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DESCOMPLICANDO OS IMPOSTOS<br />
REFLEXÕES<br />
[Seleção de artig<strong>os</strong> publicad<strong>os</strong> no Easy Tax, com o apoio do Jornal Económico]
INDICE<br />
4<br />
Prefácio<br />
5<br />
Política<br />
Fiscal<br />
17<br />
Tributação<br />
Empresarial<br />
60<br />
Tributação<br />
Pessoal<br />
80<br />
Tributação<br />
Indireta<br />
95<br />
Tributação<br />
do Imobiliário<br />
107<br />
Tributação<br />
Digital<br />
123<br />
Processo<br />
e Procedimento<br />
3
Prefácio<br />
Prefácio – Livro “Easy Tax”<br />
Luís Marques<br />
Country Tax Leader<br />
Foi no final do mês de março de<br />
2018 que a EY decidiu lançar uma<br />
parceria com o Jornal Económico no<br />
sentido de criar um Micr<strong>os</strong>ite sobre<br />
fiscalidade, denominado por “Easy<br />
Tax”. Volvid<strong>os</strong> quase 2 an<strong>os</strong> após o<br />
lançamento dessa parceria, é justo<br />
afirmar que a mesma tem vindo a ter<br />
uma grande aceitação por parte d<strong>os</strong><br />
leitores, uma vez que são cada vez<br />
mais <strong>os</strong> utilizadores deste Micr<strong>os</strong>ite.<br />
O Micr<strong>os</strong>ite Easy Tax tinha (e<br />
continua ter) como objetivo<br />
primordial o de abordar temáticas<br />
relacionadas com a fiscalidade<br />
de forma simples com recurso a<br />
uma plataforma digital, através da<br />
disponibilização de informação<br />
genérica que se entende de grande<br />
utilidade para <strong>os</strong> utilizadores,<br />
incluindo <strong>os</strong> guias fiscais da EY, e,<br />
acima de tudo, partilhar artig<strong>os</strong> de<br />
opinião escrit<strong>os</strong> por profissionais<br />
da EY, bem como providenciar<br />
simuladores de cálculo de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
e alertar para algumas questões<br />
importantes no domínio da<br />
fiscalidade.<br />
Através da plataforma Easy Tax<br />
nunca pretendem<strong>os</strong> dar opiniões<br />
sobre temas complex<strong>os</strong> e/ou que<br />
requeiram grande nível de análise,<br />
pois esses, tal como referim<strong>os</strong><br />
expressamente aquando do<br />
lançamento da mesma, deverão ser<br />
tratad<strong>os</strong> de forma profissional, por<br />
exemplo com recurso à n<strong>os</strong>sa área<br />
de consultoria e assessoria fiscal. Ao<br />
invés, o n<strong>os</strong>so objetivo foi sempre o<br />
de criar alguma sensibilidade entre<br />
<strong>os</strong> leitores / utilizadores para uma<br />
realidade que tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> cidadã<strong>os</strong><br />
e empresas se têm de confrontar<br />
diariamente, que é a realidade fiscal,<br />
pois tod<strong>os</strong> nós sabem<strong>os</strong> que pagar<br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> constitui um dever de<br />
cidadania e que tod<strong>os</strong> devem pagar<br />
na exata e justa medida prevista<br />
na lei.<br />
Julgam<strong>os</strong> ainda ter cumprido com o<br />
propósito de criar uma plataforma<br />
digital que f<strong>os</strong>se de utilização<br />
intuitiva e simples, ou seja que f<strong>os</strong>se<br />
“user friendly”, e que por isso f<strong>os</strong>se<br />
igualmente apelativa para tod<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> utilizadores. Tem sido esse o<br />
feedback que tem<strong>os</strong> vindo a ter até<br />
ao momento e por isso estam<strong>os</strong><br />
satisfeit<strong>os</strong> e com a convicção de<br />
term<strong>os</strong> atingido mais um d<strong>os</strong><br />
objetiv<strong>os</strong> que estavam subjacentes<br />
ao Easy Tax.<br />
É neste contexto que decidim<strong>os</strong> que<br />
agora seria um momento importante<br />
de apresentar ao mercado uma<br />
compilação completa d<strong>os</strong> artig<strong>os</strong><br />
(mais de 240) que até à data<br />
foram produzid<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> n<strong>os</strong>s<strong>os</strong><br />
profissionais, pois entendem<strong>os</strong><br />
que <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> encerram um<br />
conjunto de reflexões técnicas (mas<br />
simples) sobre várias temáticas<br />
de índole fiscal. Incluím<strong>os</strong> ainda<br />
nesta compilação <strong>os</strong> artig<strong>os</strong> que<br />
publicám<strong>os</strong> no Barómetro Económico<br />
(uma outra parceira de natureza<br />
mais transversal que também tem<strong>os</strong><br />
com o Jornal Económico), onde<br />
regularmente existem conteúd<strong>os</strong><br />
de natureza fiscal preparad<strong>os</strong> pel<strong>os</strong><br />
profissionais da EY. Esperam<strong>os</strong> por<br />
isso que o conteúdo deste livro seja<br />
visto pel<strong>os</strong> n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> leitores como<br />
interessante e útil.<br />
Por último, e tal como referim<strong>os</strong> no<br />
momento de lançamento do Easy<br />
Tax, e seguindo o n<strong>os</strong>so propósito<br />
global enquanto Firma internacional<br />
no sentido de estarm<strong>os</strong><br />
comprometid<strong>os</strong> em construir um<br />
melhor mundo de negóci<strong>os</strong> (que<br />
deriva do n<strong>os</strong>so lema internacional<br />
“building a better working world”),<br />
estam<strong>os</strong> convict<strong>os</strong> que o lançamento<br />
deste livro é mais um passo certo<br />
nesse objetivo.<br />
Muito obrigado a tod<strong>os</strong> e vot<strong>os</strong> de<br />
boas leituras!<br />
4
Política Fiscal
Política Fiscal<br />
Survey EY – Orçamento<br />
do Estado para 2020<br />
Luís Marques<br />
Country Tax Leader<br />
Dando continuidade a um exercício<br />
efetuado em 2018 a propósito<br />
do conteúdo da Prop<strong>os</strong>ta<br />
de Lei do Orçamento do Estado<br />
para 2019, a EY voltou novamente<br />
a lançar o desafio a gestores,<br />
empresári<strong>os</strong> e profissionais que<br />
atuam na área fiscal, no sentido<br />
de perceber quais seriam as<br />
áreas de maior relevo em que<br />
o Governo deveria incidir a sua<br />
ação no âmbito da preparação da<br />
Prop<strong>os</strong>ta de Lei do Orçamento do<br />
Estado para 2020 (PLOE2020) em<br />
matérias de índole fiscal.<br />
Este segundo survey contou com<br />
um total de quase 100 resp<strong>os</strong>tas<br />
e m<strong>os</strong>tra o interesse acrescido<br />
que o mesmo despoletou junto<br />
d<strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong>, revelando<br />
alguns dad<strong>os</strong> interessantes<br />
e que podem constituir uma<br />
matéria de reflexão nesta fase<br />
que antecede a apresentação da<br />
PLOE2020 por parte do Governo,<br />
a qual se perspetiva que venha a<br />
ocorrer no próximo dia 16 de dezembro<br />
de 2019, tendo por base<br />
as últimas informações que têm<br />
vindo a ser veiculadas n<strong>os</strong> órgã<strong>os</strong><br />
de comunicação social.<br />
Uma das áreas que a EY voltou<br />
a considerar no âmbito deste<br />
survey, dada a relevância e a<br />
premência da mesma, foi a de<br />
ter uma perceção de como <strong>os</strong><br />
agentes económic<strong>os</strong> avaliam,<br />
em term<strong>os</strong> gerais, o sistema fiscal<br />
Português. Neste contexto,<br />
uma das áreas que mais realce<br />
mereceu, em term<strong>os</strong> de aspet<strong>os</strong><br />
men<strong>os</strong> p<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong>, por parte d<strong>os</strong><br />
respondentes ao survey da EY foi<br />
relativamente ao peso da carga<br />
fiscal total suportada (quer ao<br />
nível d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> diret<strong>os</strong>, quer<br />
ao nível d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> indiret<strong>os</strong>).<br />
Existe, pois, uma clara convicção<br />
por parte d<strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong><br />
(mais de 90% d<strong>os</strong> inquirid<strong>os</strong>)<br />
que o nível da carga fiscal suportada<br />
é muito elevado. Não é certamente<br />
um resultado surpreendente,<br />
pois de facto, carga fiscal<br />
suportada em Portugal, direta e<br />
indiretamente, e à semelhança<br />
daquilo que o survey efetuado<br />
no ano anterior m<strong>os</strong>trava, situase<br />
num patamar d<strong>os</strong> mais elevad<strong>os</strong><br />
que existem na Europa. Os<br />
últim<strong>os</strong> dad<strong>os</strong> apontam para um<br />
valor que rondará <strong>os</strong> 35% do PIB.<br />
De igual modo, a falta de estabilidade<br />
do sistema fiscal é também<br />
apontada como um aspeto men<strong>os</strong><br />
p<strong>os</strong>itivo para cerca de 88%<br />
d<strong>os</strong> inquirid<strong>os</strong>. De facto, as várias<br />
alterações legislativas (que têm<br />
vindo a ser registadas transversalmente<br />
ao nível d<strong>os</strong> vári<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>)<br />
a que tem<strong>os</strong> vindo constantemente<br />
a assistir contribuem<br />
sem dúvida para este resultado.<br />
Como aspeto p<strong>os</strong>itivo, constata-se<br />
que o leque de incentiv<strong>os</strong><br />
fiscais que atualmente se encontram<br />
contemplad<strong>os</strong> na legislação<br />
fiscal para as atividades<br />
de investigação e desenvolvimento<br />
é adequado ou p<strong>os</strong>itivo.<br />
Esta é uma opinião partilhada<br />
por 70% d<strong>os</strong> respondentes do<br />
survey. É sem dúvida um aspeto<br />
que merece realce e que<br />
decorre das várias medidas que<br />
existem neste domínio e que<br />
o tecido empresarial tem, sem<br />
dúvida, vindo a utilizar de forma<br />
consistente.<br />
Em term<strong>os</strong> de competitividade<br />
fiscal que Portugal m<strong>os</strong>tra face<br />
a outr<strong>os</strong> países, a esmagadora<br />
maioria d<strong>os</strong> inquirid<strong>os</strong> refere que<br />
tal facto terá de necessariamente<br />
envolver alterações legislativas<br />
em sede d<strong>os</strong> principais imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
sobre o rendimento que vigoram<br />
em Portugal (i.e. o IRC e o IRS).<br />
Esta é uma opinião que se verifica<br />
em mais de 90% das resp<strong>os</strong>tas<br />
recebidas que indicam que o<br />
sistema fiscal Português peca por<br />
falta de competitividade quando<br />
comparado com outr<strong>os</strong> países.<br />
Este aspeto deve merecer um<br />
particular cuidado por parte do<br />
Governo, pois pode ser entendido<br />
como uma ameaça, dado que<br />
potenciais investidores internacionais<br />
poderão, como base num<br />
quadro mais negativo, ponderarem<br />
deslocalizar decisões de investimento<br />
no n<strong>os</strong>so País.<br />
Finalmente, e numa perspetiva<br />
mais global, o survey m<strong>os</strong>tra que<br />
para 96% d<strong>os</strong> inquirid<strong>os</strong> a área de<br />
litigância fiscal / contenci<strong>os</strong>o tributário<br />
carece de melhorias, não<br />
só ao nível das p<strong>os</strong>ições normalmente<br />
mais conservadoras adotadas<br />
pela Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira no âmbito das ações<br />
inspetivas e outras tomadas de<br />
p<strong>os</strong>ição, bem como pela mor<strong>os</strong>idade<br />
na obtenção de decisões<br />
definitivas n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de disputas.<br />
Apesar de se registarem melhorias<br />
a este nível (i.e. por via do recurso<br />
a<strong>os</strong> tribunais arbitrais), para <strong>os</strong><br />
contribuintes esta é sem dúvida<br />
uma área de grande preocupação.<br />
Em resumo, com a realização da<br />
segunda edição deste survey,<br />
pensam<strong>os</strong> que foi p<strong>os</strong>sível ter<br />
6
Política Fiscal<br />
uma ideia mais clara e objetiva<br />
sobre a perceção que existe<br />
no sistema fiscal Português por<br />
parte d<strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong>, e<br />
obter ainda algumas pistas sobre<br />
áreas em que o legislador poderá<br />
vir a refletir profundamente de<br />
modo a caminhar no sentido de<br />
o poder otimizar e, se p<strong>os</strong>sível,<br />
contribuir para uma melhoria de<br />
um sistema fiscal que se m<strong>os</strong>tra<br />
cada vez mais complexo.<br />
A PLOE2020 será sem dúvida um<br />
instrumento único que pode ser<br />
aproveitado para esse efeito. Vam<strong>os</strong><br />
então aguardar pelo que aí<br />
vem e depois avaliar o respetivo<br />
impacto ao nível das famílias e<br />
das empresas e confirmar se esta<br />
oportunidade foi devidamente<br />
aproveitada!<br />
Avaliação do Sistema Fiscal<br />
Português – Survey EY<br />
Luís Marques<br />
Country Tax Leader<br />
A propósito da divulgação<br />
da prop<strong>os</strong>ta de Lei do<br />
Orçamento do Estado<br />
para 2019 (PLOE219), a<br />
qual se perspetiva que<br />
venha a ocorrer em<br />
mead<strong>os</strong> do próximo mês<br />
de outubro de 2018, a<br />
EY lançou um desafio<br />
ao mercado em geral no<br />
sentido de perceber que<br />
alterações é que <strong>os</strong> agentes<br />
económic<strong>os</strong> g<strong>os</strong>tariam de<br />
ver contempladas no texto<br />
do referido documento<br />
ao nível d<strong>os</strong> principais<br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> que existem no<br />
sistema jurídico-tributário<br />
Português.<br />
Uma das áreas que foi objeto de<br />
avaliação no Survey realizado pela<br />
EY foi a de ter uma perceção geral<br />
do sistema fiscal Português, ou<br />
seja, como é que <strong>os</strong> contribuintes<br />
avaliam em term<strong>os</strong> globais o sistema<br />
que vigora em Portugal.<br />
Neste contexto, uma das áreas<br />
que mais realce mereceu, em<br />
term<strong>os</strong> de aspet<strong>os</strong> men<strong>os</strong> p<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong>,<br />
por parte d<strong>os</strong> respondentes<br />
ao Survey da EY foi relativamente<br />
à carga fiscal total suportada.<br />
Existe, pois, uma clara convicção<br />
por parte d<strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong><br />
(mais de 90% d<strong>os</strong> inquirid<strong>os</strong>)<br />
que o nível da carga fiscal<br />
suportada é muito elevada. Não<br />
é certamente um resultado surpreendente,<br />
pois de facto, carga<br />
fiscal suportada em Portugal,<br />
direta e indiretamente, situa-se<br />
num patamar d<strong>os</strong> mais elevad<strong>os</strong><br />
que existem na Europa.<br />
De igual modo, o nível de complexidade<br />
existente do sistema<br />
fiscal, bem como a taxa de esforço<br />
exigida a<strong>os</strong> contribuintes<br />
para garantir o cumprimento<br />
das obrigações fiscais, são igualmente<br />
áreas apontadas como<br />
aspet<strong>os</strong> men<strong>os</strong> p<strong>os</strong>itiv<strong>os</strong> (para<br />
mais de 80% d<strong>os</strong> participantes).<br />
Também se dirá que as resp<strong>os</strong>tas<br />
obtidas não serão de estranhar,<br />
pois, apesar de haver uma<br />
cada vez maior desmaterialização<br />
ao nível do cumprimento<br />
das obrigações declarativas por<br />
via da utilização de ferramentas<br />
assentes em plataformas<br />
Web, é igualmente verdade que<br />
a missão pr<strong>os</strong>seguida pela AT<br />
na tentativa de cruzar dad<strong>os</strong> e<br />
informação d<strong>os</strong> contribuintes<br />
implica uma maior necessidade<br />
de reporte de informação por<br />
parte d<strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong>,<br />
aumentando dessa forma o tempo<br />
exigido ao contribuinte para<br />
cumprir com as exigências imp<strong>os</strong>tas<br />
pela lei. Neste capítulo,<br />
também se tem vindo a assistir<br />
a um maior afinamento e ajuste<br />
das regras fiscais, o que torna o<br />
sistema men<strong>os</strong> user friendly e<br />
mais complexo.<br />
Apesar de ser uma área não tão<br />
crítica como as anteriormente<br />
assinaladas, o nível e a qualidade<br />
de interação entre a AT e<br />
<strong>os</strong> contribuintes continua a evidenciar-se<br />
como uma área onde<br />
ainda existe uma grande margem<br />
de melhoria, pois para mais<br />
de 55% d<strong>os</strong> participantes esse é<br />
ainda referido com um aspeto<br />
men<strong>os</strong> p<strong>os</strong>itivo do sistema fiscal<br />
Português.<br />
Para <strong>os</strong> inquirid<strong>os</strong>, a disponibilidade<br />
e a existência de incentiv<strong>os</strong><br />
fiscais nas áreas da investigação<br />
e desenvolvimento apresenta-se<br />
como a área que melhor ava-<br />
7
Política Fiscal<br />
liação obtém no Survey, sendo<br />
este um aspeto importante para<br />
quase 60% d<strong>os</strong> participantes. De<br />
facto, a existência de regimes<br />
especiais como o SIFIDE contribui<br />
certamente para a obtenção<br />
deste resultado.<br />
Em suma, podem<strong>os</strong> verificar<br />
que o Survey n<strong>os</strong> deixa algumas<br />
pistas sobre matérias que<br />
o legislador deverá refletir profundamente<br />
de modo a poder<br />
melhorar a perceção que existe<br />
do sistema fiscal Português,<br />
protegendo (e melhorando e<br />
otimizando, se p<strong>os</strong>sível) aquelas<br />
que <strong>os</strong> contribuintes entendem<br />
como áreas p<strong>os</strong>itivas que<br />
existem, sendo a PLOE2019 um<br />
instrumento que tal desiderato<br />
pode ser atingido.<br />
Para onde vai o dinheiro<br />
d<strong>os</strong> n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>?<br />
Carl<strong>os</strong> Lobo<br />
Partner, Tax Services -<br />
Prof. Faculdade Direito<br />
Universidade Lisboa<br />
A grande questão que<br />
se coloca à generalidade<br />
d<strong>os</strong> contribuintes é o<br />
destino do seu dinheiro.<br />
Mais do que a eventual<br />
“sobrecarga” ao nível<br />
da intensidade fiscal,<br />
a opacidade d<strong>os</strong> flux<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> ao nível<br />
da sua canalização<br />
para a satisfação das<br />
necessidades públicas<br />
consiste na principal<br />
fonte de crítica ao<br />
modelo geral<br />
de financiamento<br />
por via de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>.<br />
Grande parte da responsabilidade<br />
por este estado de coisas<br />
reside no sistema de gestão financeira<br />
do Estado. Princípi<strong>os</strong><br />
orçamentais como o da não consignação<br />
ou o modelo de gestão<br />
de caixa, que simplesmente se<br />
preocupa com a relação acrítica<br />
entre o volume total de receita<br />
e de despesa não promovem a<br />
criação de model<strong>os</strong> de responsabilização<br />
direta entre o que se<br />
cobra e o que se gasta.<br />
Porém, model<strong>os</strong> mais evoluíd<strong>os</strong><br />
como o da contabilidade por<br />
acréscimo, combinad<strong>os</strong> com<br />
uma maior densificação analítica<br />
da contabilidade pública<br />
permitirão alterar <strong>os</strong> model<strong>os</strong><br />
relacionais, incrementando a<br />
p<strong>os</strong>sibilidade de medição da<br />
qualidade da despesa e, consequentemente,<br />
justificabilidade<br />
da receita subjacente. De facto,<br />
não se pode esquecer que, em<br />
finanças públicas, o Estado angaria<br />
a receita necessária para<br />
as suas despesas, num exercício<br />
distinto do que acontece nas finanças<br />
privadas, onde o sujeito<br />
só pode gastar no limite do que<br />
consegue angariar.<br />
O modelo tributário deve, neste<br />
novo enquadramento, evoluir ao<br />
nível da articulação entre o acto<br />
de receita e o acto de despesa.<br />
O segredo para a boa decisão<br />
financeira assenta precisamente<br />
na conjugação da responsabilidade<br />
financeira da decisão num<br />
único agente decisor: só assim<br />
ele poderá efectuar um juízo<br />
correcto sobre a necessidade<br />
da realização daquela despesa<br />
pública, ponderando o custo da<br />
sua angariação. Uma dissonância<br />
nesta responsabilidade levará<br />
a estratégias de maximização<br />
acrítica da despesa e da receita<br />
por estrita obrigação burocrática,<br />
originando situação financeiramente<br />
sub-óptimas, com<br />
sobrecargas de amb<strong>os</strong> em cas<strong>os</strong>.<br />
Esta necessidade tem vindo a<br />
revelar-se. É por essa razão que,<br />
anarquicamente, têm aparecido<br />
cada vez mais tribut<strong>os</strong> basead<strong>os</strong><br />
no princípio da equivalência ou<br />
do benefício (taxas, contribuições<br />
financeiras, contribuições<br />
especiais) que tentam retirar<br />
legitimidade dessa aparente<br />
bilateralidade, mas que quase<br />
nunca levam essa realidade às<br />
devidas consequências em sede<br />
financeira. Os model<strong>os</strong> de justificabilidade<br />
económica-financeira<br />
nunca são suficientemente<br />
densificad<strong>os</strong> e o Estado nunca<br />
admite a necessária subsidiação<br />
por via de aplicação de despesa<br />
pública quando necessidades de<br />
interesse público tal justificam<br />
(solidariedade social ou coesão<br />
territorial).<br />
É necessário que, uma vez por<br />
todas, se clarifique o quadro<br />
estrutural d<strong>os</strong> tribut<strong>os</strong>: <strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
(imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre o rendimento<br />
e o IVA) devem ser angariad<strong>os</strong><br />
na óptica da capacidade<br />
contributiva visando imperativ<strong>os</strong><br />
de igualdade; as contribuições<br />
8
Política Fiscal<br />
devem ser cobradas atento o<br />
princípio da equivalência de grupo<br />
(por exemplo, o IMI e o ISP) e<br />
as taxas de acordo com o princípio<br />
da equivalência individual,<br />
numa lógica eminentemente assente<br />
no princípio da eficiência,<br />
mas onde as preocupações de<br />
igualdade também se encontram<br />
presentes (daí a p<strong>os</strong>sível subsidiação<br />
a<strong>os</strong> destinatári<strong>os</strong> das<br />
contribuições e das taxas).<br />
Este simples quadro relacional<br />
permitirá a reestruturação da<br />
arquitetura financeira do Estado,<br />
clarificando definitivamente<br />
o modelo de articulação entre<br />
receitas e despesas do Estado,<br />
aumentando-se significativamente<br />
a transparência de todo<br />
o sistema.<br />
Nov<strong>os</strong> Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> Europeus:<br />
Quo Vadis?<br />
Carl<strong>os</strong> Lobo<br />
Partner, Tax Services -<br />
Prof. Faculdade Direito<br />
Universidade Lisboa<br />
A construção do novo<br />
quadro financeiro da<br />
União Europeia para<br />
o próximo período<br />
de programação<br />
comunitária levanta<br />
desafi<strong>os</strong> importantes.<br />
Clama-se por uma<br />
política económico<br />
financeira comunitária<br />
mais intensa e profunda,<br />
mas não se definem as<br />
fontes de financiamento<br />
para a mesma.<br />
Exige-se a manutenção da intensidade<br />
das políticas de coesão,<br />
mas não se prevê o modelo de<br />
compensação d<strong>os</strong> financiament<strong>os</strong><br />
cessantes decorrentes da saída do<br />
gigante britânico na sequência do<br />
Brexit.<br />
O labirinto financeiro está instalado.<br />
Querem<strong>os</strong> mais intensidade<br />
e extensão na prestação de utilidades<br />
por parte d<strong>os</strong> organism<strong>os</strong><br />
comunitári<strong>os</strong>, mas o modelo tradicional<br />
de financiamento levará,<br />
inexoravelmente, a uma menor<br />
verba disponível para o efeito.<br />
Portugal está numa p<strong>os</strong>ição relativamente<br />
difícil. Sendo um d<strong>os</strong><br />
países do grupo da coesão, será<br />
daqueles que poderão sofrer mais<br />
com a redução do orçamento comunitário.<br />
A questão é sensível:<br />
políticas monetária e de concorrência,<br />
alinhadas com <strong>os</strong> “golden<br />
standards” inerentes ao mercado<br />
interno e à união económica e<br />
monetária, terão efeit<strong>os</strong> devastadores<br />
na competitividade nacional,<br />
se não forem ponderadas<br />
com transferências de coesão.<br />
Não se pode aplicar um modelo<br />
de igualdade formal a um país<br />
que é materialmente desigual face<br />
a<strong>os</strong> demais.<br />
Assim, o desafio é claro: é essencial<br />
refundar o modelo de financiamento<br />
da União Europeia, ou<br />
seja, reformatar <strong>os</strong> seus fund<strong>os</strong><br />
própri<strong>os</strong>. Esta tarefa é particularmente<br />
sensível: a sensibilidade<br />
d<strong>os</strong> países mais ric<strong>os</strong> para o<br />
primado da coesão já mereceu<br />
melhor atenção, pelo que uma<br />
qualquer solicitação de maiores<br />
transferências para o orçamento<br />
comunitário não merecerá, presumivelmente,<br />
vencimento. Ora,<br />
a solução alternativa (e não haverá<br />
outra) passará por aumentar<br />
a base de financiamento próprio<br />
da União Europeia por via de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
europeus, o que é particularmente<br />
difícil dada a ausência<br />
de legitimidade política para o<br />
seu lançamento. E essa lacuna<br />
manifesta-se de duas formas: em<br />
primeiro lugar, o princípio sacr<strong>os</strong>santo<br />
no taxation without representation<br />
atua nesta situação de<br />
uma forma desmesurada – se não<br />
existe representação política direta,<br />
torna-se imp<strong>os</strong>sível legitimar<br />
uma tributação –; em segundo lugar,<br />
o princípio da subsidiariedade<br />
aloca às instituições comunitárias<br />
políticas de alto nível, que não são<br />
recebidas de forma direta e imediata<br />
pel<strong>os</strong> cidadã<strong>os</strong> europeus, o<br />
que origina uma total ausência<br />
de perceção de um qualquer nexo<br />
de equivalência, ainda que meramente<br />
difuso, entre aquilo que se<br />
paga a título de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> e aquele<br />
de que se beneficia por parte da<br />
ação política comunitária.<br />
É neste enquadramento particularmente<br />
difícil que se inicia a<br />
discussão sobre a introdução de<br />
“nov<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> comunitári<strong>os</strong>”.<br />
O ponto de partida é dado pelo<br />
relatório Monti de dezembro 2016<br />
(disponível em: http://ec.europa.eu/budget/mff/hlgor/library/reportscommunication/<br />
hlgor-report_20170104.pdf), que<br />
contém as prop<strong>os</strong>tas para a reforma<br />
orçamental da União Europeia.<br />
Sem surpresas, refere que não<br />
existe uma “solução ideal, mas<br />
unicamente algumas soluções<br />
9
Política Fiscal<br />
praticáveis”. E as soluções seriam<br />
as seguintes: (i) a reforma do sistema<br />
IVA-recurso próprio; (ii) a<br />
introdução de imp<strong>os</strong>to europeu<br />
sobre as sociedades; (iii) a criação<br />
de um imp<strong>os</strong>to sobre as transações<br />
financeiras (FTT) e (parte<br />
inovadora) sobre as atividades<br />
financeiras; (iv) o lançamento de<br />
contribuições ambientais (sobre<br />
o CO2, sobre a eletricidade, sobre<br />
<strong>os</strong> combustíveis); (v) a instituição<br />
de um imp<strong>os</strong>to alfandegário sobre<br />
produt<strong>os</strong> importad<strong>os</strong> de países<br />
com um volume de emissões elevado;<br />
e, mais recentemente, (vi) a<br />
criação de um imp<strong>os</strong>to sobre plataformas<br />
digitais.<br />
Analisem<strong>os</strong> estas prop<strong>os</strong>tas de<br />
forma muito sintética. Em geral,<br />
deve-se referir que tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> nov<strong>os</strong><br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> são por definição<br />
maus imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>. O custo da sua<br />
instituição é enorme, e a receita<br />
que se alcança reduzida. Neste<br />
quadro, haverá que fazer um<br />
esforço na utilização de tribut<strong>os</strong><br />
já existentes. Vejam<strong>os</strong>, então,<br />
se isso já se verifica. No caso do<br />
IVA-recurso próprio, esta já existe<br />
desde <strong>os</strong> primórdi<strong>os</strong> do sistema<br />
IVA, nada há de inovador a este<br />
respeito. Por sua vez, a introdução<br />
de um imp<strong>os</strong>to europeu sobre as<br />
sociedades constitui um objetivo<br />
audaz, tanto mais que a mera<br />
solução de coordenação (o CCCTB)<br />
se encontra em discussão faz mais<br />
de uma década e ainda não viu a<br />
luz do diz. Mais recente é a iniciativa<br />
FTT, que nasceu n<strong>os</strong> temp<strong>os</strong> da<br />
crise financeira. Duas notas a este<br />
respeito: primeira, se <strong>os</strong> efeit<strong>os</strong> da<br />
crise não a tornaram real, duvidam<strong>os</strong><br />
que seja uma mera pretensão<br />
financeira orçamental o faça;<br />
segunda, o n<strong>os</strong>so País já tem um<br />
imp<strong>os</strong>to sobre a atividade financeira<br />
– o Imp<strong>os</strong>to do Selo. Significará,<br />
isso, que irem<strong>os</strong> prescindir<br />
da n<strong>os</strong>sa atual base de imp<strong>os</strong>to?<br />
Quanto a imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> ambientais,<br />
Portugal é um benchmark global:<br />
já existe o adicional referente ao<br />
CO2 introduzido pela Reforma da<br />
Fiscalidade Verde, e a tributação<br />
automóvel e da eletricidade é a<br />
mais avançada da Europa a este<br />
respeito. Duas questões a este<br />
propósito: (i) como se articula<br />
esta pretensão imp<strong>os</strong>itiva com<br />
o Comércio Europeu de Licenças<br />
de Emissão (CELE)? Terem<strong>os</strong><br />
a cumulação de instrument<strong>os</strong><br />
pigouvian<strong>os</strong> com instrument<strong>os</strong><br />
coasean<strong>os</strong>? Tal não é eficiente em<br />
term<strong>os</strong> económic<strong>os</strong>, originando<br />
dupla tributação económica; (ii)<br />
<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> ambientais são, por<br />
definição, suicidas – existem para<br />
desaparecer – ou seja, para alterar<br />
<strong>os</strong> comportament<strong>os</strong> d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong>. Não n<strong>os</strong> parece que tal<br />
mecanismo seja o mais indicado<br />
para compor um sistema de financiamento<br />
duradouro do orçamento<br />
comunitário (o duplo dividendo<br />
é, e sempre será, uma miragem).<br />
Por sua vez, o imp<strong>os</strong>to alfandegário<br />
sobre produt<strong>os</strong> importad<strong>os</strong><br />
de países fortemente emissores<br />
esbarrará em discussões hercúleas<br />
na Organização Mundial<br />
do Comércio (OMC) e, finalmente,<br />
a criação de um imp<strong>os</strong>to sobre<br />
as plataformas digitais não faz<br />
qualquer sentido, uma vez que o<br />
que está em causa é unicamente<br />
a reformulação das regras de imputação<br />
territorial do direito fiscal<br />
internacional, quer em sede de<br />
tributação do rendimento, quer<br />
do consumo.<br />
A discussão certa seria, a n<strong>os</strong>so<br />
ver, a contribuição para a União<br />
Europeia de parte d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
já existentes a nível nacional. Por<br />
outras palavras, a manutenção e<br />
reforço das transferências nacionais.<br />
Qualquer outra solução não<br />
sairá do plano teórico (na melhor<br />
das hipóteses).<br />
Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> 4.0 ?<br />
Os sistemas fiscais estão em evolução. Essa é uma realidade<br />
inolvidável. Desde sempre, <strong>os</strong> sistemas fiscais tentam<br />
acompanhar a dinâmica da sociedade, tentando capturar<br />
receitas para a prestação de diversas utilidades públicas.<br />
10<br />
Carl<strong>os</strong> Lobo<br />
Partner, Tax Services -<br />
Prof. Faculdade Direito<br />
Universidade Lisboa<br />
Numa primeira época, o modelo<br />
era claro. O imp<strong>os</strong>to era exigido<br />
ao vencido, ao estrangeiro ou<br />
ao escravo. Consistia, portanto,<br />
num pagamento de subjugação.<br />
As nações “fortes” subsistiam<br />
à conta das nações “fracas”. A<br />
base de incidência era simplificada,<br />
incidindo sobre imóveis<br />
ou no momento da transação ou<br />
movimentação (as portagens).<br />
Os víci<strong>os</strong> e o pecado eram, nesta<br />
fase, um bom argumento para<br />
a criação de tribut<strong>os</strong>, tendo em
Política Fiscal<br />
vista a expiação do prevaricador,<br />
apazigando-se, dessa forma,<br />
a pretensa ira d<strong>os</strong> “deuses”.<br />
Num segundo momento, o modelo<br />
da “autorização” do subjugado<br />
– neste caso, todas as<br />
classes, exceto o Rei – mereceu<br />
vencimento. A regra “no taxation<br />
without representation” permitiu<br />
um alargamento do âmbito<br />
de incidência subjetiva, fazendo<br />
com que tod<strong>os</strong> f<strong>os</strong>sem incomodad<strong>os</strong><br />
pelas pretensões imp<strong>os</strong>itivas<br />
do Estado, com o limite<br />
d<strong>os</strong> term<strong>os</strong> da própria autorização.<br />
