes. E, tendo em vista o percurso<br />

do aluno, este segue pelas diferentes séries sem que exista mínima coerência entre<br />

as <strong>proposta</strong>s pedagógicas ou mesmo entre a visão <strong>de</strong> aprendizagem dos vários<br />

professores com quem interage.<br />

Em relação ao trabalho com leitura e a escrita, po<strong>de</strong>m-se encontrar, n<strong>uma</strong><br />

mesma instituição <strong>de</strong> ensino, professores seguidores <strong>de</strong> cartilhas e <strong>de</strong> livros<br />

didáticos e outros que, <strong>de</strong> forma potente, levam, efetivamente, seus alunos a<br />

interagirem com situações comunicativas envolvendo textos que circulam no<br />

âmbito social. No caso da educação infantil, a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias e <strong>de</strong> fazeres<br />

didáticos permitem que alg<strong>uma</strong>s escolas sequer tenham a leitura e a escrita como<br />

elemento primordial do currículo. Por vezes, por julgarem não caber a esse<br />

segmento alfabetizar. Este argumento é totalmente legítimo quando visto em<br />

acordo com certa concepção do papel da educação infantil, do <strong>de</strong>senvolvimento e<br />

da aprendizagem. Contudo, a mesma criança que vivenciou este processo, ou seja,<br />

que pouco se aproximou dos atos <strong>de</strong> ler e <strong>de</strong> <strong>escrever</strong> no ambiente escolar, ao<br />

ingressar no segmento seguinte (fundamental I), encontra <strong>uma</strong> abordagem<br />

completamente diferente e tem o prazo <strong>de</strong> um ano para domi<strong>na</strong>r o sistema <strong>de</strong><br />

escrita convencio<strong>na</strong>l.<br />

A não consistência teórica é <strong>uma</strong> das marcas da educação escolar brasileira<br />

atualmente e, no contexto <strong>de</strong> escolas <strong>de</strong> educação infantil, esse problema parece<br />

tor<strong>na</strong>r-se ainda maior, pois há <strong>uma</strong> tendência a oportunizar pouca ou nenh<strong>uma</strong><br />

interação dos profissio<strong>na</strong>is com os estudos sobre as didáticas, distanciando-os da<br />

possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refletirem e <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>rem melhor o que significa alfabetizar.<br />

A presente monografia parte da inquietação da pesquisadora, com<br />

significativa experiência como professora <strong>de</strong>ste primeiro segmento da escolarida<strong>de</strong>,<br />

frente ao pouco comprometimento teórico e prático relacio<strong>na</strong>do, sobretudo, às<br />

questões que tangem ao processo <strong>de</strong> alfabetização inicial, junto a crianças <strong>de</strong> 3 a 6<br />

anos ida<strong>de</strong>, aproximadamente.<br />

6


O mote inspirador da pesquisa teve origem <strong>na</strong> crença, muito usual, <strong>de</strong> que<br />

um trabalho consistente, contínuo e permanente, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> linguagem,<br />

é incompatível com as necessida<strong>de</strong>s lúdicas da faixa etária e que privilegiar este<br />

aspecto implica negligenciar a brinca<strong>de</strong>ira, a arte e o movimento. Para<br />

compreen<strong>de</strong>r o que fundamenta esta afirmação e como ela se opõe à perspectiva<br />

construtivista <strong>de</strong> aprendizagem faz-se necessário <strong>uma</strong> retomada teórica que, a<br />

partir dos pressupostos construtivistas, permita a<strong>na</strong>lisar as características e<br />

objetivos da educação infantil e a própria concepção <strong>de</strong> alfabetização.<br />

Esta pesquisa busca, portanto, retomar as investigações sobre a concepção<br />

construtivista <strong>de</strong> aprendizagem, assim como traçar um breve panorama da<br />

educação infantil no Brasil e, por fim, abordar o papel e o compromisso<br />

alfabetizador que cabe a esse segmento, a partir <strong>de</strong> estudos da didática da língua e<br />

da análise do documento <strong>curricular</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino.<br />

O capítulo inicial traz alguns dos pressupostos bases do construtivismo e<br />

seus impactos <strong>na</strong> educação escolar em contraposição ao mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ensino tido<br />

como tradicio<strong>na</strong>l. Na sequência, para se enten<strong>de</strong>r alg<strong>uma</strong>s das fragilida<strong>de</strong>s<br />

encontradas nesse segmento, há <strong>uma</strong> breve retomada histórica <strong>de</strong> seu surgimento<br />

no Brasil e as implicações <strong>de</strong>correntes da mudança que ocorreu em sua <strong>na</strong>tureza, a<br />

partir da regulamentação da educação infantil.<br />

Ainda nesse capítulo, serão apresentadas as características e os objetivos do<br />

segmento tendo como base os Referenciais Curriculares Nacio<strong>na</strong>is - material<br />

produzido para instrumentalizar o professor - e, ainda, a discussão sobre a<br />

<strong>proposta</strong> <strong>de</strong> organização <strong>curricular</strong> e conteúdos para esta faixa etária, presentes<br />

nesse documento.<br />

No segundo capítulo, serão relacio<strong>na</strong>das as mudanças ocorridas <strong>na</strong> forma <strong>de</strong><br />

conceber a alfabetização quando se toma as práticas <strong>de</strong> linguagem como objeto a<br />

ser ensi<strong>na</strong>do. Neste sentido, serão discutidas as <strong>de</strong>finições e as potencialida<strong>de</strong>s do<br />

que consi<strong>de</strong>ramos ler e <strong>escrever</strong> e como a inserção <strong>de</strong>stas práticas <strong>na</strong> gra<strong>de</strong><br />

<strong>curricular</strong> diz respeito à forma como elas são concebidas, e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte das<br />

escolhas pedagógicas que são feitas <strong>na</strong> construção do currículo do segmento. Para<br />

tanto, será a<strong>na</strong>lisado, no terceiro capítulo, o documento <strong>curricular</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> escola<br />

privada, da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, consi<strong>de</strong>rando a gra<strong>de</strong> estabelecida.<br />

7


Concluo, por fim, a partir das análises realizadas à luz do referencial teórico<br />

que embasa o trabalho, refletindo sobre a crítica da escolarização da educação<br />

infantil e a sua generalização quando o que está em jogo não é somente o<br />

pressuposto teórico ou a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s, mas sobretudo a<br />

gestão do tempo didático e a qualida<strong>de</strong> das proposições e intervenções do<br />

professor.<br />

8


Capítulo I – Construtivismo e educação infantil: histórico,<br />

<strong>de</strong>finições e fundamentos.<br />

(...) existe um processo <strong>de</strong> aquisição da<br />

linguagem escrita que prece<strong>de</strong> e exce<strong>de</strong> os<br />

limites escolares.<br />

(FERREIRO, 2010, p. 45)<br />

1.1 Construtivismo: pressupostos e alicerces<br />

Como <strong>de</strong>stacado <strong>na</strong> introdução, a análise do papel da educação infantil em<br />

relação à formação <strong>de</strong> leitores e <strong>de</strong> escritores será pautada <strong>na</strong> concepção<br />

construtivista <strong>de</strong> aprendizagem. Por essa razão, cabe <strong>de</strong>stacar alguns dos<br />

pressupostos que norteiam esse modo <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r o papel do aprendiz em seu<br />

processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> conhecimentos, o que será foco neste capítulo.<br />

O construtivismo, como a própria palavra permite inferir, refere-se à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

construção, on<strong>de</strong> o ambiente, os sujeitos e as relações estão em constante<br />

transformação. Isso implica pressupor que <strong>na</strong>da está acabado, pronto. Jean Piaget<br />

(1973) foi um dos pesquisadores <strong>de</strong>dicados às questões sobre como ocorre a<br />

construção do conhecimento pelas crianças e os saberes produzidos a partir <strong>de</strong>ste<br />

estudo refletem-se, até hoje, <strong>na</strong>s diferentes áreas do saber.<br />

Este teórico concluiu, a partir <strong>de</strong> inúmeras pesquisas, que o conhecimento é<br />

produzido a partir das trocas entre o sujeito e o meio. O meio é, aqui, entendido<br />

tanto como o meio físico, social e cultural, como os objetos e <strong>de</strong>mais agentes que<br />

os compõem (PIAGET, 1971/1978). Essas trocas são intensas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o <strong>na</strong>scimento,<br />

mas ficam mais evi<strong>de</strong>ntes quando as interações <strong>de</strong> <strong>na</strong>tureza social começam a<br />

ocorrer, mais precisamente durante a primeira infância (entre dois a sete anos,<br />

aproximadamente), com o aparecimento da linguagem. Este é o exato período em<br />

que, em geral, a criança inicia sua escolarida<strong>de</strong>.<br />

9


As interações com o meio permitem ao sujeito, a partir das<br />

experiências e dos conhecimentos prévios 1 , reconstruir saberes e se apropriar <strong>de</strong><br />

novos. Os conhecimentos são experimentados, testados, generalizados, significados<br />

e ressignificados <strong>na</strong>s interações posteriores.<br />

Em outras palavras, o sujeito-aprendiz parte daquilo que já sabe e ao<br />

interagir com o outro - que tem conhecimentos diferentes - terá alg<strong>uma</strong>s <strong>de</strong> suas<br />

certezas <strong>de</strong>sestabilizadas, provocando um <strong>de</strong>sequilíbrio em sua estrutura inicial e,<br />

<strong>na</strong> tentativa <strong>de</strong> acomodar o novo conhecimento ao que ele já tem, produz novos<br />

saberes.<br />

É óbvio que um estímulo po<strong>de</strong> eliciar <strong>uma</strong> resposta somente se o<br />

organismo for anteriormente sensibilizado a este estímulo [...]<br />

Quando dizemos que um organismo ou sujeito é sensível a um<br />

estímulo e capaz <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a ele, está implícito que ele já possui<br />

um esquema ou estrutura à qual este estímulo é assimilado.<br />

(PIAGET, 1977, p.77)<br />

Em seu livro Seis estudos <strong>de</strong> Psicologia (1984), Piaget articula as i<strong>de</strong>ias<br />

apresentadas acima quando pressupõe certo funcio<strong>na</strong>mento das estruturas<br />

mentais, que se aplica <strong>na</strong>s diferentes aprendizagens, qual seja: que o meio<br />

representa um <strong>de</strong>safio, um enigma, sobre o qual a criança age, inicialmente <strong>de</strong><br />

maneira reflexa, mas que, pela repetição e incorporação <strong>de</strong> novos hábitos e<br />

percepções, vai dotando <strong>de</strong> intencio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> as suas ações ao observar as relações<br />

<strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>s. Desse movimento (repetição, imitação e exploração <strong>de</strong> outras<br />

possibilida<strong>de</strong>s) surge a linguagem, que aumenta quantitativa e qualitativamente a<br />

interação com o meio, fazendo com que este traga cada vez mais novos <strong>de</strong>safios,<br />

sobre os quais as crianças, a partir do que já sabem (conhecimentos prévios),<br />

incorporaram novos conhecimentos e construíram outros.<br />

Ainda <strong>de</strong> acordo com Piaget (1984), o que impulsio<strong>na</strong> o sujeito a atuar sobre<br />

o mundo, <strong>na</strong> tentativa <strong>de</strong> <strong>de</strong>svendá-lo é a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> equilibração: ele assimila<br />

aquilo que vem <strong>de</strong> fora e gera um <strong>de</strong>sconforto, porque não pertence às suas<br />

estruturas anteriores e, no esforço <strong>de</strong> livrar-se <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>sconforto, acomoda o que<br />

foi assimilado aos seus esquemas. Desse modo, apropria-se <strong>de</strong> maneira única <strong>de</strong><br />

1<br />

O termo “conhecimentos prévios”, alcunhado por Ausubel (1980), se refere aos saberes<br />

que os alunos dispõem e que serão <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ntes para as aprendizagens posteriores.<br />

Trata-se daquilo que Piaget (1972) chamou <strong>de</strong> estrutura mental do indivíduo e que será<br />

modificada à medida que incorporar outros conhecimentos a esta estrutura. Sendo esta,<br />

portanto, condições prévias para apren<strong>de</strong>r.<br />

10


um conhecimento inicialmente externo a ele. Macedo (1994) comparou este<br />

processo ao que ocorre quando jogamos <strong>uma</strong> pedra em um lago: as águas do lago<br />

estão paradas (o que representa as estruturas que o sujeito já construiu) e ao<br />

serem atingidas pela pedra (dado novo) produzem ondas em sua superfície, que se<br />

propagam até a pedra ter sido completamente acomodada ao solo do lago. A pedra<br />

não é mais a mesma <strong>de</strong> antes <strong>de</strong> ser lançada ao lago, nem o lago é o mesmo após<br />

ser atingido pela pedra.<br />

A partir <strong>de</strong>ssas i<strong>de</strong>ias apresentadas, po<strong>de</strong>-se inferir que a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<br />

criança realizar interações <strong>de</strong> diversas <strong>na</strong>turezas com sujeitos e objetos – <strong>na</strong>s quais<br />

possa expor suas i<strong>de</strong>ias, argumentar, experimentar, reformular etc. - é <strong>uma</strong><br />

característica estruturante e, portanto, fundamental, da construção do<br />

conhecimento.<br />

Vale <strong>de</strong>talhar o conceito <strong>de</strong> conhecimentos prévios, já mencio<strong>na</strong>dos<br />

anteriormente, dado ser um dos fundamentos do construtivismo. Nas palavras <strong>de</strong><br />

Piaget<br />

(...) para que um novo instrumento lógico se construa, é preciso<br />

sempre instrumentos lógicos prelimi<strong>na</strong>res; quer dizer que a<br />

construção <strong>de</strong> <strong>uma</strong> nova noção suporá sempre substratos,<br />

subestruturas anteriores e isso por regressões in<strong>de</strong>finidas. (PIAGET,<br />

1972, p. 20)<br />

(...) as relações entre o sujeito e o seu meio consistem n<strong>uma</strong><br />

interação radical, <strong>de</strong> modo tal que a consciência não começa pelo<br />

conhecimento dos objetos nem pelo da ativida<strong>de</strong> do sujeito, mas por<br />

um estado diferenciado; e é <strong>de</strong>sse estado que <strong>de</strong>rivam dois<br />

movimentos complementares, um <strong>de</strong> incorporação das coisas ao<br />

sujeito, o outro <strong>de</strong> acomodação às próprias coisas. (PIAGET, 1978, p.<br />

386)<br />

As i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> conhecimentos prévios, interação e, sobretudo, a do processo <strong>de</strong><br />

equilibração pressupõem um papel ativo do sujeito que apren<strong>de</strong>. Ao formular a<br />

teoria psicogenética, Piaget submeteu à comprovação prática a importância da<br />

ativida<strong>de</strong> mental construtiva dos sujeitos nos processos <strong>de</strong> aquisição do<br />

conhecimento – residindo neste aspecto a sua gran<strong>de</strong> contribuição para a<br />

concepção <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> aprendizagem. (COLL, 2004).<br />

Conceber a construção <strong>de</strong> conhecimentos <strong>de</strong>ste modo implica um novo olhar<br />

sobre a relação ensino e aprendizagem no âmbito escolar. Se as interações entre os<br />

11


sujeitos e entre estes e os objetos <strong>de</strong> conhecimento se constituem como<br />

fundamentais no processo <strong>de</strong> aprendizagem, a escola e o professor ganham novas<br />

funções e papéis. Em virtu<strong>de</strong> da importância, esse tema é mais bem discutido no<br />

tópico seguinte.<br />

1.1.1 O impacto <strong>na</strong> educação escolar<br />

Para se perceber o impacto que a concepção construtivista teve <strong>na</strong> educação,<br />

é necessário traçar, brevemente, os principais aspectos que marcam certa visão<br />

consi<strong>de</strong>rada mais tradicio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> ensino escolar. Importa salientar que não se tratará<br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição escolar, em especial, mas <strong>de</strong> um modo <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r o<br />

ensino, <strong>de</strong> certa visão <strong>de</strong> aluno e <strong>de</strong> professor, vigente antes do advento da<br />

concepção construtivista e que continua presente ainda hoje.<br />

A escola tradicio<strong>na</strong>l tem se apoiado tanto <strong>na</strong>s teorias i<strong>na</strong>tistas – <strong>de</strong> Platão<br />

(427-347 a.C.), <strong>de</strong> Kant (séc. XIV) e <strong>de</strong> Descartes (séc. XVI) -, que formulam que<br />

as pessoas <strong>na</strong>scem com <strong>uma</strong> bagagem <strong>de</strong> conhecimentos, <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong>s e, portanto, a tarefa do professor é ajudá-las a tor<strong>na</strong>r conscientes esses<br />

saberes adormecidos; quanto <strong>na</strong>s teorias empiristas – Aristóteles (384–322 a.C.) e<br />

<strong>de</strong> Locke, Hume e Bacon (séc. XVI - XVII) - para as quais todo o conhecimento está<br />

no mundo exterior e a criança é como <strong>uma</strong> “tabula rasa”, ou seja, não possui<br />

nenhum saber anterior, cabendo ao professor transmitir a ela os saberes do<br />

mundo, por meio da memorização. (BECKER, 2003).<br />

No caso do i<strong>na</strong>tismo, a aprendizagem <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> majoritariamente do aluno e<br />

do meio social, suas experiências e interações são dispensáveis neste processo.<br />

Vale ressaltar que esta noção foi rechaçada cientificamente, mas ainda é comum<br />

que educadores justifiquem o fracasso ou êxito escolar <strong>na</strong>s habilida<strong>de</strong>s individuais<br />

<strong>de</strong> aprendizagem. Já no empirismo, diametralmente aposto ao primeiro, o aluno é<br />

passivo em relação à sua aprendizagem; é um mero receptáculo do conteúdo<br />

transmitido pelo professor. Ele chega à escola e, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> sua<br />

bagagem <strong>de</strong> experiências e <strong>de</strong> seu interesse, supostamente incorporará o<br />

conhecimento mediante a memorização. Tor<strong>na</strong>ndo a aprendizagem um simples<br />

exercício, sem sentido, valor ou significado.<br />

12


Em ambos os casos, o conhecimento tem um caráter cumulativo e a<br />

capacida<strong>de</strong> do sujeito <strong>de</strong> armaze<strong>na</strong>r estas informações é o que o <strong>de</strong>fine como<br />

inteligente. À escola, por sua vez, cabe organizar os conteúdos dos mais simples<br />

aos mais complexos e <strong>de</strong>senvolver métodos que facilitam a memorização.<br />

Na perspectiva construtivista, o conhecimento não é inerente ao ser h<strong>uma</strong>no<br />

e tampouco ao meio, mas sim <strong>uma</strong> construção realizada pela ação do sujeito ao<br />

interagir com o meio.<br />

Cinqüenta 2 anos <strong>de</strong> experiências ensi<strong>na</strong>ram-nos que não existem<br />

conhecimentos resultantes <strong>de</strong> um simples registro <strong>de</strong> observações,<br />

sem <strong>uma</strong> estruturação <strong>de</strong>vida às ativida<strong>de</strong>s do indivíduo. Mas<br />

tampouco existem (no homem) estruturas cognitivas a priori ou<br />

i<strong>na</strong>tas: só o funcio<strong>na</strong>mento da inteligência é hereditário, e só gera<br />

estruturas mediante <strong>uma</strong> organização <strong>de</strong> ações sucessivas, exercidas<br />

sobre objetos. Daí resulta que <strong>uma</strong> epistemologia em conformida<strong>de</strong><br />

com os dados da psicogênese não po<strong>de</strong>ria ser empírica nem préformista,<br />

mas não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser um construtivismo, com a<br />

elaboração contínua <strong>de</strong> operações e <strong>de</strong> novas estruturas. (PIAGET<br />

apud MACEDO, 1994, p. 14).<br />

Ao afirmar que os sujeitos apren<strong>de</strong>m por meio da interação, que possuem<br />

conhecimentos anteriores e ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que são eles quem constroem<br />

seus próprios conhecimentos, Piaget contraria o que o ensino tradicio<strong>na</strong>l<br />

consi<strong>de</strong>rava caro a respeito do processo <strong>de</strong> aprendizagem, bem como o lugar<br />

ocupado pelo aprendiz.<br />

O conceito <strong>de</strong> “conhecimentos prévios” e sua importância para a construção<br />

<strong>de</strong> outros saberes por si só traz gran<strong>de</strong>s impactos, sobretudo, para a educação,<br />

porque implica assumir que a criança tem um papel fundamental em seu processo<br />

<strong>de</strong> aprendizagem. Ou seja, coloca a criança como sujeito cognoscente, ativo <strong>na</strong><br />

busca <strong>de</strong> conhecimento, que ao se <strong>de</strong>frontar com novas informações, objetos ou<br />

realida<strong>de</strong>s, assimila-as, confrontando-as com seus esquemas prévios, e então<br />

produz <strong>uma</strong> representação pessoal, diferente da que possuía antes e do que lhe<br />

tenha sido dado apriori.<br />

Decorre, portanto, que se o sujeito não possuir esquemas anteriores,<br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da informação que se relacione com este esquema não po<strong>de</strong>rá ser<br />

percebida, assimilada pela criança. Um exemplo, tomando a aprendizagem da<br />

escrita convencio<strong>na</strong>l é informar à criança que está começando a perceber a<br />

2<br />

Nas citações serão mantidas as grafias das palavras conforme constam no texto origi<strong>na</strong>l.<br />

13


correspondência sonora entre o que fala e a respectiva escrita - etapa bastante<br />

inicial do processo - sobre o uso do ‘x’ e do ‘ch’.<br />

Consi<strong>de</strong>rar e partir dos conceitos <strong>de</strong> conhecimentos prévios em todas as<br />

situações <strong>de</strong> aprendizagem e em todos os momentos <strong>de</strong>ste processo garante que o<br />

objeto a ser aprendido tenha ressonância e, portanto, escuta por parte do aluno. O<br />

novo conteúdo po<strong>de</strong>, então, ser incorporado às estruturas pré-existentes<br />

estabelecendo, assim, relações com o seu saber.<br />

Ausubel (apud MARTÍN e SOLÉ, 2004, p. 61) <strong>de</strong>fine esta aprendizagem como<br />

significativa:<br />

(...) aquela <strong>na</strong> qual a nova informação se relacio<strong>na</strong> <strong>de</strong> maneira<br />

significativa, isto é, não arbitrária, não ao pé da letra, com os<br />

conhecimentos que o aluno já tem, produzindo-se <strong>uma</strong><br />

transformação, tanto no conteúdo assimilado quanto <strong>na</strong>quele que o<br />

estudante já sabia.<br />

Dessa forma, o conhecimento adquirido é apropriado pelo aluno e lembrado<br />

por mais tempo, já que não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> armaze<strong>na</strong>mento <strong>de</strong><br />

informações aleatórias <strong>na</strong> memória. Além disso, favorece a disponibilida<strong>de</strong> do aluno<br />

para apren<strong>de</strong>r, bem como a aprendizagem <strong>de</strong> outros conteúdos, porque à medida<br />

que foi apropriado, passa a constituir o conjunto <strong>de</strong> conhecimentos <strong>de</strong>sse sujeito.<br />

Se, nesta perspectiva, o aluno apren<strong>de</strong> <strong>de</strong> um modo diferente do que se<br />

supunha até então, o trabalho do professor, consi<strong>de</strong>rado o <strong>de</strong>tentor do saber - e<br />

que o transmitia por expla<strong>na</strong>ções orais e exercícios - também muda. A partir da<br />

<strong>proposta</strong> construtivista, esse trabalho passa a consistir em favorecer amplas,<br />

sistemáticas, intencio<strong>na</strong>is e múltiplas interações com o objeto a ser aprendido e<br />

intervir <strong>de</strong> modo a oportunizar a criação <strong>de</strong> conflitos cognitivos para que o aluno<br />

possa confrontar o conteúdo já conhecido com os novos dados e, assim, reelaborar<br />

e ressignificar seus conhecimentos.<br />

As pesquisas <strong>de</strong> Piaget trouxeram gran<strong>de</strong>s contribuições ao que se concebia<br />

sobre o processo <strong>de</strong> aprendizagem. Contudo, outros autores, alguns <strong>de</strong>les<br />

contemporâneos <strong>de</strong> Piaget, <strong>de</strong>senvolveram i<strong>de</strong>ias e teorias que, hoje, também são<br />

tomadas como aporte para o construtivismo.<br />

14


Nesse sentido, Vygotsky (1999), referindo-se especificamente à<br />

aprendizagem escolar, aponta que para provocar o conflito cognitivo, o professor<br />

<strong>de</strong>ve promover situações que se localizem <strong>na</strong> zo<strong>na</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento proximal - o<br />

espaço entre o nível <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento real, isto é, aquilo que a criança é capaz<br />

<strong>de</strong> resolver sozinha, e o nível <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento potencial, o que a criança faz<br />

com colaboração <strong>de</strong> um adulto ou um companheiro.<br />

Segundo o autor (VYGOTSKY,1999, p.101), “(...) a noção <strong>de</strong> zo<strong>na</strong> <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento proximal capacita-nos a propor <strong>uma</strong> nova fórmula, a <strong>de</strong> que o<br />

“bom aprendizado” é somente aquele que se adianta ao <strong>de</strong>senvolvimento”.<br />

