Ler e escrever na Educação Infantil: Análise de uma proposta curricular
Monografia apresentada para a obtenção do título de especialista em alfabetização Centro de Formação da Escola da Vila - São Paulo/SP
Monografia apresentada para a obtenção do título de especialista em alfabetização
Centro de Formação da Escola da Vila - São Paulo/SP
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Centro <strong>de</strong> Formação da Escola da Vila<br />
Especialização em Alfabetização<br />
LER E ESCREVER NA EDUCAÇÃO INFANTIL:<br />
ANÁLISE DE UMA PROPOSTA CURRICULAR<br />
GIULIANNY RUSSO MARINHO<br />
SÃO PAULO<br />
2012
Centro <strong>de</strong> Formação da Escola da Vila<br />
Especialização em Alfabetização<br />
LER E ESCREVER NA EDUCAÇÃO INFANTIL:<br />
ANÁLISE DE UMA PROPOSTA CURRICULAR<br />
GIULIANNY RUSSO MARINHO<br />
Monografia <strong>de</strong> conclusão do curso<br />
<strong>de</strong><br />
Especialização em Alfabetização<br />
PROFA. ORIENTADORA: ANDRÉA LUIZE<br />
SÃO PAULO<br />
2012
Escola da Vila - Pós Graduação - Avaliação da Monografia<br />
Prezada Giulianny Russo Marinho<br />
As consi<strong>de</strong>rações sobre sua monografia intitulada “<strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> <strong>na</strong> educação infantil:<br />
análise <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> <strong>curricular</strong>”, feitas pela avaliação exter<strong>na</strong> apontam a extrema<br />
qualida<strong>de</strong> do trabalho fi<strong>na</strong>l, cuja nota é 10,0 (<strong>de</strong>z), conforme justifica o parecer que se<br />
segue.<br />
“O tema eleito é bastante relevante tendo em vista as comuns e recentes discussões sobre<br />
o papel alfabetizador da educação infantil. Os dois capítulos iniciais apresentam aspectos<br />
que fundamentam a análise posterior e ainda justificam a vertente tomada como referência:<br />
as práticas construtivistas <strong>de</strong> ensino inicial da leitura e da escrita. Também trazem<br />
importantes colocações sobre as características do <strong>de</strong>senvolvimento das crianças ao longo<br />
<strong>de</strong>ste segmento da escolarida<strong>de</strong> e sobre a história do próprio segmento.<br />
A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> a<strong>na</strong>lisar, minuciosamente, <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> <strong>curricular</strong> mostrou-se <strong>de</strong>safiadora, mas<br />
foi abarcada em sua totalida<strong>de</strong>: houve um cuidado em a<strong>na</strong>lisar não ape<strong>na</strong>s as situações<br />
didáticas ali presentes, mas também os conteúdos que as envolvem, algo feito à luz <strong>de</strong><br />
diferentes autores, pesquisadores <strong>de</strong> base e estudiosos da didática da língua.<br />
A conclusão apresenta corretamente a retomada das hipóteses e objetivos em confronto<br />
com a análise feita.<br />
O trabalho contém todas as partes necessárias a <strong>uma</strong> monografia. O texto apresenta<br />
linguagem formal, ajustada às <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> um texto acadêmico, inserção <strong>de</strong> citações e <strong>de</strong><br />
referências a<strong>de</strong>quadas às normas da ABNT.<br />
Pela qualida<strong>de</strong> do trabalho, recomenda-se a organização <strong>de</strong> artigos, a partir dos capítulos<br />
iniciais e <strong>de</strong> análise, que po<strong>de</strong>rá ser enviados para publicação em revistas especializadas em<br />
educação ou mesmo em educação infantil.”<br />
Cordialmente,<br />
Zélia Cavalcanti<br />
Coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção <strong>de</strong> Pós graduação<br />
5
Había u<strong>na</strong> vez un niño...<br />
que estava con un adulto...<br />
y el adulto tenía un libro...<br />
y el adulto leía.<br />
Y el niño, fasci<strong>na</strong>do, escuchaba<br />
cómo la lengua oral se hace<br />
lengua escrita.<br />
La fasci<strong>na</strong>ción <strong>de</strong>l lugar preciso<br />
don<strong>de</strong> lo conocido se hace<br />
<strong>de</strong>sconocido. El punto exacto<br />
para asumir<br />
el <strong>de</strong>safío <strong>de</strong> conocer y crecer.<br />
(FERREIRO, 2008, p. 64)
AGRADECIMENTOS<br />
Agra<strong>de</strong>ço a Andréa Luize, inicialmente, pela maneira cuidadosa e<br />
criteriosa com que orientou esse trabalho. Agra<strong>de</strong>ço também toda a<br />
orientação que, generosamente, me ofereceu anos antes <strong>de</strong> meu ingresso<br />
no curso <strong>de</strong> pós-graduação: escutando, compartilhando e legitimando<br />
minhas reflexões, discutindo, temperando e fomentando-as, indicando-me<br />
caminhos, livros e outras direções.<br />
Contudo, agra<strong>de</strong>ço-a intensamente pelo jeito sutil, carinhoso e<br />
acolhedor com que me contagiou com a sua paixão pelo universo<br />
maravilhoso da alfabetização. Minha eter<strong>na</strong> admiração.<br />
E, a<strong>de</strong>mais <strong>de</strong> toda sua importância em minha formação enquanto<br />
educadora, professora e alfabetizadora (!!), como se ainda não bastasse, me<br />
contemplou com sua amiza<strong>de</strong> e parceria.<br />
Meu muito, muito, muito obrigada.<br />
Não posso <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> agra<strong>de</strong>cer também, meu querido e eterno<br />
<strong>na</strong>morado, meu marido André Marinho. Sua paciência, seu incentivo, seu<br />
investimento e sua aposta foram (são e sempre serão) inestimáveis: sem<br />
eles eu não disporia do ânimo, da força vital, do ímpeto e da coragem<br />
necessária para me lançar <strong>na</strong> formação que acredito que todo educador<br />
<strong>de</strong>veria ter. Sem você, faltaria algo, per<strong>de</strong>ria o brilho. Você traz a<br />
serenida<strong>de</strong>, a paz e a tranquilida<strong>de</strong> emocio<strong>na</strong>l e me nutri <strong>de</strong> todo amor,<br />
carinho, amiza<strong>de</strong> e companheirismo para que eu siga: “Meu melhor amigo é<br />
o meu amor”.<br />
Meus pais, Julio e Edinei<strong>de</strong>, e irmãos Neto e Karol, que fazem parte da<br />
mais forte e fiel torcida! Vocês são o meu coração e minha vida.<br />
À Escola da Vila por ser tão inspiradora e exemplo <strong>de</strong> um trabalho<br />
consistente e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a formação pedagógica e educacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong><br />
seus alunos à formação profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> seus professores e funcionários, bem<br />
como dos <strong>de</strong>mais alunos do Centro <strong>de</strong> Formação.
SUMÁRIO<br />
INTRODUÇÃO 5<br />
CAPÍTULO I – CONSTRUTIVISMO E EDUCAÇÃO INFANTIL:<br />
HISTÓRICO, DEFINIÇÕES E FUNDAMENTOS. 9<br />
1.1 Construtivismo: pressupostos e alicerces 9<br />
1.1.1 O impacto <strong>na</strong> educação escolar 12<br />
1.2 Um pouco sobre a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 15<br />
1.2.1 A <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> no Brasil 16<br />
1.2.2 De que <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> estamos falando? 18<br />
1.2.3 Características da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 19<br />
1.2.4 O que ensi<strong>na</strong>r <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> – os conteúdos 22<br />
CAPÍTULO II - LER E ESCREVER NA EDUCAÇÃO INFANTIL: A QUEM E<br />
À QUÊ SE DESTINA 27<br />
2.1 O trabalho com Linguagem Oral e Escrita <strong>na</strong> perspectiva construtivista 27<br />
2.1.1 <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> - a alfabetização <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 31<br />
2.1.2 Propósitos e <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>Educação</strong> infantil alfabetizadora 33<br />
2.2 Re<strong>de</strong>finindo a questão 37<br />
CAPÍTULO III – ANÁLISE DE UMA PROPOSTA CURRICULAR PARA A<br />
FORMAÇÃO DE LEITURAS E ESCRITORES DESDE A EDUCAÇÃO<br />
INFANTIL 41<br />
3.1 A Escola da Vila 41<br />
3.1.1 Estrutura Curricular 43<br />
3.1.2 Organização Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem 44<br />
3.2 Gra<strong>de</strong> Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem 46<br />
3.2.1 Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário 46<br />
3.2.2 Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para 53<br />
3.2.3 Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar 61<br />
3.3. A transversalida<strong>de</strong> no currículo 65<br />
3.4 Sobre o fazer leitor/escritor: refletir sobre o sistema <strong>de</strong> escrita avançando<br />
rumo à leitura e à escrita convencio<strong>na</strong>l 68<br />
IV - ALGUMAS CONSIDERAÇÕES 71<br />
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 79
Introdução<br />
Como comumente a aprendizagem da leitura e<br />
da escrita não tem sido sequer consi<strong>de</strong>rada <strong>na</strong><br />
educação infantil, o que existe é um total<br />
<strong>de</strong>sconhecimento do assunto. O resultado mais<br />
imediato é que os professores diante do evi<strong>de</strong>nte<br />
interesse <strong>de</strong>monstrado pelas crianças em querer<br />
apren<strong>de</strong>r a ler e <strong>escrever</strong> ficam sem saber o que<br />
fazer, e em muitos casos, acabam por reproduzir<br />
práticas <strong>de</strong> ensino a que eles próprios estiveram<br />
submetidos em suas experiências escolares, sem,<br />
no entanto, terem o conhecimento necessário<br />
para compreen<strong>de</strong>r as razões do que fazem e sem<br />
subsídio teórico algum para alicerçar suas<br />
práticas.<br />
(STEMMER, 2007, p. 136)<br />
Há muitos anos o tema da alfabetização ocupa o centro dos <strong>de</strong>bates<br />
educacio<strong>na</strong>is e cada vez mais a socieda<strong>de</strong> tem discutido e se indig<strong>na</strong>do com a<br />
qualida<strong>de</strong> do ensino no país. É justo afirmar, no entanto, que os investimentos<br />
políticos feitos nesta área limitam-se a remediar as consequências, não tratando<br />
dos problemas estruturais que as <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>iam. Em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong>ste pouco caso<br />
e da falta <strong>de</strong> comprometimento, alguns dos profissio<strong>na</strong>is da área se vêm à <strong>de</strong>riva<br />
<strong>de</strong> em um sistema que não os forma a<strong>de</strong>quadamente, não os remunera<br />
satisfatoriamente e tão pouco fornece a infraestrutura necessária para o trabalho.<br />
Como resultados <strong>de</strong>sse processo, muitos professores colocam-se à espera <strong>de</strong><br />
“lançamentos pedagógicos” que solucionem todos os seus problemas didáticos -<br />
professores que estão assujeitados <strong>de</strong> seu próprio processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong><br />
conhecimento, que aplicam acriticamente aquilo que julgam compreen<strong>de</strong>r sobre as<br />
pesquisas, <strong>proposta</strong>s, mo<strong>de</strong>los e novida<strong>de</strong>s educacio<strong>na</strong>is. Em outros casos,<br />
encontramos profissio<strong>na</strong>is comprometidos que buscam estruturar suas práticas<br />
docentes consi<strong>de</strong>rando as pesquisas teóricas e as didáticas, que tomam o aluno<br />
como sujeito do processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> conhecimentos. Tais profissio<strong>na</strong>is,<br />
porém, não encontram, por vezes, um ambiente <strong>de</strong> interlocução e tampouco um<br />
respaldo para refletir, avaliar e repensar as situações <strong>de</strong> ensino e suas<br />
intervenções.<br />
O mais grave é que estes modus operandi generalizaram-se em nossa<br />
socieda<strong>de</strong>, chegando mesmo a ser reconhecido como próprio da cultura escolar,<br />
tanto no âmbito público quanto no privado.<br />
5
Po<strong>de</strong>-se avaliar como alarmante, também, a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> escolas que são<br />
<strong>de</strong>finidas a partir <strong>de</strong> um suposto referencial teórico adotado, sem que, no entanto,<br />
haja preocupação com a coerência <strong>de</strong> suas práticas em relação a ele. Mais ainda,<br />
quando não se responsabilizam pelas diferentes “correntes” que seus professores<br />
adotam, quando estes o fazem – em <strong>uma</strong> mesma escola, é possível encontrar salas<br />
<strong>de</strong> aula com professores atuando a partir <strong>de</strong> concepções <strong>de</strong> ensino tão<br />
diferenciadas que até se colocam como divergentes. E, tendo em vista o percurso<br />
do aluno, este segue pelas diferentes séries sem que exista mínima coerência entre<br />
as <strong>proposta</strong>s pedagógicas ou mesmo entre a visão <strong>de</strong> aprendizagem dos vários<br />
professores com quem interage.<br />
Em relação ao trabalho com leitura e a escrita, po<strong>de</strong>m-se encontrar, n<strong>uma</strong><br />
mesma instituição <strong>de</strong> ensino, professores seguidores <strong>de</strong> cartilhas e <strong>de</strong> livros<br />
didáticos e outros que, <strong>de</strong> forma potente, levam, efetivamente, seus alunos a<br />
interagirem com situações comunicativas envolvendo textos que circulam no<br />
âmbito social. No caso da educação infantil, a diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias e <strong>de</strong> fazeres<br />
didáticos permitem que alg<strong>uma</strong>s escolas sequer tenham a leitura e a escrita como<br />
elemento primordial do currículo. Por vezes, por julgarem não caber a esse<br />
segmento alfabetizar. Este argumento é totalmente legítimo quando visto em<br />
acordo com certa concepção do papel da educação infantil, do <strong>de</strong>senvolvimento e<br />
da aprendizagem. Contudo, a mesma criança que vivenciou este processo, ou seja,<br />
que pouco se aproximou dos atos <strong>de</strong> ler e <strong>de</strong> <strong>escrever</strong> no ambiente escolar, ao<br />
ingressar no segmento seguinte (fundamental I), encontra <strong>uma</strong> abordagem<br />
completamente diferente e tem o prazo <strong>de</strong> um ano para domi<strong>na</strong>r o sistema <strong>de</strong><br />
escrita convencio<strong>na</strong>l.<br />
A não consistência teórica é <strong>uma</strong> das marcas da educação escolar brasileira<br />
atualmente e, no contexto <strong>de</strong> escolas <strong>de</strong> educação infantil, esse problema parece<br />
tor<strong>na</strong>r-se ainda maior, pois há <strong>uma</strong> tendência a oportunizar pouca ou nenh<strong>uma</strong><br />
interação dos profissio<strong>na</strong>is com os estudos sobre as didáticas, distanciando-os da<br />
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refletirem e <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>rem melhor o que significa alfabetizar.<br />
A presente monografia parte da inquietação da pesquisadora, com<br />
significativa experiência como professora <strong>de</strong>ste primeiro segmento da escolarida<strong>de</strong>,<br />
frente ao pouco comprometimento teórico e prático relacio<strong>na</strong>do, sobretudo, às<br />
questões que tangem ao processo <strong>de</strong> alfabetização inicial, junto a crianças <strong>de</strong> 3 a 6<br />
anos ida<strong>de</strong>, aproximadamente.<br />
6
O mote inspirador da pesquisa teve origem <strong>na</strong> crença, muito usual, <strong>de</strong> que<br />
um trabalho consistente, contínuo e permanente, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> linguagem,<br />
é incompatível com as necessida<strong>de</strong>s lúdicas da faixa etária e que privilegiar este<br />
aspecto implica negligenciar a brinca<strong>de</strong>ira, a arte e o movimento. Para<br />
compreen<strong>de</strong>r o que fundamenta esta afirmação e como ela se opõe à perspectiva<br />
construtivista <strong>de</strong> aprendizagem faz-se necessário <strong>uma</strong> retomada teórica que, a<br />
partir dos pressupostos construtivistas, permita a<strong>na</strong>lisar as características e<br />
objetivos da educação infantil e a própria concepção <strong>de</strong> alfabetização.<br />
Esta pesquisa busca, portanto, retomar as investigações sobre a concepção<br />
construtivista <strong>de</strong> aprendizagem, assim como traçar um breve panorama da<br />
educação infantil no Brasil e, por fim, abordar o papel e o compromisso<br />
alfabetizador que cabe a esse segmento, a partir <strong>de</strong> estudos da didática da língua e<br />
da análise do documento <strong>curricular</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino.<br />
O capítulo inicial traz alguns dos pressupostos bases do construtivismo e<br />
seus impactos <strong>na</strong> educação escolar em contraposição ao mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ensino tido<br />
como tradicio<strong>na</strong>l. Na sequência, para se enten<strong>de</strong>r alg<strong>uma</strong>s das fragilida<strong>de</strong>s<br />
encontradas nesse segmento, há <strong>uma</strong> breve retomada histórica <strong>de</strong> seu surgimento<br />
no Brasil e as implicações <strong>de</strong>correntes da mudança que ocorreu em sua <strong>na</strong>tureza, a<br />
partir da regulamentação da educação infantil.<br />
Ainda nesse capítulo, serão apresentadas as características e os objetivos do<br />
segmento tendo como base os Referenciais Curriculares Nacio<strong>na</strong>is - material<br />
produzido para instrumentalizar o professor - e, ainda, a discussão sobre a<br />
<strong>proposta</strong> <strong>de</strong> organização <strong>curricular</strong> e conteúdos para esta faixa etária, presentes<br />
nesse documento.<br />
No segundo capítulo, serão relacio<strong>na</strong>das as mudanças ocorridas <strong>na</strong> forma <strong>de</strong><br />
conceber a alfabetização quando se toma as práticas <strong>de</strong> linguagem como objeto a<br />
ser ensi<strong>na</strong>do. Neste sentido, serão discutidas as <strong>de</strong>finições e as potencialida<strong>de</strong>s do<br />
que consi<strong>de</strong>ramos ler e <strong>escrever</strong> e como a inserção <strong>de</strong>stas práticas <strong>na</strong> gra<strong>de</strong><br />
<strong>curricular</strong> diz respeito à forma como elas são concebidas, e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte das<br />
escolhas pedagógicas que são feitas <strong>na</strong> construção do currículo do segmento. Para<br />
tanto, será a<strong>na</strong>lisado, no terceiro capítulo, o documento <strong>curricular</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> escola<br />
privada, da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo, consi<strong>de</strong>rando a gra<strong>de</strong> estabelecida.<br />
7
Concluo, por fim, a partir das análises realizadas à luz do referencial teórico<br />
que embasa o trabalho, refletindo sobre a crítica da escolarização da educação<br />
infantil e a sua generalização quando o que está em jogo não é somente o<br />
pressuposto teórico ou a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s, mas sobretudo a<br />
gestão do tempo didático e a qualida<strong>de</strong> das proposições e intervenções do<br />
professor.<br />
8
Capítulo I – Construtivismo e educação infantil: histórico,<br />
<strong>de</strong>finições e fundamentos.<br />
(...) existe um processo <strong>de</strong> aquisição da<br />
linguagem escrita que prece<strong>de</strong> e exce<strong>de</strong> os<br />
limites escolares.<br />
(FERREIRO, 2010, p. 45)<br />
1.1 Construtivismo: pressupostos e alicerces<br />
Como <strong>de</strong>stacado <strong>na</strong> introdução, a análise do papel da educação infantil em<br />
relação à formação <strong>de</strong> leitores e <strong>de</strong> escritores será pautada <strong>na</strong> concepção<br />
construtivista <strong>de</strong> aprendizagem. Por essa razão, cabe <strong>de</strong>stacar alguns dos<br />
pressupostos que norteiam esse modo <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r o papel do aprendiz em seu<br />
processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> conhecimentos, o que será foco neste capítulo.<br />
O construtivismo, como a própria palavra permite inferir, refere-se à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
construção, on<strong>de</strong> o ambiente, os sujeitos e as relações estão em constante<br />
transformação. Isso implica pressupor que <strong>na</strong>da está acabado, pronto. Jean Piaget<br />
(1973) foi um dos pesquisadores <strong>de</strong>dicados às questões sobre como ocorre a<br />
construção do conhecimento pelas crianças e os saberes produzidos a partir <strong>de</strong>ste<br />
estudo refletem-se, até hoje, <strong>na</strong>s diferentes áreas do saber.<br />
Este teórico concluiu, a partir <strong>de</strong> inúmeras pesquisas, que o conhecimento é<br />
produzido a partir das trocas entre o sujeito e o meio. O meio é, aqui, entendido<br />
tanto como o meio físico, social e cultural, como os objetos e <strong>de</strong>mais agentes que<br />
os compõem (PIAGET, 1971/1978). Essas trocas são intensas <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o <strong>na</strong>scimento,<br />
mas ficam mais evi<strong>de</strong>ntes quando as interações <strong>de</strong> <strong>na</strong>tureza social começam a<br />
ocorrer, mais precisamente durante a primeira infância (entre dois a sete anos,<br />
aproximadamente), com o aparecimento da linguagem. Este é o exato período em<br />
que, em geral, a criança inicia sua escolarida<strong>de</strong>.<br />
9
As interações com o meio permitem ao sujeito, a partir das<br />
experiências e dos conhecimentos prévios 1 , reconstruir saberes e se apropriar <strong>de</strong><br />
novos. Os conhecimentos são experimentados, testados, generalizados, significados<br />
e ressignificados <strong>na</strong>s interações posteriores.<br />
Em outras palavras, o sujeito-aprendiz parte daquilo que já sabe e ao<br />
interagir com o outro - que tem conhecimentos diferentes - terá alg<strong>uma</strong>s <strong>de</strong> suas<br />
certezas <strong>de</strong>sestabilizadas, provocando um <strong>de</strong>sequilíbrio em sua estrutura inicial e,<br />
<strong>na</strong> tentativa <strong>de</strong> acomodar o novo conhecimento ao que ele já tem, produz novos<br />
saberes.<br />
É óbvio que um estímulo po<strong>de</strong> eliciar <strong>uma</strong> resposta somente se o<br />
organismo for anteriormente sensibilizado a este estímulo [...]<br />
Quando dizemos que um organismo ou sujeito é sensível a um<br />
estímulo e capaz <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a ele, está implícito que ele já possui<br />
um esquema ou estrutura à qual este estímulo é assimilado.<br />
(PIAGET, 1977, p.77)<br />
Em seu livro Seis estudos <strong>de</strong> Psicologia (1984), Piaget articula as i<strong>de</strong>ias<br />
apresentadas acima quando pressupõe certo funcio<strong>na</strong>mento das estruturas<br />
mentais, que se aplica <strong>na</strong>s diferentes aprendizagens, qual seja: que o meio<br />
representa um <strong>de</strong>safio, um enigma, sobre o qual a criança age, inicialmente <strong>de</strong><br />
maneira reflexa, mas que, pela repetição e incorporação <strong>de</strong> novos hábitos e<br />
percepções, vai dotando <strong>de</strong> intencio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> as suas ações ao observar as relações<br />
<strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>s. Desse movimento (repetição, imitação e exploração <strong>de</strong> outras<br />
possibilida<strong>de</strong>s) surge a linguagem, que aumenta quantitativa e qualitativamente a<br />
interação com o meio, fazendo com que este traga cada vez mais novos <strong>de</strong>safios,<br />
sobre os quais as crianças, a partir do que já sabem (conhecimentos prévios),<br />
incorporaram novos conhecimentos e construíram outros.<br />
Ainda <strong>de</strong> acordo com Piaget (1984), o que impulsio<strong>na</strong> o sujeito a atuar sobre<br />
o mundo, <strong>na</strong> tentativa <strong>de</strong> <strong>de</strong>svendá-lo é a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> equilibração: ele assimila<br />
aquilo que vem <strong>de</strong> fora e gera um <strong>de</strong>sconforto, porque não pertence às suas<br />
estruturas anteriores e, no esforço <strong>de</strong> livrar-se <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>sconforto, acomoda o que<br />
foi assimilado aos seus esquemas. Desse modo, apropria-se <strong>de</strong> maneira única <strong>de</strong><br />
1<br />
O termo “conhecimentos prévios”, alcunhado por Ausubel (1980), se refere aos saberes<br />
que os alunos dispõem e que serão <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>ntes para as aprendizagens posteriores.<br />
Trata-se daquilo que Piaget (1972) chamou <strong>de</strong> estrutura mental do indivíduo e que será<br />
modificada à medida que incorporar outros conhecimentos a esta estrutura. Sendo esta,<br />
portanto, condições prévias para apren<strong>de</strong>r.<br />
10
um conhecimento inicialmente externo a ele. Macedo (1994) comparou este<br />
processo ao que ocorre quando jogamos <strong>uma</strong> pedra em um lago: as águas do lago<br />
estão paradas (o que representa as estruturas que o sujeito já construiu) e ao<br />
serem atingidas pela pedra (dado novo) produzem ondas em sua superfície, que se<br />
propagam até a pedra ter sido completamente acomodada ao solo do lago. A pedra<br />
não é mais a mesma <strong>de</strong> antes <strong>de</strong> ser lançada ao lago, nem o lago é o mesmo após<br />
ser atingido pela pedra.<br />
A partir <strong>de</strong>ssas i<strong>de</strong>ias apresentadas, po<strong>de</strong>-se inferir que a capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> a<br />
criança realizar interações <strong>de</strong> diversas <strong>na</strong>turezas com sujeitos e objetos – <strong>na</strong>s quais<br />
possa expor suas i<strong>de</strong>ias, argumentar, experimentar, reformular etc. - é <strong>uma</strong><br />
característica estruturante e, portanto, fundamental, da construção do<br />
conhecimento.<br />
Vale <strong>de</strong>talhar o conceito <strong>de</strong> conhecimentos prévios, já mencio<strong>na</strong>dos<br />
anteriormente, dado ser um dos fundamentos do construtivismo. Nas palavras <strong>de</strong><br />
Piaget<br />
(...) para que um novo instrumento lógico se construa, é preciso<br />
sempre instrumentos lógicos prelimi<strong>na</strong>res; quer dizer que a<br />
construção <strong>de</strong> <strong>uma</strong> nova noção suporá sempre substratos,<br />
subestruturas anteriores e isso por regressões in<strong>de</strong>finidas. (PIAGET,<br />
1972, p. 20)<br />
(...) as relações entre o sujeito e o seu meio consistem n<strong>uma</strong><br />
interação radical, <strong>de</strong> modo tal que a consciência não começa pelo<br />
conhecimento dos objetos nem pelo da ativida<strong>de</strong> do sujeito, mas por<br />
um estado diferenciado; e é <strong>de</strong>sse estado que <strong>de</strong>rivam dois<br />
movimentos complementares, um <strong>de</strong> incorporação das coisas ao<br />
sujeito, o outro <strong>de</strong> acomodação às próprias coisas. (PIAGET, 1978, p.<br />
386)<br />