É o alvor da auto-tributação,<br />
do princípio da legalidade<br />
fiscal e do parlamentarismo<br />
fiscal. O âmbito material tornou-se<br />
mais complexo, atenta a<br />
necessidade de estabelecer um<br />
conjunto germinal de garantias<br />
do contribuinte.<br />
Na fase seguinte, a sofisticação<br />
das administrações tributárias<br />
permitiu que cada um f<strong>os</strong>se<br />
tributado de acordo com a sua<br />
capacidade contributiva. Quem<br />
tem mais contribui de forma<br />
mais intensa do que quem tem<br />
men<strong>os</strong>. Este conceito, assente no<br />
princípio do rendimento acréscimo,<br />
absorve uma forte legitimidade.<br />
A justiça é concretizada<br />
não só no momento da despesa,<br />
mas igualmente no momento da<br />
angariação da receita. A progressividade<br />
da tributação do rendimento<br />
constitui-se como regra,<br />
numa concretização material<br />
do princípio da igualdade. Este<br />
modelo tributário é um pilar na<br />
criação do Estado Social e de Estado<br />
Bem-Estar.<br />
Atualmente, a desmaterialização<br />
crescente conjugada com<br />
uma globalização musculada,<br />
estão a modificar substancialmente<br />
o status quo fiscal. A mobilidade<br />
d<strong>os</strong> fatores impede tributações<br />
agravadas de pessoas<br />
ou de empresas, atenta a sua<br />
potencial “fuga” e a comp<strong>os</strong>ição<br />
do modelo de criação de riqueza<br />
assenta cada vez mais na<br />
imaterialidade, fluida e móvel, o<br />
que dificulta qualquer exercício<br />
de cobrança de imp<strong>os</strong>to assente<br />
num indício ou facto material.<br />
Por essa razão, o sistema fiscal<br />
está, como no princípio, a focarse<br />
nas realidades com menor<br />
mobilidade, ou seja, <strong>os</strong> imóveis<br />
(por definição) e <strong>os</strong> “nov<strong>os</strong>-escrav<strong>os</strong><br />
fiscais”, <strong>os</strong> trabalhadores<br />
dependentes, que pelo<br />
seu vínculo, não conseguem<br />
desagrilhoar-se das suas entidades<br />
laborais que reportam à<br />
Administração Tributária toda<br />
a informação necessária para o<br />
exercício da função tributária.<br />
Por outro lado, o pecado também<br />
voltou a merecer uma nova<br />
atualidade, transbordando as<br />
suas vestes tradicionais: álcool,<br />
tabaco, agora também o açúcar<br />
e afins, para incidir também, em<br />
sujeit<strong>os</strong> ou empresas que, num<br />
discurso político populista, procedem<br />
a alegadas explorações<br />
socialmente abusivas (pretens<strong>os</strong><br />
lucr<strong>os</strong> exorbitantes): sector<br />
elétrico, farmacêutico, grande<br />
distribuição, etc. Esta tributação<br />
assimétrica abala as grandes<br />
conquistas anteriores. O<br />
princípio da legalidade, filho da<br />
segunda época, decai por via do<br />
modelo das normas de votação<br />
democrática que propicia uma<br />
“ditadura” da maioria sobre a<br />
minoria, sendo que <strong>os</strong> “outr<strong>os</strong>”<br />
(minorias de geometria variável)<br />
são sempre subjugad<strong>os</strong> pela<br />
decisão maioritária. Por sua<br />
vez, o princípio da igualdade,<br />
em ambas as vertentes (formal<br />
e material), claudica igualmente<br />
já que sectores “amaldiçoad<strong>os</strong>”<br />
ou realidades tributárias dificilmente<br />
mobilizáveis são inevitavelmente<br />
alvo de uma voracidade<br />
tributária desproporcionada,<br />
facto que é crescentemente potenciado<br />
pela er<strong>os</strong>ão da restante<br />
matéria coletável.<br />
Finalmente, as crescentes barreiras<br />
tarifárias ao comércio<br />
internacional recuperam as<br />
“portagens” ancestrais, através<br />
das quais <strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> mais poder<strong>os</strong><strong>os</strong><br />
arrecadavam recurs<strong>os</strong> à<br />
conta d<strong>os</strong> restantes.<br />
Os risc<strong>os</strong> crescentes deste estado<br />
de coisas são evidentes. A<br />
política fiscal deve estar atenta<br />
às distorções que a nova tendência<br />
propicia, devendo estabelecer-se<br />
limites à tributação<br />
do imobiliário e d<strong>os</strong> trabalhadores<br />
dependentes. Por outro a<br />
“diabolização” de determinad<strong>os</strong><br />
consum<strong>os</strong> ou de setores económic<strong>os</strong><br />
deve ser reponderada,<br />
uma vez que a sua perenização<br />
irá inevitavelmente provocar<br />
perdas absolutas de bem-estar,<br />
destruindo a sua capacidade de<br />
criação de riqueza, e a consequente<br />
receita pública que daí<br />
adviria. Finalmente, o regresso<br />
da artilharia tarifária terá consequências<br />
extremamente grav<strong>os</strong>as<br />
no comércio internacional,<br />
com cust<strong>os</strong> acrescid<strong>os</strong> nas<br />
transações materiais, o que propiciará<br />
um maior fortalecimento<br />
das transações imateriais.<br />
Compete, portanto, a tod<strong>os</strong> que<br />
<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> 4.0 não se traduzam<br />
num regresso à época<br />
1.0. Model<strong>os</strong> como a economia<br />
comportamental ou o princípio<br />
da equivalência e do benefício,<br />
só para citar alguns exempl<strong>os</strong>,<br />
conjugad<strong>os</strong> com a sofisticação<br />
informática crescente das Administrações<br />
Tributárias e com <strong>os</strong><br />
nov<strong>os</strong> model<strong>os</strong> de contabilidade<br />
pública permitirão criar sistemas<br />
fiscais mais eficientes, just<strong>os</strong>, legítim<strong>os</strong><br />
e transparentes. Basta só<br />
que não se ceda à tendência populista<br />
de perseguição fiscal de<br />
fatores, pessoas ou setores.<br />
11
Política Fiscal<br />
A Economia Comportamental<br />
no OE/2019<br />
12<br />
Carl<strong>os</strong> Lobo<br />
Partner, Tax Services -<br />
Prof. Faculdade Direito<br />
Universidade Lisboa<br />
Ainda <strong>os</strong> fundament<strong>os</strong><br />
teóric<strong>os</strong> da Economia<br />
Comportamental não haviam<br />
sequer sido formulad<strong>os</strong><br />
por Richard Thaler e Daniel<br />
Kahneman, já o legislador<br />
fiscal aplicava há sécul<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> seus fundament<strong>os</strong>. A<br />
razão é fácil de explicar:<br />
a cobrança de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
será sempre uma atividade<br />
agressiva dado que implica<br />
a apropriação pública de<br />
parte do património privado;<br />
ora, a melhor forma de<br />
tal ser realizado é através<br />
de metodologias que<br />
pressuponham a aplicação<br />
de uma “anestesia” ao<br />
contribuinte.<br />
Esta técnica não é condenável,<br />
muito pelo contrário. A “arte”<br />
de cobrar imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> passa precisamente<br />
por realizar a função<br />
de arrecadação sem que o<br />
contribuinte sinta que está a<br />
ser tributado, não distorcendo<br />
a sua racionalidade económica<br />
individual. Porém, n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong><br />
an<strong>os</strong>, as técnicas psicológicas<br />
têm vindo a ser desenvolvidas<br />
numa vertente de promoção de<br />
alteração de comportament<strong>os</strong>.<br />
Em primeiro lugar através d<strong>os</strong><br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> denominad<strong>os</strong> como<br />
“pigouvian<strong>os</strong>”, ou seja, assentes<br />
no princípio da equivalência ou<br />
do benefício e que visam a eliminação<br />
de comportament<strong>os</strong><br />
economicamente nociv<strong>os</strong> (como<br />
é o caso d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> ambientais).<br />
Em segundo lugar através<br />
da tributação de determinad<strong>os</strong><br />
comportament<strong>os</strong> socialmente<br />
reprováveis, que desde temp<strong>os</strong><br />
imemoriais se demonstram<br />
como um bom motivo para legitimar<br />
tributação acrescida (por<br />
exemplo, o pagamento da bula).<br />
Ora, a Prop<strong>os</strong>ta de Lei do Orçamento<br />
do Estado para 2019 é<br />
pródiga nesta arte, quase como<br />
inspirada pel<strong>os</strong> recentes lauread<strong>os</strong><br />
pelo prémio Nobel. Podem<strong>os</strong><br />
identificar três camp<strong>os</strong> essenciais<br />
de atuação. Em primeiro<br />
lugar, no campo d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
assentes na capacidade contributiva,<br />
desenvolve diversas<br />
prop<strong>os</strong>tas que se inserem claramente<br />
nesta tendência. No IRS,<br />
por exemplo, subtrai do âmbito<br />
do cálculo das taxas de retenção<br />
na fonte o trabalho suplementar.<br />
Esta opção visa precisamente<br />
acabar com a ideia de que quem<br />
mais trabalhasse “subisse de<br />
escalão”. Obviamente que a técnica<br />
utilizada é paliativa, uma<br />
vez que, a final, no momento da<br />
liquidação, esses montantes vão<br />
ser incorporad<strong>os</strong> para a determinação<br />
do valor final a pagar,<br />
porém, com esta opção, evita-se<br />
a sensação direta de subtração<br />
imediata de liquidez por via do<br />
adicional suplementarmente auferido.<br />
Numa vertente p<strong>os</strong>itiva,<br />
igualmente, o incentivo em IRS<br />
para o interior, ou, num modelo<br />
mais intenso, a redução em 50%<br />
da matéria coletável d<strong>os</strong> “ex-emigrad<strong>os</strong>”.<br />
Finalmente, uma bandeira<br />
da distorção fiscal excessiva<br />
é eliminada: o fim do PEC para<br />
as empresas com situação fiscal<br />
regularizada. Em segundo lugar,<br />
salientam<strong>os</strong> as medidas de<br />
agravamento em IMI d<strong>os</strong> imóveis<br />
devolut<strong>os</strong>, interiorizando <strong>os</strong> cust<strong>os</strong><br />
reflex<strong>os</strong> que estes causam<br />
na vizinhança, a alteração da<br />
componente de emissões de CO2<br />
na tributação automóvel e d<strong>os</strong><br />
combustíveis, ou a “nova” contribuição<br />
para a proteção civil,<br />
todas com fundament<strong>os</strong> pigouvian<strong>os</strong>,<br />
ou seja, de interiorização<br />
de cust<strong>os</strong> extern<strong>os</strong>. Em terceiro<br />
lugar, a tributação do “pecado”.<br />
Neste campo, podem<strong>os</strong> identificar<br />
o agravamento da tributação<br />
autónoma em IRC relativamente<br />
às viaturas detidas pelas empresas.<br />
Neste caso, pune-se a<br />
“riqueza” evidenciada, em total<br />
contraste com o princípio da tributação<br />
do lucro real, mas que<br />
se tem legitimado sucessivamente<br />
no n<strong>os</strong>so ordenamento<br />
fiscal como se de um pagamento<br />
de “bula” se tratasse. O mesmo<br />
se pode dizer do agravamento<br />
em Imp<strong>os</strong>to do Selo sobre o cré-
Política Fiscal<br />
dito ao consumo. Neste campo,<br />
no entanto, convém penitenciar,<br />
mas não liquidar, o pecador. Ora,<br />
n<strong>os</strong> Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> Especiais sobre<br />
o Consumo, o Governo revelou<br />
uma cautela extrema. No caso<br />
do tabaco, continuou a sua trajetória<br />
natural de ajustamento.<br />
Porém, aqui devem<strong>os</strong> salientar o<br />
stand-still que, pela primeira vez<br />
desde a introdução deste imp<strong>os</strong>to,<br />
ocorreu em sede de IABA. De<br />
facto, a tributação das bebidas<br />
alcoólicas encontrava-se já para<br />
lá do ponto ótimo de tributação.<br />
Tal significava que aument<strong>os</strong> de<br />
tributação iriam erodir a capacidade<br />
de geração de receita do<br />
imp<strong>os</strong>to. Neste quadro, e pela<br />
primeira vez, poderem<strong>os</strong> testar<br />
se o congelamento de imp<strong>os</strong>to<br />
poderá potenciar um aumento<br />
efetivo de receita. Também na<br />
Prop<strong>os</strong>ta de Lei do Orçamento<br />
do Estado para 2019 existe campo<br />
para a investigação em economia<br />
comportamental.<br />
O Novo Contrato<br />
Social Fiscal<br />
Carl<strong>os</strong> Lobo<br />
Partner, Tax Services -<br />
Prof. Faculdade Direito<br />
Universidade Lisboa<br />
A digitalização, a<br />
globalização e <strong>os</strong> nov<strong>os</strong><br />
sistemas de disseminação<br />
de informação em rede<br />
alteraram significativamente<br />
<strong>os</strong> fundament<strong>os</strong> tradicionais<br />
do contrato social.<br />
A vida em sociedade pressupõe<br />
um equilíbrio permanente entre<br />
as prestações estatais, traduzidas<br />
financeiramente na despesa<br />
pública geradora de utilidade<br />
social e as contribuições privadas,<br />
traduzidas financeiramente<br />
na receita fiscal, causadora de<br />
desutilidade privada. O elemento<br />
chave para o equilíbrio virtu<strong>os</strong>o<br />
desta equação é a concretização<br />
de um resultado p<strong>os</strong>itivo em<br />
sede de utilidade social global,<br />
ou seja, que as prestações públicas<br />
agregadas mais do que compensem<br />
<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> decorrentes<br />
da sua cobrança. Este modelo<br />
civilizacional remonta à Magna<br />
Carta, de 1215, e foi traduzido,<br />
em mead<strong>os</strong> do século XVIII, no<br />
brocardo “no taxation without<br />
representation”, segundo o qual<br />
este jogo de equilíbri<strong>os</strong> necessita<br />
de ser legitimado e sufragado<br />
pel<strong>os</strong> alv<strong>os</strong> da pretensão imp<strong>os</strong>itiva<br />
pública, autorizando o<br />
exercício da mesma na ablação<br />
da esfera patrimonial privada.<br />
Os imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> são, portanto, o<br />
“preço da civilização”. E esse “preço”<br />
é determinado anualmente,<br />
por via parlamentar, através da<br />
votação d<strong>os</strong> representantes d<strong>os</strong><br />
destinatári<strong>os</strong> do encargo, que<br />
aprovam nov<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, e autorizam<br />
o lançamento d<strong>os</strong> existentes<br />
por via da aprovação do Orçamento<br />
do Estado. Este modelo<br />
contratualista de intermediação<br />
(Hobbes, Locke e Rousseau) está<br />
a ser colocado em causa. Efetivamente,<br />
<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> model<strong>os</strong> económico-sociais<br />
assentam precisamente<br />
na tendência inelutável<br />
para a desintermediação. Se essa<br />
realidade é claramente visível<br />
no setor privado, também se faz<br />
sentir na esfera pública. O movimento<br />
de descentralização é uma<br />
clara manifestação virtu<strong>os</strong>a desta<br />
tendência, visando a aproximar a<br />
decisão pública a<strong>os</strong> destinatári<strong>os</strong><br />
da mesma.<br />
Porém, existem outr<strong>os</strong> exempl<strong>os</strong><br />
não virtu<strong>os</strong><strong>os</strong>. Relembram<strong>os</strong> que<br />
o imp<strong>os</strong>to, como a própria denominação<br />
indica, traduz-se numa<br />
imp<strong>os</strong>ição ablativa de um ativo<br />
privado. Os mecanism<strong>os</strong> básic<strong>os</strong><br />
de auto-defesa estarão sempre<br />
presentes. Assim, qualquer intenção<br />
populista assente num<br />
“ataque a<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>” terá sempre<br />
um público ávido. A justificação<br />
para a pretensa ilegitimidade<br />
do imp<strong>os</strong>to passará sempre pelo<br />
argumento da não perceção da<br />
utilidade da despesa pública realizada,<br />
usando o argumento opaco<br />
da “corrupção”, sempre enunciado<br />
mas nunca concretizado (o caso<br />
d<strong>os</strong> “coletes amarel<strong>os</strong>”), ou da<br />
aplicação do produto d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong><br />
em benefício de um qualquer<br />
outro grupo não merecedor<br />
(moviment<strong>os</strong> secessionistas). Esta<br />
justificação assenta sempre no binómio<br />
enviesado nós versus eles,<br />
em que o grupo de reivindicação<br />
é constituído de forma aparentemente<br />
inorgânica, por via de redes<br />
sociais, aparentemente espontâneas,<br />
mas que são funcionalizadas<br />
no sentido da criação de um<br />
grupo injustiçado, que por alguma<br />
razão, é alegadamente mal tratado<br />
pelo grupo dominante.<br />
Este estado de coisas é um desafio<br />
a<strong>os</strong> model<strong>os</strong> tradicionais<br />
de organização do Estado. Um<br />
13
Política Fiscal<br />
14<br />
d<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> que é colocado<br />
em causa de forma imediata é o<br />
princípio da igualdade. No limite,<br />
e se levarm<strong>os</strong> as revindicações<br />
grupais ao ponto extremo, o grupo<br />
pretensamente contribuidor<br />
nunca acederá em contribuir<br />
para o grupo subsidiado. Ora, se<br />
a função pública de garantia da<br />
igualdade for colocada em causa,<br />
então já pouco restará para<br />
o Estado, já que <strong>os</strong> pilares da<br />
justiça e da segurança ruirão catastroficamente.<br />
Infelizmente, esta criação não<br />
virtu<strong>os</strong>a de grup<strong>os</strong> é igualmente<br />
promovida pela recente política<br />
fiscal. O sistema tributário português<br />
encontra-se em mutação.<br />
Tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> an<strong>os</strong> aparecem nov<strong>os</strong><br />
tribut<strong>os</strong>, com diferentes configurações,<br />
abrangendo realidades<br />
múltiplas, na maior parte das vezes<br />
sem qualquer conexão com<br />
<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> “normais”. Este modelo<br />
tributário decorre:<br />
a) Das próprias limitações genéticas<br />
do sistema fiscal tradicional<br />
face à nova realidade global:<br />
- que se encontra esgotado em<br />
term<strong>os</strong> de p<strong>os</strong>sibilidade de progressão<br />
das taxas de tributação<br />
(por isso aparecem tribut<strong>os</strong> com<br />
denominações diferenciadas<br />
mas que constituem efetivamente<br />
agravament<strong>os</strong> de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
tradicionais – v.g. derrama estadual<br />
no caso do IRC; sobretaxa<br />
do IRS; AIMI em sede de tributação<br />
imobiliária);<br />
- que tenta criar flux<strong>os</strong> de receita<br />
estáveis criando tip<strong>os</strong> tributári<strong>os</strong><br />
anómal<strong>os</strong>, sucessivamente agravad<strong>os</strong><br />
(v.g. tributação autónoma;<br />
limites à dedutibilidade d<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong><br />
de financiamento; limites<br />
ao reporte de prejuíz<strong>os</strong>, etc.);<br />
- que tenta contornar as limitações<br />
d<strong>os</strong> model<strong>os</strong> de conexão<br />
do direito fiscal internacional,<br />
tentando manter o poder de tributar<br />
no país de destino em atividades<br />
incorpóreas (v.g. imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
sobre as plataformas digitais;<br />
“taxas turísticas”);<br />
- pela sucessivamente crescente<br />
função reguladora do Estado,<br />
que deixando de atuar ao nível<br />
do fornecimento direto das utilidades,<br />
impõe obrigações de<br />
“serviço público” adicionais sem<br />
a necessária fundamentação<br />
económico-financeira (v.g., o caso<br />
da tarifa social da energia, ou de<br />
todas as limitações à progressão<br />
tarifária no sector d<strong>os</strong> transportes<br />
e afins), ou pela criação de<br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> regulatóri<strong>os</strong> putativamente<br />
perequativ<strong>os</strong>, mas que<br />
disfarçam pretensões eminentemente<br />
tributárias (a perequação<br />
tarifária não fundamentada);<br />
b) De estratégias comportamentais<br />
legitimadoras de pretensões<br />
tributárias maximizadas<br />
- pela utilização da vertente “sinalagmática”<br />
para a legitimação<br />
de tributações agressivas utilizando<br />
abusivamente o modelo<br />
de contribuição ou taxa (v.g. vári<strong>os</strong><br />
tribut<strong>os</strong> ambientais, a “taxa<br />
da proteção civil”, etc.);<br />
- pelo abuso da qualificação “extraordinária”<br />
para a justificação<br />
de imp<strong>os</strong>ição de sobrecargas<br />
sup<strong>os</strong>tamente temporárias, mas<br />
que tendem fatalmente para a<br />
permanência, cristalizando-se<br />
ao longo do tempo (v.g. todas as<br />
denominadas “Contribuições Extraordinárias”),<br />
tendendo o Tribunal<br />
Constitucional a “desmantelar”<br />
<strong>os</strong> cortes extraordinári<strong>os</strong> de<br />
despesa (por exemplo, <strong>os</strong> cortes<br />
a<strong>os</strong> venciment<strong>os</strong> d<strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong><br />
públic<strong>os</strong>) e a aceitar a manutenção<br />
d<strong>os</strong> tribut<strong>os</strong> (v..g. CESE);<br />
- pela incapacidade do Ministério<br />
das Finanças na gestão<br />
imp<strong>os</strong>itiva de uma política fiscal<br />
racional. Os ministéri<strong>os</strong> setoriais<br />
tomaram a imp<strong>os</strong>ição fiscal p<strong>os</strong>itiva<br />
como elemento essencial da<br />
política setorial, deixando pouco<br />
espaço para o estabelecimento<br />
de limitações a iniciativas mais<br />
criativas (o que não acontecia no<br />
caso do modelo anterior, onde<br />
<strong>os</strong> ministéri<strong>os</strong> setoriais propunham<br />
benefíci<strong>os</strong> fiscais que<br />
eram controlad<strong>os</strong> pelo efeito em<br />
sede de despesa fiscal pelo Ministério<br />
das Finanças)<br />
- pela descentralização crescente<br />
de competências para entidades<br />
menores, que não sendo<br />
acompanhadas de “envelopes financeir<strong>os</strong>”<br />
suficientes, legitima a<br />
sucessiva criação de novas taxas<br />
municipais.<br />
c) De orientações políticas limitadoras<br />
de reações de “resistência<br />
fiscal” por via da criação de grup<strong>os</strong>-alvo<br />
de tributação acrescida:<br />
- pela utilização de anátemas<br />
tradicionais de tributação do<br />
pecado (por exemplo tabaco, bebidas<br />
alcoólicas, e mais recentemente<br />
a tributação das bebidas<br />
açucaradas), que, se abusada,<br />
destrói o próprio princípio de arrecadação<br />
de receita fiscal;<br />
- pela criação de ambientes agressiv<strong>os</strong><br />
contra setores em concreto,<br />
aproveitando estereótip<strong>os</strong> socialmente<br />
instalad<strong>os</strong> para a justificação<br />
de uma sobrecarga tributária.<br />
Esta “sectorização” tributária baseada<br />
em argument<strong>os</strong> tais como<br />
<strong>os</strong> “lucr<strong>os</strong> excessiv<strong>os</strong>” (v.g. CESE,<br />
Contribuição Extraordinária sobre<br />
a Indústria Farmacêutica,<br />
Taxa de Segurança Alimentar+),<br />
ou “especulação imobiliária” (v.g.<br />
AIMI), ou a diabolização de produções,<br />
como o eucalipto (a nova<br />
taxa sobre recurs<strong>os</strong> florestais do<br />
OE/2019) criando uma luta interna<br />
n<strong>os</strong> setores (por exemplo, na<br />
CESE, elétricas vs. petrolíferas vs.<br />
renováveis; Contribuição Farmacêutica<br />
(h<strong>os</strong>pitalar vs. ambulatório,<br />
medicament<strong>os</strong> patentead<strong>os</strong><br />
vs. genéric<strong>os</strong>);<br />
- pela privatização excessiva<br />
de uma função pública, pri-
Política Fiscal<br />
vatizando-se uma função que<br />
tipicamente se insere na atividade<br />
pública. Um desses cas<strong>os</strong>,<br />
ainda em tendência crescente,<br />
é a Compensação Equitativa<br />
pela Cópia Privada, pela qual o<br />
Estado atribui poder a associações<br />
agregadoras de interesses<br />
na área da cultura, concedendo<br />
“poder tributário” a instituições<br />
privadas que o usam para a celebração<br />
de “acord<strong>os</strong>” tutelad<strong>os</strong><br />
pelo poder do Estado.<br />
Este último grupo de orientações<br />
políticas é particularmente nocivo,<br />
uma vez que assenta predominantemente<br />
num modelo de<br />
“ditadura da maioria sobre a minoria”.<br />
Apesar dessas “maiorias”<br />
e “minorias” revestirem uma natureza<br />
móvel e fluída, a verdade<br />
é que esta tributação “clusterizada”<br />
sectária viola <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong><br />
mais basilares do modelo<br />
democrático representativo, uma<br />
vez que não permite uma tutela<br />
efetiva da p<strong>os</strong>ição tributária do<br />
grupo-alvo, inevitavelmente em<br />
minoria no seio de uma democracia<br />
parlamentar. O princípio<br />
da legalidade fiscal, por conseguinte,<br />
não é suficiente para a<br />
tutela d<strong>os</strong> seus direit<strong>os</strong> constitucionais.<br />
Neste quadro complexo,<br />
as análises de conformidade<br />
constitucional terão de ultrapassar<br />
a simples análise formal de<br />
legalidade, observando outras<br />
condicionantes de ordem material<br />
(proporcionalidade, tempestividade,<br />
generalidade, liberdade<br />
económica, eficiência, entre outr<strong>os</strong>)<br />
de forma a que <strong>os</strong> grup<strong>os</strong><br />
-alvo p<strong>os</strong>sam ver a sua p<strong>os</strong>ição<br />
jurídica salvaguardada de uma<br />
forma minimamente satisfatória.<br />
Este é um imperativo, e igualmente,<br />
uma consequência deste<br />
novo contrato social fiscal. Esta<br />
tendência para a criação de antagonism<strong>os</strong><br />
grupais deve ser<br />
anulada através de uma política<br />
de transparência, justiça e igualdade.<br />
A legalidade, em si mesmo,<br />
já não é suficiente, por si só, para<br />
o efeito. Tal como a exigência<br />
na gestão pública aumentou exponencialmente<br />
por via de uma<br />
maior exigência por parte d<strong>os</strong><br />
destinatári<strong>os</strong> da mesma, também<br />
<strong>os</strong> imperativ<strong>os</strong> étic<strong>os</strong>, de justiça,<br />
proporcionalidade e igualdade<br />
na definição da política fiscal devem<br />
ser respeitad<strong>os</strong> e ampliad<strong>os</strong>.<br />
Nesta perspetiva, e n<strong>os</strong> term<strong>os</strong><br />
do novo contrato social fiscal, o<br />
contribuinte deve ser, assim, um<br />
bom contribuinte, pagando <strong>os</strong><br />
seus imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> e o Estado deve fazer<br />
bons imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, transparentes,<br />
eficientes, just<strong>os</strong> e proporcionais,<br />
sem a criação de anátemas ou<br />
injustiças relativas, promovendo<br />
a paz social e o desenvolvimento<br />
sócio-económico.<br />
Carl<strong>os</strong> Lobo<br />
Partner, Tax Services -<br />
Prof. Faculdade Direito<br />
Universidade Lisboa<br />
O Futuro da Tributação:<br />
Princípio do Destino (Serão<br />
Indiret<strong>os</strong> tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
sobre o Rendimento<br />
Empresarial num futuro<br />
próximo?)<br />
O direito fiscal<br />
internacional assenta<br />
historicamente a<br />
fundamentação para as<br />
suas regras no princípio<br />
da origem. Nesse<br />
quadro geral, todo o<br />
edifício da tributação<br />
do rendimento pessoal<br />
individual e das pessoas<br />
coletivas foi assente<br />
na lógica da residência.<br />
A sua lógica era imbatível: <strong>os</strong><br />
agentes económic<strong>os</strong> usufruem<br />
de utilidades públicas prestadas<br />
nas suas localizações originárias,<br />
sendo estas as detentoras<br />
de toda a informação que permitiria<br />
uma tributação de acordo<br />
com o princípio do acréscimo,<br />
concretizando a tributação do<br />
rendimento real (no caso das<br />
pessoas singulares) e do lucro<br />
real (no caso das pessoas coletivas).<br />
Esta lógica era reforçada pela<br />
envolvente estrutural. No caso<br />
da tributação singular, as ponderações<br />
pessoais deveriam<br />
ser efetuadas de acordo com<br />
as condições do seu agregado<br />
familiar, que se situaria inevitavelmente<br />
numa localização<br />
de residência. Por sua vez, no<br />
15
Política Fiscal<br />
16<br />
caso da tributação das pessoas<br />
coletivas, a atribuição do direito<br />
de tributar à localização da sede<br />
(ou da direção efetiva) decorria<br />
igualmente de uma “compensação”<br />
pelo prejuízo que esse<br />
Estado havia suportado, permitindo<br />
a realização de investiment<strong>os</strong><br />
das “suas” empresas<br />
em outras jurisdições o que,<br />
alegadamente, afetaria o crescimento<br />
económico no seu território<br />
(princípio da neutralidade<br />
na exportação de capitais, que<br />
prejudica atribuição do direito<br />
de tributar ao Estado da Fonte<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong>).<br />
Todo este edifício formal, que<br />
assenta numa lógica estrita de<br />
soberania fiscal enclausurada,<br />
tem sido colocado em causa<br />
pelo movimento de globalização,<br />
recentemente acelerado<br />
pela digitalização da economia.<br />
As pessoas circulam livremente<br />
num mundo cada vez mais global,<br />
e as empresas (pessoas jurídicas<br />
eminentemente formais)<br />
estabelecem-se de forma ainda<br />
mais facilitada nas jurisdições<br />
que lhes são mais convenientes.<br />
Quanto a isto, a iniciativa BEPS,<br />
ao esticar de forma quase insuportável<br />
<strong>os</strong> vetust<strong>os</strong> conceit<strong>os</strong><br />
tradicionais, não se traduz senão<br />
num mero paliativo temporário<br />
que culminará inevitavelmente<br />
numa recomp<strong>os</strong>ição d<strong>os</strong> model<strong>os</strong><br />
gerais de tributação internacional.<br />
E, neste contexto, o princípio do<br />
destino parece adquirir vantagem.<br />
Efetivamente, <strong>os</strong> argument<strong>os</strong><br />
que fundamentavam a hegemonia<br />
do princípio da origem<br />
deixaram de existir. A informação<br />
sobre a situação concreta<br />
d<strong>os</strong> contribuintes pode ser angariada<br />
e transmitida em rede<br />
para todas as Administrações<br />
Fiscais (o que já ocorre hoje de<br />
forma crescente) permitindo<br />
que qualquer jurisdição p<strong>os</strong>sa<br />
efetuar as ponderações personalizantes<br />
necessárias. Por sua<br />
vez, a luta contra o planeamento<br />
fiscal agressivo só terá sucesso<br />
quando as regras de definição<br />
do direito de tributar forem alteradas,<br />
privilegiando a atribuição<br />
desse direito à localização<br />
de variáveis mais imóveis para a<br />
formação do rendimento. Na lógica<br />
do princípio do destino, as<br />
decisões empresariais relativas<br />
às estratégias de investimento,<br />
de tipo de rendimento ou<br />
de estruturas de financiamento<br />
passariam a ser fiscalmente<br />
neutras.<br />
A prop<strong>os</strong>ta da Comissão Europeia<br />
relativa ao CC(C)TB, que assenta<br />
n<strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> de volume de<br />
ativ<strong>os</strong>, trabalhadores e vendas<br />
é um primeiro indicador dessa<br />
nova tendência. A crescente aplicação<br />
do princípio da tributação<br />
territorial em jurisdições como<br />
Hong Kong (ou mesmo Portugal,<br />
no caso do regime d<strong>os</strong> residentes<br />
não habituais) é uma outra<br />
manifestação. No mesmo sentido,<br />
<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre as<br />
plataformas digitais assentam<br />
igualmente no princípio do destino,<br />
contornando de forma “bárbara”<br />
<strong>os</strong> model<strong>os</strong> tradicionais de<br />
tributação do rendimento, originando<br />
duplas tributações económicas<br />
ineficientes.<br />
Ora, no limite, poderá dizer-se<br />
que, num mundo digital, onde<br />
a base de ativ<strong>os</strong> é tendencialmente<br />
imaterial e a força laboral<br />
assente em model<strong>os</strong> de colaboração<br />
relativamente informal,<br />
em parceria, ou em sociedade,<br />
a única variável que resta para<br />
a determinação do direito a tributar<br />
será o ato de venda (na<br />
lógica da oferta) ou o ato do<br />
consumo (na ótica da procura).<br />
E tal é intrinsecamente verdadeiro:<br />
todo o lucro, mesmo na<br />
perspetiva conceptual tradicional,<br />
tem subjacente um ato, que<br />
se consubstancia na transação<br />
em mercado. Ora, uma vez que<br />
o movimento de digitalização assenta<br />
essencialmente na “devolução<br />
do poder de mercado” ao<br />
consumidor, será na localização<br />
do cliente que o direito de tributar<br />
definitivamente se localizará.<br />
Ora, neste quadro, a convergência<br />
entre esta nova tributação do<br />
rendimento e o IVA é evidente e<br />
incontornável, tendo sido já elaboradas<br />
prop<strong>os</strong>tas de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
sobre o rendimento das sociedades<br />
traduzidas na tributação<br />
do cash-flow na jurisdição de<br />
destino.<br />
Este modelo (ou um outro qualquer<br />
de base similar) terá a virtude<br />
de contribuir p<strong>os</strong>itivamente<br />
não só para a eficiência económica<br />
como para a redistribuição<br />
global, uma vez que permitirá<br />
que as nações mais popul<strong>os</strong>as e,<br />
consequentemente, com maior<br />
necessidade de infraestruturação<br />
reforcem a sua base de tributação.