As crianças, em constante interação com o meio físico e social, precisam<br />

constantemente rever suas hipóteses e, neste sentido, a atuação do professor<br />

resi<strong>de</strong> em promover interações, em sala <strong>de</strong> aula, entre as crianças; entre elas e o<br />

objeto <strong>de</strong> conhecimento; com o próprio professor e assim possibilitando, com isso,<br />

que exerçam diferentes papéis sociais <strong>na</strong>s diversas relações. Estas intervenções<br />

têm o intuito <strong>de</strong> provocar a <strong>de</strong>sestabilização das i<strong>de</strong>ias iniciais ou gerar um conflito<br />

cognitivo, favorecendo assim as novas aprendizagens.<br />

Por essa razão, é imprescindível que o professor, além <strong>de</strong> domi<strong>na</strong>r o objeto a<br />

ser ensi<strong>na</strong>do e as didáticas específicas, reflita <strong>de</strong>talhadamente sobre o processo <strong>de</strong><br />

aprendizagem <strong>de</strong> cada criança, conheça o que cada um <strong>de</strong> seus alunos já construiu<br />

como saber e o que ainda precisa construir. A partir <strong>de</strong>sse conhecimento, po<strong>de</strong>rá<br />

então planejar e promover as diferentes situações didáticas.<br />

Ensi<strong>na</strong>r exige rigorosida<strong>de</strong> metódica. Ensi<strong>na</strong>r exige pesquisa. Ensi<strong>na</strong>r<br />

exige respeito aos saberes dos educandos. Ensi<strong>na</strong>r exige reflexão<br />

crítica sobre a prática. Ensi<strong>na</strong>r exige curiosida<strong>de</strong>. Ensi<strong>na</strong>r exige<br />

segurança, competência profissio<strong>na</strong>l e generosida<strong>de</strong>. Ensi<strong>na</strong>r exige<br />

compreen<strong>de</strong>r que a educação é <strong>uma</strong> forma <strong>de</strong> intervenção no<br />

mundo. (FREIRE, 2009, p.7-8).<br />

1.2 Um pouco sobre a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong><br />

Como este trabalho preten<strong>de</strong> discutir o papel <strong>de</strong>ste segmento no processo <strong>de</strong><br />

alfabetização inicial é importante <strong>de</strong>ixar claro qual visão <strong>de</strong> educação infantil será<br />

tomada como norte, evi<strong>de</strong>nciando o papel que este segmento da escolarida<strong>de</strong> tem<br />

<strong>na</strong> vida das crianças. Na parte que se segue, há <strong>uma</strong> breve retomada histórica que<br />

15


nos leva até o Referencial que subsidia e norteia o trabalho <strong>de</strong>senvolvido em<br />

escolas e creches.<br />

1.2.1 A <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> no Brasil<br />

Durante muitos séculos a educação da criança peque<strong>na</strong> era <strong>de</strong><br />

responsabilida<strong>de</strong> exclusiva da família. Com o ingresso da mulher no mercado <strong>de</strong><br />

trabalho, sobretudo, <strong>na</strong>s últimas décadas do século XX, o atendimento à criança <strong>de</strong><br />

0 a 6 anos passa a ser realizado em creches, <strong>de</strong> cunho filantrópico, que ofereciam<br />

alimentação, higiene e segurança aos filhos <strong>de</strong> operárias ou empregadas<br />

domésticas. As crianças das famílias mais abastadas permaneciam sob os cuidados<br />

<strong>de</strong> babás.<br />

No processo <strong>de</strong> industrialização do Brasil, a partir da década <strong>de</strong> 30, com o<br />

aumento da <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra femini<strong>na</strong>, os movimentos operários –<br />

li<strong>de</strong>rados, sobretudo, por imigrantes europeus - ganham força e passam a<br />

reivindicar os direitos trabalhistas, <strong>de</strong>ntre eles, a criação <strong>de</strong> instituições que<br />

cuidassem <strong>de</strong> seus filhos durante a sua jor<strong>na</strong>da <strong>de</strong> trabalho.<br />

Com a expansão da oferta <strong>de</strong> trabalho e da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> renda, a<br />

<strong>de</strong>manda por serviços <strong>de</strong> instituições <strong>de</strong> atendimento à criança aumentou em todo<br />

país: as <strong>de</strong> cunho público, com objetivo <strong>de</strong> suprir as carências essenciais, e as<br />

privadas, com ênfase à socialização e a preparação para a educação obrigatória<br />

(KRAMER, 1995).<br />

Observou-se então que crianças oriundas da classe baixa, ao ingressarem no<br />

ensino regular público, em pouco tempo fracassavam e abando<strong>na</strong>vam a escola.<br />

Com objetivo <strong>de</strong> suprir certas carências culturais e ensi<strong>na</strong>r conteúdos que,<br />

supostamente, seriam requisitos para aprendizagens no nível seguinte, surgiu a<br />

educação “pré-escolar”, dos 4 a 6 anos.<br />

Contudo, essa pré-escola não era regulamentada, não possuía caráter formal<br />

e tampouco contava com profissio<strong>na</strong>is habilitados, sendo sua mão <strong>de</strong> obra<br />

constituída, principalmente, por voluntários. (KRAMER, 1995)<br />

Ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 80, pela mobilização da socieda<strong>de</strong> civil e <strong>de</strong> órgãos<br />

não-gover<strong>na</strong>mentais, a educação para crianças <strong>de</strong> 0 a 6 anos passou a ser<br />

16


consi<strong>de</strong>rada um <strong>de</strong>ver do Estado e um direito da criança, garantidos pela<br />

Constituição <strong>de</strong> 1988. A partir <strong>de</strong>ste momento, as creches, que até então<br />

prestavam um serviço assistencial, passam a ser também, responsáveis por certo<br />

trabalho educacio<strong>na</strong>l.<br />

Nos anos seguintes, <strong>uma</strong> série <strong>de</strong> pesquisas, leis e estatutos foram<br />

publicados 3 com a intenção <strong>de</strong> subsidiar o trabalho neste segmento:<br />

• 1990 – aprovado o Estatuto da Criança e do Adolescente -, que os assegura<br />

direitos fundamentais: “[...] <strong>de</strong>senvolvimento físico, mental, moral, espiritual<br />

e social, em condições <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> e dignida<strong>de</strong>” (BRASIL, 1990).<br />

• 1994 a 1996 – são publicados pelo Ministério da <strong>Educação</strong> (MEC) diversos<br />

documentos intitulados “Política Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>”, “Critérios<br />

para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das<br />

crianças”, “Por <strong>uma</strong> política <strong>de</strong> formação do profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> educação<br />

infantil”, “<strong>Educação</strong> infantil: bibliografia anotada” e “Propostas pedagógicas e<br />

currículo em educação infantil”.<br />

• 1996 – Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da <strong>Educação</strong> Nacio<strong>na</strong>l (LDB): trata dos<br />

diferentes segmentos e inclui a educação infantil como primeira etapa da<br />

<strong>Educação</strong> Básica. Essa Lei <strong>de</strong>fine que a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> da educação infantil é<br />

promover o <strong>de</strong>senvolvimento integral da criança até 6 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>,<br />

complementando a ação da família e da comunida<strong>de</strong> (BRASIL, 1996).<br />

• 1998 - O MEC publica os documentos “Subsídios para o cre<strong>de</strong>nciamento e o<br />

funcio<strong>na</strong>mento das instituições <strong>de</strong> educação infantil” e o “Referencial<br />

Curricular Nacio<strong>na</strong>l para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>”.<br />

• 1998 e 1999 – O Conselho Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> <strong>Educação</strong> aprova as “Diretrizes<br />

Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>” e as “Diretrizes Curriculares<br />

para a Formação <strong>de</strong> Professores da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> e Anos Iniciais do<br />

Ensino Fundamental”<br />

• 2011 – aprovado o Plano Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> <strong>Educação</strong> (PNE), que estabelece metas<br />

para todos os níveis <strong>de</strong> ensino.<br />

3<br />

Documentos citados estão listados em REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, no fi<strong>na</strong>l <strong>de</strong>ste<br />

trabalho.<br />

17


Ao regulamentar a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, estabelecendo metas, objetivos e<br />

<strong>proposta</strong>s educativas o Ministério da <strong>Educação</strong> teve que, necessariamente, adotar<br />

<strong>uma</strong> concepção <strong>de</strong> criança, <strong>de</strong> educação, <strong>de</strong> cuidado e <strong>de</strong> aprendizagem. Estes<br />

conceitos são apresentados e justificados, à luz da perspectiva construtivista, nos<br />

diversos documentos anteriormente citados, bem como o volume 1 do Referencial<br />

Curricular Nacio<strong>na</strong>l para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL, 1998, v1).<br />

A origem da educação infantil no Brasil, que esteve atrelada por muito tempo<br />

a um histórico <strong>de</strong> assistencialismo, apresenta agora <strong>uma</strong> organização, <strong>uma</strong><br />

estrutura e um currículo específico, do qual nos aproximaremos a seguir.<br />

1.2.2 De que <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> estamos falando?<br />

A mudança do papel social <strong>de</strong>senvolvido pelas instituições <strong>de</strong> educação<br />

infantil trouxe<br />

(...) um consenso sobre a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que a educação para as<br />

crianças peque<strong>na</strong>s <strong>de</strong>va promover a integração entre os aspectos<br />

físicos, emocio<strong>na</strong>is, afetivos, cognitivos e sociais da criança,<br />

consi<strong>de</strong>rando que esta é um ser complexo e indivisível. (BRASIL,<br />

1998, v.1, p.17)<br />

Contudo, há diferentes modos <strong>de</strong> conceber o trabalho com cada um <strong>de</strong>sses<br />

aspectos, e <strong>de</strong>finir qual a perspectiva e a concepção a serem adotadas é<br />

fundamental para a elaboração <strong>de</strong> <strong>proposta</strong>s educativas consistentes.<br />

Ou seja, para propor um currículo para a educação infantil é importante ter a<br />

clareza <strong>de</strong> qual criança se está a tratar: a carente, a frágil, a passiva e a<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte ou um sujeito ativo que cria e busca soluções e respostas para<br />

enten<strong>de</strong>r e lidar com o mundo em que está inserido?<br />

Esta monografia, assim como o Referencial Curricular Nacio<strong>na</strong>l para a<br />

<strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 4 , partirá <strong>de</strong>sta última concepção <strong>de</strong> criança, que é a mesma<br />

concebida por Piaget, um sujeito ativo <strong>na</strong> busca do conhecimento, que <strong>de</strong>sempenha<br />

um intenso trabalho no processo <strong>de</strong> apropriação do mesmo.<br />

4<br />

A partir <strong>de</strong>ste ponto do texto, se fará referência a este documento por meio <strong>de</strong> sua sigla:<br />

RCN<br />

18


(...) um sujeito social e histórico (que) faz parte <strong>de</strong> <strong>uma</strong> organização<br />

familiar que está inserida em <strong>uma</strong> socieda<strong>de</strong>, com <strong>uma</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da<br />

cultura, em um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do momento histórico (...) e <strong>na</strong>s<br />

interações que estabelecem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo com as pessoas que lhe são<br />

próximas e com o meio que as circunda, as crianças revelam seu<br />

esforço para compreen<strong>de</strong>r o mundo em que vivem, as relações<br />

contraditórias que presenciam e, por meio das brinca<strong>de</strong>iras,<br />

explicitam as condições <strong>de</strong> vida a que estão submetidas e seus<br />

anseios e <strong>de</strong>sejos. (BRASIL, 1998, v.1, p.21).<br />

As Diretrizes Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL, 2010,<br />

p. 14) <strong>de</strong>finem criança como:<br />

Sujeito histórico e <strong>de</strong> direitos que, <strong>na</strong>s interações, relações e práticas<br />

cotidia<strong>na</strong>s que vivencia, constrói sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> pessoal e coletiva,<br />

brinca, imagi<strong>na</strong>, fantasia, <strong>de</strong>seja, apren<strong>de</strong>, observa, experimenta,<br />

<strong>na</strong>rra, questio<strong>na</strong> e constrói sentidos sobre a <strong>na</strong>tureza e a socieda<strong>de</strong>,<br />

produzindo cultura.<br />

A partir do momento em que se tem em vista esta perspectiva <strong>de</strong> criança,<br />

tor<strong>na</strong>-se insustentável a existência <strong>de</strong> práticas escolares pautadas no<br />

condicio<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> comportamento e no trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s. Faz-se<br />

necessária <strong>uma</strong> escola que, ciente <strong>de</strong> como se dá a construção do conhecimento,<br />

promova aprendizagens significativas que <strong>de</strong>safiem seus alunos e os mobilizem a<br />

criar, a significar e a ressignificar seus saberes.<br />

1.2.3 Características da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong><br />

A Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases - LDB 9.394/96 - <strong>de</strong>fine que a <strong>Educação</strong> Básica é<br />

composta pela <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, pelo Ensino Fundamental e pelo Ensino Médio. Na<br />

seção II, o artigo 29 estabelece:<br />

A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como<br />

fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> o <strong>de</strong>senvolvimento integral da criança até seis anos <strong>de</strong><br />

ida<strong>de</strong>, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,<br />

complementando a ação da família e da comunida<strong>de</strong>. 5 (BRASIL,<br />

1996)<br />

5<br />

Em 2007 as Leis Fe<strong>de</strong>rais 11.114 e 11.274 alteram a faixa etária da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> para<br />

0 a 5 anos.<br />

19


A educação infantil po<strong>de</strong> ser oferecida em creches (0 a 3 anos) e pré-escolas<br />

(4 e 5 anos), públicas ou privadas, regulamentada pelos órgãos competentes. Esta<br />

etapa não é obrigatória, ou seja, é facultativo à família a frequência <strong>de</strong> menores <strong>de</strong><br />

seis anos em instituição <strong>de</strong> ensino. Todavia, continua sendo <strong>de</strong>ver do Estado<br />

garantir o acesso universal, gratuito e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, sem requisito <strong>de</strong> seleção<br />

(BRASIL, 2010).<br />

Segundo Bassedas, Huguet e Solé (1999), os principais traços característicos<br />

<strong>de</strong>sta etapa resi<strong>de</strong>m no caráter não-obrigatório: as diferentes séries po<strong>de</strong>m ser<br />

compostas tanto por crianças já escolarizadas quanto por aquelas que entram pela<br />

primeira vez neste ambiente; <strong>na</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> colaboração estreita com a<br />

família, a fim <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r as diferentes necessida<strong>de</strong>s da criança, bem como a<br />

concordância no que se refere às re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cuidados; no equilíbrio entre a etapa<br />

como própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e a relação necessária com as outras etapas educativas:<br />

ter <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> característica, que lhe seja própria e não em função do<br />

segmento seguinte, sem, contudo, <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> tê-lo em vista, para que haja<br />

coerência e fluência <strong>na</strong> transição <strong>de</strong> <strong>uma</strong> etapa a outra; <strong>na</strong> função educativa e<br />

função social simultâneas: auxiliar as famílias <strong>na</strong> tarefa <strong>de</strong> educar as crianças e<br />

<strong>de</strong>senvolver o potencial máximo <strong>de</strong> cada aluno, por meio dos conteúdos próprios da<br />

etapa.<br />

Barbosa (2009) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que, para garantir um trabalho <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> nesta<br />

etapa é necessária a articulação entre as três funções que atribui à educação<br />

infantil: função social, que é divida com a família, e é relativa ao cuidar e a<br />

formação pessoal e social; função política, relacio<strong>na</strong>da ao gozo dos direitos sociais e<br />

políticos e a garantia <strong>de</strong> exercer seu direito <strong>de</strong> participação; e a função pedagógica<br />

<strong>de</strong> oferecer acesso à cultura, ao conhecimento do meio social e aos diferentes<br />

sistemas <strong>de</strong> representação da realida<strong>de</strong>, ou seja, as diferentes linguagens: oral,<br />

escrita, matemática, científica, artística etc. Nas palavras da autora (2009, p. 12):<br />

A função da educação infantil <strong>na</strong>s socieda<strong>de</strong>s contemporâneas é a <strong>de</strong><br />

possibilitar a vivência em comunida<strong>de</strong>, apren<strong>de</strong>ndo a respeitar, a<br />

acolher e a celebrar a diversida<strong>de</strong> dos <strong>de</strong>mais, a sair da percepção<br />

exclusiva do seu universo pessoal, assim como a ver o mundo a<br />

partir do olhar do outro e da compreensão <strong>de</strong> outros mundos sociais.<br />

Isso implica em <strong>uma</strong> profunda aprendizagem da cultura através <strong>de</strong><br />

ações, experiências e práticas <strong>de</strong> convívio social que tenham soli<strong>de</strong>z,<br />

constância e compromisso, possibilitando à criança inter<strong>na</strong>lizar as<br />

formas cognitivas <strong>de</strong> pensar, agir e operar que sua comunida<strong>de</strong><br />

construiu ao longo da história. Práticas sociais que se apren<strong>de</strong>m<br />

através do conhecimento <strong>de</strong> outras culturas, das <strong>na</strong>rrativas<br />

20


tradicio<strong>na</strong>is e contemporâneas que possam contar sobre a vida<br />

h<strong>uma</strong><strong>na</strong> por meio da literatura, da música, da pintura, da dança.<br />

Isso é, histórias coletivas que, ao serem ouvidas, se encontram com<br />

as histórias pessoais, alargando os horizontes cognitivos e<br />

emocio<strong>na</strong>is através do diálogo, das conversas, da participação e da<br />

vida <strong>de</strong>mocrática.<br />

Estas diferentes funções da educação infantil se concretizam, <strong>de</strong> maneira<br />

integrada, <strong>na</strong> prática escolar; <strong>na</strong>s relações entre o adulto e a criança e entre a<br />

escola e a família; <strong>na</strong> valorização e capacitação profissio<strong>na</strong>l; bem como se<br />

traduzem <strong>na</strong>s <strong>proposta</strong>s pedagógicas; <strong>na</strong> forma como são feitos os<br />

encaminhamentos e o planejamento <strong>de</strong> intervenções; <strong>na</strong> distribuição do tempo e<br />

espaço; <strong>na</strong> organização tanto social da sala - os agrupamentos – como a <strong>de</strong><br />

conteúdos. Todas as situações escolares atuam <strong>na</strong> construção da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e<br />

autonomia, <strong>na</strong> formação política como, também, no acesso à cultura e a relação<br />

que a criança po<strong>de</strong> estabelecer com o saber.<br />

Com a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instrumentalizar o professor para que possa preparar e<br />

refletir sobre a sua prática, os RCN apresentam <strong>uma</strong> organização didática<br />

estabelecendo dois âmbitos da ação educativa: o da Formação Pessoal e Social e o<br />

do Conhecimento <strong>de</strong> Mundo. A primeira refere-se ao <strong>de</strong>senvolvimento da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

e conquista da autonomia, partindo do pressuposto <strong>de</strong> que a escola <strong>de</strong> educação<br />

infantil é um espaço privilegiado “<strong>de</strong> inserção das crianças <strong>na</strong>s relações éticas e<br />

morais que permeiam a socieda<strong>de</strong> <strong>na</strong> qual estão inseridas” (BRASIL, 1998. v2.<br />

p.11). E o segundo, Conhecimento <strong>de</strong> Mundo, “refere-se à construção das<br />

diferentes linguagens pelas crianças e as relações que estabelecem com os objetos<br />

<strong>de</strong> conhecimento: Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita,<br />

Natureza e Socieda<strong>de</strong> e Matemática” (BRASIL, 1998. v1, p.7).<br />

A partir <strong>de</strong>sta organização, é possível se consi<strong>de</strong>rar quais <strong>de</strong>vem ser,<br />

efetivamente, os conteúdos <strong>de</strong> trabalho do segmento da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, aspecto<br />

que será abordado no próximo item.<br />

21


1.2.4 O que ensi<strong>na</strong>r <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> – os conteúdos<br />

Zabala (2010) afirma que conteúdo <strong>de</strong> aprendizagem é tudo aquilo que é<br />

suscetível <strong>de</strong> ser aprendido.<br />

Na educação infantil o termo conteúdo gerou e ainda gera muitas polêmicas,<br />

que inclusive se relacio<strong>na</strong>m com o tema <strong>de</strong>ste trabalho. Por muito tempo, a<br />

educação <strong>de</strong> crianças <strong>de</strong> 0 a 6 anos, esteve subordi<strong>na</strong>da à preparação para o<br />

Ensino Fundamental, o que implicou <strong>na</strong> antecipação <strong>de</strong> conteúdos e no treino <strong>de</strong><br />

habilida<strong>de</strong>s que supostamente eram pré-requisitos para aprendizagens posteriores.<br />

Contudo, se partimos do pressuposto <strong>de</strong> que as crianças apren<strong>de</strong>m “algo” neste<br />

segmento e que este terá propósitos educativos para além do cuidar, ele será,<br />

portanto, dotados <strong>de</strong> intencio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>, fazendo enorme sentido falar em conteúdos.<br />

Além disso, se partimos da concepção que a função <strong>de</strong>ste segmento é a<br />

ampliação do universo cultural infantil, e que isto ocorre a partir da inserção da<br />

criança em práticas sociais não restritas àquelas que transitam em âmbito familiar,<br />

é necessário permitir e garantir o acesso aos conhecimentos próprios e amplos da<br />

cultura <strong>na</strong> instituição escolar.<br />

É importante, como já dito anteriormente, que essa etapa da escolarida<strong>de</strong><br />

tenha <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> própria, com conteúdos ajustados às suas <strong>de</strong>mandas e<br />

características, mas restringir o acesso à cultura e ao conhecimento do meio social<br />

é <strong>de</strong>sprover as práticas do segmento <strong>de</strong> sentido e propósito (BASSEDAS et.al,<br />

1999).<br />

Coll (1998) amplia esse conceito <strong>de</strong> conteúdo, classificando-o <strong>de</strong> acordo com<br />

a sua <strong>na</strong>tureza: a conceitual (refere-se aos conhecimentos, ao saber), a<br />

procedimental (correspon<strong>de</strong> ao saber fazer - estratégias e técnicas a fim <strong>de</strong> atingir<br />

um propósito) e a atitudi<strong>na</strong>l (associado às atitu<strong>de</strong>s, valores e normas).<br />

Esta forma <strong>de</strong> classificação dos conteúdos organiza, didaticamente, <strong>de</strong> outro<br />

modo o trabalho da escola, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> contemplar os conceitos <strong>de</strong>scritos<br />

anteriormente, que dizem respeito à sua função educativa. Também é útil para que<br />

o professor tenha consciência <strong>de</strong> qual aspecto está trabalhando e qual é necessário<br />

focar, <strong>de</strong> quais conceitos sua <strong>proposta</strong> po<strong>de</strong> articular e <strong>de</strong> quais serão as<br />

intervenções que fará, tendo em vista que a <strong>uma</strong> mesma <strong>proposta</strong> po<strong>de</strong>m ser<br />

22


dados diferentes enfoques (conceitual, procedimental ou atitudi<strong>na</strong>l), em função <strong>de</strong><br />

seus objetivos.<br />

Segundo o RCN (BRASIL, 1998, v1, p49) os conteúdos concretizam os<br />

propósitos da instituição e também são<br />

um meio para que as crianças <strong>de</strong>senvolvam suas capacida<strong>de</strong>s e<br />

exercitem sua maneira própria <strong>de</strong> pensar, sentir e ser, ampliando<br />

suas hipóteses acerca do mundo ao qual pertencem e constituindose<br />

em um instrumento para a compreensão da realida<strong>de</strong>.<br />

Barbosa (2009) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que os conteúdos <strong>na</strong> educação infantil <strong>de</strong>vem estar<br />

relacio<strong>na</strong>dos com a vida cotidia<strong>na</strong> e terem como referência as práticas sociais, ou<br />

seja, o conjunto <strong>de</strong> ações dos sujeitos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> cultura que os i<strong>de</strong>ntificam como<br />

membros pertencentes àquele grupo social. Cita, ainda, como conteúdos<br />

educacio<strong>na</strong>is <strong>de</strong>sta etapa, ações <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a higiene e controle do corpo, relações<br />

sociais, brinca<strong>de</strong>iras, movimento, repouso, relações sociais, cultura popular até a<br />

aprendizagem das diferentes linguagens.<br />

A autora enfatiza que não se trata <strong>de</strong> “pedagogizar” a troca <strong>de</strong> fraldas, por<br />

exemplo, mas que <strong>na</strong> medida em que o cuidado com o corpo é <strong>uma</strong> prática<br />

fundamental, que pertence à cultura da qual a escola e o sujeito comungam, é<br />

necessário consi<strong>de</strong>rar, prever e problematizá-la enquanto importante conteúdo<br />

relativo à educação e ao bem-estar da criança.<br />

Po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>finir ‘prática’ a partir da contraposição com o que chamamos <strong>de</strong><br />

teoria que, segundo o dicionário Michaelis, é um conjunto <strong>de</strong> “princípios básicos e<br />

elementares <strong>de</strong> <strong>uma</strong> arte ou ciência”, relativo ao campo das i<strong>de</strong>ias ou<br />

“conhecimento que se limita à exposição, sem passar à ação, sendo, portanto, o<br />

contrário da prática”. Triviños (2006) afirma, em seu artigo sobre a dialética<br />

materialista e a prática social, que as i<strong>de</strong>ias, o conhecimento e a teoria são<br />

materializados pela linguagem, que é consi<strong>de</strong>rada como prática social.<br />