As i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> conhecimentos prévios, interação e, sobretudo, a do processo <strong>de</strong><br />
equilibração pressupõem um papel ativo do sujeito que apren<strong>de</strong>. Ao formular a<br />
teoria psicogenética, Piaget submeteu à comprovação prática a importância da<br />
ativida<strong>de</strong> mental construtiva dos sujeitos nos processos <strong>de</strong> aquisição do<br />
conhecimento – residindo neste aspecto a sua gran<strong>de</strong> contribuição para a<br />
concepção <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> aprendizagem. (COLL, 2004).<br />
Conceber a construção <strong>de</strong> conhecimentos <strong>de</strong>ste modo implica um novo olhar<br />
sobre a relação ensino e aprendizagem no âmbito escolar. Se as interações entre os<br />
11
sujeitos e entre estes e os objetos <strong>de</strong> conhecimento se constituem como<br />
fundamentais no processo <strong>de</strong> aprendizagem, a escola e o professor ganham novas<br />
funções e papéis. Em virtu<strong>de</strong> da importância, esse tema é mais bem discutido no<br />
tópico seguinte.<br />
1.1.1 O impacto <strong>na</strong> educação escolar<br />
Para se perceber o impacto que a concepção construtivista teve <strong>na</strong> educação,<br />
é necessário traçar, brevemente, os principais aspectos que marcam certa visão<br />
consi<strong>de</strong>rada mais tradicio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> ensino escolar. Importa salientar que não se tratará<br />
<strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição escolar, em especial, mas <strong>de</strong> um modo <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r o<br />
ensino, <strong>de</strong> certa visão <strong>de</strong> aluno e <strong>de</strong> professor, vigente antes do advento da<br />
concepção construtivista e que continua presente ainda hoje.<br />
A escola tradicio<strong>na</strong>l tem se apoiado tanto <strong>na</strong>s teorias i<strong>na</strong>tistas – <strong>de</strong> Platão<br />
(427-347 a.C.), <strong>de</strong> Kant (séc. XIV) e <strong>de</strong> Descartes (séc. XVI) -, que formulam que<br />
as pessoas <strong>na</strong>scem com <strong>uma</strong> bagagem <strong>de</strong> conhecimentos, <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong><br />
qualida<strong>de</strong>s e, portanto, a tarefa do professor é ajudá-las a tor<strong>na</strong>r conscientes esses<br />
saberes adormecidos; quanto <strong>na</strong>s teorias empiristas – Aristóteles (384–322 a.C.) e<br />
<strong>de</strong> Locke, Hume e Bacon (séc. XVI - XVII) - para as quais todo o conhecimento está<br />
no mundo exterior e a criança é como <strong>uma</strong> “tabula rasa”, ou seja, não possui<br />
nenhum saber anterior, cabendo ao professor transmitir a ela os saberes do<br />
mundo, por meio da memorização. (BECKER, 2003).<br />
No caso do i<strong>na</strong>tismo, a aprendizagem <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> majoritariamente do aluno e<br />
do meio social, suas experiências e interações são dispensáveis neste processo.<br />
Vale ressaltar que esta noção foi rechaçada cientificamente, mas ainda é comum<br />
que educadores justifiquem o fracasso ou êxito escolar <strong>na</strong>s habilida<strong>de</strong>s individuais<br />
<strong>de</strong> aprendizagem. Já no empirismo, diametralmente aposto ao primeiro, o aluno é<br />
passivo em relação à sua aprendizagem; é um mero receptáculo do conteúdo<br />
transmitido pelo professor. Ele chega à escola e, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente <strong>de</strong> sua<br />
bagagem <strong>de</strong> experiências e <strong>de</strong> seu interesse, supostamente incorporará o<br />
conhecimento mediante a memorização. Tor<strong>na</strong>ndo a aprendizagem um simples<br />
exercício, sem sentido, valor ou significado.<br />
12
Em ambos os casos, o conhecimento tem um caráter cumulativo e a<br />
capacida<strong>de</strong> do sujeito <strong>de</strong> armaze<strong>na</strong>r estas informações é o que o <strong>de</strong>fine como<br />
inteligente. À escola, por sua vez, cabe organizar os conteúdos dos mais simples<br />
aos mais complexos e <strong>de</strong>senvolver métodos que facilitam a memorização.<br />
Na perspectiva construtivista, o conhecimento não é inerente ao ser h<strong>uma</strong>no<br />
e tampouco ao meio, mas sim <strong>uma</strong> construção realizada pela ação do sujeito ao<br />
interagir com o meio.<br />
Cinqüenta 2 anos <strong>de</strong> experiências ensi<strong>na</strong>ram-nos que não existem<br />
conhecimentos resultantes <strong>de</strong> um simples registro <strong>de</strong> observações,<br />
sem <strong>uma</strong> estruturação <strong>de</strong>vida às ativida<strong>de</strong>s do indivíduo. Mas<br />
tampouco existem (no homem) estruturas cognitivas a priori ou<br />
i<strong>na</strong>tas: só o funcio<strong>na</strong>mento da inteligência é hereditário, e só gera<br />
estruturas mediante <strong>uma</strong> organização <strong>de</strong> ações sucessivas, exercidas<br />
sobre objetos. Daí resulta que <strong>uma</strong> epistemologia em conformida<strong>de</strong><br />
com os dados da psicogênese não po<strong>de</strong>ria ser empírica nem préformista,<br />
mas não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> ser um construtivismo, com a<br />
elaboração contínua <strong>de</strong> operações e <strong>de</strong> novas estruturas. (PIAGET<br />
apud MACEDO, 1994, p. 14).<br />
Ao afirmar que os sujeitos apren<strong>de</strong>m por meio da interação, que possuem<br />
conhecimentos anteriores e ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que são eles quem constroem<br />
seus próprios conhecimentos, Piaget contraria o que o ensino tradicio<strong>na</strong>l<br />
consi<strong>de</strong>rava caro a respeito do processo <strong>de</strong> aprendizagem, bem como o lugar<br />
ocupado pelo aprendiz.<br />
O conceito <strong>de</strong> “conhecimentos prévios” e sua importância para a construção<br />
<strong>de</strong> outros saberes por si só traz gran<strong>de</strong>s impactos, sobretudo, para a educação,<br />
porque implica assumir que a criança tem um papel fundamental em seu processo<br />
<strong>de</strong> aprendizagem. Ou seja, coloca a criança como sujeito cognoscente, ativo <strong>na</strong><br />
busca <strong>de</strong> conhecimento, que ao se <strong>de</strong>frontar com novas informações, objetos ou<br />
realida<strong>de</strong>s, assimila-as, confrontando-as com seus esquemas prévios, e então<br />
produz <strong>uma</strong> representação pessoal, diferente da que possuía antes e do que lhe<br />
tenha sido dado apriori.<br />
Decorre, portanto, que se o sujeito não possuir esquemas anteriores,<br />
<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da informação que se relacione com este esquema não po<strong>de</strong>rá ser<br />
percebida, assimilada pela criança. Um exemplo, tomando a aprendizagem da<br />
escrita convencio<strong>na</strong>l é informar à criança que está começando a perceber a<br />
2<br />
Nas citações serão mantidas as grafias das palavras conforme constam no texto origi<strong>na</strong>l.<br />
13
correspondência sonora entre o que fala e a respectiva escrita - etapa bastante<br />
inicial do processo - sobre o uso do ‘x’ e do ‘ch’.<br />
Consi<strong>de</strong>rar e partir dos conceitos <strong>de</strong> conhecimentos prévios em todas as<br />
situações <strong>de</strong> aprendizagem e em todos os momentos <strong>de</strong>ste processo garante que o<br />
objeto a ser aprendido tenha ressonância e, portanto, escuta por parte do aluno. O<br />
novo conteúdo po<strong>de</strong>, então, ser incorporado às estruturas pré-existentes<br />
estabelecendo, assim, relações com o seu saber.<br />
Ausubel (apud MARTÍN e SOLÉ, 2004, p. 61) <strong>de</strong>fine esta aprendizagem como<br />
significativa:<br />
(...) aquela <strong>na</strong> qual a nova informação se relacio<strong>na</strong> <strong>de</strong> maneira<br />
significativa, isto é, não arbitrária, não ao pé da letra, com os<br />
conhecimentos que o aluno já tem, produzindo-se <strong>uma</strong><br />
transformação, tanto no conteúdo assimilado quanto <strong>na</strong>quele que o<br />
estudante já sabia.<br />
Dessa forma, o conhecimento adquirido é apropriado pelo aluno e lembrado<br />
por mais tempo, já que não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> armaze<strong>na</strong>mento <strong>de</strong><br />
informações aleatórias <strong>na</strong> memória. Além disso, favorece a disponibilida<strong>de</strong> do aluno<br />
para apren<strong>de</strong>r, bem como a aprendizagem <strong>de</strong> outros conteúdos, porque à medida<br />
que foi apropriado, passa a constituir o conjunto <strong>de</strong> conhecimentos <strong>de</strong>sse sujeito.<br />
Se, nesta perspectiva, o aluno apren<strong>de</strong> <strong>de</strong> um modo diferente do que se<br />
supunha até então, o trabalho do professor, consi<strong>de</strong>rado o <strong>de</strong>tentor do saber - e<br />
que o transmitia por expla<strong>na</strong>ções orais e exercícios - também muda. A partir da<br />
<strong>proposta</strong> construtivista, esse trabalho passa a consistir em favorecer amplas,<br />
sistemáticas, intencio<strong>na</strong>is e múltiplas interações com o objeto a ser aprendido e<br />
intervir <strong>de</strong> modo a oportunizar a criação <strong>de</strong> conflitos cognitivos para que o aluno<br />
possa confrontar o conteúdo já conhecido com os novos dados e, assim, reelaborar<br />
e ressignificar seus conhecimentos.<br />
As pesquisas <strong>de</strong> Piaget trouxeram gran<strong>de</strong>s contribuições ao que se concebia<br />
sobre o processo <strong>de</strong> aprendizagem. Contudo, outros autores, alguns <strong>de</strong>les<br />
contemporâneos <strong>de</strong> Piaget, <strong>de</strong>senvolveram i<strong>de</strong>ias e teorias que, hoje, também são<br />
tomadas como aporte para o construtivismo.<br />
14
Nesse sentido, Vygotsky (1999), referindo-se especificamente à<br />
aprendizagem escolar, aponta que para provocar o conflito cognitivo, o professor<br />
<strong>de</strong>ve promover situações que se localizem <strong>na</strong> zo<strong>na</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento proximal - o<br />
espaço entre o nível <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento real, isto é, aquilo que a criança é capaz<br />
<strong>de</strong> resolver sozinha, e o nível <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento potencial, o que a criança faz<br />
com colaboração <strong>de</strong> um adulto ou um companheiro.<br />
Segundo o autor (VYGOTSKY,1999, p.101), “(...) a noção <strong>de</strong> zo<strong>na</strong> <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento proximal capacita-nos a propor <strong>uma</strong> nova fórmula, a <strong>de</strong> que o<br />
“bom aprendizado” é somente aquele que se adianta ao <strong>de</strong>senvolvimento”.<br />
As crianças, em constante interação com o meio físico e social, precisam<br />
constantemente rever suas hipóteses e, neste sentido, a atuação do professor<br />
resi<strong>de</strong> em promover interações, em sala <strong>de</strong> aula, entre as crianças; entre elas e o<br />
objeto <strong>de</strong> conhecimento; com o próprio professor e assim possibilitando, com isso,<br />
que exerçam diferentes papéis sociais <strong>na</strong>s diversas relações. Estas intervenções<br />
têm o intuito <strong>de</strong> provocar a <strong>de</strong>sestabilização das i<strong>de</strong>ias iniciais ou gerar um conflito<br />
cognitivo, favorecendo assim as novas aprendizagens.<br />
Por essa razão, é imprescindível que o professor, além <strong>de</strong> domi<strong>na</strong>r o objeto a<br />
ser ensi<strong>na</strong>do e as didáticas específicas, reflita <strong>de</strong>talhadamente sobre o processo <strong>de</strong><br />
aprendizagem <strong>de</strong> cada criança, conheça o que cada um <strong>de</strong> seus alunos já construiu<br />
como saber e o que ainda precisa construir. A partir <strong>de</strong>sse conhecimento, po<strong>de</strong>rá<br />
então planejar e promover as diferentes situações didáticas.<br />
Ensi<strong>na</strong>r exige rigorosida<strong>de</strong> metódica. Ensi<strong>na</strong>r exige pesquisa. Ensi<strong>na</strong>r<br />
exige respeito aos saberes dos educandos. Ensi<strong>na</strong>r exige reflexão<br />
crítica sobre a prática. Ensi<strong>na</strong>r exige curiosida<strong>de</strong>. Ensi<strong>na</strong>r exige<br />
segurança, competência profissio<strong>na</strong>l e generosida<strong>de</strong>. Ensi<strong>na</strong>r exige<br />
compreen<strong>de</strong>r que a educação é <strong>uma</strong> forma <strong>de</strong> intervenção no<br />
mundo. (FREIRE, 2009, p.7-8).<br />
1.2 Um pouco sobre a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong><br />
Como este trabalho preten<strong>de</strong> discutir o papel <strong>de</strong>ste segmento no processo <strong>de</strong><br />
alfabetização inicial é importante <strong>de</strong>ixar claro qual visão <strong>de</strong> educação infantil será<br />
tomada como norte, evi<strong>de</strong>nciando o papel que este segmento da escolarida<strong>de</strong> tem<br />
<strong>na</strong> vida das crianças. Na parte que se segue, há <strong>uma</strong> breve retomada histórica que<br />
15
nos leva até o Referencial que subsidia e norteia o trabalho <strong>de</strong>senvolvido em<br />
escolas e creches.<br />
1.2.1 A <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> no Brasil<br />
Durante muitos séculos a educação da criança peque<strong>na</strong> era <strong>de</strong><br />
responsabilida<strong>de</strong> exclusiva da família. Com o ingresso da mulher no mercado <strong>de</strong><br />
trabalho, sobretudo, <strong>na</strong>s últimas décadas do século XX, o atendimento à criança <strong>de</strong><br />
0 a 6 anos passa a ser realizado em creches, <strong>de</strong> cunho filantrópico, que ofereciam<br />
alimentação, higiene e segurança aos filhos <strong>de</strong> operárias ou empregadas<br />
domésticas. As crianças das famílias mais abastadas permaneciam sob os cuidados<br />
<strong>de</strong> babás.<br />
No processo <strong>de</strong> industrialização do Brasil, a partir da década <strong>de</strong> 30, com o<br />
aumento da <strong>de</strong>manda <strong>de</strong> mão <strong>de</strong> obra femini<strong>na</strong>, os movimentos operários –<br />
li<strong>de</strong>rados, sobretudo, por imigrantes europeus - ganham força e passam a<br />
reivindicar os direitos trabalhistas, <strong>de</strong>ntre eles, a criação <strong>de</strong> instituições que<br />
cuidassem <strong>de</strong> seus filhos durante a sua jor<strong>na</strong>da <strong>de</strong> trabalho.<br />
Com a expansão da oferta <strong>de</strong> trabalho e da necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> renda, a<br />
<strong>de</strong>manda por serviços <strong>de</strong> instituições <strong>de</strong> atendimento à criança aumentou em todo<br />
país: as <strong>de</strong> cunho público, com objetivo <strong>de</strong> suprir as carências essenciais, e as<br />
privadas, com ênfase à socialização e a preparação para a educação obrigatória<br />
(KRAMER, 1995).<br />
Observou-se então que crianças oriundas da classe baixa, ao ingressarem no<br />
ensino regular público, em pouco tempo fracassavam e abando<strong>na</strong>vam a escola.<br />
Com objetivo <strong>de</strong> suprir certas carências culturais e ensi<strong>na</strong>r conteúdos que,<br />
supostamente, seriam requisitos para aprendizagens no nível seguinte, surgiu a<br />
educação “pré-escolar”, dos 4 a 6 anos.<br />
Contudo, essa pré-escola não era regulamentada, não possuía caráter formal<br />
e tampouco contava com profissio<strong>na</strong>is habilitados, sendo sua mão <strong>de</strong> obra<br />
constituída, principalmente, por voluntários. (KRAMER, 1995)<br />
Ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong> década <strong>de</strong> 80, pela mobilização da socieda<strong>de</strong> civil e <strong>de</strong> órgãos<br />
não-gover<strong>na</strong>mentais, a educação para crianças <strong>de</strong> 0 a 6 anos passou a ser<br />
16
consi<strong>de</strong>rada um <strong>de</strong>ver do Estado e um direito da criança, garantidos pela<br />
Constituição <strong>de</strong> 1988. A partir <strong>de</strong>ste momento, as creches, que até então<br />
prestavam um serviço assistencial, passam a ser também, responsáveis por certo<br />
trabalho educacio<strong>na</strong>l.<br />
Nos anos seguintes, <strong>uma</strong> série <strong>de</strong> pesquisas, leis e estatutos foram<br />
publicados 3 com a intenção <strong>de</strong> subsidiar o trabalho neste segmento:<br />
• 1990 – aprovado o Estatuto da Criança e do Adolescente -, que os assegura<br />
direitos fundamentais: “[...] <strong>de</strong>senvolvimento físico, mental, moral, espiritual<br />
e social, em condições <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> e dignida<strong>de</strong>” (BRASIL, 1990).<br />
• 1994 a 1996 – são publicados pelo Ministério da <strong>Educação</strong> (MEC) diversos<br />
documentos intitulados “Política Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>”, “Critérios<br />
para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das<br />
crianças”, “Por <strong>uma</strong> política <strong>de</strong> formação do profissio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> educação<br />
infantil”, “<strong>Educação</strong> infantil: bibliografia anotada” e “Propostas pedagógicas e<br />
currículo em educação infantil”.<br />
• 1996 – Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases da <strong>Educação</strong> Nacio<strong>na</strong>l (LDB): trata dos<br />
diferentes segmentos e inclui a educação infantil como primeira etapa da<br />
<strong>Educação</strong> Básica. Essa Lei <strong>de</strong>fine que a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> da educação infantil é<br />
promover o <strong>de</strong>senvolvimento integral da criança até 6 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>,<br />
complementando a ação da família e da comunida<strong>de</strong> (BRASIL, 1996).<br />
• 1998 - O MEC publica os documentos “Subsídios para o cre<strong>de</strong>nciamento e o<br />
funcio<strong>na</strong>mento das instituições <strong>de</strong> educação infantil” e o “Referencial<br />
Curricular Nacio<strong>na</strong>l para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>”.<br />
• 1998 e 1999 – O Conselho Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> <strong>Educação</strong> aprova as “Diretrizes<br />
Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>” e as “Diretrizes Curriculares<br />
para a Formação <strong>de</strong> Professores da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> e Anos Iniciais do<br />
Ensino Fundamental”<br />
• 2011 – aprovado o Plano Nacio<strong>na</strong>l <strong>de</strong> <strong>Educação</strong> (PNE), que estabelece metas<br />
para todos os níveis <strong>de</strong> ensino.<br />
3<br />
Documentos citados estão listados em REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS, no fi<strong>na</strong>l <strong>de</strong>ste<br />
trabalho.<br />
17
Ao regulamentar a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, estabelecendo metas, objetivos e<br />
<strong>proposta</strong>s educativas o Ministério da <strong>Educação</strong> teve que, necessariamente, adotar<br />
<strong>uma</strong> concepção <strong>de</strong> criança, <strong>de</strong> educação, <strong>de</strong> cuidado e <strong>de</strong> aprendizagem. Estes<br />
conceitos são apresentados e justificados, à luz da perspectiva construtivista, nos<br />
diversos documentos anteriormente citados, bem como o volume 1 do Referencial<br />
Curricular Nacio<strong>na</strong>l para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL, 1998, v1).<br />
A origem da educação infantil no Brasil, que esteve atrelada por muito tempo<br />
a um histórico <strong>de</strong> assistencialismo, apresenta agora <strong>uma</strong> organização, <strong>uma</strong><br />
estrutura e um currículo específico, do qual nos aproximaremos a seguir.<br />
1.2.2 De que <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> estamos falando?<br />
A mudança do papel social <strong>de</strong>senvolvido pelas instituições <strong>de</strong> educação<br />
infantil trouxe<br />
(...) um consenso sobre a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> que a educação para as<br />
crianças peque<strong>na</strong>s <strong>de</strong>va promover a integração entre os aspectos<br />
físicos, emocio<strong>na</strong>is, afetivos, cognitivos e sociais da criança,<br />
consi<strong>de</strong>rando que esta é um ser complexo e indivisível. (BRASIL,<br />
1998, v.1, p.17)<br />
Contudo, há diferentes modos <strong>de</strong> conceber o trabalho com cada um <strong>de</strong>sses<br />
aspectos, e <strong>de</strong>finir qual a perspectiva e a concepção a serem adotadas é<br />
fundamental para a elaboração <strong>de</strong> <strong>proposta</strong>s educativas consistentes.<br />
Ou seja, para propor um currículo para a educação infantil é importante ter a<br />
clareza <strong>de</strong> qual criança se está a tratar: a carente, a frágil, a passiva e a<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte ou um sujeito ativo que cria e busca soluções e respostas para<br />
enten<strong>de</strong>r e lidar com o mundo em que está inserido?<br />
Esta monografia, assim como o Referencial Curricular Nacio<strong>na</strong>l para a<br />
<strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> 4 , partirá <strong>de</strong>sta última concepção <strong>de</strong> criança, que é a mesma<br />
concebida por Piaget, um sujeito ativo <strong>na</strong> busca do conhecimento, que <strong>de</strong>sempenha<br />
um intenso trabalho no processo <strong>de</strong> apropriação do mesmo.<br />
4<br />
A partir <strong>de</strong>ste ponto do texto, se fará referência a este documento por meio <strong>de</strong> sua sigla:<br />
RCN<br />
18
(...) um sujeito social e histórico (que) faz parte <strong>de</strong> <strong>uma</strong> organização<br />
familiar que está inserida em <strong>uma</strong> socieda<strong>de</strong>, com <strong>uma</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da<br />
cultura, em um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do momento histórico (...) e <strong>na</strong>s<br />
interações que estabelecem <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo com as pessoas que lhe são<br />
próximas e com o meio que as circunda, as crianças revelam seu<br />
esforço para compreen<strong>de</strong>r o mundo em que vivem, as relações<br />
contraditórias que presenciam e, por meio das brinca<strong>de</strong>iras,<br />
explicitam as condições <strong>de</strong> vida a que estão submetidas e seus<br />
anseios e <strong>de</strong>sejos. (BRASIL, 1998, v.1, p.21).<br />
As Diretrizes Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL, 2010,<br />
p. 14) <strong>de</strong>finem criança como:<br />
Sujeito histórico e <strong>de</strong> direitos que, <strong>na</strong>s interações, relações e práticas<br />
cotidia<strong>na</strong>s que vivencia, constrói sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> pessoal e coletiva,<br />
brinca, imagi<strong>na</strong>, fantasia, <strong>de</strong>seja, apren<strong>de</strong>, observa, experimenta,<br />
<strong>na</strong>rra, questio<strong>na</strong> e constrói sentidos sobre a <strong>na</strong>tureza e a socieda<strong>de</strong>,<br />
produzindo cultura.<br />
A partir do momento em que se tem em vista esta perspectiva <strong>de</strong> criança,<br />
tor<strong>na</strong>-se insustentável a existência <strong>de</strong> práticas escolares pautadas no<br />
condicio<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> comportamento e no trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> habilida<strong>de</strong>s. Faz-se<br />
necessária <strong>uma</strong> escola que, ciente <strong>de</strong> como se dá a construção do conhecimento,<br />
promova aprendizagens significativas que <strong>de</strong>safiem seus alunos e os mobilizem a<br />
criar, a significar e a ressignificar seus saberes.<br />
1.2.3 Características da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong><br />
A Lei <strong>de</strong> Diretrizes e Bases - LDB 9.394/96 - <strong>de</strong>fine que a <strong>Educação</strong> Básica é<br />
composta pela <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, pelo Ensino Fundamental e pelo Ensino Médio. Na<br />
seção II, o artigo 29 estabelece:<br />
A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como<br />
fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> o <strong>de</strong>senvolvimento integral da criança até seis anos <strong>de</strong><br />
ida<strong>de</strong>, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,<br />
complementando a ação da família e da comunida<strong>de</strong>. 5 (BRASIL,<br />
1996)<br />
5<br />
Em 2007 as Leis Fe<strong>de</strong>rais 11.114 e 11.274 alteram a faixa etária da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> para<br />
0 a 5 anos.<br />
19
A educação infantil po<strong>de</strong> ser oferecida em creches (0 a 3 anos) e pré-escolas<br />
(4 e 5 anos), públicas ou privadas, regulamentada pelos órgãos competentes. Esta<br />
etapa não é obrigatória, ou seja, é facultativo à família a frequência <strong>de</strong> menores <strong>de</strong><br />
seis anos em instituição <strong>de</strong> ensino. Todavia, continua sendo <strong>de</strong>ver do Estado<br />
garantir o acesso universal, gratuito e <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>, sem requisito <strong>de</strong> seleção<br />
(BRASIL, 2010).<br />
Segundo Bassedas, Huguet e Solé (1999), os principais traços característicos<br />
<strong>de</strong>sta etapa resi<strong>de</strong>m no caráter não-obrigatório: as diferentes séries po<strong>de</strong>m ser<br />
compostas tanto por crianças já escolarizadas quanto por aquelas que entram pela<br />
primeira vez neste ambiente; <strong>na</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> colaboração estreita com a<br />
família, a fim <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r as diferentes necessida<strong>de</strong>s da criança, bem como a<br />
concordância no que se refere às re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cuidados; no equilíbrio entre a etapa<br />
como própria i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e a relação necessária com as outras etapas educativas:<br />
ter <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> característica, que lhe seja própria e não em função do<br />
segmento seguinte, sem, contudo, <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> tê-lo em vista, para que haja<br />
coerência e fluência <strong>na</strong> transição <strong>de</strong> <strong>uma</strong> etapa a outra; <strong>na</strong> função educativa e<br />
função social simultâneas: auxiliar as famílias <strong>na</strong> tarefa <strong>de</strong> educar as crianças e<br />