Tributação Empresarial<br />
Tributação<br />
Empresarial
Tributação Empresarial<br />
O atual paradigma<br />
do IRC – Imp<strong>os</strong>to<br />
progressivo vs. taxa única<br />
18<br />
Luís Marques<br />
Country Tax Leader<br />
Foi em 1988, num período<br />
de governação liderado<br />
pelo Prof. Aníbal Cavaco<br />
Silva, que foi publicado o<br />
Decreto-Lei nº 442-B/88,<br />
de 30 de novembro que<br />
visou implementar no<br />
ordenamento jurídicotributário<br />
Português<br />
o Código do Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento das<br />
Pessoas Coletivas (“IRC”),<br />
o qual entrou em vigor no<br />
dia 1 de janeiro de 1989.<br />
Estávam<strong>os</strong> num período caracterizado<br />
por uma profunda<br />
reforma tributária em Portugal,<br />
dado estarm<strong>os</strong> a passar de um<br />
sistema fiscal assente numa lógica<br />
cedular / parcelar para evoluirm<strong>os</strong><br />
para um sistema de imp<strong>os</strong>to<br />
único, nomeadamente no<br />
que concerne a imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre<br />
o rendimento, não apenas em<br />
sede das empresas e restantes<br />
pessoas coletivas, mas também<br />
ao nível do Imp<strong>os</strong>to sobre o Rendimento<br />
das Pessoas Singulares<br />
(“IRS”).<br />
De facto, um d<strong>os</strong> objetiv<strong>os</strong> que<br />
presidiu, à data, à aprovação do<br />
Código do IRC residia na adoção<br />
de uma taxa geral do IRC com<br />
base num critério de moderação,<br />
em que se teve particularmente<br />
em conta o elevado grau de<br />
abertura da economia portuguesa<br />
ao exterior e, por isso, a ne-<br />
cessidade de a situar a um nível<br />
que se enquadrasse n<strong>os</strong> níveis<br />
vigentes em países com graus<br />
de desenvolvimento semelhante<br />
ao n<strong>os</strong>so ou com <strong>os</strong> quais mantem<strong>os</strong><br />
estreitas relações económicas.<br />
Referia-se também que não obstante<br />
o Estado, nas circunstâncias<br />
à data, não poder prescindir<br />
de receitas fiscais, o objetivo do<br />
desagravamento da tributação<br />
d<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> das empresas não<br />
foi tão longe quanto seria desejável,<br />
mas isso não impediu<br />
que, mesmo tendo em conta a<br />
p<strong>os</strong>sibilidade de serem lançadas<br />
derramas sobre a coleta do<br />
IRC, se tenha atingido uma uniformização<br />
dessa tributação. Ou<br />
seja, havia um objetivo de, por<br />
um lado, manter uma taxa geral<br />
de IRC (ainda com a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de lançamento de derramas<br />
numa lógica de financiamento<br />
municipal) e, por outro lado, garantir<br />
que a mesma se afigurava<br />
competitiva face a<strong>os</strong> países que<br />
tradicionalmente competiam<br />
com Portugal.<br />
No entanto, a crise financeira a<br />
que Portugal esteve sujeito, o<br />
que levou à adoção de um plano<br />
de assistência financeira liderado<br />
por 3 entidades (i.e. FMI, BCE<br />
e Comissão Europeia), comummente<br />
designado por Troika,<br />
entre <strong>os</strong> an<strong>os</strong> de 2011 e 2014, fez<br />
com que este paradigma se alterasse<br />
e mesmo p<strong>os</strong>to em causa.<br />
De facto, neste período de recessão<br />
económica, houve necessidade<br />
de implementar um conjunto<br />
de medidas económicas de<br />
carácter excecional (i.e. medidas<br />
de austeridade), nas quais se<br />
incluíram medidas de caracter<br />
fiscal. Uma dessas medidas foi a<br />
introdução da chamada Derrama<br />
Estadual (“DE”), a qual foi introduzida<br />
ainda em 2010, ou seja,<br />
antes até da entrada formal da<br />
Troika em Portugal.<br />
Constata-se, assim, que ao longo<br />
d<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong> tem<strong>os</strong> vindo a<br />
assistir a um conjunto de alterações<br />
ao nível do regime fiscal<br />
aplicável à DE (a qual constitui<br />
receita do Governo central), sendo<br />
uma das mais emblemáticas<br />
a que decorreu da aprovação<br />
da Lei do Orçamento do Estado<br />
para 2018 (“OE 2018”), no âmbito<br />
da qual se estipulou que <strong>os</strong><br />
contribuintes que gerem lucro<br />
tributável acima de 35 milhões<br />
de Eur<strong>os</strong>, ficarão sujeit<strong>os</strong> ao pagamento<br />
da DE em 9%.<br />
Deste modo, estabelece-se<br />
atualmente que <strong>os</strong> contribuintes<br />
ficarão sujeit<strong>os</strong> ao pagamento da<br />
DE, n<strong>os</strong> seguintes moldes:<br />
a) Lucro tributável acima de<br />
1.500.000€ e até 7.500.000€ –<br />
taxa de 3%;<br />
b) Lucro tributável acima de<br />
7.500.000€ e até 35.000.000€ –<br />
taxa de 5%;<br />
c) Lucro tributável acima de<br />
35.000.000€ – taxa de 9%;<br />
Dito de outro modo, o IRC transformou-se,<br />
ao longo destes últim<strong>os</strong><br />
an<strong>os</strong>, num imp<strong>os</strong>to de carácter<br />
progressivo.<br />
Ainda que a introdução da DE se<br />
tenha inserido num contexto de<br />
exceção económica, o que, numa<br />
primeira análise a poderia justificar,<br />
o facto de esse contexto<br />
de excecionalidade (i.e. período
Tributação Empresarial<br />
da Troika) ter terminado, coloca<br />
em causa <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> que estiveram<br />
na sua génese e dão a<br />
entender que, afinal, esta medida<br />
não será excecional mas sim<br />
estruturante do próprio sistema<br />
fiscal e, em particular, no que<br />
concerne ao próprio Código do<br />
IRC. A alteração ocorrida agora<br />
sede de aprovação do OE 2018<br />
dá expressão a esse sentimento<br />
por parte do legislador.<br />
Assim, <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> que estiveram<br />
na base, em 1988, aquando<br />
da aprovação do Código do IRC,<br />
estão agora p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> em causa,<br />
pois não estam<strong>os</strong> perante uma<br />
realidade que afasta o IRC de<br />
um regime de imp<strong>os</strong>to assente,<br />
em substância, numa lógica de<br />
taxa única, como também se levantam<br />
algumas dúvidas sobre<br />
o nível de competitividade da<br />
taxa efetiva final que uma entidade<br />
pode ser confrontada (que<br />
pode, no limite, vir a ser superior<br />
a 30%).<br />
Como nota final, não se pode<br />
de deixar de questionar se a<br />
manutenção do atual regime da<br />
DE não é em si mesmo algo que<br />
legislador deverá repensar em<br />
term<strong>os</strong> de estrutura conceptual<br />
do imp<strong>os</strong>to e bem assim das regras<br />
basilares em que o mesmo<br />
assenta.<br />
Isenção de IRC na<br />
distribuição de lucr<strong>os</strong> a<br />
empresas norte-americanas<br />
– O que fazer?<br />
Luís Marques<br />
Country Tax Leader<br />
O Código do Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento<br />
das Pessoas Coletivas<br />
(“IRC”) contempla<br />
uma disp<strong>os</strong>ição (i.e.<br />
no seu artigo 14º) que<br />
permite isentar de<br />
retenção na fonte <strong>os</strong><br />
lucr<strong>os</strong> distribuíd<strong>os</strong><br />
a empresas não<br />
residentes em Portugal,<br />
desde que respeitad<strong>os</strong><br />
alguns requisit<strong>os</strong>.<br />
Esta medida assume uma importância<br />
vital na competitividade<br />
do sistema fiscal português e<br />
assenta numa lógica de permitir<br />
uma maior flexibilidade na<br />
movimentação de capitais entre<br />
Estad<strong>os</strong> e insere-se num quadro<br />
de alinhamento de regras<br />
de tributação que vigoram em<br />
múltipl<strong>os</strong> países onde o tema<br />
da competitividade fiscal está<br />
sempre presente. Em term<strong>os</strong><br />
internacionais, a adoção deste<br />
tipo de disp<strong>os</strong>ições n<strong>os</strong> normativ<strong>os</strong><br />
fiscais nacionais insere-se<br />
no quadro das denominadas regras<br />
de participation exemption,<br />
muito comuns em vári<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong><br />
Membr<strong>os</strong> da União Europeia mas<br />
também em outr<strong>os</strong> países de relevo<br />
internacional.<br />
Contudo, se por um lado se deve<br />
saudar a inclusão desta medida<br />
no normativo jurídico-tributário<br />
português, por outro lado, constata-se<br />
que, em term<strong>os</strong> prátic<strong>os</strong>,<br />
a respetiva aplicação nem sempre<br />
se m<strong>os</strong>tra tão linear como<br />
numa primeira análise se poderia<br />
pensar. Este facto, men<strong>os</strong><br />
p<strong>os</strong>itivo, é especialmente importante<br />
no caso particular d<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong><br />
Unid<strong>os</strong> da América (“EUA”),<br />
país com o qual Portugal tem<br />
um Acordo de Dupla Tributação<br />
(“ADT”), como seguidamente se<br />
irá explicar de forma resumida.<br />
Comecem<strong>os</strong> por analisar <strong>os</strong> requisit<strong>os</strong><br />
de aplicação da referida<br />
isenção. De facto, para que tal<br />
isenção p<strong>os</strong>sa ser desde logo<br />
aplicável dever-se-ão verificar,<br />
entre outr<strong>os</strong>, <strong>os</strong> seguintes requisit<strong>os</strong>:<br />
1. Os lucr<strong>os</strong> devem ser pag<strong>os</strong> a<br />
uma entidade residente num<br />
país com o qual Portugal celebrado<br />
uma convenção para evitar<br />
a dupla tributação onde se<br />
prevejam mecanism<strong>os</strong> de troca<br />
de informação, como é o caso<br />
d<strong>os</strong> EUA;<br />
2. Que a entidade que recebe <strong>os</strong><br />
lucr<strong>os</strong> esteja sujeita e não isenta<br />
a um imp<strong>os</strong>to sobre o rendimento<br />
de natureza similar ou<br />
19
Tributação Empresarial<br />
Diretiva podem ser resumidas<br />
como se segue:<br />
Limitação à dedução de jur<strong>os</strong><br />
de financiamento – É considerado<br />
um limite à dedução d<strong>os</strong><br />
gast<strong>os</strong> de financiamento, regra<br />
geral, resultante do maior<br />
valor entre 30% do EBITDA e €<br />
3.000.000, permitindo-se o cômputo<br />
da limitação ao nível de<br />
um grupo fiscal. Não obstante,<br />
para <strong>os</strong> contribuintes que façam<br />
parte de um grupo que consolide<br />
financeiramente, o referido<br />
limite poderá não ser aplicável<br />
se o rácio entre <strong>os</strong> capitais própri<strong>os</strong><br />
e o total de ativ<strong>os</strong> do conidêntica<br />
ao IRC e que a taxa legal<br />
aplicável a essa entidade no seu<br />
país de residência não seja inferior<br />
a 60% da taxa nominal de<br />
IRC (atualmente fixada em 21%),<br />
ou seja, que a taxa de tributação<br />
que vigore n<strong>os</strong> EUA não seja inferior<br />
a 12,6% (i.e. 60% x 21%).<br />
Neste contexto, o Código do IRC<br />
estabelece ainda de forma expressa<br />
que o requisito elencado<br />
em b) supra apenas se considera<br />
verificado mediante uma declaração<br />
confirmada e autenticada<br />
pelas autoridades fiscais competentes<br />
do país onde a entidade<br />
beneficiária d<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> for residente<br />
(que no caso d<strong>os</strong> EUA, trata-se<br />
do Internal Revenue Services<br />
– “IRS”). E é precisamente<br />
aqui que <strong>os</strong> problemas prátic<strong>os</strong><br />
começam. Isto porque o IRS não<br />
emite este tipo de declarações.<br />
Aliás, a única declaração que o<br />
IRS emite, regra geral, para efeit<strong>os</strong><br />
de aplicação de instrument<strong>os</strong><br />
de direito fiscal internacional<br />
(sendo que tal procedimento encontra-se<br />
expressamente previsto<br />
nas guidelines emitidas por<br />
parte daquela autoridade tributária)<br />
é um formulário standard<br />
(i.e. o formulário designado por<br />
“Form-6166”) que confirma que<br />
a entidade em causa é uma<br />
pessoa coletiva de direito norte-americano<br />
e residente fiscal<br />
n<strong>os</strong> EUA.<br />
Com base nesta situação particular,<br />
tem havido cas<strong>os</strong> em que<br />
a isenção de retenção na fonte<br />
n<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> pag<strong>os</strong> e distribuíd<strong>os</strong><br />
a empresas norte-americanas<br />
não tem sido p<strong>os</strong>sível de aplicar,<br />
sendo mesmo vedada por parte<br />
da administração tributária<br />
portuguesa em virtude da inobservância<br />
deste requisito formal<br />
previsto no Código do IRC,<br />
mesmo nas situações em que,<br />
com recurso a mei<strong>os</strong> de prova<br />
alternativ<strong>os</strong>, se demonstra a verificação<br />
do requisito da taxa de<br />
tributação aplicável n<strong>os</strong> EUA ser<br />
superior a 60% da taxa nominal<br />
do IRC atualmente vigente em<br />
Portugal. Com isto têm emergido<br />
process<strong>os</strong> de litigância fiscal.<br />
Esta questão, para além de tecnicamente<br />
ser bastante discutível,<br />
pois deveria ser p<strong>os</strong>sível<br />
cumprir com o requisito previsto<br />
na lei com recurso a mei<strong>os</strong> alternativ<strong>os</strong><br />
de prova quando for<br />
imp<strong>os</strong>sível de obter a tal declaração<br />
(como é o caso d<strong>os</strong> EUA),<br />
levanta problemas de fundo sobre<br />
a efetiva competitividade do<br />
sistema fiscal português e, talvez<br />
ainda com maior nível de negatividade,<br />
levanta ainda problemas<br />
de desconfiança por parte de<br />
potenciais investidores norte-american<strong>os</strong><br />
em Portugal.<br />
Por tudo o que foi anteriormente<br />
exp<strong>os</strong>to, seria bom que a administração<br />
fiscal portuguesa<br />
refletisse sobre esta temática<br />
e procurasse, numa ótica de<br />
bom senso, nomeadamente por<br />
recurso à via administrativa,<br />
elencar formas alternativas de<br />
cumprir com <strong>os</strong> requisit<strong>os</strong> plasmad<strong>os</strong><br />
na lei quando <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>,<br />
tal qual se encontram previst<strong>os</strong>,<br />
não se m<strong>os</strong>tram p<strong>os</strong>síveis<br />
de aplicar.<br />
A Diretiva antielisão da U.E.<br />
20<br />
ANTÓNIO NEVES<br />
Partner, Tax Services<br />
Em julho de 2016, foi<br />
publicada a Diretiva<br />
(UE) n.º 2016/1164, do<br />
Conselho, que estabelece<br />
regras contra as práticas<br />
de elisão fiscal que<br />
tenham incidência direta<br />
no funcionamento<br />
do mercado interno.<br />
Na prática, esta Diretiva foi uma<br />
das resp<strong>os</strong>tas da U.E. ao projeto<br />
BEPS (Base Er<strong>os</strong>ion and Profit<br />
Shifting) da OCDE, focando-se<br />
em 5 medidas que visam combater<br />
a elisão fiscal no seio d<strong>os</strong><br />
Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong>. Estas medidas<br />
têm como objetivo funcionar<br />
como um nível mínimo de<br />
proteção contra a elisão fiscal<br />
na U.E., mas <strong>os</strong> Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong><br />
poderão continuar a aplicar<br />
as disp<strong>os</strong>ições nacionais ou<br />
convencionais que permitam<br />
um nível de proteção mais elevado.<br />
As 5 medidas contempladas na
Tributação Empresarial<br />
tribuinte for superior ao mesmo<br />
rácio aferido na esfera do grupo.<br />
Outra alternativa, para permitir<br />
um limite de dedução superior,<br />
decorre da p<strong>os</strong>sibilidade de<br />
considerar o rácio entre <strong>os</strong> gast<strong>os</strong><br />
líquid<strong>os</strong> de financiamento<br />
do grupo com empréstim<strong>os</strong> de<br />
terceir<strong>os</strong> e o EBITDA do grupo<br />
multiplicado pelo EBITDA do<br />
contribuinte. Os Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong><br />
poderão excluir da aplicação<br />
da norma <strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de<br />
financiamento associad<strong>os</strong> a<br />
projet<strong>os</strong> de infraestruturas públicas<br />
de longo prazo considerad<strong>os</strong><br />
de interesse público geral,<br />
bem como as empresas financeiras.<br />
Quando se verifique o<br />
apuramento de gast<strong>os</strong> excessiv<strong>os</strong><br />
de financiamento não dedutíveis<br />
no período de tributação<br />
em causa, <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> poderão<br />
ser reportad<strong>os</strong> para períod<strong>os</strong><br />
seguintes (prevendo-se, inclusive,<br />
a p<strong>os</strong>sibilidade de dedução<br />
em exercíci<strong>os</strong> anteriores), sendo<br />
que a parte não utilizada do limite<br />
de dedução também poderá<br />
ser reportada para períod<strong>os</strong><br />
de tributação seguintes.<br />
Exit tax – Prevenir a não tributação<br />
na deslocalização de<br />
ativ<strong>os</strong>, mediante transferência<br />
de ativ<strong>os</strong> entre a sede e um<br />
estabelecimento estável, ou<br />
entre estabeleciment<strong>os</strong> estáveis,<br />
bem como a transferência<br />
de residência ou transferência<br />
de atividade de um estabelecimento<br />
estável. Contudo, no<br />
caso de transferências no seio<br />
da U.E. (e do E.E.E. com assistência<br />
mútua equivalente à<br />
existente na U.E.), permite-se<br />
o pagamento do imp<strong>os</strong>to em<br />
prestações durante 5 an<strong>os</strong>,<br />
caso em que serão devid<strong>os</strong> jur<strong>os</strong><br />
e, em certas situações, poderá<br />
ser exigida uma garantia.<br />
Regra geral antiabuso – Permite<br />
desconsiderar construções jurídicas<br />
com o objetivo de obter<br />
vantagens fiscais e considerar,<br />
para efeit<strong>os</strong> tributári<strong>os</strong>, a substância<br />
económica das transações.<br />
Controlled foreign company –<br />
Tem como objetivo mitigar a<br />
transferência de lucr<strong>os</strong> para um<br />
território de baixa tributação,<br />
mediante imputação (independentemente<br />
da distribuição) a<strong>os</strong><br />
sóci<strong>os</strong> residentes – que tenham<br />
uma p<strong>os</strong>ição de controlo (50%<br />
ou mais d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> de voto,<br />
capital ou direito a lucr<strong>os</strong>) – d<strong>os</strong><br />
lucr<strong>os</strong> obtid<strong>os</strong> por uma entidade<br />
estrangeira (incluindo um estabelecimento<br />
estável), na medida<br />
em que a respetiva tributação<br />
efetiva seja inferior a metade da<br />
que seria aplicável no Estado-<br />
Membro em causa. São delineadas<br />
duas alternativas para imputação<br />
de lucr<strong>os</strong> – uma com base<br />
em rendiment<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> e outra<br />
com base em falta de substância<br />
–, em cada uma delas prevend<strong>os</strong>e<br />
regras de imputação específicas,<br />
e consideradas exceções à<br />
aplicação da norma, designadamente,<br />
se a atividade, recurs<strong>os</strong>,<br />
ativ<strong>os</strong>, etc., permitam justificar<br />
razões económicas válidas para<br />
a localização da entidade no território<br />
de baixa tributação ou a<br />
entidade estrangeira tiver uma<br />
pequena dimensão. São, ainda,<br />
contempladas medias tendentes<br />
a evitar a dupla tributação.<br />
Switchover rule – Tem como<br />
propósito evitar a dupla não tributação<br />
de cert<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong>,<br />
mediante a dedução apenas no<br />
Estado-Membro de origem do<br />
pagamento (no caso de se verificar<br />
uma dupla dedução) ou<br />
ser negada a dedução no Estado-Membro<br />
pagador (se houver<br />
uma dedução sem inclusão).<br />
A Diretiva deverá ser implementada<br />
a partir de 01.01.2019,<br />
embora p<strong>os</strong>sam haver algumas<br />
derrogações relativamente a<br />
normas específicas, quer pela<br />
sua natureza (exit tax), quer<br />
porque o Estado-Membro já dispõe<br />
de norma similar (limitação<br />
à dedução de jur<strong>os</strong>), cas<strong>os</strong> em<br />
que a implementação poderá<br />
ser adiada para 2020, no primeiro<br />
caso, ou até 2024, no segundo<br />
caso.<br />
A Comissão deverá avaliar o<br />
impacto da regra de limitação<br />
à dedução de jur<strong>os</strong> em ag<strong>os</strong>to<br />
de 2020 e, se necessário, propor<br />
alterações.<br />
Tendo em conta que, atualmente,<br />
alguns d<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong><br />
já têm, na sua legislação nacional,<br />
muitas ou algumas das normas<br />
em causa, bem como que<br />
outr<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong> não<br />
têm nenhuma ou praticamente<br />
nenhuma, 2018 será um ano em<br />
que se verifica mais um desafio<br />
de harmonização fiscal no seio<br />
da U.E., seja para reformulação<br />
de normas nacionais existentes<br />
de modo a que as mesmas sejam<br />
consistentes com a Diretiva,<br />
seja para introdução de normas<br />
até ao presente inexistentes no<br />
ordenamento jurídico-tributário<br />
nacional.<br />
No caso de Portugal, verifica-se<br />
já a existência de praticamente<br />
todas as normas, embora algumas<br />
devam vir a ser adaptadas<br />
para se conformarem com a<br />
Diretiva, faltando efetivamente<br />
desenvolver a regra de “switchover”<br />
para mitigar situações<br />
de assimetrias híbridas decorrentes<br />
de diferenças na qualificação<br />
jurídica de pagament<strong>os</strong><br />
ou entidades.<br />
21
Tributação Empresarial<br />
A “retroatividade tangível”<br />
na dedução d<strong>os</strong> intangíveis<br />
22<br />
ANTÓNIO NEVES<br />
Partner, Tax Services<br />
Uma das grandes<br />
alterações introduzidas<br />
pela Lei n.º 2/2014,<br />
de 16 de janeiro,<br />
então popularmente<br />
apelidada por “Reforma<br />
do IRC”, foi, sem<br />
dúvida, a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de deduzir,<br />
para efeit<strong>os</strong> fiscais,<br />
o valor de aquisição<br />
d<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> intangíveis<br />
reconhecid<strong>os</strong><br />
autonomamente<br />
na contabilidade.<br />
Esta alteração foi particularmente<br />
relevante no que concerne (i)<br />
a<strong>os</strong> element<strong>os</strong> da propriedade<br />
industrial – tais como marcas,<br />
alvarás, process<strong>os</strong> de produção,<br />
model<strong>os</strong> ou outr<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> assimilad<strong>os</strong><br />
– adquirid<strong>os</strong> a título<br />
oner<strong>os</strong>o e sem vigência temporal<br />
limitada (caso contrário, poderiam<br />
ser amortizad<strong>os</strong> n<strong>os</strong> term<strong>os</strong><br />
do Decreto-Regulamentar n.º<br />
25/2009, de 14 de setembro) e<br />
(ii) ao goodwill adquirido numa<br />
concentração de atividades empresariais<br />
(exceto se respeitante<br />
a partes de capital).<br />
Assim, no caso de se aplicável a<br />
dedução prevista no então aditado<br />
artigo 45.º-A do código do IRC,<br />
passou a ser aceite como como<br />
gasto fiscal, em partes iguais, durante<br />
<strong>os</strong> primeir<strong>os</strong> 20 períod<strong>os</strong> de<br />
tributação após o reconhecimento<br />
inicial, o custo de aquisição de<br />
tais ativ<strong>os</strong> intangíveis.<br />
Desde logo, a dedução fiscal<br />
ficou limitada a<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> intangíveis<br />
adquirid<strong>os</strong> em ou após<br />
1 de janeiro de 2014, tendo a<br />
mesma sido vedada no caso de<br />
ativ<strong>os</strong> intangíveis adquirid<strong>os</strong> (i)<br />
no âmbito de operações de fusão,<br />
cisão ou entrada de ativ<strong>os</strong>,<br />
quando seja aplicado o regime<br />
especial de neutralidade fiscal<br />
ou (ii) a entidades residentes em<br />
país, território ou região sujeit<strong>os</strong><br />
a um regime fiscal claramente<br />
mais favorável constante de lista<br />
aprovada por portaria do membro<br />
do Governo responsável pela<br />
área das finanças.<br />
Ora, volvid<strong>os</strong> apenas 5 an<strong>os</strong>, o legislador<br />
pondera – através da redação<br />
constante da Prop<strong>os</strong>ta de<br />
Lei do Orçamento do Estado para<br />
2019 (“PLOE 2019”) – introduzir<br />
mais uma (e deveras importante)<br />
limitação à dedução do gasto<br />
de aquisição d<strong>os</strong> referid<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong><br />
intangíveis. Efetivamente, encontra-se<br />
em discussão uma disp<strong>os</strong>ição<br />
que, se aprovada, não permitirá<br />
a dedução do gasto, para<br />
efeit<strong>os</strong> fiscais, quando <strong>os</strong> ativ<strong>os</strong><br />
intangíveis em causa sejam adquirid<strong>os</strong><br />
a entidades com as<br />
quais existam relações especiais<br />
n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> definid<strong>os</strong> para as regras<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência.<br />
Caso esta limitação venha a ser<br />
introduzida, operar-se-á uma<br />
discriminação relativamente às<br />
aquisições de ativ<strong>os</strong> intangíveis<br />
entre entidades relacionadas, o<br />
que se afigura ser, à semelhança<br />
de muitas outras, uma norma<br />
anti abuso totalmente cega. Se,<br />
por um lado, as transações entre<br />
partes relacionadas devem<br />
respeitar as condições de mercado<br />
e de plena concorrência,<br />
sendo tributáveis <strong>os</strong> ganh<strong>os</strong> na<br />
alienação de ativ<strong>os</strong> intangíveis<br />
(sem p<strong>os</strong>sibilidade de beneficiar<br />
do regime de reinvestimento do<br />
valor de realização, o que já se<br />
revela como uma desvantagem<br />
face a uma transação entre partes<br />
não relacionadas), por outro<br />
lado, tal norma inviabiliza a dedução<br />
fiscal na esfera da entidade<br />
adquirente (mais uma vez,<br />
resultando numa desvantagem<br />
face a uma transação entre partes<br />
não relacionadas).<br />
É verdade que várias foram as<br />
transações desta natureza efetuadas<br />
n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> quase 5 an<strong>os</strong><br />
e que, em substância, apenas<br />
visaram o aproveitamento e<br />
refrescamento de prejuíz<strong>os</strong> fiscais.<br />
Contudo, a Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (“AT”) tem<br />
outr<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> para atuar<br />
e efetuar as correções que se<br />
revelem aplicáveis, não sendo<br />
necessário, e muito men<strong>os</strong> desejável,<br />
uma norma completamente<br />
desproporcional e que<br />
coloca em causa uma dedução<br />
fiscal só pela simples razão das<br />
partes intervenientes serem entidades<br />
relacionadas, ignorando<br />
por completo a substância económica<br />
da transação.<br />
Refira-se que, em muit<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>,<br />
esta dedução tem funcionado<br />
como um importante incentivo<br />
para trazer para Portugal muit<strong>os</strong><br />
ativ<strong>os</strong> intangíveis que, de outra<br />
forma, continuariam a ser detid<strong>os</strong><br />
por entidades estrangeiras<br />
que receberiam royalties das<br />
empresas portuguesas.<br />
Mas se a eventual introdução da<br />
mencionada limitação já é uma<br />
péssima notícia, o pior mesmo<br />
é não se encontrar previsto um
Tributação Empresarial<br />
regime transitório, por exemplo,<br />
referindo expressamente que a<br />
nova limitação – caso a mesma<br />
venha a ser aprovada – apenas<br />
se aplica às aquisições (a partes<br />
relacionadas) de ativ<strong>os</strong> intangíveis<br />
em ou a partir de 1 de janeiro<br />
de 2019. Na ausência de tal<br />
regime transitório, certamente<br />
verem<strong>os</strong> n<strong>os</strong> próxim<strong>os</strong> an<strong>os</strong> uma<br />
escalada na litigância entre a AT<br />
e <strong>os</strong> contribuintes, porquanto, a<br />
AT poderá (previsivelmente) vir a<br />
entender que a nova limitação<br />
tanto se aplica nas situações<br />
já existentes como nas futuras<br />
aquisições de ativ<strong>os</strong> intangíveis.<br />
Por conseguinte, espera-se (talvez<br />
ingenuamente) que na discussão<br />
da PLOE 2019 na especialidade<br />
a referida limitação não<br />
venha a ser sequer aprovada,<br />
sob pena de representar uma<br />
clara discriminação relativamente<br />
às transações entre partes<br />
relacionadas. A não ser assim,<br />
pelo men<strong>os</strong> deverá assegura-se<br />
que a alteração legislativa não<br />
tenha efeit<strong>os</strong> retroativ<strong>os</strong>, para<br />
evitar ferir irremediavelmente a<br />
legítima espectativa d<strong>os</strong> contribuintes<br />
que atuaram em estrito<br />
cumprimento com a lei vigente.<br />
Limitação à dedução de<br />
gast<strong>os</strong> de financiamento –<br />
uma evolução<br />
ANTÓNIO NEVES<br />
Partner, Tax Services<br />
Durante muit<strong>os</strong> an<strong>os</strong>,<br />
vigorou em Portugal uma<br />
limitação à dedução de<br />
jur<strong>os</strong> de financiamento<br />
por via das regras<br />
de subcapitalização.<br />
Nessa altura, quando o endividamento<br />
de um sujeito passivo para<br />
com uma entidade considerada<br />
relacionada não residente era<br />
considerado excessivo (ou seja,<br />
quando o rácio entre valor da dívida<br />
e a correspondente participação<br />
no capital era superior a 2), <strong>os</strong><br />
jur<strong>os</strong> suportad<strong>os</strong> relativamente à<br />
parte considerada excessiva não<br />
eram dedutíveis para efeit<strong>os</strong> de<br />
determinação do lucro tributável.<br />
Contudo, o contribuinte poderia<br />
demonstrar, tendo em conta o tipo<br />
de atividade, o sector, a dimensão<br />
das empresas e outr<strong>os</strong> critéri<strong>os</strong><br />
pertinentes, que podia ter obtido<br />
o mesmo nível do endividamento<br />
e em condições análogas de uma<br />
entidade independente, caso em<br />
que a limitação à dedução de jur<strong>os</strong><br />
não seria aplicável.<br />
Face à discriminação inicial da<br />
norma e da jurisprudência comunitária<br />
que se lhe seguiu, acabaram<br />
por ficar excluídas as situações<br />
de endividamento quando<br />
a entidade relacionada era residente<br />
noutro estado membro da<br />
União Europeia, pelo que, n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong><br />
an<strong>os</strong> da sua vigência, a respetiva<br />
aplicação tinha uma abrangência<br />
prática muito limitada.<br />
Por conseguinte, e na decorrência<br />
da Ação 4 do Projeto BEPS<br />
(Base Er<strong>os</strong>ion and Profit Shifting)<br />
da OCDE, a regra de subcapitalização<br />
foi substituída em 2013<br />
pela limitação à dedução de<br />
gast<strong>os</strong> de financiamento atualmente<br />
existente. Desde logo, as<br />
recomendações da OCDE tinham<br />
<strong>os</strong> seguintes pilares:<br />
l Rácio fixo (entre 10% e 30%)<br />
associado ao EBITDA (earnings<br />
before interest, tax, depreciation<br />
and amortization) que limitasse<br />
a dedução de encarg<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong><br />
líquid<strong>os</strong>, sendo que Portugal<br />
adotou a percentagem de 30%;<br />
l P<strong>os</strong>sibilidade de um rácio de<br />
grupo, o qual não seria limitado<br />
às entidades localizadas na mesma<br />
jurisdição (como alternativa<br />
ao rácio de grupo, poderia ser<br />
considerada uma regra que permita<br />
a dedução sempre que o rácio<br />
de dívida vs. capitais própri<strong>os</strong><br />
da entidade em causa não exceda<br />
o mesmo rácio determinado para<br />
o grupo), sendo que este critério<br />
não foi adotado por Portugal;<br />
l P<strong>os</strong>sibilidade de considerar<br />
uma média de EBITDA d<strong>os</strong> últim<strong>os</strong><br />
an<strong>os</strong> de modo a mitigar<br />
<strong>os</strong> risc<strong>os</strong> de volatilidade d<strong>os</strong> resultad<strong>os</strong>,<br />
algo que Portugal não<br />
adotou;<br />
l Permitir o reporte de “excess<strong>os</strong>”<br />
ou “folgas”, sendo que Portugal<br />
instituiu um período de 5<br />
an<strong>os</strong> para este efeito;<br />
l Exclusão para determinado<br />
tipo de investiment<strong>os</strong> ou entidades,<br />
sendo que Portugal excluiu<br />
as entidades financeiras.<br />
Ainda assim, em 2013 vigorou uma<br />
norma mais flexível, essencialmente,<br />
porque permitia uma dedução<br />
mínima de gast<strong>os</strong> líquid<strong>os</strong><br />
de financiamento até € 3 milhões<br />
e não se encontravam previstas<br />
23
Tributação Empresarial<br />
24<br />
correções ao EBITDA, designadamente<br />
não desconsiderando rendiment<strong>os</strong><br />
excluíd<strong>os</strong> de tributação<br />
(por exemplo, dividend<strong>os</strong> e maisvalias<br />
abrangid<strong>os</strong> pelo regime de<br />
participation exemption e imputação<br />
de resultad<strong>os</strong> no âmbito do<br />
método de equivalência patrimonial),<br />
o que originou, nesse ano,<br />
valores significativ<strong>os</strong> de “folgas” a<br />
reportar para <strong>os</strong> an<strong>os</strong> seguintes.<br />
Ora, logo em 2014, com a Reforma<br />
do Código do IRC, o limite d<strong>os</strong> € 3<br />
milhões foi reduzido para € 1 milhão<br />
e foram introduzidas correções<br />
para apuramento do EBITDA<br />
relevante, procurando a sua aproximação<br />
com o EBITDA fiscal. Não<br />
obstante, verificou-se também a<br />
p<strong>os</strong>sibilidade de optar por aplicar<br />
a norma numa ótica de grupo fiscal,<br />
no âmbito do RETGS (Regime<br />
Especial de Tributação d<strong>os</strong> Grup<strong>os</strong><br />
de Sociedades), p<strong>os</strong>sibilitando<br />
corrigir situações desviantes em<br />
que a dívida financeira e, portanto,<br />
<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de financiamento, se<br />
encontravam na esfera de algumas<br />
sociedades do grupo mas o<br />
EBITDA do grupo advinha de outras<br />
sociedades.<br />
Num esforço conjunto para harmonizar<br />
algumas medidas anti<br />
abuso no seio da União Europeia,<br />
foi aprovada a ATAD 1 (Anti Tax<br />
Avoidance Directive), com o propósito<br />
de instituir um nível mínimo<br />
de proteção contra a elisão<br />
fiscal na União Europeia, sem prejuízo<br />
de aplicação pel<strong>os</strong> estad<strong>os</strong><br />
membr<strong>os</strong> de disp<strong>os</strong>ições nacionais<br />
ou convencionais que permitam<br />
um nível de proteção mais<br />
elevado. A ATAD 1 visou prevenir as<br />
formas mais comuns de planeamento<br />
fiscal agressivo, tendo-se<br />
focado n<strong>os</strong> seguintes aspet<strong>os</strong>:<br />
l Regra de limitação d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong>;<br />
l Tributação à saída;<br />
l Regra geral anti abuso;<br />
l Regra das sociedades estrangeiras<br />
controladas;<br />
l Assimetrias híbridas.<br />
A publicação recente da Lei n.º<br />
32/2019, de 3 de maio, veio precisamente<br />
proceder à implementação<br />
da ATAD 1, ou melhor, à<br />
reformulação de algumas regras<br />
já existentes na legislação fiscal<br />
portuguesa, uma vez que a grande<br />
maioria das normas já vigorava<br />
em Portugal.<br />
No que concerne à limitação d<strong>os</strong><br />
gast<strong>os</strong> de financiamento, verificou-se<br />
verdadeiramente duas alterações<br />
ao artigo 67.º do Código<br />
do IRC. Em primeiro lugar, procedeu-se<br />
a um alargamento do conceito<br />
de gast<strong>os</strong> de financiamento,<br />
incluindo realidades como:<br />
l Quaisquer importâncias devidas<br />
ou imputadas à remuneração<br />
de capitais alhei<strong>os</strong>, designadamente<br />
pagament<strong>os</strong> no âmbito<br />
de empréstim<strong>os</strong> participativ<strong>os</strong> e<br />
montantes pag<strong>os</strong> ao abrigo de<br />
mecanism<strong>os</strong> de financiamento<br />
alternativ<strong>os</strong>, incluindo instrument<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> islâmic<strong>os</strong>;<br />
l Depreciações ou amortizações<br />
de cust<strong>os</strong> de empréstim<strong>os</strong> obtid<strong>os</strong><br />
capitalizad<strong>os</strong> no custo de<br />
aquisição de element<strong>os</strong> do ativo;<br />
l Montantes calculad<strong>os</strong> por referência<br />
ao retorno de um financiamento<br />
no âmbito das regras em<br />
matéria de preç<strong>os</strong> de transferência;<br />
l Montantes de jur<strong>os</strong> nocionais<br />
no âmbito de instrument<strong>os</strong> derivad<strong>os</strong><br />
ou de mecanism<strong>os</strong> de<br />
cobertura do risco relacionad<strong>os</strong><br />
com empréstim<strong>os</strong> obtid<strong>os</strong>;<br />
l Ganho e perdas cambiais relativ<strong>os</strong><br />
a empréstim<strong>os</strong> obtid<strong>os</strong> e<br />
instrument<strong>os</strong> associad<strong>os</strong> à obtenção<br />
de financiamento;<br />
l Comissões de garantia para<br />
acord<strong>os</strong> de financiamento, taxas<br />
de negociação e gast<strong>os</strong> similares<br />
relacionad<strong>os</strong> com a obtenção de<br />
empréstim<strong>os</strong>.<br />
Em segundo lugar, simplificou-se<br />
o conceito de EBITDA relevante,<br />
transformando-o num verdadeiro<br />
EBITDA fiscal, na medida em que<br />
passa a ser determinado mediante<br />
o somatório entre o lucro tributável<br />
ou prejuízo fiscal (sujeito e<br />
não isento), <strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de financiamento<br />
líquid<strong>os</strong> fiscalmente dedutíveis<br />
e as depreciações e amortizações<br />
fiscalmente dedutíveis.<br />
Ainda assim, Portugal continua a<br />
não implementar algumas disp<strong>os</strong>ições<br />
particularmente relevantes,<br />
as quais contribuem para a<br />
penalização das regras imp<strong>os</strong>tas<br />
às sociedades portuguesas face<br />
a sociedades de outr<strong>os</strong> estad<strong>os</strong><br />
membr<strong>os</strong> da União Europeia:<br />
l Manutenção do limite mínimo<br />
de € 1 milhão, quando a ATAD 1<br />
indica € 3 milhões;<br />
l Não exclusão relativamente a<br />
projet<strong>os</strong> de infraestruturas públicas<br />
de longo prazo de interesse<br />
público geral;<br />
l Sem p<strong>os</strong>sibilidade de evitar limites<br />
ou, pelo men<strong>os</strong>, aumentar<br />
<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>, em função d<strong>os</strong> ráci<strong>os</strong><br />
do sujeito passivo vs. ráci<strong>os</strong><br />
do grupo financeiro;<br />
l Reporte de “excess<strong>os</strong>” e de<br />
“folgas” durante 5 an<strong>os</strong>, sendo<br />
que a ATAD 1 permite a não existência<br />
de limite temporal.<br />
Tendo sido recentemente transp<strong>os</strong>ta<br />
a ATAD 1, mas sem a transp<strong>os</strong>ição<br />
das normas relativas a<br />
instrument<strong>os</strong> e entidades híbridas,<br />
que decorrem da Ação 2 do<br />
Projeto BEPS da OCDE e foram<br />
exponencialmente aprofundadas<br />
na ATAD 2 face à redação inicial<br />
constante da ATAD 1, cuja transp<strong>os</strong>ição<br />
deverá ocorrer ainda em<br />
2019, verem<strong>os</strong> mais uma limitação<br />
à dedução de gast<strong>os</strong> de financiamento<br />
das empresas, designadamente<br />
quando se verifique uma<br />
das seguintes situações: (i) dupla<br />
não tributação, (ii) dupla dedução,<br />
(iii) dedução sem inclusão ou (iv)<br />
não tributação sem inclusão; cuja<br />
aplicação será, certamente, bem<br />
mais complexa e desafiante.