O pensamento, as idéias, os conceitos que temos sobre a realida<strong>de</strong><br />

que constituem a relação teórica do sujeito com o objeto, “surge e se<br />

<strong>de</strong>senvolve a base da interação prática entre eles (TRIVIÑOS, 2006,<br />

p 124).<br />

Na mesma direção, Barbosa (2009, p.85) também <strong>de</strong>fine práticas sociais<br />

enquanto linguagem, consi<strong>de</strong>rada em um “sentido amplo <strong>de</strong> compartilhar sentidos<br />

23


e comunicar significados, ou seja, <strong>de</strong> leitura, <strong>de</strong> interpretação, <strong>de</strong> expressão e <strong>de</strong><br />

produção <strong>de</strong> significados simbólicos e não no sentido restrito <strong>de</strong> linguagem verbal,<br />

oral ou escrita”.<br />

Há diferentes tipos <strong>de</strong> linguagem: enquanto manifestação e expressão<br />

cultural, linguagem científica, matemática, artística etc.<br />

(...) as linguagens são saberes da ação: simbólicos, expressivos,<br />

científicos, artísticos e tecnológicos que <strong>de</strong>monstram a capacida<strong>de</strong><br />

h<strong>uma</strong><strong>na</strong> para falar, <strong>escrever</strong>, manipular, expressar e produzir um<br />

número ilimitado <strong>de</strong> pensamentos e experiências in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />

do conhecimento formal das discipli<strong>na</strong>s sistematizadas,<br />

hierarquizadas e lineares. (BARBOSA, 2009, p.85)<br />

A autora <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>, portanto, que os conteúdos <strong>de</strong> ensino <strong>na</strong> educação infantil<br />

estejam centrados e pautados pelas práticas sociais e culturais <strong>de</strong> uso das<br />

linguagens, proporcio<strong>na</strong>ndo assim situações reais <strong>de</strong> interação em um contexto <strong>de</strong><br />

significação.<br />

Um exemplo <strong>de</strong> <strong>proposta</strong> pautada <strong>na</strong>s práticas sociais <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> linguagem,<br />

seria a <strong>de</strong> “seguir” um autor - prática comum entre leitores e escritores , que lêem<br />

os livros <strong>de</strong> um mesmo autor, por gostarem do estilo, da qualida<strong>de</strong> ou temática.<br />

Nesta <strong>proposta</strong>, vários conteúdos po<strong>de</strong>m ser trabalhados e, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da série e<br />

dos objetivos pedagógicos, alguns serão privilegiados em relação a outros, por<br />

exemplo, po<strong>de</strong>m ser conteúdos: a escuta <strong>de</strong> textos daquele gênero; a socialização<br />

<strong>de</strong> opiniões sobre a história, perso<strong>na</strong>gens, <strong>de</strong>sfecho, parte favorita etc., a<br />

antecipação <strong>de</strong> partes do enredo ou da história a partir dos conhecimentos que tem<br />

sobre o autor ou pelas ilustrações, o reconhecimento <strong>de</strong> marcas próprias do autor,<br />

<strong>de</strong>ntre muitos outros conteúdos possíveis.<br />

Mas como <strong>de</strong>finir quais conteúdos serão privilegiados? Coll e Solé (2010)<br />

relembram que os conteúdos veiculados <strong>na</strong> escola já estão elaborados e fazem<br />

parte da cultura e conhecimento. Ou seja, são saberes que a socieda<strong>de</strong> e os<br />

pesquisadores em educação reconhecem como importantes para o <strong>de</strong>senvolvimento<br />

social e individual dos alunos e, por isso, <strong>de</strong>vem ser trabalhados <strong>na</strong> escola.<br />

Uma vez que “os conteúdos escolares constituem um reflexo e <strong>uma</strong> seleção”<br />

(COLL e SOLÉ, 2010, p.21) <strong>de</strong> alguns aspectos da cultura, não faria sentido instituir<br />

quais conteúdos <strong>de</strong>veriam ser trabalhados em âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, já que um país<br />

expressa <strong>uma</strong> rica diversida<strong>de</strong> cultural. Baseado nesta i<strong>de</strong>ia, excetuando-se aquilo<br />

24


que está previsto em lei, as <strong>de</strong>mais publicações referentes à educação são<br />

chamadas <strong>de</strong> “Parâmetros”, “Referencias”, “Orientações”, que visam manter certa<br />

unida<strong>de</strong>, assegurando alguns pontos comuns, mas <strong>de</strong>ixam espaço para as<br />

particularida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada grupo e realida<strong>de</strong>.<br />

Os conteúdos aqui elencados preten<strong>de</strong>m oferecer um repertório que<br />

possa auxiliar o <strong>de</strong>senvolvimento das capacida<strong>de</strong>s colocadas nos<br />

objetivos gerais. (BRASIL,1998, p. 53)<br />

Dada a diversida<strong>de</strong> existente no País, é <strong>na</strong>tural e <strong>de</strong>sejável que<br />

ocorram alterações no quadro proposto. A <strong>de</strong>finição dos conteúdos a<br />

serem tratados <strong>de</strong>ve consi<strong>de</strong>rar o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong>s<br />

a<strong>de</strong>quadas às características sociais, culturais e econômicas<br />

particulares <strong>de</strong> cada localida<strong>de</strong>. Assim, a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> conteúdos nos<br />

Parâmetros Curriculares Nacio<strong>na</strong>is é <strong>uma</strong> referência suficientemente<br />

aberta para técnicos e professores a<strong>na</strong>lisarem, refletirem e tomarem<br />

<strong>de</strong>cisões, resultando em ampliações ou reduções <strong>de</strong> certos aspectos,<br />

em função das necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aprendizagem <strong>de</strong> seus alunos.<br />

(BRASIL, 1997, p.51)<br />

O documento tem por objetivos: servir <strong>de</strong> referência para o trabalho<br />

do professor (...). Subsidiar cada professor (...). Apoiar cada equipe<br />

(...) (SÃO PAULO, 2007, p.7)<br />

Na educação infantil esta maleabilida<strong>de</strong> do currículo 6 é imprescindível dada a<br />

diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> experiências que convivem em <strong>uma</strong> mesma sala <strong>de</strong> aula. Como dito<br />

anteriormente, seguindo a <strong>proposta</strong> dos RCN, o currículo da educação infantil <strong>de</strong>ve<br />

contar com os objetivos e os conteúdos relativos à construção da I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e<br />

Autonomia, assim como, objetivos e conteúdos relativos ao âmbito Conhecimento<br />

<strong>de</strong> mundo, “orientados para a construção das diferentes linguagens e para as<br />

relações que estabelecem com os objetos <strong>de</strong> conhecimento: Movimento, Música,<br />

Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Socieda<strong>de</strong> e Matemática”<br />

(BRASIL, 1998, v1, p.46).<br />

Como este trabalho preten<strong>de</strong> pesquisar sobre o papel da educação infantil no<br />

processo <strong>de</strong> alfabetização inicial, se discorrerá, no capítulo seguinte, sobre as<br />

concepções <strong>de</strong> área, <strong>de</strong> objetivos, <strong>de</strong> conteúdos e <strong>de</strong> eixos <strong>de</strong> trabalho<br />

6<br />

Neste momento, não nos ateremos a todas as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> concepção <strong>de</strong>ste termo, o<br />

mesmo será usado aqui como a articulação entre os conteúdos eleitos em função dos<br />

propósitos educacio<strong>na</strong>is.<br />

25


<strong>de</strong>senvolvido em Linguagem Oral e Escrita. Além disso, conforme citado<br />

anteriormente, se a<strong>na</strong>lisa o currículo <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino.<br />

26


Capítulo II - <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> <strong>na</strong> educação infantil: a quem e à quê se<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong><br />

No caso da aprendizagem da língua oral,<br />

os adultos que ro<strong>de</strong>iam a criança manifestam<br />

entusiasmo quando ela faz suas primeiras<br />

tentativas para comunicar-se oralmente (...)<br />

Todos tentam compreen<strong>de</strong>r o que a criança disse<br />

supondo que quis dizer algo […] No caso da<br />

língua escrita o comportamento da comunida<strong>de</strong><br />

escolar é marcadamente oposto (...), porque se<br />

supõe que não possa <strong>escrever</strong> <strong>na</strong>da até ter<br />

recebido a instrução formal pertinente (...)<br />

Ninguém tenta retraduzir o que a criança<br />

escreveu, porque lhe nega o direito <strong>de</strong><br />

aproximar-se da escrita por aminho diferente do<br />

indicado pelo método escolhido pelo professor.<br />

(FERREIRO, 2008, p.30)<br />

2.1 O trabalho com Linguagem Oral e Escrita <strong>na</strong> perspectiva construtivista<br />

As <strong>de</strong>scobertas realizadas acerca <strong>de</strong> como as crianças apren<strong>de</strong>m tem<br />

transformado, <strong>de</strong> modo substancial, a maneira <strong>de</strong> se conceber a aprendizagem das<br />

linguagens oral e escrita. Em consonância com o que está exposto neste trabalho<br />

sobre o referencial construtivista, as crianças construirão estes saberes à medida<br />

que estiverem inseridas em situações reais <strong>de</strong> comunicação e uso da linguagem.<br />

A perspectiva construtivista começou a influenciar as concepções <strong>de</strong><br />

linguagem no Brasil, mais propriamente as <strong>de</strong> linguagem escrita, a partir da<br />

publicação, em 1979, da obra Psicogênese da Língua Escrita, <strong>de</strong> Emilia Ferreiro e<br />

A<strong>na</strong> Teberosky. Ancoradas nos estudos <strong>de</strong> Piaget, as autoras, em conjunto com<br />

outras pesquisadoras, <strong>de</strong>dicaram-se a investigar como a criança constrói o saber<br />

sobre a língua escrita.<br />

Este estudo trouxe um novo aspecto para o <strong>de</strong>bate sobre a alfabetização,<br />

que até então acontecia ape<strong>na</strong>s no sentido <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir qual seria o melhor método <strong>de</strong><br />

ensino. A re<strong>de</strong> pública que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 60, vinha sendo castigada pelo<br />

fracasso escolar (representado pela evasão e repetência), principalmente <strong>na</strong>s séries<br />

27


iniciais, vislumbrou <strong>na</strong> pesquisa psicogenética a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a este<br />

problema. É fato que, <strong>de</strong> início, a inserção das i<strong>de</strong>ias apresentadas por Ferreiro e<br />

Teberosky foi feita <strong>de</strong> modo abrupto e pouco formativo. De todas as conclusões<br />

apresentadas, somente as i<strong>de</strong>ias vinculadas à apropriação da escrita alfabética<br />

foram trazidas para os professores, ou seja, ape<strong>na</strong>s as i<strong>de</strong>ias sobre as hipóteses<br />

construídas pelas crianças chegaram aos professores. Isso acabou gerando – e é<br />

algo que ainda ocorre – distorções no papel do professor alfabetizador e <strong>na</strong> forma<br />

como as contribuições advindas da Psicogênese influenciam a prática <strong>de</strong> ensino. Em<br />

muitos casos, por exemplo, os professores se mantinham usando métodos fechados<br />

<strong>de</strong> alfabetização e “usavam” as hipóteses ape<strong>na</strong>s em caráter avaliativo, a fim <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>finir quantos alunos escreviam <strong>de</strong> forma alfabética, quantos <strong>de</strong> forma silábica<br />

etc.<br />

(...) a <strong>de</strong>speito da amplitu<strong>de</strong> do referencial teórico e das suas<br />

implicações para a prática pedagógica, a apropriação da psicogênese<br />

em sala <strong>de</strong> aula acabou configurando-se sob a forma <strong>de</strong> praticas<br />

reducionistas e, não raro, equivocadas. Ansiosos por encontrar<br />

alter<strong>na</strong>tivas para os dramáticos índices <strong>de</strong> reprovação e fracasso<br />

escolar, muitos professores acabaram fazendo <strong>uma</strong> transposição<br />

<strong>de</strong>masiadamente direta das situações <strong>de</strong> pesquisa, trazendo-as para<br />

a escola mais como <strong>uma</strong> metodologia <strong>de</strong> trabalho do que<br />

propriamente como um estímulo à reflexão, ao estudo e ao<br />

planejamento <strong>de</strong> práticas mais compromissadas com o aprendiz (...)<br />

muitos educadores lançaram-se avidamente à psicogenética como se<br />

ela fosse a solução para todos os problemas da sala <strong>de</strong> aula (...)<br />

surgiram também os ‘modismos pedagógicos’, práticas<br />

inconseqüentes e até irresponsáveis, embora não necessariamente<br />

mal-intencio<strong>na</strong>das. (LUIZE E COLELLO, 2005, p.20)<br />

Nas instâncias superiores, porém, aos poucos houve <strong>uma</strong> preocupação em<br />

salientar a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mudanças <strong>na</strong> forma como se ensi<strong>na</strong>va a ler e a <strong>escrever</strong><br />

e, igualmente, <strong>uma</strong> preocupação em tor<strong>na</strong>r as contribuições das autoras<br />

compreensíveis para os professores. Então, a partir da adoção da perspectiva que<br />

fundamentou as novas <strong>de</strong>scobertas <strong>na</strong> área, <strong>uma</strong> série <strong>de</strong> publicações foi produzida<br />

pelo Ministério e Secretarias da <strong>Educação</strong> e, em praticamente <strong>uma</strong> década, foram<br />

distribuídas em ampla escala, a todos os profissio<strong>na</strong>is da re<strong>de</strong>.<br />

Nos Referenciais Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL,<br />

1998, v.2), o trabalho com linguagem oral e escrita é consi<strong>de</strong>rado eixo básico do<br />

trabalho neste segmento, porque é a linguagem que media a relação e a interação<br />

28


da criança com o outro, com a cultura e com o conhecimento, contribuindo tanto<br />

para a formação do sujeito quanto para o <strong>de</strong>senvolvimento e o refi<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> suas<br />

competências linguísticas. Portanto, o objetivo estabelecido para esta etapa da<br />

escolarida<strong>de</strong>, nesta área, “é a ampliação das capacida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> comunicação e<br />

expressão e <strong>de</strong> acesso ao mundo letrado pela criança” (BRASIL, 1998, v2, p.117) e<br />

os respectivos conteúdos se organizam em um único bloco para crianças <strong>de</strong> 0 a 3<br />

anos e em três blocos para as <strong>de</strong> 4 a 6 anos, são eles: “Falar e escutar”, “Práticas<br />

<strong>de</strong> leitura” e “Práticas <strong>de</strong> escrita”.<br />

Outra bibliografia bastante utilizada por quem adota os pressupostos<br />

construtivistas em relação ao processo <strong>de</strong> ensino e aprendizagem são os Diseños<br />

Curriculares Argentino – documentos norteadores, <strong>de</strong> âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l - pois estes<br />

foram elaborados por autores que são pesquisadores <strong>de</strong> referências nesta área,<br />

sobretudo, no que se refere às didáticas especificas.<br />

No Diseño Curricular para la Educación Inicial 7 , a área conhecida nos<br />

documentos <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is brasileiro por Linguagem Oral e Escrita faz parte <strong>de</strong> um bloco<br />

chamado “La expresión y la comunicación”:<br />

Las experiencias plásticas, musicales, <strong>de</strong>l movimiento y <strong>de</strong> la palavra<br />

posibilita conocer el mundo que nos ro<strong>de</strong>a y el que llevamos <strong>de</strong>ntro.<br />

Los lenguajes expresivos permiten crear y mostrar lo particular y lo<br />

irrepetible <strong>de</strong> cada uno <strong>de</strong> nosotros, los seres h<strong>uma</strong>nos, y a la vez <strong>de</strong><br />

nuestra sociedad. 8 (GOVERNO DE LA CIUDAD AUTÓNOMA DE<br />

BUENOS AIRES, 2000. v.4, p.157)<br />

Esse bloco engloba as diferentes linguagens corporal, musical, plástica e as<br />

experiências ou práticas que envolvem o falar, o ouvir, o ler, o <strong>escrever</strong> e a<br />

literária.<br />

A <strong>de</strong>finição da área como “Práticas <strong>de</strong> Linguagem” evi<strong>de</strong>ncia, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu<br />

nome, que os objetos <strong>de</strong> estudo e ensino se situarão sobre as práticas, sobre a<br />

linguagem em uso e, por isso mesmo, os conteúdos propostos terão como<br />

referência e se basearão <strong>na</strong>s práticas <strong>de</strong> linguagem que se realizam <strong>na</strong> vida social<br />

7<br />

O Diseño Curricular Argentino é composto por quatro volumes: 1. Marco geral, que expõe<br />

as orientações comuns ao segmento; 2. Para crianças <strong>de</strong> 45 dias a 2 anos; 3. Para crianças<br />

<strong>de</strong> 2 e 3 anos; Para crianças <strong>de</strong> 4 e 5 anos.<br />

8<br />

Tradução livre <strong>de</strong> Giulianny Russo: Por meio das experiências plásticas, musicais, <strong>de</strong><br />

movimento e da palavra po<strong>de</strong>mos conhecer o mundo a nossa volta e a nós mesmos. As<br />

linguagens expressivas permitem criar e mostrar aquilo que é próprio e único <strong>de</strong> cada um<br />

<strong>de</strong> nós, seres h<strong>uma</strong>nos, e da nossa socieda<strong>de</strong>.<br />

29


(DIRECCIÓN GENERAL DE CULTURA Y EDUCACIÓN, 2008). Isso muda o objeto <strong>de</strong><br />

estudo da área, que antes era a língua, propriamente dita, e agora se localiza no<br />

uso social que se faz <strong>de</strong>la, o que implica em práticas escolares contextualizadas e,<br />

portanto, repletas <strong>de</strong> sentido para o aluno.<br />

Neste currículo, <strong>na</strong> educação infantil, a área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem é<br />

dividida em: Falar; <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> <strong>na</strong> educação infantil; e Literatura 9 .<br />

Diferentemente do RCN, esse currículo distingue, a princípio, dois tipos <strong>de</strong><br />

leitura em função <strong>de</strong> seus propósitos: a leitura para apren<strong>de</strong>r a ler e a leitura<br />

literária para se divertir, emocio<strong>na</strong>r, provocar reflexões e instigar conhecimentos. À<br />

literatura é atribuído um papel especial e fundamental para a constituição <strong>de</strong><br />

leitores competentes, críticos, sensíveis e agentes <strong>de</strong> transformação social. Além<br />

disso, este currículo está estruturado a partir <strong>de</strong> referências no estudo da didática,<br />

ou seja, focado nos processo <strong>de</strong> ensino e aprendizagem <strong>de</strong> modo prático: como<br />

ensi<strong>na</strong>r a partir <strong>de</strong> um dado pressuposto teórico, que disserta sobre como as<br />

crianças apren<strong>de</strong>m.<br />

Esta forma <strong>de</strong> pensar o currículo é a que melhor se ajusta e ilustra a<br />

concepção <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> aprendizagem e os propósitos aspirados à educação<br />

infantil, dos quais parte este trabalho. Além disso, a gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> a ser<br />

problematizada nos próximos capítulos, organiza-se a partir <strong>de</strong>sta perspectiva.<br />

Importa salientar que não se está tratando <strong>de</strong> referenciais <strong>curricular</strong>es<br />

opostos ou que se contradizem. Ambos, tanto os RCN quanto o Diseño Curricular<br />

Argentino, partem e tomam como referência os pressupostos construtivistas e,<br />

igualmente, consi<strong>de</strong>ram a leitura, a escrita e a oralida<strong>de</strong> fundamentais, não<br />

somente <strong>de</strong>ntro dos muros da escola, mas também fora <strong>de</strong>le, focando o ensino <strong>na</strong><br />

formação <strong>de</strong> leitores, escritores, falantes e ouvintes competentes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>Educação</strong><br />

<strong>Infantil</strong>. Porém, a forma como cada um está estruturado e os eixos <strong>de</strong> trabalho que<br />

sugerem é que os diferencia. E é por estas razões, que os parâmetros argentinos<br />

fundamentarão as i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong>ste capítulo.<br />

9<br />

Respectivamente: Hablar em El jardín, Leer y escribir en el jardín e Literatura.<br />

30


2.1.1 <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> - a alfabetização <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong><br />

Tradicio<strong>na</strong>lmente, a palavra “alfabetização” era concebida para <strong>de</strong>sig<strong>na</strong>r a<br />

aquisição do código escrito, o que ocorria quando a criança domi<strong>na</strong>va a técnica <strong>de</strong><br />

codificar a linguagem oral (<strong>escrever</strong>) e <strong>de</strong>codificar o escrito (leitura).<br />

Ferreiro e Teberosky (1999) observam, no entanto, que não existe um<br />

momento preciso, <strong>de</strong>svinculado das experiências anteriores e resultado <strong>de</strong> um<br />

conjunto <strong>de</strong> técnicas, que culmi<strong>na</strong>ria com o domínio da língua escrita. Segundo<br />

estas autoras, apren<strong>de</strong>r a ler e a <strong>escrever</strong>, alfabetizar-se, é um processo mais<br />

amplo e complexo, abarcando a aprendizagem do sistema <strong>de</strong> escrita, mas não se<br />

restringindo a ela. Concebem a alfabetização como a apropriação e a ampliação do<br />

conhecimento sobre a língua escrita e, por isso, como um processo que começa<br />

antes mesmo <strong>de</strong> a criança ingressar <strong>na</strong> escola e que prossegue mesmo após sua<br />

conclusão, à medida que continua construindo saberes neste campo. 10<br />

Des<strong>de</strong> o seu <strong>na</strong>scimento, a criança é inserida em <strong>uma</strong> cultura letrada. Uma<br />

cultura que utiliza em escrita <strong>na</strong>s diversas situações para comunicar, informar e<br />

divertir (livros, revistas, televisão, computador, receitas, placas <strong>de</strong> rua e <strong>de</strong><br />

estabelecimentos, embalagens etc.). Assim como os <strong>de</strong>mais objetos <strong>de</strong><br />

conhecimento que compõem o universo infantil, a escrita também é alvo <strong>de</strong><br />

reflexão e indagação, e sobre o qual a criança cria hipóteses sobre sua <strong>na</strong>tureza e<br />

função.<br />

Imersa em um mundo on<strong>de</strong> há a presença <strong>de</strong> sistemas simbólicos<br />

socialmente elaborados, a criança procura compreen<strong>de</strong>r a <strong>na</strong>tureza<br />

<strong>de</strong>stas marcas especiais. Para tanto, não exercita <strong>uma</strong> técnica<br />

específica <strong>de</strong> aprendizagem. Como já fez antes, com outros tipos <strong>de</strong><br />

objetos, vai <strong>de</strong>scobrindo as proprieda<strong>de</strong>s dos sistemas simbólicos por<br />

meio <strong>de</strong> um prolongado processo construtivo. (FERREIRO, 2010,<br />

p.44)<br />

10<br />

Uma das principais distinções entre o ensino tradicio<strong>na</strong>l e o construtivista refere-se à<br />

concepção <strong>de</strong> escrita: “se a escrita é concebida como um código <strong>de</strong> transcrição, sua<br />

aprendizagem é concebida como a aquisição <strong>de</strong> <strong>uma</strong> técnica; se a escrita é concebida como<br />

um sistema <strong>de</strong> representação, sua aprendizagem se converte <strong>na</strong> apropriação <strong>de</strong> um novo<br />

objeto <strong>de</strong> conhecimento, ou seja, em <strong>uma</strong> aprendizagem conceitual”. (FERREIRO, 2010,<br />

p.19)<br />

31


Os conhecimentos construídos acerca da linguagem escrita são parte<br />

constitutiva fundamental do processo <strong>de</strong> alfabetização e é o que motiva e significa a<br />

aprendizagem do sistema notacio<strong>na</strong>l. A notação é o termo utilizado por Teberosky e<br />

Tolchinsky (2008), bem como por Sinclair (1990) e outros autores, para <strong>de</strong>sig<strong>na</strong>r<br />

os si<strong>na</strong>is gráficos convencio<strong>na</strong>is, “usados para registrar e transmitir informação<br />

(...). O conhecimento notacio<strong>na</strong>l consiste <strong>na</strong> capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reconhecer, interpretar<br />

e produzir distintas formas notacio<strong>na</strong>is” (TEBEROSKY E TOLCHINSKY, 2008, p.9).<br />

São comuns, ainda hoje, práticas escolares que reduzem todo o processo <strong>de</strong><br />

alfabetização à aprendizagem da notação e é neste ponto em que resi<strong>de</strong> outra<br />

polêmica: po<strong>de</strong>-se ou não alfabetizar <strong>na</strong> educação infantil? É intrínseco a este<br />

questio<strong>na</strong>mento um posicio<strong>na</strong>mento teórico a respeito da aprendizagem da leitura e<br />

da escrita: é um processo <strong>de</strong> construção conceitual ou é o preciso momento em que<br />

a criança codifica/<strong>de</strong>codifica os si<strong>na</strong>is convencio<strong>na</strong>is?<br />

Na perspectiva construtivista, apren<strong>de</strong>r a notação convencio<strong>na</strong>l consiste em<br />