<strong>de</strong>senvolver o potencial máximo <strong>de</strong> cada aluno, por meio dos conteúdos próprios da<br />
etapa.<br />
Barbosa (2009) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que, para garantir um trabalho <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong> nesta<br />
etapa é necessária a articulação entre as três funções que atribui à educação<br />
infantil: função social, que é divida com a família, e é relativa ao cuidar e a<br />
formação pessoal e social; função política, relacio<strong>na</strong>da ao gozo dos direitos sociais e<br />
políticos e a garantia <strong>de</strong> exercer seu direito <strong>de</strong> participação; e a função pedagógica<br />
<strong>de</strong> oferecer acesso à cultura, ao conhecimento do meio social e aos diferentes<br />
sistemas <strong>de</strong> representação da realida<strong>de</strong>, ou seja, as diferentes linguagens: oral,<br />
escrita, matemática, científica, artística etc. Nas palavras da autora (2009, p. 12):<br />
A função da educação infantil <strong>na</strong>s socieda<strong>de</strong>s contemporâneas é a <strong>de</strong><br />
possibilitar a vivência em comunida<strong>de</strong>, apren<strong>de</strong>ndo a respeitar, a<br />
acolher e a celebrar a diversida<strong>de</strong> dos <strong>de</strong>mais, a sair da percepção<br />
exclusiva do seu universo pessoal, assim como a ver o mundo a<br />
partir do olhar do outro e da compreensão <strong>de</strong> outros mundos sociais.<br />
Isso implica em <strong>uma</strong> profunda aprendizagem da cultura através <strong>de</strong><br />
ações, experiências e práticas <strong>de</strong> convívio social que tenham soli<strong>de</strong>z,<br />
constância e compromisso, possibilitando à criança inter<strong>na</strong>lizar as<br />
formas cognitivas <strong>de</strong> pensar, agir e operar que sua comunida<strong>de</strong><br />
construiu ao longo da história. Práticas sociais que se apren<strong>de</strong>m<br />
através do conhecimento <strong>de</strong> outras culturas, das <strong>na</strong>rrativas<br />
20
tradicio<strong>na</strong>is e contemporâneas que possam contar sobre a vida<br />
h<strong>uma</strong><strong>na</strong> por meio da literatura, da música, da pintura, da dança.<br />
Isso é, histórias coletivas que, ao serem ouvidas, se encontram com<br />
as histórias pessoais, alargando os horizontes cognitivos e<br />
emocio<strong>na</strong>is através do diálogo, das conversas, da participação e da<br />
vida <strong>de</strong>mocrática.<br />
Estas diferentes funções da educação infantil se concretizam, <strong>de</strong> maneira<br />
integrada, <strong>na</strong> prática escolar; <strong>na</strong>s relações entre o adulto e a criança e entre a<br />
escola e a família; <strong>na</strong> valorização e capacitação profissio<strong>na</strong>l; bem como se<br />
traduzem <strong>na</strong>s <strong>proposta</strong>s pedagógicas; <strong>na</strong> forma como são feitos os<br />
encaminhamentos e o planejamento <strong>de</strong> intervenções; <strong>na</strong> distribuição do tempo e<br />
espaço; <strong>na</strong> organização tanto social da sala - os agrupamentos – como a <strong>de</strong><br />
conteúdos. Todas as situações escolares atuam <strong>na</strong> construção da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e<br />
autonomia, <strong>na</strong> formação política como, também, no acesso à cultura e a relação<br />
que a criança po<strong>de</strong> estabelecer com o saber.<br />
Com a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instrumentalizar o professor para que possa preparar e<br />
refletir sobre a sua prática, os RCN apresentam <strong>uma</strong> organização didática<br />
estabelecendo dois âmbitos da ação educativa: o da Formação Pessoal e Social e o<br />
do Conhecimento <strong>de</strong> Mundo. A primeira refere-se ao <strong>de</strong>senvolvimento da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />
e conquista da autonomia, partindo do pressuposto <strong>de</strong> que a escola <strong>de</strong> educação<br />
infantil é um espaço privilegiado “<strong>de</strong> inserção das crianças <strong>na</strong>s relações éticas e<br />
morais que permeiam a socieda<strong>de</strong> <strong>na</strong> qual estão inseridas” (BRASIL, 1998. v2.<br />
p.11). E o segundo, Conhecimento <strong>de</strong> Mundo, “refere-se à construção das<br />
diferentes linguagens pelas crianças e as relações que estabelecem com os objetos<br />
<strong>de</strong> conhecimento: Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita,<br />
Natureza e Socieda<strong>de</strong> e Matemática” (BRASIL, 1998. v1, p.7).<br />
A partir <strong>de</strong>sta organização, é possível se consi<strong>de</strong>rar quais <strong>de</strong>vem ser,<br />
efetivamente, os conteúdos <strong>de</strong> trabalho do segmento da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, aspecto<br />
que será abordado no próximo item.<br />
21
1.2.4 O que ensi<strong>na</strong>r <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> – os conteúdos<br />
Zabala (2010) afirma que conteúdo <strong>de</strong> aprendizagem é tudo aquilo que é<br />
suscetível <strong>de</strong> ser aprendido.<br />
Na educação infantil o termo conteúdo gerou e ainda gera muitas polêmicas,<br />
que inclusive se relacio<strong>na</strong>m com o tema <strong>de</strong>ste trabalho. Por muito tempo, a<br />
educação <strong>de</strong> crianças <strong>de</strong> 0 a 6 anos, esteve subordi<strong>na</strong>da à preparação para o<br />
Ensino Fundamental, o que implicou <strong>na</strong> antecipação <strong>de</strong> conteúdos e no treino <strong>de</strong><br />
habilida<strong>de</strong>s que supostamente eram pré-requisitos para aprendizagens posteriores.<br />
Contudo, se partimos do pressuposto <strong>de</strong> que as crianças apren<strong>de</strong>m “algo” neste<br />
segmento e que este terá propósitos educativos para além do cuidar, ele será,<br />
portanto, dotados <strong>de</strong> intencio<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>, fazendo enorme sentido falar em conteúdos.<br />
Além disso, se partimos da concepção que a função <strong>de</strong>ste segmento é a<br />
ampliação do universo cultural infantil, e que isto ocorre a partir da inserção da<br />
criança em práticas sociais não restritas àquelas que transitam em âmbito familiar,<br />
é necessário permitir e garantir o acesso aos conhecimentos próprios e amplos da<br />
cultura <strong>na</strong> instituição escolar.<br />
É importante, como já dito anteriormente, que essa etapa da escolarida<strong>de</strong><br />
tenha <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> própria, com conteúdos ajustados às suas <strong>de</strong>mandas e<br />
características, mas restringir o acesso à cultura e ao conhecimento do meio social<br />
é <strong>de</strong>sprover as práticas do segmento <strong>de</strong> sentido e propósito (BASSEDAS et.al,<br />
1999).<br />
Coll (1998) amplia esse conceito <strong>de</strong> conteúdo, classificando-o <strong>de</strong> acordo com<br />
a sua <strong>na</strong>tureza: a conceitual (refere-se aos conhecimentos, ao saber), a<br />
procedimental (correspon<strong>de</strong> ao saber fazer - estratégias e técnicas a fim <strong>de</strong> atingir<br />
um propósito) e a atitudi<strong>na</strong>l (associado às atitu<strong>de</strong>s, valores e normas).<br />
Esta forma <strong>de</strong> classificação dos conteúdos organiza, didaticamente, <strong>de</strong> outro<br />
modo o trabalho da escola, sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> contemplar os conceitos <strong>de</strong>scritos<br />
anteriormente, que dizem respeito à sua função educativa. Também é útil para que<br />
o professor tenha consciência <strong>de</strong> qual aspecto está trabalhando e qual é necessário<br />
focar, <strong>de</strong> quais conceitos sua <strong>proposta</strong> po<strong>de</strong> articular e <strong>de</strong> quais serão as<br />
intervenções que fará, tendo em vista que a <strong>uma</strong> mesma <strong>proposta</strong> po<strong>de</strong>m ser<br />
22
dados diferentes enfoques (conceitual, procedimental ou atitudi<strong>na</strong>l), em função <strong>de</strong><br />
seus objetivos.<br />
Segundo o RCN (BRASIL, 1998, v1, p49) os conteúdos concretizam os<br />
propósitos da instituição e também são<br />
um meio para que as crianças <strong>de</strong>senvolvam suas capacida<strong>de</strong>s e<br />
exercitem sua maneira própria <strong>de</strong> pensar, sentir e ser, ampliando<br />
suas hipóteses acerca do mundo ao qual pertencem e constituindose<br />
em um instrumento para a compreensão da realida<strong>de</strong>.<br />
Barbosa (2009) <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que os conteúdos <strong>na</strong> educação infantil <strong>de</strong>vem estar<br />
relacio<strong>na</strong>dos com a vida cotidia<strong>na</strong> e terem como referência as práticas sociais, ou<br />
seja, o conjunto <strong>de</strong> ações dos sujeitos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> cultura que os i<strong>de</strong>ntificam como<br />
membros pertencentes àquele grupo social. Cita, ainda, como conteúdos<br />
educacio<strong>na</strong>is <strong>de</strong>sta etapa, ações <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a higiene e controle do corpo, relações<br />
sociais, brinca<strong>de</strong>iras, movimento, repouso, relações sociais, cultura popular até a<br />
aprendizagem das diferentes linguagens.<br />
A autora enfatiza que não se trata <strong>de</strong> “pedagogizar” a troca <strong>de</strong> fraldas, por<br />
exemplo, mas que <strong>na</strong> medida em que o cuidado com o corpo é <strong>uma</strong> prática<br />
fundamental, que pertence à cultura da qual a escola e o sujeito comungam, é<br />
necessário consi<strong>de</strong>rar, prever e problematizá-la enquanto importante conteúdo<br />
relativo à educação e ao bem-estar da criança.<br />
Po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>finir ‘prática’ a partir da contraposição com o que chamamos <strong>de</strong><br />
teoria que, segundo o dicionário Michaelis, é um conjunto <strong>de</strong> “princípios básicos e<br />
elementares <strong>de</strong> <strong>uma</strong> arte ou ciência”, relativo ao campo das i<strong>de</strong>ias ou<br />
“conhecimento que se limita à exposição, sem passar à ação, sendo, portanto, o<br />
contrário da prática”. Triviños (2006) afirma, em seu artigo sobre a dialética<br />
materialista e a prática social, que as i<strong>de</strong>ias, o conhecimento e a teoria são<br />
materializados pela linguagem, que é consi<strong>de</strong>rada como prática social.<br />
O pensamento, as idéias, os conceitos que temos sobre a realida<strong>de</strong><br />
que constituem a relação teórica do sujeito com o objeto, “surge e se<br />
<strong>de</strong>senvolve a base da interação prática entre eles (TRIVIÑOS, 2006,<br />
p 124).<br />
Na mesma direção, Barbosa (2009, p.85) também <strong>de</strong>fine práticas sociais<br />
enquanto linguagem, consi<strong>de</strong>rada em um “sentido amplo <strong>de</strong> compartilhar sentidos<br />
23
e comunicar significados, ou seja, <strong>de</strong> leitura, <strong>de</strong> interpretação, <strong>de</strong> expressão e <strong>de</strong><br />
produção <strong>de</strong> significados simbólicos e não no sentido restrito <strong>de</strong> linguagem verbal,<br />
oral ou escrita”.<br />
Há diferentes tipos <strong>de</strong> linguagem: enquanto manifestação e expressão<br />
cultural, linguagem científica, matemática, artística etc.<br />
(...) as linguagens são saberes da ação: simbólicos, expressivos,<br />
científicos, artísticos e tecnológicos que <strong>de</strong>monstram a capacida<strong>de</strong><br />
h<strong>uma</strong><strong>na</strong> para falar, <strong>escrever</strong>, manipular, expressar e produzir um<br />
número ilimitado <strong>de</strong> pensamentos e experiências in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />
do conhecimento formal das discipli<strong>na</strong>s sistematizadas,<br />
hierarquizadas e lineares. (BARBOSA, 2009, p.85)<br />
A autora <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>, portanto, que os conteúdos <strong>de</strong> ensino <strong>na</strong> educação infantil<br />
estejam centrados e pautados pelas práticas sociais e culturais <strong>de</strong> uso das<br />
linguagens, proporcio<strong>na</strong>ndo assim situações reais <strong>de</strong> interação em um contexto <strong>de</strong><br />
significação.<br />
Um exemplo <strong>de</strong> <strong>proposta</strong> pautada <strong>na</strong>s práticas sociais <strong>de</strong> uso <strong>de</strong> linguagem,<br />
seria a <strong>de</strong> “seguir” um autor - prática comum entre leitores e escritores , que lêem<br />
os livros <strong>de</strong> um mesmo autor, por gostarem do estilo, da qualida<strong>de</strong> ou temática.<br />
Nesta <strong>proposta</strong>, vários conteúdos po<strong>de</strong>m ser trabalhados e, a <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da série e<br />
dos objetivos pedagógicos, alguns serão privilegiados em relação a outros, por<br />
exemplo, po<strong>de</strong>m ser conteúdos: a escuta <strong>de</strong> textos daquele gênero; a socialização<br />
<strong>de</strong> opiniões sobre a história, perso<strong>na</strong>gens, <strong>de</strong>sfecho, parte favorita etc., a<br />
antecipação <strong>de</strong> partes do enredo ou da história a partir dos conhecimentos que tem<br />
sobre o autor ou pelas ilustrações, o reconhecimento <strong>de</strong> marcas próprias do autor,<br />
<strong>de</strong>ntre muitos outros conteúdos possíveis.<br />
Mas como <strong>de</strong>finir quais conteúdos serão privilegiados? Coll e Solé (2010)<br />
relembram que os conteúdos veiculados <strong>na</strong> escola já estão elaborados e fazem<br />
parte da cultura e conhecimento. Ou seja, são saberes que a socieda<strong>de</strong> e os<br />
pesquisadores em educação reconhecem como importantes para o <strong>de</strong>senvolvimento<br />
social e individual dos alunos e, por isso, <strong>de</strong>vem ser trabalhados <strong>na</strong> escola.<br />
Uma vez que “os conteúdos escolares constituem um reflexo e <strong>uma</strong> seleção”<br />
(COLL e SOLÉ, 2010, p.21) <strong>de</strong> alguns aspectos da cultura, não faria sentido instituir<br />
quais conteúdos <strong>de</strong>veriam ser trabalhados em âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l, já que um país<br />
expressa <strong>uma</strong> rica diversida<strong>de</strong> cultural. Baseado nesta i<strong>de</strong>ia, excetuando-se aquilo<br />
24
que está previsto em lei, as <strong>de</strong>mais publicações referentes à educação são<br />
chamadas <strong>de</strong> “Parâmetros”, “Referencias”, “Orientações”, que visam manter certa<br />
unida<strong>de</strong>, assegurando alguns pontos comuns, mas <strong>de</strong>ixam espaço para as<br />
particularida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> cada grupo e realida<strong>de</strong>.<br />
Os conteúdos aqui elencados preten<strong>de</strong>m oferecer um repertório que<br />
possa auxiliar o <strong>de</strong>senvolvimento das capacida<strong>de</strong>s colocadas nos<br />
objetivos gerais. (BRASIL,1998, p. 53)<br />
Dada a diversida<strong>de</strong> existente no País, é <strong>na</strong>tural e <strong>de</strong>sejável que<br />
ocorram alterações no quadro proposto. A <strong>de</strong>finição dos conteúdos a<br />
serem tratados <strong>de</strong>ve consi<strong>de</strong>rar o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong>s<br />
a<strong>de</strong>quadas às características sociais, culturais e econômicas<br />
particulares <strong>de</strong> cada localida<strong>de</strong>. Assim, a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> conteúdos nos<br />
Parâmetros Curriculares Nacio<strong>na</strong>is é <strong>uma</strong> referência suficientemente<br />
aberta para técnicos e professores a<strong>na</strong>lisarem, refletirem e tomarem<br />
<strong>de</strong>cisões, resultando em ampliações ou reduções <strong>de</strong> certos aspectos,<br />
em função das necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> aprendizagem <strong>de</strong> seus alunos.<br />
(BRASIL, 1997, p.51)<br />
O documento tem por objetivos: servir <strong>de</strong> referência para o trabalho<br />
do professor (...). Subsidiar cada professor (...). Apoiar cada equipe<br />
(...) (SÃO PAULO, 2007, p.7)<br />
Na educação infantil esta maleabilida<strong>de</strong> do currículo 6 é imprescindível dada a<br />
diversida<strong>de</strong> <strong>de</strong> experiências que convivem em <strong>uma</strong> mesma sala <strong>de</strong> aula. Como dito<br />
anteriormente, seguindo a <strong>proposta</strong> dos RCN, o currículo da educação infantil <strong>de</strong>ve<br />
contar com os objetivos e os conteúdos relativos à construção da I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e<br />
Autonomia, assim como, objetivos e conteúdos relativos ao âmbito Conhecimento<br />
<strong>de</strong> mundo, “orientados para a construção das diferentes linguagens e para as<br />
relações que estabelecem com os objetos <strong>de</strong> conhecimento: Movimento, Música,<br />
Artes Visuais, Linguagem Oral e Escrita, Natureza e Socieda<strong>de</strong> e Matemática”<br />
(BRASIL, 1998, v1, p.46).<br />
Como este trabalho preten<strong>de</strong> pesquisar sobre o papel da educação infantil no<br />
processo <strong>de</strong> alfabetização inicial, se discorrerá, no capítulo seguinte, sobre as<br />
concepções <strong>de</strong> área, <strong>de</strong> objetivos, <strong>de</strong> conteúdos e <strong>de</strong> eixos <strong>de</strong> trabalho<br />
6<br />
Neste momento, não nos ateremos a todas as possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> concepção <strong>de</strong>ste termo, o<br />
mesmo será usado aqui como a articulação entre os conteúdos eleitos em função dos<br />
propósitos educacio<strong>na</strong>is.<br />
25
<strong>de</strong>senvolvido em Linguagem Oral e Escrita. Além disso, conforme citado<br />
anteriormente, se a<strong>na</strong>lisa o currículo <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino.<br />
26
Capítulo II - <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> <strong>na</strong> educação infantil: a quem e à quê se<br />
<strong>de</strong>sti<strong>na</strong><br />
No caso da aprendizagem da língua oral,<br />
os adultos que ro<strong>de</strong>iam a criança manifestam<br />
entusiasmo quando ela faz suas primeiras<br />
tentativas para comunicar-se oralmente (...)<br />
Todos tentam compreen<strong>de</strong>r o que a criança disse<br />
supondo que quis dizer algo […] No caso da<br />
língua escrita o comportamento da comunida<strong>de</strong><br />
escolar é marcadamente oposto (...), porque se<br />
supõe que não possa <strong>escrever</strong> <strong>na</strong>da até ter<br />
recebido a instrução formal pertinente (...)<br />
Ninguém tenta retraduzir o que a criança<br />
escreveu, porque lhe nega o direito <strong>de</strong><br />
aproximar-se da escrita por aminho diferente do<br />
indicado pelo método escolhido pelo professor.<br />
(FERREIRO, 2008, p.30)<br />
2.1 O trabalho com Linguagem Oral e Escrita <strong>na</strong> perspectiva construtivista<br />
As <strong>de</strong>scobertas realizadas acerca <strong>de</strong> como as crianças apren<strong>de</strong>m tem<br />
transformado, <strong>de</strong> modo substancial, a maneira <strong>de</strong> se conceber a aprendizagem das<br />
linguagens oral e escrita. Em consonância com o que está exposto neste trabalho<br />
sobre o referencial construtivista, as crianças construirão estes saberes à medida<br />
que estiverem inseridas em situações reais <strong>de</strong> comunicação e uso da linguagem.<br />
A perspectiva construtivista começou a influenciar as concepções <strong>de</strong><br />
linguagem no Brasil, mais propriamente as <strong>de</strong> linguagem escrita, a partir da<br />
publicação, em 1979, da obra Psicogênese da Língua Escrita, <strong>de</strong> Emilia Ferreiro e<br />
A<strong>na</strong> Teberosky. Ancoradas nos estudos <strong>de</strong> Piaget, as autoras, em conjunto com<br />
outras pesquisadoras, <strong>de</strong>dicaram-se a investigar como a criança constrói o saber<br />
sobre a língua escrita.<br />
Este estudo trouxe um novo aspecto para o <strong>de</strong>bate sobre a alfabetização,<br />
que até então acontecia ape<strong>na</strong>s no sentido <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir qual seria o melhor método <strong>de</strong><br />
ensino. A re<strong>de</strong> pública que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a década <strong>de</strong> 60, vinha sendo castigada pelo<br />
fracasso escolar (representado pela evasão e repetência), principalmente <strong>na</strong>s séries<br />
27
iniciais, vislumbrou <strong>na</strong> pesquisa psicogenética a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r a este<br />
problema. É fato que, <strong>de</strong> início, a inserção das i<strong>de</strong>ias apresentadas por Ferreiro e<br />
Teberosky foi feita <strong>de</strong> modo abrupto e pouco formativo. De todas as conclusões<br />
apresentadas, somente as i<strong>de</strong>ias vinculadas à apropriação da escrita alfabética<br />
foram trazidas para os professores, ou seja, ape<strong>na</strong>s as i<strong>de</strong>ias sobre as hipóteses<br />
construídas pelas crianças chegaram aos professores. Isso acabou gerando – e é<br />
algo que ainda ocorre – distorções no papel do professor alfabetizador e <strong>na</strong> forma<br />
como as contribuições advindas da Psicogênese influenciam a prática <strong>de</strong> ensino. Em<br />
muitos casos, por exemplo, os professores se mantinham usando métodos fechados<br />
<strong>de</strong> alfabetização e “usavam” as hipóteses ape<strong>na</strong>s em caráter avaliativo, a fim <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>finir quantos alunos escreviam <strong>de</strong> forma alfabética, quantos <strong>de</strong> forma silábica<br />
etc.<br />
(...) a <strong>de</strong>speito da amplitu<strong>de</strong> do referencial teórico e das suas<br />
implicações para a prática pedagógica, a apropriação da psicogênese<br />
em sala <strong>de</strong> aula acabou configurando-se sob a forma <strong>de</strong> praticas<br />
reducionistas e, não raro, equivocadas. Ansiosos por encontrar<br />
alter<strong>na</strong>tivas para os dramáticos índices <strong>de</strong> reprovação e fracasso<br />
escolar, muitos professores acabaram fazendo <strong>uma</strong> transposição<br />
<strong>de</strong>masiadamente direta das situações <strong>de</strong> pesquisa, trazendo-as para<br />
a escola mais como <strong>uma</strong> metodologia <strong>de</strong> trabalho do que<br />
propriamente como um estímulo à reflexão, ao estudo e ao<br />
planejamento <strong>de</strong> práticas mais compromissadas com o aprendiz (...)<br />
muitos educadores lançaram-se avidamente à psicogenética como se<br />
ela fosse a solução para todos os problemas da sala <strong>de</strong> aula (...)<br />
surgiram também os ‘modismos pedagógicos’, práticas<br />
inconseqüentes e até irresponsáveis, embora não necessariamente<br />
mal-intencio<strong>na</strong>das. (LUIZE E COLELLO, 2005, p.20)<br />
Nas instâncias superiores, porém, aos poucos houve <strong>uma</strong> preocupação em<br />
salientar a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> mudanças <strong>na</strong> forma como se ensi<strong>na</strong>va a ler e a <strong>escrever</strong><br />
e, igualmente, <strong>uma</strong> preocupação em tor<strong>na</strong>r as contribuições das autoras<br />
compreensíveis para os professores. Então, a partir da adoção da perspectiva que<br />
fundamentou as novas <strong>de</strong>scobertas <strong>na</strong> área, <strong>uma</strong> série <strong>de</strong> publicações foi produzida<br />
pelo Ministério e Secretarias da <strong>Educação</strong> e, em praticamente <strong>uma</strong> década, foram<br />
distribuídas em ampla escala, a todos os profissio<strong>na</strong>is da re<strong>de</strong>.<br />
Nos Referenciais Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL,<br />
1998, v.2), o trabalho com linguagem oral e escrita é consi<strong>de</strong>rado eixo básico do<br />
trabalho neste segmento, porque é a linguagem que media a relação e a interação<br />
28
da criança com o outro, com a cultura e com o conhecimento, contribuindo tanto<br />
para a formação do sujeito quanto para o <strong>de</strong>senvolvimento e o refi<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> suas<br />
competências linguísticas. Portanto, o objetivo estabelecido para esta etapa da<br />
escolarida<strong>de</strong>, nesta área, “é a ampliação das capacida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> comunicação e<br />
expressão e <strong>de</strong> acesso ao mundo letrado pela criança” (BRASIL, 1998, v2, p.117) e<br />
os respectivos conteúdos se organizam em um único bloco para crianças <strong>de</strong> 0 a 3<br />
anos e em três blocos para as <strong>de</strong> 4 a 6 anos, são eles: “Falar e escutar”, “Práticas<br />
<strong>de</strong> leitura” e “Práticas <strong>de</strong> escrita”.<br />
Outra bibliografia bastante utilizada por quem adota os pressupostos<br />
construtivistas em relação ao processo <strong>de</strong> ensino e aprendizagem são os Diseños<br />
Curriculares Argentino – documentos norteadores, <strong>de</strong> âmbito <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>l - pois estes<br />
foram elaborados por autores que são pesquisadores <strong>de</strong> referências nesta área,<br />
sobretudo, no que se refere às didáticas especificas.<br />
No Diseño Curricular para la Educación Inicial 7 , a área conhecida nos<br />
documentos <strong>na</strong>cio<strong>na</strong>is brasileiro por Linguagem Oral e Escrita faz parte <strong>de</strong> um bloco<br />
chamado “La expresión y la comunicación”:<br />
Las experiencias plásticas, musicales, <strong>de</strong>l movimiento y <strong>de</strong> la palavra<br />
posibilita conocer el mundo que nos ro<strong>de</strong>a y el que llevamos <strong>de</strong>ntro.<br />
Los lenguajes expresivos permiten crear y mostrar lo particular y lo<br />
irrepetible <strong>de</strong> cada uno <strong>de</strong> nosotros, los seres h<strong>uma</strong>nos, y a la vez <strong>de</strong><br />
nuestra sociedad. 8 (GOVERNO DE LA CIUDAD AUTÓNOMA DE<br />
BUENOS AIRES, 2000. v.4, p.157)<br />
Esse bloco engloba as diferentes linguagens corporal, musical, plástica e as<br />
experiências ou práticas que envolvem o falar, o ouvir, o ler, o <strong>escrever</strong> e a<br />
literária.<br />
A <strong>de</strong>finição da área como “Práticas <strong>de</strong> Linguagem” evi<strong>de</strong>ncia, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu<br />
nome, que os objetos <strong>de</strong> estudo e ensino se situarão sobre as práticas, sobre a<br />
linguagem em uso e, por isso mesmo, os conteúdos propostos terão como<br />
referência e se basearão <strong>na</strong>s práticas <strong>de</strong> linguagem que se realizam <strong>na</strong> vida social<br />