Tributação Empresarial<br />
A Diretiva Antielisão Fiscal:<br />
O que muda no<br />
financiamento às empresas<br />
Bruna Melo<br />
Senior Manager EY, Tax Services<br />
Pedro Fugas<br />
Partner EY, TAX Services<br />
Atualmente, as<br />
empresas que<br />
obtenham empréstim<strong>os</strong><br />
para financiar a sua<br />
atividade podem<br />
deduzir <strong>os</strong> encarg<strong>os</strong><br />
daí decorrentes<br />
(substancialmente, <strong>os</strong><br />
jur<strong>os</strong>) quando apuram<br />
seu lucro tributável<br />
e, assim, reduzir<br />
o montante de IRC<br />
a pagar.<br />
No entanto, desde 2013 que a<br />
dedutibilidade destes encarg<strong>os</strong><br />
associad<strong>os</strong> a<strong>os</strong> financiament<strong>os</strong><br />
obtid<strong>os</strong> tem vindo a ser limitada,<br />
numa dupla tentativa de alargamento<br />
da base tributável d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> de IRC, com o<br />
consequente aumento da receita<br />
fiscal, por um lado e, por outro,<br />
de reversão da tendência para<br />
o endividamento excessivo das<br />
empresas portuguesas. Assim, a<br />
dedutibilidade fiscal d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong><br />
líquid<strong>os</strong> associad<strong>os</strong> ao financiamento<br />
está hoje limitada a 1 milhão<br />
de Eur<strong>os</strong> ou, se mais elevado,<br />
a 30% do EBITDA (com alguns<br />
ajustament<strong>os</strong> fiscais) da empresa<br />
que regista <strong>os</strong> gast<strong>os</strong>.<br />
Atualmente, ficam de fora desta<br />
limitação <strong>os</strong> jur<strong>os</strong> e outr<strong>os</strong> gast<strong>os</strong><br />
de financiamento incorrid<strong>os</strong> e<br />
que sejam capitalizad<strong>os</strong> no valor<br />
de um ativo que seja adquirido,<br />
produzido ou construído pela<br />
empresa com recurso a capitais<br />
alhei<strong>os</strong>. Veja-se o caso de uma<br />
empresa que obtém um empréstimo<br />
para construir um edifício<br />
(seja um h<strong>os</strong>pital, um armazém<br />
ou um edifício de escritóri<strong>os</strong>). Esta<br />
empresa, de acordo com as regras<br />
contabilísticas aplicáveis, poderá<br />
não registar <strong>os</strong> jur<strong>os</strong> deste empréstimo<br />
como gast<strong>os</strong> em resultad<strong>os</strong><br />
no exercício. Ao invés, estes<br />
jur<strong>os</strong> poderão ser incorporad<strong>os</strong><br />
(capitalizad<strong>os</strong>) no valor de balanço<br />
do ativo em construção até que<br />
ele esteja apto para desempenhar<br />
as suas funções. Esta empresa irá<br />
recuperar a dedutibilidade d<strong>os</strong><br />
jur<strong>os</strong> capitalizad<strong>os</strong> através da depreciação<br />
anual do edifício construído<br />
(que incorporará no valor<br />
bruto do ativo <strong>os</strong> jur<strong>os</strong> capitalizad<strong>os</strong>)<br />
ou aquando do apuramento<br />
de um resultado fiscal futuro por<br />
via de uma hipotética alienação<br />
futura do ativo (seja pela via de<br />
uma redução da mais-valia fiscal<br />
realizada, seja por via de uma<br />
maior men<strong>os</strong>-valia fiscal apurada<br />
em virtude da capitalização d<strong>os</strong><br />
jur<strong>os</strong> no valor de construção do<br />
ativo). Nestes cas<strong>os</strong>, a dedutibilidade<br />
d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> através destas vias<br />
é integral, não sendo aplicáveis<br />
<strong>os</strong> limites que referim<strong>os</strong> acima.<br />
E este é o entendimento da Autoridade<br />
Tributária, que o deixou<br />
claro numa Circular emitida sobre<br />
esta matéria.<br />
Antecipa-se, contudo, uma mudança<br />
deste enquadramento a<br />
partir de 1 de janeiro de 2019, data<br />
limite para que entrem em vigor<br />
em Portugal (e n<strong>os</strong> demais Estad<strong>os</strong><br />
Membr<strong>os</strong> da União Europeia)<br />
as regras que visam transpor a<br />
Diretiva Europeia Antielisão Fiscal.<br />
Embora não seja ainda oficialmente<br />
conhecido o conteúdo destas<br />
regras, antecipa-se que a limitação<br />
à dedutibilidade d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong><br />
de financiamento referidas acima<br />
venha a ser igualmente alargada<br />
às situações em que estes gast<strong>os</strong><br />
sejam capitalizad<strong>os</strong> no valor de<br />
balanço de um ativo.<br />
Espera-se que as novas regras<br />
venham a ter um impacto significativo<br />
nas empresas do setor da<br />
construção e promoção imobiliária<br />
ou em empresas concessionárias<br />
que tenham de construir <strong>os</strong><br />
ativ<strong>os</strong> afet<strong>os</strong> à exploração, a que<br />
tipicamente não eram aplicadas<br />
as limitações supra referidas e<br />
que verão assim reduzida a sua<br />
capacidade de deduzir fiscalmente<br />
<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> com <strong>os</strong> empréstim<strong>os</strong><br />
obtid<strong>os</strong>, designadamente<br />
quando estejam em causa níveis<br />
de financiamento elevad<strong>os</strong>.<br />
Passará assim a ser (ainda mais)<br />
importante uma correta estruturação<br />
das operações de financiamento<br />
de forma a assegurar a dedutibilidade<br />
d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> para efeit<strong>os</strong><br />
fiscais.<br />
25
Tributação Empresarial<br />
Quem é o seu<br />
beneficiário efetivo?<br />
BRUNA MELO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Se gere uma empresa,<br />
saiba que novas<br />
obrigações terá de<br />
cumprir. Acima de tudo,<br />
tente descobrir quem<br />
é o seu beneficiário<br />
efetivo. Aviso: poderá<br />
não ser tarefa fácil.<br />
Desde novembro de 2017, as sociedades<br />
portuguesas (entre outr<strong>os</strong><br />
tip<strong>os</strong> de entidades) estão sujeitas<br />
ao novo quadro jurídico europeu<br />
de combate ao branqueamento<br />
de capitais e financiamento do<br />
terrorismo, transp<strong>os</strong>to para a lei<br />
portuguesa.<br />
Por um lado, estas entidades estão<br />
obrigadas a registar internamente<br />
a identidade d<strong>os</strong> detentores diret<strong>os</strong><br />
do seu capital, d<strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong><br />
que, em última instancia, detêm o<br />
seu capital, e de quem detenha,<br />
por qualquer forma, o respetivo<br />
controlo efetivo. Por outro, deverão<br />
apresentar uma declaração<br />
que identifique o respetivo beneficiário<br />
efetivo (DBE), ou seja, em<br />
term<strong>os</strong> prátic<strong>os</strong>, o indivíduo que,<br />
numa estrutura corporativa, seja o<br />
beneficiário último d<strong>os</strong> resultad<strong>os</strong><br />
económic<strong>os</strong> por esta gerad<strong>os</strong>.<br />
É natural que neste momento se<br />
esteja a perguntar quem é o beneficiário<br />
efetivo da sua empresa. Se<br />
a pergunta é de fácil resp<strong>os</strong>ta para<br />
entidades detidas diretamente<br />
por indivídu<strong>os</strong>, a mesma adquire<br />
contorn<strong>os</strong> sinu<strong>os</strong><strong>os</strong> quanto estruturas<br />
acionista que incluem sociedades<br />
cotadas em bolsas estrangeiras,<br />
fund<strong>os</strong> de investimento ou<br />
uma significativa dispersão de capital.<br />
A má notícia é que as novas<br />
normas não definem cabalmente<br />
<strong>os</strong> conceit<strong>os</strong> de beneficiário ou<br />
controlo efetivo e <strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> que<br />
permitirão concretizar estes conceit<strong>os</strong><br />
serão apenas definid<strong>os</strong> em<br />
regulamentação que deveria ter<br />
sido publicada até ao final do mês<br />
de novembro de 2017, a qual definirá<br />
o procedimento e praz<strong>os</strong> para<br />
apresentação da DBE.<br />
Até lá, as empresas poderão apenas<br />
assegurar o seu registo interno<br />
de informação, também este<br />
não isento de dúvidas.<br />
Entretanto, tome nota de algumas<br />
consequências do não cumprimento<br />
do novo regime: se <strong>os</strong><br />
lucr<strong>os</strong> que distribui ao seu acionista<br />
estrangeiro têm sido isent<strong>os</strong><br />
de imp<strong>os</strong>to em Portugal, apenas<br />
poderá continuar a fazê-lo caso<br />
apresente a DBE e desde que da<br />
mesma não constem, como beneficiári<strong>os</strong><br />
efetiv<strong>os</strong>, entidades<br />
sedeadas em paraís<strong>os</strong> fiscais. Poderá<br />
ainda ser vedado de celebrar<br />
contrat<strong>os</strong> com o Estado, beneficiar<br />
de fund<strong>os</strong> europeus ou transacionar<br />
bens imóveis.<br />
Não men<strong>os</strong> importante, a informação<br />
incluída nas DBE será centralizada<br />
numa base de dad<strong>os</strong> à<br />
qual a Autoridade Tributária (AT)<br />
terá acesso. Esta será indiscutivelmente<br />
uma poder<strong>os</strong>a ferramenta<br />
ao alcance da AT na fiscalização<br />
de estruturas multinacionais com<br />
presença ou investimento em<br />
Portugal. Com esta informação, a<br />
aplicação de benefíci<strong>os</strong> fiscais ou<br />
de acord<strong>os</strong> de dupla tributação<br />
poderá ser negada ou limitada em<br />
caso de suspeita de práticas de<br />
planeamento fiscal abusivo.<br />
Siga este conselho: esteja seguro<br />
quanto à sua estrutura acionista e<br />
à estratégia de planeamento d<strong>os</strong><br />
seus projet<strong>os</strong>. Acima de tudo, descubra<br />
e identifique claramente o<br />
seu beneficiário efetivo.<br />
26
CATARINA CARREIRA<br />
Manager, Tax Services<br />
Angola introduziu<br />
legislação específica<br />
em matéria de Preç<strong>os</strong><br />
de Transferência em<br />
outubro de 2013, por<br />
meio da publicação do<br />
Decreto-Presidencial<br />
n.º 147/13. Esta<br />
legislação, inserida<br />
no Estatuto d<strong>os</strong><br />
Grandes Contribuintes,<br />
compreende a<br />
obrigação da<br />
preparação de um<br />
d<strong>os</strong>sier de Preç<strong>os</strong><br />
de Transferência<br />
por período de<br />
tributação, sempre<br />
que <strong>os</strong> proveit<strong>os</strong> totais<br />
anuais do contribuinte<br />
ultrapassem <strong>os</strong> 7 mil<br />
milhões de kwanzas.<br />
Angola - Nov<strong>os</strong> desafi<strong>os</strong><br />
e oportunidades: A CDT<br />
Angola-Portugal e <strong>os</strong> Preç<strong>os</strong><br />
de Transferência<br />
P<strong>os</strong>teriormente, em julho de<br />
2016, Angola foi o 83.º país a aderir<br />
ao quadro inclusivo do projeto<br />
BEPS (“BEPS - Base Er<strong>os</strong>ion<br />
and Profit Shifting”), comprometendo-se<br />
assim a implementar<br />
um pacote mínimo de medidas,<br />
nomeadamente através do reforço<br />
ou estabelecimento de normas<br />
anti abuso, do combate à<br />
transferência de lucr<strong>os</strong> mediante<br />
o alinhamento entre as políticas<br />
de Preç<strong>os</strong> de Transferência com<br />
a criação de valor, da implementação<br />
de medidas que previnam<br />
o reconhecimento artificial de<br />
estabelecimento estável, bem<br />
como ap<strong>os</strong>tando no reforço e<br />
troca de informação fiscal entre<br />
autoridades fiscais de diferentes<br />
Estad<strong>os</strong>.<br />
Mais recentemente, no passado<br />
dia 14 de fevereiro foram publicadas<br />
as resoluções da Assembleia<br />
da República que aprovaram (i)<br />
a Convenção para Evitar a dupla<br />
Tributação em Matéria de<br />
Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre o Rendimento e<br />
Prevenir a Fraude e a Evasão Fiscal<br />
(“CDT”) e (ii) o Acordo sobre<br />
Assistência Administrativa Mútua<br />
e Cooperação em Matéria Fiscal<br />
(“ATI”), ambas estabelecidas entre<br />
Portugal e Angola, tendo aqueles<br />
instrument<strong>os</strong> legais sido e assinad<strong>os</strong><br />
a 18 de setembro de 2018,<br />
em Luanda. Ambas as resoluções<br />
entrarão em vigor na data de receção<br />
da última notificação, por<br />
escrito e por via diplomática, de<br />
que foram cumprid<strong>os</strong> <strong>os</strong> requisit<strong>os</strong><br />
do direito interno das Partes<br />
necessári<strong>os</strong> para o efeito.<br />
Tributação Empresarial<br />
Dado o forte laço nas trocas comerciais<br />
e no investimento externo<br />
entre Portugal e Angola,<br />
esta convenção representará um<br />
contributo importante para as<br />
empresas presentes nestas duas<br />
jurisdições.<br />
Por um lado, são esperad<strong>os</strong><br />
maiores desafi<strong>os</strong> em matérias<br />
fiscais, em virtude do ATI celebrado,<br />
o qual prevê, entre outr<strong>os</strong>,<br />
a realização de control<strong>os</strong> fiscais<br />
simultâne<strong>os</strong> e a participação em<br />
control<strong>os</strong> fiscais no estrangeiro.<br />
Assim, tornar-se-á essencial que<br />
<strong>os</strong> Grup<strong>os</strong> multinacionais apresentem<br />
uma política de preç<strong>os</strong><br />
de transferência coerente, e devidamente<br />
documentada e suportada.<br />
Não obstante, <strong>os</strong> Grup<strong>os</strong> multinacionais<br />
terão na CDT celebrada<br />
uma oportunidade para<br />
reestruturarem e otimizarem as<br />
suas estruturas e operações por<br />
forma a alinharem <strong>os</strong> seus flux<strong>os</strong><br />
com a criação do valor, mitigarem<br />
o risco fiscal a que p<strong>os</strong>sam<br />
estar sujeit<strong>os</strong>, por exemplo, ao<br />
nível de eventuais risc<strong>os</strong> de estabelecimento<br />
estável, mas beneficiando<br />
da p<strong>os</strong>sibilidade de<br />
eliminarem a dupla tributação<br />
que lhes seria aplicável.<br />
27
Tributação Empresarial<br />
Revisão d<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong><br />
fiscais – Revisão estrutural<br />
ou simples corte<br />
de despesa fiscal?<br />
28<br />
DIOGO CUNHA<br />
Manager, Tax Services<br />
No passado dia 17 de<br />
junho de 2019, foram<br />
apresentadas as<br />
principais conclusões<br />
de um estudo elaborado<br />
por um Grupo de<br />
Trabalho indigitado<br />
pelo Governo sobre<br />
<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais<br />
atualmente em vigor<br />
em Portugal.<br />
Para o efeito, o referido Grupo de<br />
Trabalho procedeu a um levantamento<br />
exaustivo e sistematizado<br />
d<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais em vigor,<br />
tendo ainda desenvolvido uma<br />
nova metodologia para, no futuro,<br />
criar, monitorizar e avaliar <strong>os</strong><br />
mesm<strong>os</strong>.<br />
As principais conclusões do<br />
estudo apontam (1) para um<br />
aparente facilitismo com a implementação<br />
de mais de cinco<br />
centenas de benefíci<strong>os</strong> fiscais;<br />
(2) para um elevado número de<br />
benefíci<strong>os</strong> fiscais dispers<strong>os</strong> por<br />
legislação avulsa, o que torna<br />
o sistema complexo e pouco<br />
transparente; (3) para a dificuldade<br />
na avaliação de um número<br />
significativo de benefíci<strong>os</strong><br />
fiscais quanto à despesa fiscal<br />
associada e/ou número de beneficiári<strong>os</strong>;<br />
(4) para uma falta<br />
de clareza quanto a<strong>os</strong> objetiv<strong>os</strong><br />
pretendid<strong>os</strong>.<br />
Note-se que o estudo apresentado<br />
não recomenda a extinção<br />
de qualquer benefício em particular,<br />
mas admite que, em vári<strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong>, não é p<strong>os</strong>sível saber que<br />
despesa geram e quant<strong>os</strong> contribuintes<br />
beneficiam d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>.<br />
Adicionalmente, o estudo recomenda<br />
que <strong>os</strong> futur<strong>os</strong> Orçament<strong>os</strong><br />
do Estado passem a detalhar<br />
o impacto financeiro do benefício,<br />
como se de uma despesa<br />
direta se tratasse. Outra das<br />
prop<strong>os</strong>tas sugeridas pelo Grupo<br />
de Trabalho é que cada novo benefício<br />
criado seja compensado<br />
do ponto de vista do equilíbrio<br />
orçamental.<br />
O Grupo de Trabalho sugere ainda<br />
que seja criada uma base de<br />
dad<strong>os</strong> eletrónica, que vá sendo<br />
regularmente atualizada, de<br />
modo a dar informação simplificada<br />
ao contribuinte sobre a forma<br />
de aproveitar <strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong><br />
fiscais. Ao mesmo tempo, propõe<br />
que esta base, sempre que<br />
p<strong>os</strong>sível, inclua um relatório da<br />
despesa fiscal incorrida com o<br />
benefício fiscal em causa.<br />
Por fim, é recomendado que seja<br />
feita uma avaliação periódica<br />
d<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais existentes<br />
(em cicl<strong>os</strong> de 5 an<strong>os</strong>) por uma<br />
unidade técnica criada para o<br />
efeito. Esta unidade técnica deverá,<br />
igualmente, acompanhar<br />
a criação de nov<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong><br />
fiscais e a monitorização d<strong>os</strong><br />
mesm<strong>os</strong>.<br />
No decurso da apresentação do<br />
estudo em apreço, o Ministro das<br />
Finanças mencionou que, num<br />
futuro próximo, proceder-se-á a<br />
uma reavaliação e monitorização<br />
efetiva d<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais<br />
atualmente em vigor.<br />
No entanto, deseja-se que esta<br />
revisão não tenha como objetivo<br />
apenas o corte de despesa fiscal<br />
nas ações de redução do défice<br />
público.<br />
Recorde-se que n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do<br />
n.º 1 do artigo 2.º do Estatuto<br />
d<strong>os</strong> Benefíci<strong>os</strong> Fiscais, são considerad<strong>os</strong><br />
benefíci<strong>os</strong> fiscais, as<br />
medidas de carácter excecional<br />
instituídas para tutela de interesses<br />
públic<strong>os</strong> extrafiscais relevantes<br />
que sejam superiores<br />
a<strong>os</strong> da própria tributação que<br />
impedem.<br />
Por tudo o que acabou de ser<br />
exp<strong>os</strong>to, esta deverá ser uma<br />
oportunidade de ouro para efetuar-se<br />
uma revisão estrutural<br />
de tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais<br />
em vigor, aproveitando para criar<br />
medidas que visem aumentar o<br />
crescimento económico, atrair o<br />
investimento direto estrangeiro,<br />
aumentar o investimento nacional,<br />
aumentar a poupança e o<br />
emprego e, por fim, aumentar a<br />
receita fiscal.
A proteção de direit<strong>os</strong><br />
de propriedade<br />
intelectual na Indústria<br />
Tributação Empresarial<br />
FRANCISCO HAMILTON<br />
Executive Director, Tax Services<br />
Tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> setores<br />
industriais são<br />
impulsionad<strong>os</strong> pela<br />
criação de nov<strong>os</strong><br />
produt<strong>os</strong>. A proteção<br />
de vantagens<br />
competitivas<br />
decorrentes dessas<br />
invenções é um aspeto<br />
fundamental da gestão<br />
das organizações.<br />
Em Portugal, tem sido dada primazia<br />
à proteção da invenção<br />
através de práticas que pretendem<br />
manter a confidencialidade<br />
da criação. Contudo, com as formas<br />
de disseminação da informação<br />
existentes, a manutenção<br />
do segredo industrial pode<br />
ser ineficaz. Assim, tem-se vindo<br />
a assistir a um maior interesse<br />
das empresas na proteção através<br />
de patentes.<br />
As patentes são direit<strong>os</strong> que se<br />
obtêm sobre soluções novas<br />
para problemas técnic<strong>os</strong> específic<strong>os</strong>.<br />
Estes direit<strong>os</strong> resultam de<br />
uma troca entre o Estado, que<br />
confere um direito temporário<br />
e exclusivo à empresa inventora<br />
para explorar a invenção, e<br />
a empresa, que torna pública a<br />
sua descoberta e assim potencia<br />
o desenvolvimento de novo<br />
conhecimento tecnológico.<br />
Embora existam incentiv<strong>os</strong> que<br />
podem compensar parcialmente<br />
<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> do registo de patente,<br />
a proteção e manutenção<br />
da mesma exige que as empresas<br />
mantenham práticas de vigilância<br />
tecnológica que podem<br />
representar cust<strong>os</strong> elevad<strong>os</strong>.<br />
Pela sua relevância, as empresas<br />
industriais tem que dar uma<br />
resp<strong>os</strong>ta às questões da proteção<br />
da propriedade industrial<br />
que deve estar alinhada com a<br />
sua estratégia.<br />
Desde logo, as empresas deverão<br />
decidir se <strong>os</strong> resultad<strong>os</strong> inventiv<strong>os</strong><br />
d<strong>os</strong> seus programas de<br />
I&D devem ser protegid<strong>os</strong> por<br />
patentes e, ao mesmo tempo,<br />
divulgad<strong>os</strong> ou se existem mei<strong>os</strong><br />
eficazes de garantir que <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong><br />
não passem para o domínio<br />
público, mantendo-<strong>os</strong> como<br />
segredo industrial.<br />
Por outro lado, será importante<br />
determinar se <strong>os</strong> cust<strong>os</strong> da<br />
patente não serão superiores<br />
a<strong>os</strong> seus benefíci<strong>os</strong> potenciais.<br />
Para tal, as empresas industriais<br />
terão de aferir qual o valor adicional<br />
da invenção patenteada<br />
considerando as diferentes fontes,<br />
nomeadamente: Proteção<br />
de uma vantagem competitiva;<br />
Geração de um fluxo de receitas<br />
adicionais pelo licenciamento;<br />
Valorização da imagem de inovação<br />
da Empresa; Obtenção de<br />
vantagens negociais em joint<br />
ventures ou process<strong>os</strong> de violação<br />
de propriedade industrial;<br />
Construção de barreiras à entrada<br />
de outr<strong>os</strong> concorrentes; e a<br />
obtenção de benefíci<strong>os</strong> fiscais.<br />
A gestão ativa da proteção da<br />
propriedade industrial assume<br />
hoje um papel fundamental na<br />
manutenção de vantagens competitivas<br />
e na criação de novas<br />
formas de acesso ao mercado e<br />
a outras tecnologias, pelo que<br />
não poderá permanecer afastada<br />
do primeiro plano de atenção<br />
d<strong>os</strong> gestores.<br />
29
Tributação Empresarial<br />
HUGO MACHADO<br />
Manager, Tax Services<br />
PEDRO PAIVA<br />
Partner, Tax Services<br />
Reconhecendo<br />
o impacto da<br />
fiscalidade enquanto<br />
condicionante<br />
no domínio das<br />
reorganizações<br />
societárias, a legislação<br />
nacional prevê um<br />
regime de neutralidade<br />
fiscal em sede de<br />
IRC, o qual, mediante<br />
o cumprimento de<br />
cert<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong>,<br />
permite o diferimento<br />
da tributação incidente<br />
sobre estas operações<br />
e, em certa medida,<br />
a manutenção e/<br />
ou transferência de<br />
prejuíz<strong>os</strong> fiscais e<br />
crédit<strong>os</strong> fiscais entre as<br />
sociedades envolvidas.<br />
Capitais própri<strong>os</strong> negativ<strong>os</strong><br />
e a motivação económica<br />
em fusões – jurisprudência<br />
recente<br />
Contudo, está prevista uma cláusula<br />
específica anti abuso que<br />
prevê que o regime poderá não<br />
se aplicar quando, entre outras<br />
condições, as operações não tenham<br />
sido realizadas por razões<br />
económicas válidas, tais como<br />
a reestruturação ou a racionalização<br />
das atividades das sociedades<br />
que nelas participam. A<br />
motivação económica sempre foi<br />
igualmente condição de transmissão<br />
de prejuíz<strong>os</strong> fiscais no<br />
âmbito de operações de fusão.<br />
Acontece que, na prática, a Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira<br />
(AT) tem vindo a utilizar, em diversas<br />
situações, a consideração<br />
do critério do peso do património<br />
líquido ao nível das entidades<br />
envolvidas como meio de<br />
aferição da existência de razões<br />
económicas válidas em operações<br />
de fusão, sendo vári<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong> em que conclui pela inexistência<br />
de vantagens económicas<br />
quando a sociedade incorporada<br />
p<strong>os</strong>sui uma situação<br />
líquida negativa, utilizando este<br />
argumento como condição única<br />
e suficiente para essa avaliação.<br />
Não obstante a natureza casuística<br />
inerente a este tipo de análise,<br />
o interesse da fusão pode-se<br />
acentuar precisamente quando<br />
uma empresa se apresenta<br />
numa situação de dificuldade<br />
económica mas, ainda assim,<br />
detenha, por exemplo, uma p<strong>os</strong>ição<br />
no mercado ou ativ<strong>os</strong> que<br />
interessa salvaguardar e desenvolver,<br />
pelo que a mera avaliação<br />
do património líquido da sociedade<br />
incorporante como regra<br />
de exclusão automática não<br />
deveria ser um critério a utilizar<br />
pela AT. Em n<strong>os</strong>sa opinião, este<br />
nunca poderá ser um parâmetro<br />
exclusivo de avaliação económica<br />
das repercussões de fusões,<br />
sob pena de inviabilizar estas<br />
operações a empresas que efetivamente<br />
dependem das mesmas<br />
para assegurar a sua sustentabilidade<br />
e sobrevivência.<br />
É este, também, o entendimento<br />
vertido na recente jurisprudência<br />
d<strong>os</strong> Tribunais Centrais<br />
Administrativ<strong>os</strong> e do Supremo<br />
Tribunal Administrativo, que<br />
têm vindo a pronunciar-se no<br />
sentido de considerar que o<br />
entendimento seguido pela AT<br />
põe em causa o princípio da legalidade<br />
fiscal e peca por défice<br />
de fundamentação, reconhecendo<br />
a necessidade de ajustar<br />
o critério de aferição das motivações<br />
económicas das operações<br />
à realidade específica de<br />
cada agente económico e a uma<br />
avaliação detalhada do contexto<br />
jurídico-económico de cada<br />
operação. Estas decisões dão<br />
um novo alento às empresas em<br />
situação mais débil, que encarem<br />
reorganizações societárias<br />
como um meio de salvação e/ou<br />
subsistência da sua atividade<br />
económica (e mesmo mantendo<br />
a estrutura de recurs<strong>os</strong> human<strong>os</strong><br />
previamente existente)<br />
e que poderão agora deixar de<br />
se debater com uma oneração<br />
(fiscal) adicional deste tipo de<br />
operações.<br />
30
Tributação Empresarial<br />
Novo regime fiscal<br />
das perdas por imparidade<br />
aplicável ao sector<br />
financeiro<br />
HUGO ALVES<br />
Senior Manager, FSO Tax Services<br />
No passado dia 23 de<br />
janeiro deu entrada no<br />
Parlamento a Prop<strong>os</strong>ta<br />
de Lei n.º 178/XIII que<br />
pretende proceder<br />
à revisão do regime<br />
fiscal das perdas por<br />
imparidade associadas<br />
a operações de crédito<br />
registadas pelas<br />
entidades sujeitas<br />
à supervisão do Banco<br />
de Portugal.<br />
De acordo com o preâmbulo,<br />
o propósito desta alteração é<br />
o de aproximar o regime fiscal<br />
das perdas por imparidade às<br />
regras contabilísticas e regulamentares<br />
aplicáveis àquelas<br />
entidades de modo a minimizar<br />
a criação de nov<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> por<br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> diferid<strong>os</strong> que, à luz<br />
das atuais regras, por dependerem<br />
da rendibilidade futura,<br />
são objeto de dedução a<strong>os</strong> fund<strong>os</strong><br />
própri<strong>os</strong> e/ou de ponderações<br />
mais elevadas para efeit<strong>os</strong><br />
de cálculo das necessidades de<br />
capital.<br />
Neste sentido, a referida prop<strong>os</strong>ta<br />
prevê uma alteração ao<br />
Código do Imp<strong>os</strong>to sobre o<br />
Rendimento das Pessoas Coletivas<br />
(“IRC”) no sentido de as<br />
imparidades para risco de crédito,<br />
registadas a partir de 1 de<br />
janeiro de 2019 e constituídas<br />
n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> das normas contabilísticas<br />
e regulamentares,<br />
passem a ser, regra geral, aceites<br />
fiscalmente.<br />
A prop<strong>os</strong>ta de lei prevê ainda<br />
um regime transitório aplicável<br />
às perdas por imparidade e outras<br />
correções de valor para risco<br />
específico de crédito registadas<br />
em períod<strong>os</strong> anteriores<br />
e ainda não aceites fiscalmente,<br />
bem como um período de<br />
adaptação de 5 an<strong>os</strong> durante<br />
o qual as entidades financeiras<br />
poderão continuar a aplicar o<br />
atual regime fiscal.<br />
Ora, a opção tomada pelo legislador<br />
relativamente ao regime<br />
transitório poderia ter ido<br />
no sentido da definição de um<br />
regime de phasing-out que assegurasse<br />
a dedução fiscal das<br />
perdas por imparidade registadas<br />
em períod<strong>os</strong> anteriores por<br />
um período de tempo pré-determinado.<br />
Tal regime teria claras<br />
vantagens, uma vez que, entre<br />
outr<strong>os</strong> aspet<strong>os</strong>, seria operacionalmente<br />
mais simples e facilitaria<br />
<strong>os</strong> exercíci<strong>os</strong> de recuperabilidade<br />
d<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> por imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
diferid<strong>os</strong> por via de uma maior<br />
previsibilidade d<strong>os</strong> resultad<strong>os</strong><br />
tributáveis futur<strong>os</strong>.<br />
Contudo, a opção do legislador<br />
não parece ser essa tendo por<br />
base a prop<strong>os</strong>ta de lei em apreço,<br />
o que poderá resultar em<br />
maiores cust<strong>os</strong> operacionais<br />
(dado que <strong>os</strong> control<strong>os</strong> intern<strong>os</strong><br />
terão de ser forç<strong>os</strong>amente<br />
maiores) para as entidades<br />
financeiras em resultado da<br />
aplicação em simultâneo, e por<br />
tempo indeterminado, de dois<br />
(ou até mais) regimes fiscais<br />
distint<strong>os</strong> (um d<strong>os</strong> quais baseado<br />
num Aviso do Banco de Portugal<br />
que se encontra revogado<br />
desde 2016), num risco acrescido<br />
de contenci<strong>os</strong>o com a AT e<br />
ainda num aumento d<strong>os</strong> níveis<br />
de incerteza quanto à recuperabilidade<br />
d<strong>os</strong> atuais ativ<strong>os</strong> por<br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> diferid<strong>os</strong>, com eventual<br />
impacto n<strong>os</strong> ráci<strong>os</strong> de fund<strong>os</strong><br />
própri<strong>os</strong> e/ou de capital.<br />
31
Tributação Empresarial<br />
IES – Alteração<br />
relevante ao Anexo H<br />
32<br />
JOÃO CUNHA GUIMARÃES<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A nova obrigação<br />
declarativa constante<br />
da IES, relativa<br />
à ocorrência de<br />
alterações no modelo<br />
de negócio, marca<br />
claramente um novo<br />
foco de atenção por<br />
parte da Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira,<br />
com implicações<br />
diretas e substanciais<br />
na forma como <strong>os</strong><br />
contribuintes devem<br />
abordar estas situações<br />
do ponto de vista<br />
fiscal e de preç<strong>os</strong><br />
de transferência.<br />
A recente alteração ao Anexo<br />
H da declaração anual de informação<br />
contabilística e fiscal<br />
(IES), decorrente da publicação,<br />
em 28 de janeiro, da Portaria<br />
n.º35/2019, oferece subtis, porém<br />
relevantes e interessantes,<br />
novidades do ponto de vista da<br />
temática d<strong>os</strong> preç<strong>os</strong> de transferência.<br />
Estas novidades permitirão<br />
dotar a Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (AT) de novas<br />
ferramentas de identificação e<br />
diagnóstico de situações específicas<br />
que propiciem novas vias<br />
de atuação e, de outro prisma,<br />
novas áreas de foco e atenção<br />
que impliquem necessariamente<br />
a consideração de novas linhas<br />
de defesa por parte d<strong>os</strong> contribuintes.<br />
A principal alteração, objeto do<br />
presente artigo, prende-se com<br />
a nova obrigação de declarar, no<br />
Quadro 03 do Anexo H, se “ocorreram<br />
alterações no modelo de<br />
negócio durante o período de<br />
tributação”. Antes de proceder<br />
à interpretação desta novidade,<br />
importa destacar que o princípio<br />
que subjaz a uma obrigação desta<br />
natureza encontra eco n<strong>os</strong> desenvolviment<strong>os</strong><br />
internacionais<br />
d<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong> em matéria<br />
de fiscalidade e preç<strong>os</strong> de transferência,<br />
<strong>os</strong> quais ambicionam<br />
fomentar e garantir a coerência,<br />
a transparência e a substância<br />
económica das práticas fiscais<br />
d<strong>os</strong> Grup<strong>os</strong> Multinacionais, materializando-se<br />
na necessidade<br />
de garantir um adequado alinhamento<br />
entre a função fiscal, em<br />
todas as suas dimensões relevantes,<br />
e a realidade do negócio<br />
de cada Grupo.<br />
É neste contexto internacional<br />
particular que deve ser interpretada<br />
esta nova obrigação<br />
declarativa que consta da IES, na<br />
medida em que resulta evidente<br />
a importância crescente que o<br />
legislador outorga a situações<br />
de alteração e transformação de<br />
model<strong>os</strong> de negócio, reforçando<br />
a perceção da sua significativa<br />
transcendência em matéria de<br />
preç<strong>os</strong> de transferência e dando<br />
pass<strong>os</strong> significativ<strong>os</strong> no sentido<br />
de potenciar um maior escrutínio<br />
futuro das mesmas.<br />
Neste sentido, é razoável concluir-se<br />
que qualquer alteração<br />
do modelo de negócio de um<br />
contribuinte, independentemente<br />
da sua magnitude ou<br />
características, deverá ser cuidad<strong>os</strong>amente<br />
analisada também<br />
da perspetiva d<strong>os</strong> preç<strong>os</strong> de<br />
transferência, sob pena de gerar<br />
situações em que a política<br />
vigente deixa de estar alinhada<br />
com a nova realidade do negócio<br />
e com a efetiva contribuição de<br />
valor das entidades envolvidas<br />
(a qual poderá ter-se alterado),<br />
resultando em potenciais contingências<br />
fiscais futuras. Paralelamente,<br />
um acompanhamento<br />
proactivo e contemporâneo de<br />
uma alteração do modelo de negócio<br />
poderá permitir, também,<br />
detetar importantes oportunidades<br />
de otimização operacional e<br />
fiscal, sempre em cumprimento<br />
d<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> standards fiscais internacionais,<br />
já transp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> em<br />
grande medida para a norma<br />
portuguesa.<br />
Tendo em conta o anterior, revela-se,<br />
portanto, ainda mais<br />
fundamental que qualquer alteração<br />
do modelo de negócio de<br />
um Grupo Multinacional se faça<br />
acompanhar de uma análise detalhada<br />
e contemporânea das<br />
correspondentes implicações<br />
fiscais e de preç<strong>os</strong> de transferência.<br />
Esta análise deverá ter<br />
como resultado, entre outr<strong>os</strong>, a<br />
preparação de documentação<br />
específica que trate tod<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
aspet<strong>os</strong> fiscalmente relevantes<br />
associad<strong>os</strong> à transição do modelo<br />
atual para o modelo futuro, a<br />
qual poderá ser entregue à AT na<br />
muito provável eventualidade de<br />
vir a ser solicitada, dada a maior<br />
visibilidade gerada por esta nova<br />
comunicação que deverá ser feita<br />
na IES.