<strong>uma</strong> parte do processo <strong>de</strong> apropriação da linguagem escrita, que influi e é<br />

influenciado pelas conceitualizações da criança 11 .<br />

Alfabetização, hoje, é um processo permanente <strong>de</strong> compreensão e<br />

produção <strong>de</strong> linguagens e sistemas <strong>de</strong> escrita. Engloba um conjunto<br />

<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s que procuram fazer com que as pessoas <strong>de</strong> diversas<br />

culturas e grupos sociais se apropriem do complexo objeto que é a<br />

escrita. (CASTEDO, 1997, p.35)<br />

Por essa razão, é imprescindível que no início da alfabetização, assim como<br />

no restante da escolarida<strong>de</strong>, o aluno esteja inserido em práticas sociais<br />

relacio<strong>na</strong>das ao fazer do escritor e do leitor, <strong>de</strong> maneira que, contínua e<br />

progressivamente, possa atribuir significados e construir e reconstruir saberes cada<br />

vez mais ajustados sobre a <strong>na</strong>tureza do sistema, as suas funções, os modos<br />

próprios <strong>de</strong> organização etc.<br />

11<br />

Neste trabalho não nos <strong>de</strong>teremos sobre as conceitualizações que as crianças constroem<br />

sobre a escrita, <strong>de</strong> modo que, brevemente, po<strong>de</strong>-se afirmar que: “Três períodos<br />

fundamentais po<strong>de</strong>m ser i<strong>de</strong>ntificados, no interior dos quais é possível indicar subníveis. 1)<br />

O primeiro período caracteriza-se pela busca <strong>de</strong> parâmetros <strong>de</strong> diferenciação entre as<br />

marcas gráficas figurativas e as marcas gráficas não-figurativas, assim como pela formação<br />

<strong>de</strong> séries <strong>de</strong> letras como objetos substitutos, e pela busca das condições <strong>de</strong> interpretação<br />

<strong>de</strong>sses objetos substitutos. 2) O segundo período é caracterizado pela construção <strong>de</strong> modos<br />

<strong>de</strong> diferenciação entre os enca<strong>de</strong>amentos <strong>de</strong> letras, baseando-se alter<strong>na</strong>damente em eixos<br />

<strong>de</strong> diferenciação qualitativos e quantitativos. 3) O terceiro período é o que correspon<strong>de</strong> à<br />

fonetização da escrita, que começa por um período silábico e culmi<strong>na</strong> no período alfabético.”<br />

(FERREIRO, 1990, p.22)<br />

32


Deste ponto <strong>de</strong> vista, tor<strong>na</strong>-se óbvio o papel da educação infantil no processo<br />

<strong>de</strong> alfabetização inicial: Promover práticas potentes e reais para que as crianças<br />

atuem como membros plenos da cultura letrada (LERNER, 2002).<br />

Todos los problemas <strong>de</strong> la alfabetización comenzaron cuando se<br />

<strong>de</strong>cidió que escribir no era u<strong>na</strong> profesion sino u<strong>na</strong> obligación y que<br />

leer no era marca <strong>de</strong> sabidura sino marca <strong>de</strong> ciudadania. (FERREIRO,<br />

2008, p. 12) 12<br />

2.1.2 Propósitos e <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>Educação</strong> infantil alfabetizadora<br />

Alfabetizamos para lograr niños conscientes <strong>de</strong> un mundo atravesado<br />

por la escritura, po<strong>de</strong>rosos por ser capaces <strong>de</strong> domi<strong>na</strong>rla y felices por<br />

ser capaces <strong>de</strong> disfrutarla. (CASTEDO, 1995, p.5) 13<br />

Como vimos, o objeto <strong>de</strong> ensino da escola no estudo da língua é a prática<br />

social e, à medida que os adultos oferecem oportunida<strong>de</strong>s para a criança agir<br />

enquanto leitor e escritor “antes <strong>de</strong> sê-lo (convencio<strong>na</strong>lmente 14 ), faz com que se<br />

aprenda <strong>de</strong> modo precoce o essencial das práticas sociais ligadas à escrita”<br />

(Ferreiro, 2010, p.59). Neste processo, “A criança se vê continuamente envolvida,<br />

como agente e observador, no mundo letrado” (FERREIRO, 2010, p.58)<br />

Segundo Castedo (1997, p.36) “a pré-escola po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve dar oportunida<strong>de</strong>s,<br />

sistemáticas e contínuas, para criar ou prolongar situações <strong>na</strong>s quais as crianças<br />

entrem em contato com a linguagem escrita” e que possam fazer uso dos mesmos<br />

procedimentos que os escritores e leitores experientes utilizam, mesmo ainda que<br />

não dominem o sistema notacio<strong>na</strong>l: planejar o texto, fazer rascunhos, revisar,<br />

editar, comentar o que está lendo, trocar opiniões e informações <strong>de</strong>scobertas,<br />

recomendar etc.<br />

Contudo, como crianças que não sabem ler e <strong>escrever</strong> convencio<strong>na</strong>lmente<br />

po<strong>de</strong>m atuar enquanto leitoras e escritoras? Elas o farão segundo seus níveis <strong>de</strong><br />

conceitualização e estas situações representarão <strong>de</strong>safios sobre os quais colocarão<br />

12<br />

Tradução livre Giulianny Russo: Todos os problemas <strong>de</strong> alfabetização começaram quando<br />

se <strong>de</strong>cidiu que <strong>escrever</strong> não era <strong>uma</strong> profissão, mas <strong>uma</strong> obrigação e que ler não era<br />

sinônimo <strong>de</strong> sabedoria, mas sinônimo <strong>de</strong> cidadania<br />

13<br />

Tradução livre Giulianny Russo: Alfabetizamos para formar crianças conscientes <strong>de</strong> um<br />

mundo atravessado pela língua escrita, potentes por serem capazes <strong>de</strong> dominá-la e felizes<br />

por <strong>de</strong>sfrutar-la.<br />

14<br />

Informação entre parênteses foi <strong>uma</strong> inserção minha, não consta no texto origi<strong>na</strong>l da<br />

autora.<br />

33


em jogo as suas hipóteses e estratégias, relacio<strong>na</strong>ndo-as aos novos dados que<br />

observa, a fim <strong>de</strong> solucio<strong>na</strong>r o que para elas representa um problema, um <strong>de</strong>safio.<br />

Ou seja, os aprendizes escrevem e leem por si mesmos <strong>de</strong> acordo com suas<br />

possibilida<strong>de</strong>s, mas também leem e escrevem por meio do professor. Kaufman<br />

(2011) propõe <strong>uma</strong> organização didática das situações com leitura e escrita, em<br />

função da participação do aluno em cada <strong>uma</strong> <strong>de</strong>las.<br />

Ao escutar a leitura realizada pelo professor, as crianças po<strong>de</strong>rão aproximarse<br />

do conteúdo do texto, das informações que ele veicula, construindo significados<br />

e apren<strong>de</strong>ndo sobre os aspectos discursivos (como o texto se organiza em função<br />

<strong>de</strong> seu propósito) e sobre a linguagem escrita (gênero e léxico específicos <strong>de</strong> cada<br />

portador). “Participando <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> situaciones, el niño se está formando como<br />

lector y se está nutriendo <strong>de</strong> palabras, i<strong>de</strong>as y formas que incidirán positivamente<br />

también en la elaboración <strong>de</strong> sus producciones escritas” 15 (KAUFMAN, 2011, p.68).<br />

Um exemplo <strong>de</strong> situações com crianças peque<strong>na</strong>s po<strong>de</strong> ser a leitura <strong>de</strong> variados<br />

gêneros, com distintos propósitos: para se divertir, se instruir, para saber mais<br />

sobre um tema, para receber informações acerca <strong>de</strong> eventos, novida<strong>de</strong>s etc.<br />

Já <strong>na</strong> leitura por si mesmo, o aluno po<strong>de</strong>rá fazê-la tanto silenciosamente -<br />

para <strong>de</strong>sfrutar, se entreter, localizar dados e se informar- quanto em voz alta, para<br />

compartilhar a leitura com os <strong>de</strong>mais. Contudo, quando ainda não sabe ler<br />

convencio<strong>na</strong>lmente, usa “las mismas estratégias básicas que los lectores expertos:<br />

anticipando significados posibles em función <strong>de</strong> la coordi<strong>na</strong>ción inteligente <strong>de</strong> datos<br />

<strong>de</strong>l texto com datos <strong>de</strong>l contexto” 16 , mas têm como maior <strong>de</strong>safio i<strong>de</strong>ntificar on<strong>de</strong><br />

algo po<strong>de</strong> estar escrito ou se algo realmente po<strong>de</strong> estar escrito on<strong>de</strong> indica o<br />

professor, afi<strong>na</strong>l não dispõe da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>codificar (KAUFMAN, 2011,<br />

p.30). Nestas situações o foco <strong>de</strong> reflexão do aluno inci<strong>de</strong> sobre o sistema<br />

notacio<strong>na</strong>l: inicialmente po<strong>de</strong>rá se apoiar somente <strong>na</strong> imagem que acompanha o<br />

texto para lê-lo, com o tempo e com a participação em situações <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong>ste<br />

tipo, po<strong>de</strong>rá observar <strong>na</strong> palavra outros índices, tais como, letras conhecidas,<br />

sílabas iniciais que coinci<strong>de</strong>m com a <strong>de</strong> outras palavras <strong>de</strong> referência, a extensão<br />

da palavra, até que possa ler sem o auxílio da imagem ou do contexto. Alguns<br />

15<br />

Tradução livre Giulianny Russo: Participando <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> situações, a criança estará se<br />

formando como leitor e se nutrindo <strong>de</strong> palavras, i<strong>de</strong>ias e formas que incidirão positivamente<br />

também <strong>na</strong> elaboração <strong>de</strong> suas produções escritas.<br />

16<br />

Tradução livre Giulianny Russo: as mesmas estratégias básicas que os leitores<br />

experientes: antecipando os possíveis significados em função da coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção inteligentes<br />

dos dados informados pelo texto com os dados informados pelo contexto.<br />

34


exemplos <strong>de</strong> situações com crianças peque<strong>na</strong>s: explorar livremente diferentes<br />

portadores textuais ou buscando informações específicas relacio<strong>na</strong>das a um estudo<br />

do grupo e que contenha pistas suficientes para viabilizar a tarefa, localizar<br />

palavras em <strong>uma</strong> lista etc.<br />

Nas situações <strong>de</strong> escrita por meio do professor, as crianças concentrarão<br />

seus esforços em o quê <strong>escrever</strong>, cuidando da escolha <strong>de</strong> palavras, da articulação<br />

entre as i<strong>de</strong>ias expostas, da a<strong>de</strong>quação ao gênero e do propósito e a quem se<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong> o texto. A <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r do objetivo didático, po<strong>de</strong>rão realizar revisões com foco<br />

nestes aspectos e assim apren<strong>de</strong>rão sobre a linguagem escrita e sobre as<br />

características próprias a cada discurso, além do que apren<strong>de</strong>rão sobre o processo<br />

<strong>de</strong> produção, que envolve planejamento e sucessivas revisões. Alguns exemplos <strong>de</strong><br />

situações com crianças peque<strong>na</strong>s: ditar ao professor <strong>uma</strong> carta a um colega<br />

enfermo, um convite, o registro <strong>de</strong> <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong>, as <strong>de</strong>scobertas <strong>de</strong> um estudo ou<br />

mesmo a reescrita <strong>de</strong> texto, vinculada a um projeto do grupo.<br />

Ao <strong>escrever</strong> por si mesmo a criança terá que gerenciar o quê <strong>escrever</strong> com o<br />

como vai <strong>escrever</strong> e, se por um lado se concentra em aspectos discursivos, <strong>na</strong><br />

a<strong>de</strong>quação ao gênero, <strong>na</strong> coerência e coesão, por outro será iminente a atenção à<br />

grafia das palavras. Devido a esta enorme <strong>de</strong>manda cognitiva, Kaufman (2011)<br />

propõe que se siga um “passo a passo”, que remonta o procedimento escritor:<br />

planejamento do texto, escrita da primeira versão, revisões orientadas com focos<br />

específicos (ocorrência <strong>de</strong> palavras repetidas, falta <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> informação, palavras<br />

e expressões <strong>de</strong> acordo com o gênero etc.).<br />

A criança que ainda não escreve convencio<strong>na</strong>lmente, ao ser solicitada a<br />

<strong>escrever</strong>, lançará mão <strong>de</strong> tudo o que sabe para po<strong>de</strong>r realizar esta tarefa: atribuir<br />

significado às marcas gráficas que faz no papel, ater-se aos critérios que ela<br />

mesma elaborou sobre a organização do sistema, perceber e iniciar a<br />

correspondência sonora em trechos escritos, consultar palavras <strong>de</strong> referência que<br />

ofereçam pistas para a escrita da palavra <strong>de</strong>sejada, consultar colegas e professor.<br />

Como as crianças constroem saberes distintos sobre a língua escrita, em razão <strong>de</strong><br />

estarem inseridas em práticas sociais diversas e possuírem diferentes esquemas <strong>de</strong><br />

assimilação, a heterogeneida<strong>de</strong> da sala <strong>de</strong> aula a constitui em um rico ambiente,<br />

que propicia a interação com outras hipóteses e ao observá-las e confrontá-las as<br />

crianças percebem quais aspectos o outro consi<strong>de</strong>ra quando da escrita <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

palavra, po<strong>de</strong>ndo assim ampliar suas possibilida<strong>de</strong>s ou ainda reformular ou<br />

35


corroborar suas hipóteses. Alguns exemplos <strong>de</strong> situações com crianças peque<strong>na</strong>s:<br />

produzir <strong>uma</strong> escrita em duplas <strong>de</strong> maneira que cada membro <strong>de</strong>sempenhe em um<br />

momento o papel <strong>de</strong> escriba e o <strong>de</strong> ditante, escritas com diferentes propósitos –<br />

lista <strong>de</strong> brinquedos que levará ao parque, <strong>uma</strong> parlenda para compor o cancioneiro<br />

do grupo, registro das informações <strong>de</strong>scobertas em um estudo etc.<br />

Nestas situações, à medida que atuam sobre a língua, as crianças constroem<br />

e avançam no conhecimento sobre a linguagem escrita. Vale ressaltar que, o que<br />

mobiliza estas <strong>proposta</strong>s não é a intenção <strong>de</strong> que a criança leia e escreva<br />

convencio<strong>na</strong>lmente ao fim da educação infantil. Mas, sim, o <strong>de</strong> promover práticas<br />

significativas que contemplem um objeto que faz parte do interesse e do universo<br />

infantil, sobre o qual as crianças constroem diferentes hipóteses explicativas,<br />

também fora da instituição escolar. Contudo, trabalhar com as práticas <strong>de</strong><br />

linguagem em sala <strong>de</strong> aula visa, por um lado “Dar às crianças ocasiões <strong>de</strong><br />

apren<strong>de</strong>r. A língua escrita é muito mais que um conjunto <strong>de</strong> formas gráficas. É um<br />

modo <strong>de</strong> a língua existir, é um objeto social, é parte <strong>de</strong> nosso patrimônio cultural”<br />

(Ferreiro, 2010, p.99) e, por outro, manter a criança constantemente envolvida e<br />

<strong>de</strong>safiada, criando conflitos cognitivos, a partir dos quais irá, continua e<br />

permanentemente, se apropriando <strong>de</strong> sua língua.<br />

Quando se afirma que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito peque<strong>na</strong>s as crianças po<strong>de</strong>m<br />

iniciar o processo <strong>de</strong> compreensão da leitura e escrita, po<strong>de</strong>-se dizer<br />

que estão se alfabetizando. Isso significa assumir o papel<br />

alfabetizador da Pré-escola. Tal compromisso não pressupõe<br />

estabelecer “ganhos” para cada ida<strong>de</strong>, nem enten<strong>de</strong>r que quando<br />

ingressam <strong>na</strong> pré-escola <strong>de</strong>vam alcançar a alfabeticida<strong>de</strong> do sistema,<br />

ou seja, não implica em <strong>uma</strong> exigência <strong>de</strong> <strong>uma</strong> escrita alfabética por<br />

parte das crianças. (CASTEDO, 1997, p.36)<br />

Ferreiro (2008, p.38) sintetiza a questão: “Deve se ensi<strong>na</strong>r a ler e a <strong>escrever</strong><br />

<strong>na</strong> pré-escola ou não? Minha resposta é simples: não se <strong>de</strong>ve ensi<strong>na</strong>r, porém <strong>de</strong>vese<br />

permitir que a criança aprenda”. Ou seja, não se <strong>de</strong>ve ter por meta que as<br />

crianças fi<strong>na</strong>lizem o segmento escrevendo convencio<strong>na</strong>lmente e, permitir que ela<br />

aprenda significa proporcio<strong>na</strong>r, <strong>de</strong>ntro da escola, intenso, mas contextualizado e<br />

significativo, contato com a leitura e a escrita. Para isso, se faz necessário um<br />

planejamento cuidadoso e criterioso quanto às suas proposições e intervenções<br />

docentes.<br />

36


2.2 Re<strong>de</strong>finindo a questão<br />

Em que consiste esse “saber” preescolar? Basicamente, em <strong>uma</strong><br />

primeira inmersión em la “cultura letrada”: Haber escuchado leer em<br />

voz alta, haber visto escribir; Haber tenido La oportunidad <strong>de</strong><br />

producir marcas intencio<strong>na</strong>les; Haber participado em actos sociales<br />

don<strong>de</strong> leer y escribir tienen sentido; haber podido plantear preguntas<br />

y obtener algún tipo <strong>de</strong> respuesta. (FERREIRO, 2008, p.25) 17<br />

Até este ponto da presente monografia há diversas referências à discussão<br />

sobre o papel alfabetizador da escola e, já no item sobre a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, se<br />

apresenta a questão da escolarização <strong>de</strong>ste segmento.<br />

Muitas publicações consultadas tratam <strong>de</strong>ssa temática, contudo, as críticas<br />

referem-se ape<strong>na</strong>s a duas formas, diametralmente opostas, <strong>de</strong> conceber a<br />

existência da escrita <strong>na</strong> escola infantil: em um polo, situam-se as práticas que<br />

evitam o contato da criança com a linguagem escrita, focando o trabalho ape<strong>na</strong>s no<br />

brincar. No outro, aquelas que antecipam e reproduzem as práticas<br />

tradicio<strong>na</strong>lmente atribuídas ao segmento posterior e que visam <strong>de</strong>senvolver as<br />

habilida<strong>de</strong>s que são consi<strong>de</strong>radas como pré-requisitos para a alfabetização.<br />

As <strong>proposta</strong>s pedagógicas pautadas <strong>na</strong> concepção construtivista, no entanto,<br />

apesar <strong>de</strong> não se apoiarem no trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> técnicas (exercício <strong>de</strong> controle motriz<br />

e discrimi<strong>na</strong>ção perceptiva, reconhecimento e cópia <strong>de</strong> letras, sílabas ou palavras,<br />

repetições em coro etc.); têm sido atualmente alvo <strong>de</strong> críticas, que <strong>de</strong>stacam que,<br />

apesar <strong>de</strong> não proporem um mo<strong>de</strong>lo mecânico da aprendizagem da leitura e da<br />

escrita, têm antecipado esta construção por parte da criança, privilegiando e<br />

<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>ndo muito tempo às intervenções <strong>na</strong> área <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> linguagem em<br />

<strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outras áreas.<br />

Contudo, como se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> tudo o que foi exposto até agora, esta<br />

questão está mal localizada. O construtivismo é um conjunto <strong>de</strong> pressupostos<br />

teóricos sobre como a criança apren<strong>de</strong>. Fundamentadas nestes princípios e<br />

apoiadas nos conhecimentos específicos <strong>de</strong> cada área, emergem diferentes<br />

<strong>proposta</strong>s didáticas e, <strong>de</strong>finir o tempo a ser <strong>de</strong>dicado a cada <strong>uma</strong> <strong>de</strong>stas áreas<br />

17<br />

Tradução livre Giulianny Russo: Em que consiste esse “saber” pré-escolar? Basicamente,<br />

em <strong>uma</strong> primeira imersão <strong>na</strong> “cultura letrada”: ter escutado ler em voz alto, ter visto<br />

<strong>escrever</strong>; ter tido a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir marcas gráficas intencio<strong>na</strong>is; ter participado<br />

em situações sociais <strong>na</strong>s quais ler e <strong>escrever</strong> têm sentido; ter podido fazer perguntas e<br />

obter respostas.<br />

37


(Práticas <strong>de</strong> Linguagem, Ciências Naturais e Sociais, Matemática e Brincar e<br />

Movimento) é <strong>uma</strong> <strong>de</strong>cisão pedagógica, que <strong>de</strong>ve estar em consonância com o<br />

currículo <strong>de</strong> cada instituição, bem como com os princípios e metas estabelecidos<br />

para cada segmento da escolarida<strong>de</strong>.<br />

Já <strong>na</strong> segunda parte <strong>de</strong>ste capítulo, apresentamos que a regulamentação e a<br />

elaboração <strong>de</strong> <strong>proposta</strong>s <strong>curricular</strong>es para a educação infantil <strong>de</strong>mandavam,<br />

necessariamente, a adoção <strong>de</strong> um arcabouço teórico que, ao <strong>de</strong>finir as concepções<br />

<strong>de</strong> infância, ensino-aprendizagem, educação da qual partem, embasava as práticas<br />

<strong>de</strong>correntes. Segundo Ferreiro (2010, p.33): “Nenh<strong>uma</strong> prática pedagógica é<br />

neutra. Todas estão apoiadas em certo modo <strong>de</strong> conceber o processo <strong>de</strong><br />

aprendizagem e o objeto <strong>de</strong>ssa aprendizagem”.<br />

Este conjunto <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong>ve estar expresso no currículo escolar que ainda,<br />

<strong>de</strong> acordo com diversos pesquisadores, <strong>de</strong>ve incluir a caracterização da escola (a<br />

faixa etária atendida; os horários; os critérios <strong>de</strong> agrupamento e os<br />

encaminhamentos esperados às distintas situações; os pressupostos teóricos,<br />

políticos e filosófico; o tipo <strong>de</strong> escola que se <strong>de</strong>seja oferecer e o tipo <strong>de</strong> aluno que<br />

se <strong>de</strong>seja formar; o contexto em que se inserem; suas metas; priorida<strong>de</strong>s;<br />

conteúdos e como os ensi<strong>na</strong>r; a organização do tempo, dos espaços e dos<br />

materiais; e o cronograma <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s previstas. (KRAMER, 1997)<br />

As Diretrizes Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL, 2010),<br />

separam as características que se referem à “Proposta Pedagógica” das que se<br />

referem ao “Currículo”.<br />

Proposta pedagógica ou projeto político pedagógico é o plano<br />

orientador das ações da instituição e <strong>de</strong>fine as metas que se<br />

preten<strong>de</strong> para a aprendizagem e o <strong>de</strong>senvolvimento das crianças que<br />

nela são educados e cuidados. É elaborado num processo coletivo,<br />

com a participação da direção, dos professores e da comunida<strong>de</strong><br />

escolar. (BRASIL, 2010, p.13)<br />

Para atingir estas metas, a escola <strong>de</strong> educação infantil elabora seu currículo,<br />

que é <strong>de</strong>finido enquanto:<br />

Conjunto <strong>de</strong> práticas que buscam articular as experiências e os<br />

saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do<br />

patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, <strong>de</strong><br />

modo a promover o <strong>de</strong>senvolvimento integral <strong>de</strong> crianças <strong>de</strong> 0 a 5<br />

anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>. (BRASIL, 2010, p.12)<br />

38


Tanto o Projeto Político Pedagógico ou Proposta Pedagógica quanto o<br />

currículo po<strong>de</strong>m ser elaborados envolvendo toda a comunida<strong>de</strong> escolar (pais,<br />

alunos, professores, gestores e funcionários), que entre outras coisas, participarão<br />

da<br />

(...) organização <strong>de</strong> diversos aspectos: os tempos <strong>de</strong> realização das<br />

ativida<strong>de</strong>s (ocasião, freqüência, duração), os espaços em que essas<br />

ativida<strong>de</strong>s transcorrem (o que inclui a estruturação dos espaços<br />

internos, externos, <strong>de</strong> modo a favorecer as interações infantis <strong>na</strong><br />

exploração que fazem do mundo), os materiais disponíveis e, em<br />

especial, as maneiras do professor exercer seu papel (organizando o<br />

ambiente, ouvindo as crianças, respon<strong>de</strong>ndo-lhes <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da<br />

maneira, oferecendo-lhes materiais, sugestões, apoio emocio<strong>na</strong>l, ou<br />

promovendo condições para a ocorrência <strong>de</strong> valiosas interações e<br />

brinca<strong>de</strong>iras criadas pelas crianças etc.) (OLIVEIRA, 2010, p.5 – grifo<br />

meu)<br />

“(...) enten<strong>de</strong>mos o currículo como o projeto que presi<strong>de</strong> as<br />

ativida<strong>de</strong>s educativas escolares, <strong>de</strong>fine suas intenções e proporcio<strong>na</strong><br />

guias <strong>de</strong> ação a<strong>de</strong>quadas e úteis para os professores, que são<br />

diretamente responsáveis pela sua execução. Para isto, o currículo<br />

proporcio<strong>na</strong> informações concretas sobre o que ensi<strong>na</strong>r, quando<br />

ensi<strong>na</strong>r, como ensi<strong>na</strong>r e quando, como e o que avaliar.” (COLL,<br />