7<br />
O Diseño Curricular Argentino é composto por quatro volumes: 1. Marco geral, que expõe<br />
as orientações comuns ao segmento; 2. Para crianças <strong>de</strong> 45 dias a 2 anos; 3. Para crianças<br />
<strong>de</strong> 2 e 3 anos; Para crianças <strong>de</strong> 4 e 5 anos.<br />
8<br />
Tradução livre <strong>de</strong> Giulianny Russo: Por meio das experiências plásticas, musicais, <strong>de</strong><br />
movimento e da palavra po<strong>de</strong>mos conhecer o mundo a nossa volta e a nós mesmos. As<br />
linguagens expressivas permitem criar e mostrar aquilo que é próprio e único <strong>de</strong> cada um<br />
<strong>de</strong> nós, seres h<strong>uma</strong>nos, e da nossa socieda<strong>de</strong>.<br />
29
(DIRECCIÓN GENERAL DE CULTURA Y EDUCACIÓN, 2008). Isso muda o objeto <strong>de</strong><br />
estudo da área, que antes era a língua, propriamente dita, e agora se localiza no<br />
uso social que se faz <strong>de</strong>la, o que implica em práticas escolares contextualizadas e,<br />
portanto, repletas <strong>de</strong> sentido para o aluno.<br />
Neste currículo, <strong>na</strong> educação infantil, a área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem é<br />
dividida em: Falar; <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> <strong>na</strong> educação infantil; e Literatura 9 .<br />
Diferentemente do RCN, esse currículo distingue, a princípio, dois tipos <strong>de</strong><br />
leitura em função <strong>de</strong> seus propósitos: a leitura para apren<strong>de</strong>r a ler e a leitura<br />
literária para se divertir, emocio<strong>na</strong>r, provocar reflexões e instigar conhecimentos. À<br />
literatura é atribuído um papel especial e fundamental para a constituição <strong>de</strong><br />
leitores competentes, críticos, sensíveis e agentes <strong>de</strong> transformação social. Além<br />
disso, este currículo está estruturado a partir <strong>de</strong> referências no estudo da didática,<br />
ou seja, focado nos processo <strong>de</strong> ensino e aprendizagem <strong>de</strong> modo prático: como<br />
ensi<strong>na</strong>r a partir <strong>de</strong> um dado pressuposto teórico, que disserta sobre como as<br />
crianças apren<strong>de</strong>m.<br />
Esta forma <strong>de</strong> pensar o currículo é a que melhor se ajusta e ilustra a<br />
concepção <strong>de</strong> ensino e <strong>de</strong> aprendizagem e os propósitos aspirados à educação<br />
infantil, dos quais parte este trabalho. Além disso, a gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> a ser<br />
problematizada nos próximos capítulos, organiza-se a partir <strong>de</strong>sta perspectiva.<br />
Importa salientar que não se está tratando <strong>de</strong> referenciais <strong>curricular</strong>es<br />
opostos ou que se contradizem. Ambos, tanto os RCN quanto o Diseño Curricular<br />
Argentino, partem e tomam como referência os pressupostos construtivistas e,<br />
igualmente, consi<strong>de</strong>ram a leitura, a escrita e a oralida<strong>de</strong> fundamentais, não<br />
somente <strong>de</strong>ntro dos muros da escola, mas também fora <strong>de</strong>le, focando o ensino <strong>na</strong><br />
formação <strong>de</strong> leitores, escritores, falantes e ouvintes competentes <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>Educação</strong><br />
<strong>Infantil</strong>. Porém, a forma como cada um está estruturado e os eixos <strong>de</strong> trabalho que<br />
sugerem é que os diferencia. E é por estas razões, que os parâmetros argentinos<br />
fundamentarão as i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong>ste capítulo.<br />
9<br />
Respectivamente: Hablar em El jardín, Leer y escribir en el jardín e Literatura.<br />
30
2.1.1 <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> - a alfabetização <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong><br />
Tradicio<strong>na</strong>lmente, a palavra “alfabetização” era concebida para <strong>de</strong>sig<strong>na</strong>r a<br />
aquisição do código escrito, o que ocorria quando a criança domi<strong>na</strong>va a técnica <strong>de</strong><br />
codificar a linguagem oral (<strong>escrever</strong>) e <strong>de</strong>codificar o escrito (leitura).<br />
Ferreiro e Teberosky (1999) observam, no entanto, que não existe um<br />
momento preciso, <strong>de</strong>svinculado das experiências anteriores e resultado <strong>de</strong> um<br />
conjunto <strong>de</strong> técnicas, que culmi<strong>na</strong>ria com o domínio da língua escrita. Segundo<br />
estas autoras, apren<strong>de</strong>r a ler e a <strong>escrever</strong>, alfabetizar-se, é um processo mais<br />
amplo e complexo, abarcando a aprendizagem do sistema <strong>de</strong> escrita, mas não se<br />
restringindo a ela. Concebem a alfabetização como a apropriação e a ampliação do<br />
conhecimento sobre a língua escrita e, por isso, como um processo que começa<br />
antes mesmo <strong>de</strong> a criança ingressar <strong>na</strong> escola e que prossegue mesmo após sua<br />
conclusão, à medida que continua construindo saberes neste campo. 10<br />
Des<strong>de</strong> o seu <strong>na</strong>scimento, a criança é inserida em <strong>uma</strong> cultura letrada. Uma<br />
cultura que utiliza em escrita <strong>na</strong>s diversas situações para comunicar, informar e<br />
divertir (livros, revistas, televisão, computador, receitas, placas <strong>de</strong> rua e <strong>de</strong><br />
estabelecimentos, embalagens etc.). Assim como os <strong>de</strong>mais objetos <strong>de</strong><br />
conhecimento que compõem o universo infantil, a escrita também é alvo <strong>de</strong><br />
reflexão e indagação, e sobre o qual a criança cria hipóteses sobre sua <strong>na</strong>tureza e<br />
função.<br />
Imersa em um mundo on<strong>de</strong> há a presença <strong>de</strong> sistemas simbólicos<br />
socialmente elaborados, a criança procura compreen<strong>de</strong>r a <strong>na</strong>tureza<br />
<strong>de</strong>stas marcas especiais. Para tanto, não exercita <strong>uma</strong> técnica<br />
específica <strong>de</strong> aprendizagem. Como já fez antes, com outros tipos <strong>de</strong><br />
objetos, vai <strong>de</strong>scobrindo as proprieda<strong>de</strong>s dos sistemas simbólicos por<br />
meio <strong>de</strong> um prolongado processo construtivo. (FERREIRO, 2010,<br />
p.44)<br />
10<br />
Uma das principais distinções entre o ensino tradicio<strong>na</strong>l e o construtivista refere-se à<br />
concepção <strong>de</strong> escrita: “se a escrita é concebida como um código <strong>de</strong> transcrição, sua<br />
aprendizagem é concebida como a aquisição <strong>de</strong> <strong>uma</strong> técnica; se a escrita é concebida como<br />
um sistema <strong>de</strong> representação, sua aprendizagem se converte <strong>na</strong> apropriação <strong>de</strong> um novo<br />
objeto <strong>de</strong> conhecimento, ou seja, em <strong>uma</strong> aprendizagem conceitual”. (FERREIRO, 2010,<br />
p.19)<br />
31
Os conhecimentos construídos acerca da linguagem escrita são parte<br />
constitutiva fundamental do processo <strong>de</strong> alfabetização e é o que motiva e significa a<br />
aprendizagem do sistema notacio<strong>na</strong>l. A notação é o termo utilizado por Teberosky e<br />
Tolchinsky (2008), bem como por Sinclair (1990) e outros autores, para <strong>de</strong>sig<strong>na</strong>r<br />
os si<strong>na</strong>is gráficos convencio<strong>na</strong>is, “usados para registrar e transmitir informação<br />
(...). O conhecimento notacio<strong>na</strong>l consiste <strong>na</strong> capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> reconhecer, interpretar<br />
e produzir distintas formas notacio<strong>na</strong>is” (TEBEROSKY E TOLCHINSKY, 2008, p.9).<br />
São comuns, ainda hoje, práticas escolares que reduzem todo o processo <strong>de</strong><br />
alfabetização à aprendizagem da notação e é neste ponto em que resi<strong>de</strong> outra<br />
polêmica: po<strong>de</strong>-se ou não alfabetizar <strong>na</strong> educação infantil? É intrínseco a este<br />
questio<strong>na</strong>mento um posicio<strong>na</strong>mento teórico a respeito da aprendizagem da leitura e<br />
da escrita: é um processo <strong>de</strong> construção conceitual ou é o preciso momento em que<br />
a criança codifica/<strong>de</strong>codifica os si<strong>na</strong>is convencio<strong>na</strong>is?<br />
Na perspectiva construtivista, apren<strong>de</strong>r a notação convencio<strong>na</strong>l consiste em<br />
<strong>uma</strong> parte do processo <strong>de</strong> apropriação da linguagem escrita, que influi e é<br />
influenciado pelas conceitualizações da criança 11 .<br />
Alfabetização, hoje, é um processo permanente <strong>de</strong> compreensão e<br />
produção <strong>de</strong> linguagens e sistemas <strong>de</strong> escrita. Engloba um conjunto<br />
<strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s que procuram fazer com que as pessoas <strong>de</strong> diversas<br />
culturas e grupos sociais se apropriem do complexo objeto que é a<br />
escrita. (CASTEDO, 1997, p.35)<br />
Por essa razão, é imprescindível que no início da alfabetização, assim como<br />
no restante da escolarida<strong>de</strong>, o aluno esteja inserido em práticas sociais<br />
relacio<strong>na</strong>das ao fazer do escritor e do leitor, <strong>de</strong> maneira que, contínua e<br />
progressivamente, possa atribuir significados e construir e reconstruir saberes cada<br />
vez mais ajustados sobre a <strong>na</strong>tureza do sistema, as suas funções, os modos<br />
próprios <strong>de</strong> organização etc.<br />
11<br />
Neste trabalho não nos <strong>de</strong>teremos sobre as conceitualizações que as crianças constroem<br />
sobre a escrita, <strong>de</strong> modo que, brevemente, po<strong>de</strong>-se afirmar que: “Três períodos<br />
fundamentais po<strong>de</strong>m ser i<strong>de</strong>ntificados, no interior dos quais é possível indicar subníveis. 1)<br />
O primeiro período caracteriza-se pela busca <strong>de</strong> parâmetros <strong>de</strong> diferenciação entre as<br />
marcas gráficas figurativas e as marcas gráficas não-figurativas, assim como pela formação<br />
<strong>de</strong> séries <strong>de</strong> letras como objetos substitutos, e pela busca das condições <strong>de</strong> interpretação<br />
<strong>de</strong>sses objetos substitutos. 2) O segundo período é caracterizado pela construção <strong>de</strong> modos<br />
<strong>de</strong> diferenciação entre os enca<strong>de</strong>amentos <strong>de</strong> letras, baseando-se alter<strong>na</strong>damente em eixos<br />
<strong>de</strong> diferenciação qualitativos e quantitativos. 3) O terceiro período é o que correspon<strong>de</strong> à<br />
fonetização da escrita, que começa por um período silábico e culmi<strong>na</strong> no período alfabético.”<br />
(FERREIRO, 1990, p.22)<br />
32
Deste ponto <strong>de</strong> vista, tor<strong>na</strong>-se óbvio o papel da educação infantil no processo<br />
<strong>de</strong> alfabetização inicial: Promover práticas potentes e reais para que as crianças<br />
atuem como membros plenos da cultura letrada (LERNER, 2002).<br />
Todos los problemas <strong>de</strong> la alfabetización comenzaron cuando se<br />
<strong>de</strong>cidió que escribir no era u<strong>na</strong> profesion sino u<strong>na</strong> obligación y que<br />
leer no era marca <strong>de</strong> sabidura sino marca <strong>de</strong> ciudadania. (FERREIRO,<br />
2008, p. 12) 12<br />
2.1.2 Propósitos e <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>Educação</strong> infantil alfabetizadora<br />
Alfabetizamos para lograr niños conscientes <strong>de</strong> un mundo atravesado<br />
por la escritura, po<strong>de</strong>rosos por ser capaces <strong>de</strong> domi<strong>na</strong>rla y felices por<br />
ser capaces <strong>de</strong> disfrutarla. (CASTEDO, 1995, p.5) 13<br />
Como vimos, o objeto <strong>de</strong> ensino da escola no estudo da língua é a prática<br />
social e, à medida que os adultos oferecem oportunida<strong>de</strong>s para a criança agir<br />
enquanto leitor e escritor “antes <strong>de</strong> sê-lo (convencio<strong>na</strong>lmente 14 ), faz com que se<br />
aprenda <strong>de</strong> modo precoce o essencial das práticas sociais ligadas à escrita”<br />
(Ferreiro, 2010, p.59). Neste processo, “A criança se vê continuamente envolvida,<br />
como agente e observador, no mundo letrado” (FERREIRO, 2010, p.58)<br />
Segundo Castedo (1997, p.36) “a pré-escola po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve dar oportunida<strong>de</strong>s,<br />
sistemáticas e contínuas, para criar ou prolongar situações <strong>na</strong>s quais as crianças<br />
entrem em contato com a linguagem escrita” e que possam fazer uso dos mesmos<br />
procedimentos que os escritores e leitores experientes utilizam, mesmo ainda que<br />
não dominem o sistema notacio<strong>na</strong>l: planejar o texto, fazer rascunhos, revisar,<br />
editar, comentar o que está lendo, trocar opiniões e informações <strong>de</strong>scobertas,<br />
recomendar etc.<br />
Contudo, como crianças que não sabem ler e <strong>escrever</strong> convencio<strong>na</strong>lmente<br />
po<strong>de</strong>m atuar enquanto leitoras e escritoras? Elas o farão segundo seus níveis <strong>de</strong><br />
conceitualização e estas situações representarão <strong>de</strong>safios sobre os quais colocarão<br />
12<br />
Tradução livre Giulianny Russo: Todos os problemas <strong>de</strong> alfabetização começaram quando<br />
se <strong>de</strong>cidiu que <strong>escrever</strong> não era <strong>uma</strong> profissão, mas <strong>uma</strong> obrigação e que ler não era<br />
sinônimo <strong>de</strong> sabedoria, mas sinônimo <strong>de</strong> cidadania<br />
13<br />
Tradução livre Giulianny Russo: Alfabetizamos para formar crianças conscientes <strong>de</strong> um<br />
mundo atravessado pela língua escrita, potentes por serem capazes <strong>de</strong> dominá-la e felizes<br />
por <strong>de</strong>sfrutar-la.<br />
14<br />
Informação entre parênteses foi <strong>uma</strong> inserção minha, não consta no texto origi<strong>na</strong>l da<br />
autora.<br />
33
em jogo as suas hipóteses e estratégias, relacio<strong>na</strong>ndo-as aos novos dados que<br />
observa, a fim <strong>de</strong> solucio<strong>na</strong>r o que para elas representa um problema, um <strong>de</strong>safio.<br />
Ou seja, os aprendizes escrevem e leem por si mesmos <strong>de</strong> acordo com suas<br />
possibilida<strong>de</strong>s, mas também leem e escrevem por meio do professor. Kaufman<br />
(2011) propõe <strong>uma</strong> organização didática das situações com leitura e escrita, em<br />
função da participação do aluno em cada <strong>uma</strong> <strong>de</strong>las.<br />
Ao escutar a leitura realizada pelo professor, as crianças po<strong>de</strong>rão aproximarse<br />
do conteúdo do texto, das informações que ele veicula, construindo significados<br />
e apren<strong>de</strong>ndo sobre os aspectos discursivos (como o texto se organiza em função<br />
<strong>de</strong> seu propósito) e sobre a linguagem escrita (gênero e léxico específicos <strong>de</strong> cada<br />
portador). “Participando <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> situaciones, el niño se está formando como<br />
lector y se está nutriendo <strong>de</strong> palabras, i<strong>de</strong>as y formas que incidirán positivamente<br />
también en la elaboración <strong>de</strong> sus producciones escritas” 15 (KAUFMAN, 2011, p.68).<br />
Um exemplo <strong>de</strong> situações com crianças peque<strong>na</strong>s po<strong>de</strong> ser a leitura <strong>de</strong> variados<br />
gêneros, com distintos propósitos: para se divertir, se instruir, para saber mais<br />
sobre um tema, para receber informações acerca <strong>de</strong> eventos, novida<strong>de</strong>s etc.<br />
Já <strong>na</strong> leitura por si mesmo, o aluno po<strong>de</strong>rá fazê-la tanto silenciosamente -<br />
para <strong>de</strong>sfrutar, se entreter, localizar dados e se informar- quanto em voz alta, para<br />
compartilhar a leitura com os <strong>de</strong>mais. Contudo, quando ainda não sabe ler<br />
convencio<strong>na</strong>lmente, usa “las mismas estratégias básicas que los lectores expertos:<br />
anticipando significados posibles em función <strong>de</strong> la coordi<strong>na</strong>ción inteligente <strong>de</strong> datos<br />
<strong>de</strong>l texto com datos <strong>de</strong>l contexto” 16 , mas têm como maior <strong>de</strong>safio i<strong>de</strong>ntificar on<strong>de</strong><br />
algo po<strong>de</strong> estar escrito ou se algo realmente po<strong>de</strong> estar escrito on<strong>de</strong> indica o<br />
professor, afi<strong>na</strong>l não dispõe da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>codificar (KAUFMAN, 2011,<br />
p.30). Nestas situações o foco <strong>de</strong> reflexão do aluno inci<strong>de</strong> sobre o sistema<br />
notacio<strong>na</strong>l: inicialmente po<strong>de</strong>rá se apoiar somente <strong>na</strong> imagem que acompanha o<br />
texto para lê-lo, com o tempo e com a participação em situações <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong>ste<br />
tipo, po<strong>de</strong>rá observar <strong>na</strong> palavra outros índices, tais como, letras conhecidas,<br />
sílabas iniciais que coinci<strong>de</strong>m com a <strong>de</strong> outras palavras <strong>de</strong> referência, a extensão<br />
da palavra, até que possa ler sem o auxílio da imagem ou do contexto. Alguns<br />
15<br />
Tradução livre Giulianny Russo: Participando <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> situações, a criança estará se<br />
formando como leitor e se nutrindo <strong>de</strong> palavras, i<strong>de</strong>ias e formas que incidirão positivamente<br />
também <strong>na</strong> elaboração <strong>de</strong> suas produções escritas.<br />
16<br />
Tradução livre Giulianny Russo: as mesmas estratégias básicas que os leitores<br />
experientes: antecipando os possíveis significados em função da coor<strong>de</strong><strong>na</strong>ção inteligentes<br />
dos dados informados pelo texto com os dados informados pelo contexto.<br />
34
exemplos <strong>de</strong> situações com crianças peque<strong>na</strong>s: explorar livremente diferentes<br />
portadores textuais ou buscando informações específicas relacio<strong>na</strong>das a um estudo<br />
do grupo e que contenha pistas suficientes para viabilizar a tarefa, localizar<br />
palavras em <strong>uma</strong> lista etc.<br />
Nas situações <strong>de</strong> escrita por meio do professor, as crianças concentrarão<br />
seus esforços em o quê <strong>escrever</strong>, cuidando da escolha <strong>de</strong> palavras, da articulação<br />
entre as i<strong>de</strong>ias expostas, da a<strong>de</strong>quação ao gênero e do propósito e a quem se<br />
<strong>de</strong>sti<strong>na</strong> o texto. A <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r do objetivo didático, po<strong>de</strong>rão realizar revisões com foco<br />
nestes aspectos e assim apren<strong>de</strong>rão sobre a linguagem escrita e sobre as<br />
características próprias a cada discurso, além do que apren<strong>de</strong>rão sobre o processo<br />
<strong>de</strong> produção, que envolve planejamento e sucessivas revisões. Alguns exemplos <strong>de</strong><br />
situações com crianças peque<strong>na</strong>s: ditar ao professor <strong>uma</strong> carta a um colega<br />
enfermo, um convite, o registro <strong>de</strong> <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong>, as <strong>de</strong>scobertas <strong>de</strong> um estudo ou<br />
mesmo a reescrita <strong>de</strong> texto, vinculada a um projeto do grupo.<br />
Ao <strong>escrever</strong> por si mesmo a criança terá que gerenciar o quê <strong>escrever</strong> com o<br />
como vai <strong>escrever</strong> e, se por um lado se concentra em aspectos discursivos, <strong>na</strong><br />
a<strong>de</strong>quação ao gênero, <strong>na</strong> coerência e coesão, por outro será iminente a atenção à<br />
grafia das palavras. Devido a esta enorme <strong>de</strong>manda cognitiva, Kaufman (2011)<br />
propõe que se siga um “passo a passo”, que remonta o procedimento escritor:<br />
planejamento do texto, escrita da primeira versão, revisões orientadas com focos<br />
específicos (ocorrência <strong>de</strong> palavras repetidas, falta <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> informação, palavras<br />
e expressões <strong>de</strong> acordo com o gênero etc.).<br />
A criança que ainda não escreve convencio<strong>na</strong>lmente, ao ser solicitada a<br />
<strong>escrever</strong>, lançará mão <strong>de</strong> tudo o que sabe para po<strong>de</strong>r realizar esta tarefa: atribuir<br />
significado às marcas gráficas que faz no papel, ater-se aos critérios que ela<br />
mesma elaborou sobre a organização do sistema, perceber e iniciar a<br />
correspondência sonora em trechos escritos, consultar palavras <strong>de</strong> referência que<br />
ofereçam pistas para a escrita da palavra <strong>de</strong>sejada, consultar colegas e professor.<br />
Como as crianças constroem saberes distintos sobre a língua escrita, em razão <strong>de</strong><br />
estarem inseridas em práticas sociais diversas e possuírem diferentes esquemas <strong>de</strong><br />
assimilação, a heterogeneida<strong>de</strong> da sala <strong>de</strong> aula a constitui em um rico ambiente,<br />
que propicia a interação com outras hipóteses e ao observá-las e confrontá-las as<br />
crianças percebem quais aspectos o outro consi<strong>de</strong>ra quando da escrita <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />
palavra, po<strong>de</strong>ndo assim ampliar suas possibilida<strong>de</strong>s ou ainda reformular ou<br />
35
corroborar suas hipóteses. Alguns exemplos <strong>de</strong> situações com crianças peque<strong>na</strong>s:<br />
produzir <strong>uma</strong> escrita em duplas <strong>de</strong> maneira que cada membro <strong>de</strong>sempenhe em um<br />
momento o papel <strong>de</strong> escriba e o <strong>de</strong> ditante, escritas com diferentes propósitos –<br />
lista <strong>de</strong> brinquedos que levará ao parque, <strong>uma</strong> parlenda para compor o cancioneiro<br />
do grupo, registro das informações <strong>de</strong>scobertas em um estudo etc.<br />
Nestas situações, à medida que atuam sobre a língua, as crianças constroem<br />
e avançam no conhecimento sobre a linguagem escrita. Vale ressaltar que, o que<br />
mobiliza estas <strong>proposta</strong>s não é a intenção <strong>de</strong> que a criança leia e escreva<br />
convencio<strong>na</strong>lmente ao fim da educação infantil. Mas, sim, o <strong>de</strong> promover práticas<br />
significativas que contemplem um objeto que faz parte do interesse e do universo<br />
infantil, sobre o qual as crianças constroem diferentes hipóteses explicativas,<br />
também fora da instituição escolar. Contudo, trabalhar com as práticas <strong>de</strong><br />
linguagem em sala <strong>de</strong> aula visa, por um lado “Dar às crianças ocasiões <strong>de</strong><br />
apren<strong>de</strong>r. A língua escrita é muito mais que um conjunto <strong>de</strong> formas gráficas. É um<br />
modo <strong>de</strong> a língua existir, é um objeto social, é parte <strong>de</strong> nosso patrimônio cultural”<br />
(Ferreiro, 2010, p.99) e, por outro, manter a criança constantemente envolvida e<br />
<strong>de</strong>safiada, criando conflitos cognitivos, a partir dos quais irá, continua e<br />
permanentemente, se apropriando <strong>de</strong> sua língua.<br />
Quando se afirma que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito peque<strong>na</strong>s as crianças po<strong>de</strong>m<br />
iniciar o processo <strong>de</strong> compreensão da leitura e escrita, po<strong>de</strong>-se dizer<br />
que estão se alfabetizando. Isso significa assumir o papel<br />
alfabetizador da Pré-escola. Tal compromisso não pressupõe<br />
estabelecer “ganhos” para cada ida<strong>de</strong>, nem enten<strong>de</strong>r que quando<br />
ingressam <strong>na</strong> pré-escola <strong>de</strong>vam alcançar a alfabeticida<strong>de</strong> do sistema,<br />
ou seja, não implica em <strong>uma</strong> exigência <strong>de</strong> <strong>uma</strong> escrita alfabética por<br />
parte das crianças. (CASTEDO, 1997, p.36)<br />
Ferreiro (2008, p.38) sintetiza a questão: “Deve se ensi<strong>na</strong>r a ler e a <strong>escrever</strong><br />
<strong>na</strong> pré-escola ou não? Minha resposta é simples: não se <strong>de</strong>ve ensi<strong>na</strong>r, porém <strong>de</strong>vese<br />
permitir que a criança aprenda”. Ou seja, não se <strong>de</strong>ve ter por meta que as<br />
crianças fi<strong>na</strong>lizem o segmento escrevendo convencio<strong>na</strong>lmente e, permitir que ela<br />
aprenda significa proporcio<strong>na</strong>r, <strong>de</strong>ntro da escola, intenso, mas contextualizado e<br />
significativo, contato com a leitura e a escrita. Para isso, se faz necessário um<br />
planejamento cuidadoso e criterioso quanto às suas proposições e intervenções<br />
docentes.<br />
36
2.2 Re<strong>de</strong>finindo a questão<br />
Em que consiste esse “saber” preescolar? Basicamente, em <strong>uma</strong><br />
primeira inmersión em la “cultura letrada”: Haber escuchado leer em<br />
voz alta, haber visto escribir; Haber tenido La oportunidad <strong>de</strong><br />
producir marcas intencio<strong>na</strong>les; Haber participado em actos sociales<br />
don<strong>de</strong> leer y escribir tienen sentido; haber podido plantear preguntas<br />
y obtener algún tipo <strong>de</strong> respuesta. (FERREIRO, 2008, p.25) 17<br />
Até este ponto da presente monografia há diversas referências à discussão<br />
sobre o papel alfabetizador da escola e, já no item sobre a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, se<br />
apresenta a questão da escolarização <strong>de</strong>ste segmento.<br />
Muitas publicações consultadas tratam <strong>de</strong>ssa temática, contudo, as críticas<br />
referem-se ape<strong>na</strong>s a duas formas, diametralmente opostas, <strong>de</strong> conceber a<br />
existência da escrita <strong>na</strong> escola infantil: em um polo, situam-se as práticas que<br />
evitam o contato da criança com a linguagem escrita, focando o trabalho ape<strong>na</strong>s no<br />
brincar. No outro, aquelas que antecipam e reproduzem as práticas<br />
tradicio<strong>na</strong>lmente atribuídas ao segmento posterior e que visam <strong>de</strong>senvolver as<br />
habilida<strong>de</strong>s que são consi<strong>de</strong>radas como pré-requisitos para a alfabetização.<br />
As <strong>proposta</strong>s pedagógicas pautadas <strong>na</strong> concepção construtivista, no entanto,<br />
apesar <strong>de</strong> não se apoiarem no trei<strong>na</strong>mento <strong>de</strong> técnicas (exercício <strong>de</strong> controle motriz<br />