JOÃO CUNHA GUIMARÃES<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Tributação Empresarial<br />
Controvérsia em matéria<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência<br />
num contexto p<strong>os</strong>t-BEPS:<br />
preparad<strong>os</strong> para<br />
a turbulência que aí vem?<br />
Nunca, como n<strong>os</strong> temp<strong>os</strong><br />
atuais, a comunidade de<br />
especialistas fiscais de<br />
preç<strong>os</strong> de transferência<br />
foi tão prolífera na<br />
produção de ideias,<br />
debates e reflexões sobre<br />
esta matéria, em distint<strong>os</strong><br />
e variad<strong>os</strong> fóruns,<br />
públic<strong>os</strong> e privad<strong>os</strong>.<br />
O motivo?<br />
O novo contexto fiscal p<strong>os</strong>t-BEPS<br />
e as já observáveis implicações<br />
imediatas decorrentes do mesmo,<br />
no que se refere à forma como as<br />
distintas administrações fiscais<br />
têm vindo a interpretar, na prática,<br />
<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> standards marcad<strong>os</strong><br />
pelas ações 8-10 e 13 do Projeto<br />
BEPS, no contexto de inspeções<br />
tributárias focadas em preç<strong>os</strong> de<br />
transferência.<br />
Importa destacar, em primeiro lugar,<br />
que existe um número cada<br />
vez maior de países n<strong>os</strong> quais<br />
estas inspeções começam a extravasar<br />
<strong>os</strong> aspet<strong>os</strong> puramente<br />
doméstic<strong>os</strong> que resultam da aplicação<br />
estrita da normativa local,<br />
começando a incluir uma perspetiva<br />
multi-jurisdicional decorrente<br />
do maior acesso a informação<br />
de natureza global (por exemplo,<br />
Country-by-Country Report). Esta<br />
tendência reforçar-se-á, seguramente,<br />
pela expectável crescente<br />
colaboração entre administrações<br />
fiscais em process<strong>os</strong> de inspeção<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência (notese,<br />
a este propósito, <strong>os</strong> recentes<br />
trabalh<strong>os</strong> levad<strong>os</strong> a cabo pelo<br />
European Joint Transfer Pricing Forum<br />
da Comissão Europeia nesta<br />
matéria: “A coordinated approach<br />
to transfer pricing controls within<br />
the EU”, de outubro de 2018).<br />
Esta “internacionalização” d<strong>os</strong><br />
process<strong>os</strong> de inspeção de preç<strong>os</strong><br />
de transferência reforça e eleva<br />
o papel (e <strong>os</strong> deveres) d<strong>os</strong> responsáveis<br />
fiscais locais de cada<br />
grupo multinacional (MNE), na<br />
medida em que estes terão, forç<strong>os</strong>amente,<br />
que ser agentes ainda<br />
mais ativ<strong>os</strong> (e proativ<strong>os</strong>) na gestão<br />
global d<strong>os</strong> risc<strong>os</strong> fiscais das suas<br />
organizações, porquanto se antecipam<br />
cada vez mais process<strong>os</strong> de<br />
litigância fiscal local despoletad<strong>os</strong><br />
por inspeções iniciadas noutras<br />
jurisdições (o vice-versa aqui seria<br />
redundante…). Neste sentido, o<br />
maior ou menor “apetite” de uma<br />
determinada administração fiscal<br />
local para apreciar criticamente<br />
esquemas de preç<strong>os</strong> de transferência<br />
em context<strong>os</strong> de inspeções<br />
deve servir cada vez men<strong>os</strong> de<br />
“barómetro” único para medir e<br />
antecipar o risco real a que uma<br />
determinada entidade de um<br />
MNE se enfrenta, em matéria de<br />
preç<strong>os</strong> de transferência, na jurisdição<br />
correspondente em que se<br />
localiza.<br />
Em segundo lugar, tem-se verificado<br />
uma crescente sofisticação, por<br />
parte das administrações fiscais,<br />
na abordagem a<strong>os</strong> aspet<strong>os</strong> técnic<strong>os</strong><br />
mais relevantes, em questões<br />
relacionadas com a substância<br />
económica das atividades, com<br />
a gestão e o controlo d<strong>os</strong> principais<br />
risc<strong>os</strong> do negócio e com as<br />
funções mais relevantes associadas<br />
a<strong>os</strong> principais intangíveis<br />
das MNE (entre outr<strong>os</strong>), configurando-se<br />
estes como importantes<br />
fatores que contribuem para<br />
uma evolução do entendimento<br />
do conceito de “criação de valor”,<br />
proporcionando um novo marco<br />
referente com consequências<br />
diretas ao nível da interpretação<br />
do “princípio de plena concorrência”.<br />
Neste sentido, verifica-se<br />
claramente uma evolução de um<br />
controlo incidente sobretudo em<br />
aspet<strong>os</strong> puramente valorativ<strong>os</strong><br />
(quantificação de uma transação),<br />
para um controlo mais amplo que<br />
incide no contexto económico da<br />
transação em sentido vasto, em<br />
todas as suas dimensões relevantes.<br />
Esta nova realidade parece<br />
vir a marcar uma rutura com<br />
as abordagens técnicas clássicas<br />
seguidas em inspeções fiscais de<br />
preç<strong>os</strong> de transferência, criando<br />
nov<strong>os</strong> e complex<strong>os</strong> desafi<strong>os</strong> para<br />
<strong>os</strong> principais atores envolvid<strong>os</strong> no<br />
mundo da fiscalidade.<br />
Como corolário desta nova dinâmica,<br />
o contexto atual (e o que<br />
se antecipa para o futuro) torna<br />
imperi<strong>os</strong>o que <strong>os</strong> responsáveis<br />
fiscais reflitam sobre as suas estratégias<br />
de defesa de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência e procedam às correspondentes<br />
alterações de rumo<br />
que lhes permitam “navegar mais<br />
tranquilamente as turbulentas<br />
marés que se avizinham”.<br />
33
Tributação Empresarial<br />
JOANA ANICETO<br />
Manager, Tax Services<br />
Ativ<strong>os</strong> por imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
diferid<strong>os</strong> subjacentes<br />
à recuperação fiscal das<br />
amortizações e depreciações<br />
acrescidas no passado<br />
34<br />
Na sequência da alteração<br />
do Código do Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento<br />
das Pessoas Coletivas<br />
(Código do IRC),<br />
destinada a adaptar as<br />
regras de determinação<br />
do lucro tributável<br />
ao enquadramento<br />
contabilístico resultante<br />
da aprovação do Sistema<br />
de Normalização<br />
Contabilística (SNC),<br />
que transpôs, com<br />
algumas diferenças, as<br />
Normas Internacionais<br />
de Contabilidade (NIC)<br />
na ordem jurídica interna,<br />
foi igualmente revisto<br />
o regime regulamentar<br />
das depreciações<br />
e amortizações,<br />
adaptando-o a este novo<br />
contexto regulamentar,<br />
o que culminou com a<br />
aprovação do Decreto-<br />
Regulamentar n.º 25/2009,<br />
de 14 de setembro.<br />
Uma das mais importantes alterações<br />
legislativas resultante da<br />
aprovação deste diploma foi o<br />
reconhecimento da p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> recuperarem<br />
o gasto fiscal associado<br />
às depreciações e amortizações<br />
contabilísticas excessivas praticadas,<br />
em resultado da aplicação de<br />
taxas de depreciação ou amortização<br />
superiores às máximas previstas<br />
nas tabelas anexas àquele<br />
diploma.<br />
Com efeito, a dedução fiscal daqueles<br />
gast<strong>os</strong>, acrescid<strong>os</strong> para<br />
efeit<strong>os</strong> da determinação do resultado<br />
tributável no período de<br />
tributação da respetiva contabilização<br />
por excederem as importâncias<br />
máximas admitidas, são<br />
aceites como gast<strong>os</strong> fiscais n<strong>os</strong><br />
períod<strong>os</strong> seguintes, na medida<br />
em que não se excedam as quotas<br />
máximas de depreciação ou<br />
amortização fixadas.<br />
Foi precisamente neste contexto<br />
que passou a ser admissível<br />
o reconhecimento contabilístico<br />
de ativ<strong>os</strong> por imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> diferid<strong>os</strong><br />
sobre o montante de gast<strong>os</strong> com<br />
depreciações e amortizações fiscalmente<br />
não aceites em cada período<br />
de tributação (aqui não se<br />
incluindo, naturalmente, <strong>os</strong> montantes<br />
acrescid<strong>os</strong> por via do apuramento<br />
de quotas perdidas – já<br />
que estes representam diferenças<br />
permanentes não recuperáveis no<br />
futuro).<br />
Sucede contudo que, volvid<strong>os</strong><br />
quase 10 an<strong>os</strong> sobre a entrada em<br />
vigor daquele diploma, continuam<strong>os</strong><br />
a verificar que alguns sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> demonstram significativas<br />
dificuldades em p<strong>os</strong>suir um<br />
controlo efetivo sobre <strong>os</strong> montantes<br />
de depreciações e amortizações<br />
excessivas (i.e. que não<br />
foram aceites como gasto fiscal)<br />
por cada um d<strong>os</strong> element<strong>os</strong> do<br />
ativo em questão, o que, necessariamente,<br />
inviabiliza a análise do<br />
momento em que tais depreciações/amortizações<br />
excessivas poderão<br />
ser aceites enquanto gasto<br />
fiscal, através da correspondente<br />
dedução ao resultado tributável.<br />
Sob um ponto de vista formal, não<br />
só a inexistência d<strong>os</strong> mapas fiscais<br />
implica a potencial aplicação<br />
de coimas por parte da Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira, como,<br />
no limite, pode pôr em causa a<br />
dedutibilidade fiscal da totalidade<br />
das amortizações e depreciações<br />
reconhecidas no período.<br />
Além de que, a ausência deste<br />
controlo efetivo, implicará necessariamente<br />
a incapacidade d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> recuperarem o<br />
gasto fiscal de tais depreciações e<br />
amortizações acrescidas em exercíci<strong>os</strong><br />
fiscais passad<strong>os</strong>. Sem um<br />
controlo efetivo desta realidade,<br />
quant<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> poderão existir de<br />
ativ<strong>os</strong> que atualmente já se encontram<br />
totalmente depreciad<strong>os</strong>,<br />
cujas depreciações acrescidas em<br />
períod<strong>os</strong> de tributação anteriores<br />
já deviam encontrar-se a ser deduzidas<br />
ao resultado tributável?<br />
E, consequentemente, determinar<br />
o consumo do ativo por imp<strong>os</strong>to<br />
diferido subjacente? Não existindo<br />
este controlo efetivo, deverão<br />
as Empresas, de facto, reconhecer<br />
tais ativ<strong>os</strong>?<br />
Embora, de acordo com a n<strong>os</strong>sa<br />
experiência, o ataque a potencial<br />
problema tenha vindo a ser objeto<br />
de adiamento por parte d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong>, é certo que, passada<br />
uma década, poderão já existir<br />
verdadeir<strong>os</strong> elefantes no canto<br />
da sala.
A complexificação<br />
do benefício da criação<br />
de emprego<br />
Tributação Empresarial<br />
JOÃO SOUSA<br />
Partner, Tax Services<br />
Foi recentemente tornada<br />
pública a Prop<strong>os</strong>ta de Lei<br />
n.o 121/XIII, a qual veio,<br />
entre outr<strong>os</strong>, alterar<br />
e prorrogar, numa base<br />
transitória, a vigência<br />
do artigo 19.o do Estatuto<br />
d<strong>os</strong> Benefíci<strong>os</strong> Fiscais<br />
(“EBF”) – criação<br />
de emprego.<br />
Esta prop<strong>os</strong>ta vem prorrogar a<br />
vigência do benefício fiscal da<br />
criação de emprego até 31 de<br />
dezembro de 2019, devendo ser<br />
p<strong>os</strong>teriormente avaliada anualmente<br />
a manutenção, ou não, do<br />
mesmo.<br />
De acordo com a nova redação<br />
da lei:<br />
l O benefício passa a incluir<br />
apenas <strong>os</strong> jovens com men<strong>os</strong> de<br />
30 an<strong>os</strong> (inclusive), que estejam<br />
à procura do primeiro emprego,<br />
e bem assim <strong>os</strong> desempregad<strong>os</strong><br />
de longa duração ou de muito<br />
longa duração;<br />
l A percentagem de majoração<br />
mantém-se n<strong>os</strong> 50% para as entidades<br />
qualificadas enquanto<br />
Pequenas e Médias Empresas<br />
(“PME”) e reduz-se para 20% para<br />
as restantes entidades, podendo<br />
ser majoradas em 50 ou 25 pont<strong>os</strong><br />
percentuais (respetivamente)<br />
consoante a localização territorial<br />
das mesmas, a situação d<strong>os</strong><br />
colaboradores contratad<strong>os</strong> para<br />
efeit<strong>os</strong> do benefício ou, ainda,<br />
quando se tratem de projet<strong>os</strong> de<br />
interesse estratégico;<br />
l Passará a existir uma majoração<br />
específica para <strong>os</strong> encarg<strong>os</strong><br />
correspondentes à conversão de<br />
contrat<strong>os</strong> de trabalho a termo<br />
para contrat<strong>os</strong> sem termo – cuja<br />
duração do benefício será de<br />
apenas 1 ano –, a qual irá variar<br />
consoante essa conversão se<br />
verifique até 31 de dezembro de<br />
2018 ou a partir de 1 de janeiro<br />
de 2019, dependendo ainda da<br />
qualificação, ou não, da empresa<br />
enquanto PME;<br />
l O conceito de “encarg<strong>os</strong>” passará<br />
a incluir apenas a remuneração-base<br />
e as contribuições<br />
para a Segurança Social ao encargo<br />
da entidade patronal e<br />
por criação líquida de emprego<br />
passará a entender-se apenas<br />
as situações em que a entidade<br />
empregadora tiver alcançado<br />
por via da celebração de contrat<strong>os</strong><br />
de trabalho sem termo um<br />
número total de trabalhadores<br />
superior à média d<strong>os</strong> trabalhadores<br />
registada n<strong>os</strong> 12 meses<br />
que precedem a celebração d<strong>os</strong><br />
referid<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong>.<br />
De acordo com a exp<strong>os</strong>ição<br />
de motiv<strong>os</strong> da Prop<strong>os</strong>ta de Lei<br />
acima referida, as alterações à<br />
redação do benefício fiscal da<br />
criação de emprego visam fundamentalmente,<br />
“(...) diferenciar<br />
p<strong>os</strong>itivamente <strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong><br />
para as PMEs, favorecer <strong>os</strong> territóri<strong>os</strong><br />
mais desfavorecid<strong>os</strong> e<br />
uniformizar <strong>os</strong> conceit<strong>os</strong> subjacentes<br />
a<strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> de aplicação<br />
do benefício.”.<br />
Em n<strong>os</strong>sa opinião, a nova redação<br />
da lei não cumpre totalmente<br />
com <strong>os</strong> seus objetiv<strong>os</strong>, pois,<br />
para além de não trazer maiores<br />
vantagens significativas para as<br />
PME face às atualmente existentes,<br />
vem tornar muito mais complexa<br />
a aplicação e interpretação<br />
de um benefício fiscal já de si<br />
pouco consensual e com muitas<br />
áreas de conflitualidade.<br />
Desde logo, uma dúvida se coloca<br />
quanto ao regime a aplicar ao<br />
exercício de 2018: aplicarem<strong>os</strong> o<br />
novo regime para todo o exercício<br />
de 2018 ou estarem<strong>os</strong> perante<br />
a existência de dois regimes<br />
distint<strong>os</strong> no exercício de 2018?<br />
Também quanto a<strong>os</strong> conceit<strong>os</strong><br />
utilizad<strong>os</strong> e à forma de apuramento<br />
do benefício se colocam<br />
muitas dúvidas basilares, como<br />
por exemplo: quais <strong>os</strong> colaboradores<br />
que serão considerad<strong>os</strong><br />
para efeit<strong>os</strong> do apuramento do<br />
número médio? Tod<strong>os</strong>? Apenas<br />
<strong>os</strong> colaboradores elegíveis?<br />
Como será apurado esse número<br />
médio de colaboradores?<br />
Não será preciso, no entanto,<br />
aguardar para concluir que este<br />
benefício sofreu uma revolução<br />
e se complexificou em múltipl<strong>os</strong><br />
aspet<strong>os</strong>, nomeadamente, população<br />
elegível, tip<strong>os</strong> de contrat<strong>os</strong><br />
elegíveis, majorações de<br />
encarg<strong>os</strong> distintas consoante<br />
as empresas, a localização ou<br />
mesmo <strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> celebrad<strong>os</strong>,<br />
períod<strong>os</strong> de vigência do benefício,<br />
existência ou não de regime<br />
transitório para 2018, etc..<br />
Neste contexto, parece-n<strong>os</strong> que<br />
será necessária uma redobrada<br />
atenção na utilização deste relevante<br />
benefício fiscal.<br />
35
Tributação Empresarial<br />
Falsa partida! Afinal Jersey,<br />
Ilha de Man e o Uruguai<br />
continuam da lista<br />
de paraís<strong>os</strong> fiscais<br />
36<br />
LIBANIA RIBEIRO<br />
Manager, Tax Services<br />
PEDRO FUGAS<br />
Partner, Tax Services<br />
A eterna luta contra a<br />
evasão e a fraude fiscal<br />
ao nível do desvio de<br />
fund<strong>os</strong> de Portugal para<br />
entidades localizadas em<br />
regimes de tributação<br />
privilegiada levou o<br />
legislador a criar um<br />
conjunto de medidas<br />
para desincentivar<br />
<strong>os</strong> contribuintes a<br />
enredarem em operações<br />
com tais entidades.<br />
Havendo dificuldades em definir<br />
o conceito de “paraís<strong>os</strong> fiscais”,<br />
foi publicada a Portaria<br />
150/2004, de 13 fevereiro, que<br />
contém a lista das jurisdições<br />
que o legislador entendeu que<br />
têm um regime de tributação<br />
privilegiada (comumente conhecida<br />
por lista de paraís<strong>os</strong> fiscais).<br />
Decorrente d<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> anti<br />
-abuso a serem implementad<strong>os</strong><br />
no plano internacional, houve<br />
a necessidade de adaptar esta<br />
lista, pelo que se procedeu às<br />
seguintes alterações:<br />
l As sociedades holding sujeitas<br />
a um regime fiscal específico no<br />
Luxemburgo e o Chipre foram retiradas<br />
da lista em 2011 (as primeiras<br />
por vazio legal, uma vez<br />
que já se havia extinto há muito<br />
aquele tipo de sociedades);<br />
l Jersey, Ilha de Man e o Uruguai<br />
foram retirad<strong>os</strong> da lista com<br />
efeit<strong>os</strong> a 1 de janeiro de 2017.<br />
Segundo o explicitado na Portaria<br />
nº 345-A/2016 de 30 de<br />
dezembro, estas 3 jurisdições<br />
foram retiradas por serem membr<strong>os</strong><br />
do Fórum Global sobre<br />
Transparência e Troca de Informações<br />
para efeit<strong>os</strong> fiscais, Jersey<br />
e o Uruguai por terem sido<br />
considerad<strong>os</strong> “largely compliant”<br />
e a Ilha de Man “compliant”. Por<br />
outro lado, Jersey e a Ilha de Man<br />
assinaram um Acordo para Troca<br />
de Informação em matéria fiscal<br />
(ATI) com Portugal e, no caso do<br />
Uruguai, está em vigor uma Convenção<br />
para Evitar a Dupla Tributação<br />
(CDT) que inclui uma norma<br />
sobre troca de informações<br />
em matéria fiscal. Por fim, todas<br />
as jurisdições referidas aderiram<br />
plenamente ao Acordo Multilateral<br />
das Autoridades Competentes<br />
para a Troca<br />
Automática de Informações de<br />
Contas Financeiras.<br />
Ora, se é verdade que desde a<br />
publicação da portaria, o Fórum<br />
Global sobre Transparência e<br />
Troca de Informações não mudou<br />
a sua qualificação destas jurisdições,<br />
também não deixa de<br />
ser verdade que o ATI celebrado<br />
entre Jersey e a Ilha de Man com<br />
Portugal não foi revogado e a<br />
CDT celebrada entre Portugal e o<br />
Uruguai também não.<br />
Por outro lado, é de notar que<br />
nenhuma das jurisdições em<br />
análise se encontra na lista das<br />
17 jurisdições não cooperantes<br />
em matéria fiscal publicada pelo<br />
Conselho a 5 de dezembro de<br />
2017. Já, por op<strong>os</strong>ição, existem<br />
um conjunto de jurisdições relevantes<br />
no contexto português,<br />
como é o caso de Macau, que se<br />
encontram nessa lista do Conselho,<br />
mas que nunca estiveram na<br />
lista de paraís<strong>os</strong> fiscais.<br />
Sendo assim, o que mudou desde<br />
a publicação da portaria? Em<br />
substância, nada.<br />
Afinal, falsa partida? Afinal ainda<br />
querem<strong>os</strong> escrutinar as operações<br />
com estas jurisdições? Ou<br />
afinal a receita fiscal perdida<br />
com a tributação agressiva sobre<br />
as operações realizadas com estas<br />
jurisdições é necessária para<br />
cumprir métricas orçamentais?<br />
De facto, de acordo com as
Tributação Empresarial<br />
próprias estatísticas da Autoridade<br />
Tributária, em 2016 foram<br />
comunicadas transferências ou<br />
envi<strong>os</strong> de fund<strong>os</strong> no montante<br />
de EUR 643.705.757,13 efetuadas<br />
entre sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> residentes<br />
em Portugal e sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
residentes em Jersey, Ilha<br />
de Man e Uruguai que apenas<br />
obtiveram rendiment<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
a retenção na fonte a título<br />
definitivo em território português.<br />
O primeiro aniversário da Portaria<br />
nº 345-A/2016 de 30 de<br />
dezembro fica marcado com a<br />
(precoce) revogação da mesma,<br />
através do Orçamento de Estado<br />
de 2018, o que significa que<br />
Jersey, Ilha de Man e o Uruguai<br />
passam a constar novamente<br />
na lista de paraís<strong>os</strong> fiscais. Falta<br />
perceber se a referida Portaria<br />
foi uma precipitação legislativa<br />
ou se a sua revogação foi uma<br />
medida extraordinária de obtenção<br />
de receita orçamental. Em<br />
qualquer um d<strong>os</strong> caso, estes retrocess<strong>os</strong><br />
em nada abonam para<br />
a segurança e estabilidade fiscal<br />
que <strong>os</strong> Investidores procuram<br />
quando ponderam investir em<br />
Portugal.<br />
Prop<strong>os</strong>ta de Lei referente<br />
à transp<strong>os</strong>ição da DAC6<br />
LUÍS PINTO<br />
Associate Partner, Tax Services<br />
Foi divulgada, e objeto<br />
de uma primeira<br />
discussão pública no<br />
passado dia 28 de maio,<br />
a prop<strong>os</strong>ta de lei para<br />
a transp<strong>os</strong>ição, para a<br />
ordem jurídica interna,<br />
da Diretiva Europeia que<br />
estabelece um regime de<br />
comunicação obrigatória<br />
e de troca automática de<br />
informações (Mandatory<br />
Discl<strong>os</strong>ure Rules -<br />
MDR) relativamente<br />
a mecanism<strong>os</strong><br />
transfronteiriç<strong>os</strong> de<br />
planeamento fiscal<br />
potencialmente<br />
agressiv<strong>os</strong> (Diretiva (UE)<br />
2018/822, do Conselho,<br />
de 25 de maio de 2018,<br />
comummente designada<br />
“DAC6”).<br />
Inserida num conjunto vasto de<br />
medidas que pretendem reforçar<br />
a transparência e o combate<br />
à evasão fiscal, a DAC6 vem introduzir<br />
a obrigação de comunicar<br />
numa base nominativa, às<br />
respetivas autoridades tributárias<br />
nacionais, mecanism<strong>os</strong><br />
que, envolvendo mais de Estado-membro<br />
(ou um EM e um<br />
país terceiro), contenham pelo<br />
men<strong>os</strong> uma das característicaschave<br />
aí elencadas. A obrigação<br />
de comunicar recairá, em<br />
primeira linha, sobre <strong>os</strong> intermediári<strong>os</strong><br />
de tais mecanism<strong>os</strong>,<br />
prevendo-se, no entanto, certas<br />
situações em que deverá ser o<br />
próprio contribuinte a proceder<br />
a essa comunicação.<br />
Feita a comunicação, a informação<br />
recebida será depois<br />
partilhada automaticamente<br />
pelas autoridades tributárias<br />
com as suas congéneres d<strong>os</strong><br />
restantes EM.<br />
Relembra-se que a transp<strong>os</strong>ição<br />
da Diretiva deverá ocorrer<br />
obrigatoriamente até ao final do<br />
ano, pelo que a divulgação desta<br />
prop<strong>os</strong>ta de lei era aguardada<br />
com bastante expectativa.<br />
Entre outras, uma das novidades<br />
é, sem dúvida, a prop<strong>os</strong>ta<br />
de aplicação das regras<br />
“importadas” da DAC6 quer a<br />
mecanism<strong>os</strong> transfronteiriç<strong>os</strong>,<br />
quer a mecanism<strong>os</strong> puramente<br />
doméstic<strong>os</strong>, com a consequente<br />
revogação do Decreto-Lei n.º<br />
29/2008, de 25 de fevereiro – o<br />
qual, embora circunscrito a mecanism<strong>os</strong><br />
doméstic<strong>os</strong>, consagra<br />
um regime similar ao que se visa<br />
implementar a nível europeu.<br />
Atendendo à complexidade do<br />
regime, <strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong><br />
terão a oportunidade de, até<br />
29 de julho, prestarem o seu<br />
contributo e formularem sugestões.<br />
Findo tal período, a prop<strong>os</strong>ta<br />
será sujeita a discussão<br />
e votação em Assembleia da<br />
República, não sendo de excluir<br />
a hipótese de a versão final do<br />
diploma não ser totalmente<br />
coincidente com a prop<strong>os</strong>ta de<br />
lei divulgada.<br />
Independentemente do que<br />
vier a ocorrer, a primeira comunicação<br />
deverá ocorrer até<br />
31 de ag<strong>os</strong>to de 2020 (e, daí em<br />
diante, no prazo de 30 dias a<br />
contar da data relevante em<br />
cada caso) e abrangerá, necessariamente,<br />
tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> meca-<br />
37
Tributação Empresarial<br />
nism<strong>os</strong> cujo primeiro passo de<br />
implementação se tenha verificado<br />
entre 25 de junho 2018 e 1<br />
de julho de 2020.<br />
Torna-se, portanto, indispensável<br />
que intermediári<strong>os</strong> e<br />
contribuintes estejam devidamente<br />
conscientes da importância<br />
de, atempadamente, e<br />
de forma regular, identificarem<br />
operações/transações potencialmente<br />
abrangidas pelo dever<br />
de comunicação, precavendo-se,<br />
assim, contra a eventual aplicação<br />
de coimas pelo incumprimento<br />
desse dever (que, de<br />
acordo a prop<strong>os</strong>ta de lei, podem<br />
ascender a valor máximo de 80<br />
mil eur<strong>os</strong>).<br />
Facilmente se percebe que este<br />
regime vem exigir d<strong>os</strong> operadores<br />
económic<strong>os</strong> um esforço<br />
(adicional) considerável para<br />
assegurarem, a todo o momento,<br />
o cumprimento da miríade<br />
de obrigações que sobre eles<br />
recaem, incluindo a necessidade<br />
de se efetuar uma análise<br />
qualitativa da informação a reportar<br />
/ comunicar.<br />
O Renascer do Regime CFC<br />
38<br />
MIGUEL PUIM<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A Prop<strong>os</strong>ta de Lei n.º 177/<br />
XIII vem estabelecer um<br />
conjunto de medidas<br />
contra práticas de<br />
elisão fiscal, sendo<br />
p<strong>os</strong>sivelmente a mais<br />
profunda alteração da<br />
tributação empresarial<br />
em Portugal desde<br />
a Reforma de 2014.<br />
De acordo com o respetivo<br />
preâmbulo, pretende-se a implementação<br />
das iniciativas europeias<br />
usualmente conhecidas<br />
pela designação “ATAD” (Anti Tax<br />
Avoidance Directive) 1 e 2, consagrando<br />
mecanism<strong>os</strong> antiabuso<br />
direcionad<strong>os</strong> essencialmente<br />
para empresas multinacionais e/<br />
ou com operações transfronteiras.<br />
O presente artigo foi preparado<br />
com base no texto conhecido<br />
e incluído na Prop<strong>os</strong>ta de<br />
Lei referida, não sendo na data<br />
da sua preparação conhecida a<br />
versão final aprovada pelo Parlamento,<br />
a qual poderá, ou não,<br />
conter alterações face ao texto<br />
original.<br />
Entre estas alterações destaca-se<br />
a substancial reformulação do<br />
regime de imputação de resultad<strong>os</strong><br />
de entidades não residentes<br />
(“Controled Foreign Companies”<br />
ou “CFC”). Em traç<strong>os</strong> gerais, este<br />
regime requer que <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> residentes em Portugal<br />
incluam no respetivo lucro tributável<br />
o lucro ou rendimento<br />
apurado por subsidiárias não<br />
residentes em Portugal, que na<br />
respetiva jurisdição onde são residentes<br />
se encontrem, sujeitas a<br />
um regime fiscal privilegiado, ainda<br />
que este lucro ou rendimento<br />
não tenha sido distribuído.<br />
Mediante a referida Prop<strong>os</strong>ta<br />
passam a ser classificadas como<br />
CFC as entidades sujeitas a uma<br />
tributação efetiva inferior a 50%<br />
da que seria devida “n<strong>os</strong> term<strong>os</strong><br />
do Código do IRC”, quando antes<br />
se previa tal qualificação para<br />
entidades sujeitas a uma taxa<br />
nominal inferior a 60% da taxa<br />
nominal portuguesa. É efetuada<br />
igualmente uma mudança de<br />
paradigma quanto ao rendimento<br />
a imputar, o qual passa a ser<br />
definido n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do Código<br />
do IRC.<br />
A aplicação concreta de ambas<br />
as disp<strong>os</strong>ições é complexa e<br />
gerará certamente algumas dúvidas,<br />
particularmente se o novo<br />
regime for levado à letra em toda<br />
a sua extensão. Será necessário<br />
converter as contas das subsidiárias<br />
não residentes para o<br />
referencial contabilístico vigente<br />
em Portugal (i.e. SNC ou IFRS,<br />
dependendo da entidade) de<br />
forma a que se apure o lucro tributável<br />
/ imp<strong>os</strong>to em base idêntica<br />
à do Código do IRC? Ter-se-á<br />
que reconstituir o histórico d<strong>os</strong><br />
atribut<strong>os</strong> fiscais à luz do Código<br />
do IRC para determinar se existiriam,<br />
por exemplo, prejuíz<strong>os</strong><br />
fiscais ou outr<strong>os</strong> crédit<strong>os</strong> fiscais<br />
reportáveis e passíveis de dedução?<br />
Como deverão ser tratadas
Tributação Empresarial<br />
situações em que a subsidiária<br />
integra um grupo de sociedades<br />
no seu país de residência? Como<br />
aplicar <strong>os</strong> regimes de exclusão<br />
tributária ou benefíci<strong>os</strong> fiscais<br />
existentes no país de residência<br />
e que não têm correspondência<br />
a<strong>os</strong> existentes em Portugal e o<br />
inverso? É relevante a derrama<br />
estadual e, porventura, a derrama<br />
municipal no cálculo da taxa<br />
efetiva? Estas são algumas das<br />
perguntas que surgirão na aplicação<br />
prática da norma e que,<br />
de momento, não estão esclarecidas.<br />
Por outro lado, a exclusão das<br />
regras CFC de entidades com<br />
determinadas atividades é alterada,<br />
passando a ser excluídas<br />
entidades cuj<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
“passiv<strong>os</strong>”, ou obtid<strong>os</strong> junto de<br />
entidades relacionadas em determinadas<br />
circunstâncias, não<br />
excedam 25% do total de rendiment<strong>os</strong>.<br />
Salienta-se que para o<br />
cálculo d<strong>os</strong> 25% concorrem <strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> de “empresas de<br />
faturação” provenientes de transações<br />
com partes relacionadas<br />
e que acrescentem pouco ou<br />
nenhum valor económico, sendo<br />
o âmbito de aplicação potencialmente<br />
muito amplo, nomeadamente,<br />
por não se definir o conceito<br />
de pouco valor económico.<br />
Ou seja, estam<strong>os</strong> perante um<br />
conceito vago e indeterminado<br />
que por certo será potenciador<br />
de interpretações distintas.<br />
Adicionalmente, é revogada a<br />
exclusão da aplicação das regras<br />
CFC a entidades residentes<br />
em Portugal sujeitas a regime<br />
especial, conceito que, embora<br />
não seja definido na lei, poderá<br />
aplicar-se a determinad<strong>os</strong> regimes<br />
específic<strong>os</strong> com grande<br />
exp<strong>os</strong>ição ao investimento internacional<br />
e que agora deverão<br />
aferir a aplicação das CFC n<strong>os</strong><br />
term<strong>os</strong> gerais.<br />
Por último, a não aplicação das<br />
regras CFC a subsidiárias residentes<br />
na União Europeia, em<br />
linha com o Acórdão Cadbury<br />
-Schweppes do TJUE, torna-se<br />
mais exigente, na medida em<br />
que, para além da necessidade<br />
de demonstração da constituição<br />
e funcionamento com base<br />
em razões económicas válidas,<br />
deverá adicionalmente ser desenvolvida<br />
uma atividade económica<br />
com recurso a pessoal,<br />
equipamento, ativ<strong>os</strong> e instalações.<br />
Fica a questão de saber<br />
se <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> referid<strong>os</strong> deverão<br />
ser da própria sociedade ou se<br />
é relevante o desenvolvimento<br />
de uma atividade económica, em<br />
maior ou menor grau, através de<br />
recurs<strong>os</strong> subcontratad<strong>os</strong> junto<br />
de outras entidades, o que acontece<br />
com frequência em grup<strong>os</strong><br />
multinacionais com especialização<br />
societária.<br />
Pressupondo que a Lei estará em<br />
vigor durante o ano 2019, as alterações<br />
ao regime CFC, em tese,<br />
terão efeit<strong>os</strong> na determinação<br />
do lucro tributável para todo o<br />
período de tributação de 2019.<br />
Caberá agora a<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong>,<br />
com relevante margem<br />
para divergência de interpretação<br />
tendo em conta as questões<br />
pendentes de clarificação,<br />
avaliar se as suas subsidiárias<br />
poderão ou não ser consideradas<br />
CFC e que rendimento será<br />
imputável. Em qualquer caso,<br />
é certo que o âmbito da norma<br />
terá um alcance muito amplo<br />
comparativamente a atividades<br />
e entidades até agora excluídas,<br />
pelo que se poderá claramente<br />
afirmar que o regime das CFC<br />
renascerá com a implementação<br />
da ATAD.<br />
39
Tributação Empresarial<br />
Redomiciliação de<br />
sociedades para Portugal –<br />
aspet<strong>os</strong> fiscais por clarificar<br />
40<br />
MIGUEL PUIM<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A redomiciliação<br />
de sociedades<br />
corresponde,<br />
tipicamente,<br />
à transferência da<br />
sede e direção efetiva<br />
(e assim da respetiva<br />
residência fiscal)<br />
para outro país.<br />
Na redomiciliação de sociedades<br />
não residentes para Portugal<br />
colocam-se algumas dúvidas na<br />
interpretação de preceit<strong>os</strong> muito<br />
relevantes em sede do Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento das Pessoas<br />
Coletivas (“IRC”). A Lei n.º 32/2019,<br />
de 3 de maio (“Lei 32/2019”), que<br />
transpõe a Anti-Avoidance Tax Directive<br />
(“ATAD”), passou a prever<br />
que na redomiciliação de sociedades<br />
não residentes para Portugal<br />
considera-se como custo de aquisição<br />
fiscal d<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> o respetivo<br />
valor líquido contabilístico, desde<br />
que não exceda o valor de mercado<br />
à data da redomiciliação. Não<br />
obstante, caso as entidades provenham<br />
de outro Estado membro<br />
da União Europeia, entre outras<br />
condições, o sujeito passivo pode<br />
optar por considerar como custo<br />
de aquisição fiscal o valor que<br />
nesse outro Estado foi adotado no<br />
apuramento de imp<strong>os</strong>to “à saída”,<br />
desde que reflita o valor de mercado<br />
à data da transferência.<br />
De uma forma geral, a adoção do<br />
valor líquido contabilístico enquanto<br />
custo de aquisição fiscal<br />
gerará alguma incongruência face<br />
ao regime regra, pois poderá relevar<br />
como base fiscal, a favor ou<br />
contra o sujeito passivo, o valor<br />
contabilístico em situações que<br />
não seriam admitidas para uma<br />
sociedade, à partida, residente<br />
em Portugal. Num exemplo simplificado,<br />
uma sociedade redomiciliada<br />
poderá considerar como<br />
base fiscal de uma participação<br />
social o valor contabilístico que,<br />
porventura, resulte da aplicação<br />
do método de equivalência patrimonial,<br />
quando em circunstâncias<br />
análogas uma sociedade<br />
fiscalmente residente em Portugal<br />
consideraria o custo de aquisição<br />
histórico da participação.<br />
A mesma situação pode surgir<br />
relativamente a outr<strong>os</strong> métod<strong>os</strong><br />
de contabilização não seguid<strong>os</strong><br />
para efeit<strong>os</strong> fiscais (v.g., o justo<br />
valor, em grande parte das situações),<br />
ativ<strong>os</strong> com diferenças<br />
temporárias entre a base fiscal e<br />
contabilística e que, desta forma,<br />
cristalizarão estas diferenças no<br />
valor fiscal, entre outr<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>.<br />
Da redação da norma surge ainda<br />
a dúvida se o valor contabilístico<br />
relevante para definição<br />
da base fiscal seria o definido<br />
no normativo do país de origem<br />
(abordagem consentânea com o<br />
teste alternativo relativamente<br />
ao “step up” para o valor que<br />
serviu de base para a eventual<br />
liquidação de imp<strong>os</strong>to) ou no<br />
normativo Português (abordagem<br />
consentânea com o princípio<br />
vigente no Código do IRC de<br />
que <strong>os</strong> valores fiscais relevantes<br />
são determinad<strong>os</strong>, à partida,<br />
com base no normativo contabilístico<br />
português, com eventuais<br />
adaptações expressamente previstas<br />
naquele código).<br />
Adicionalmente, apesar das importantes<br />
alterações trazidas pela<br />
Lei 32/2019, existe um conjunto<br />
de temas mais vast<strong>os</strong> que carece<br />
de densificação, designadamente<br />
se a redomiciliação reiniciará a<br />
contagem d<strong>os</strong> praz<strong>os</strong> de detenção<br />
de participações na (e pela) sociedade<br />
redomiciliada para divers<strong>os</strong><br />
efeit<strong>os</strong> ou sobre a aplicação de<br />
obrigações que dependem de variáveis<br />
referentes a períod<strong>os</strong> de<br />
tributação anteriores (pagament<strong>os</strong><br />
por conta, especial por conta<br />
e adicional por conta, etc.).<br />
Desta forma, seria recomendável<br />
a clarificação d<strong>os</strong> temas referid<strong>os</strong><br />
de forma a conferir maior certeza<br />
relativamente à redomiciliação de<br />
sociedades para Portugal e ao respetivo<br />
apuramento de resultad<strong>os</strong><br />
tributáveis já enquanto entidades<br />
residentes em Portugal.