1996, p.45)<br />

Diante <strong>de</strong>sta perspectiva, po<strong>de</strong>mos nos perguntar: como <strong>uma</strong> escola <strong>de</strong><br />

educação infantil, construtivista, po<strong>de</strong>ria organizar seu currículo <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong><br />

Linguagem, trabalhando a leitura e a escrita, sem, no entanto, escolarizar e,<br />

consequentemente, <strong>de</strong>stituir a significação <strong>de</strong> suas práticas e, ao mesmo tempo,<br />

preservar a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do segmento? Em outras palavras: é possível colocar<br />

crianças tão peque<strong>na</strong>s para refletir sobre a leitura e a escrita sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />

consi<strong>de</strong>rar as suas características e, ainda, sem que elas <strong>de</strong>ixem <strong>de</strong> fazer e<br />

<strong>de</strong>senvolver outros aspetos que são necessários e específicos <strong>de</strong>ssa etapa escolar<br />

(brincar, socialização, relações interpessoais, expressivida<strong>de</strong>, artes)? Em síntese, é<br />

possível investir <strong>na</strong> formação <strong>de</strong> leitores e <strong>de</strong> escritores sem <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar que as<br />

crianças têm ape<strong>na</strong>s três, quatro e cinco anos?<br />

Tendo em vista estes questio<strong>na</strong>mentos, faremos a análise da gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong><br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong> escola socialmente reconhecida, tanto pela comunida<strong>de</strong> escolar quanto por<br />

<strong>de</strong>mais docentes, como construtivista, cujo currículo é cuidadosa e reiteradamente<br />

39


problematizado, com o objetivo <strong>de</strong> observar como as diferentes práticas sociais <strong>de</strong><br />

uso da língua escrita articulam-se e dialogam tanto com as crianças, suas<br />

características e <strong>de</strong>mandas, como com os objetivos da série e do segmento.<br />

40


Capítulo III – <strong>Análise</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> <strong>curricular</strong> para a formação <strong>de</strong><br />

leituras e escritores <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a educação infantil<br />

É útil se perguntar através <strong>de</strong> que tipo <strong>de</strong><br />

práticas a criança é introduzida <strong>na</strong> língua escrita,<br />

e como se apresenta esse objeto no cotidiano<br />

escolar [...] Nenh<strong>uma</strong> prática pedagógica é<br />

neutra.<br />

(FERREIRO, 2010, p.32-33).<br />

À luz das concepções teóricas apresentadas, o objetivo <strong>de</strong>sta monografia é<br />

<strong>de</strong>monstrar que é possível <strong>uma</strong> organização <strong>curricular</strong> da educação infantil que<br />

favoreça o trabalho com a leitura e a escrita <strong>de</strong> modo contextualizado, significativo<br />

e sem <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar ou mesmo concorrer com as <strong>de</strong>mais <strong>de</strong>mandas da faixa etária.<br />

Para tanto, serão a<strong>na</strong>lisadas as gra<strong>de</strong>s <strong>curricular</strong>es da área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong><br />

Linguagem, dos três grupos etários que compõem este segmento <strong>na</strong> Escola Vila,<br />

bem como o planejamento sema<strong>na</strong>l <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s salas para ilustrar como a área se<br />

insere <strong>na</strong> roti<strong>na</strong>.<br />

Porém, é necessário <strong>de</strong> antemão, justificar a escolha pela análise da gra<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sta instituição escolar, bem como explicitar a estrutura e organização <strong>curricular</strong>.<br />

3.1 A Escola da Vila<br />

A Escola é <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino privada, que aten<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a educação<br />

infantil até o ensino médio. Foi fundada em 1980, com ape<strong>na</strong>s cinco salas <strong>de</strong><br />

educação infantil e o Centro <strong>de</strong> Formação e foi, por meio <strong>de</strong>ste, que a escola entrou<br />

em contato, ainda neste ano, com a obra Psicogênese da língua escrita (FERREIRO<br />

e TEBEROSKY, 1999). Des<strong>de</strong> então, tem trilhado um caminho no sentido da<br />

construção <strong>de</strong> um currículo <strong>de</strong> base construtivista, tanto em seus fundamentos<br />

quanto em sua didática, <strong>na</strong>s diferentes áreas – matemática, ciências <strong>na</strong>turais e<br />

sociais e artes -, <strong>de</strong> modo que a escola tornou-se <strong>uma</strong> referência <strong>na</strong> educação <strong>de</strong><br />

base construtivista.<br />

41


Uma vez construtivista e implicada <strong>na</strong> promoção <strong>de</strong> práticas pedagógicas<br />

coerentes, a alfabetização passa ocupar um lugar central do projeto escolar.<br />

Alfabetização aqui entendida <strong>de</strong> forma mais ampla:<br />

(...) para hacer referencia a las habilida<strong>de</strong>s lingüísticas y cognitivas<br />

necesarias para el ingreso, la apropiación y recreación <strong>de</strong> la cultura<br />

escrita que la h<strong>uma</strong>nidad ha producido a lo largo <strong>de</strong> su historia (en la<br />

ciencia, el arte y los lenguajes simbólicos y matemáticos). 18<br />

(MINISTERIO DE EDUCACIÓN, CULTURA E TECNOLOGÍA, 2006,<br />

p.19)<br />

Mais atualmente, o termo alfabetização também po<strong>de</strong> abranger conceitos<br />

como “alfabetização digital” e “alfabetização científica”. Cabe, aqui, enfatizar algo já<br />

<strong>de</strong>stacado: nesta perspectiva a alfabetização não correspon<strong>de</strong> somente ao<br />

momento da aquisição notacio<strong>na</strong>l, até mesmo porque não é possível <strong>de</strong>svincular e<br />

isolar a reflexão sobre o princípio alfabético do seu contexto <strong>de</strong> uso. No momento<br />

da produção todos estes aspectos estão em jogo e o professor não po<strong>de</strong>rá controlar<br />

as reflexões que seu aluno faz.<br />

Por esta razão, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a educação infantil as crianças <strong>de</strong>sta escola participam<br />

<strong>de</strong> situações <strong>de</strong> uso real da leitura e da escrita, ou seja, que possuem função<br />

social: leem e escrevem, por si mesmo ou por meio do professor, para se divertir,<br />

emocio<strong>na</strong>r, apreciar, para saber mais sobre um assunto ou acessar um conjunto <strong>de</strong><br />

dados que as possibilitem executar <strong>uma</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da ação (receita, regras <strong>de</strong> jogo<br />

etc.); também fazem uso da leitura e da escrita em situações relacio<strong>na</strong>das ao<br />

cotidiano escolar, tais como elaborar um convite para <strong>uma</strong> exposição, <strong>uma</strong> carta a<br />

um colega que faltou, um cartaz para a festa da escola, um e-mail solicitando<br />

materiais;selecio<strong>na</strong>m e escolhem os títulos <strong>de</strong> livros que serão relidos ou a<br />

brinca<strong>de</strong>ira do parque ou a música, entre muitas outras possibilida<strong>de</strong>s.<br />

Todas as <strong>proposta</strong>s <strong>curricular</strong>es são cuidadosamente planejadas por um<br />

profissio<strong>na</strong>l, que é coor<strong>de</strong><strong>na</strong>dor da área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem, e<br />

constantemente discutidas com a equipe do segmento, a fim <strong>de</strong> promover ajustes e<br />

aprimoramentos. A existência <strong>de</strong>sse profissio<strong>na</strong>l, que tem o papel <strong>de</strong> pensar o<br />

currículo <strong>de</strong> todo o segmento e não somente <strong>de</strong> <strong>uma</strong> das séries que o compõe e<br />

18<br />

Tradução livre Giulianny Russo: (...) para fazer referencia às habilida<strong>de</strong>s linguísticas e<br />

cognitivas necessárias ao ingresso, à apropriação e recriação da cultura escrita que a<br />

h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong> tem produzido ao longo <strong>de</strong> sua história (<strong>na</strong> ciência, <strong>na</strong> arte e <strong>na</strong>s linguagens<br />

simbólicas e matemáticas)<br />

42


ainda atuar sistematicamente <strong>na</strong> formação dos professores e no acompanhamento<br />

e avaliação <strong>de</strong> situações didáticas encaminhadas, permite olhar para a área como<br />

um todo e, em função dos objetivos que esta etapa da escolarida<strong>de</strong> possui, propor<br />

práticas coerentes <strong>na</strong>s séries, com <strong>de</strong>safios a<strong>de</strong>quados e progressivos e que<br />

transversalizem os diferentes grupos etários.<br />

O objetivo <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo formar leitores; portanto, as<br />

<strong>proposta</strong>s <strong>de</strong>vem estar centradas <strong>na</strong> construção do significado<br />

também <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo. Para construir significado ao ler, é<br />

fundamental ter constantes oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> se enfronhar <strong>na</strong> cultura<br />

do escrito, <strong>de</strong> ir construindo expectativas acerca do que po<strong>de</strong> “dizer”<br />

neste ou <strong>na</strong>quele texto (... ) <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o princípio, a escola <strong>de</strong>ve fazer as<br />

crianças participarem em situações <strong>de</strong> leitura e <strong>de</strong> escrita: é<br />

necessário ler para elas muitos e bons textos para que tenham<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer diversos gêneros e possam fazer<br />

antecipações fundandas nesse conhecimento... É necessário lhes<br />

propor também situações <strong>de</strong> produção lhes apresentarão o <strong>de</strong>safio<br />

<strong>de</strong> compor oralmente texto com <strong>de</strong>stino escrito – para serem ditados<br />

ao professor, por exemplo -; no curso <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong>, serão<br />

apresentados problemas que as levarão a <strong>de</strong>scobrir novas<br />

características da língua escrita e a se familiarizar com o ato <strong>de</strong><br />

escrita, antes <strong>de</strong> saberem <strong>escrever</strong> no sentido convencio<strong>na</strong>l do termo<br />

(LERNER, 2002, p.41)<br />

3.1.1 Estrutura Curricular<br />

O trabalho da educação infantil da Escola da Vila organiza-se em três eixos:<br />

I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e Autonomia, Comunicação e Representação (expressão pessoal e uso<br />

das diferentes linguagens expressivas – inclui as áreas <strong>de</strong> arte, música, movimento<br />

e brinca<strong>de</strong>iras, práticas <strong>de</strong> oralida<strong>de</strong>, leitura e escrita, matemática e língua inglesa)<br />

e Conhecimento <strong>de</strong> Mundo (manifestações sociais, culturais e <strong>na</strong>turais).<br />

É composta por grupos, <strong>de</strong> acordo com as faixas etárias: crianças que<br />

completam três anos até 30 <strong>de</strong> junho, fazem parte do Grupo 1 (G1), as <strong>de</strong> quatro<br />

anos, do Grupo 2 (G2) e as <strong>de</strong> cinco anos, do Grupo 3 (G3). Contudo, está previsto<br />

em seu currículo diversas ativida<strong>de</strong>s, chamadas <strong>de</strong> “Convívio”, <strong>na</strong>s quais as<br />

crianças <strong>de</strong> diferentes faixas etárias têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuarem juntas. Neste<br />

sentido, há momentos planejados para que participem juntas <strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>iras livres,<br />

<strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>iras dirigidas, <strong>de</strong> jogos, <strong>de</strong> <strong>uma</strong> ofici<strong>na</strong> <strong>de</strong> pintura, da escuta <strong>de</strong><br />

histórias, <strong>de</strong> músicas etc.<br />

43


Cada sala é composta por, aproximadamente, 22 crianças, <strong>uma</strong> professora e<br />

<strong>uma</strong> professora estagiária.<br />

O período escolar é <strong>de</strong> 5h diárias, totalizando 25h sema<strong>na</strong>is. Destas, 60<br />

minutos são <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos à aula <strong>de</strong> inglês, divididas em duas aulas <strong>de</strong> 30 minutos 19 ,<br />

no G1, e quatro aulas <strong>de</strong> 30 minutos nos G2 e G3 (120 minutos); e 40 minutos à<br />

aula <strong>de</strong> música, ambos com professores-especialistas 20 . Ainda são <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos 30<br />

minutos à visita a biblioteca da escola, <strong>na</strong> qual o responsável pela biblioteca<br />

encaminha rodas <strong>de</strong> leitura, indicação <strong>de</strong> títulos, contação <strong>de</strong> histórias,<br />

apresentação <strong>de</strong> coleções, autores, ilustradores etc., com materiais previamente<br />

selecio<strong>na</strong>dos <strong>de</strong> acordo com a faixa etária do grupo atendido, características e<br />

gostos. Ao fi<strong>na</strong>lizar, as crianças exploram/manuseiam os livros e escolhem aquele<br />

que <strong>de</strong>seja realizar o empréstimo.<br />

O restante do tempo (aproximadamente 22h) é <strong>de</strong>dicado aos <strong>de</strong>mais<br />

componentes <strong>curricular</strong>es: Práticas <strong>de</strong> Linguagem, Matemática, Ciências Naturais e<br />

Sociais, Brincar e Movimento e Artes, além dos cuidados relacio<strong>na</strong>dos à higiene e<br />

alimentação. Vale salientar que as áreas <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem, Artes e Brincar<br />

ocupam a mesma carga horária, pois têm a mesma importância no currículo.<br />

3.1.2 Organização Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem<br />

A gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> da área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem <strong>na</strong> educação infantil da<br />

Escola da Vila está organizada em três eixos e todos eles articulam as diferentes<br />

competências linguísticas <strong>de</strong> ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar aos propósitos sociais a<br />

que se <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>m: “Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário” -<br />

para se divertir, emocio<strong>na</strong>r, conhecer outros mundos possíveis e refletir sobre o<br />

próprio; “Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar” -<br />

para saber mais sobre um tema ou comunicar o que apren<strong>de</strong>u; e “Eixo 3 - <strong>Ler</strong>,<br />

<strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar” - para organização da<br />

roti<strong>na</strong> diária, inserindo as práticas <strong>de</strong> linguagem <strong>na</strong>s ocorrências do dia-a-dia.<br />

19<br />

Apesar da <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>ção “aula”, as <strong>proposta</strong>s encaminhadas nesta área são bem distintas<br />

do que o termo “aula” po<strong>de</strong> nos remeter. Nestas duas ocasiões a professora <strong>de</strong> inglês<br />

encaminha situações da roti<strong>na</strong> do grupo: lanche, brinca<strong>de</strong>ira, música, artes, história.<br />

20<br />

Vale ressaltar que outras <strong>proposta</strong>s <strong>na</strong> área <strong>de</strong> música são encaminhadas pela professora<br />

da sala em outros momentos.<br />

44


Para cada eixo estão relacio<strong>na</strong>dos os respectivos fazeres 21 do leitor, escritor,<br />

falante e ouvinte. Por exemplo, para o Eixo 1, um dos fazeres <strong>de</strong>scritos é: “<strong>Ler</strong> ou<br />

escutar histórias atentamente por entretenimento e apreciação”. Em seguida, são<br />

citados os meses do ano em que as diferentes <strong>proposta</strong>s didáticas, referentes<br />

àquele eixo, serão <strong>de</strong>senvolvidas.<br />

As situações didáticas estão organizadas <strong>de</strong> modo a<br />

“articular os propósitos didáticos (...) com propósitos comunicativos<br />

que tenham um sentido “atual” para o aluno e tenham<br />

correspondência com os que habitualmente orientam a leitura e a<br />

escrita fora da escola” (LERNER, 2002, p.22)<br />

E se concretizam por meio das modalida<strong>de</strong>s organizativas: projetos,<br />

sequências <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s, ativida<strong>de</strong>s habituais e situações in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes -<br />

ocasio<strong>na</strong>is.<br />

Os projetos são situações didáticas <strong>na</strong>s quais o professor e os alunos<br />

encontram-se comprometidos com a realização <strong>de</strong> um propósito e um produto fi<strong>na</strong>l<br />

e que contam com <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>tários externos à sala <strong>de</strong> aula (pais, grupos <strong>de</strong> colegas <strong>de</strong><br />

outras classes, funcionários da escola etc.). As ações que são <strong>proposta</strong>s guardam<br />

em si as relações necessárias e ganham sentido em função daquilo que se <strong>de</strong>seja<br />

produzir.<br />

Já as sequências constituem-se por ativida<strong>de</strong>s que abordam um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do<br />

fazer leitor e escritor: ler diferentes títulos <strong>de</strong> um mesmo gênero, autor ou tema.<br />

Diferentemente dos projetos, as sequências não têm compromisso com a<br />

socialização <strong>de</strong> um produto fi<strong>na</strong>l, embora contemplem propósitos comunicativos.<br />

As ativida<strong>de</strong>s habituais são aquelas que “se reiteram <strong>de</strong> forma sistemática e<br />

previsível” (LERNER, 2002, p.88) durante um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do período e com certa<br />

periodicida<strong>de</strong>, por exemplo: duas vezes por sema<strong>na</strong> ao longo <strong>de</strong> três meses, ou<br />

diariamente por todo ano entre outras combi<strong>na</strong>ções possíveis que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da<br />

importância atribuída a um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do conteúdo.<br />

21<br />

Tradução da palavra “quehacer” em espanhol para se referir ao conjunto <strong>de</strong> ações que o<br />

leitor, escritor, falante e ouvinte realizam. Por exemplo, um fazer leitor é antecipar o que<br />

está escrito em função do gênero, autor, ilustrações, extensão e verificar estas antecipações<br />

à medida que lê, comentar, recomendar e discutir. Quanto aos fazeres dos escritos estão: o<br />

planejar, textualizar, revisar muitas vezes e se <strong>de</strong>slocar ao papel do futuro leitor. Em<br />

português, a expressão utilizada para se referir a estes fazeres é “comportamento do leitor”<br />

e “comportamento do escritor”. (LERNER, 2002)<br />

45


Nas situações in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes encontramos dois subgrupos, os das situações<br />

ocasio<strong>na</strong>is e <strong>de</strong> sistematização. Ambas in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m dos propósitos dos projetos,<br />

sequências e ativida<strong>de</strong>s habituais, mas são justificadas à medida que a primeira, as<br />

situações ocasio<strong>na</strong>is, garantem espaço para aquelas situações imprevistas, mas<br />

que são valiosas compartilhar com as crianças, por exemplo, escrita <strong>de</strong> <strong>uma</strong> carta<br />

para um amigo ausente, <strong>de</strong>bate em função <strong>de</strong> um tema veiculado <strong>na</strong> mídia, a<br />

publicação <strong>de</strong> um livro ou pesquisas que não correspon<strong>de</strong>m aos trabalhos que o<br />

grupo está realizando num dado momento. No caso das situações <strong>de</strong><br />

sistematização, apesar <strong>de</strong> não estarem em função dos propósitos didáticos das<br />

outras modalida<strong>de</strong>s, estão a serviço <strong>de</strong>les, pois sistematizam os conhecimentos que<br />

foram construídos.<br />

Vale ressaltar que, <strong>na</strong> educação infantil da Escola da Vila, não são<br />

trabalhadas situações <strong>de</strong> sistematização <strong>de</strong> conteúdo, dadas as características do<br />

segmento e objetivos da área, qual seja: “incorporar as crianças à comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

leitores e escritores; (...) formar os alunos como cidadãos da cultura escrita”.<br />

(LERNER, 2002, p.56)<br />

3.2 Gra<strong>de</strong> Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem<br />

Como apresentado anteriormente, a gra<strong>de</strong> organiza-se, para os três grupos<br />

(G1, 2 e 3) em três eixos: Eixo 1 - ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do<br />

literário, Eixo 2 - ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar e<br />

Eixo 3 - ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar. A seguir,<br />

a<strong>na</strong>lisaremos cada um <strong>de</strong>les. Importa informar que a análise foi pautada tanto <strong>na</strong>s<br />

gra<strong>de</strong>s <strong>curricular</strong>es da área, estruturadas por grupo (cada eixo é contemplado em<br />

cada grupo do segmento) e também em documentos <strong>curricular</strong>es, que trazem<br />

justificativas, conteúdos, etapas e orientações didáticas para as sequências e os<br />

projetos previstos.<br />

3.2.1 Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário<br />

La literatura educa, porque es arte. Enseña el sentido <strong>de</strong> la belleza,<br />

la magia que pue<strong>de</strong> brindar la combi<strong>na</strong>ción <strong>de</strong> palabras utilizadas por<br />

un escritor. Cuando u<strong>na</strong> perso<strong>na</strong> lee mucho <strong>de</strong>sarrolla un sentido<br />

selectivo <strong>de</strong> los textos, crece como lector y se vuelve cada vez más<br />

46


exigente con los libros, porque reconoce la calidad literaria y la<br />

belleza que contiene. (DIRECCIÓN GENERAL DE CULTURA Y<br />

EDUCACIÓN, 2008, p.52)<br />

Para se formar como leitor <strong>de</strong> literatura é importante que a criança<br />

experimente diferentes situações reais <strong>de</strong> leitura, situações vivenciadas por leitores<br />

experientes, tais como, ler livros <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do autor ou gênero, bem como<br />

aqueles cujo interesse incida sobre o perfil do perso<strong>na</strong>gem ou temática. Cabe<br />

<strong>de</strong>stacar também que um leitor aprecia obras porque sabe o que olhar nela, porque<br />

tem vários observáveis. Isso não é algo que <strong>na</strong>sce com o leitor, mas <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> suas<br />

experiências ao viver em <strong>uma</strong> comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitores, ao conversar sobre<br />

literatura, ao indicar e receber indicações <strong>de</strong> livros etc.<br />

A educação infantil tem <strong>uma</strong> importância fundamental <strong>na</strong> vinculação da<br />

criança à literatura; ao longo <strong>de</strong>sse segmento as crianças leem por meio do<br />

professor <strong>uma</strong> infinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> títulos, ampliando assim seu repertório cultural.<br />

Espera-se, ainda, que possam “ouvir histórias para se divertir, se emocio<strong>na</strong>r,<br />

conhecer outros mundos possíveis e refletir sobre o próprio” 22 .<br />

Os fazeres leitor, escritor, falante e ouvinte neste eixo, <strong>de</strong> modo geral, se<br />

repetem ao longo dos três anos da educação infantil e alguns <strong>de</strong>le se mantêm ao<br />

longo <strong>de</strong> toda a escolarida<strong>de</strong>, como: <strong>Ler</strong> ou ouvir histórias atentamente por<br />

entretenimento e apreciação e Participar <strong>de</strong> <strong>uma</strong> comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitores literários.<br />

O quadro abaixo apresenta como estes fazeres estão organizados ao longo<br />

do segmento e como eles são revisitados <strong>na</strong>s séries seguintes:<br />

22<br />

Trecho extraído do material apresentado <strong>na</strong>s aulas <strong>de</strong> Didática, da pós-graduação em<br />

Alfabetização, da Escola da Vila, ministradas pela Profa. Andréa Luize.<br />

47


Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário<br />

G1<br />

Escrever/<br />

ditar<br />

trechos <strong>de</strong><br />

histórias<br />

para que<br />

outros<br />

apreciem<br />

G2 -<br />

G3<br />

Comentar<br />

e escutar<br />

comentário<br />

s sobre o<br />

lido/ouvido<br />

Comentar e<br />

escutar<br />

comentário<br />

s sobre as<br />

histórias<br />

Escrever/<br />

ditar<br />

trechos <strong>de</strong><br />

histórias<br />

para que<br />

outros<br />

apreciem<br />

Indicar<br />

livros<br />

Escutar e<br />

ditar ao<br />

professor<br />

indicações<br />

literárias<br />

<strong>Ler</strong> ou<br />

ouvir<br />

histórias<br />

atentament<br />

e por<br />

entretenim<br />

ento e<br />

apreciação<br />

Narrar<br />

oralmente<br />

histórias<br />

conhecidas<br />

Participar<br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

comunidad<br />

e <strong>de</strong><br />

leitores<br />

literários<br />

Recitar<br />

parlendas e<br />

poemas<br />

-<br />

Refletir<br />

sobre o<br />

sistema <strong>de</strong><br />

escrita<br />

avançando<br />

rumo à<br />

leitura e à<br />

escrita<br />

convencion<br />

al<br />

As crianças têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se aproximar sucessivas vezes e <strong>de</strong><br />

maneiras diferentes dos conteúdos relacio<strong>na</strong>dos à formação literária. Os<br />

planejamentos sema<strong>na</strong>is (conhecido também como semanário ou roti<strong>na</strong> sema<strong>na</strong>l)<br />

das professoras dos três grupos evi<strong>de</strong>nciam a importância atribuída a esse<br />

trabalho, que é realizado diariamente, seja pelas ativida<strong>de</strong>s habituais diárias <strong>de</strong><br />

leitura, seja por meio dos projetos e sequências <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s.<br />

A seguir, po<strong>de</strong>mos observar, como exemplo, o planejamento <strong>de</strong> um Grupo 2,<br />

as setas vermelhas indicam a ocorrência <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s em torno do literário.<br />