e discrimi<strong>na</strong>ção perceptiva, reconhecimento e cópia <strong>de</strong> letras, sílabas ou palavras,<br />
repetições em coro etc.); têm sido atualmente alvo <strong>de</strong> críticas, que <strong>de</strong>stacam que,<br />
apesar <strong>de</strong> não proporem um mo<strong>de</strong>lo mecânico da aprendizagem da leitura e da<br />
escrita, têm antecipado esta construção por parte da criança, privilegiando e<br />
<strong>de</strong>sti<strong>na</strong>ndo muito tempo às intervenções <strong>na</strong> área <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> linguagem em<br />
<strong>de</strong>trimento <strong>de</strong> outras áreas.<br />
Contudo, como se po<strong>de</strong> <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> tudo o que foi exposto até agora, esta<br />
questão está mal localizada. O construtivismo é um conjunto <strong>de</strong> pressupostos<br />
teóricos sobre como a criança apren<strong>de</strong>. Fundamentadas nestes princípios e<br />
apoiadas nos conhecimentos específicos <strong>de</strong> cada área, emergem diferentes<br />
<strong>proposta</strong>s didáticas e, <strong>de</strong>finir o tempo a ser <strong>de</strong>dicado a cada <strong>uma</strong> <strong>de</strong>stas áreas<br />
17<br />
Tradução livre Giulianny Russo: Em que consiste esse “saber” pré-escolar? Basicamente,<br />
em <strong>uma</strong> primeira imersão <strong>na</strong> “cultura letrada”: ter escutado ler em voz alto, ter visto<br />
<strong>escrever</strong>; ter tido a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir marcas gráficas intencio<strong>na</strong>is; ter participado<br />
em situações sociais <strong>na</strong>s quais ler e <strong>escrever</strong> têm sentido; ter podido fazer perguntas e<br />
obter respostas.<br />
37
(Práticas <strong>de</strong> Linguagem, Ciências Naturais e Sociais, Matemática e Brincar e<br />
Movimento) é <strong>uma</strong> <strong>de</strong>cisão pedagógica, que <strong>de</strong>ve estar em consonância com o<br />
currículo <strong>de</strong> cada instituição, bem como com os princípios e metas estabelecidos<br />
para cada segmento da escolarida<strong>de</strong>.<br />
Já <strong>na</strong> segunda parte <strong>de</strong>ste capítulo, apresentamos que a regulamentação e a<br />
elaboração <strong>de</strong> <strong>proposta</strong>s <strong>curricular</strong>es para a educação infantil <strong>de</strong>mandavam,<br />
necessariamente, a adoção <strong>de</strong> um arcabouço teórico que, ao <strong>de</strong>finir as concepções<br />
<strong>de</strong> infância, ensino-aprendizagem, educação da qual partem, embasava as práticas<br />
<strong>de</strong>correntes. Segundo Ferreiro (2010, p.33): “Nenh<strong>uma</strong> prática pedagógica é<br />
neutra. Todas estão apoiadas em certo modo <strong>de</strong> conceber o processo <strong>de</strong><br />
aprendizagem e o objeto <strong>de</strong>ssa aprendizagem”.<br />
Este conjunto <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong>ve estar expresso no currículo escolar que ainda,<br />
<strong>de</strong> acordo com diversos pesquisadores, <strong>de</strong>ve incluir a caracterização da escola (a<br />
faixa etária atendida; os horários; os critérios <strong>de</strong> agrupamento e os<br />
encaminhamentos esperados às distintas situações; os pressupostos teóricos,<br />
políticos e filosófico; o tipo <strong>de</strong> escola que se <strong>de</strong>seja oferecer e o tipo <strong>de</strong> aluno que<br />
se <strong>de</strong>seja formar; o contexto em que se inserem; suas metas; priorida<strong>de</strong>s;<br />
conteúdos e como os ensi<strong>na</strong>r; a organização do tempo, dos espaços e dos<br />
materiais; e o cronograma <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s previstas. (KRAMER, 1997)<br />
As Diretrizes Curriculares Nacio<strong>na</strong>is para a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong> (BRASIL, 2010),<br />
separam as características que se referem à “Proposta Pedagógica” das que se<br />
referem ao “Currículo”.<br />
Proposta pedagógica ou projeto político pedagógico é o plano<br />
orientador das ações da instituição e <strong>de</strong>fine as metas que se<br />
preten<strong>de</strong> para a aprendizagem e o <strong>de</strong>senvolvimento das crianças que<br />
nela são educados e cuidados. É elaborado num processo coletivo,<br />
com a participação da direção, dos professores e da comunida<strong>de</strong><br />
escolar. (BRASIL, 2010, p.13)<br />
Para atingir estas metas, a escola <strong>de</strong> educação infantil elabora seu currículo,<br />
que é <strong>de</strong>finido enquanto:<br />
Conjunto <strong>de</strong> práticas que buscam articular as experiências e os<br />
saberes das crianças com os conhecimentos que fazem parte do<br />
patrimônio cultural, artístico, ambiental, científico e tecnológico, <strong>de</strong><br />
modo a promover o <strong>de</strong>senvolvimento integral <strong>de</strong> crianças <strong>de</strong> 0 a 5<br />
anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>. (BRASIL, 2010, p.12)<br />
38
Tanto o Projeto Político Pedagógico ou Proposta Pedagógica quanto o<br />
currículo po<strong>de</strong>m ser elaborados envolvendo toda a comunida<strong>de</strong> escolar (pais,<br />
alunos, professores, gestores e funcionários), que entre outras coisas, participarão<br />
da<br />
(...) organização <strong>de</strong> diversos aspectos: os tempos <strong>de</strong> realização das<br />
ativida<strong>de</strong>s (ocasião, freqüência, duração), os espaços em que essas<br />
ativida<strong>de</strong>s transcorrem (o que inclui a estruturação dos espaços<br />
internos, externos, <strong>de</strong> modo a favorecer as interações infantis <strong>na</strong><br />
exploração que fazem do mundo), os materiais disponíveis e, em<br />
especial, as maneiras do professor exercer seu papel (organizando o<br />
ambiente, ouvindo as crianças, respon<strong>de</strong>ndo-lhes <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da<br />
maneira, oferecendo-lhes materiais, sugestões, apoio emocio<strong>na</strong>l, ou<br />
promovendo condições para a ocorrência <strong>de</strong> valiosas interações e<br />
brinca<strong>de</strong>iras criadas pelas crianças etc.) (OLIVEIRA, 2010, p.5 – grifo<br />
meu)<br />
“(...) enten<strong>de</strong>mos o currículo como o projeto que presi<strong>de</strong> as<br />
ativida<strong>de</strong>s educativas escolares, <strong>de</strong>fine suas intenções e proporcio<strong>na</strong><br />
guias <strong>de</strong> ação a<strong>de</strong>quadas e úteis para os professores, que são<br />
diretamente responsáveis pela sua execução. Para isto, o currículo<br />
proporcio<strong>na</strong> informações concretas sobre o que ensi<strong>na</strong>r, quando<br />
ensi<strong>na</strong>r, como ensi<strong>na</strong>r e quando, como e o que avaliar.” (COLL,<br />
1996, p.45)<br />
Diante <strong>de</strong>sta perspectiva, po<strong>de</strong>mos nos perguntar: como <strong>uma</strong> escola <strong>de</strong><br />
educação infantil, construtivista, po<strong>de</strong>ria organizar seu currículo <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong><br />
Linguagem, trabalhando a leitura e a escrita, sem, no entanto, escolarizar e,<br />
consequentemente, <strong>de</strong>stituir a significação <strong>de</strong> suas práticas e, ao mesmo tempo,<br />
preservar a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do segmento? Em outras palavras: é possível colocar<br />
crianças tão peque<strong>na</strong>s para refletir sobre a leitura e a escrita sem <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong><br />
consi<strong>de</strong>rar as suas características e, ainda, sem que elas <strong>de</strong>ixem <strong>de</strong> fazer e<br />
<strong>de</strong>senvolver outros aspetos que são necessários e específicos <strong>de</strong>ssa etapa escolar<br />
(brincar, socialização, relações interpessoais, expressivida<strong>de</strong>, artes)? Em síntese, é<br />
possível investir <strong>na</strong> formação <strong>de</strong> leitores e <strong>de</strong> escritores sem <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar que as<br />
crianças têm ape<strong>na</strong>s três, quatro e cinco anos?<br />
Tendo em vista estes questio<strong>na</strong>mentos, faremos a análise da gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong><br />
<strong>de</strong> <strong>uma</strong> escola socialmente reconhecida, tanto pela comunida<strong>de</strong> escolar quanto por<br />
<strong>de</strong>mais docentes, como construtivista, cujo currículo é cuidadosa e reiteradamente<br />
39
problematizado, com o objetivo <strong>de</strong> observar como as diferentes práticas sociais <strong>de</strong><br />
uso da língua escrita articulam-se e dialogam tanto com as crianças, suas<br />
características e <strong>de</strong>mandas, como com os objetivos da série e do segmento.<br />
40
Capítulo III – <strong>Análise</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> <strong>curricular</strong> para a formação <strong>de</strong><br />
leituras e escritores <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a educação infantil<br />
É útil se perguntar através <strong>de</strong> que tipo <strong>de</strong><br />
práticas a criança é introduzida <strong>na</strong> língua escrita,<br />
e como se apresenta esse objeto no cotidiano<br />
escolar [...] Nenh<strong>uma</strong> prática pedagógica é<br />
neutra.<br />
(FERREIRO, 2010, p.32-33).<br />
À luz das concepções teóricas apresentadas, o objetivo <strong>de</strong>sta monografia é<br />
<strong>de</strong>monstrar que é possível <strong>uma</strong> organização <strong>curricular</strong> da educação infantil que<br />
favoreça o trabalho com a leitura e a escrita <strong>de</strong> modo contextualizado, significativo<br />
e sem <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>rar ou mesmo concorrer com as <strong>de</strong>mais <strong>de</strong>mandas da faixa etária.<br />
Para tanto, serão a<strong>na</strong>lisadas as gra<strong>de</strong>s <strong>curricular</strong>es da área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong><br />
Linguagem, dos três grupos etários que compõem este segmento <strong>na</strong> Escola Vila,<br />
bem como o planejamento sema<strong>na</strong>l <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s salas para ilustrar como a área se<br />
insere <strong>na</strong> roti<strong>na</strong>.<br />
Porém, é necessário <strong>de</strong> antemão, justificar a escolha pela análise da gra<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sta instituição escolar, bem como explicitar a estrutura e organização <strong>curricular</strong>.<br />
3.1 A Escola da Vila<br />
A Escola é <strong>uma</strong> instituição <strong>de</strong> ensino privada, que aten<strong>de</strong> <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a educação<br />
infantil até o ensino médio. Foi fundada em 1980, com ape<strong>na</strong>s cinco salas <strong>de</strong><br />
educação infantil e o Centro <strong>de</strong> Formação e foi, por meio <strong>de</strong>ste, que a escola entrou<br />
em contato, ainda neste ano, com a obra Psicogênese da língua escrita (FERREIRO<br />
e TEBEROSKY, 1999). Des<strong>de</strong> então, tem trilhado um caminho no sentido da<br />
construção <strong>de</strong> um currículo <strong>de</strong> base construtivista, tanto em seus fundamentos<br />
quanto em sua didática, <strong>na</strong>s diferentes áreas – matemática, ciências <strong>na</strong>turais e<br />
sociais e artes -, <strong>de</strong> modo que a escola tornou-se <strong>uma</strong> referência <strong>na</strong> educação <strong>de</strong><br />
base construtivista.<br />
41
Uma vez construtivista e implicada <strong>na</strong> promoção <strong>de</strong> práticas pedagógicas<br />
coerentes, a alfabetização passa ocupar um lugar central do projeto escolar.<br />
Alfabetização aqui entendida <strong>de</strong> forma mais ampla:<br />
(...) para hacer referencia a las habilida<strong>de</strong>s lingüísticas y cognitivas<br />
necesarias para el ingreso, la apropiación y recreación <strong>de</strong> la cultura<br />
escrita que la h<strong>uma</strong>nidad ha producido a lo largo <strong>de</strong> su historia (en la<br />
ciencia, el arte y los lenguajes simbólicos y matemáticos). 18<br />
(MINISTERIO DE EDUCACIÓN, CULTURA E TECNOLOGÍA, 2006,<br />
p.19)<br />
Mais atualmente, o termo alfabetização também po<strong>de</strong> abranger conceitos<br />
como “alfabetização digital” e “alfabetização científica”. Cabe, aqui, enfatizar algo já<br />
<strong>de</strong>stacado: nesta perspectiva a alfabetização não correspon<strong>de</strong> somente ao<br />
momento da aquisição notacio<strong>na</strong>l, até mesmo porque não é possível <strong>de</strong>svincular e<br />
isolar a reflexão sobre o princípio alfabético do seu contexto <strong>de</strong> uso. No momento<br />
da produção todos estes aspectos estão em jogo e o professor não po<strong>de</strong>rá controlar<br />
as reflexões que seu aluno faz.<br />
Por esta razão, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a educação infantil as crianças <strong>de</strong>sta escola participam<br />
<strong>de</strong> situações <strong>de</strong> uso real da leitura e da escrita, ou seja, que possuem função<br />
social: leem e escrevem, por si mesmo ou por meio do professor, para se divertir,<br />
emocio<strong>na</strong>r, apreciar, para saber mais sobre um assunto ou acessar um conjunto <strong>de</strong><br />
dados que as possibilitem executar <strong>uma</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da ação (receita, regras <strong>de</strong> jogo<br />
etc.); também fazem uso da leitura e da escrita em situações relacio<strong>na</strong>das ao<br />
cotidiano escolar, tais como elaborar um convite para <strong>uma</strong> exposição, <strong>uma</strong> carta a<br />
um colega que faltou, um cartaz para a festa da escola, um e-mail solicitando<br />
materiais;selecio<strong>na</strong>m e escolhem os títulos <strong>de</strong> livros que serão relidos ou a<br />
brinca<strong>de</strong>ira do parque ou a música, entre muitas outras possibilida<strong>de</strong>s.<br />
Todas as <strong>proposta</strong>s <strong>curricular</strong>es são cuidadosamente planejadas por um<br />
profissio<strong>na</strong>l, que é coor<strong>de</strong><strong>na</strong>dor da área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem, e<br />
constantemente discutidas com a equipe do segmento, a fim <strong>de</strong> promover ajustes e<br />
aprimoramentos. A existência <strong>de</strong>sse profissio<strong>na</strong>l, que tem o papel <strong>de</strong> pensar o<br />
currículo <strong>de</strong> todo o segmento e não somente <strong>de</strong> <strong>uma</strong> das séries que o compõe e<br />
18<br />
Tradução livre Giulianny Russo: (...) para fazer referencia às habilida<strong>de</strong>s linguísticas e<br />
cognitivas necessárias ao ingresso, à apropriação e recriação da cultura escrita que a<br />
h<strong>uma</strong>nida<strong>de</strong> tem produzido ao longo <strong>de</strong> sua história (<strong>na</strong> ciência, <strong>na</strong> arte e <strong>na</strong>s linguagens<br />
simbólicas e matemáticas)<br />
42
ainda atuar sistematicamente <strong>na</strong> formação dos professores e no acompanhamento<br />
e avaliação <strong>de</strong> situações didáticas encaminhadas, permite olhar para a área como<br />
um todo e, em função dos objetivos que esta etapa da escolarida<strong>de</strong> possui, propor<br />
práticas coerentes <strong>na</strong>s séries, com <strong>de</strong>safios a<strong>de</strong>quados e progressivos e que<br />
transversalizem os diferentes grupos etários.<br />
O objetivo <strong>de</strong>ve ser <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo formar leitores; portanto, as<br />
<strong>proposta</strong>s <strong>de</strong>vem estar centradas <strong>na</strong> construção do significado<br />
também <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo. Para construir significado ao ler, é<br />
fundamental ter constantes oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> se enfronhar <strong>na</strong> cultura<br />
do escrito, <strong>de</strong> ir construindo expectativas acerca do que po<strong>de</strong> “dizer”<br />
neste ou <strong>na</strong>quele texto (... ) <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o princípio, a escola <strong>de</strong>ve fazer as<br />
crianças participarem em situações <strong>de</strong> leitura e <strong>de</strong> escrita: é<br />
necessário ler para elas muitos e bons textos para que tenham<br />
oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> conhecer diversos gêneros e possam fazer<br />
antecipações fundandas nesse conhecimento... É necessário lhes<br />
propor também situações <strong>de</strong> produção lhes apresentarão o <strong>de</strong>safio<br />
<strong>de</strong> compor oralmente texto com <strong>de</strong>stino escrito – para serem ditados<br />
ao professor, por exemplo -; no curso <strong>de</strong>ssa ativida<strong>de</strong>, serão<br />
apresentados problemas que as levarão a <strong>de</strong>scobrir novas<br />
características da língua escrita e a se familiarizar com o ato <strong>de</strong><br />
escrita, antes <strong>de</strong> saberem <strong>escrever</strong> no sentido convencio<strong>na</strong>l do termo<br />
(LERNER, 2002, p.41)<br />
3.1.1 Estrutura Curricular<br />
O trabalho da educação infantil da Escola da Vila organiza-se em três eixos:<br />
I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e Autonomia, Comunicação e Representação (expressão pessoal e uso<br />
das diferentes linguagens expressivas – inclui as áreas <strong>de</strong> arte, música, movimento<br />
e brinca<strong>de</strong>iras, práticas <strong>de</strong> oralida<strong>de</strong>, leitura e escrita, matemática e língua inglesa)<br />
e Conhecimento <strong>de</strong> Mundo (manifestações sociais, culturais e <strong>na</strong>turais).<br />
É composta por grupos, <strong>de</strong> acordo com as faixas etárias: crianças que<br />
completam três anos até 30 <strong>de</strong> junho, fazem parte do Grupo 1 (G1), as <strong>de</strong> quatro<br />
anos, do Grupo 2 (G2) e as <strong>de</strong> cinco anos, do Grupo 3 (G3). Contudo, está previsto<br />
em seu currículo diversas ativida<strong>de</strong>s, chamadas <strong>de</strong> “Convívio”, <strong>na</strong>s quais as<br />
crianças <strong>de</strong> diferentes faixas etárias têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> atuarem juntas. Neste<br />
sentido, há momentos planejados para que participem juntas <strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>iras livres,<br />
<strong>de</strong> brinca<strong>de</strong>iras dirigidas, <strong>de</strong> jogos, <strong>de</strong> <strong>uma</strong> ofici<strong>na</strong> <strong>de</strong> pintura, da escuta <strong>de</strong><br />
histórias, <strong>de</strong> músicas etc.<br />
43
Cada sala é composta por, aproximadamente, 22 crianças, <strong>uma</strong> professora e<br />
<strong>uma</strong> professora estagiária.<br />
O período escolar é <strong>de</strong> 5h diárias, totalizando 25h sema<strong>na</strong>is. Destas, 60<br />
minutos são <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos à aula <strong>de</strong> inglês, divididas em duas aulas <strong>de</strong> 30 minutos 19 ,<br />
no G1, e quatro aulas <strong>de</strong> 30 minutos nos G2 e G3 (120 minutos); e 40 minutos à<br />
aula <strong>de</strong> música, ambos com professores-especialistas 20 . Ainda são <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos 30<br />
minutos à visita a biblioteca da escola, <strong>na</strong> qual o responsável pela biblioteca<br />
encaminha rodas <strong>de</strong> leitura, indicação <strong>de</strong> títulos, contação <strong>de</strong> histórias,<br />
apresentação <strong>de</strong> coleções, autores, ilustradores etc., com materiais previamente<br />
selecio<strong>na</strong>dos <strong>de</strong> acordo com a faixa etária do grupo atendido, características e<br />
gostos. Ao fi<strong>na</strong>lizar, as crianças exploram/manuseiam os livros e escolhem aquele<br />
que <strong>de</strong>seja realizar o empréstimo.<br />
O restante do tempo (aproximadamente 22h) é <strong>de</strong>dicado aos <strong>de</strong>mais<br />
componentes <strong>curricular</strong>es: Práticas <strong>de</strong> Linguagem, Matemática, Ciências Naturais e<br />
Sociais, Brincar e Movimento e Artes, além dos cuidados relacio<strong>na</strong>dos à higiene e<br />
alimentação. Vale salientar que as áreas <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem, Artes e Brincar<br />
ocupam a mesma carga horária, pois têm a mesma importância no currículo.<br />
3.1.2 Organização Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem<br />
A gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> da área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem <strong>na</strong> educação infantil da<br />
Escola da Vila está organizada em três eixos e todos eles articulam as diferentes<br />
competências linguísticas <strong>de</strong> ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar aos propósitos sociais a<br />
que se <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>m: “Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário” -<br />
para se divertir, emocio<strong>na</strong>r, conhecer outros mundos possíveis e refletir sobre o<br />
próprio; “Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar” -<br />
para saber mais sobre um tema ou comunicar o que apren<strong>de</strong>u; e “Eixo 3 - <strong>Ler</strong>,<br />
<strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar” - para organização da<br />
roti<strong>na</strong> diária, inserindo as práticas <strong>de</strong> linguagem <strong>na</strong>s ocorrências do dia-a-dia.<br />
19<br />
Apesar da <strong>de</strong>nomi<strong>na</strong>ção “aula”, as <strong>proposta</strong>s encaminhadas nesta área são bem distintas<br />
do que o termo “aula” po<strong>de</strong> nos remeter. Nestas duas ocasiões a professora <strong>de</strong> inglês<br />
encaminha situações da roti<strong>na</strong> do grupo: lanche, brinca<strong>de</strong>ira, música, artes, história.<br />
20<br />
Vale ressaltar que outras <strong>proposta</strong>s <strong>na</strong> área <strong>de</strong> música são encaminhadas pela professora<br />
da sala em outros momentos.<br />
44
Para cada eixo estão relacio<strong>na</strong>dos os respectivos fazeres 21 do leitor, escritor,<br />
falante e ouvinte. Por exemplo, para o Eixo 1, um dos fazeres <strong>de</strong>scritos é: “<strong>Ler</strong> ou<br />
escutar histórias atentamente por entretenimento e apreciação”. Em seguida, são<br />
citados os meses do ano em que as diferentes <strong>proposta</strong>s didáticas, referentes<br />
àquele eixo, serão <strong>de</strong>senvolvidas.<br />
As situações didáticas estão organizadas <strong>de</strong> modo a<br />
“articular os propósitos didáticos (...) com propósitos comunicativos<br />
que tenham um sentido “atual” para o aluno e tenham<br />
correspondência com os que habitualmente orientam a leitura e a<br />
escrita fora da escola” (LERNER, 2002, p.22)<br />
E se concretizam por meio das modalida<strong>de</strong>s organizativas: projetos,<br />
sequências <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s, ativida<strong>de</strong>s habituais e situações in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes -<br />
ocasio<strong>na</strong>is.<br />
Os projetos são situações didáticas <strong>na</strong>s quais o professor e os alunos<br />
encontram-se comprometidos com a realização <strong>de</strong> um propósito e um produto fi<strong>na</strong>l<br />
e que contam com <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>tários externos à sala <strong>de</strong> aula (pais, grupos <strong>de</strong> colegas <strong>de</strong><br />
outras classes, funcionários da escola etc.). As ações que são <strong>proposta</strong>s guardam<br />
em si as relações necessárias e ganham sentido em função daquilo que se <strong>de</strong>seja<br />
produzir.<br />
Já as sequências constituem-se por ativida<strong>de</strong>s que abordam um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do<br />
fazer leitor e escritor: ler diferentes títulos <strong>de</strong> um mesmo gênero, autor ou tema.<br />
Diferentemente dos projetos, as sequências não têm compromisso com a<br />
socialização <strong>de</strong> um produto fi<strong>na</strong>l, embora contemplem propósitos comunicativos.<br />
As ativida<strong>de</strong>s habituais são aquelas que “se reiteram <strong>de</strong> forma sistemática e<br />
previsível” (LERNER, 2002, p.88) durante um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do período e com certa<br />
periodicida<strong>de</strong>, por exemplo: duas vezes por sema<strong>na</strong> ao longo <strong>de</strong> três meses, ou<br />
diariamente por todo ano entre outras combi<strong>na</strong>ções possíveis que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m da<br />
importância atribuída a um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do conteúdo.<br />
21<br />
Tradução da palavra “quehacer” em espanhol para se referir ao conjunto <strong>de</strong> ações que o<br />
leitor, escritor, falante e ouvinte realizam. Por exemplo, um fazer leitor é antecipar o que<br />
está escrito em função do gênero, autor, ilustrações, extensão e verificar estas antecipações<br />
à medida que lê, comentar, recomendar e discutir. Quanto aos fazeres dos escritos estão: o<br />
planejar, textualizar, revisar muitas vezes e se <strong>de</strong>slocar ao papel do futuro leitor. Em<br />
português, a expressão utilizada para se referir a estes fazeres é “comportamento do leitor”<br />
e “comportamento do escritor”. (LERNER, 2002)<br />
45
Nas situações in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes encontramos dois subgrupos, os das situações<br />
ocasio<strong>na</strong>is e <strong>de</strong> sistematização. Ambas in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m dos propósitos dos projetos,<br />
sequências e ativida<strong>de</strong>s habituais, mas são justificadas à medida que a primeira, as<br />
situações ocasio<strong>na</strong>is, garantem espaço para aquelas situações imprevistas, mas<br />
que são valiosas compartilhar com as crianças, por exemplo, escrita <strong>de</strong> <strong>uma</strong> carta<br />
para um amigo ausente, <strong>de</strong>bate em função <strong>de</strong> um tema veiculado <strong>na</strong> mídia, a<br />
publicação <strong>de</strong> um livro ou pesquisas que não correspon<strong>de</strong>m aos trabalhos que o<br />
grupo está realizando num dado momento. No caso das situações <strong>de</strong><br />
sistematização, apesar <strong>de</strong> não estarem em função dos propósitos didáticos das<br />
outras modalida<strong>de</strong>s, estão a serviço <strong>de</strong>les, pois sistematizam os conhecimentos que<br />
foram construídos.<br />
Vale ressaltar que, <strong>na</strong> educação infantil da Escola da Vila, não são<br />
trabalhadas situações <strong>de</strong> sistematização <strong>de</strong> conteúdo, dadas as características do<br />