Tributação Empresarial<br />
Financiamento para a<br />
aquisição de participações<br />
– Será esta decisão<br />
empresarial “dedutível”?<br />
MIGUEL PUIM<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
TAMARA FARIA<br />
Senior Consultant, Tax Services<br />
Imagine que pretende<br />
alterar a estrutura e a<br />
dimensão económica do<br />
seu negócio, e que, para<br />
tal, a sua empresa contrai<br />
empréstim<strong>os</strong> cujo destino<br />
é o financiamento da<br />
aquisição de participações<br />
sociais - qual o tratamento<br />
fiscal a conceder a<strong>os</strong><br />
jur<strong>os</strong> associad<strong>os</strong> a esses<br />
empréstim<strong>os</strong>?<br />
Apesar de não ser novo, este<br />
tema continua a ser controvertido<br />
e objeto de inúmer<strong>os</strong> acórdã<strong>os</strong>.<br />
No cerne da questão, a<br />
discussão sobre o conceito de<br />
gasto dedutível na determinação<br />
do lucro tributável, em especial o<br />
artigo 23.º do CIRC.<br />
Estabelece este artigo, na redação<br />
dada pela “Reforma do IRC”<br />
de 2014, que “para a determinação<br />
do lucro tributável, são dedutíveis<br />
tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> gast<strong>os</strong> e perdas<br />
incorrid<strong>os</strong> ou suportad<strong>os</strong> pelo<br />
sujeito passivo para obter ou<br />
garantir <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
a IRC”. Anteriormente a 2014, previa-se,<br />
alternativamente, a dedução<br />
d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> incorrid<strong>os</strong> para a<br />
manutenção da fonte produtora.<br />
Em primeiro lugar, parece atualmente<br />
assente na jurisprudência<br />
que, regra geral, um gasto é dedutível<br />
quando suportado no interesse<br />
da empresa, ainda que a<br />
decisão se revele p<strong>os</strong>teriormente<br />
desfavorável em term<strong>os</strong> económic<strong>os</strong>.<br />
O interesse económico da<br />
aquisição de participações sociais<br />
não é assim sindicável numa<br />
perspetiva fiscal, porquanto<br />
constitui um ato legítimo de gestão.<br />
Com efeito, a “atividade” de<br />
uma empresa não se esgota no<br />
conjunto de at<strong>os</strong> operacionais relativamente<br />
a<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> por si diretamente<br />
detid<strong>os</strong>. “Atividade” é<br />
também o conjunto de operações<br />
que têm por propósito o exercício<br />
de atividade económica por<br />
intermédio de sociedades participadas,<br />
o que terá que incluir<br />
por definição a sua aquisição. De<br />
facto, a organização da atividade<br />
económica em grup<strong>os</strong> de sociedades<br />
tem uma razão comercial<br />
subjacente e é incentivada pelo<br />
legislador há já diversas décadas<br />
(veja-se o preâmbulo do regime<br />
legal das SGPS).<br />
Na perspetiva tributária, discutese<br />
se a “remuneração” da detenção<br />
das participações sociais, no<br />
caso dividend<strong>os</strong> ou mais-valias,<br />
corresponde a um rendimento<br />
sujeito a IRC na aceção do artigo<br />
23.º do Código do IRC, como se<br />
entende ser o caso. De facto, embora<br />
p<strong>os</strong>sam beneficiar de uma<br />
exclusão de tributação (“participation<br />
exemption”), <strong>os</strong> dividend<strong>os</strong><br />
e mais-valias da venda de<br />
participações constituem rendiment<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> e não isent<strong>os</strong><br />
de IRC. Para conclusão distinta,<br />
deveria a norma geral de dedutibilidade<br />
d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> requerer algo<br />
mais do que a mera sujeição a<br />
IRC, o que não é o caso.<br />
Adicionalmente, importa salientar<br />
que o Código do IRC contempla<br />
mecanism<strong>os</strong> cujo intuito é limitar<br />
o excessivo / abusivo endividamento<br />
das empresas. Especificamente,<br />
desde 2014, estabelece-se<br />
uma limitação à dedutibilidade<br />
d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de financiamento líquid<strong>os</strong>,<br />
no âmbito do qual <strong>os</strong> dividend<strong>os</strong><br />
e mais-valias a que se<br />
tenha aplicado o “participation<br />
exemption” não relevam para o<br />
apuramento do “EBITDA Fiscal”.<br />
Este ajustamento resulta, materialmente,<br />
numa limitação à dedução<br />
d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> incorrid<strong>os</strong> para a<br />
aquisição de participações sociais,<br />
sendo que, por definição, apenas<br />
se poderá limitar a dedução de<br />
algo que seja, à partida, dedutível.<br />
Face ao exp<strong>os</strong>to é visível a necessidade<br />
de “pacificar” a relação<br />
entre sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> e AT relativamente<br />
a um tema desnecessariamente<br />
controvertido, por um<br />
lado, pelo facto do Código do IRC<br />
parecer já suficientemente claro<br />
quanto a este tema e, por outro,<br />
pela importância que este tema<br />
tem na competitividade do tecido<br />
empresarial português.<br />
41
Tributação Empresarial<br />
Retenção na fonte sobre<br />
dividend<strong>os</strong> – isenção para<br />
participações “portfólio”?<br />
42<br />
MIGUEL PUIM<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
No Acórdão C-575/17,<br />
publicado em 22 de<br />
novembro, o Tribunal<br />
de Justiça da União<br />
Europeia decidiu ser<br />
contrário ao princípio da<br />
liberdade de circulação<br />
de capitais a retençãona<br />
fonte sobre dividend<strong>os</strong><br />
pag<strong>os</strong> a entidades não<br />
residentes que, por<br />
apurarem prejuízo fiscal,<br />
não consigam recuperar<br />
esta retenção por crédito<br />
de imp<strong>os</strong>to no país em<br />
que são residentes.<br />
Especificamente, uma sociedade<br />
belga recebeu dividend<strong>os</strong><br />
de participações reduzidas<br />
(“portfólio”) em sociedades<br />
residentes em França, <strong>os</strong> quais<br />
foram sujeit<strong>os</strong> a retenção na<br />
fonte neste país, dado que o<br />
regime de isenção da Diretiva<br />
Mãe-Filhas não era aplicável<br />
ao caso concreto. Uma vez que<br />
a sociedade belga não obteve<br />
lucro tributável n<strong>os</strong> períod<strong>os</strong><br />
de tributação em que obteve<br />
<strong>os</strong> dividend<strong>os</strong>, não foi p<strong>os</strong>sível<br />
a recuperação desta retenção<br />
na fonte por via de crédito de<br />
imp<strong>os</strong>to. Neste sentido, a sociedade<br />
belga pediu, em França, o<br />
reembolso da retenção na fonte<br />
sofrida neste país, com base em<br />
alegada desconformidade desta<br />
tributação com o direito europeu,<br />
tendo o subsequente litígio<br />
sido decidido a seu favor, n<strong>os</strong><br />
term<strong>os</strong> referid<strong>os</strong>.<br />
Relativamente ao sistema fiscal<br />
português, esta decisão levanta<br />
algumas questões quanto à futura<br />
evolução da tributação d<strong>os</strong><br />
dividend<strong>os</strong> pag<strong>os</strong> a entidades<br />
residentes em outr<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong><br />
Membr<strong>os</strong> da União Europeia,<br />
quando estas não beneficiem<br />
da isenção de retenção na fonte<br />
prevista no artigo 14.º do Código<br />
do IRC (por exemplo, pelo facto<br />
da participação ser inferior a<br />
10% do respectivo capital social).<br />
Entre outras, poderão ser levantadas<br />
as seguintes questões:<br />
l Estará o Código do IRC em desconformidade<br />
com o direito europeu<br />
por não permitir um mecanismo<br />
de isenção de retenção<br />
na fonte para dividend<strong>os</strong> pag<strong>os</strong><br />
a entidades não residentes, n<strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong> em que estas não consigam<br />
recuperar a tributação sofrida<br />
em Portugal por intermédio<br />
de crédito de imp<strong>os</strong>to?<br />
l Como poderá ser operacionalizada<br />
esta potencial isenção de<br />
retenção na fonte, a qual depende<br />
de variáveis não totalmente<br />
definidas no momento da retenção<br />
(por exemplo, apuramento ou<br />
não de coleta pelo beneficiário,<br />
entre outras)? Em que medida<br />
poderá ser admissível um método<br />
de reembolso da retenção na<br />
fonte mediante verificação futura<br />
das condições necessárias?<br />
l Em que medida é relevante o<br />
facto d<strong>os</strong> prejuíz<strong>os</strong> fiscais poderem<br />
resultar da exclusão d<strong>os</strong> dividend<strong>os</strong><br />
do lucro tributável por<br />
aplicação de um regime de “participation<br />
exemption” no país do<br />
beneficiário d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong>?<br />
Neste âmbito, deverá realçar-se<br />
o Acórdão relativo ao processo<br />
0768/13 do Supremo Tribunal<br />
Administrativo.<br />
l Que outr<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> (como<br />
jur<strong>os</strong> ou royalties) poderão ser<br />
impactad<strong>os</strong> pel<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong><br />
desta decisão?<br />
De momento, estas são algumas<br />
das questões que permanecem<br />
sem resp<strong>os</strong>ta, mas que certamente<br />
terão desenvolviment<strong>os</strong><br />
relevantes num futuro próximo,<br />
especialmente para entidades<br />
da União Europeia que obtenham<br />
rendiment<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> a retenção<br />
na fonte em Portugal, as<br />
quais deverão avaliar o impacto<br />
desta decisão na ótica da tributação<br />
que têm vindo a sofrer em<br />
Portugal.
Aplicação da tecnologia<br />
blockchain a<strong>os</strong> preç<strong>os</strong><br />
de transferência<br />
Tributação Empresarial<br />
NELSON PEREIRA<br />
Director, Tax Services<br />
A tecnologia<br />
blockchain é<br />
relativamente recente<br />
e ainda não é usada<br />
de forma ampla<br />
na área fiscal e,<br />
em concreto, na<br />
área de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência (“PT”).<br />
A imutabilidade e versão única<br />
desta plataforma torna p<strong>os</strong>sível<br />
unificar o processamento de<br />
todas as transações e providencia<br />
um registo mais completo e<br />
disponível para todas as partes<br />
ao longo do fluxo transacional.<br />
Tendo em conta que, segundo a<br />
ONU, mais de 30% do comércio<br />
global é intragrupo, a utilização<br />
da tecnologia blockchain poderá<br />
sem dúvida ser um game changer<br />
para <strong>os</strong> PT, sendo mesmo<br />
uma questão de tempo até se<br />
tornar a plataforma tecnológica<br />
de base para as empresas multinacionais<br />
(“EM”) gerirem a sua<br />
cadeia de valor (e transações intragrupo)<br />
numa época caracterizada<br />
por uma forte transparência<br />
fiscal sem precedentes.<br />
Considerando que esta tecnologia<br />
poderá auxiliar a documentar<br />
um fluxo rastreável da conduta<br />
das partes relacionadas, assegurando<br />
assim o cumprimento das<br />
políticas de PT, são descritas de<br />
seguida algumas áreas específicas<br />
de PT que podem beneficiar<br />
do seu uso:<br />
l Sistema de gestão de contas<br />
a receber – as aplicações blockchain<br />
poderão desenhar process<strong>os</strong><br />
para gerir as contas a<br />
receber incluindo a emissão de<br />
faturas e respetiva validação de<br />
autenticidade, montante e outr<strong>os</strong><br />
detalhes; bem como o envio<br />
de follow-ups para cobranças,<br />
etc. Este registo providenciará<br />
tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> detalhes relevantes que<br />
permanecerão acessíveis durante<br />
muit<strong>os</strong> an<strong>os</strong> para evidenciar<br />
a cobrança atempada e dispensarão<br />
uma auditoria detalhada<br />
tendo em conta o protocolo blockchain;<br />
l Disponibilidade de informação<br />
para aplicação de métod<strong>os</strong><br />
– dois d<strong>os</strong> métod<strong>os</strong> de PT men<strong>os</strong><br />
utilizad<strong>os</strong> são o método do<br />
preço comparável de mercado<br />
(“MPCM”) e o método do fracionamento<br />
do lucro (“MFL”). A<br />
tecnologia blockchain facilitará<br />
a maior disponibilidade de informação<br />
sobre transações comparáveis<br />
efetuadas pela empresa<br />
ou pelas suas entidades relacionadas<br />
(p<strong>os</strong>sibilitando a aplicação<br />
do MPCM) bem como de<br />
informação fiável em tempo real<br />
sobre a contribuição de cada entidade<br />
para a cadeia de valor do<br />
grupo (facilitando, deste modo, a<br />
aplicação do MFL);<br />
l Implementação de contrat<strong>os</strong><br />
smart a nível intragrupo – um<br />
contrato smart é um acordo, ou<br />
conjunto de regras, que governa<br />
uma transação e é codificado na<br />
rede blockchain, fazendo com<br />
que a transação seja executada<br />
caso as regras sejam cumpridas.<br />
Em substituição d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong><br />
físic<strong>os</strong>, estes contrat<strong>os</strong> podem,<br />
por exemplo, definir as condições<br />
contratuais subjacentes a<br />
serviç<strong>os</strong> intragrupo ou a mecanism<strong>os</strong><br />
de tesouraria centralizada<br />
(tipo cash pooling) entre<br />
diversas entidades do mesmo<br />
grupo. Para além de ajudar na<br />
validação das chaves de repartição,<br />
este exercício ocorreria em<br />
tempo real, não implicaria intervenção<br />
manual significativa e reduziria<br />
a p<strong>os</strong>sibilidade de err<strong>os</strong><br />
e perdas de dad<strong>os</strong>;<br />
l Auxílio em inspeções de PT –<br />
a tecnologia blockchain poderá<br />
ser útil para consubstanciar <strong>os</strong><br />
term<strong>os</strong> de uma transação intragrupo,<br />
mais concretamente para<br />
refletir o fluxo de transações, a<br />
conduta das partes e o processo<br />
de tomada de decisão. Facultar<br />
às autoridades tributárias (“AT”),<br />
por um período limitado de<br />
tempo, acesso ao blockchain do<br />
negócio permitirá a recolha de<br />
informação necessária para determinar<br />
a efetiva conduta das<br />
partes numa transação intragrupo,<br />
facilitar o processo inspetivo<br />
ao aumentar a confiança da AT<br />
na informação sobre acord<strong>os</strong><br />
intragrupo das EM e, sobretudo,<br />
reduzir gast<strong>os</strong> com inspeções de<br />
PT. No futuro, mediante a aceitação<br />
por parte das AT, poderá inclusive<br />
ser p<strong>os</strong>sível a implementação<br />
de acord<strong>os</strong> prévi<strong>os</strong> de PT<br />
usando tecnologia blockchain;<br />
l Partilha de Country-by-Country<br />
reports (CbCr) – o processo<br />
de partilha de CbCr poderia ser<br />
automatizado através do uso de<br />
tecnologia blockchain, de modo<br />
a que todas as jurisdições signatárias<br />
de acordo multilateral<br />
43
Tributação Empresarial<br />
sejam participantes ou membr<strong>os</strong><br />
da rede e, assim que qualquer<br />
CbCr seja partilhado nesta plataforma,<br />
recebam essa informação<br />
em tempo real. Isto p<strong>os</strong>sibilitaria<br />
uma melhor interpretação d<strong>os</strong><br />
resultad<strong>os</strong> d<strong>os</strong> CbCr por parte<br />
das AT, asseguraria uma maior<br />
consistência de reporte e permitiria<br />
às EM monitorizar as tendências<br />
de CbCr.<br />
Na sequência das novas tendências<br />
de tributação internacional,<br />
onde a transparência e o cruzamento<br />
de dad<strong>os</strong> e informações<br />
são as palavras de ordem, as EM<br />
têm que olhar de forma diferente<br />
para as suas políticas de PT e<br />
planear deliberadamente a sua<br />
revisão de forma mais integrada.<br />
A vantagem desta tecnologia é<br />
que permite capturar informação,<br />
sob múltiplas perspetivas,<br />
que é imutável e disponível para<br />
verificação, p<strong>os</strong>sibilitando a<strong>os</strong><br />
departament<strong>os</strong> fiscais das EM<br />
ter informação fiável disponível<br />
para cumprir cabalmente as<br />
diversas obrigações de reporte<br />
com que se confrontam. É um<br />
novo futuro que aí vem e com<br />
nov<strong>os</strong> desafi<strong>os</strong> no que a PT diz<br />
respeito.<br />
Evolução do fracionamento<br />
do lucro num contexto<br />
de criação de valor<br />
44<br />
NELSON PEREIRA<br />
Director, Tax Services<br />
A maioria das<br />
transações intragrupo<br />
ainda é valorizada<br />
segundo métod<strong>os</strong> de<br />
preç<strong>os</strong> de transferência<br />
que apenas analisam<br />
um lado da transação.<br />
No contexto destes métod<strong>os</strong>, é<br />
determinada uma medida confiável<br />
no que respeita a<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong><br />
que uma parte da transação, se<br />
independente, iria realizar, sendo<br />
o “lucro residual” capturado<br />
pela contraparte da mesma<br />
transação. A exceção aplicável<br />
aplica-se, naturalmente, quando<br />
mais de uma parte da mesma<br />
transação faz contribuições<br />
que não podem ser avaliadas de<br />
forma fiável com <strong>os</strong> benchmarks<br />
disponíveis, devendo neste caso<br />
o método do fracionamento do<br />
lucro (“MFL”) ser selecionado.<br />
Esta abordagem encontra-se<br />
atualmente em destaque devido<br />
à maior transparência para<br />
as autoridades tributárias (“AT”)<br />
do lucro total da cadeia de valor<br />
e onde o mesmo é reconhecido<br />
para efeit<strong>os</strong> fiscais, em resultado<br />
d<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong> de country-bycountry<br />
reporting n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> da<br />
Ação 13 do Projeto BEPS (com a<br />
crescente implementação destes<br />
requisit<strong>os</strong> a nível mundial.<br />
Neste contexto, as AT têm agora<br />
uma visão geral da cadeia de<br />
valor completa providenciada<br />
pelo contribuinte no country-bycountry<br />
reporting e, sobretudo,<br />
visibilidade quanto às atividades<br />
rotineiras e não rotineiras).<br />
Mas, mais do que isso, num<br />
mundo de múltipl<strong>os</strong> intangíveis<br />
e contribuições através de toda a<br />
cadeia de valor, <strong>os</strong> métod<strong>os</strong> tradicionais<br />
podem falhar e tornase<br />
cada vez mais provável que o<br />
MFL seja aplicado. Não se trata<br />
apenas do resultado de uma<br />
qualquer alteração regulamentar<br />
mas sim o resultado de mudanças<br />
na realidade d<strong>os</strong> negóci<strong>os</strong><br />
que tornam <strong>os</strong> designad<strong>os</strong> métod<strong>os</strong><br />
tradicionais de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência mais difíceis de<br />
aplicar. O MFL oferece-se como<br />
uma solução para operações altamente<br />
integradas para as quais<br />
não seria apropriado aplicar um<br />
método que apenas analisa um<br />
lado da transação. Ademais,<br />
como ambas as partes da transação<br />
são avaliadas, a divisão de<br />
lucr<strong>os</strong> de eficiências conjuntas é<br />
assegurada o que satisfaz tanto<br />
<strong>os</strong> contribuintes como as AT.<br />
Devido à crescente integração<br />
das empresas multinacionais
Tributação Empresarial<br />
(“EM”) e à globalização das economias<br />
e mercad<strong>os</strong> nacionais, a<br />
clarificação do MFL foi uma das<br />
prioridades identificadas no<br />
âmbito do Projeto BEPS. Assim,<br />
a OCDE, em resp<strong>os</strong>ta à missão<br />
subjacente ao Projeto BEPS relativamente<br />
ao desenvolvimento<br />
de regras com o intuito de assegurar<br />
a alocação de lucr<strong>os</strong> em<br />
linha com a real criação de valor,<br />
reviu recentemente as orientações<br />
fornecidas para a aplicação<br />
do MFL, que clarificam e expandem<br />
significativamente as orientações<br />
anteriormente existentes<br />
sobre quando será mais apropriado<br />
aplicar o MFL.<br />
O parágrafo 2.124 destas orientações<br />
revistas é particularmente<br />
relevante ao referir que “Por<br />
vezes argumenta-se que o MFL<br />
é raramente utilizado entre empresas<br />
independentes, pelo que<br />
a sua aplicação em transações<br />
vinculadas deve ser similarmente<br />
raro. Quando tal método for<br />
considerado o mais apropriado,<br />
isso não deve ser tido em consideração<br />
dado que <strong>os</strong> métod<strong>os</strong><br />
de preç<strong>os</strong> de transferência não<br />
se destinam necessariamente a<br />
replicar um comportamento de<br />
plena concorrência, mas antes<br />
a servir como um meio de estabelecer<br />
e/ou verificar resultad<strong>os</strong><br />
de plena concorrência para transações<br />
vinculadas.”.<br />
Em suporte, e de forma complementar<br />
às orientações revistas, o<br />
EU Joint Transfer Pricing Forum<br />
publicou no passado mês de<br />
março um documento sobre a<br />
aplicação do MFL. Este documento<br />
concluiu que não existe uma<br />
correlação direta entre o MFL e<br />
um setor específico (sendo antes<br />
aplicado em divers<strong>os</strong> setores), e<br />
sobretudo que este método não<br />
é usado muito frequentemente<br />
e que, quando usado, tal ocorre<br />
principalmente no contexto de<br />
procediment<strong>os</strong> de acord<strong>os</strong> prévi<strong>os</strong><br />
de preç<strong>os</strong> de transferência.<br />
Ainda segundo esta pesquisa,<br />
a escolha de fatores apropriad<strong>os</strong><br />
de fracionamento, <strong>os</strong> seus<br />
pes<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> e a avaliação<br />
das contribuições, especialmente<br />
contribuições heterogéneas,<br />
constituem <strong>os</strong> principais desafi<strong>os</strong><br />
para a aplicação do MFL. Não<br />
obstante, é também referido que<br />
existe a p<strong>os</strong>sibilidade do MFL ser<br />
aplicado mais frequentemente<br />
no futuro devido ao surgimento<br />
de nov<strong>os</strong> model<strong>os</strong> de negócio.<br />
Com efeito, a prop<strong>os</strong>ta de diretiva<br />
da Comissão Europeia que estabelece<br />
regras relativas à tributação<br />
das sociedades com uma<br />
presença digital significativa (21<br />
de março de 2018) refere explicitamente<br />
que o MFL é o método<br />
mais apropriado para alocar lucr<strong>os</strong><br />
na economia digital.<br />
Face ao exp<strong>os</strong>to, as orientações<br />
revistas de aplicação do MFL irão<br />
provavelmente colocar mais ênfase<br />
no delineamento da transação,<br />
incluindo a determinação<br />
sobre se as partes providenciam<br />
contribuições únicas e vali<strong>os</strong>as<br />
bem como a seleção da metodologia<br />
mais apropriada. Estes<br />
desenvolviment<strong>os</strong> terão impacto<br />
tanto em EM que atualmente<br />
não aplicam o MFL como em EM<br />
que já aplicam o MFL, sendo que<br />
estes últim<strong>os</strong> devem avaliar se<br />
as atuais políticas de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência estão alinhadas<br />
com estas orientações revistas<br />
ou se exigem mudanças.<br />
45
Tributação Empresarial<br />
NUNO MELO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Ampliação do conceito<br />
de gast<strong>os</strong> de financiamento<br />
- clarificação inócua<br />
ou alteração relevante<br />
com efeit<strong>os</strong> prátic<strong>os</strong>?<br />
46<br />
Com a transp<strong>os</strong>ição<br />
da ATAD 1 (Anti Tax<br />
Avoidance Directive)<br />
para o ordenamento<br />
jurídico-fiscal<br />
português, procedeuse<br />
a uma ampliação<br />
do conceito de “gast<strong>os</strong><br />
de financiamento”<br />
constante do recémmodificado<br />
n.º 12 do<br />
artigo 67.º do Código<br />
do Imp<strong>os</strong>to sobre o<br />
Rendimento das Pessoas<br />
Coletivas (CIRC).<br />
Com a transp<strong>os</strong>ição da ATAD 1<br />
(Anti Tax Avoidance Directive)<br />
para o ordenamento jurídico-fiscal<br />
português – que veio fortalecer<br />
<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> anti-abuso<br />
ao dispor da Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (“AT”), conforme<br />
já foi devidamente abordado em<br />
anteriores artig<strong>os</strong> neste mesmo<br />
espaço – na sequência da publicação<br />
recente da Lei n.º 32/2019,<br />
de 3 de maio, procedeu-se a uma<br />
ampliação do conceito de “gast<strong>os</strong><br />
de financiamento” constante<br />
do recém-modificado n.º 12 do<br />
artigo 67.º do Código do Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento das Pessoas<br />
Coletivas (CIRC).<br />
Este alargamento de conceito,<br />
atendendo ao caráter anti-abuso<br />
da norma, parece ter como<br />
consequência mais imediata o<br />
aumento do número de itens a<br />
considerar pelo contribuinte no<br />
cálculo d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de financiamento<br />
com relevância fiscal, o<br />
que, poderá implicar para aqueles<br />
que se encontrem em situações<br />
limite (i.e., que aproveitam<br />
a dedução até ao teto máximo<br />
ou o excedem residualmente) o<br />
aumento d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> contabilístic<strong>os</strong><br />
de natureza financeira cuja<br />
dedução não será fiscalmente<br />
permitida.<br />
Independentemente da materialização<br />
prática destas consequências,<br />
certo é que, com o<br />
alargamento do conceito parece<br />
pelo men<strong>os</strong> que a AT passará a<br />
poder escrutinar de forma mais<br />
incisiva o apuramento do montante<br />
de gast<strong>os</strong> de financiamento,<br />
o que poderá ter como consequência<br />
a eventual negação da<br />
dedutibilidade de cert<strong>os</strong> gast<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong>, em contraponto ao<br />
que acontecia antes da referida<br />
alteração legislativa.<br />
Uma das novidades intrigantes<br />
da nova redação ampliada da<br />
norma é a aparente necessidade<br />
sentida pelo legislador de acrescentar,<br />
entre outras situações,<br />
e para além d<strong>os</strong> já expectáveis<br />
jur<strong>os</strong> de descobert<strong>os</strong> bancári<strong>os</strong><br />
e de empréstim<strong>os</strong> obtid<strong>os</strong> a curto<br />
e longo praz<strong>os</strong> ou quaisquer<br />
importâncias devidas ou imputadas<br />
à remuneração de capitais<br />
alhei<strong>os</strong>, <strong>os</strong> “montantes calculad<strong>os</strong><br />
por referência ao retorno de<br />
um financiamento no âmbito das<br />
regras em matéria de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência”.<br />
Isto porque, já anteriormente à<br />
alteração legislativa, era comummente<br />
acolhida a interpretação<br />
de que a dedução fiscal de gast<strong>os</strong><br />
de financiamento referentes<br />
a operações em que o mutuário<br />
e o mutuante se encontravam em<br />
situação de relações especiais,<br />
se encontrava implicitamente<br />
sujeita à observância das regras<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência. Esta<br />
interpretação decorria da referência<br />
expressa no artigo 63.º<br />
do CIRC às operações financeiras<br />
como estando sujeitas às regras<br />
de preç<strong>os</strong> de transferências e, por<br />
conseguinte, <strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de financiamento<br />
inerentes às mesmas<br />
também. O próprio enquadramento<br />
sistemático d<strong>os</strong> dois artig<strong>os</strong><br />
no CIRC acentuava e reforçava<br />
esta mesma interpretação.<br />
Assim, a necessidade de espelhar<br />
esta realidade na nova redação<br />
da alínea a) do número 12.º<br />
do artigo 67.º do CIRC, encerra algumas<br />
dúvidas quanto às realidades<br />
que se pretendem abarcar<br />
ou reforçar, para além daquelas<br />
que eram, desde logo, aceites e<br />
implicitamente já abrangidas.<br />
Em primeiro lugar, se é de sublinhar<br />
a novidade na referência<br />
expressa ao conceito de preç<strong>os</strong><br />
de transferência, causa alguma<br />
estranheza que, para efeit<strong>os</strong> da<br />
definição de um conceito de gast<strong>os</strong><br />
de financiamento, se coloque<br />
a tónica no retorno (i.e., rendimento)<br />
de um financiamento<br />
à luz das regras de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência e não no gasto em
Tributação Empresarial<br />
si, sujeito a limitação na dedução<br />
fiscal.<br />
Em segundo lugar, a nova redação<br />
parece impor o recurso, a priori,<br />
às regras de preç<strong>os</strong> de transferência<br />
para o simples efeito de<br />
apurar o montante de gast<strong>os</strong> de<br />
financiamento a considerar para<br />
efeit<strong>os</strong> fiscais, independentemente<br />
da sua existência contabilística<br />
ou da materialização de<br />
correções efetivas de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência promovidas pela AT<br />
perante a constatação desta(s)<br />
discrepância(s).<br />
Por fim, a referência às normas<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência,<br />
poderá ser vista como uma<br />
“presunção de jur<strong>os</strong>” sujeita às<br />
regras de mercado, particularmente<br />
i) em situações de discrepância<br />
entre a taxa de juro aplicada<br />
ou não e a que decorreria<br />
da aplicação do princípio de plena<br />
concorrência, ii) onde a lei comercial<br />
admita a sua inexistência,<br />
mesmo perante situações de<br />
relações especiais (participações<br />
iguais ou superiores a 20%), nomeadamente<br />
em operações de<br />
supriment<strong>os</strong> não remunerad<strong>os</strong>.<br />
Nesta perspetiva, ao abrigo da<br />
nova redação também poderão<br />
ser abrangid<strong>os</strong> pelo conceito de<br />
gast<strong>os</strong> de financiamento aqueles<br />
que seriam suportad<strong>os</strong> a título<br />
de sald<strong>os</strong> intragrupo de dívidas<br />
comerciais não remunerad<strong>os</strong>,<br />
contas correntes entre sede e<br />
sucursal, entre outras realidades.<br />
Neste contexto, impõe-se que<br />
<strong>os</strong> contribuintes avaliem e tomem<br />
consciência das eventuais<br />
implicações práticas destas alterações<br />
no cálculo d<strong>os</strong> respetiv<strong>os</strong><br />
gast<strong>os</strong> de financiamento e das<br />
consequências daí decorrentes<br />
no IRC a pagar, devendo, pois, revisitar<br />
proactivamente <strong>os</strong> term<strong>os</strong><br />
e condições das operações de<br />
financiamento intragrupo. Uma<br />
abordagem reativa poderá, em<br />
determinadas situações, trazer<br />
surpresas indesejáveis.<br />
Será esta evolução do conceito<br />
de gast<strong>os</strong> de financiamento uma<br />
mera clarificação inócua em term<strong>os</strong><br />
prátic<strong>os</strong> ou acarreta ténues<br />
alterações com impact<strong>os</strong> prátic<strong>os</strong><br />
reais?<br />
A alteração do léxico fiscal<br />
PAULO MENDONÇA<br />
Partner, Tax Services<br />
De uma forma ou<br />
outra, quem lida com<br />
frequência com temas<br />
fiscais já se deparou<br />
com expressões que<br />
envolvem remissões para<br />
a ação x, y ou z do BEPS<br />
(“Base Er<strong>os</strong>ion and Profit<br />
Shifting”), referências<br />
à ICA (“International<br />
Compliance<br />
Assurance”), ao prazo<br />
para entrega do CbCR<br />
(“Country-by-Country<br />
Report”) ou, ainda, à<br />
relevância crescente<br />
do MLI (“Multilateral<br />
Instrument”), entre<br />
outr<strong>os</strong>.<br />
Estes acrónim<strong>os</strong> são o produto<br />
do que parece ser uma atitude<br />
mais do que proativa de algumas<br />
instituições supranacionais,<br />
principalmente a Organização de<br />
Cooperação e Desenvolvimento<br />
Económico (“OCDE”) e a União<br />
Europeia, com algumas tentativas<br />
de aproximação ao pelotão<br />
da frente por parte da Organização<br />
das Nações Unidas (embora<br />
esta última, diga-se em abono<br />
da verdade, mais preocupada<br />
com aspet<strong>os</strong> fiscais relacionad<strong>os</strong><br />
com <strong>os</strong> países em vias de desenvolvimento),<br />
que se assemelha,<br />
perig<strong>os</strong>amente, a uma corrida<br />
para ver quem apresenta mais<br />
trabalho no mais curto espaço<br />
de tempo.<br />
Toda esta hiperatividade criativa<br />
tem vantagens e desvantagens.<br />
No plano das vantagens, assinala-se<br />
o grande desenvolvimento<br />
e a densificação de alguns<br />
conceit<strong>os</strong> e de temas com que<br />
<strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong>, principalmente<br />
as empresas, têm que<br />
lidar amiúde. Refiro apenas, para<br />
simplificar, de entre as 15 publicadas,<br />
a medida 1 do BEPS que<br />
endereça o tema muito atual<br />
d<strong>os</strong> desafi<strong>os</strong> fiscais da economia<br />
digital, e a medida 7, relativa<br />
ao tema d<strong>os</strong> estabeleciment<strong>os</strong><br />
estáveis. No que respeita a desvantagens,<br />
encontram<strong>os</strong> uma<br />
agenda que condiciona <strong>os</strong> Estad<strong>os</strong><br />
a alterarem radicalmente,<br />
e muito rapidamente, as suas<br />
leis fiscais, muitas vezes sem o<br />
tempo necessário para equacionar<br />
se essas alterações, sempre<br />
justificadas com o argumento do<br />
combate às práticas fiscais abusivas,<br />
não implicam, no médio/<br />
longo prazo, uma perda efetiva<br />
de receita, seja pela falta de estabilidade<br />
do sistema fiscal, que<br />
afasta muit<strong>os</strong> investidores, seja<br />
porque direta ou indiretamente<br />
transfere receita para determi-<br />
47
Tributação Empresarial<br />
nadas jurisdições que, pela sua<br />
relevância no contexto internacional,<br />
conseguem condicionar<br />
as decisões que são tomadas no<br />
âmbito destas instituições supranacionais.<br />
Atente-se, por exemplo, no que<br />
propõe a medida 15 do pacote<br />
BEPS (“Developing a Multilateral<br />
Instrument to Modify Bilateral<br />
Tax Treaties” ou MLI). Nada men<strong>os</strong><br />
que o desenvolvimento de<br />
um instrumento multilateral que<br />
pretende modificar <strong>os</strong> tratad<strong>os</strong><br />
bilaterais celebrad<strong>os</strong> entre países<br />
para evitar a dupla tributação.<br />
Embora a ideia seja alinhar<br />
<strong>os</strong> tratad<strong>os</strong> em causa com as<br />
orientações do pacote BEPS, e<br />
sem prejuízo de se tratar de um<br />
processo voluntário, fica claro,<br />
lendo <strong>os</strong> document<strong>os</strong> publicad<strong>os</strong><br />
pela OCDE sobre o tema, que<br />
a ideia prevalecente é a de que<br />
<strong>os</strong> tratad<strong>os</strong> em causa acabam<br />
por fomentar aquilo que o pacote<br />
BEPS pretende combater. Isto<br />
porque tais tratad<strong>os</strong> são aplicad<strong>os</strong><br />
em articulação com a lei fiscal<br />
de cada um d<strong>os</strong> países contratantes<br />
e porque existe uma<br />
grande disparidade nas cláusulas<br />
negociadas e aceites n<strong>os</strong> diferentes<br />
instrument<strong>os</strong> subscrit<strong>os</strong><br />
por cada país. E que esses fact<strong>os</strong><br />
geram oportunidades para abuso<br />
e aproveitamento em term<strong>os</strong><br />
de minimização artificial da carga<br />
fiscal.<br />
Ora, a razão fundamental para a<br />
assinatura de tratad<strong>os</strong> bilaterais<br />
assenta, precisamente, num processo<br />
negocial em que cada um<br />
d<strong>os</strong> países avalia a sua p<strong>os</strong>ição e<br />
tenta fazer valer <strong>os</strong> argument<strong>os</strong><br />
e as cláusulas que lhe são mais<br />
convenientes ou men<strong>os</strong> desvantaj<strong>os</strong>as,<br />
tendo por pano de<br />
fundo a intenção de eliminar <strong>os</strong><br />
fenómen<strong>os</strong> de dupla tributação<br />
que ocorrem nas transações internacionais.<br />
E já nem menciono<br />
o processo formal de aprovação,<br />
muito complexo, que o n<strong>os</strong>so<br />
ordenamento jurídico preconiza<br />
para que se chegue à fase de ratificação<br />
de um instrumento desta<br />
natureza. O MLI, como agora se<br />
diz, faz tábua quase rasa de tod<strong>os</strong><br />
estes aspet<strong>os</strong> de relevância nacional.<br />
Parece, na verdade, uma<br />
iniciativa destinada a impor a<br />
muit<strong>os</strong> a vontade de uns pouc<strong>os</strong>.<br />
Ordem de aplicação<br />
d<strong>os</strong> artig<strong>os</strong> 7.o e 9.o da<br />
Convenção-Modelo da OCDE<br />
48<br />
PAULO MENDONÇA<br />
Partner, Tax Services<br />
No seguimento do seu<br />
projeto de combate<br />
à er<strong>os</strong>ão fiscal e<br />
transferência de lucr<strong>os</strong><br />
– Base Er<strong>os</strong>ion and<br />
Profit Shifting (“BEPS”)<br />
– e após vári<strong>os</strong> an<strong>os</strong> de<br />
trabalho, a Organização<br />
para a Cooperação<br />
e Desenvolvimento<br />
Económico (“OCDE”)<br />
desenvolveu 15 ações<br />
que foram entregues<br />
ao G20 em 2015.<br />
Um d<strong>os</strong> principais tópic<strong>os</strong> abordad<strong>os</strong><br />
na Ação 7 do BEPS visa<br />
prevenir o uso de certas estratégias<br />
que têm sido utilizadas<br />
como forma de contornar a definição<br />
de Estabelecimento Estável<br />
(“EE”). Assim, o relatório “Preventing<br />
the Artificial Avoidance<br />
of Permanent Establishment<br />
Status” no âmbito daquela Ação<br />
(OCDE, 2015) recomenda alterações<br />
à definição de EE constante<br />
no Artigo 5.o da Convenção-Modelo<br />
da OCDE (“CMOCDE”).<br />
As alterações à definição de EE e<br />
a sua correlação com as diretrizes<br />
de outr<strong>os</strong> relatóri<strong>os</strong> do BEPS,<br />
em particular sobre as Ações 8<br />
a 10, foram identificadas no relatório<br />
da Ação 7 como algumas<br />
das principais áreas de preocupação<br />
e de necessidade de<br />
estudo futuro pela OCDE. Neste<br />
âmbito, o relatório da Ação 7 do<br />
BEPS pressupõe o desenvolvimento<br />
de orientações adicionais<br />
no sentido de perceber como é<br />
que a atribuição de lucro a<strong>os</strong><br />
EEs será conjugada com as novas<br />
Orientações de Preç<strong>os</strong> de Transferência<br />
introduzidas pelo relatório<br />
Aligning Transfer Pricing<br />
Outcomes with Value Creation<br />
(OCDE, 2015), no âmbito das referidas<br />
Ações 8 a 10.<br />
Em particular, quando se considera<br />
que um EE existe à luz do<br />
Artigo 5, n.o 5, da CMOCDE, como<br />
consequência das relações de<br />
negócio entre um intermediário<br />
e uma entidade não residente,<br />
essas atividades são relevantes
Tributação Empresarial<br />
para dois sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> no<br />
h<strong>os</strong>t country: o intermediário (o<br />
qual pode ser residente nessa<br />
jurisdição) e o EE (dessa entidade<br />
não residente). A remuneração<br />
de plena concorrência<br />
do intermediário pel<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />
que este presta à entidade não<br />
residente é um d<strong>os</strong> element<strong>os</strong><br />
que precisa ser determinado e<br />
deduzido do cálculo d<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong><br />
atribuíveis ao EE, de acordo com<br />
o Artigo 7.o da CMOCDE.<br />
Em cert<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, o intermediário<br />
e a entidade não residente são<br />
entidades relacionadas. Nestes<br />
cenári<strong>os</strong>, tanto o Artigo 9.o como<br />
o Artigo 7.o entram em cena, por<br />
forma a determinar o montante<br />
de lucr<strong>os</strong> total que deve ser<br />
tributado no h<strong>os</strong>t country. Enquanto<br />
o Artigo 9.o permite a<br />
realização de ajustament<strong>os</strong> ao<br />
lucro tributável de entidades<br />
relacionadas, se <strong>os</strong> term<strong>os</strong> e<br />
condições das transações entre<br />
estas (i.e., entre a entidade não<br />
residente e o intermediário) não<br />
forem consistentes com o princípio<br />
de plena concorrência, o Artigo<br />
7.o determina a base na qual<br />
<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> são atribuíveis ao EE da<br />
entidade não residente.<br />
Neste sentido, quando, em julho<br />
de 2016 e em junho de 2017,<br />
o Comité de Assunt<strong>os</strong> Fiscais da<br />
OCDE emitiu dois drafts para discussão<br />
pública acerca da atribuição<br />
de lucr<strong>os</strong> a<strong>os</strong> EEs e convidou<br />
todas as partes interessadas a<br />
comentar a prop<strong>os</strong>ta de orientações<br />
adicionais relativamente<br />
à aplicação das regras do Artigo<br />
7.o da CMOCDE para EEs, resultantes<br />
de alteração ao Artigo 5.o<br />
da mesma Convenção-Modelo,<br />
uma das principais preocupações<br />
levantadas relacionava-se<br />
com a ordem pela qual <strong>os</strong> referid<strong>os</strong><br />
Artig<strong>os</strong> 7.o e 9.o deveriam<br />
ser aplicad<strong>os</strong>.<br />
Neste sentido, no recente relatório<br />
final da Additional Guidance<br />
on the Attribution of Profits to<br />
Permanent Establishments (“Additional<br />
Guidance”) publicado<br />
a 22 de março de 2018, a OCDE<br />
volta a insistir que a ordem de<br />
aplicação d<strong>os</strong> Artig<strong>os</strong> 7.o e 9.o da<br />
CMOCDE não deve ser relevante<br />
na determinação d<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong><br />
atribuíveis ao envolvimento do<br />
intermediário, desde que seja<br />
aplicada uma abordagem consistente.<br />
Neste âmbito, a OCDE esclarece<br />
que “A CMOCDE e <strong>os</strong> seus comentári<strong>os</strong><br />
não referem, explicitamente,<br />
se um ajustamento ao<br />
lucro tributável à luz do Artigo<br />
9.o deva preceder a atribuição<br />
de lucr<strong>os</strong> conforme o Artigo 7.o.<br />
Contudo, várias jurisdições consideram<br />
lógico e eficiente determinar<br />
primeiramente o lucro de<br />
plena concorrência resultante,<br />
enquanto outras podem decidir<br />
desenvolver uma análise primeiro<br />
à luz do Artigo 7.o e só depois<br />
aplicar o Artigo 9.o”. Neste sentido,<br />
a OCDE volta a repetir que a<br />
ordem de aplicação d<strong>os</strong> artig<strong>os</strong><br />
“não deve<br />
influenciar o montante de lucr<strong>os</strong><br />
sobre o qual o “h<strong>os</strong>t country”<br />
tem direit<strong>os</strong> à tributação, como<br />
resultado das atividades do intermediário”.<br />
Adicionalmente, a OCDE enfatiza,<br />
uma vez mais, que “a abordagem<br />
adotada por uma jurisdição deve<br />
ser aplicada de forma consistente<br />
e deve ser tornada pública<br />
para garantir a transparência<br />
e aumentar a segurança para<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong>. Ademais,<br />
qualquer abordagem adotada<br />
na aplicação d<strong>os</strong> Artig<strong>os</strong> 7.o e<br />
9.o da CMOCDE para <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de<br />
EEs à luz do Artigo 5, n.o 5, deve<br />
garantir que não existe dupla tributação<br />
no h<strong>os</strong>t country, i.e., tributação<br />
d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> auferid<strong>os</strong><br />
pelo EE (de acordo com<br />
as regras de atribuição de lucro)<br />
e auferid<strong>os</strong> pelo intermediário<br />
(de acordo com as regras de preç<strong>os</strong><br />
de transferência)”.<br />
O relatório final Additional Guidance<br />
também ressalva a situação<br />
de não alinhamento entre<br />
as significant people functions<br />
para <strong>os</strong> efeit<strong>os</strong> da Authorized<br />
OECD Approach e as funções de<br />
controlo de risco para efeit<strong>os</strong><br />
de aplicação do Artigo 9.o da<br />
CMOCDE, a qual tem sido identificada<br />
como uma preocupação<br />
adicional d<strong>os</strong> stakeholders.<br />
Neste âmbito, a OCDE especifica<br />
que, “apesar de poderem existir<br />
funções que podem ser consideradas<br />
como “significant people<br />
functions” para efeit<strong>os</strong> do Artigo<br />
7.o e funções de controlo de risco<br />
para propósit<strong>os</strong> do Artigo 9.o,<br />
não se pode concluir que estes<br />
dois conceit<strong>os</strong> estão alinhad<strong>os</strong><br />
ou que podem ser considerad<strong>os</strong><br />
permutáveis”.<br />
Quando amb<strong>os</strong> <strong>os</strong> Artig<strong>os</strong> da<br />
CMOCDE são aplicáveis e as funções<br />
do intermediário podem<br />
ser classificadas como significant<br />
people functions e como<br />
funções de controlo de risco, a<br />
OCDE refere que é importante<br />
assegurar que o risco associado<br />
a essas funções não é “simultaneamente<br />
alocado ao intermediário<br />
e ao EE”, uma vez que tal<br />
pode levar a uma situação de<br />
dupla tributação. Adicionalmente,<br />
é referido que “é importante<br />
notar que <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> à tributação<br />
do “h<strong>os</strong>t country” não são<br />
necessariamente esgotad<strong>os</strong> por<br />
ser garantida uma compensação<br />
de plena concorrência para o intermediário”.<br />
49
Tributação Empresarial<br />
Transações com paraís<strong>os</strong><br />
fiscais: novo olhar<br />
da AT e da jurisprudência<br />
50<br />
PEDRO FUGAS<br />
Partner, Tax Services<br />
No âmbito de um<br />
conjunto de ações de<br />
inspeção realizadas pela<br />
Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (AT) a<br />
sociedades de mediação<br />
e revenda imobiliária,<br />
a AT procedeu a<br />
liquidações adicionais<br />
de IRC pela aquisição<br />
de serviç<strong>os</strong> de promoção<br />
imobiliária e de<br />
marketing a sociedades<br />
residentes em Hong<br />
Kong (que, apesar<br />
de ter, desde 2012, uma<br />
Convenção para evitar<br />
a dupla tributação<br />
em vigor com Portugal,<br />
continua na lista de<br />
“paraís<strong>os</strong> fiscais”).<br />
Durante o período da crise, estas<br />
sociedades contrataram serviç<strong>os</strong><br />
de promoção junto de entidades<br />
residentes em Hong Kong com o<br />
fim de atrair potenciais compradores<br />
residentes na China continental<br />
para adquirirem imóveis<br />
em Portugal e assim poderem<br />
beneficiar do programa de “Vist<strong>os</strong><br />
Gold”. No âmbito de um conjunto<br />
de decisões que se encontram a<br />
ser publicadas pelo CAAD, <strong>os</strong> contrat<strong>os</strong><br />
estabelecid<strong>os</strong> previam que<br />
cabia à sociedade não residente<br />
a realização de um conjunto de<br />
ações de promoção tendo como<br />
contrapartida o pagamento pela<br />
entidade portuguesa de uma comissão<br />
pela venda do imóvel no<br />
momento em que o mesmo f<strong>os</strong>se<br />
alienado.<br />
N<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do Código do IRC, não<br />
são aceites <strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> decorrentes<br />
do pagamento de importâncias<br />
a qualquer título, a pessoas<br />
singulares ou coletivas residentes<br />
em países, territóri<strong>os</strong> ou regiões<br />
com regime claramente mais favorável<br />
(i.e., paraís<strong>os</strong> fiscais) salvo<br />
se o contribuinte provar que tais<br />
encarg<strong>os</strong> correspondem a operações<br />
efetivamente realizadas e<br />
não têm um caráter anormal ou<br />
um montante exagerado.<br />
N<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> em análise, por forma<br />
a demonstrar que foi efetivamente<br />
realizado, tratando-se de serviç<strong>os</strong><br />
de promoção e marketing,<br />
a AT exigia que o serviço não só<br />
f<strong>os</strong>se suportado por um contrato<br />
e pelas respetivas faturas, como<br />
também f<strong>os</strong>se demonstrado que<br />
o serviço foi efetivamente realizado,<br />
designadamente, através da<br />
apresentação de estud<strong>os</strong>, panflet<strong>os</strong><br />
que tenham sido elaborad<strong>os</strong>,<br />
ou de outro material promocional<br />
ou de conferências.<br />
Ademais, ascendendo as comissões<br />
cobradas a valores muito<br />
acima das comissões normalmente<br />
cobradas no mercado<br />
português, a AT concluiu que as<br />
mesmas não seguiam o padrão<br />
do mercado, sendo exageradas.<br />
Não obstante <strong>os</strong> mérit<strong>os</strong> da<br />
análise da AT, as decisões publicadas<br />
pelo CAAD têm sido genericamente<br />
favoráveis a<strong>os</strong> contribuintes,<br />
porque, para efeit<strong>os</strong> do<br />
requisito da efetiva realização<br />
d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong>, abonou em favor<br />
d<strong>os</strong> contribuintes o facto de só<br />
serem pagas comissões com a<br />
venda d<strong>os</strong> imóveis, e ainda que,<br />
antes da venda destes imóveis,<br />
estas sociedades se encontravam<br />
numa situação financeira muito<br />
frágil e terem passiv<strong>os</strong> bancári<strong>os</strong><br />
avultad<strong>os</strong>.<br />
Adicionalmente, tendo em conta<br />
o elevado valor d<strong>os</strong> imóveis<br />
vendid<strong>os</strong>, sem o apoio destes<br />
intermediári<strong>os</strong>, as sociedades<br />
portuguesas não teriam dimensão<br />
e condições financeiras para<br />
chegar ao mercado asiático, pelo<br />
que <strong>os</strong> tribunais têm admitido<br />
que não se trataram de valores<br />
excessiv<strong>os</strong> e que não podem ter<br />
comparável no mercado.<br />
Destes cas<strong>os</strong>, podem-se extrair<br />
duas conclusões principais: por<br />
um lado, a AT está efetivamente<br />
atenta às operações com contrapartes<br />
em paraís<strong>os</strong> fiscais, mas<br />
por outro lado, destas decisões,<br />
é p<strong>os</strong>sível retirar quais as traves<br />
mestras da orientação da AT nesta<br />
matéria.