48


16ª sema<strong>na</strong><br />

G2D/Paula<br />

CANTOS<br />

13h30 – 14h<br />

BANHEIRO<br />

14h – 14h10<br />

RODA<br />

14h10 – 14h30<br />

BRINCADEIRA<br />

14h30 – 14h50<br />

ARTE<br />

14h50 – 15h10<br />

23/05 24/05 25/05 26/05 27/05<br />

segunda-feira terça-feira quarta-feira quinta-feira sexta-feira<br />

Ma<strong>de</strong>irinha com<br />

Cantos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho: Fantasias e acessórios Teatro <strong>de</strong> fantoches<br />

ferramentas<br />

suportes circulares, todos Pula macaco<br />

(arr<strong>uma</strong>r mesa,<br />

Bingo (acompanhar) os meios secos<br />

Caba<strong>na</strong><br />

ca<strong>de</strong>iras)<br />

Zoob<br />

Bingo <strong>de</strong> nomes<br />

Quebra-cabeça<br />

Jogo da memória<br />

(acompanhar)<br />

Pinos mágicos<br />

Trilha até 50<br />

Barbantes do pai do<br />

Marcão<br />

Médico<br />

Pula Macaco<br />

Poesias <strong>na</strong>s<br />

mesas<br />

Chamar crianças para<br />

<strong>escrever</strong> comentários da<br />

visita dos pais<br />

Todos juntos Todos juntos Todos juntos Todos juntos Todos juntos<br />

-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />

- Entrevista Karin (mãe<br />

Camila)<br />

-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />

- Número oculto<br />

Piaba - Biblioteca (14h15<br />

às 14h45) Poesia <strong>na</strong><br />

pasta<br />

Desenho: com<br />

interferências <strong>de</strong> lixa<br />

Suporte: QD<br />

Meio: giz <strong>de</strong> cera FOTO<br />

5ª Roda <strong>de</strong> critérios<br />

<strong>de</strong> seleção <strong>de</strong> livro<br />

da biblioteca<br />

-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />

- Roda: tematizar<br />

contagem com 2 dados<br />

-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />

- Leitura <strong>de</strong> nomes:<br />

Lucas e Thomas<br />

-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />

- Profissões: listar<br />

perguntas para<br />

Fabia<strong>na</strong><br />

Peixe tralhoto Ensaio da festa juni<strong>na</strong> Farinhada<br />

Apreciação Leda Catunda<br />

– espírito do jardim.<br />

Gravar discussão.<br />

Passar camada <strong>de</strong><br />

cola <strong>na</strong>s argilas<br />

LANCHE<br />

Pic Nic Na sala mesas separadas Na Sala mesas separadas Pic Nic com G2C Na sala, banquete<br />

15h10 – 15h40<br />

PARQUE<br />

Inglês (16h30 às 17h) Inglês (16h às 16h30)<br />

15h40 – 16h40<br />

Teacher conta história<br />

ATIVIDADE 3<br />

16h40 – 17h Relaxamento Relaxamento Relaxamento Relaxamento Relaxamento<br />

HISTÓRIA<br />

17h – 17h20<br />

Conversa sobre o parque Entrevista Luisa (mãe<br />

Ernest)<br />

Música (17h10 às 17h50) Inglês (17h às 17h30) - Mais<br />

Brasileirinhos<br />

- Histórias para<br />

todos os dias<br />

ATIVIDADE 4<br />

17h20 – 17h40<br />

DESENHO<br />

17h40 – 18h<br />

SAÍDA<br />

- Mais<br />

Brasileirinhos<br />

Thaís escolhe e conta<br />

Inglês (17h30 às 18h)<br />

Arr<strong>uma</strong>ção<br />

Guardar squeeze<br />

Massagem<br />

Moradias, casas<br />

Suporte: A4<br />

Meio: canetinha<br />

Arr<strong>uma</strong>ção<br />

Guardar squeeze<br />

- Mais<br />

Brasileirinhos<br />

- Coleção do Sapo<br />

Arr<strong>uma</strong>ção<br />

Guardar squeeze<br />

- Mais<br />

Brasileirinhos<br />

- Superamigos<br />

-Suporte: circulo com um<br />

buraco no meio<br />

- Meio: canetinha<br />

Arr<strong>uma</strong>ção<br />

Guardar squeeze<br />

Ofici<strong>na</strong> <strong>de</strong> convívio:<br />

prendas juni<strong>na</strong>s<br />

- Suporte: AA4<br />

-Meio: canetão<br />

Arr<strong>uma</strong>ção<br />

Guardar squeeze


A recorrência do gênero poesia se <strong>de</strong>ve à sequência <strong>de</strong> leituras <strong>de</strong><br />

poemas <strong>de</strong> um dado autor ou ilustrador (no caso, Lalau e Laura Beatriz,<br />

criadores do livro “Mais Brasileirinhos” 23 , que aparece citado nos momentos<br />

da história).<br />

Esta sequência é realizada entre os meses <strong>de</strong> abril e junho, com o<br />

propósito <strong>de</strong> ampliar o repertório <strong>de</strong> poemas, que serão utilizados em um<br />

recital para funcionários e colegas <strong>de</strong> outras turmas. Este é o produto fi<strong>na</strong>l <strong>de</strong><br />

um projeto, <strong>de</strong>senvolvido em junho e agosto, cujo foco principal resi<strong>de</strong> <strong>na</strong>s<br />

práticas <strong>de</strong> oralida<strong>de</strong>. É importante ressaltar que, a utilização da palavra<br />

“ampliar”, no início do parágrafo, foi intencio<strong>na</strong>l, primeiro porque parte-se do<br />

pressuposto <strong>de</strong> que o texto poético não é restrito ao âmbito escolar e que as<br />

crianças têm ou po<strong>de</strong>m ter acesso a ele fora da escola, tanto por meio <strong>de</strong><br />

livros, quanto pelas mídias e mesmo pela música. Segundo, porque, além<br />

disso, a escuta e a récita <strong>de</strong> poemas é <strong>uma</strong> das ativida<strong>de</strong>s habituais,<br />

realizada durante todo o ano, no Grupo 1. 24<br />

Nestes momentos, a criança está apreciando a leitura ou récita do<br />

poema, realizada pela professora, e se divertindo com os efeitos sonoros que<br />

observa, com o jogo com as palavras que percebe, mas que nem sempre<br />

sabe nomear ou produzir. Conforme a criança tem a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ler e<br />

escutar outras vezes o mesmo poema, poemas diferentes, no caso, poemas<br />

do mesmo autor, ela começa a estabelecer relações, fazer comparações e a<br />

criar hipóteses sobre o gênero, sobre como é o autor, seus gostos, temas,<br />

motivações e estilos, bem como refletir sobre a linguagem poética <strong>na</strong> qual “a<br />

forma <strong>de</strong> dizer adquire um valor específico”. (LERNER, 2002, p.82).<br />

Ao terem como propósito comunicativo a apresentação <strong>de</strong> um recital<br />

<strong>de</strong> poemas para os funcionários da escola e colegas <strong>de</strong> outras turmas,<br />

23<br />

Lalau e Laura Beatriz. Mais Brasileirinhos. Coleção Brasileirinhos. Ed. Cosac Naify.<br />

24<br />

Propostas <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong> poemas retor<strong>na</strong>m em diversos momentos da escolarida<strong>de</strong>,<br />

o que não quer dizer que, <strong>na</strong> série em que ele não apareça enquanto prática social<br />

privilegiada, ele não seja contemplado nos momentos <strong>de</strong> leituras diversas.<br />

50


cumprirão os diferentes propósitos didáticos relacio<strong>na</strong>dos aos objetivos <strong>de</strong>sse<br />

projeto. Isso ocorrerá <strong>de</strong> modo contextualizado e significativo, pois cada<br />

etapa do trabalho é fundamental para a concretização do produto fi<strong>na</strong>l. Por<br />

exemplo:<br />

1. Para fazermos um recital é necessário escolher que poema cada um<br />

ou grupo irá apresentar, para escolher um é necessário conhecer alguns,<br />

portanto, justificam-se os momentos <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong> poemas e <strong>de</strong> conversa<br />

sobre.<br />

Propósitos didáticos: Ampliação do repertório literário, compartilhar o<br />

efeito que <strong>uma</strong> obra literária produz; comentar os poemas que ouve,<br />

trocando opiniões sobre o mesmo; confrontar interpretações <strong>de</strong> um texto<br />

literário; familiarização com o tipo <strong>de</strong> texto.<br />

2. Para recitar é necessário conhecer bem o poema e ensaiar antes <strong>de</strong><br />

apresentar.<br />

Propósitos didáticos: Ter compreendido o poema que irá recitar;<br />

observar e comentar a recitação <strong>de</strong> poemas feita pelo professor ou outros<br />

adultos; respeitar as rimas e expressões, mantendo-as; a<strong>de</strong>quar o volume da<br />

voz ao público ouvinte e ao espaço on<strong>de</strong> será realizada a leitura; utilizar-se<br />

<strong>de</strong> recursos da voz para enfatizar trechos ou mostrar sentimentos (falar mais<br />

alto, falar com voz triste, falar mais rapidamente...).<br />

As ações que as crianças realizam ganham sentido em função do que<br />

se quer realizar e as <strong>proposta</strong>s encaminhadas em sala <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser um<br />

exercício ou <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> escolar que não se relacio<strong>na</strong> com o que existe no<br />

mundo real, fora da escola.<br />

Motivados em seus propósitos as crianças se empenharão e<br />

construirão saberes - o que não significa absolutamente que trabalharão <strong>de</strong><br />

maneira exaustiva neste percurso. Como se po<strong>de</strong> observar, as ativida<strong>de</strong>s<br />

relacio<strong>na</strong>das à sequência <strong>de</strong> leitura ocorreram diariamente, mas ocuparam,<br />

fundamentalmente, o momento da roda <strong>de</strong> história, que tem duração <strong>de</strong> 20<br />

51


minutos. Na terça-feira, esse momento aconteceu <strong>na</strong> roda <strong>de</strong> biblioteca e <strong>na</strong><br />

segunda-feira, aparece ainda como <strong>proposta</strong> <strong>de</strong> um dos cantos <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s<br />

diversificadas.<br />

Assim como este exemplo, outras sequências <strong>de</strong> leitura literária são<br />

<strong>proposta</strong>s ao longo do segmento e constam <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong>, entre elas:<br />

3;<br />

Sequência <strong>de</strong> perseguir um autor – Eva Fur<strong>na</strong>ri – <strong>na</strong>s turmas <strong>de</strong> Grupo<br />

Sequência <strong>de</strong> perseguir coleções – como a da Estela (Coleção da<br />

Editora Brinque Book) - <strong>na</strong>s turmas <strong>de</strong> Grupo 1.<br />

A presença da literatura <strong>na</strong> infância é um tema que tem sido muito<br />

discutido no que concerne às suas fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>s: pedagógicas – utilizando a<br />

literatura para ensi<strong>na</strong>r algo; ou poética – ligada a função estética, ao prazer.<br />

Contudo, é indiscutível a pertinência e importância da literatura para os<br />

pequenos, pois, enquanto manifestação cultural artística h<strong>uma</strong><strong>na</strong>, possibilita<br />

criar e fantasiar, por meio da linguagem, um mundo alter<strong>na</strong>tivo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias,<br />

emoções e sensações:<br />

(...) escuchar um cuento, um poema o ver u<strong>na</strong> obra <strong>de</strong> teatro<br />

(...) son experiencias sensibles, comparables a oír música,<br />

asistir a um espectáculo <strong>de</strong> danza, mirar u<strong>na</strong> fotografía o ver<br />

u<strong>na</strong> película (GOBIERNO DE LA CIUDAD AUTÓNOMA DE<br />

BUENOS AIRES, 2000, V4, p.323).<br />

Por estas razões, o discurso pedagógico é unânime ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r o<br />

trabalho sistemático e intenso com a literatura <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>,<br />

senão antes. Este aspecto parece contemplado no currículo da escola que<br />

a<strong>na</strong>lisamos.<br />

52


3.2.2 Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar<br />

Outra função social da linguagem, que é privilegiada no currículo <strong>de</strong><br />

Práticas <strong>de</strong> linguagem, é o ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para saber mais<br />

sobre um tema ou compartilhar o que sabe.<br />

Além <strong>de</strong> ser um fazer do leitor - localizar materiais que o aju<strong>de</strong>m a<br />

respon<strong>de</strong>r/sa<strong>na</strong>r suas dúvidas, localizar no material qual parte lhe serve,<br />

sem, necessariamente, ter que ler tudo para encontrar a informação, usando,<br />

assim, pistas que o texto oferece, e concluir algo a partir das informações<br />

encontradas - este é um procedimento que está muito relacio<strong>na</strong>do aos<br />

fazeres dos estudantes, já que a pesquisa é estratégia didática muito<br />

utilizada <strong>na</strong> escola e, porque não afirmarmos, também fora <strong>de</strong>la.<br />

Contudo, a concepção <strong>de</strong> pesquisa com a qual a Escola da Vila<br />

partilha, pautada nos estudos e produções argenti<strong>na</strong>s, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> didática,<br />

difere do que é tradicio<strong>na</strong>lmente realizado <strong>na</strong>s escolas: um recorte<br />

bibliográfico, em geral, enciclopédico, do tema pesquisado, que se faz<br />

individualmente ou em grupos, como tarefa escolar, e muitas vezes como<br />

tarefa para casa, e sem orientação <strong>de</strong> alguém que conheça os procedimentos<br />

implicados no pesquisar e que tão pouco tenha em vista os objetivos que a<br />

tarefa <strong>de</strong>seja cumprir. Nestes mol<strong>de</strong>s, não faz sentido pensar a pesquisa no<br />

contexto da educação infantil, pois seria <strong>uma</strong> tarefa realizada pelo adulto e<br />

absolutamente sem relevância para o aprendiz, além <strong>de</strong> meramente<br />

burocrática, que existe somente no âmbito escolar e que não fornece à<br />

criança as ferramentas que precisará quando quiser pesquisar algo para<br />

respon<strong>de</strong>r a seus interesses e curiosida<strong>de</strong>s pessoais.<br />

<strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, falar e ouvir com o propósito <strong>de</strong> saber mais sobre um<br />

tema <strong>de</strong> interesse coloca a criança em contato com outro tipo <strong>de</strong> texto para<br />

além dos literários: os textos informativos. Em geral, estes materiais<br />

(enciclopédias, artigos e livros científicos) não são produzidos para o público<br />

infantil, mas são estes que existem com a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> veicularem e<br />

53


divulgarem as informações científicas e, portanto, será com este tipo <strong>de</strong><br />

material com o qual a criança irá interagir toda vez que quiser buscar<br />

conhecimentos, validados, <strong>de</strong>sta <strong>na</strong>tureza.<br />

Na educação infantil, o contato com estas publicações acontecerá com<br />

a mediação do professor que hora irá atuar com mo<strong>de</strong>lo, hora como<br />

instrumento - lerá trechos apontados pelos alunos, para que confirmem ou<br />

não suas hipóteses e <strong>escrever</strong>á o que ditarem -, e hora como<br />

problematizador: colocará em discussão os diferentes achados e estratégias<br />

utilizadas, favorecendo a construção do conhecimento e sua circulação no<br />

grupo.<br />

Assim como no Eixo 1, alguns fazeres do leitor, escritor, falante e<br />

ouvinte permanecem ao longo <strong>de</strong> todo o segmento e outros se mantêm, mas<br />

agregam os saberes já construídos nos anos anteriores.<br />

Os fazeres, relacio<strong>na</strong>dos a localizar informações precisas em imagens<br />

(estáticas ou em movimento) e em textos, se referem aos procedimentos<br />

que são realizados por aquele que pesquisa: em qualquer momento da<br />

escolarida<strong>de</strong> ou mesmo fora do contexto escolar, quando se vai buscar <strong>uma</strong><br />

informação, o sujeito interessado <strong>de</strong>verá i<strong>de</strong>ntificar quais dados, presentes<br />

nos portadores utilizados, respon<strong>de</strong>m a sua questão.<br />

54


Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar<br />

G1<br />

G2<br />

G3<br />

Comunicar<br />

oralmente,<br />

por escrito e<br />

por <strong>de</strong>senho<br />

informações<br />

aprendidas;<br />

Localizar<br />

informações<br />

precisas em<br />

imagens<br />

(estáticas e<br />

em<br />

movimento)<br />

que lê;<br />

Localizar<br />

informações<br />

precisas em<br />

textos que<br />

ouve/lê;<br />

Ouvir textos<br />

informativos<br />

diversos,<br />

entre eles,<br />

legendas e<br />

trechos <strong>de</strong><br />

verbetes;<br />

Ouvir textos<br />

informativos<br />

diversos,<br />

entre eles,<br />

legendas,<br />

esquemas,<br />

tabelas e<br />

trechos <strong>de</strong><br />

verbetes;<br />

Conhecer<br />

alguns<br />

portadores<br />

<strong>de</strong> textos<br />

informativos<br />

;<br />

Reconhecer<br />

portadores<br />

<strong>de</strong> textos<br />

informativos<br />

específicos<br />

para os<br />

temas <strong>de</strong><br />

estudo;<br />

Reconhecer<br />

alguns<br />

portadores<br />

<strong>de</strong> textos<br />

informativos<br />

Refletir<br />

sobre o<br />

sistema <strong>de</strong><br />

escrita<br />

avançando<br />

rumo à<br />

leitura e à<br />

escrita<br />

convencio<strong>na</strong>l<br />

Por isso, estes procedimentos estarão presentes em qualquer situação<br />

didática ou social que impliquem o propósito informativo. Embora as<br />

pesquisas envolvam temas científicos, importa esclarecer que o foco maior<br />

das <strong>proposta</strong>s está <strong>na</strong> interação das crianças com estes importantes<br />

procedimentos: usar índices dos portadores para localizar a pági<strong>na</strong> <strong>de</strong>sejada;<br />

questio<strong>na</strong>r-se e explorar textos em busca <strong>de</strong> respostas; registrar, <strong>de</strong> formas<br />

diversas, o que se apren<strong>de</strong> etc.<br />

Comunicar o que foi aprendido, por sua vez, socializando as<br />

<strong>de</strong>scobertas é <strong>uma</strong> tarefa que está intrinsecamente relacio<strong>na</strong>da ao fazer<br />

científico: realiza-se <strong>uma</strong> pesquisa, um estudo, com a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

respon<strong>de</strong>r a <strong>uma</strong> <strong>de</strong>manda social, portanto, não faz sentido <strong>uma</strong> pesquisa <strong>de</strong><br />

<strong>na</strong>tureza científica que não divulgue os seus achados.<br />

A ação <strong>de</strong> comunicar o que foi aprendido também se conecta aos<br />

propósitos do projeto didático, quando da realização <strong>de</strong> um produto fi<strong>na</strong>l,<br />

dando sentido às etapas do estudo, por exemplo: para se produzir <strong>uma</strong><br />

revista <strong>de</strong> “Você Sabia” sobre os animais polares (produto fi<strong>na</strong>l e situação<br />

55


comunicativa, <strong>na</strong> qual se comunica o que foi aprendido), há <strong>de</strong> se estudar e<br />

apren<strong>de</strong>r informações que irão compor os textos <strong>de</strong> “Você sabia que...”.<br />

No entanto, <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> da educação infantil da Escola da Vila,<br />

optou-se por esta estratégia didática ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong>s <strong>proposta</strong>s ligadas ao fazer<br />

literário. Esta escolha se justifica pela <strong>na</strong>tureza dos objetos <strong>de</strong> cada<br />

<strong>proposta</strong>: o objeto do projeto recital <strong>de</strong> poesia é o poema, do cancioneiro é a<br />

cantiga. Produzir algo é o que motiva o aluno a <strong>de</strong>dicar-se a cada etapa: do<br />

ponto <strong>de</strong> vista da criança, ela não está escutando muitos poemas, porque a<br />

professora quer, mas porque precisa conhecer muitos, para po<strong>de</strong>r escolher<br />

qual irá apresentar; não está pensando sobre a característica do texto escrito<br />

nos contos <strong>de</strong> fadas, porque faz parte da aula, mas para po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>cidir quais<br />

palavras irá utilizar e que combi<strong>na</strong>rão com o que vai produzir.<br />

Eixo 2 - <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar<br />

Grupo 1<br />

Grupo 2 Grupo 3<br />

Ativida<strong>de</strong><br />

habitual<br />

Sequência<br />

Ativida<strong>de</strong><br />

habitual<br />

Sequência<br />

Ativida<strong>de</strong><br />

habitual<br />

Sequência<br />

Composição<br />

do álbum A<br />

gente <strong>de</strong><br />

quem a<br />

gente gosta<br />

(marcos <strong>de</strong><br />

crescimento)<br />

. Produção e<br />

ditado<br />

individual <strong>de</strong><br />

legendas<br />

A infância<br />

dos avós –<br />

Ditado <strong>de</strong><br />

relatos das<br />

visitas <strong>de</strong><br />

avós<br />

Pesquisa<br />

coletiva<br />

sobre<br />

filhotes<br />

eleitos/<br />

Conhecer<br />

profissões:<br />

entrevista<br />

com<br />

funcionários<br />

da escola e<br />

pais<br />

Pesquisa<br />

sobre animal<br />

do fundo do<br />

mar/<br />

exposição do<br />

percurso em<br />

um mural<br />

Escuta <strong>de</strong><br />

textos<br />

jor<strong>na</strong>lísticos<br />

e <strong>de</strong><br />

convites <strong>de</strong><br />

eventos<br />

culturais<br />

Crescer índio<br />

- exposição<br />

oral<br />

Pesquisa<br />

fau<strong>na</strong><br />

brasileira -<br />

mural<br />

Contudo, no caso do texto científico, o que mobiliza o aluno é a própria<br />

curiosida<strong>de</strong> que o tema <strong>de</strong>sperta e que se relacio<strong>na</strong> a outras áreas <strong>de</strong><br />

conhecimento, por exemplo: as crianças se interessam em pesquisa sobre os<br />

filhotes, a fau<strong>na</strong> brasileira, os animais do fundo mar ou sobre infância do<br />

56


índio (ciências <strong>na</strong>turais e/ou sociais), porque são temas <strong>de</strong> seu interesse e<br />

não porque vão fazer um livro ou mesmo o mural. Neste caso, o mural e a<br />

exposição oral servem para colecio<strong>na</strong>r, controlar e comunicar as <strong>de</strong>scobertas,<br />

mas não é a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> compartilhar isso com um público externo o que<br />

motiva o estudo. Aqui, está em jogo, essencialmente, que as crianças se<br />

informem sobre o tema <strong>de</strong> pesquisa.<br />

Vale ressaltar, no entanto, que utilizar temas <strong>de</strong> outras áreas,<br />

absolutamente significa, por si só, que se trata <strong>de</strong> um projeto ou sequência<br />

didática <strong>na</strong> área abrangida, algo já citado. Os objetivos <strong>de</strong>stes estudos são os<br />

procedimentos <strong>de</strong> leitura e escrita no contexto da pesquisa, portanto, saber o<br />

peso da foca-leopardo ou apren<strong>de</strong>r sobre a sua alimentação não é o<br />

propósito didático <strong>de</strong>sta situação, mas sim as estratégias <strong>de</strong> como localizar<br />

estes dados: saber que o tipo <strong>de</strong> informação é buscada para restringir o<br />

campo <strong>de</strong> procura, por exemplo, os dados numéricos são pistas <strong>de</strong> on<strong>de</strong> se<br />

po<strong>de</strong> encontrar o peso do animal? As imagens e os ícones próximos ao texto<br />

indicam sobre o que ele trata? Entre outros.<br />

As crianças se apropriam dos procedimentos <strong>de</strong> pesquisa à medida que<br />

a realizam, contudo, neste momento da escolarida<strong>de</strong>, em que não têm<br />

muitas experiências nesta área, o professor terá o papel fundamental <strong>de</strong><br />

oferecer mo<strong>de</strong>los e, por isso, quase todas as ativida<strong>de</strong>s são centradas em<br />

sua atuação, ainda que, do Grupo 1 ao Grupo 3, espera-se que as crianças<br />

tenham se apropriado <strong>de</strong> alguns procedimentos, como a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

consultar índices e o façam com certa autonomia.<br />

Ao a<strong>na</strong>lisar os documentos das sequências <strong>de</strong> pesquisas,<br />

<strong>de</strong>senvolvidas nos três grupos, observa-se que as ativida<strong>de</strong>s ocorrem,<br />

essencialmente, nos momentos da roda, on<strong>de</strong> são problematizadas questões<br />

relativas ao trabalho, e nos cantos.<br />

Exemplo <strong>de</strong> situações encaminhadas em roda:<br />

A professora leva para a roda diferentes imagens (impressas, no<br />

datashow ou em ví<strong>de</strong>os) do animal escolhido para o estudo e, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

57


explorarem as imagens, propõem perguntas tais como: “O que essa imagem<br />

está nos contando sobre o leopardo?”, “O que o macho está fazendo aqui?”,<br />

“Quem pesa mais, vocês ou esse filhote aqui?”<br />

A professora leva para a roda diferentes textos informativos com o<br />

propósito <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r às perguntas (levantadas sobre o animal, em outra<br />

roda) e que não pu<strong>de</strong>ram ser respondidas pela leitura das imagens.<br />