segmento e objetivos da área, qual seja: “incorporar as crianças à comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
leitores e escritores; (...) formar os alunos como cidadãos da cultura escrita”.<br />
(LERNER, 2002, p.56)<br />
3.2 Gra<strong>de</strong> Curricular <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong> Linguagem<br />
Como apresentado anteriormente, a gra<strong>de</strong> organiza-se, para os três grupos<br />
(G1, 2 e 3) em três eixos: Eixo 1 - ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do<br />
literário, Eixo 2 - ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar e<br />
Eixo 3 - ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar. A seguir,<br />
a<strong>na</strong>lisaremos cada um <strong>de</strong>les. Importa informar que a análise foi pautada tanto <strong>na</strong>s<br />
gra<strong>de</strong>s <strong>curricular</strong>es da área, estruturadas por grupo (cada eixo é contemplado em<br />
cada grupo do segmento) e também em documentos <strong>curricular</strong>es, que trazem<br />
justificativas, conteúdos, etapas e orientações didáticas para as sequências e os<br />
projetos previstos.<br />
3.2.1 Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário<br />
La literatura educa, porque es arte. Enseña el sentido <strong>de</strong> la belleza,<br />
la magia que pue<strong>de</strong> brindar la combi<strong>na</strong>ción <strong>de</strong> palabras utilizadas por<br />
un escritor. Cuando u<strong>na</strong> perso<strong>na</strong> lee mucho <strong>de</strong>sarrolla un sentido<br />
selectivo <strong>de</strong> los textos, crece como lector y se vuelve cada vez más<br />
46
exigente con los libros, porque reconoce la calidad literaria y la<br />
belleza que contiene. (DIRECCIÓN GENERAL DE CULTURA Y<br />
EDUCACIÓN, 2008, p.52)<br />
Para se formar como leitor <strong>de</strong> literatura é importante que a criança<br />
experimente diferentes situações reais <strong>de</strong> leitura, situações vivenciadas por leitores<br />
experientes, tais como, ler livros <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do autor ou gênero, bem como<br />
aqueles cujo interesse incida sobre o perfil do perso<strong>na</strong>gem ou temática. Cabe<br />
<strong>de</strong>stacar também que um leitor aprecia obras porque sabe o que olhar nela, porque<br />
tem vários observáveis. Isso não é algo que <strong>na</strong>sce com o leitor, mas <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> suas<br />
experiências ao viver em <strong>uma</strong> comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitores, ao conversar sobre<br />
literatura, ao indicar e receber indicações <strong>de</strong> livros etc.<br />
A educação infantil tem <strong>uma</strong> importância fundamental <strong>na</strong> vinculação da<br />
criança à literatura; ao longo <strong>de</strong>sse segmento as crianças leem por meio do<br />
professor <strong>uma</strong> infinida<strong>de</strong> <strong>de</strong> títulos, ampliando assim seu repertório cultural.<br />
Espera-se, ainda, que possam “ouvir histórias para se divertir, se emocio<strong>na</strong>r,<br />
conhecer outros mundos possíveis e refletir sobre o próprio” 22 .<br />
Os fazeres leitor, escritor, falante e ouvinte neste eixo, <strong>de</strong> modo geral, se<br />
repetem ao longo dos três anos da educação infantil e alguns <strong>de</strong>le se mantêm ao<br />
longo <strong>de</strong> toda a escolarida<strong>de</strong>, como: <strong>Ler</strong> ou ouvir histórias atentamente por<br />
entretenimento e apreciação e Participar <strong>de</strong> <strong>uma</strong> comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitores literários.<br />
O quadro abaixo apresenta como estes fazeres estão organizados ao longo<br />
do segmento e como eles são revisitados <strong>na</strong>s séries seguintes:<br />
22<br />
Trecho extraído do material apresentado <strong>na</strong>s aulas <strong>de</strong> Didática, da pós-graduação em<br />
Alfabetização, da Escola da Vila, ministradas pela Profa. Andréa Luize.<br />
47
Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em torno do literário<br />
G1<br />
Escrever/<br />
ditar<br />
trechos <strong>de</strong><br />
histórias<br />
para que<br />
outros<br />
apreciem<br />
G2 -<br />
G3<br />
Comentar<br />
e escutar<br />
comentário<br />
s sobre o<br />
lido/ouvido<br />
Comentar e<br />
escutar<br />
comentário<br />
s sobre as<br />
histórias<br />
Escrever/<br />
ditar<br />
trechos <strong>de</strong><br />
histórias<br />
para que<br />
outros<br />
apreciem<br />
Indicar<br />
livros<br />
Escutar e<br />
ditar ao<br />
professor<br />
indicações<br />
literárias<br />
<strong>Ler</strong> ou<br />
ouvir<br />
histórias<br />
atentament<br />
e por<br />
entretenim<br />
ento e<br />
apreciação<br />
Narrar<br />
oralmente<br />
histórias<br />
conhecidas<br />
Participar<br />
<strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />
comunidad<br />
e <strong>de</strong><br />
leitores<br />
literários<br />
Recitar<br />
parlendas e<br />
poemas<br />
-<br />
Refletir<br />
sobre o<br />
sistema <strong>de</strong><br />
escrita<br />
avançando<br />
rumo à<br />
leitura e à<br />
escrita<br />
convencion<br />
al<br />
As crianças têm a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> se aproximar sucessivas vezes e <strong>de</strong><br />
maneiras diferentes dos conteúdos relacio<strong>na</strong>dos à formação literária. Os<br />
planejamentos sema<strong>na</strong>is (conhecido também como semanário ou roti<strong>na</strong> sema<strong>na</strong>l)<br />
das professoras dos três grupos evi<strong>de</strong>nciam a importância atribuída a esse<br />
trabalho, que é realizado diariamente, seja pelas ativida<strong>de</strong>s habituais diárias <strong>de</strong><br />
leitura, seja por meio dos projetos e sequências <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s.<br />
A seguir, po<strong>de</strong>mos observar, como exemplo, o planejamento <strong>de</strong> um Grupo 2,<br />
as setas vermelhas indicam a ocorrência <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s em torno do literário.<br />
48
16ª sema<strong>na</strong><br />
G2D/Paula<br />
CANTOS<br />
13h30 – 14h<br />
BANHEIRO<br />
14h – 14h10<br />
RODA<br />
14h10 – 14h30<br />
BRINCADEIRA<br />
14h30 – 14h50<br />
ARTE<br />
14h50 – 15h10<br />
23/05 24/05 25/05 26/05 27/05<br />
segunda-feira terça-feira quarta-feira quinta-feira sexta-feira<br />
Ma<strong>de</strong>irinha com<br />
Cantos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senho: Fantasias e acessórios Teatro <strong>de</strong> fantoches<br />
ferramentas<br />
suportes circulares, todos Pula macaco<br />
(arr<strong>uma</strong>r mesa,<br />
Bingo (acompanhar) os meios secos<br />
Caba<strong>na</strong><br />
ca<strong>de</strong>iras)<br />
Zoob<br />
Bingo <strong>de</strong> nomes<br />
Quebra-cabeça<br />
Jogo da memória<br />
(acompanhar)<br />
Pinos mágicos<br />
Trilha até 50<br />
Barbantes do pai do<br />
Marcão<br />
Médico<br />
Pula Macaco<br />
Poesias <strong>na</strong>s<br />
mesas<br />
Chamar crianças para<br />
<strong>escrever</strong> comentários da<br />
visita dos pais<br />
Todos juntos Todos juntos Todos juntos Todos juntos Todos juntos<br />
-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />
- Entrevista Karin (mãe<br />
Camila)<br />
-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />
- Número oculto<br />
Piaba - Biblioteca (14h15<br />
às 14h45) Poesia <strong>na</strong><br />
pasta<br />
Desenho: com<br />
interferências <strong>de</strong> lixa<br />
Suporte: QD<br />
Meio: giz <strong>de</strong> cera FOTO<br />
5ª Roda <strong>de</strong> critérios<br />
<strong>de</strong> seleção <strong>de</strong> livro<br />
da biblioteca<br />
-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />
- Roda: tematizar<br />
contagem com 2 dados<br />
-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />
- Leitura <strong>de</strong> nomes:<br />
Lucas e Thomas<br />
-<strong>Ler</strong> roti<strong>na</strong><br />
- Profissões: listar<br />
perguntas para<br />
Fabia<strong>na</strong><br />
Peixe tralhoto Ensaio da festa juni<strong>na</strong> Farinhada<br />
Apreciação Leda Catunda<br />
– espírito do jardim.<br />
Gravar discussão.<br />
Passar camada <strong>de</strong><br />
cola <strong>na</strong>s argilas<br />
LANCHE<br />
Pic Nic Na sala mesas separadas Na Sala mesas separadas Pic Nic com G2C Na sala, banquete<br />
15h10 – 15h40<br />
PARQUE<br />
Inglês (16h30 às 17h) Inglês (16h às 16h30)<br />
15h40 – 16h40<br />
Teacher conta história<br />
ATIVIDADE 3<br />
16h40 – 17h Relaxamento Relaxamento Relaxamento Relaxamento Relaxamento<br />
HISTÓRIA<br />
17h – 17h20<br />
Conversa sobre o parque Entrevista Luisa (mãe<br />
Ernest)<br />
Música (17h10 às 17h50) Inglês (17h às 17h30) - Mais<br />
Brasileirinhos<br />
- Histórias para<br />
todos os dias<br />
ATIVIDADE 4<br />
17h20 – 17h40<br />
DESENHO<br />
17h40 – 18h<br />
SAÍDA<br />
- Mais<br />
Brasileirinhos<br />
Thaís escolhe e conta<br />
Inglês (17h30 às 18h)<br />
Arr<strong>uma</strong>ção<br />
Guardar squeeze<br />
Massagem<br />
Moradias, casas<br />
Suporte: A4<br />
Meio: canetinha<br />
Arr<strong>uma</strong>ção<br />
Guardar squeeze<br />
- Mais<br />
Brasileirinhos<br />
- Coleção do Sapo<br />
Arr<strong>uma</strong>ção<br />
Guardar squeeze<br />
- Mais<br />
Brasileirinhos<br />
- Superamigos<br />
-Suporte: circulo com um<br />
buraco no meio<br />
- Meio: canetinha<br />
Arr<strong>uma</strong>ção<br />
Guardar squeeze<br />
Ofici<strong>na</strong> <strong>de</strong> convívio:<br />
prendas juni<strong>na</strong>s<br />
- Suporte: AA4<br />
-Meio: canetão<br />
Arr<strong>uma</strong>ção<br />
Guardar squeeze
A recorrência do gênero poesia se <strong>de</strong>ve à sequência <strong>de</strong> leituras <strong>de</strong><br />
poemas <strong>de</strong> um dado autor ou ilustrador (no caso, Lalau e Laura Beatriz,<br />
criadores do livro “Mais Brasileirinhos” 23 , que aparece citado nos momentos<br />
da história).<br />
Esta sequência é realizada entre os meses <strong>de</strong> abril e junho, com o<br />
propósito <strong>de</strong> ampliar o repertório <strong>de</strong> poemas, que serão utilizados em um<br />
recital para funcionários e colegas <strong>de</strong> outras turmas. Este é o produto fi<strong>na</strong>l <strong>de</strong><br />
um projeto, <strong>de</strong>senvolvido em junho e agosto, cujo foco principal resi<strong>de</strong> <strong>na</strong>s<br />
práticas <strong>de</strong> oralida<strong>de</strong>. É importante ressaltar que, a utilização da palavra<br />
“ampliar”, no início do parágrafo, foi intencio<strong>na</strong>l, primeiro porque parte-se do<br />
pressuposto <strong>de</strong> que o texto poético não é restrito ao âmbito escolar e que as<br />
crianças têm ou po<strong>de</strong>m ter acesso a ele fora da escola, tanto por meio <strong>de</strong><br />
livros, quanto pelas mídias e mesmo pela música. Segundo, porque, além<br />
disso, a escuta e a récita <strong>de</strong> poemas é <strong>uma</strong> das ativida<strong>de</strong>s habituais,<br />
realizada durante todo o ano, no Grupo 1. 24<br />
Nestes momentos, a criança está apreciando a leitura ou récita do<br />
poema, realizada pela professora, e se divertindo com os efeitos sonoros que<br />
observa, com o jogo com as palavras que percebe, mas que nem sempre<br />
sabe nomear ou produzir. Conforme a criança tem a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ler e<br />
escutar outras vezes o mesmo poema, poemas diferentes, no caso, poemas<br />
do mesmo autor, ela começa a estabelecer relações, fazer comparações e a<br />
criar hipóteses sobre o gênero, sobre como é o autor, seus gostos, temas,<br />
motivações e estilos, bem como refletir sobre a linguagem poética <strong>na</strong> qual “a<br />
forma <strong>de</strong> dizer adquire um valor específico”. (LERNER, 2002, p.82).<br />
Ao terem como propósito comunicativo a apresentação <strong>de</strong> um recital<br />
<strong>de</strong> poemas para os funcionários da escola e colegas <strong>de</strong> outras turmas,<br />
23<br />
Lalau e Laura Beatriz. Mais Brasileirinhos. Coleção Brasileirinhos. Ed. Cosac Naify.<br />
24<br />
Propostas <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong> poemas retor<strong>na</strong>m em diversos momentos da escolarida<strong>de</strong>,<br />
o que não quer dizer que, <strong>na</strong> série em que ele não apareça enquanto prática social<br />
privilegiada, ele não seja contemplado nos momentos <strong>de</strong> leituras diversas.<br />
50
cumprirão os diferentes propósitos didáticos relacio<strong>na</strong>dos aos objetivos <strong>de</strong>sse<br />
projeto. Isso ocorrerá <strong>de</strong> modo contextualizado e significativo, pois cada<br />
etapa do trabalho é fundamental para a concretização do produto fi<strong>na</strong>l. Por<br />
exemplo:<br />
1. Para fazermos um recital é necessário escolher que poema cada um<br />
ou grupo irá apresentar, para escolher um é necessário conhecer alguns,<br />
portanto, justificam-se os momentos <strong>de</strong> leitura <strong>de</strong> poemas e <strong>de</strong> conversa<br />
sobre.<br />
Propósitos didáticos: Ampliação do repertório literário, compartilhar o<br />
efeito que <strong>uma</strong> obra literária produz; comentar os poemas que ouve,<br />
trocando opiniões sobre o mesmo; confrontar interpretações <strong>de</strong> um texto<br />
literário; familiarização com o tipo <strong>de</strong> texto.<br />
2. Para recitar é necessário conhecer bem o poema e ensaiar antes <strong>de</strong><br />
apresentar.<br />
Propósitos didáticos: Ter compreendido o poema que irá recitar;<br />
observar e comentar a recitação <strong>de</strong> poemas feita pelo professor ou outros<br />
adultos; respeitar as rimas e expressões, mantendo-as; a<strong>de</strong>quar o volume da<br />
voz ao público ouvinte e ao espaço on<strong>de</strong> será realizada a leitura; utilizar-se<br />
<strong>de</strong> recursos da voz para enfatizar trechos ou mostrar sentimentos (falar mais<br />
alto, falar com voz triste, falar mais rapidamente...).<br />
As ações que as crianças realizam ganham sentido em função do que<br />
se quer realizar e as <strong>proposta</strong>s encaminhadas em sala <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> ser um<br />
exercício ou <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> escolar que não se relacio<strong>na</strong> com o que existe no<br />
mundo real, fora da escola.<br />
Motivados em seus propósitos as crianças se empenharão e<br />
construirão saberes - o que não significa absolutamente que trabalharão <strong>de</strong><br />
maneira exaustiva neste percurso. Como se po<strong>de</strong> observar, as ativida<strong>de</strong>s<br />
relacio<strong>na</strong>das à sequência <strong>de</strong> leitura ocorreram diariamente, mas ocuparam,<br />
fundamentalmente, o momento da roda <strong>de</strong> história, que tem duração <strong>de</strong> 20<br />
51
minutos. Na terça-feira, esse momento aconteceu <strong>na</strong> roda <strong>de</strong> biblioteca e <strong>na</strong><br />
segunda-feira, aparece ainda como <strong>proposta</strong> <strong>de</strong> um dos cantos <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s<br />
diversificadas.<br />
Assim como este exemplo, outras sequências <strong>de</strong> leitura literária são<br />
<strong>proposta</strong>s ao longo do segmento e constam <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong>, entre elas:<br />
3;<br />
Sequência <strong>de</strong> perseguir um autor – Eva Fur<strong>na</strong>ri – <strong>na</strong>s turmas <strong>de</strong> Grupo<br />
Sequência <strong>de</strong> perseguir coleções – como a da Estela (Coleção da<br />
Editora Brinque Book) - <strong>na</strong>s turmas <strong>de</strong> Grupo 1.<br />
A presença da literatura <strong>na</strong> infância é um tema que tem sido muito<br />
discutido no que concerne às suas fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong>s: pedagógicas – utilizando a<br />
literatura para ensi<strong>na</strong>r algo; ou poética – ligada a função estética, ao prazer.<br />
Contudo, é indiscutível a pertinência e importância da literatura para os<br />
pequenos, pois, enquanto manifestação cultural artística h<strong>uma</strong><strong>na</strong>, possibilita<br />
criar e fantasiar, por meio da linguagem, um mundo alter<strong>na</strong>tivo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias,<br />
emoções e sensações:<br />
(...) escuchar um cuento, um poema o ver u<strong>na</strong> obra <strong>de</strong> teatro<br />
(...) son experiencias sensibles, comparables a oír música,<br />
asistir a um espectáculo <strong>de</strong> danza, mirar u<strong>na</strong> fotografía o ver<br />
u<strong>na</strong> película (GOBIERNO DE LA CIUDAD AUTÓNOMA DE<br />
BUENOS AIRES, 2000, V4, p.323).<br />
Por estas razões, o discurso pedagógico é unânime ao <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r o<br />
trabalho sistemático e intenso com a literatura <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>,<br />
senão antes. Este aspecto parece contemplado no currículo da escola que<br />
a<strong>na</strong>lisamos.<br />
52
3.2.2 Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar<br />
Outra função social da linguagem, que é privilegiada no currículo <strong>de</strong><br />
Práticas <strong>de</strong> linguagem, é o ler, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para saber mais<br />
sobre um tema ou compartilhar o que sabe.<br />
Além <strong>de</strong> ser um fazer do leitor - localizar materiais que o aju<strong>de</strong>m a<br />
respon<strong>de</strong>r/sa<strong>na</strong>r suas dúvidas, localizar no material qual parte lhe serve,<br />
sem, necessariamente, ter que ler tudo para encontrar a informação, usando,<br />
assim, pistas que o texto oferece, e concluir algo a partir das informações<br />
encontradas - este é um procedimento que está muito relacio<strong>na</strong>do aos<br />
fazeres dos estudantes, já que a pesquisa é estratégia didática muito<br />
utilizada <strong>na</strong> escola e, porque não afirmarmos, também fora <strong>de</strong>la.<br />
Contudo, a concepção <strong>de</strong> pesquisa com a qual a Escola da Vila<br />
partilha, pautada nos estudos e produções argenti<strong>na</strong>s, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> didática,<br />
difere do que é tradicio<strong>na</strong>lmente realizado <strong>na</strong>s escolas: um recorte<br />
bibliográfico, em geral, enciclopédico, do tema pesquisado, que se faz<br />
individualmente ou em grupos, como tarefa escolar, e muitas vezes como<br />
tarefa para casa, e sem orientação <strong>de</strong> alguém que conheça os procedimentos<br />
implicados no pesquisar e que tão pouco tenha em vista os objetivos que a<br />
tarefa <strong>de</strong>seja cumprir. Nestes mol<strong>de</strong>s, não faz sentido pensar a pesquisa no<br />
contexto da educação infantil, pois seria <strong>uma</strong> tarefa realizada pelo adulto e<br />
absolutamente sem relevância para o aprendiz, além <strong>de</strong> meramente<br />
burocrática, que existe somente no âmbito escolar e que não fornece à<br />
criança as ferramentas que precisará quando quiser pesquisar algo para<br />
respon<strong>de</strong>r a seus interesses e curiosida<strong>de</strong>s pessoais.<br />
<strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, falar e ouvir com o propósito <strong>de</strong> saber mais sobre um<br />
tema <strong>de</strong> interesse coloca a criança em contato com outro tipo <strong>de</strong> texto para<br />
além dos literários: os textos informativos. Em geral, estes materiais<br />
(enciclopédias, artigos e livros científicos) não são produzidos para o público<br />
infantil, mas são estes que existem com a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong> veicularem e<br />
53
divulgarem as informações científicas e, portanto, será com este tipo <strong>de</strong><br />
material com o qual a criança irá interagir toda vez que quiser buscar<br />
conhecimentos, validados, <strong>de</strong>sta <strong>na</strong>tureza.<br />
Na educação infantil, o contato com estas publicações acontecerá com<br />
a mediação do professor que hora irá atuar com mo<strong>de</strong>lo, hora como<br />
instrumento - lerá trechos apontados pelos alunos, para que confirmem ou<br />
não suas hipóteses e <strong>escrever</strong>á o que ditarem -, e hora como<br />
problematizador: colocará em discussão os diferentes achados e estratégias<br />
utilizadas, favorecendo a construção do conhecimento e sua circulação no<br />
grupo.<br />
Assim como no Eixo 1, alguns fazeres do leitor, escritor, falante e<br />
ouvinte permanecem ao longo <strong>de</strong> todo o segmento e outros se mantêm, mas<br />
agregam os saberes já construídos nos anos anteriores.<br />
Os fazeres, relacio<strong>na</strong>dos a localizar informações precisas em imagens<br />
(estáticas ou em movimento) e em textos, se referem aos procedimentos<br />
que são realizados por aquele que pesquisa: em qualquer momento da<br />
escolarida<strong>de</strong> ou mesmo fora do contexto escolar, quando se vai buscar <strong>uma</strong><br />
informação, o sujeito interessado <strong>de</strong>verá i<strong>de</strong>ntificar quais dados, presentes<br />
nos portadores utilizados, respon<strong>de</strong>m a sua questão.<br />
54
Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar<br />
G1<br />
G2<br />
G3<br />
Comunicar<br />
oralmente,<br />
por escrito e<br />
por <strong>de</strong>senho<br />
informações<br />
aprendidas;<br />
Localizar<br />
informações<br />
precisas em<br />
imagens<br />
(estáticas e<br />
em<br />
movimento)<br />
que lê;<br />
Localizar<br />
informações<br />
precisas em<br />
textos que<br />
ouve/lê;<br />
Ouvir textos<br />
informativos<br />
diversos,<br />
entre eles,<br />
legendas e<br />
trechos <strong>de</strong><br />
verbetes;<br />
Ouvir textos<br />
informativos<br />
diversos,<br />
entre eles,<br />
legendas,<br />
esquemas,<br />
tabelas e<br />
trechos <strong>de</strong><br />
verbetes;<br />
Conhecer<br />
alguns<br />
portadores<br />
<strong>de</strong> textos<br />
informativos<br />
;<br />
Reconhecer<br />
portadores<br />
<strong>de</strong> textos<br />
informativos<br />
específicos<br />
para os<br />
temas <strong>de</strong><br />
estudo;<br />
Reconhecer<br />
alguns<br />
portadores<br />
<strong>de</strong> textos<br />
informativos<br />
Refletir<br />
sobre o<br />
sistema <strong>de</strong><br />
escrita<br />
avançando<br />
rumo à<br />
leitura e à<br />
escrita<br />
convencio<strong>na</strong>l<br />
Por isso, estes procedimentos estarão presentes em qualquer situação<br />
didática ou social que impliquem o propósito informativo. Embora as<br />
pesquisas envolvam temas científicos, importa esclarecer que o foco maior<br />
das <strong>proposta</strong>s está <strong>na</strong> interação das crianças com estes importantes<br />
procedimentos: usar índices dos portadores para localizar a pági<strong>na</strong> <strong>de</strong>sejada;<br />
questio<strong>na</strong>r-se e explorar textos em busca <strong>de</strong> respostas; registrar, <strong>de</strong> formas<br />
diversas, o que se apren<strong>de</strong> etc.<br />
Comunicar o que foi aprendido, por sua vez, socializando as<br />
<strong>de</strong>scobertas é <strong>uma</strong> tarefa que está intrinsecamente relacio<strong>na</strong>da ao fazer<br />
científico: realiza-se <strong>uma</strong> pesquisa, um estudo, com a fi<strong>na</strong>lida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
respon<strong>de</strong>r a <strong>uma</strong> <strong>de</strong>manda social, portanto, não faz sentido <strong>uma</strong> pesquisa <strong>de</strong><br />
<strong>na</strong>tureza científica que não divulgue os seus achados.<br />
A ação <strong>de</strong> comunicar o que foi aprendido também se conecta aos<br />
propósitos do projeto didático, quando da realização <strong>de</strong> um produto fi<strong>na</strong>l,<br />
dando sentido às etapas do estudo, por exemplo: para se produzir <strong>uma</strong><br />
revista <strong>de</strong> “Você Sabia” sobre os animais polares (produto fi<strong>na</strong>l e situação<br />
55
comunicativa, <strong>na</strong> qual se comunica o que foi aprendido), há <strong>de</strong> se estudar e<br />
apren<strong>de</strong>r informações que irão compor os textos <strong>de</strong> “Você sabia que...”.<br />
No entanto, <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> da educação infantil da Escola da Vila,<br />
optou-se por esta estratégia didática ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong>s <strong>proposta</strong>s ligadas ao fazer<br />
literário. Esta escolha se justifica pela <strong>na</strong>tureza dos objetos <strong>de</strong> cada<br />
<strong>proposta</strong>: o objeto do projeto recital <strong>de</strong> poesia é o poema, do cancioneiro é a<br />
cantiga. Produzir algo é o que motiva o aluno a <strong>de</strong>dicar-se a cada etapa: do<br />
ponto <strong>de</strong> vista da criança, ela não está escutando muitos poemas, porque a<br />
professora quer, mas porque precisa conhecer muitos, para po<strong>de</strong>r escolher<br />
qual irá apresentar; não está pensando sobre a característica do texto escrito<br />
nos contos <strong>de</strong> fadas, porque faz parte da aula, mas para po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>cidir quais<br />
palavras irá utilizar e que combi<strong>na</strong>rão com o que vai produzir.<br />
Eixo 2 - <strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong>, escutar e falar para informar-se e para informar<br />
Grupo 1<br />
Grupo 2 Grupo 3<br />
Ativida<strong>de</strong><br />
habitual<br />
Sequência<br />
Ativida<strong>de</strong><br />
habitual<br />
Sequência<br />
Ativida<strong>de</strong><br />
habitual<br />
Sequência<br />
Composição<br />
do álbum A<br />
gente <strong>de</strong><br />
quem a<br />
gente gosta<br />
(marcos <strong>de</strong><br />
crescimento)<br />
. Produção e<br />
ditado<br />
individual <strong>de</strong><br />
legendas<br />
A infância<br />
dos avós –<br />
Ditado <strong>de</strong><br />
relatos das<br />
visitas <strong>de</strong><br />
avós<br />
Pesquisa<br />
coletiva<br />
sobre<br />
filhotes<br />
eleitos/<br />
Conhecer<br />
profissões:<br />
entrevista<br />
com<br />
funcionários<br />
da escola e<br />
pais<br />
Pesquisa<br />
sobre animal<br />
do fundo do<br />
mar/<br />
exposição do<br />
percurso em<br />
um mural<br />
Escuta <strong>de</strong><br />
textos<br />
jor<strong>na</strong>lísticos<br />
e <strong>de</strong><br />
convites <strong>de</strong><br />
eventos<br />
culturais<br />
Crescer índio<br />
- exposição<br />
oral<br />
Pesquisa<br />
fau<strong>na</strong><br />
brasileira -<br />
mural<br />
Contudo, no caso do texto científico, o que mobiliza o aluno é a própria<br />
curiosida<strong>de</strong> que o tema <strong>de</strong>sperta e que se relacio<strong>na</strong> a outras áreas <strong>de</strong><br />
conhecimento, por exemplo: as crianças se interessam em pesquisa sobre os<br />
filhotes, a fau<strong>na</strong> brasileira, os animais do fundo mar ou sobre infância do<br />
56