PEDRO FUGAs<br />
Partner, Tax Services<br />
RITA VAZ<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Muito se tem falado<br />
do novo regime do novo<br />
Regime Jurídico do Registo<br />
Central do Beneficiário<br />
Efetivo (“RCBE”).<br />
Recapitulando: o RCBE veio impor,<br />
para um amplo conjunto de<br />
entidades (incluindo empresas,<br />
associações, fundações e fund<strong>os</strong>),<br />
a obrigação de (i) manter<br />
atualizad<strong>os</strong> regist<strong>os</strong> intern<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />
sóci<strong>os</strong>, com discriminação das<br />
respetivas participações sociais,<br />
de pessoas singulares que detêm,<br />
ainda que de forma indireta,<br />
a propriedade das participações<br />
sociais e de quem detenha o controlo<br />
efetivo, e (ii) divulgar informações<br />
detalhadas sobre <strong>os</strong> seus<br />
beneficiári<strong>os</strong> efetiv<strong>os</strong>.<br />
Enquanto que a primeira obrigação<br />
acima referida deverá estar já<br />
a ser observada, a submissão da<br />
primeira declaração para dar cumprimento<br />
à segunda obrigação, viu<br />
ser alargado o prazo de dia 30 de<br />
abril para o dia 30 de junho de<br />
2019. Assim, as entidades nas condições<br />
referidas são obrigadas a<br />
O impacto fiscal<br />
da divulgação do beneficiário<br />
efetivo nas distribuições<br />
de dividend<strong>os</strong><br />
Tributação Empresarial<br />
submeter o formulário anual do<br />
beneficiário efetivo junto do RCBE,<br />
atualizando as informações nele<br />
contidas no prazo de 30 dias contad<strong>os</strong><br />
de futuras alterações.<br />
De acordo com o referido regime<br />
legal, as entidades que não cumpram<br />
as obrigações declarativas<br />
decorrentes do RCBE ficarão sujeitas<br />
a um conjunto alargado de<br />
sanções, entre as quais, a imp<strong>os</strong>sibilidade<br />
de distribuição lucr<strong>os</strong>,<br />
de celebrar ou renovar contrat<strong>os</strong><br />
com entidades públicas, de colocar<br />
instrument<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong> em<br />
mercad<strong>os</strong> regulad<strong>os</strong>, de aceder<br />
a fund<strong>os</strong> europeus ou de intervir<br />
como parte em negóci<strong>os</strong> que<br />
tenham por objeto a transmissão<br />
de direit<strong>os</strong> reais sobre imóveis.<br />
No entanto, o impacto deste regime<br />
não é meramente legal. A entrada<br />
em vigor deste diploma introduziu<br />
importantes alterações<br />
ao nível da isenção de retenção<br />
na fonte de dividend<strong>os</strong>, conforme<br />
verem<strong>os</strong>.<br />
Regra geral, <strong>os</strong> dividend<strong>os</strong> distribuíd<strong>os</strong><br />
por entidades residentes<br />
em Portugal a não residentes são<br />
sujeit<strong>os</strong> a retenção na fonte à taxa<br />
de 25%. Contudo, caso se cumpra<br />
um conjunto de requisit<strong>os</strong> objetiv<strong>os</strong><br />
(como sejam o nível e período<br />
de detenção da participação)<br />
e formais (como, por exemplo,<br />
a prova que as condições estão<br />
cumpridas), bem como não sendo<br />
aplicável a norma específica<br />
anti-abuso aí referida, não haverá<br />
lugar a retenção na fonte.<br />
Ora, na sequência da criação do<br />
RCBE, ainda que <strong>os</strong> referid<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong><br />
objetiv<strong>os</strong> e formais se<br />
encontrem cumprid<strong>os</strong>, a isenção<br />
acima referida não é aplicável<br />
quando a entidade residente em<br />
território português, que coloca<br />
<strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> e reservas à disp<strong>os</strong>ição,<br />
não tenha cumprido as obrigações<br />
declarativas previstas no<br />
Regime Jurídico do RCBE.<br />
Também muito relevante e que,<br />
de alguma forma, parece ter passado<br />
despercebida, é a introdução<br />
da norma que prevê que nas<br />
situações em que a obrigação é<br />
cumprida mas algum d<strong>os</strong> beneficiári<strong>os</strong><br />
efetiv<strong>os</strong> declarad<strong>os</strong> tenha<br />
residência num país, território ou<br />
região sujeito a um regime fiscal<br />
claramente mais favorável (vulgo<br />
“paraís<strong>os</strong> fiscais”), a isenção de<br />
retenção na fonte não se aplica,<br />
exceto se o sujeito passivo comprovar<br />
que a sociedade beneficiária<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> não integra<br />
uma construção ou série de construções<br />
que não seja considerada<br />
genuína (i.e., não seja realizada<br />
por razões económicas válidas e<br />
não reflita substância económica).<br />
Trata-se, pois, de uma clara inversão<br />
do ónus da prova, passando a<br />
recair sobre a entidade portuguesa,<br />
distribuidora d<strong>os</strong> dividend<strong>os</strong>, a<br />
prova de que a norma anti-abuso<br />
prevista naquele artigo não se<br />
aplica ao caso em concreto.<br />
Em conclusão, prevê-se que o<br />
período que se seguirá após o<br />
prazo para efetuar a submissão<br />
da primeira declaração do RCBE<br />
seja de elevado escrutínio por<br />
parte da Autoridade Tributária e<br />
Aduaneira.<br />
51
Tributação Empresarial<br />
PEDRO PAIVA<br />
Partner, Tax Services<br />
As mudanças, a nível<br />
global, nas regras de<br />
dedutibilidade fiscal<br />
d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> (estimuladas<br />
pelo projeto BEPS) estão<br />
a começar a alterar a<br />
atratividade relativa entre<br />
o financiamento das<br />
empresas por capitais<br />
alhei<strong>os</strong> ou por capitais<br />
própri<strong>os</strong>, determinando<br />
alterações nas políticas<br />
governamentais<br />
e comportament<strong>os</strong><br />
empresariais<br />
que se prolongaram<br />
por várias décadas.<br />
As novas regras fiscais<br />
estão a alterar a forma<br />
de financiamento<br />
d<strong>os</strong> negóci<strong>os</strong><br />
A OCDE propôs uma limitação à<br />
dedutibilidade fiscal d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong><br />
em 2015, quando emitiu o relatório<br />
final sobre a Ação 4 do BEPS.<br />
A OCDE justificou sua p<strong>os</strong>ição,<br />
argumentando que as empresas<br />
multinacionais podem: (i) colocar<br />
seletivamente níveis mais<br />
elevad<strong>os</strong> de dívida de terceir<strong>os</strong><br />
em países de elevada tributação;<br />
(ii) usar empréstim<strong>os</strong> intragrupo<br />
para gerar situações de dedução<br />
fiscal de jur<strong>os</strong> acima da despesa<br />
efetiva que <strong>os</strong> grup<strong>os</strong> têm com<br />
entidades terceiras; e (iii) fazer<br />
empréstim<strong>os</strong> para gerar rendiment<strong>os</strong><br />
isent<strong>os</strong> de imp<strong>os</strong>to<br />
como, por exemplo, dividend<strong>os</strong>.<br />
Segundo a OCDE, todas estas situações<br />
constituem técnicas de<br />
er<strong>os</strong>ão da base tributária ou de<br />
desvio de lucr<strong>os</strong>.<br />
A solução que foi prop<strong>os</strong>ta pela<br />
OCDE consistiu em novas regras<br />
que permitam a dedução fiscal<br />
de encarg<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong> somente<br />
até ao limite de 10% a 30% do<br />
EBITDA (com a grande maioria<br />
d<strong>os</strong> países, incluindo Portugal,<br />
a escolher o limite superior),<br />
existindo uma regra opcional de<br />
aplicação deste rácio ao nível de<br />
um grupo. Portugal foi, em 2013,<br />
d<strong>os</strong> primeir<strong>os</strong> países da OCDE a<br />
aplicar este tipo de regras, ainda<br />
antes da Reforma do IRC de 2014<br />
que introduziu no Código do IRC<br />
um conjunto de recomendações<br />
previstas no Plano BEPS previamente<br />
à sua publicação final.<br />
A nível global continua a existir<br />
um conjunto significativo de<br />
países participantes na iniciativa<br />
BEPS que ainda não adotou<br />
este tipo de regras. No entanto,<br />
entre 2017 e 2018, espera-se que<br />
venham a ser adotadas, por um<br />
conjunto alargado de países,<br />
regras em linha com as prop<strong>os</strong>tas<br />
pela Ação 4 do BEPS ou<br />
outras formas de limitação da<br />
dedutibilidade fiscal de jur<strong>os</strong><br />
(e.g., China, Holanda e Índia).<br />
Adicionalmente, a nova Diretiva<br />
europeia antievasão fiscal, que<br />
entra em vigor em 1 de janeiro<br />
de 2019, limitará a dedutibilidade<br />
fiscal d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> em tod<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong> da UE a 30%<br />
do EBITDA. Desta forma, há um<br />
conjunto muito significativo de<br />
países que se estão a movimentar<br />
na mesma direção, embora<br />
com algumas inconsistências na<br />
abordagem.<br />
Esta tendência determina que as<br />
vantagens fiscais da dívida sobre<br />
o capital estejam a mudar. Anteriormente,<br />
a dívida era, na generalidade<br />
d<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, dedutível<br />
para o devedor e era tributável<br />
na esfera do credor, enquanto o<br />
capital não era dedutível para o<br />
emitente, mas também não era<br />
tributável na esfera do investidor.<br />
Os dois tip<strong>os</strong> de financiamento<br />
eram, numa perspetiva<br />
integrada, iguais, mas, se se considerar<br />
apenas a perspetiva da<br />
entidade financiada, a vantagem<br />
da dívida era inequívoca.<br />
No entanto, há ainda um conjunto<br />
de outr<strong>os</strong> de aspet<strong>os</strong> que tendem<br />
a orientar o financiamento<br />
para o uso da dívida: <strong>os</strong> métod<strong>os</strong><br />
de isenção para evitar a dupla<br />
52
Tributação Empresarial<br />
tributação são, em muit<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>,<br />
apenas parciais e <strong>os</strong> sistemas de<br />
crédito de imp<strong>os</strong>to nem sempre<br />
reconhecem a tributação total<br />
d<strong>os</strong> ganh<strong>os</strong> a partir d<strong>os</strong> quais <strong>os</strong><br />
dividend<strong>os</strong> são pag<strong>os</strong>. Desta forma,<br />
e atendendo a um conjunto<br />
muito alargado de motiv<strong>os</strong>,<br />
a tendência ao longo d<strong>os</strong> an<strong>os</strong><br />
tem sido a de que o financiamento<br />
através de dívida fornece<br />
uma resp<strong>os</strong>ta fiscal muito mais<br />
eficiente.<br />
Esse status quo está a ser alterado<br />
em consequência da já<br />
mencionada Ação 4 do BEPS. A<br />
regra que impõe um limite fixo<br />
impede uma dedução fiscal d<strong>os</strong><br />
jur<strong>os</strong> acima de um certo nível,<br />
mas mantém a sua tributação integral<br />
na esfera do credor, desnivelando<br />
a comparação entre ambas<br />
as fontes de financiamento.<br />
Alguns países (incluindo a própria<br />
UE no âmbito do Diretiva<br />
ainda não aprovada da matéria<br />
coletável comum consolidada<br />
de imp<strong>os</strong>to sobre as sociedades),<br />
embora não tod<strong>os</strong>, estão<br />
a propor e a implementar medidas<br />
no sentido de conferir um<br />
tratamento fiscal mais vantaj<strong>os</strong>o<br />
ao capital, quer através do<br />
nivelamento com o tratamento<br />
fiscal da dívida, quer através<br />
do favorecimento claro do financiamento<br />
através de capital.<br />
Portugal, pressionado por um<br />
endividamento galopante das<br />
empresas na última década, está<br />
neste último grupo de países<br />
com a recente reformulação e<br />
alargamento do regime da remuneração<br />
convencional do capital<br />
social que passou a prever, para<br />
feit<strong>os</strong> fiscais, uma taxa de juro<br />
presumida do capital de 7% que<br />
é claramente acima das taxas de<br />
mercado atuais.<br />
Desta forma, é bastante provável<br />
que, no futuro, existam men<strong>os</strong><br />
certezas e vantagens fiscais<br />
quanto ao uso de instrument<strong>os</strong><br />
de dívida por comparação a instrument<strong>os</strong><br />
de capital próprio. Se<br />
essa tendência se continuar a<br />
consolidar, assistirem<strong>os</strong> a uma<br />
mudança fundamental na forma<br />
como o investimento internacional<br />
é financiado. Isto significará<br />
que, à medida que o nível de dívida<br />
aumente, <strong>os</strong> motiv<strong>os</strong>, de índole<br />
fiscal, para escolher instrument<strong>os</strong><br />
de dívida irão diminuir.<br />
Esta não vai ser, no entanto, uma<br />
equação simples. Existe um conjunto<br />
de outras questões que<br />
acrescentarão complexidade às<br />
decisões e que são igualmente<br />
variáveis dessa equação, tais<br />
como a definição d<strong>os</strong> preç<strong>os</strong> de<br />
transferência da dívida entre<br />
partes relacionadas, a Ação 2 do<br />
BEPS e as p<strong>os</strong>ições da UE sobre<br />
instrument<strong>os</strong> híbrid<strong>os</strong> (i.e., acord<strong>os</strong><br />
que exploram diferenças no<br />
tratamento fiscal de instrument<strong>os</strong><br />
em dois ou mais países), entre<br />
outr<strong>os</strong>.<br />
Em conclusão, <strong>os</strong> cust<strong>os</strong> de financiamento<br />
e o seu tratamento<br />
fiscal são um fator crucial para<br />
qualquer empresa – sobretudo<br />
em situações em que o mercado<br />
de capitais está incipiente,<br />
tal como sucede em Portugal, ou<br />
quando se está em presença de<br />
investiment<strong>os</strong> de private equity<br />
(que tendem a ser altamente<br />
alavancad<strong>os</strong>) ou em process<strong>os</strong><br />
de aquisição. Esta tendência<br />
para restringir a dedutibilidade<br />
d<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> não é nova, mas está<br />
a ganhar um impulso decisivo a<br />
nível global. Com tod<strong>os</strong> estes sinais<br />
e alterações, é, sem dúvida,<br />
a altura ideal para as empresas<br />
fazerem uma avaliação da forma<br />
como <strong>os</strong> seus negóci<strong>os</strong> são<br />
financiad<strong>os</strong>, sob pena de poder<br />
vir a ser muito mais oner<strong>os</strong>o se<br />
essa avaliação for atrasada.<br />
53
Tributação Empresarial<br />
Mudanças nas regras<br />
de tributação da economia<br />
digital arrastam<br />
as restantes empresas<br />
54<br />
PEDRO PAIVA<br />
Partner, Tax Services<br />
No passado mês de<br />
fevereiro, a OCDE<br />
emitiu um documento<br />
para consulta pública<br />
no sentido de obter<br />
comentári<strong>os</strong> sobre<br />
p<strong>os</strong>síveis soluções de<br />
tributação que foram<br />
identificadas para<br />
abordar <strong>os</strong> desafi<strong>os</strong><br />
em matéria de política<br />
fiscal decorrentes<br />
da digitalização<br />
da economia.<br />
O documento está focado em<br />
dois pilares fundamentais consistindo<br />
numa nova abordagem<br />
sobre as formas e competências<br />
de tributação numa economia<br />
global em que as empresas podem<br />
ter negóci<strong>os</strong> em múltiplas<br />
jurisdições sem qualquer presença<br />
física significativa e onde<br />
nov<strong>os</strong> ativ<strong>os</strong> intangíveis têm<br />
cada vez maior relevância.<br />
O primeiro pilar aborda <strong>os</strong> principais<br />
desafi<strong>os</strong> da economia digital<br />
e está focado na atribuição<br />
de direit<strong>os</strong> de tributação entre<br />
<strong>os</strong> divers<strong>os</strong> estad<strong>os</strong>, determinando<br />
a reavaliação das regras<br />
de avaliação da ligação que <strong>os</strong><br />
negóci<strong>os</strong> têm com cada um deles<br />
e o montante de lucro que<br />
deverá ser alocado e, consequentemente,<br />
tributado em cada<br />
estado.<br />
O documento sublinha, por<br />
exemplo, o processo de criação<br />
de valor por parte de empresas<br />
altamente digitalizadas através<br />
de bases alargadas de utilizadores<br />
muito ativ<strong>os</strong>, a<strong>os</strong> quais,<br />
em alguns cas<strong>os</strong>, são solicitad<strong>os</strong><br />
conteúd<strong>os</strong> e contribuições que<br />
constituem componentes crític<strong>os</strong><br />
para essa de criação de valor<br />
(v.g., redes sociais, motores de<br />
busca, etc.). Desta forma, as regras<br />
atuais de alocação de lucr<strong>os</strong><br />
deverão ser alteradas no sentido<br />
de permitir que p<strong>os</strong>sa ser alocado<br />
lucro a<strong>os</strong> estad<strong>os</strong> onde se<br />
localizam essas bases de utilizadores,<br />
independentemente de as<br />
empresas aí terem qualquer tipo<br />
de presença física.<br />
Paralelamente, é também salientado<br />
o processo atual de criação<br />
de intangíveis de marketing<br />
(muitas vezes remotamente) e<br />
a p<strong>os</strong>sibilidade dar lugar a tributação,<br />
independentemente da<br />
residência da entidade que <strong>os</strong> detém,<br />
bem como a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de tributação (em alguns cas<strong>os</strong><br />
por retenção na fonte) de uma<br />
presença económica numa determinada<br />
jurisdição associada<br />
à existência de um fluxo recorrente<br />
de rendiment<strong>os</strong>, independentemente<br />
da existência de<br />
qualquer presença física.<br />
O segundo pilar está focado n<strong>os</strong><br />
desafi<strong>os</strong> que ainda restam do<br />
plano BEPS e estabelece regras<br />
para evitar que determinad<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> sejam sujeit<strong>os</strong> a<br />
uma tributação muito baixa ou<br />
nula. Estas prop<strong>os</strong>tas não visam<br />
apenas <strong>os</strong> negóci<strong>os</strong> digitais e<br />
propõem soluções para assegurar<br />
que <strong>os</strong> grup<strong>os</strong> e empresas<br />
com operações internacionais<br />
paguem um nível mínimo de<br />
tributação (v.g., coletas mínimas<br />
de imp<strong>os</strong>to para determinad<strong>os</strong><br />
grup<strong>os</strong> determinada ao nível d<strong>os</strong><br />
acionistas, imp<strong>os</strong>sibilidade de<br />
acesso a benefíci<strong>os</strong> de Acord<strong>os</strong><br />
para evitar a Dupla Tributação,<br />
caso <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> não estejam<br />
sujeit<strong>os</strong> a uma tributação<br />
mínima, etc.).<br />
A OCDE pretende que este processo<br />
seja tão unanime quanto<br />
p<strong>os</strong>sível tendo previsto que <strong>os</strong><br />
comentári<strong>os</strong> a este documento<br />
deverão servir de base à preparação<br />
de um relatório preliminar
Tributação Empresarial<br />
que será discutido no encontro<br />
d<strong>os</strong> Ministr<strong>os</strong> das Finanças do<br />
G20 a ter lugar em junho de 2019,<br />
tendo em vista a emissão de um<br />
relatório final durante o ano de<br />
2020 e a efetiva aplicação de algumas<br />
medidas já em 2021.<br />
Estas medidas representam uma<br />
nova mudança significativa para<br />
o atual sistema de tributação internacional,<br />
com impact<strong>os</strong> muito<br />
para além da economia digital.<br />
Tal como mencionado acima, estão<br />
previstas alterações ao nível<br />
da alocação de direit<strong>os</strong> de tributação,<br />
nexus, criação de níveis de<br />
imp<strong>os</strong>to mínim<strong>os</strong> e, sobretudo,<br />
potenciais alterações ao atual<br />
quadro internacional das regras<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência. Estas<br />
mudanças são complexas e,<br />
em muit<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, determinarão<br />
alterações n<strong>os</strong> Acord<strong>os</strong> para Evitar<br />
a Dupla Tributação (adicionais<br />
às que terão lugar este ano<br />
em consequência do instrumento<br />
multilateral).<br />
Tendo em atenção a previsível<br />
introdução unilateral de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
sobre serviç<strong>os</strong> digitais por<br />
vári<strong>os</strong> estad<strong>os</strong>, <strong>os</strong> trabalh<strong>os</strong> da<br />
Comissão Europeia ao nível da<br />
tributação desse tipo de serviç<strong>os</strong><br />
e <strong>os</strong> trabalh<strong>os</strong> do FMI quanto ao<br />
princípio da livre concorrência,<br />
as empresas deverão estar preparadas<br />
para adaptar <strong>os</strong> seus<br />
model<strong>os</strong> de negóci<strong>os</strong> a esta redefinição<br />
do quadro de regras de<br />
tributação internacional. Essas<br />
regras irão impactar uma grande<br />
parte das empresas com operações<br />
internacionais independentemente<br />
de terem uma presença<br />
física internacional, não<br />
só as digitais ou que utilizem<br />
plataformas digitais mas, sobretudo,<br />
aquelas cuja atividade<br />
está alinhada com a detenção e<br />
exploração de ativ<strong>os</strong> intangíveis<br />
que, em alguns cas<strong>os</strong>, pode incluir<br />
a respetiva base de clientes.<br />
RITA VAZ<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Temp<strong>os</strong> difíceis requerem<br />
decisões fiscais extremas ou<br />
como o Tribunal de Justiça<br />
da União Europeia (TJUE)<br />
surpreendeu o mundo fiscal<br />
No dia 26 de fevereiro<br />
de 2019, a comunidade<br />
que acompanha de perto<br />
as questões de tributação<br />
internacional, acordou<br />
para uma nova realidade na<br />
interpretação das normas<br />
específicas anti-abuso.<br />
Neste dia foram conhecidas as<br />
muito aguardadas decisões do<br />
TJUE sobre dois cas<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong><br />
à isenção de retenção na fonte<br />
na distribuição de dividend<strong>os</strong> ao<br />
abrigo da diretiva mães e afiliadas<br />
e quatro cas<strong>os</strong> aplicáveis à<br />
isenção de retenção na fonte sobre<br />
<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> pag<strong>os</strong> ao abrigo da<br />
diretiva jur<strong>os</strong> e royalties.<br />
De forma muito simplista, <strong>os</strong> fact<strong>os</strong><br />
são <strong>os</strong> seguintes: a autoridade<br />
fiscal dinamarquesa considerou<br />
que <strong>os</strong> acionistas residentes<br />
em outr<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Membr<strong>os</strong> (EM)<br />
da União Europeia (EU) que recebiam<br />
dividend<strong>os</strong> e jur<strong>os</strong> de subsidiárias<br />
residentes na Dinamarca<br />
não poderiam beneficiar das<br />
isenções previstas nas referidas<br />
diretivas porque <strong>os</strong> acionistas<br />
seriam “sociedades interp<strong>os</strong>tas”<br />
(conduit companies), não sendo<br />
consideradas as beneficiárias<br />
efetivas d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong>.<br />
As expectativas quando a estes<br />
cas<strong>os</strong> eram elevadas. Há muito<br />
que <strong>os</strong> contribuintes buscavam<br />
instruções, orientações ou até<br />
mesmo indíci<strong>os</strong> para interpretar<br />
as normas específicas anti-abuso<br />
previstas nas referidas diretivas<br />
e transp<strong>os</strong>tas pel<strong>os</strong> EM para<br />
as suas legislações internas.<br />
As conclusões da Advogada Geral<br />
apresentadas a 1 de março<br />
de 2018, relativamente a tod<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, iam no sentido de uma<br />
maior flexibilidade na forma<br />
como o conceito de beneficiário<br />
55
Tributação Empresarial<br />
efetivo deveria ser aplicado, tendo<br />
sido esgrimid<strong>os</strong> argument<strong>os</strong><br />
que pendiam a favor da p<strong>os</strong>ição<br />
d<strong>os</strong> contribuintes.<br />
Diz-n<strong>os</strong> a prática que as conclusões<br />
d<strong>os</strong> Advogad<strong>os</strong> Gerais são<br />
geralmente acolhidas pelo TJUE<br />
e, portanto, <strong>os</strong> agentes económic<strong>os</strong><br />
estavam expectantes pelas<br />
decisões do TJUE que viriam<br />
clarificar a interpretação destas<br />
normas e (esperava-se) conferir<br />
alguma tranquilidade na forma<br />
como <strong>os</strong> investiment<strong>os</strong> deveriam<br />
ser planead<strong>os</strong>, contrariando as<br />
últimas tendências (muito) mais<br />
severas adotadas pela OCDE (veja-se<br />
o novo principal purp<strong>os</strong>e<br />
test) e mesmo pelo legislador<br />
europeu (veja-se a nova cláusula<br />
geral anti-abuso).<br />
Surpreendentemente, as decisões<br />
do TJUE foram maioritariamente<br />
ao encontro d<strong>os</strong> argument<strong>os</strong><br />
da autoridade fiscal<br />
dinamarquesa. No que concerne<br />
a<strong>os</strong> dividend<strong>os</strong>, as decisões<br />
vão no sentido de que deverá<br />
ser provado que as sociedades<br />
intermediárias não fazem parte<br />
de uma construção fraudulenta<br />
ou abusiva. Este teste deverá<br />
ser realizado com base na nova<br />
cláusula geral anti-abuso (a ser<br />
transp<strong>os</strong>ta pel<strong>os</strong> EM em breve).<br />
No que concerne a<strong>os</strong> jur<strong>os</strong>, <strong>os</strong><br />
contribuintes deverão também<br />
demonstrar que não fazem parte<br />
de uma construção fraudulenta<br />
ou abusiva. Além disso, o conceito<br />
de “beneficiário efetivo” deverá<br />
ser interpretado em conformidade<br />
com o preconizado pela<br />
OCDE a este respeito.<br />
O impacto que estes cas<strong>os</strong> terão<br />
nas atuais estruturas de investimento<br />
terá de ser devidamente<br />
revisto de forma a assegurar que<br />
as mesmas estão em linha com<br />
estas novas interpretações do<br />
TJUE.<br />
Prestação Patrimonial<br />
sobre <strong>os</strong> Ativ<strong>os</strong><br />
por Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> Diferid<strong>os</strong><br />
56<br />
Tiago Capelo Silva<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
No final do mês passado<br />
foi divulgada a iniciativa<br />
legislativa de criação<br />
de uma prestação<br />
patrimonial sobre <strong>os</strong><br />
Ativ<strong>os</strong> por Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
Diferid<strong>os</strong> (“AID”)<br />
abrangid<strong>os</strong> pelo Regime<br />
Especial aprovado pela<br />
Lei n.º 61/2014, de 26<br />
de ag<strong>os</strong>to (“REAID”).<br />
Propõe-se, com esta norma, a<br />
criação de uma nova “contribuição”<br />
à taxa de 1,5%, incidente sobre<br />
o montante de AID abrangido<br />
pela referida lei, ainda que deduzido<br />
do montante de IRC pago<br />
entre 2009 e 2015, como forma<br />
de remuneração do Estado por<br />
este garantir a recuperação d<strong>os</strong><br />
AID (leia-se, o pagamento do imp<strong>os</strong>to<br />
ao sujeito passivo).<br />
Não sendo motivação deste artigo<br />
a análise à prop<strong>os</strong>ta legislativa<br />
que deu entrada na Assembleia<br />
da República no passado<br />
dia 22 de março, serve, no entanto,<br />
o ressurgimento deste assunto<br />
como pretexto para abordar<br />
este fugaz regime que apenas<br />
vigorou entre ag<strong>os</strong>to de 2014 e<br />
dezembro 2015 (embora <strong>os</strong> seus<br />
efeit<strong>os</strong> e consequências perdurem<br />
para além desse período, o<br />
que justifica esta abordagem).<br />
A este propósito, revela-se oportuno<br />
debruçar sobre um aspeto<br />
particular que se reporta à<br />
constituição de uma “reserva<br />
especial” por parte d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> que aderiram o REAID e<br />
a consequente atribuição de direit<strong>os</strong><br />
ao Estado.<br />
Com efeito, quando um sujeito<br />
passivo abrangido por este regime<br />
se encontra em condições de<br />
converter <strong>os</strong> seus AID em crédit<strong>os</strong><br />
tributári<strong>os</strong> (o que ocorre, por<br />
exemplo, quando num determinado<br />
exercício apura um resultado<br />
contabilístico negativo), deve,<br />
necessariamente, constituir uma<br />
“reserva especial”, que corresponde<br />
ao valor do crédito tributário<br />
majorado em 10%.<br />
Em simultâneo, o sujeito passivo<br />
deverá emitir direit<strong>os</strong> de<br />
conversão atribuíd<strong>os</strong> ao Estado,<br />
conferindo a este a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de exigir ao sujeito passivo o<br />
aumento de capital social através
Tributação Empresarial<br />
da incorporação da reserva especial<br />
referida e consequente emissão<br />
e entrega gratuita de ações.<br />
Naturalmente, o número de direit<strong>os</strong><br />
atribuíd<strong>os</strong> ao Estado deverá<br />
corresponder a<strong>os</strong> suficientes que<br />
permitam ao Estado, ao converter<br />
esses direit<strong>os</strong>, obter ações do<br />
sujeito passivo que representem<br />
no total, um valor equivalente à<br />
reserva constituída.<br />
De uma forma mais simples,<br />
o REAID determina que para<br />
o Estado conceder o crédito<br />
tributário deverá obter como<br />
contrapartida ações do sujeito<br />
passivo no valor de 110% desse<br />
mesmo crédito tributário sendo<br />
que, em alguns cas<strong>os</strong>, tal contrapartida<br />
pode ser, inclusive,<br />
em dinheiro caso o acionista<br />
do sujeito passivo exerça o seu<br />
direito potestativo de aquisição<br />
d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> ao Estado, conforme<br />
também previsto no regime.<br />
Assim, crem<strong>os</strong> que o legislador<br />
teve a preocupação de dotar o<br />
REAID de um mecanismo próprio<br />
para remunerar o Estado Português<br />
pela concessão de crédit<strong>os</strong><br />
tributári<strong>os</strong> a<strong>os</strong> aderentes ao regime,<br />
optando, no entanto, por<br />
uma solução diferente de outr<strong>os</strong><br />
estad<strong>os</strong> que aplicaram regimes<br />
semelhantes, mas procurando<br />
atingir o mesmo objetivo.<br />
Os nov<strong>os</strong> regulament<strong>os</strong><br />
municipais para<br />
a concessão de isenções<br />
e benefíci<strong>os</strong> fiscais<br />
ANA CHACIM<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A Lei n.º 51/2018,<br />
de 16 de ag<strong>os</strong>to veio<br />
alterar a Lei das<br />
Finanças Locais,<br />
incluindo o modelo<br />
de concessão<br />
pel<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong><br />
de isenções<br />
e benefíci<strong>os</strong> fiscais.<br />
Pela referida alteração, a partir<br />
de janeiro de 2019, <strong>os</strong> municípi<strong>os</strong><br />
são obrigad<strong>os</strong> a aprovar<br />
um regulamento municipal onde<br />
constem <strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> e condições<br />
para a atribuição das isenções<br />
fiscais totais ou parciais, objetivas<br />
ou subjetivas, relativamente<br />
a<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> e outr<strong>os</strong> tribut<strong>os</strong><br />
própri<strong>os</strong>. Referimo-n<strong>os</strong> aqui,<br />
fundamentalmente, ao Imp<strong>os</strong>to<br />
Municipal sobre Imóveis (IMI),<br />
ao Imp<strong>os</strong>to Municipal sobre as<br />
Transmissões Oner<strong>os</strong>as de Imóveis<br />
(IMT) e Derrama. Neste contexto,<br />
foram aditad<strong>os</strong> <strong>os</strong> critéri<strong>os</strong><br />
específic<strong>os</strong> a serem aplicad<strong>os</strong><br />
em sede de derrama, exigindo-se<br />
que tenham por base o volume<br />
de negóci<strong>os</strong> das empresas beneficiárias,<br />
o setor de atividade em<br />
que estas empresas operam, ou<br />
ainda a criação de emprego no<br />
município. Para o efeito, deverá<br />
assim ser submetido o referido<br />
regulamento municipal, o qual<br />
concretizará <strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> aplicáveis,<br />
ficando igualmente dependente<br />
o lançamento de uma taxa<br />
reduzida de derrama a aplicar a<br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> com volume de<br />
negóci<strong>os</strong> inferior a 150.000 € (até<br />
à aprovação do regulamento).<br />
Sendo exigida a devida racionalização,<br />
salienta-se ainda a<br />
alteração do Código do IMI, pela<br />
qual se exclui da isenção atribuída<br />