Exemplo <strong>de</strong> situações encaminhadas em cantos:<br />

Leitura exploratória nos cantos, dispondo diferentes portadores<br />

informativos ou não e que abor<strong>de</strong>m várias temáticas, incluindo e excluindo a<br />

do estudo.<br />

Entre os cantos o professor organiza um que seja <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do ao<br />

tratamento do tema e convida alg<strong>uma</strong>s crianças para participarem nele: a<br />

ativida<strong>de</strong> do canto po<strong>de</strong> ser, por exemplo, localizar no material<br />

disponibilizado on<strong>de</strong> tem informação sobre o animal pesquisado e marcar a<br />

pági<strong>na</strong> do livro para que possa, posteriormente, compartilhar com os <strong>de</strong>mais<br />

seu achado.<br />

Estes são ape<strong>na</strong>s dois exemplos <strong>de</strong> encaminhamentos nos cantos e <strong>na</strong><br />

roda.<br />

Somente no Grupo 3, foi possível observar, ainda que <strong>de</strong> maneira não<br />

sistemática, a ocorrência <strong>de</strong> outros momentos <strong>na</strong> roti<strong>na</strong> <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do às<br />

ativida<strong>de</strong>s das sequências <strong>de</strong>sse eixo.<br />

Além da pesquisa, as crianças têm outras oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ler,<br />

<strong>escrever</strong>, ouvir e falar para informar e informar-se, com outros propósitos,<br />

entre eles a leitura e a escrita (por si mesmo ou através do professor) <strong>de</strong><br />

legendas <strong>de</strong> foto <strong>de</strong> quando eram pequenos, relato da visita dos avós,<br />

entrevista e relato das mesmas realizada com os funcionários da escola e<br />

pais dos alunos do grupo, <strong>de</strong> textos jor<strong>na</strong>lísticos com eventuais temas <strong>de</strong><br />

interesse e dicas culturais.<br />

58


É interessante observar como até as <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s habituais<br />

são conso<strong>na</strong>ntes aos interesses dos alunos e como todas as situações <strong>de</strong><br />

leitura e escrita aparecem com a função <strong>de</strong> cumprir algum propósito social. O<br />

quadro a seguir, apresenta as diferentes ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidas ao longo<br />

dos três grupos.<br />

59


Ativida<strong>de</strong>s habituais<br />

Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em<br />

G1 G2 G3 G1 G2 G3 G1 G2 G3<br />

Escuta e récita<br />

<strong>de</strong> parlendas e<br />

<strong>de</strong> poemas<br />

mais curtos<br />

Escuta diária <strong>de</strong><br />

textos literários<br />

diversos; troca<br />

<strong>de</strong> comentários<br />

e apreciações<br />

Escuta e leitura<br />

pelo professor,<br />

<strong>de</strong> LIVRO<br />

ÁLBUM e <strong>de</strong><br />

contos com<br />

repetição<br />

Visitas à<br />

biblioteca<br />

central<br />

Escuta e récita<br />

<strong>de</strong> parlendas e<br />

<strong>de</strong> poemas<br />

Escuta diária <strong>de</strong><br />

textos literários<br />

diversos; troca<br />

<strong>de</strong> comentários<br />

e apreciações<br />

Visitas à<br />

biblioteca<br />

central<br />

Escuta <strong>de</strong><br />

adivinhas e <strong>de</strong><br />

trava-línguas,<br />

leitura e escrita<br />

por si mesmos<br />

(localização/esc<br />

rita <strong>de</strong><br />

respostas e<br />

adivinhas)<br />

Escuta diária <strong>de</strong><br />

textos literários<br />

diversos; troca<br />

<strong>de</strong><br />

comentários,<br />

apreciações e<br />

ditado ao<br />

professor <strong>de</strong><br />

indicações<br />

literárias (<strong>uma</strong><br />

por semestre).<br />

Visitas à<br />

biblioteca<br />

central<br />

Produção e<br />

ditado<br />

individual <strong>de</strong><br />

legendas para o<br />

álbum "A gente<br />

<strong>de</strong> quem a<br />

gente gosta"<br />

A infância dos<br />

avós – Ditado<br />

<strong>de</strong> relatos das<br />

visitas <strong>de</strong> avós<br />

Conhecer<br />

profissões:<br />

entrevista com<br />

funcionários da<br />

escola e pais<br />

Escuta <strong>de</strong><br />

textos<br />

jor<strong>na</strong>lísticos e<br />

<strong>de</strong> convites <strong>de</strong><br />

eventos<br />

culturais<br />

Escuta e récita<br />

<strong>de</strong> parlendas e<br />

poemas,<br />

especialmente,<br />

<strong>de</strong> poemas<br />

mais curtos<br />

Escuta e récita<br />

<strong>de</strong> parlendas e<br />

poemas,<br />

especialmente,<br />

<strong>de</strong> poemas<br />

mais curtos<br />

Escuta <strong>de</strong><br />

adivinhas e <strong>de</strong><br />

trava-línguas,<br />

leitura e escrita<br />

por si mesmos<br />

(localização/esc<br />

rita <strong>de</strong><br />

respostas e<br />

adivinhas)


Em nenhum momento as crianças fazem lições vinculadas a pesquisa,<br />

leem ou escrevem porque é hora <strong>de</strong> ler e <strong>escrever</strong>, mas sim porque estas<br />

ações colocam-se como inerentes à sua participação no contexto <strong>de</strong> cada<br />

<strong>uma</strong> das modalida<strong>de</strong>s organizativas (projetos, sequências e ativida<strong>de</strong>s<br />

habituais). Neste eixo do trabalho com práticas <strong>de</strong> linguagem, por exemplo,<br />

escutam leituras <strong>de</strong> textos enciclopédicos para buscar informações que<br />

respondam às curiosida<strong>de</strong>s que se colocaram sobre o animal; exploram<br />

materiais diversos buscando localizar on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m encontrar <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>das<br />

informações; registram o que apren<strong>de</strong>m porque é necessário para que se<br />

retome mais adiante o que já se sabe sobre o animal. Trata-se <strong>de</strong> situações<br />

reais e significativas <strong>de</strong> leitura e <strong>de</strong> escrita.<br />

3.2.3 Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano<br />

escolar<br />

Pensar sobre o uso da escrita <strong>na</strong> escola é, antes <strong>de</strong> tudo, pensá-lo fora<br />

da escola: lemos e escrevemos para nos entreter; para nos informar; para<br />

comunicar por carta, e-mail, bilhete, convite; para fazer <strong>uma</strong> receita;<br />

apren<strong>de</strong>r um jogo; ou saber como funcio<strong>na</strong> ou como se monta um aparelho;<br />

para nos apropriar das normas <strong>de</strong> um lugar; organizar materiais; fazer<br />

compras etc.<br />

O dia-a-dia escolar está repleto <strong>de</strong> situações reais, advindas das<br />

relações; das interações; e mesmo dos eventos extra-escolares. E,<br />

sobretudo, não é novida<strong>de</strong> pensarmos, nestes momentos, como<br />

privilegiados, pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uso real da leitura e da escrita para<br />

organização das ativida<strong>de</strong>s diárias.<br />

Contudo, <strong>de</strong>finir as situações do cotidiano escolar como eixo <strong>de</strong><br />

trabalho <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> linguagem é reconhecer toda a sua potência e a sua<br />

importância <strong>na</strong> formação do usuário da cultura escrita. Essa <strong>de</strong>finição,<br />

61


também, garante que esses momentos <strong>de</strong> fato aconteçam, já que estão<br />

previstos e valorizados <strong>curricular</strong>mente e, portanto, não ficam ape<strong>na</strong>s no<br />

plano do discurso pedagógico ou das tarefas a serem cumpridas.<br />

Este eixo <strong>de</strong> trabalho, ao longo dos três grupos, se organiza em torno<br />

<strong>de</strong> quatro categorias:<br />

Proposta<br />

1. Bilhete, convites e listas<br />

2. Nome Próprio<br />

Função Social<br />

Solicitação materiais; registros para a organização do dia a<br />

dia escolar; comunicação inter<strong>na</strong> (setores e funcionários da<br />

escola; colegas <strong>de</strong> outra classe; colegas ausentes) e com<br />

as famílias etc.<br />

I<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> pertences e <strong>de</strong> produções; organização <strong>de</strong><br />

jogos; <strong>de</strong> fichas <strong>de</strong> biblioteca; calendário <strong>de</strong><br />

aniversariantes; cartaz <strong>de</strong> ajudantes do dia; jogo <strong>de</strong> bingo<br />

etc.<br />

3. Roda <strong>de</strong> conversa<br />

Conversas e relatos sobre temas específicos, sejam<br />

centrados em estudos, sejam temas do convívio social ou<br />

escolar; conversas sobre as situações da roti<strong>na</strong> diária.<br />

4. Explicações ou instruções<br />

Escuta atenta <strong>de</strong> explicações ou <strong>de</strong> instruções dadas pelo<br />

professor a fim <strong>de</strong> orientar-se e organizar-se a partir <strong>de</strong>las.<br />

Explicação <strong>de</strong> dúvidas para colegas e professores.<br />

Por serem ativida<strong>de</strong>s que ocorrem em função das situações próprias<br />

do cotidiano escolar, são caracterizadas como habituais, ocorrendo ao longo<br />

<strong>de</strong> toda a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, e varia ape<strong>na</strong>s no que se refere à progressão <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>safios: se no G1 o aluno ouvia e ditava bilhetes, no G3, além disso, po<strong>de</strong>rá<br />

também ter a tarefa <strong>de</strong> escrevê-lo por si mesmo.<br />

É importante ressaltar que estas <strong>proposta</strong>s inserem-se em momentos<br />

extremamente contextualizados: o professor não planeja <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> com<br />

o propósito <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r a <strong>escrever</strong> bilhetes, mas ao olhar os projetos e<br />

sequências da série, antecipa em quais situações <strong>escrever</strong> um bilhete é<br />

pertinente e organiza seu planejamento para que este momento ocorra e<br />

seja, <strong>de</strong> fato, significativo para os alunos. Por outro lado, ao ter consciência<br />

<strong>de</strong> que esse fazer integra o trabalho da série, estará mais atento às situações<br />

62


que emergem do dia-a-dia escolar, po<strong>de</strong>ndo explorá-las com mais<br />

proprieda<strong>de</strong>, por exemplo, quando <strong>uma</strong> criança traz um jogo e o professor<br />

julga que a leitura das regras e a exploração <strong>de</strong>le pelos alunos é pertinente<br />

e, então, abre este espaço para a realização, em sua programação. Ou,<br />

ainda, quando atua como escriba <strong>de</strong> <strong>uma</strong> carta <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>da a um aluno que se<br />

ausentou por doença.<br />

Ao privilegiar esses momentos <strong>de</strong> interação com as distintas práticas<br />

<strong>de</strong> uso social da linguagem escrita, a criança construirá saberes tanto sobre o<br />

sistema <strong>de</strong> escrita, como sobre o tipo <strong>de</strong> texto que escreve por si mesmo ou<br />

pelas mãos do professor, observando suas características, tais como,<br />

estrutura, expressões, vocabulário próprio, temas; <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>tários e funções.<br />

Outro aspecto que merece <strong>de</strong>staque é o cuidado com que as gra<strong>de</strong>s<br />

<strong>curricular</strong>es foram organizadas <strong>de</strong> modo a se referirem sempre aos fazeres<br />

das crianças enquanto leitoras e escritoras <strong>na</strong>s situações do cotidiano escolar<br />

e não em relação aos objetivos que <strong>de</strong>vem alcançar em cada grupo.<br />

63


Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar<br />

G1<br />

G2<br />

G3<br />

<strong>Ler</strong> e<br />

<strong>escrever</strong><br />

seu<br />

próprio<br />

nome;<br />

<strong>Ler</strong> e<br />

<strong>escrever</strong><br />

seu<br />

próprio<br />

nome;<br />

<strong>Ler</strong> e<br />

<strong>escrever</strong><br />

nomes <strong>de</strong><br />

colegas;<br />

<strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> seu<br />

próprio nome e os<br />

nomes <strong>de</strong> colegas;<br />

Falar e<br />

escutar<br />

em<br />

contextos<br />

<strong>de</strong><br />

comunicaç<br />

ão<br />

interpesso<br />

al<br />

Falar e<br />

escutar<br />

em<br />

contextos<br />

<strong>de</strong><br />

instrução<br />

Falar e<br />

escutar<br />

em<br />

contextos<br />

normativo<br />

s;<br />

Ouvir a<br />

leitura e<br />

ditar<br />

textos <strong>de</strong><br />

comunicaç<br />

ão<br />

interpesso<br />

al<br />

(bilhetes,<br />

convites,<br />

listas <strong>de</strong><br />

solicitação<br />

etc.);<br />

Ouvir a<br />

leitura,<br />

<strong>escrever</strong> e<br />

ditar ao<br />

professor<br />

textos <strong>de</strong><br />

comunicaç<br />

ão<br />

interpesso<br />

al<br />

(bilhetes,<br />

convites,<br />

listas <strong>de</strong><br />

solicitação<br />

etc.);<br />

-<br />

<strong>Ler</strong> e<br />

<strong>escrever</strong><br />

palavras e<br />

títulos <strong>de</strong><br />

brinca<strong>de</strong>ir<br />

as, jogos<br />

e livros;<br />

<strong>Ler</strong> e<br />

<strong>escrever</strong><br />

listas<br />

diversas e<br />

palavras<br />

(objetos,<br />

brinquedo<br />

s) para<br />

organizar<br />

ativida<strong>de</strong>s<br />

cotidia<strong>na</strong>s<br />

(para<br />

votações,<br />

para<br />

conservar<br />

<strong>de</strong><br />

memória<br />

etc.)<br />

Refletir<br />

sobre o<br />

sistema<br />

<strong>de</strong> escrita<br />

avançando<br />

rumo à<br />

leitura e à<br />

escrita<br />

convencio<br />

<strong>na</strong>l<br />

Por exemplo, <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> do G1 e G2 aparece como um fazer<br />

“ler e <strong>escrever</strong> seu próprio nome” e a criança o fará quando escutá-lo;<br />

escrevê-lo e lê-lo; da maneira que for capaz em cada momento, com o<br />

propósito <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificar os seus pertences, as suas produções; organizar<br />

jogos e fichas da biblioteca; para consultar o calendário <strong>de</strong> aniversariantes e<br />

os ajudantes do dia etc. Isso, absolutamente quer dizer que <strong>de</strong>verá ler e<br />

<strong>escrever</strong>, convencio<strong>na</strong>lmente, “listas diversas e palavras (objetos,<br />

brinquedos) para organizar ativida<strong>de</strong>s cotidia<strong>na</strong>s (para votações, para<br />

conservar <strong>de</strong> memória etc.), palavras e títulos das brinca<strong>de</strong>iras, jogos e<br />

64


livros”, mas que, ainda assim, será solicitada a ler e a <strong>escrever</strong>, com estes<br />

propósitos, e o fará <strong>de</strong> acordo com suas possibilida<strong>de</strong>s.<br />

Como já dito anteriormente, e que vale ressaltar, o êxito da criança<br />

não consiste em respon<strong>de</strong>r “corretamente”, do ponto <strong>de</strong> vista convencio<strong>na</strong>l,<br />

mas, a partir do que sabe e dos dados que o contexto informa, encontrar<br />

respostas que possam justificar e explicar, <strong>de</strong> acordo com seus pressupostos.<br />

3.3. A transversalida<strong>de</strong> no currículo<br />

Ao a<strong>na</strong>lisar a gra<strong>de</strong> dos três grupos etários da educação infantil da<br />

Escola da Vila é possível observar <strong>uma</strong> organização que dá oportunida<strong>de</strong>s à<br />

criança vivenciar e experimentar <strong>uma</strong> mesma prática social em diferentes<br />

momentos.<br />

Esta dinâmica <strong>curricular</strong> parte do pressuposto <strong>de</strong> que <strong>uma</strong> situação<br />

isolada não garante a aquisição <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do conhecimento, e que para<br />

construí-lo são necessárias diversas aproximações em distintos momentos,<br />

para que aquilo que foi experimentado possa se relacio<strong>na</strong>r com outros<br />

eventos e saberes que circulam <strong>de</strong>ntro e fora da escola e, então, possibilitar<br />

um novo olhar à prática em questão.<br />

Para ilustrar como ocorre essa transversalida<strong>de</strong>, o quadro abaixo<br />

organiza as <strong>proposta</strong>s observadas <strong>na</strong>s três gra<strong>de</strong>s, e que tematizam a<br />

mesma prática.<br />

65


Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar<br />

Grupo 1<br />

Grupo 2 Grupo 3<br />

Ativida<strong>de</strong> Ativida<strong>de</strong><br />

Ativida<strong>de</strong><br />

Sequência Projeto<br />

Sequência<br />

habitual habitual<br />

habitual<br />

Projeto<br />

Escuta e<br />

récita <strong>de</strong><br />

parlendas<br />

(também<br />

utilizadas<br />

em sorteios<br />

e<br />

brinca<strong>de</strong>iras)<br />

e poemas,<br />

especialment<br />

e, <strong>de</strong><br />

poemas<br />

mais curtos<br />

Escuta e<br />

récita <strong>de</strong><br />

parlendas<br />

(também<br />

utilizadas<br />

em sorteios<br />

e<br />

brinca<strong>de</strong>iras)<br />

e poemas,<br />

especialment<br />

e, <strong>de</strong><br />

poemas<br />

mais curtos<br />

Leitura <strong>de</strong><br />

poemas <strong>de</strong><br />

um dado<br />

autor (Lalau,<br />

como<br />

escritor, e<br />

Laurabeatriz,<br />

como<br />

ilustradora)<br />

e conversas<br />

sobre<br />

regularida<strong>de</strong><br />

s que se<br />

po<strong>de</strong><br />

observar<br />

(temáticas,<br />

presença ou<br />

não <strong>de</strong> rimas<br />

etc.)<br />

Recital <strong>de</strong><br />

poemas<br />

Apresentaçã<br />

o <strong>de</strong> récita<br />

<strong>de</strong> poemas<br />

curtos (para<br />

funcionários<br />

da escola ou<br />

para colegas<br />

<strong>de</strong> outra<br />

classe)<br />

Escuta <strong>de</strong><br />

adivinhas e<br />

<strong>de</strong> travalínguas<br />

(ampliação<br />

<strong>de</strong> repertório<br />

e diversão),<br />

leitura por si<br />

mesmos<br />

(localização<br />

<strong>de</strong><br />

respostas) e<br />

escrita por si<br />

mesmos<br />

(respostas e<br />

adivinhas).<br />

Eva Fur<strong>na</strong>ri -<br />

Escuta <strong>de</strong><br />

obras<br />

diversas <strong>de</strong><br />

um mesmo<br />

autor/<br />

Informações<br />

sobre a vida<br />

do autor/<br />

<strong>Análise</strong> <strong>de</strong><br />

regularida<strong>de</strong><br />

s presentes<br />

em sua<br />

obra/ Leitura<br />

<strong>de</strong> rimas;<br />

leitura e<br />

produção <strong>de</strong><br />

títulos/<br />

Ditado ao<br />

professor <strong>de</strong><br />

indicação<br />

literária<br />

Cancioneiro<br />

Escuta,<br />

leitura e<br />

canto –<br />

canções <strong>de</strong><br />

domínio<br />

público<br />

(canções<br />

com<br />

repetição) /<br />

Reescrita <strong>de</strong><br />

canções, em<br />

duplas, para<br />

compor o<br />

cancioneiro<br />

Neste quadro foram <strong>de</strong>stacadas as <strong>proposta</strong>s que se relacio<strong>na</strong>m com<br />

um tipo <strong>de</strong> texto que, envolve o jogo com as palavras, e possibilita às<br />

crianças “atentarem à forma, aos aspectos sonoros da linguagem como<br />

ritmos e rimas, além das questões culturais e afetivas envolvidas” (BRASIL,<br />

1998, v3. p.141), que são as parlendas, poesias, cantigas e trava-línguas.<br />

Des<strong>de</strong> o G1, são previstas, como ativida<strong>de</strong>s habituais e <strong>de</strong> duração<br />

anual, a escuta e a récita <strong>de</strong> parlendas e <strong>de</strong> poemas, iniciando assim o<br />

contato da criança com este tipo <strong>de</strong> texto, <strong>na</strong> escola. Ao longo <strong>de</strong> todo G2,<br />

essa <strong>proposta</strong> permanece, mas é realizado um maior aprofundamento, no<br />

trabalho com a poesia, por meio da sequência <strong>de</strong> leituras <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do autor. Estas ações, entre outros pontos já <strong>de</strong>stacados<br />

anteriormente, ampliarão o repertório <strong>de</strong> poemas conhecidos e a<br />

66


possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apreciação por parte das crianças e, ainda, fornecerão<br />

subsídios para o recital <strong>de</strong> poesias, projeto realizado ainda nesta série.<br />

No G3, dando seguimento a esse trabalho, ampliam-se as<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> textos que compartilham o brincar com as palavras e os<br />

aspectos sonoros como características. As crianças po<strong>de</strong>m apreciar como as<br />

palavras se organizam <strong>de</strong> modos distintos, criando também diferentes<br />

efeitos; também po<strong>de</strong>m experimentar recitar um trava-língua; fazer<br />

adivinhas para os colegas; bem como lê-las e escrevê-las, durante todo o<br />

ano. Na sequência sobre Eva Fur<strong>na</strong>ri, além <strong>de</strong> se aproximarem novamente <strong>de</strong><br />

um dos critérios <strong>de</strong> seleção <strong>de</strong> livros – que é pelo conhecimento que tem<br />

sobre o autor -, terão a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> observar, novamente, a presença da<br />

rima, um tipo <strong>de</strong> texto diverso do que até então tiveram contato. E por fim,<br />

com muitos saberes construídos sobre essa forma <strong>de</strong> organização textual,<br />

<strong>de</strong>senvolverão um projeto que visa a produção <strong>de</strong> um Cancioneiro.<br />

Os saberes envolvidos ao longo <strong>de</strong> todo esse percurso garantirão a<br />

experiência necessária para que as crianças possam re<strong>escrever</strong> canções com<br />

repetição. Há <strong>uma</strong> evi<strong>de</strong>nte progressão <strong>de</strong> <strong>de</strong>safios, e ter tido a oportunida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> atuar verda<strong>de</strong>iramente como leitor e escritor, durante “toda” sua vida<br />

escolar, permitirá que a criança, <strong>na</strong> fase fi<strong>na</strong>l do segmento (setembro,<br />

outubro e novembro), encontre <strong>de</strong>safios ajustados às suas possibilida<strong>de</strong>s,<br />

motivadas pelo propósito comunicativo em questão.<br />

No G3, em função do incremento da complexida<strong>de</strong> das <strong>proposta</strong>s, é<br />

<strong>de</strong>mandado que maior tempo seja <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do à realização das mesmas. Se,<br />

no G1 e G2, observávamos que as situações didáticas, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong><br />

Linguagem, ocorriam como <strong>uma</strong> das ativida<strong>de</strong>s diversificadas - <strong>na</strong> hora dos<br />

cantos, no momento da roda <strong>de</strong> conversa e <strong>na</strong> roda <strong>de</strong> história -, no G3<br />

aparecem momentos específicos <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos às ações relativas às etapas das<br />

sequências ou dos projetos, mas, que não ultrapassam – pelos<br />

planejamentos a<strong>na</strong>lisados - 30 minutos sema<strong>na</strong>is.<br />

67


Para ilustrar como ocorre a transversalida<strong>de</strong> no currículo foi utilizado o<br />

trabalho com textos, cuja característica compartilhada é o jogo <strong>de</strong> palavras,<br />

mas, vale ressaltar que o mesmo ocorre em outros tipos <strong>de</strong> textos que,<br />

também, são privilegiados <strong>na</strong> educação infantil da Escola da Vila, tais como<br />

os contos <strong>de</strong> repetição e os contos <strong>de</strong> fadas.<br />

Vale esclarecer, também, que o recorte realizado neste trabalho<br />

restringe a análise ao segmento da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, mas, o contato e o<br />

estudo <strong>de</strong>sses gêneros são retomados e revisitados em repetidos momentos<br />

da escolarida<strong>de</strong> – fundamental I e II e ensino médio.<br />

3.4 Sobre o fazer leitor/escritor: refletir sobre o sistema <strong>de</strong> escrita<br />

avançando rumo à leitura e à escrita convencio<strong>na</strong>l<br />

Em <strong>de</strong>corrência do tema <strong>de</strong>ste trabalho, a alfabetização <strong>na</strong> <strong>Educação</strong><br />

<strong>Infantil</strong>, é necessário fazer <strong>uma</strong> consi<strong>de</strong>ração especial a este fazer atribuído<br />

ao leitor, em especial neste eixo do currículo.<br />

Na apresentação teórica ficou claro qual o sentido esta perspectiva <strong>de</strong><br />

ensino e <strong>de</strong> aprendizagem dá ao termo alfabetização – processo <strong>de</strong><br />

apropriação da cultura escrita que envolve diferentes possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> uso, e<br />

não ape<strong>na</strong>s a aquisição do sistema notacio<strong>na</strong>l, ampliando e potencializando a<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trânsito do sujeito em diferentes práticas sociais.<br />