índio (ciências <strong>na</strong>turais e/ou sociais), porque são temas <strong>de</strong> seu interesse e<br />
não porque vão fazer um livro ou mesmo o mural. Neste caso, o mural e a<br />
exposição oral servem para colecio<strong>na</strong>r, controlar e comunicar as <strong>de</strong>scobertas,<br />
mas não é a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> compartilhar isso com um público externo o que<br />
motiva o estudo. Aqui, está em jogo, essencialmente, que as crianças se<br />
informem sobre o tema <strong>de</strong> pesquisa.<br />
Vale ressaltar, no entanto, que utilizar temas <strong>de</strong> outras áreas,<br />
absolutamente significa, por si só, que se trata <strong>de</strong> um projeto ou sequência<br />
didática <strong>na</strong> área abrangida, algo já citado. Os objetivos <strong>de</strong>stes estudos são os<br />
procedimentos <strong>de</strong> leitura e escrita no contexto da pesquisa, portanto, saber o<br />
peso da foca-leopardo ou apren<strong>de</strong>r sobre a sua alimentação não é o<br />
propósito didático <strong>de</strong>sta situação, mas sim as estratégias <strong>de</strong> como localizar<br />
estes dados: saber que o tipo <strong>de</strong> informação é buscada para restringir o<br />
campo <strong>de</strong> procura, por exemplo, os dados numéricos são pistas <strong>de</strong> on<strong>de</strong> se<br />
po<strong>de</strong> encontrar o peso do animal? As imagens e os ícones próximos ao texto<br />
indicam sobre o que ele trata? Entre outros.<br />
As crianças se apropriam dos procedimentos <strong>de</strong> pesquisa à medida que<br />
a realizam, contudo, neste momento da escolarida<strong>de</strong>, em que não têm<br />
muitas experiências nesta área, o professor terá o papel fundamental <strong>de</strong><br />
oferecer mo<strong>de</strong>los e, por isso, quase todas as ativida<strong>de</strong>s são centradas em<br />
sua atuação, ainda que, do Grupo 1 ao Grupo 3, espera-se que as crianças<br />
tenham se apropriado <strong>de</strong> alguns procedimentos, como a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
consultar índices e o façam com certa autonomia.<br />
Ao a<strong>na</strong>lisar os documentos das sequências <strong>de</strong> pesquisas,<br />
<strong>de</strong>senvolvidas nos três grupos, observa-se que as ativida<strong>de</strong>s ocorrem,<br />
essencialmente, nos momentos da roda, on<strong>de</strong> são problematizadas questões<br />
relativas ao trabalho, e nos cantos.<br />
Exemplo <strong>de</strong> situações encaminhadas em roda:<br />
A professora leva para a roda diferentes imagens (impressas, no<br />
datashow ou em ví<strong>de</strong>os) do animal escolhido para o estudo e, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
57
explorarem as imagens, propõem perguntas tais como: “O que essa imagem<br />
está nos contando sobre o leopardo?”, “O que o macho está fazendo aqui?”,<br />
“Quem pesa mais, vocês ou esse filhote aqui?”<br />
A professora leva para a roda diferentes textos informativos com o<br />
propósito <strong>de</strong> respon<strong>de</strong>r às perguntas (levantadas sobre o animal, em outra<br />
roda) e que não pu<strong>de</strong>ram ser respondidas pela leitura das imagens.<br />
Exemplo <strong>de</strong> situações encaminhadas em cantos:<br />
Leitura exploratória nos cantos, dispondo diferentes portadores<br />
informativos ou não e que abor<strong>de</strong>m várias temáticas, incluindo e excluindo a<br />
do estudo.<br />
Entre os cantos o professor organiza um que seja <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do ao<br />
tratamento do tema e convida alg<strong>uma</strong>s crianças para participarem nele: a<br />
ativida<strong>de</strong> do canto po<strong>de</strong> ser, por exemplo, localizar no material<br />
disponibilizado on<strong>de</strong> tem informação sobre o animal pesquisado e marcar a<br />
pági<strong>na</strong> do livro para que possa, posteriormente, compartilhar com os <strong>de</strong>mais<br />
seu achado.<br />
Estes são ape<strong>na</strong>s dois exemplos <strong>de</strong> encaminhamentos nos cantos e <strong>na</strong><br />
roda.<br />
Somente no Grupo 3, foi possível observar, ainda que <strong>de</strong> maneira não<br />
sistemática, a ocorrência <strong>de</strong> outros momentos <strong>na</strong> roti<strong>na</strong> <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do às<br />
ativida<strong>de</strong>s das sequências <strong>de</strong>sse eixo.<br />
Além da pesquisa, as crianças têm outras oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ler,<br />
<strong>escrever</strong>, ouvir e falar para informar e informar-se, com outros propósitos,<br />
entre eles a leitura e a escrita (por si mesmo ou através do professor) <strong>de</strong><br />
legendas <strong>de</strong> foto <strong>de</strong> quando eram pequenos, relato da visita dos avós,<br />
entrevista e relato das mesmas realizada com os funcionários da escola e<br />
pais dos alunos do grupo, <strong>de</strong> textos jor<strong>na</strong>lísticos com eventuais temas <strong>de</strong><br />
interesse e dicas culturais.<br />
58
É interessante observar como até as <strong>proposta</strong>s <strong>de</strong> ativida<strong>de</strong>s habituais<br />
são conso<strong>na</strong>ntes aos interesses dos alunos e como todas as situações <strong>de</strong><br />
leitura e escrita aparecem com a função <strong>de</strong> cumprir algum propósito social. O<br />
quadro a seguir, apresenta as diferentes ativida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>senvolvidas ao longo<br />
dos três grupos.<br />
59
Ativida<strong>de</strong>s habituais<br />
Eixo 1 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em Eixo 2 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar para Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em<br />
G1 G2 G3 G1 G2 G3 G1 G2 G3<br />
Escuta e récita<br />
<strong>de</strong> parlendas e<br />
<strong>de</strong> poemas<br />
mais curtos<br />
Escuta diária <strong>de</strong><br />
textos literários<br />
diversos; troca<br />
<strong>de</strong> comentários<br />
e apreciações<br />
Escuta e leitura<br />
pelo professor,<br />
<strong>de</strong> LIVRO<br />
ÁLBUM e <strong>de</strong><br />
contos com<br />
repetição<br />
Visitas à<br />
biblioteca<br />
central<br />
Escuta e récita<br />
<strong>de</strong> parlendas e<br />
<strong>de</strong> poemas<br />
Escuta diária <strong>de</strong><br />
textos literários<br />
diversos; troca<br />
<strong>de</strong> comentários<br />
e apreciações<br />
Visitas à<br />
biblioteca<br />
central<br />
Escuta <strong>de</strong><br />
adivinhas e <strong>de</strong><br />
trava-línguas,<br />
leitura e escrita<br />
por si mesmos<br />
(localização/esc<br />
rita <strong>de</strong><br />
respostas e<br />
adivinhas)<br />
Escuta diária <strong>de</strong><br />
textos literários<br />
diversos; troca<br />
<strong>de</strong><br />
comentários,<br />
apreciações e<br />
ditado ao<br />
professor <strong>de</strong><br />
indicações<br />
literárias (<strong>uma</strong><br />
por semestre).<br />
Visitas à<br />
biblioteca<br />
central<br />
Produção e<br />
ditado<br />
individual <strong>de</strong><br />
legendas para o<br />
álbum "A gente<br />
<strong>de</strong> quem a<br />
gente gosta"<br />
A infância dos<br />
avós – Ditado<br />
<strong>de</strong> relatos das<br />
visitas <strong>de</strong> avós<br />
Conhecer<br />
profissões:<br />
entrevista com<br />
funcionários da<br />
escola e pais<br />
Escuta <strong>de</strong><br />
textos<br />
jor<strong>na</strong>lísticos e<br />
<strong>de</strong> convites <strong>de</strong><br />
eventos<br />
culturais<br />
Escuta e récita<br />
<strong>de</strong> parlendas e<br />
poemas,<br />
especialmente,<br />
<strong>de</strong> poemas<br />
mais curtos<br />
Escuta e récita<br />
<strong>de</strong> parlendas e<br />
poemas,<br />
especialmente,<br />
<strong>de</strong> poemas<br />
mais curtos<br />
Escuta <strong>de</strong><br />
adivinhas e <strong>de</strong><br />
trava-línguas,<br />
leitura e escrita<br />
por si mesmos<br />
(localização/esc<br />
rita <strong>de</strong><br />
respostas e<br />
adivinhas)
Em nenhum momento as crianças fazem lições vinculadas a pesquisa,<br />
leem ou escrevem porque é hora <strong>de</strong> ler e <strong>escrever</strong>, mas sim porque estas<br />
ações colocam-se como inerentes à sua participação no contexto <strong>de</strong> cada<br />
<strong>uma</strong> das modalida<strong>de</strong>s organizativas (projetos, sequências e ativida<strong>de</strong>s<br />
habituais). Neste eixo do trabalho com práticas <strong>de</strong> linguagem, por exemplo,<br />
escutam leituras <strong>de</strong> textos enciclopédicos para buscar informações que<br />
respondam às curiosida<strong>de</strong>s que se colocaram sobre o animal; exploram<br />
materiais diversos buscando localizar on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>m encontrar <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>das<br />
informações; registram o que apren<strong>de</strong>m porque é necessário para que se<br />
retome mais adiante o que já se sabe sobre o animal. Trata-se <strong>de</strong> situações<br />
reais e significativas <strong>de</strong> leitura e <strong>de</strong> escrita.<br />
3.2.3 Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano<br />
escolar<br />
Pensar sobre o uso da escrita <strong>na</strong> escola é, antes <strong>de</strong> tudo, pensá-lo fora<br />
da escola: lemos e escrevemos para nos entreter; para nos informar; para<br />
comunicar por carta, e-mail, bilhete, convite; para fazer <strong>uma</strong> receita;<br />
apren<strong>de</strong>r um jogo; ou saber como funcio<strong>na</strong> ou como se monta um aparelho;<br />
para nos apropriar das normas <strong>de</strong> um lugar; organizar materiais; fazer<br />
compras etc.<br />
O dia-a-dia escolar está repleto <strong>de</strong> situações reais, advindas das<br />
relações; das interações; e mesmo dos eventos extra-escolares. E,<br />
sobretudo, não é novida<strong>de</strong> pensarmos, nestes momentos, como<br />
privilegiados, pela possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uso real da leitura e da escrita para<br />
organização das ativida<strong>de</strong>s diárias.<br />
Contudo, <strong>de</strong>finir as situações do cotidiano escolar como eixo <strong>de</strong><br />
trabalho <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> linguagem é reconhecer toda a sua potência e a sua<br />
importância <strong>na</strong> formação do usuário da cultura escrita. Essa <strong>de</strong>finição,<br />
61
também, garante que esses momentos <strong>de</strong> fato aconteçam, já que estão<br />
previstos e valorizados <strong>curricular</strong>mente e, portanto, não ficam ape<strong>na</strong>s no<br />
plano do discurso pedagógico ou das tarefas a serem cumpridas.<br />
Este eixo <strong>de</strong> trabalho, ao longo dos três grupos, se organiza em torno<br />
<strong>de</strong> quatro categorias:<br />
Proposta<br />
1. Bilhete, convites e listas<br />
2. Nome Próprio<br />
Função Social<br />
Solicitação materiais; registros para a organização do dia a<br />
dia escolar; comunicação inter<strong>na</strong> (setores e funcionários da<br />
escola; colegas <strong>de</strong> outra classe; colegas ausentes) e com<br />
as famílias etc.<br />
I<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong> pertences e <strong>de</strong> produções; organização <strong>de</strong><br />
jogos; <strong>de</strong> fichas <strong>de</strong> biblioteca; calendário <strong>de</strong><br />
aniversariantes; cartaz <strong>de</strong> ajudantes do dia; jogo <strong>de</strong> bingo<br />
etc.<br />
3. Roda <strong>de</strong> conversa<br />
Conversas e relatos sobre temas específicos, sejam<br />
centrados em estudos, sejam temas do convívio social ou<br />
escolar; conversas sobre as situações da roti<strong>na</strong> diária.<br />
4. Explicações ou instruções<br />
Escuta atenta <strong>de</strong> explicações ou <strong>de</strong> instruções dadas pelo<br />
professor a fim <strong>de</strong> orientar-se e organizar-se a partir <strong>de</strong>las.<br />
Explicação <strong>de</strong> dúvidas para colegas e professores.<br />
Por serem ativida<strong>de</strong>s que ocorrem em função das situações próprias<br />
do cotidiano escolar, são caracterizadas como habituais, ocorrendo ao longo<br />
<strong>de</strong> toda a <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, e varia ape<strong>na</strong>s no que se refere à progressão <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>safios: se no G1 o aluno ouvia e ditava bilhetes, no G3, além disso, po<strong>de</strong>rá<br />
também ter a tarefa <strong>de</strong> escrevê-lo por si mesmo.<br />
É importante ressaltar que estas <strong>proposta</strong>s inserem-se em momentos<br />
extremamente contextualizados: o professor não planeja <strong>uma</strong> ativida<strong>de</strong> com<br />
o propósito <strong>de</strong> ensi<strong>na</strong>r a <strong>escrever</strong> bilhetes, mas ao olhar os projetos e<br />
sequências da série, antecipa em quais situações <strong>escrever</strong> um bilhete é<br />
pertinente e organiza seu planejamento para que este momento ocorra e<br />
seja, <strong>de</strong> fato, significativo para os alunos. Por outro lado, ao ter consciência<br />
<strong>de</strong> que esse fazer integra o trabalho da série, estará mais atento às situações<br />
62
que emergem do dia-a-dia escolar, po<strong>de</strong>ndo explorá-las com mais<br />
proprieda<strong>de</strong>, por exemplo, quando <strong>uma</strong> criança traz um jogo e o professor<br />
julga que a leitura das regras e a exploração <strong>de</strong>le pelos alunos é pertinente<br />
e, então, abre este espaço para a realização, em sua programação. Ou,<br />
ainda, quando atua como escriba <strong>de</strong> <strong>uma</strong> carta <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>da a um aluno que se<br />
ausentou por doença.<br />
Ao privilegiar esses momentos <strong>de</strong> interação com as distintas práticas<br />
<strong>de</strong> uso social da linguagem escrita, a criança construirá saberes tanto sobre o<br />
sistema <strong>de</strong> escrita, como sobre o tipo <strong>de</strong> texto que escreve por si mesmo ou<br />
pelas mãos do professor, observando suas características, tais como,<br />
estrutura, expressões, vocabulário próprio, temas; <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>tários e funções.<br />
Outro aspecto que merece <strong>de</strong>staque é o cuidado com que as gra<strong>de</strong>s<br />
<strong>curricular</strong>es foram organizadas <strong>de</strong> modo a se referirem sempre aos fazeres<br />
das crianças enquanto leitoras e escritoras <strong>na</strong>s situações do cotidiano escolar<br />
e não em relação aos objetivos que <strong>de</strong>vem alcançar em cada grupo.<br />
63
Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar<br />
G1<br />
G2<br />
G3<br />
<strong>Ler</strong> e<br />
<strong>escrever</strong><br />
seu<br />
próprio<br />
nome;<br />
<strong>Ler</strong> e<br />
<strong>escrever</strong><br />
seu<br />
próprio<br />
nome;<br />
<strong>Ler</strong> e<br />
<strong>escrever</strong><br />
nomes <strong>de</strong><br />
colegas;<br />
<strong>Ler</strong> e <strong>escrever</strong> seu<br />
próprio nome e os<br />
nomes <strong>de</strong> colegas;<br />
Falar e<br />
escutar<br />
em<br />
contextos<br />
<strong>de</strong><br />
comunicaç<br />
ão<br />
interpesso<br />
al<br />
Falar e<br />
escutar<br />
em<br />
contextos<br />
<strong>de</strong><br />
instrução<br />
Falar e<br />
escutar<br />
em<br />
contextos<br />
normativo<br />
s;<br />
Ouvir a<br />
leitura e<br />
ditar<br />
textos <strong>de</strong><br />
comunicaç<br />
ão<br />
interpesso<br />
al<br />
(bilhetes,<br />
convites,<br />
listas <strong>de</strong><br />
solicitação<br />
etc.);<br />
Ouvir a<br />
leitura,<br />
<strong>escrever</strong> e<br />
ditar ao<br />
professor<br />
textos <strong>de</strong><br />
comunicaç<br />
ão<br />
interpesso<br />
al<br />
(bilhetes,<br />
convites,<br />
listas <strong>de</strong><br />
solicitação<br />
etc.);<br />
-<br />
<strong>Ler</strong> e<br />
<strong>escrever</strong><br />
palavras e<br />
títulos <strong>de</strong><br />
brinca<strong>de</strong>ir<br />
as, jogos<br />
e livros;<br />
<strong>Ler</strong> e<br />
<strong>escrever</strong><br />
listas<br />
diversas e<br />
palavras<br />
(objetos,<br />
brinquedo<br />
s) para<br />
organizar<br />
ativida<strong>de</strong>s<br />
cotidia<strong>na</strong>s<br />
(para<br />
votações,<br />
para<br />
conservar<br />
<strong>de</strong><br />
memória<br />
etc.)<br />
Refletir<br />
sobre o<br />
sistema<br />
<strong>de</strong> escrita<br />
avançando<br />
rumo à<br />
leitura e à<br />
escrita<br />
convencio<br />
<strong>na</strong>l<br />
Por exemplo, <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> do G1 e G2 aparece como um fazer<br />
“ler e <strong>escrever</strong> seu próprio nome” e a criança o fará quando escutá-lo;<br />
escrevê-lo e lê-lo; da maneira que for capaz em cada momento, com o<br />
propósito <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificar os seus pertences, as suas produções; organizar<br />
jogos e fichas da biblioteca; para consultar o calendário <strong>de</strong> aniversariantes e<br />
os ajudantes do dia etc. Isso, absolutamente quer dizer que <strong>de</strong>verá ler e<br />
<strong>escrever</strong>, convencio<strong>na</strong>lmente, “listas diversas e palavras (objetos,<br />
brinquedos) para organizar ativida<strong>de</strong>s cotidia<strong>na</strong>s (para votações, para<br />
conservar <strong>de</strong> memória etc.), palavras e títulos das brinca<strong>de</strong>iras, jogos e<br />
64
livros”, mas que, ainda assim, será solicitada a ler e a <strong>escrever</strong>, com estes<br />
propósitos, e o fará <strong>de</strong> acordo com suas possibilida<strong>de</strong>s.<br />
Como já dito anteriormente, e que vale ressaltar, o êxito da criança<br />
não consiste em respon<strong>de</strong>r “corretamente”, do ponto <strong>de</strong> vista convencio<strong>na</strong>l,<br />
mas, a partir do que sabe e dos dados que o contexto informa, encontrar<br />
respostas que possam justificar e explicar, <strong>de</strong> acordo com seus pressupostos.<br />
3.3. A transversalida<strong>de</strong> no currículo<br />
Ao a<strong>na</strong>lisar a gra<strong>de</strong> dos três grupos etários da educação infantil da<br />
Escola da Vila é possível observar <strong>uma</strong> organização que dá oportunida<strong>de</strong>s à<br />
criança vivenciar e experimentar <strong>uma</strong> mesma prática social em diferentes<br />
momentos.<br />
Esta dinâmica <strong>curricular</strong> parte do pressuposto <strong>de</strong> que <strong>uma</strong> situação<br />
isolada não garante a aquisição <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do conhecimento, e que para<br />
construí-lo são necessárias diversas aproximações em distintos momentos,<br />
para que aquilo que foi experimentado possa se relacio<strong>na</strong>r com outros<br />
eventos e saberes que circulam <strong>de</strong>ntro e fora da escola e, então, possibilitar<br />
um novo olhar à prática em questão.<br />
Para ilustrar como ocorre essa transversalida<strong>de</strong>, o quadro abaixo<br />
organiza as <strong>proposta</strong>s observadas <strong>na</strong>s três gra<strong>de</strong>s, e que tematizam a<br />
mesma prática.<br />
65
Eixo 3 - <strong>Ler</strong>, <strong>escrever</strong>, escutar e falar em situações do cotidiano escolar<br />
Grupo 1<br />
Grupo 2 Grupo 3<br />
Ativida<strong>de</strong> Ativida<strong>de</strong><br />
Ativida<strong>de</strong><br />
Sequência Projeto<br />
Sequência<br />
habitual habitual<br />
habitual<br />
Projeto<br />
Escuta e<br />
récita <strong>de</strong><br />
parlendas<br />
(também<br />
utilizadas<br />
em sorteios<br />
e<br />
brinca<strong>de</strong>iras)<br />
e poemas,<br />
especialment<br />
e, <strong>de</strong><br />
poemas<br />
mais curtos<br />
Escuta e<br />
récita <strong>de</strong><br />
parlendas<br />
(também<br />
utilizadas<br />
em sorteios<br />
e<br />
brinca<strong>de</strong>iras)<br />
e poemas,<br />
especialment<br />
e, <strong>de</strong><br />
poemas<br />
mais curtos<br />
Leitura <strong>de</strong><br />
poemas <strong>de</strong><br />
um dado<br />
autor (Lalau,<br />
como<br />
escritor, e<br />
Laurabeatriz,<br />
como<br />
ilustradora)<br />
e conversas<br />
sobre<br />
regularida<strong>de</strong><br />
s que se<br />
po<strong>de</strong><br />
observar<br />
(temáticas,<br />
presença ou<br />
não <strong>de</strong> rimas<br />
etc.)<br />
Recital <strong>de</strong><br />
poemas<br />
Apresentaçã<br />
o <strong>de</strong> récita<br />
<strong>de</strong> poemas<br />
curtos (para<br />
funcionários<br />
da escola ou<br />
para colegas<br />
<strong>de</strong> outra<br />
classe)<br />
Escuta <strong>de</strong><br />
adivinhas e<br />
<strong>de</strong> travalínguas<br />
(ampliação<br />
<strong>de</strong> repertório<br />
e diversão),<br />
leitura por si<br />
mesmos<br />
(localização<br />
<strong>de</strong><br />
respostas) e<br />
escrita por si<br />
mesmos<br />
(respostas e<br />
adivinhas).<br />
Eva Fur<strong>na</strong>ri -<br />
Escuta <strong>de</strong><br />
obras<br />
diversas <strong>de</strong><br />
um mesmo<br />
autor/<br />
Informações<br />
sobre a vida<br />
do autor/<br />
<strong>Análise</strong> <strong>de</strong><br />
regularida<strong>de</strong><br />
s presentes<br />
em sua<br />
obra/ Leitura<br />
<strong>de</strong> rimas;<br />
leitura e<br />
produção <strong>de</strong><br />
títulos/<br />
Ditado ao<br />
professor <strong>de</strong><br />
indicação<br />
literária<br />
Cancioneiro<br />
Escuta,<br />
leitura e<br />
canto –<br />
canções <strong>de</strong><br />
domínio<br />
público<br />
(canções<br />
com<br />
repetição) /<br />
Reescrita <strong>de</strong><br />
canções, em<br />
duplas, para<br />
compor o<br />
cancioneiro<br />
Neste quadro foram <strong>de</strong>stacadas as <strong>proposta</strong>s que se relacio<strong>na</strong>m com<br />
um tipo <strong>de</strong> texto que, envolve o jogo com as palavras, e possibilita às<br />
crianças “atentarem à forma, aos aspectos sonoros da linguagem como<br />
ritmos e rimas, além das questões culturais e afetivas envolvidas” (BRASIL,<br />
1998, v3. p.141), que são as parlendas, poesias, cantigas e trava-línguas.<br />
Des<strong>de</strong> o G1, são previstas, como ativida<strong>de</strong>s habituais e <strong>de</strong> duração<br />
anual, a escuta e a récita <strong>de</strong> parlendas e <strong>de</strong> poemas, iniciando assim o<br />
contato da criança com este tipo <strong>de</strong> texto, <strong>na</strong> escola. Ao longo <strong>de</strong> todo G2,<br />
essa <strong>proposta</strong> permanece, mas é realizado um maior aprofundamento, no<br />
trabalho com a poesia, por meio da sequência <strong>de</strong> leituras <strong>de</strong> poemas <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do autor. Estas ações, entre outros pontos já <strong>de</strong>stacados<br />
anteriormente, ampliarão o repertório <strong>de</strong> poemas conhecidos e a<br />
66
possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> apreciação por parte das crianças e, ainda, fornecerão<br />
subsídios para o recital <strong>de</strong> poesias, projeto realizado ainda nesta série.<br />
No G3, dando seguimento a esse trabalho, ampliam-se as<br />
possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> textos que compartilham o brincar com as palavras e os<br />
aspectos sonoros como características. As crianças po<strong>de</strong>m apreciar como as<br />
palavras se organizam <strong>de</strong> modos distintos, criando também diferentes<br />
efeitos; também po<strong>de</strong>m experimentar recitar um trava-língua; fazer<br />
adivinhas para os colegas; bem como lê-las e escrevê-las, durante todo o<br />
ano. Na sequência sobre Eva Fur<strong>na</strong>ri, além <strong>de</strong> se aproximarem novamente <strong>de</strong><br />
um dos critérios <strong>de</strong> seleção <strong>de</strong> livros – que é pelo conhecimento que tem<br />
sobre o autor -, terão a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> observar, novamente, a presença da<br />
rima, um tipo <strong>de</strong> texto diverso do que até então tiveram contato. E por fim,<br />
com muitos saberes construídos sobre essa forma <strong>de</strong> organização textual,<br />
<strong>de</strong>senvolverão um projeto que visa a produção <strong>de</strong> um Cancioneiro.<br />
Os saberes envolvidos ao longo <strong>de</strong> todo esse percurso garantirão a<br />
experiência necessária para que as crianças possam re<strong>escrever</strong> canções com<br />
repetição. Há <strong>uma</strong> evi<strong>de</strong>nte progressão <strong>de</strong> <strong>de</strong>safios, e ter tido a oportunida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> atuar verda<strong>de</strong>iramente como leitor e escritor, durante “toda” sua vida<br />
escolar, permitirá que a criança, <strong>na</strong> fase fi<strong>na</strong>l do segmento (setembro,<br />
outubro e novembro), encontre <strong>de</strong>safios ajustados às suas possibilida<strong>de</strong>s,<br />
motivadas pelo propósito comunicativo em questão.<br />
No G3, em função do incremento da complexida<strong>de</strong> das <strong>proposta</strong>s, é<br />
<strong>de</strong>mandado que maior tempo seja <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>do à realização das mesmas. Se,<br />
no G1 e G2, observávamos que as situações didáticas, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> Práticas <strong>de</strong><br />
Linguagem, ocorriam como <strong>uma</strong> das ativida<strong>de</strong>s diversificadas - <strong>na</strong> hora dos<br />
cantos, no momento da roda <strong>de</strong> conversa e <strong>na</strong> roda <strong>de</strong> história -, no G3<br />
aparecem momentos específicos <strong>de</strong>sti<strong>na</strong>dos às ações relativas às etapas das<br />
sequências ou dos projetos, mas, que não ultrapassam – pelos<br />
planejamentos a<strong>na</strong>lisados - 30 minutos sema<strong>na</strong>is.<br />
67
Para ilustrar como ocorre a transversalida<strong>de</strong> no currículo foi utilizado o<br />
trabalho com textos, cuja característica compartilhada é o jogo <strong>de</strong> palavras,<br />
mas, vale ressaltar que o mesmo ocorre em outros tipos <strong>de</strong> textos que,<br />
também, são privilegiados <strong>na</strong> educação infantil da Escola da Vila, tais como<br />
os contos <strong>de</strong> repetição e os contos <strong>de</strong> fadas.<br />
Vale esclarecer, também, que o recorte realizado neste trabalho<br />
restringe a análise ao segmento da <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>, mas, o contato e o<br />
estudo <strong>de</strong>sses gêneros são retomados e revisitados em repetidos momentos<br />
da escolarida<strong>de</strong> – fundamental I e II e ensino médio.<br />
3.4 Sobre o fazer leitor/escritor: refletir sobre o sistema <strong>de</strong> escrita<br />
avançando rumo à leitura e à escrita convencio<strong>na</strong>l<br />
Em <strong>de</strong>corrência do tema <strong>de</strong>ste trabalho, a alfabetização <strong>na</strong> <strong>Educação</strong><br />
<strong>Infantil</strong>, é necessário fazer <strong>uma</strong> consi<strong>de</strong>ração especial a este fazer atribuído<br />
ao leitor, em especial neste eixo do currículo.<br />
Na apresentação teórica ficou claro qual o sentido esta perspectiva <strong>de</strong><br />
ensino e <strong>de</strong> aprendizagem dá ao termo alfabetização – processo <strong>de</strong><br />
apropriação da cultura escrita que envolve diferentes possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> uso, e<br />
não ape<strong>na</strong>s a aquisição do sistema notacio<strong>na</strong>l, ampliando e potencializando a<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trânsito do sujeito em diferentes práticas sociais.<br />
Contudo, ao estar inserido em contextos nos quais a língua escrita o<br />
integra e ter a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> participar ativamente enquanto leitor e<br />
escritor, <strong>de</strong>sempenhando as mesmas ações e procedimentos que leitores e<br />
escritores experientes realizam, a criança po<strong>de</strong>rá refletir sobre a língua que<br />
se fala, se lê e se escreve, suas particularida<strong>de</strong>s, estruturas, organizações e<br />
funções.<br />
No momento <strong>de</strong> <strong>uma</strong> produção escrita, a criança terá <strong>de</strong> lidar com<br />
problemas <strong>de</strong> diferentes <strong>na</strong>turezas: o que <strong>escrever</strong>, a maneira <strong>de</strong> dispor as<br />
68
informações no texto, a escolha <strong>de</strong> palavras que melhor se ajustam ao tipo<br />
<strong>de</strong> texto que se <strong>de</strong>seja produzir (aspectos discursivos), mas, também, terá<br />
<strong>de</strong> lidar com o como <strong>escrever</strong> aquilo que <strong>de</strong>seja, pensando sobre a grafia <strong>de</strong><br />
cada palavra (aspectos notacio<strong>na</strong>is).<br />
Apesar <strong>de</strong> o professor encaminhar situações cujo foco da <strong>proposta</strong><br />
privilegia um aspecto ou outro, – quando a criança dita para o outro, a sua<br />
atenção incidirá sobre os aspectos discursivos; quando ela escreve o que o<br />
outro ditou, sua atenção incidirá sobre os aspectos notacio<strong>na</strong>is -, não se po<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar que o professor não po<strong>de</strong> controlar as reflexões que a<br />
criança faz em cada um <strong>de</strong>sses momentos.<br />
Além disso, nestas situações <strong>de</strong> produção, a criança encontra-se<br />
extremamente motivada, em função do objetivo que ela <strong>de</strong>seja atingir – um<br />
cancioneiro, um recital <strong>de</strong> poesias, um livro <strong>de</strong> informações sobre um animal<br />
pesquisado etc. Contudo, o principal objetivo docente é o <strong>de</strong> promover<br />
situações em que a criança tenha a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refletir sobre a escrita,<br />
suas funções e características, e não que ela conquiste, neste momento, a<br />
escrita convencio<strong>na</strong>l.<br />
O que está implícito aqui é o pressuposto <strong>de</strong> que as crianças, todas<br />
elas, participam <strong>de</strong> todas as práticas <strong>de</strong> linguagem que existem em seu<br />
ambiente social, criando representações pessoais para aquilo que observa e<br />
vivencia. A escola, ao tomar estas práticas como referência, convoca os<br />
alunos, por meio <strong>de</strong> suas <strong>proposta</strong>s, a atuar enquanto leitores e escritores<br />
reais, que leem e escrevem com propósitos <strong>de</strong>finidos e participam <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />
comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> leitores e escritores, que compartilham e fazem circular os<br />
seus saberes. Contudo, é equivocado supor, <strong>de</strong>ssa perspectiva, que para ler<br />
e <strong>escrever</strong> é necessário domi<strong>na</strong>r a notação convencio<strong>na</strong>l.<br />
Ao d<strong>escrever</strong>em as diferentes conceitualizações que a criança tem<br />
sobre o sistema <strong>de</strong> escrita, Ferreiro e Teberosky (1979) revolucio<strong>na</strong>ram o<br />
ensino da língua, porque <strong>de</strong>monstraram que as crianças, mesmo sem<br />
produção alfabética, possuem inúmeros saberes sobre o sistema <strong>de</strong> escrita, o<br />
69
que <strong>de</strong>monstra que elas estão refletindo e criando hipóteses para explicar o<br />
que percebem. Essa é a razão <strong>de</strong> ser, absolutamente, legítimo e possível que<br />
escrevam e leiam, mesmo quando não o façam convencio<strong>na</strong>lmente.<br />
Proporcio<strong>na</strong>r situações <strong>na</strong>s quais as crianças possam ler e <strong>escrever</strong>, do<br />
jeito que po<strong>de</strong>m fazê-lo, é legitimar os saberes que elas dispõem no<br />
momento, e validar a sua participação como membro <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>da cultura<br />
escrita. Nesse sentido, se faz premente a existência <strong>de</strong> um clima <strong>de</strong><br />
confiança para que os alunos se sintam seguros em suas competências e<br />
possam ler e <strong>escrever</strong> <strong>de</strong> acordo com as hipóteses que possuem.<br />
Vale ressaltar também que este trabalho não preestabelece níveis que<br />
a criança <strong>de</strong>ve alcançar a cada série, ou após cada projeto ou sequência,<br />
mas, sim que participem efetivamente das práticas sociais <strong>de</strong> leitura e <strong>de</strong><br />
escrita, e tenham garantido o seu direito <strong>de</strong> refletir sobre a língua que se<br />
fala, se ouve, se lê e se escreve.<br />
70
IV - Alg<strong>uma</strong>s Consi<strong>de</strong>rações<br />
(...) se a escola não gera<br />
aprendizagem, não po<strong>de</strong> justificar-se<br />
como instituição social.<br />
(FERREIRO, 2008, p.53)<br />
A motivação para esta monografia partiu da inquietação frente a i<strong>de</strong>ia<br />
<strong>de</strong> que um trabalho consistente, contínuo e permanente, <strong>na</strong> área <strong>de</strong> práticas<br />
<strong>de</strong> linguagem, é incompatível com as necessida<strong>de</strong>s lúdicas da faixa etária e<br />
que privilegiar este aspecto implica negligenciar a brinca<strong>de</strong>ira, a arte e o<br />
movimento. A hipótese, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, era <strong>de</strong> que esta afirmação é equívoca<br />
e para verificá-la se fez necessário buscar o que a fundamenta, resgatando<br />
um pouco da história da educação infantil no Brasil, as concepções que se<br />
tem sobre este segmento, bem como os pressupostos que embasam o ensino<br />
e a aprendizagem, <strong>na</strong> perspectiva construtivista, no que se refere ao ensino<br />
da língua.<br />
Contudo, apesar da revisitação ao marco teórico ter sido fundamental<br />
para esta pesquisa, esta ação não bastava por si só para corroborar a<br />
hipótese inicial, <strong>de</strong> que brincar e apren<strong>de</strong>r não são ativida<strong>de</strong>s exclu<strong>de</strong>ntes e<br />
que práticas significativas e contextualizadas não competem com o espaço do<br />
lúdico <strong>na</strong> <strong>Educação</strong> <strong>Infantil</strong>. Fazia-se premente, ilustrar, com a análise do<br />
currículo escolar <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição referência <strong>na</strong> abordagem construtivista,<br />
como é possível em <strong>uma</strong> organização <strong>curricular</strong> trabalhar a leitura e a<br />
escrita, sem, no entanto, escolarizar e consequentemente <strong>de</strong>stituir a<br />
significação <strong>de</strong> suas práticas e, ao mesmo tempo, preservar a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do<br />
segmento (brincar, socialização, relações interpessoais, expressivida<strong>de</strong>,<br />
artes).<br />
A análise <strong>de</strong>sse currículo expõe claramente como é possível a<br />
equilibração entre as diferentes áreas do saber e o brincar - necessida<strong>de</strong><br />
inerente à faixa etária. A análise ainda atesta a hipótese inicial e, mesmo que<br />
não o fizesse, esta se manteria, pois como já discorrido anteriormente, a<br />
71
equilibração entre as áreas é <strong>uma</strong> <strong>de</strong>cisão institucio<strong>na</strong>l e não inerente à<br />
qualquer área em si.<br />
Neste caso, a incongruência constituiria <strong>na</strong> <strong>de</strong>sconsi<strong>de</strong>ração das<br />
características e <strong>de</strong>mandas dos principais sujeitos envolvidos e, segundo a<br />
perspectiva construtivista, conhecer bem a quem ensi<strong>na</strong>mos é premissa<br />
básica sobre a qual se <strong>de</strong>sdobrarão todas as intervenções didáticas. Neste<br />
sentido,<br />
O verda<strong>de</strong>iro <strong>de</strong>safio da alfabetização é o <strong>de</strong> conhecer a quem<br />
ensi<strong>na</strong>mos (os processos <strong>de</strong> aprendizagem dos alunos, seus<br />
saberes e pontos <strong>de</strong> <strong>de</strong>sequilíbrio cognitivo) e o que<br />
ensi<strong>na</strong>mos quando nos propomos a alfabetizar (a <strong>na</strong>tureza da<br />
linguagem e o papel social por ela atribuído). (COLELLO e<br />
LUIZE, in: Viver Mente Cérebro, 2006, p.19)<br />
Conhecer as crianças, como apren<strong>de</strong>m, o que estão pensando e pelo o<br />
que se interessam permite ao professor, munido dos saberes sobre a<br />
<strong>na</strong>tureza do objeto <strong>de</strong> ensino, assim como da sua respectiva didática,<br />
potencializar, por meio <strong>de</strong> suas intervenções, as situações escolares. Desse<br />
modo, a criança terá a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> interagir com o objeto <strong>de</strong> estudo <strong>de</strong><br />
forma qualitativa e sistemática, tanto nos projetos e sequências como,<br />
sobretudo, <strong>na</strong>s situações cotidia<strong>na</strong>s. Contudo, é importante ressaltar que a<br />
sistematicida<strong>de</strong> não implica <strong>na</strong> proposição <strong>de</strong> exaustivas e repetitivas<br />
ativida<strong>de</strong>s, pobres em relação ao sentido, ao propósito e ao que mobiliza <strong>na</strong><br />
criança. Mas sim <strong>na</strong> oportunida<strong>de</strong> da criança entrar em contato, reiteradas<br />
vezes e em diferentes momentos, com <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do objeto <strong>de</strong> estudo.<br />
Como po<strong>de</strong> ser observado, o que se apresenta <strong>na</strong> gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> são<br />
conteúdos, não como são entendidos tradicio<strong>na</strong>lmente – tendo a língua como<br />
objeto <strong>de</strong> ensino -, mas sim conteúdos enquanto práticas sociais,<br />
relacio<strong>na</strong>dos aos fazeres leitores e escritores e vinculados a um <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>do<br />
eixo, que se refere, novamente, aos âmbitos <strong>de</strong> uso da linguagem: para se<br />
divertir e emocio<strong>na</strong>r (literária), para informar e se informar e a serviço das<br />
situações do cotidiano. Enquanto práticas sociais, é <strong>na</strong>tural que estas se<br />
72
eiterem <strong>de</strong> forma sistemática e contínua ao longo <strong>de</strong> toda a escolarida<strong>de</strong> e a<br />
construção <strong>de</strong>sse conhecimento se dará à medida que a criança possa se<br />
aproximar <strong>de</strong>le sucessivas vezes e diferentes maneiras – não como um<br />
exercício repetitivo, mas, a partir dos conhecimentos já construídos em<br />
outros momentos, voltar a olhar, refletir, atuar e produzir, ampliando suas<br />
possibilida<strong>de</strong>s, aprofundando sua análise e se apropriando mais <strong>de</strong>sse saber.<br />
Os conteúdos, que aparecem <strong>de</strong>scritos ape<strong>na</strong>s nos documentos das<br />
sequências e projetos, referem-se a saberes culturais que foram socialmente<br />
selecio<strong>na</strong>dos por serem consi<strong>de</strong>rados relevantes <strong>de</strong> serem transmitidos pela<br />
escola, nesta faixa etária.<br />
A<strong>na</strong> Malajovich, n<strong>uma</strong> apresentação feita em um seminário sobre o<br />
brincar (Brincar e Apren<strong>de</strong>r: os dois lados da mesma moeda?) 25 , <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> que,<br />
os conhecimentos próprios da <strong>Educação</strong> infantil, diferente daqueles<br />
trabalhados <strong>na</strong>s <strong>de</strong>mais etapas escolares, não po<strong>de</strong>m ser recuperados, pois<br />
se referem à oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> brincar com o outro, ampliar suas<br />
possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> comunicação, <strong>de</strong> exploração do ambiente e objetos, suas<br />
curiosida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> se perguntar e encontrar respostas, <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolver<br />
confiança e respeito em si mesma e no/pelo outro e <strong>de</strong>scobrir que po<strong>de</strong> se<br />
expressar por palavras e pelas artes (plásticas, corporal, musical etc.).<br />
Nesta perspectiva, os conteúdos são consi<strong>de</strong>rados como meio para o<br />
<strong>de</strong>senvolvimento das capacida<strong>de</strong>s e para que a criança possa expandir o<br />
conhecimento que tem sobre o mundo que pertence, ou seja, um<br />
instrumento para compreen<strong>de</strong>r a realida<strong>de</strong>. Mas não somente a própria, mas<br />
outras lhe sejam novas, com as quais possa interagir e estabelecendo<br />
relações a partir daquilo que já sabe e, assim, ampliando seu conhecimento<br />
<strong>de</strong> mundo. Ou seja, consi<strong>de</strong>rando a escola um lugar em que a criança entre<br />
em contato também com aquilo que não lhe é familiar e para que isso ocorra<br />
é necessário que a escola lhe apresente, já que não é possível <strong>de</strong>sejar aquilo<br />
que se <strong>de</strong>sconhece a existência: <strong>uma</strong> criança que não sabe que existe um<br />
25<br />
Organizado pela Escola da Vila e Instituto Singularida<strong>de</strong>s, em setembro <strong>de</strong> 2012<br />
73
lugar chamado museu, não po<strong>de</strong>ria solicitar que os pais a levem ou tenha<br />
representações sobre este espaço.<br />
Outro aspecto, extremamente relevante, é o <strong>de</strong> não se estabelecerem<br />
logros a para cada <strong>proposta</strong>. Naturalmente que há expectativas <strong>de</strong><br />
aprendizagens, mas o objetivo principal é possibilitar que a criança participe<br />
<strong>de</strong>stas situações, interaja com seus pares, com o professor, com os<br />
materiais, com o objeto <strong>de</strong> estudo e, ao relacio<strong>na</strong>r todas as informações,<br />
produtos <strong>de</strong>stas interações, com aquilo que já sabia, com suas hipóteses,<br />
produza novas conclusões, que hora se ajustará o que é convencio<strong>na</strong>lmente<br />
estabelecido, hora ape<strong>na</strong>s se aproximará.<br />
Cuando <strong>de</strong>cimos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muy pequeños los niños pue<strong>de</strong>n<br />
iniciar el proceso <strong>de</strong> comprensión <strong>de</strong> la lectura y la escritura,<br />
<strong>de</strong>cimos en realidad que ya se están alfabetizando. Por eso, y<br />
porque a<strong>de</strong>más resulta un contenido valioso <strong>de</strong>s<strong>de</strong> el punto<br />
<strong>de</strong> vista cultural, el jardín <strong>de</strong>be asumir un compromiso<br />
alfabetizador. Pero este compromiso no <strong>de</strong>be confundirse con<br />
la producción alfabética. No significa estipular niveles <strong>de</strong> logro<br />
por salas o eda<strong>de</strong>s, ni adquirir la alfabeticidad <strong>de</strong>l sistema al<br />
egreso <strong>de</strong>l jardín. Supone trabajar los contenidos <strong>de</strong> manera<br />
sistemática y con propósitos claros. Enseñar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> las<br />
posibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> los niños para su transformación. (MOLINARI,<br />
2000, p.19) 26<br />
Mas, se é a criança quem constrói, não é possível que ela construa<br />
algo totalmente díspar do que é convencio<strong>na</strong>lmente aceitável? Se não for<br />
objetivo <strong>de</strong>ste segmento chegar a <strong>uma</strong> verda<strong>de</strong> absoluta, não será um<br />
problema a criança concluir, por exemplo, que a sílaba ‘GA’ que escuta é<br />
representada pelo ‘HÁ’ ou ainda que acredite que o que está escrito nos<br />
livros é a expressão da verda<strong>de</strong>, ou fora da área da linguagem, que a cauda<br />
do girino cai e não simplesmente integra o corpo do animal à medida que ele<br />
26<br />
Tradução livre Giulianny Russo: Quando dizemos que <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito peque<strong>na</strong>s as<br />
crianças po<strong>de</strong>m iniciar o processo <strong>de</strong> compreensão da leitura e da escrita, dizemos<br />
<strong>na</strong> realida<strong>de</strong> que já estão se alfabetizando. Por isso, e porque também é um valioso<br />
conteúdo do ponto <strong>de</strong> vista cultural, a educação infantil <strong>de</strong>ve assumir um<br />
compromisso alfabetizador. Mas este compromisso não <strong>de</strong>ve ser confundido com a<br />
produção alfabética. Não significa estipular níveis <strong>de</strong> logros para cada ida<strong>de</strong>, tão<br />
pouco adquirir a alfabeticida<strong>de</strong> do sistema ao fi<strong>na</strong>l do segmento. Supõe, sim,<br />
trabalhar os conteúdos <strong>de</strong> maneira sistemática e com propósitos claros. Para que as<br />
crianças se transformem é necessário ensiná-las a partir <strong>de</strong> suas possibilida<strong>de</strong>s.<br />
74
cresce. Ao ter a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> entrar em contato diversas vezes com os<br />
materiais, observar os diferentes contextos em que a informação aparece, ter<br />
oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> refletir sobre e então fazer generalizações,<br />
progressivamente irá se aproximando do conhecimento que foi por outros<br />
construído.<br />
Contudo, é muito difícil que, <strong>uma</strong> criança, inserida no mundo letrado,<br />
nesta cultura oci<strong>de</strong>ntal, construa a hipótese <strong>de</strong> que a nossa língua é<br />
representada por si<strong>na</strong>is gráficos pictóricos ou lendo um livro verticalmente ou<br />
<strong>de</strong> trás para frente. É difícil porque todas as interações que teve, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu<br />
<strong>na</strong>scimento, informaram outra coisa. Além disso, os erros observados <strong>na</strong> fala<br />
e <strong>na</strong> escrita <strong>de</strong> crianças entre 3 e 6 anos relevam um intenso esforço<br />
cognitivo <strong>de</strong> compreensão da sua língua mater<strong>na</strong>, para citar um exemplo: a<br />
regularização da conjugação dos verbos irregulares, por exemplo, dizer “eu<br />
trazi” para “eu trouxe”. Este erro <strong>de</strong>monstra que a criança já sabe distinguir<br />
“entre radical verbal e <strong>de</strong>sinência verbal e ter <strong>de</strong>scoberto qual é o paradigma<br />
‘normal’ (isto é, regular) da conjugação dos verbos”. (Ferreiro e Teberosky,<br />
1999, p 25).<br />
A <strong>na</strong>tureza do erro também é relevante: a criança que escreve BITK<br />
(para biblioteca – atribuindo <strong>uma</strong> sílaba para letra escrita) comete um erro<br />
<strong>de</strong> <strong>na</strong>tureza conceitual; ela já sabe que a escrita representa aquilo que<br />
falamos e consegue fazer um recorte sonoro, silábico, entre aquilo que fala e<br />
o que escreve. Totalmente diferente é a criança, ao fi<strong>na</strong>l do segmento,<br />
<strong>de</strong>senhar livros para representar a biblioteca.<br />
Por esta razão, é possível concluir que não é o professor que<br />
alfabetiza, mas sim a criança que o faz a partir das relações que vai<br />
estabelecendo ao interatuar com a língua (escrita e falada) e com outros<br />
falantes e escritores. O que, por outro lado, não é minimizar o papel do<br />
professor que é quem planejará intencio<strong>na</strong>lmente variadas e significativas<br />
oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> entrada, contato, reflexão e experiência sobre a língua.<br />
75
Portanto, se concluímos que é <strong>de</strong>ver da escola tor<strong>na</strong>r acessível às<br />
crianças os elementos da cultura e possibilitar que participem <strong>na</strong> vida social,<br />
tanto quanto garantir que sejam atendidas em suas necessida<strong>de</strong>s, que além<br />
das fisiológicas e do cuidado, incluem o brincar e o apren<strong>de</strong>r, as <strong>proposta</strong>s<br />
relacio<strong>na</strong>das às práticas <strong>de</strong> linguagem <strong>de</strong>sempenham um papel fundamental<br />
e estruturante no que se refere à ampliação e potencialização da participação<br />
da criança em práticas sociais da cultura letrada. À medida que participa e<br />
atua, observa, reflete, constrói e se apropria da linguagem como um todo:<br />
tantos dos aspectos notacio<strong>na</strong>is, quanto dos discursivos.<br />
À escola cabe a tarefa <strong>de</strong> romper ‘<strong>de</strong>finitivamente entre a<br />
divisão entre ‘o momento <strong>de</strong> apren<strong>de</strong>r’ e ‘o momento <strong>de</strong> fazer<br />
uso da aprendizagem’’, propondo a ‘articulação dinâmica e<br />
reversível’ entre <strong>de</strong>scobrir a escrita (conhecimento <strong>de</strong> suas<br />
funções e formas <strong>de</strong> manifestação) e apren<strong>de</strong>r a escrita<br />
(compreensão das regras e modos <strong>de</strong> funcio<strong>na</strong>mento) e usar<br />
a escrita (cultivo <strong>de</strong> suas práticas a partir <strong>de</strong> um referencial<br />
culturalmente significativo para o sujeito. (COLELLO, 2004, p<br />
113)<br />
O temor <strong>de</strong> escolarizar a educação infantil é legitimo e oriundo <strong>de</strong> um<br />
momento histórico e alg<strong>uma</strong>s percepções <strong>de</strong>ste segmento como preparatório<br />
para a educação “<strong>de</strong> verda<strong>de</strong>”, o fundamental. Contudo, é <strong>uma</strong> generalização<br />
simplista e levia<strong>na</strong> atribuir esta escolarização à presença <strong>de</strong> conteúdos e ao<br />
trabalho consistente com a linguagem. Reduzir a responsabilida<strong>de</strong> à presença<br />
ou não <strong>de</strong> <strong>de</strong>termi<strong>na</strong>dos conteúdos exime a própria instituição escolar e o<br />
professor do cuidado da gestão do tempo, da organização <strong>de</strong> um currículo<br />
atento às <strong>de</strong>mandas <strong>de</strong> seu público e do planejamento criterioso <strong>de</strong> suas<br />
<strong>proposta</strong>s e intervenções. Em nome da crítica da escolarização, abstém-se <strong>de</strong><br />
oferecer conteúdos, selecio<strong>na</strong>dos por esta cultura.<br />
É responsabilida<strong>de</strong> da escola garantir que as crianças aprendam,<br />
sintam-se <strong>de</strong>safiadas e avancem em relação as suas hipóteses – e por<br />
hipótese, não me refiro ao nível <strong>de</strong> conceitualização sobre a notação, mas<br />
por qualquer i<strong>de</strong>ia prévia que se tem sobre algo e que po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve ser<br />
problematizada e aprimorada. Isso in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> das competências individuais:<br />
76
<strong>uma</strong> criança que se apropriou da alfabeticida<strong>de</strong> do sistema, em um grupo<br />
que esta conquista não é o objetivo, precisa continuar sendo motivada,<br />
<strong>de</strong>safiada e tenha possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> continuar refletindo e avançando em<br />
relação ao seu próprio saber. Ou seja, não é porque <strong>uma</strong> criança ou um<br />
grupo atingiu as expectativas <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>proposta</strong> ou mesmo <strong>de</strong> <strong>uma</strong> série, que<br />
ela não será mais alvo <strong>de</strong> investimento por parte do professor, em outras<br />
palavras, negligenciada à medida que tem suas potencialida<strong>de</strong>s podadas,<br />
porque chegou a um suposto “ponto-fi<strong>na</strong>l”.<br />
É tarefa do professor não fazer só o que interessa a criança, mas<br />
tor<strong>na</strong>r interessante aquilo que ensi<strong>na</strong>.<br />
Vale ressaltar que a gra<strong>de</strong> <strong>curricular</strong> a<strong>na</strong>lisada é <strong>uma</strong> opção possível<br />
entre muitas outras e que não preten<strong>de</strong> servir como mo<strong>de</strong>lo a ser seguido.<br />
Esta gra<strong>de</strong> se ajusta aos propósitos da escola, ao público e ao trabalho <strong>de</strong><br />
formação profissio<strong>na</strong>l que <strong>de</strong>senvolve. É produto <strong>de</strong> muita pesquisa e<br />
reflexão e dificilmente po<strong>de</strong>ria ser puramente transposta a outras realida<strong>de</strong>s.<br />
A intenção em utilizá-la foi a <strong>de</strong> apresentar como crianças <strong>de</strong> 3, 4 e 5 anos<br />
atuam enquanto leitores e escritores, sem <strong>de</strong>ixarem <strong>de</strong> vivenciar outros<br />
momentos importantes para sua formação.<br />
Para fi<strong>na</strong>lizar, fica claro que a questão principal sobre a qual a escola<br />
infantil <strong>de</strong>ve se <strong>de</strong>bruçar não é <strong>de</strong>finir se irá reproduzir as práticas do ensino<br />
fundamental ou limpar assepticamente as salas <strong>de</strong> aula <strong>de</strong> qualquer traço da<br />
linguagem escrita, mas sim <strong>de</strong>finir quais são os conteúdos relevantes para<br />
cada grupo e, partindo dos pressupostos teóricos sobre como se dá a<br />
construção do conhecimento refletir: Como ensi<strong>na</strong>r <strong>de</strong> forma a potencializar a<br />
criança, como sujeito <strong>de</strong> seu próprio percurso <strong>de</strong> aprendizagem?<br />
É certo que as discussões sobre o tema da alfabetização <strong>na</strong> educação<br />
infantil não se esgotam aqui. Há muito o que pesquisas po<strong>de</strong>m contribuir<br />
para favorecer a reflexão e a atuação dos docentes <strong>de</strong>ste segmento. Para<br />
<strong>uma</strong> próxima investigação, por exemplo, seria interessante realizar um<br />
levantamento sobre o impacto <strong>na</strong> aprendizagem das crianças ao serem<br />
77
convidadas <strong>na</strong> escola, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o início, a atuarem enquanto leitores e<br />
escritores que o são.<br />
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