Contudo, ao estar inserido em contextos nos quais a língua escrita o<br />

integra e ter a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> participar ativamente enquanto leitor e<br />

escritor, <strong>de</strong>sempenhando as mesmas ações e procedimentos que leitores e<br />

escritores experientes realizam, a criança po<strong>de</strong>rá refletir sobre a língua que<br />

se fala, se lê e se escreve, suas particularida<strong>de</strong>s, estruturas, organizações e<br />

funções.<br />

No momento <strong>de</strong> <strong>uma</strong> produção escrita, a criança terá <strong>de</strong> lidar com<br />

problemas <strong>de</strong> diferentes <strong>na</strong>turezas: o que <strong>escrever</strong>, a maneira <strong>de</strong> dispor as<br />

68


informações no texto, a escolha <strong>de</strong> palavras que melhor se ajustam ao tipo<br />

<strong>de</strong> texto que se <strong>de</strong>seja produzir (aspectos discursivos), mas, também, terá<br />

<strong>de</strong> lidar com o como <strong>escrever</strong> aquilo que <strong>de</strong>seja, pensando sobre a grafia <strong>de</strong><br />

cada palavra (aspectos notacio<strong>na</strong>is).<br />

Apesar <strong>de</strong> o professor encaminhar situações cujo foco da <strong>proposta</strong><br />

privilegia um aspecto ou outro, – quando a criança dita para o outro, a sua<br />

atenção incidirá sobre os aspectos discursivos; quando ela escreve o que o<br />

outro ditou, sua atenção incidirá sobre os aspectos notacio<strong>na</strong>is -, não se po<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar que o professor não po<strong>de</strong> controlar as reflexões que a<br />

criança faz em cada um <strong>de</strong>sses momentos.<br />

Além disso, nestas situações <strong>de</strong> produção, a criança encontra-se<br />

extremamente motivada, em função do objetivo que ela <strong>de</strong>seja atingir – um<br />

cancioneiro, um recital <strong>de</strong> poesias, um livro <strong>de</strong> informações sobre um animal<br />

pesquisado etc. Contudo, o principal objetivo docente é o <strong>de</strong> promover<br />

situações em que a criança tenha a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refletir sobre a escrita,<br />

suas funções e características, e não que ela conquiste, neste momento, a<br />

escrita convencio<strong>na</strong>l.<br />

O que está implícito aqui é o pressuposto <strong>de</strong> que as crianças, todas<br />

elas, participam <strong>de</strong> todas as práticas <strong>de</strong> linguagem que existem em seu<br />

ambiente social, criando representações pessoais para aquilo que observa e<br />

vivencia. A escola, ao tomar estas práticas como referência, convoca os<br />

alunos, por meio <strong>de</strong> suas <strong>proposta</strong>s, a atuar enquanto leitores e escritores<br />

reais, que leem e escrevem com propósitos <strong>de</strong>finidos e participam <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitores e escritores, que compartilham e fazem circular os<br />

seus saberes. Contudo, é equivocado supor, <strong>de</strong>ssa perspectiva, que para ler<br />

e <strong>escrever</strong> é necessário domi<strong>na</strong>r a notação convencio<strong>na</strong>l.<br />

Ao d<strong>escrever</strong>em as diferentes conceitualizações que a criança tem<br />

sobre o sistema <strong>de</strong> escrita, Ferreiro e Teberosky (1979) revolucio<strong>na</strong>ram o<br />

ensino da língua, porque <strong>de</strong>monstraram que as crianças, mesmo sem<br />

produção alfabética, possuem inúmeros saberes sobre o sistema <strong>de</strong> escrita, o<br />

69


que <strong>de</strong>monstra que elas estão refletindo e criando hipóteses para explicar o<br />

que percebem. Essa é a razão <strong>de</strong> ser, absolutamente, legítimo e possível que<br />

escrevam e leiam, mesmo quando não o façam convencio<strong>na</strong>lmente.<br />

Proporcio<strong>na</strong>r situações <strong>na</strong>s quais as crianças possam ler e <strong>escrever</strong>, do<br />

jeito que po<strong>de</strong>m fazê-lo, é legitimar os saberes que elas dispõem no<br />

momento, e validar a sua participação como membro <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da cultura<br />

escrita. Nesse sentido, se faz premente a existência <strong>de</strong> um clima <strong>de</strong><br />

confiança para que os alunos se sintam seguros em suas competências e<br />

possam ler e <strong>escrever</strong> <strong>de</strong> acordo com as hipóteses que possuem.<br />

Vale ressaltar também que este trabalho não preestabelece níveis que<br />

a criança <strong>de</strong>ve alcançar a cada série, ou após cada projeto ou sequência,<br />

mas, sim que participem efetivamente das práticas sociais <strong>de</strong> leitura e <strong>de</strong><br />

escrita, e tenham garantido o seu direito <strong>de</strong> refletir sobre a língua que se<br />

fala, se ouve, se lê e se escreve.<br />

70


IV - Alg<strong>uma</strong>s Consi<strong>de</strong>rações<br />

(...) se a escola não gera<br />

aprendizagem, não po<strong>de</strong> justificar-se<br />

como instituição social.<br />

(FERREIRO, 2008, p.53)<br />

A motivação para esta monografia partiu da inquietação frente a i<strong>de</strong>ia<br />

<strong>de</strong> que um trabalho consistente, contínuo e permanente, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> práticas<br />

<strong>de</strong> linguagem, é incompatível com as necessida<strong>de</strong>s lúdicas da faixa etária e<br />

que privilegiar este aspecto implica negligenciar a brinca<strong>de</strong>ira, a arte e o<br />

movimento. A hipótese, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, era <strong>de</strong> que esta afirmação é equívoca<br />

e para verificá-la se fez necessário buscar o que a fundamenta, resgatando<br />

um pouco da história da educação infantil no Brasil, as concepções que se<br />

tem sobre este segmento, bem como os pressupostos que embasam o ensino<br />

e a aprendizagem, <strong>na</strong> perspectiva construtivista, no que se refere ao ensino<br />

da língua.<br />

Contudo, apesar da revisitação ao marco teórico ter sido fundamental<br />

para esta pesquisa, esta ação não bastava por si só para corroborar a<br />

hipótese inicial, <strong>de</strong> que brincar e apren<strong>de</strong>r não são ativida<strong>de</strong>s exclu<strong>de</strong>ntes e<br />

que práticas significativas e contextualizadas não competem com o espaço do<br />

lúdico <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>. Fazia-se premente, ilustrar, com a análise do<br />

currículo escolar <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição referência <strong>na</strong> abordagem construtivista,<br />

como é possível em <strong>uma</strong> organização <strong>curricular</strong> trabalhar a leitura e a<br />

escrita, sem, no entanto, escolarizar e consequentemente <strong>de</strong>stituir a<br />

significação <strong>de</strong> suas práticas e, ao mesmo tempo, preservar a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do<br />

segmento (brincar, socialização, relações interpessoais, expressivida<strong>de</strong>,<br />

artes).<br />

A análise <strong>de</strong>sse currículo expõe claramente como é possível a<br />

equilibração entre as diferentes áreas do saber e o brincar - necessida<strong>de</strong><br />

inerente à faixa etária. A análise ainda atesta a hipótese inicial e, mesmo que<br />

não o fizesse, esta se manteria, pois como já discorrido anteriormente, a<br />

71


equilibração entre as áreas é <strong>uma</strong> <strong>de</strong>cisão institucio<strong>na</strong>l e não inerente à<br />

qualquer área em si.<br />

Neste caso, a incongruência constituiria <strong>na</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração das<br />

características e <strong>de</strong>mandas dos principais sujeitos envolvidos e, segundo a<br />

perspectiva construtivista, conhecer bem a quem ensi<strong>na</strong>mos é premissa<br />

básica sobre a qual se <strong>de</strong>sdobrarão todas as intervenções didáticas. Neste<br />

sentido,<br />

O verda<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>safio da alfabetização é o <strong>de</strong> conhecer a quem<br />

ensi<strong>na</strong>mos (os processos <strong>de</strong> aprendizagem dos alunos, seus<br />

saberes e pontos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sequilíbrio cognitivo) e o que<br />

ensi<strong>na</strong>mos quando nos propomos a alfabetizar (a <strong>na</strong>tureza da<br />

linguagem e o papel social por ela atribuído). (COLELLO e<br />

LUIZE, in: Viver Mente Cérebro, 2006, p.19)<br />

Conhecer as crianças, como apren<strong>de</strong>m, o que estão pensando e pelo o<br />

que se interessam permite ao professor, munido dos saberes sobre a<br />

<strong>na</strong>tureza do objeto <strong>de</strong> ensino, assim como da sua respectiva didática,<br />

potencializar, por meio <strong>de</strong> suas intervenções, as situações escolares. Desse<br />

modo, a criança terá a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interagir com o objeto <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong><br />

forma qualitativa e sistemática, tanto nos projetos e sequências como,<br />

sobretudo, <strong>na</strong>s situações cotidia<strong>na</strong>s. Contudo, é importante ressaltar que a<br />

sistematicida<strong>de</strong> não implica <strong>na</strong> proposição <strong>de</strong> exaustivas e repetitivas<br />

ativida<strong>de</strong>s, pobres em relação ao sentido, ao propósito e ao que mobiliza <strong>na</strong><br />

criança. Mas sim <strong>na</strong> oportunida<strong>de</strong> da criança entrar em contato, reiteradas<br />

vezes e em diferentes momentos, com <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do objeto <strong>de</strong> estudo.<br />

Como po<strong>de</strong> ser observado, o que se apresenta <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> são<br />

conteúdos, não como são entendidos tradicio<strong>na</strong>lmente – tendo a língua como<br />

objeto <strong>de</strong> ensino -, mas sim conteúdos enquanto práticas sociais,<br />

relacio<strong>na</strong>dos aos fazeres leitores e escritores e vinculados a um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do<br />

eixo, que se refere, novamente, aos âmbitos <strong>de</strong> uso da linguagem: para se<br />

divertir e emocio<strong>na</strong>r (literária), para informar e se informar e a serviço das<br />

situações do cotidiano. Enquanto práticas sociais, é <strong>na</strong>tural que estas se<br />

72


eiterem <strong>de</strong> forma sistemática e contínua ao longo <strong>de</strong> toda a escolarida<strong>de</strong> e a<br />

construção <strong>de</strong>sse conhecimento se dará à medida que a criança possa se<br />

aproximar <strong>de</strong>le sucessivas vezes e diferentes maneiras – não como um<br />

exercício repetitivo, mas, a partir dos conhecimentos já construídos em<br />

outros momentos, voltar a olhar, refletir, atuar e produzir, ampliando suas<br />

possibilida<strong>de</strong>s, aprofundando sua análise e se apropriando mais <strong>de</strong>sse saber.<br />

Os conteúdos, que aparecem <strong>de</strong>scritos ape<strong>na</strong>s nos documentos das<br />

sequências e projetos, referem-se a saberes culturais que foram socialmente<br />

selecio<strong>na</strong>dos por serem consi<strong>de</strong>rados relevantes <strong>de</strong> serem transmitidos pela<br />

escola, nesta faixa etária.<br />

A<strong>na</strong> Malajovich, n<strong>uma</strong> apresentação feita em um seminário sobre o<br />

brincar (Brincar e Apren<strong>de</strong>r: os dois lados da mesma moeda?) 25 , <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que,<br />

os conhecimentos próprios da <strong>Educação</strong> infantil, diferente daqueles<br />

trabalhados <strong>na</strong>s <strong>de</strong>mais etapas escolares, não po<strong>de</strong>m ser recuperados, pois<br />

se referem à oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> brincar com o outro, ampliar suas<br />

possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> comunicação, <strong>de</strong> exploração do ambiente e objetos, suas<br />

curiosida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> se perguntar e encontrar respostas, <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver<br />

confiança e respeito em si mesma e no/pelo outro e <strong>de</strong>scobrir que po<strong>de</strong> se<br />

expressar por palavras e pelas artes (plásticas, corporal, musical etc.).<br />

Nesta perspectiva, os conteúdos são consi<strong>de</strong>rados como meio para o<br />

<strong>de</strong>senvolvimento das capacida<strong>de</strong>s e para que a criança possa expandir o<br />

conhecimento que tem sobre o mundo que pertence, ou seja, um<br />

instrumento para compreen<strong>de</strong>r a realida<strong>de</strong>. Mas não somente a própria, mas<br />

outras lhe sejam novas, com as quais possa interagir e estabelecendo<br />

relações a partir daquilo que já sabe e, assim, ampliando seu conhecimento<br />

<strong>de</strong> mundo. Ou seja, consi<strong>de</strong>rando a escola um lugar em que a criança entre<br />

em contato também com aquilo que não lhe é familiar e para que isso ocorra<br />

é necessário que a escola lhe apresente, já que não é possível <strong>de</strong>sejar aquilo<br />

que se <strong>de</strong>sconhece a existência: <strong>uma</strong> criança que não sabe que existe um<br />

25<br />

Organizado pela Escola da Vila e Instituto Singularida<strong>de</strong>s, em setembro <strong>de</strong> 2012<br />

73


lugar chamado museu, não po<strong>de</strong>ria solicitar que os pais a levem ou tenha<br />

representações sobre este espaço.<br />

Outro aspecto, extremamente relevante, é o <strong>de</strong> não se estabelecerem<br />

logros a para cada <strong>proposta</strong>. Naturalmente que há expectativas <strong>de</strong><br />

aprendizagens, mas o objetivo principal é possibilitar que a criança participe<br />

<strong>de</strong>stas situações, interaja com seus pares, com o professor, com os<br />

materiais, com o objeto <strong>de</strong> estudo e, ao relacio<strong>na</strong>r todas as informações,<br />

produtos <strong>de</strong>stas interações, com aquilo que já sabia, com suas hipóteses,<br />

produza novas conclusões, que hora se ajustará o que é convencio<strong>na</strong>lmente<br />

estabelecido, hora ape<strong>na</strong>s se aproximará.<br />

Cuando <strong>de</strong>cimos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muy pequeños los niños pue<strong>de</strong>n<br />

iniciar el proceso <strong>de</strong> comprensión <strong>de</strong> la lectura y la escritura,<br />

<strong>de</strong>cimos en realidad que ya se están alfabetizando. Por eso, y<br />

porque a<strong>de</strong>más resulta un contenido valioso <strong>de</strong>s<strong>de</strong> el punto<br />

<strong>de</strong> vista cultural, el jardín <strong>de</strong>be asumir un compromiso<br />

alfabetizador. Pero este compromiso no <strong>de</strong>be confundirse con<br />

la producción alfabética. No significa estipular niveles <strong>de</strong> logro<br />

por salas o eda<strong>de</strong>s, ni adquirir la alfabeticidad <strong>de</strong>l sistema al<br />

egreso <strong>de</strong>l jardín. Supone trabajar los contenidos <strong>de</strong> manera<br />

sistemática y con propósitos claros. Enseñar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> las<br />

posibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> los niños para su transformación. (MOLINARI,<br />

2000, p.19) 26<br />

Mas, se é a criança quem constrói, não é possível que ela construa<br />

algo totalmente díspar do que é convencio<strong>na</strong>lmente aceitável? Se não for<br />

objetivo <strong>de</strong>ste segmento chegar a <strong>uma</strong> verda<strong>de</strong> absoluta, não será um<br />

problema a criança concluir, por exemplo, que a sílaba ‘GA’ que escuta é<br />

representada pelo ‘HÁ’ ou ainda que acredite que o que está escrito nos<br />

livros é a expressão da verda<strong>de</strong>, ou fora da área da linguagem, que a cauda<br />

do girino cai e não simplesmente integra o corpo do animal à medida que ele<br />

26<br />

Tradução livre Giulianny Russo: Quando dizemos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito peque<strong>na</strong>s as<br />

crianças po<strong>de</strong>m iniciar o processo <strong>de</strong> compreensão da leitura e da escrita, dizemos<br />

<strong>na</strong> realida<strong>de</strong> que já estão se alfabetizando. Por isso, e porque também é um valioso<br />

conteúdo do ponto <strong>de</strong> vista cultural, a educação infantil <strong>de</strong>ve assumir um<br />

compromisso alfabetizador. Mas este compromisso não <strong>de</strong>ve ser confundido com a<br />

produção alfabética. Não significa estipular níveis <strong>de</strong> logros para cada ida<strong>de</strong>, tão<br />

pouco adquirir a alfabeticida<strong>de</strong> do sistema ao fi<strong>na</strong>l do segmento. Supõe, sim,<br />

trabalhar os conteúdos <strong>de</strong> maneira sistemática e com propósitos claros. Para que as<br />

crianças se transformem é necessário ensiná-las a partir <strong>de</strong> suas possibilida<strong>de</strong>s.<br />

74


cresce. Ao ter a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrar em contato diversas vezes com os<br />

materiais, observar os diferentes contextos em que a informação aparece, ter<br />

oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refletir sobre e então fazer generalizações,<br />

progressivamente irá se aproximando do conhecimento que foi por outros<br />

construído.<br />

Contudo, é muito difícil que, <strong>uma</strong> criança, inserida no mundo letrado,<br />

nesta cultura oci<strong>de</strong>ntal, construa a hipótese <strong>de</strong> que a nossa língua é<br />

representada por si<strong>na</strong>is gráficos pictóricos ou lendo um livro verticalmente ou<br />

<strong>de</strong> trás para frente. É difícil porque todas as interações que teve, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu<br />

<strong>na</strong>scimento, informaram outra coisa. Além disso, os erros observados <strong>na</strong> fala<br />

e <strong>na</strong> escrita <strong>de</strong> crianças entre 3 e 6 anos relevam um intenso esforço<br />

cognitivo <strong>de</strong> compreensão da sua língua mater<strong>na</strong>, para citar um exemplo: a<br />

regularização da conjugação dos verbos irregulares, por exemplo, dizer “eu<br />

trazi” para “eu trouxe”. Este erro <strong>de</strong>monstra que a criança já sabe distinguir<br />

“entre radical verbal e <strong>de</strong>sinência verbal e ter <strong>de</strong>scoberto qual é o paradigma<br />

‘normal’ (isto é, regular) da conjugação dos verbos”. (Ferreiro e Teberosky,<br />

1999, p 25).<br />

A <strong>na</strong>tureza do erro também é relevante: a criança que escreve BITK<br />

(para biblioteca – atribuindo <strong>uma</strong> sílaba para letra escrita) comete um erro<br />

<strong>de</strong> <strong>na</strong>tureza conceitual; ela já sabe que a escrita representa aquilo que<br />

falamos e consegue fazer um recorte sonoro, silábico, entre aquilo que fala e<br />

o que escreve. Totalmente diferente é a criança, ao fi<strong>na</strong>l do segmento,<br />

<strong>de</strong>senhar livros para representar a biblioteca.<br />

Por esta razão, é possível concluir que não é o professor que<br />

alfabetiza, mas sim a criança que o faz a partir das relações que vai<br />

estabelecendo ao interatuar com a língua (escrita e falada) e com outros<br />

falantes e escritores. O que, por outro lado, não é minimizar o papel do<br />

professor que é quem planejará intencio<strong>na</strong>lmente variadas e significativas<br />

oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> entrada, contato, reflexão e experiência sobre a língua.<br />

75


Portanto, se concluímos que é <strong>de</strong>ver da escola tor<strong>na</strong>r acessível às<br />

crianças os elementos da cultura e possibilitar que participem <strong>na</strong> vida social,<br />

tanto quanto garantir que sejam atendidas em suas necessida<strong>de</strong>s, que além<br />

das fisiológicas e do cuidado, incluem o brincar e o apren<strong>de</strong>r, as <strong>proposta</strong>s<br />

relacio<strong>na</strong>das às práticas <strong>de</strong> linguagem <strong>de</strong>sempenham um papel fundamental<br />

e estruturante no que se refere à ampliação e potencialização da participação<br />

da criança em práticas sociais da cultura letrada. À medida que participa e<br />

atua, observa, reflete, constrói e se apropria da linguagem como um todo:<br />

tantos dos aspectos notacio<strong>na</strong>is, quanto dos discursivos.<br />

À escola cabe a tarefa <strong>de</strong> romper ‘<strong>de</strong>finitivamente entre a<br />

divisão entre ‘o momento <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r’ e ‘o momento <strong>de</strong> fazer<br />

uso da aprendizagem’’, propondo a ‘articulação dinâmica e<br />

reversível’ entre <strong>de</strong>scobrir a escrita (conhecimento <strong>de</strong> suas<br />

funções e formas <strong>de</strong> manifestação) e apren<strong>de</strong>r a escrita<br />

(compreensão das regras e modos <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento) e usar<br />

a escrita (cultivo <strong>de</strong> suas práticas a partir <strong>de</strong> um referencial<br />

culturalmente significativo para o sujeito. (COLELLO, 2004, p<br />

113)<br />

O temor <strong>de</strong> escolarizar a educação infantil é legitimo e oriundo <strong>de</strong> um<br />

momento histórico e alg<strong>uma</strong>s percepções <strong>de</strong>ste segmento como preparatório<br />

para a educação “<strong>de</strong> verda<strong>de</strong>”, o fundamental. Contudo, é <strong>uma</strong> generalização<br />

simplista e levia<strong>na</strong> atribuir esta escolarização à presença <strong>de</strong> conteúdos e ao<br />

trabalho consistente com a linguagem. Reduzir a responsabilida<strong>de</strong> à presença<br />

ou não <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>dos conteúdos exime a própria instituição escolar e o<br />

professor do cuidado da gestão do tempo, da organização <strong>de</strong> um currículo<br />

atento às <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> seu público e do planejamento criterioso <strong>de</strong> suas<br />

<strong>proposta</strong>s e intervenções. Em nome da crítica da escolarização, abstém-se <strong>de</strong><br />

oferecer conteúdos, selecio<strong>na</strong>dos por esta cultura.<br />

É responsabilida<strong>de</strong> da escola garantir que as crianças aprendam,<br />

sintam-se <strong>de</strong>safiadas e avancem em relação as suas hipóteses – e por<br />

hipótese, não me refiro ao nível <strong>de</strong> conceitualização sobre a notação, mas<br />

por qualquer i<strong>de</strong>ia prévia que se tem sobre algo e que po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser<br />

problematizada e aprimorada. Isso in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> das competências individuais:<br />

76


<strong>uma</strong> criança que se apropriou da alfabeticida<strong>de</strong> do sistema, em um grupo<br />

que esta conquista não é o objetivo, precisa continuar sendo motivada,<br />

<strong>de</strong>safiada e tenha possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> continuar refletindo e avançando em<br />

relação ao seu próprio saber. Ou seja, não é porque <strong>uma</strong> criança ou um<br />

grupo atingiu as expectativas <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> ou mesmo <strong>de</strong> <strong>uma</strong> série, que<br />

ela não será mais alvo <strong>de</strong> investimento por parte do professor, em outras<br />

palavras, negligenciada à medida que tem suas potencialida<strong>de</strong>s podadas,<br />

porque chegou a um suposto “ponto-fi<strong>na</strong>l”.<br />

É tarefa do professor não fazer só o que interessa a criança, mas<br />

tor<strong>na</strong>r interessante aquilo que ensi<strong>na</strong>.<br />

Vale ressaltar que a gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> a<strong>na</strong>lisada é <strong>uma</strong> opção possível<br />

entre muitas outras e que não preten<strong>de</strong> servir como mo<strong>de</strong>lo a ser seguido.<br />

Esta gra<strong>de</strong> se ajusta aos propósitos da escola, ao público e ao trabalho <strong>de</strong><br />

formação profissio<strong>na</strong>l que <strong>de</strong>senvolve. É produto <strong>de</strong> muita pesquisa e<br />

reflexão e dificilmente po<strong>de</strong>ria ser puramente transposta a outras realida<strong>de</strong>s.<br />

A intenção em utilizá-la foi a <strong>de</strong> apresentar como crianças <strong>de</strong> 3, 4 e 5 anos<br />

atuam enquanto leitores e escritores, sem <strong>de</strong>ixarem <strong>de</strong> vivenciar outros<br />

momentos importantes para sua formação.<br />

Para fi<strong>na</strong>lizar, fica claro que a questão principal sobre a qual a escola<br />

infantil <strong>de</strong>ve se <strong>de</strong>bruçar não é <strong>de</strong>finir se irá reproduzir as práticas do ensino<br />

fundamental ou limpar assepticamente as salas <strong>de</strong> aula <strong>de</strong> qualquer traço da<br />

linguagem escrita, mas sim <strong>de</strong>finir quais são os conteúdos relevantes para<br />

cada grupo e, partindo dos pressupostos teóricos sobre como se dá a<br />

construção do conhecimento refletir: Como ensi<strong>na</strong>r <strong>de</strong> forma a potencializar a<br />

criança, como sujeito <strong>de</strong> seu próprio percurso <strong>de</strong> aprendizagem?<br />

É certo que as discussões sobre o tema da alfabetização <strong>na</strong> educação<br />

infantil não se esgotam aqui. Há muito o que pesquisas po<strong>de</strong>m contribuir<br />

para favorecer a reflexão e a atuação dos docentes <strong>de</strong>ste segmento. Para<br />

<strong>uma</strong> próxima investigação, por exemplo, seria interessante realizar um<br />

levantamento sobre o impacto <strong>na</strong> aprendizagem das crianças ao serem<br />

77


convidadas <strong>na</strong> escola, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, a atuarem enquanto leitores e<br />

escritores que o são.<br />

78


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