às entidades públicas o “património<br />
imobiliário público sem<br />
utilização”, promovendo assim a<br />
difícil disponibilização de edifíci<strong>os</strong><br />
públic<strong>os</strong>.<br />
A presente alteração visa fomentar<br />
o papel do município<br />
na organização da política de<br />
desenvolvimento económico<br />
local, aproveitando as potencialidades<br />
económicas territoriais<br />
(principais setores de atividade),<br />
com recurso a incentiv<strong>os</strong> fiscais,<br />
devendo assim ser visto como<br />
um mecanismo de fomento ao<br />
crescimento empresarial no Município.<br />
O inevitável processo de dinamização<br />
económica ao nível local,<br />
57
Tributação Empresarial<br />
CESE, «(…) a sujeição [à CESE] de<br />
determinad<strong>os</strong> operadores económic<strong>os</strong><br />
tem como um d<strong>os</strong> seus<br />
objetiv<strong>os</strong> «financiar mecanism<strong>os</strong><br />
que promovam a sustentabilidade<br />
sistémica do sector energético»<br />
(…), considerando-se aqui<br />
a definição de «(…) políticas do<br />
setor energético de cariz social e<br />
ambiental, e medidas relacionadas<br />
com a eficiência energética,<br />
bem como de medidas de apoio<br />
às empresas, que gerará, igualmente,<br />
contrapartidas, ainda que<br />
difusas».<br />
A CESE mantém, deste modo, a<br />
sua salvaguarda formal através<br />
da justificação de que existem<br />
presumidas contraprestações,<br />
ainda que de forma difusa, pelo<br />
que «(…) a atividade desenvolvida<br />
por estes agentes econóacompanhado<br />
da tão esperada<br />
descentralização de competências,<br />
compreende assim várias<br />
perspetivas, devendo assumir-se<br />
uma ação integrada no que respeita<br />
à autonomia e capacitação<br />
d<strong>os</strong> govern<strong>os</strong> locais em matéria<br />
de receita e de despesa. Se,<br />
por um lado, é reconhecida a<br />
imperatividade quanto à maior<br />
responsabilização d<strong>os</strong> autarcas<br />
na gestão municipal, por outro,<br />
cabe a<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> alavancar as<br />
potencialidades económicas locais,<br />
recorrendo ao investimento<br />
comunitário existente, mas também<br />
a instrument<strong>os</strong> fiscais. Neste<br />
sentido, compreende-se a obrigatoriedade<br />
agora introduzida para<br />
aprovação de um regulamento<br />
municipal com a prévia divulgação<br />
pública a<strong>os</strong> potenciais beneficiári<strong>os</strong><br />
d<strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> e condições<br />
com base n<strong>os</strong> quais será efetuado<br />
o reconhecimento pela Câmara<br />
Municipal das isenções relativas<br />
a<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> municipais. Cabe<br />
a<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> comunicar anualmente<br />
à Autoridade Tributária e<br />
Aduaneira (até 31 de dezembro),<br />
<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais reconhecid<strong>os</strong><br />
por titular, com a indicação do seu<br />
âmbito e período de vigência e, no<br />
caso do IMI, d<strong>os</strong> artig<strong>os</strong> matriciais<br />
d<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> abrangid<strong>os</strong>.<br />
Salienta-se ainda que <strong>os</strong> term<strong>os</strong><br />
em que assenta a concessão de<br />
benefíci<strong>os</strong> fiscais, mas também <strong>os</strong><br />
apoi<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong> por parte d<strong>os</strong><br />
Municípi<strong>os</strong>, deverão respeitar as<br />
regras comunitárias em sede de<br />
auxíli<strong>os</strong> de estado, estando em<br />
causa uma efetiva tutela de interesses<br />
públic<strong>os</strong> relevantes. Deste<br />
modo, a escolha d<strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> por<br />
parte do Município deverá ter em<br />
conta o princípio da igualdade na<br />
atribuição d<strong>os</strong> referid<strong>os</strong> apoi<strong>os</strong><br />
a<strong>os</strong> potenciais beneficiári<strong>os</strong> e a<br />
sua formulação ser genérica, garantindo<br />
a transparência e não<br />
obstrução da concorrência.<br />
Em síntese, se a obrigatoriedade<br />
do regulamento decorre da necessidade<br />
de garantia de transparência<br />
e igualdade em todo o<br />
processo de atribuição de benefíci<strong>os</strong><br />
fiscais, com respeito pelo<br />
regime de auxíli<strong>os</strong> de estado, tal<br />
aplica-se igualmente ao nível<br />
d<strong>os</strong> apoi<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong>. Em amb<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, estam<strong>os</strong> perante<br />
a atribuição de fund<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>,<br />
a cujo processo de atribuição se<br />
impõe cada vez mais uma maior<br />
transparência.<br />
A indefinida<br />
continuidade da CESE<br />
58<br />
ANA CHACIM<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A recente divulgação do<br />
Acórdão n.º 7/2019 (Processo<br />
n.º 141/16) do Tribunal<br />
Constitucional (TC) acabou<br />
por não acompanhar as<br />
expectativas d<strong>os</strong> operadores<br />
económic<strong>os</strong> abrangid<strong>os</strong><br />
quanto a uma discussão<br />
mais aprofundada sobre a<br />
verdadeira natureza jurídicotributária<br />
e objetiv<strong>os</strong> da<br />
Contribuição Extraordinária<br />
sobre o Setor Energético<br />
(CESE), na sequência da<br />
análise efetuada em tempo<br />
pelo Tribunal Arbitral relativa<br />
ao ano de 2014.<br />
Numa apreciação geral, o TC optou<br />
por manter uma p<strong>os</strong>ição de<br />
concordância quanto ao teor da<br />
decisão preexistente, pela qual<br />
se entende a CESE como uma<br />
contribuição financeira, cuja<br />
receita se encontra validamente<br />
consignada ao Fundo para a<br />
Sustentabilidade Sistémica do<br />
Setor Energético (FSSSE). O TC<br />
soluciona assim a questão através<br />
do entendimento de que<br />
existe uma contraprestação pública<br />
ao nível do setor energético<br />
de que são beneficiári<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
operadores económic<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong>,<br />
sendo assim clara a legitimidade<br />
tributária para a criação da CESE.<br />
Nestes term<strong>os</strong>, e ainda que não<br />
se consiga delimitar uma contraprestação<br />
específica pela qual o<br />
Estado se faz cobrar através da
Tributação Empresarial<br />
mic<strong>os</strong> beneficiará das ações de<br />
regulação traduzidas no desenvolvimento<br />
de políticas sociais<br />
e ambientais do setor energético,<br />
(…)».<br />
Sem recurso à mediática discussão<br />
sobre a necessidade de<br />
recuperação das ditas “rendas<br />
excessivas”, centram<strong>os</strong> o n<strong>os</strong>so<br />
comentário no contexto atual de<br />
proliferação de tribut<strong>os</strong> (imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>,<br />
contribuições e taxas), com<br />
reconhecido impacto ao nível do<br />
setor económico em que se inserem,<br />
tendo em conta a matriz<br />
estruturante de princípi<strong>os</strong> em<br />
que assenta o ordenamento jurídico-tributário<br />
nacional.<br />
Sendo expectável a apresentação<br />
de um juízo de ponderação<br />
da CESE à luz da Constituição no<br />
plano fiscal, assinala-se, ao invés,<br />
uma expressa dispensa de apreciação<br />
d<strong>os</strong> fundament<strong>os</strong> constitucionais<br />
apresentad<strong>os</strong>, com<br />
preponderância do princípio da<br />
capacidade contributiva na sua<br />
vertente material ou a violação<br />
do princípio da tributação das<br />
empresas pelo lucro real. A CESE<br />
configura efetivamente um normativo<br />
atípico, o qual exige uma<br />
discussão maior no que respeita<br />
à sua harmonização no seio<br />
do sistema fiscal português. Em<br />
term<strong>os</strong> puramente fiscais, a Contribuição<br />
em apreço determina<br />
a subtração de uma parcela de<br />
liquidez patrimonial a<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong>, tendo em conta não o<br />
seu rendimento real, mas sim<br />
tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> seus ativ<strong>os</strong>, impondo<br />
assim uma incidência direta<br />
sobre o património líquido da<br />
empresa. Releva ainda referir a<br />
imp<strong>os</strong>sibilidade de considerar a<br />
CESE enquanto gasto dedutível<br />
em sede de IRC, bem como a ausência<br />
de qualquer delimitação<br />
temporal, o que propicia um claro<br />
condicionamento da certeza e<br />
segurança jurídica em que se deveria<br />
basear a própria liberdade<br />
de gestão fiscal das empresas e,<br />
como tal, do próprio investimento<br />
económico (externo).<br />
O fundamento material em que<br />
deverá assentar a criação de<br />
nov<strong>os</strong> tribut<strong>os</strong>, e de que é exemplo<br />
a CESE ou Contribuições<br />
como a que ainda incide sobre<br />
a Indústria Farmacêutica, padece<br />
de uma maior minucia na<br />
demonstração da conexão entre<br />
a realidade tributada e o meio<br />
de tributação utilizado, de uma<br />
análise de impacto ao nível do<br />
respetivo setor económico, afastando<br />
a sobrep<strong>os</strong>ição de mei<strong>os</strong><br />
de tributação direta e indireta, e<br />
a garantia quanto à necessária<br />
coerência com o restante sistema<br />
fiscal. Apenas assim ficará legitimada<br />
a atuação material do<br />
legislador fiscal, devendo ficar<br />
para segundo plano o recurso a<br />
definições legais de ordem formal<br />
para a legalização de nov<strong>os</strong><br />
tribut<strong>os</strong>.<br />
59
60<br />
Tributação Pessoal
Tributação Pessoal<br />
Programa Regressar<br />
benefíci<strong>os</strong> fiscais e apoi<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> para emigrantes<br />
JOANA VIVAS<br />
Manager, People<br />
Advisory Services<br />
MIGUEL FIGUEIREDO<br />
Consultant, People<br />
Advisory Services<br />
Caso seja um cidadão<br />
Português que tenha<br />
saído do país até<br />
31 de dezembro de 2015<br />
e regresse a Portugal<br />
entre 1 de janeiro de<br />
2019 e 31 de dezembro<br />
de 2020, este programa<br />
é para si!<br />
O Programa Regressar passou<br />
a representar mais do que<br />
um benefício fiscal para <strong>os</strong><br />
ex-residentes de Portugal que<br />
venham a regressar ao país<br />
entre 2019 e 2020. De facto, a<br />
recente Portaria n.º 214/2019,<br />
de 5 de julho, veio também<br />
estabelecer apoi<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong><br />
a<strong>os</strong> emigrantes de modo<br />
a incentivar o seu retorno a<br />
Portugal.<br />
Assim, para além de <strong>os</strong> ex-residentes<br />
poderem usufruir de uma<br />
exclusão de tributação em sede<br />
de IRS de 50% d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
do trabalho dependente e d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> empresariais e profissionais<br />
durante 5 an<strong>os</strong>, poderão<br />
ainda candidatar-se a apoi<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> que podem totalizar,<br />
em 2019, um montante de Euro<br />
6.536,40.<br />
De modo a ter acesso a<strong>os</strong> apoi<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> em questão, para<br />
além d<strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> já referid<strong>os</strong>,<br />
torna-se necessário atender às<br />
restantes condições de candidatura,<br />
designadamente:<br />
l Ser cidadão nacional que tenha<br />
residido durante, pelo men<strong>os</strong>,<br />
12 meses, com caráter permanente,<br />
em país estrangeiro e<br />
onde tenha exercido atividade<br />
remunerada por contra própria<br />
ou por conta de outrem;<br />
l Iniciar um contrato laboral em<br />
Portugal continental por conta<br />
de outrem e sem termo entre 1<br />
de janeiro de 2019 e 31 de dezembro<br />
de 2020, respeitando<br />
todas as condições laborais<br />
exigidas por lei, quer a nível de<br />
retribuição mínima mensal garantida<br />
quer a nível de regulamentação<br />
coletiva de trabalho<br />
(se aplicável);<br />
l Ter a situação contributiva e<br />
tributária regularizada;<br />
l Não estar em situação de incumprimento<br />
no que respeita a<br />
apoi<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong> concedid<strong>os</strong><br />
pelo Instituto do Emprego e da<br />
Formação Profissional, I.P. (IEFP).<br />
Reunid<strong>os</strong> <strong>os</strong> requisit<strong>os</strong> acima<br />
elencad<strong>os</strong>, <strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong> têm<br />
direito a apoi<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong> indexad<strong>os</strong><br />
ao IAS1, conforme abaixo<br />
melhor descrit<strong>os</strong>:<br />
l Seis vezes o IAS, i.e. Euro<br />
2.614,56, caso o período normal<br />
de trabalho seja de 40 horas semanais,<br />
podendo este montante<br />
ser majorado em 10% por cada<br />
membro do agregado familiar do<br />
indivíduo que fixe residência em<br />
Portugal, com o limite de 3 vezes<br />
o IAS (i.e. Euro 1.307,28). Caso o<br />
contrato de trabalho preveja<br />
men<strong>os</strong> de 40 horas de trabalho<br />
semanais, o montante do apoio<br />
financeiro é reduzido na devida<br />
proporção;<br />
l Comparticipação d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> de<br />
viagem para Portugal do indivíduo<br />
e do seu agregado familiar<br />
até ao limite de três vezes o IAS<br />
(i.e. Euro 1.307,28);<br />
l Comparticipação d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> de<br />
transporte de bens para Portugal,<br />
com o limite de duas vezes o<br />
IAS (i.e. Euro 871,52);<br />
l Comparticipação d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong><br />
com o reconhecimento de qualificações<br />
académicas ou profissionais<br />
em Portugal do indivíduo,<br />
com o limite do IAS (i.e.<br />
Euro 435,76).<br />
Exemplo prático: um casal, com<br />
um titular e 2 filh<strong>os</strong>, poderá, no<br />
61
Tributação Pessoal<br />
total, beneficiar de um apoio financeiro<br />
de Euro 6.013,49.<br />
De notar que o pagamento do<br />
montante relativo a<strong>os</strong> apoi<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> aprovado pelo IEFP<br />
será efetuado de uma forma faseada.<br />
Caso a presente medida de<br />
Apoio ao Regresso de Emigrantes<br />
a Portugal seja aplicável a si,<br />
deverá ter em atenção <strong>os</strong> praz<strong>os</strong><br />
estabelecid<strong>os</strong> para o efeito. Assim,<br />
deve requerer este apoio<br />
financeiro junto do IEFP até 60<br />
dias após o início do contrato<br />
de trabalho. Caso o seu contrato<br />
de trabalho tenha tido início<br />
em data anterior a 5 de julho de<br />
2019, deverá requer <strong>os</strong> apoi<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong><br />
até 90 dias a contar da<br />
data de abertura das candidaturas<br />
(i.e. 22 de julho de 2019), prazo<br />
que termina, numa contagem<br />
prudente, no próximo dia 19 de<br />
outubro. Após apresentação da<br />
candidatura, o IEFP tem 20 dias<br />
úteis para análise da mesma.<br />
Estará na hora de “voltar a<br />
casa”?”<br />
Notas:<br />
1 – O valor do Indexante d<strong>os</strong><br />
Apoi<strong>os</strong> Sociais (“IAS”) atualmente<br />
em vigor é de Euro 435,76, conforme<br />
definido em Portaria n.º<br />
24/2019 de 17 de janeiro.<br />
Reembolso de Plan<strong>os</strong>-<br />
Poupança Reforma<br />
62<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
Os plan<strong>os</strong> de<br />
Poupança-Reforma<br />
foram introduzid<strong>os</strong><br />
pelo Decreto-Lei<br />
nº 205/89, de 27 de<br />
Junho, e desde a sua<br />
génese têm vindo<br />
a beneficiar de um<br />
regime de tributação<br />
favorável, tendo<br />
em vista incentivar<br />
a poupança de<br />
médio e longo prazo<br />
destinada a satisfazer<br />
as necessidades<br />
financeiras inerentes<br />
à situação de<br />
reforma d<strong>os</strong> seus<br />
participantes.<br />
Não obstante, em contrapartida<br />
d<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais concedid<strong>os</strong>,<br />
foram estabelecidas condições<br />
específicas de reembolso,<br />
cujo incumprimento pode conduzir<br />
à aplicação de penalizações<br />
fiscais.<br />
Atualmente, são as seguintes as<br />
condições previstas no Decreto-Lei<br />
nº 158/2002 (e sucessivas<br />
atualizações), que consagrou o<br />
novo regime jurídico d<strong>os</strong> plan<strong>os</strong><br />
de poupança-reforma, d<strong>os</strong> plan<strong>os</strong><br />
de poupança-educação e d<strong>os</strong><br />
plan<strong>os</strong> de poupança-reforma/<br />
educação, para que o reembolso<br />
d<strong>os</strong> PPR não seja oner<strong>os</strong>a do<br />
ponto de vista fiscal:<br />
1. Reforma por velhice do participante;<br />
2. Desemprego de longa duração<br />
do participante ou de qualquer<br />
d<strong>os</strong> membr<strong>os</strong> do seu agregado<br />
familiar;<br />
3. Incapacidade permanente para<br />
o trabalho do participante ou de<br />
qualquer d<strong>os</strong> membr<strong>os</strong> do seu<br />
agregado familiar, qualquer que<br />
seja a sua causa;<br />
4. Doença grave do participante<br />
ou de qualquer d<strong>os</strong> membr<strong>os</strong> do<br />
seu agregado familiar;<br />
5. A partir d<strong>os</strong> 60 an<strong>os</strong> de idade<br />
do participante;<br />
6. Frequência ou ingresso do<br />
participante ou de qualquer d<strong>os</strong><br />
membr<strong>os</strong> do seu agregado familiar<br />
em curso do ensino profissional<br />
ou do ensino superior, quando<br />
geradores de despesas no ano<br />
respetivo;<br />
7. Utilização para pagamento de<br />
prestações de contrat<strong>os</strong> de crédito<br />
garantid<strong>os</strong> por hipoteca sobre<br />
imóvel destinado a habitação<br />
própria e permanente do participante.<br />
O reembolso efetuado ao abrigo<br />
das alíneas a), e), f) e g) do número<br />
anterior só se pode verificar<br />
quanto a entregas relativamente<br />
às quais já tenham decorrido pelo<br />
men<strong>os</strong> cinco an<strong>os</strong> após as respetivas<br />
datas de aplicação pelo participante.<br />
Por outro lado, decorrido<br />
o prazo de cinco an<strong>os</strong> após a data<br />
da primeira entrega, o participante<br />
pode exigir o reembolso da totalidade<br />
do valor do PPR/E, ao abrigo<br />
das alíneas a), e), f) e g), se o<br />
montante das entregas efetuadas<br />
na primeira metade da vigência do<br />
contrato representar, pelo men<strong>os</strong>,<br />
35 % da totalidade das entregas.
Tributação Pessoal<br />
Caso o reembolso ocorra fora<br />
das condições acima mencionadas,<br />
o sujeito passivo fica sujeito<br />
às penalizações previstas no n.º<br />
4 do artigo 21º do Estatuto d<strong>os</strong><br />
Benefíci<strong>os</strong> fiscais, i.e., devem ser<br />
acrescidas à coleta do IRS as importâncias<br />
deduzidas, majoradas<br />
em 10%, por cada ano ou fração<br />
decorrid<strong>os</strong> desde o ano da dedução.<br />
Recentemente, através de ficha<br />
doutrinária proferida no âmbito<br />
do Processo nº 4242/2017, a Autoridade<br />
Tributária divulgou o<br />
seu entendimento relativamente<br />
às implicações em sede de IRS<br />
resultantes do reembolso de PPR<br />
decorrente de duas situações<br />
específicas: (a) a utilização d<strong>os</strong><br />
valores aplicad<strong>os</strong> em PPR para<br />
aquisição de imóvel para habitação<br />
própria e permanente; e (b) a<br />
aplicação d<strong>os</strong> valores do PPR na<br />
subscrição de um novo PPR.<br />
Na mencionada ficha doutrinária,<br />
a Autoridade Tributária concluiu<br />
que, de acordo com a redação<br />
atual do nº1 do artigo 4º do Decreto-Lei<br />
nº 158/2002, de 2 de<br />
Julho, a alínea g) é “clara na sua<br />
formulação ao referir “Utilização<br />
para pagamento de prestações<br />
de contrat<strong>os</strong> de crédito garantid<strong>os</strong><br />
por hipoteca sobre imóvel<br />
destinado a habitação própria e<br />
permanente”, no sentido de que<br />
o valor do reembolso do PPR só<br />
pode ser utilizado para pagamento<br />
de prestações”, sendo no<br />
nº 11 do referido artigo 4º especificad<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> tip<strong>os</strong> de contrat<strong>os</strong><br />
de crédito abrangid<strong>os</strong> por aquela<br />
alínea. Assim, no entender da<br />
Autoridade Tributária, apenas a<br />
utilização para pagamento das<br />
prestações do crédito concedido<br />
não dará origem às penalizações<br />
previstas no artigo 21º do EBF (e<br />
não a utilização na própria aquisição<br />
da habitação em causa). Do<br />
mesmo modo, também a “A subscrição<br />
de novo PPR com o valor<br />
do resgate de PPR efetuado anteriormente,<br />
não é condição para<br />
o participante se eximir das consequências<br />
a que se refere o n.º 5<br />
do artigo 4.º do diploma.”<br />
Tratando-se do reembolso de<br />
PPR fora do quadro legal, deverão<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> preencher o<br />
anexo H – Quadro 8 - Acréscim<strong>os</strong><br />
por incumprimento de requisit<strong>os</strong><br />
e, no Campo 803, mencionar as<br />
importâncias deduzidas à coleta,<br />
majoradas em 10%, identificadas<br />
por cada ano ou fração decorrida<br />
desde aquele que foi exercido o<br />
direito à dedução.<br />
Mais-valias imobiliárias<br />
em sede de IRS<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
O sistema fiscal português<br />
adota, em sede de imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o rendimento das<br />
pessoas singulares – IRS<br />
– uma noção extensiva de<br />
rendimento, o rendimentoacréscimo,<br />
ainda que não<br />
de uma forma plena, na<br />
medida em que algumas<br />
categorias de rendiment<strong>os</strong><br />
– designadamente as<br />
mais-valias – apresentam<br />
um tratamento específico,<br />
mais favorável, em virtude<br />
da sua não recorrência<br />
e caráter fortuito.<br />
No caso das mais-valias imobiliárias,<br />
auferidas por residentes<br />
em território português, as mesmas<br />
são sujeitas a englobamento<br />
obrigatório, sendo, contudo,<br />
apenas consideradas em 50% da<br />
diferença p<strong>os</strong>itiva entre as mais e<br />
as men<strong>os</strong> valias, existindo ainda<br />
algumas exclusões de tributação,<br />
como é o caso das mais-valias<br />
realizadas na alienação de imóveis<br />
destinad<strong>os</strong> à habitação própria<br />
e permanente com reinvestimento<br />
do valor de realização em<br />
imóveis com o mesmo destino, ou<br />
mais recentemente, com a Reforma<br />
do IRS em 2015, as mais-valias<br />
cujo valor de realização seja aplicado<br />
na amortização de eventual<br />
empréstimo contraído para a<br />
aquisição do imóvel alienado (em<br />
amb<strong>os</strong> <strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, cumpridas que<br />
estejam determinadas condições).<br />
Uma das questões que tem gerado<br />
mais litígio entre <strong>os</strong> contribuintes<br />
e a Autoridade Tributária<br />
prende-se com a determinação<br />
do próprio ganho sujeito a imp<strong>os</strong>to,<br />
atendendo à formulação vaga<br />
e com ampla margem de indeterminação,<br />
do conceito de encarg<strong>os</strong><br />
com a valorização d<strong>os</strong> bens, bem<br />
como às despesas necessárias e<br />
efetivamente praticadas e inerentes<br />
à aquisição e alienação. Na falta<br />
de clareza da lei, a Autoridade<br />
Tributária tem proferido divers<strong>os</strong><br />
entendiment<strong>os</strong> administrativ<strong>os</strong><br />
e vindo a aceitar como despesas<br />
necessárias e inerentes à aquisição<br />
e alienação, o Imp<strong>os</strong>to Municipal<br />
sobre as Transmissões One-<br />
63
Tributação Pessoal<br />
r<strong>os</strong>as de Imóveis e <strong>os</strong> encarg<strong>os</strong><br />
notariais e de registo predial, bem<br />
como as comissões de mediação<br />
imobiliária (cfr. Despacho do<br />
Substituto Legal do Diretor Geral<br />
d<strong>os</strong> Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, de 14 de Julho e 12<br />
de Ag<strong>os</strong>to de 2008) ou as despesas<br />
com a certificação energética<br />
(Despacho da Subdiretora Geral<br />
de 8 de Julho de 2010, no âmbito<br />
do Processo 3089/10).<br />
Existe ainda um conjunto de decisões<br />
judiciais e arbitrais que importa<br />
salientar sobre a matéria –<br />
como é o caso do recente Acórdão<br />
do Tribunal Central Administrativo<br />
Sul de 3 de Março de 2016, relativo<br />
ao Processo 05182/11, que conclui<br />
não se poder considerar como<br />
“despesas necessárias inerentes<br />
à alienação” as despesas suportadas<br />
com a extinção e pagamento<br />
de penhoras, ou o Acórdão do<br />
Tribunal Arbitral de 25 de Janeiro<br />
de 2016 no âmbito do Processo<br />
31/2015-T, que não considera<br />
como despesas relevantes para<br />
este efeito <strong>os</strong> pagament<strong>os</strong> efetuad<strong>os</strong><br />
para distratar as hipotecas<br />
incidentes sobre o imóvel alienado.<br />
Por outro lado, de salientar<br />
que, através de alteração legislativa<br />
introduzida pela Reforma do<br />
IRS, passou a considerar-se como<br />
dedutível para efeit<strong>os</strong> da determinação<br />
das mais-valias sujeitas a<br />
imp<strong>os</strong>to, o montante correspondente<br />
às indemnizações comprovadamente<br />
pagas pela renúncia<br />
oner<strong>os</strong>a a p<strong>os</strong>ições contratuais ou<br />
outr<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> inerentes a contrat<strong>os</strong><br />
relativ<strong>os</strong> a esses bens, pondo<br />
dessa forma um ponto final na<br />
polémica questão de saber se as<br />
indemnizações por despejo poderiam<br />
ou não ser abatidas para a<br />
determinação d<strong>os</strong> ganh<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
a imp<strong>os</strong>to.<br />
A determinação das despesas e<br />
encarg<strong>os</strong> relevantes para a determinação<br />
das mais-valias imobiliárias<br />
sujeitas a imp<strong>os</strong>to deve,<br />
portanto, ser objeto de análise<br />
detalhada, relevando toda a despesa<br />
que se assuma como condição<br />
sine qua non – indissociável,<br />
portanto – do rendimento concretamente<br />
obtido, porque traduzido<br />
numa despesa necessária<br />
para a existência do próprio rendimento,<br />
para além de ser uma<br />
despesa inerente ao próprio ato<br />
de aquisição ou alienação.<br />
Cláusula geral anti-abuso<br />
em sede de IRS<br />
64<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
Atenta a<br />
complexidade d<strong>os</strong><br />
negóci<strong>os</strong> no mundo<br />
atual, é cada vez mais<br />
ténue a fronteira entre<br />
o que se considera<br />
planeamento fiscal<br />
legítimo, e, ao invés,<br />
planeamento ilegítimo<br />
ou “extra legem”,<br />
que ocorre quando<br />
o sujeito passivo<br />
aproveita de forma<br />
abusiva a lei para<br />
chegar a um resultado<br />
fiscal mais favorável,<br />
pese embora este não<br />
a violar diretamente.<br />
A Lei Geral Tributária contempla,<br />
no seu artigo 38º nº2, um princípio<br />
de ineficácia d<strong>os</strong> negóci<strong>os</strong><br />
jurídic<strong>os</strong> sempre que <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong><br />
sejam dirigid<strong>os</strong>, por mei<strong>os</strong> artifici<strong>os</strong><strong>os</strong><br />
ou fraudulent<strong>os</strong>, à redução,<br />
eliminação ou diferimento temporal<br />
de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> ou obtenção de<br />
vantagens fiscais que não seriam<br />
obtidas, total ou parcialmente,<br />
sem utilização desses mei<strong>os</strong>.<br />
A este respeito, têm vindo a ser<br />
recentemente divulgad<strong>os</strong> vári<strong>os</strong><br />
acórdã<strong>os</strong> pelo Centro de Arbitragem<br />
Tributária (CAAD) relativamente<br />
à aplicação da cláusula<br />
geral anti-abuso em sede de Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento das<br />
Pessoas Singulares (IRS). As situações<br />
consideradas pela Autoridade<br />
Tributária como de planeamento<br />
fiscal abusivo podem ser<br />
genericamente divididas em dois<br />
grup<strong>os</strong>: (i) as que decorrem da<br />
transformação de sociedades por<br />
quotas em sociedades anónimas<br />
e subsequente venda da participação<br />
social detida na sociedade<br />
anónima sem tributação em sede<br />
de IRS; e (ii) as que resultam na<br />
disponibilização a<strong>os</strong> acionistas de<br />
montantes decorrente de operações<br />
sobre participações sociais,<br />
que consubstanciando no entender<br />
da Autoridade Tributária distribuições<br />
indiretas de dividend<strong>os</strong>,<br />
não estão, no entanto, sujeitas a<br />
retenção na fonte nem a tributação<br />
final na esfera d<strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong>.<br />
A apreciação quanto à aplicabilidade<br />
da cláusula geral anti-abuso<br />
tem vindo a basear-se<br />
na análise de cinco element<strong>os</strong>,<br />
de verificação cumulativa: o meio<br />
(formas utilizadas para a obtenção<br />
da vantagem), o resultado
Tributação Pessoal<br />
(vantagem propriamente dita), o<br />
elemento intelectual (motivação<br />
fiscal subjacente), o elemento<br />
normativo (intenção legal contrária<br />
ou não legitimadora do<br />
resultado obtido) e o elemento<br />
sancionatório (sanção de ineficácia<br />
no domínio tributário d<strong>os</strong><br />
negóci<strong>os</strong> dit<strong>os</strong> abusiv<strong>os</strong>).<br />
É interessante verificar que no<br />
caso da transformação de sociedades<br />
por quotas em sociedades<br />
anónimas, o CAAD tem considerado<br />
de forma muito consistente,<br />
que não está presente o elemento<br />
normativo, concluindo pela não<br />
aplicação da norma anti-abuso,<br />
contrariamente às pretensões da<br />
Autoridade Tributária.<br />
Relativamente a<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de distribuição<br />
indireta de dividend<strong>os</strong>,<br />
a jurisprudência não é uniforme,<br />
concluindo, em alguns cas<strong>os</strong>, em<br />
sentido favorável à Autoridade<br />
Tributária e noutr<strong>os</strong> ao contribuinte,<br />
sendo a questão fulcral<br />
a de determinar se a aplicação<br />
da cláusula geral pode produzir<br />
ou não efeit<strong>os</strong> fiscais sobre terceir<strong>os</strong><br />
que não o contribuinte<br />
que obteve a vantagem fiscal<br />
(por ex. impondo a obrigação de<br />
retenção na fonte), pois a Autoridade<br />
Tributária tem emitido as<br />
liquidações adicionais sobre <strong>os</strong><br />
substitut<strong>os</strong> tributári<strong>os</strong> e não sobre<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong>.<br />
Atent<strong>os</strong> <strong>os</strong> desenvolviment<strong>os</strong><br />
nesta matéria, seria portanto importante<br />
clarificar por via legislativa<br />
ou, pelo men<strong>os</strong>, assegurando<br />
uniformidade na jurisprudência,<br />
alguns aspet<strong>os</strong> associad<strong>os</strong> à<br />
aplicação da norma anti-abuso<br />
(nomeadamente no que se refere<br />
às consequências da ineficácia, e<br />
sobre quem incidem essas consequências).<br />
Deduções a<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
prediais em sede de IRS<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
Uma das questões<br />
que frequentemente<br />
se colocam a<strong>os</strong><br />
contribuintes que<br />
arrendam imóveis e<br />
auferem rendiment<strong>os</strong><br />
prediais tributad<strong>os</strong> no<br />
âmbito da Categoria<br />
F, é quais são <strong>os</strong><br />
gast<strong>os</strong> dedutíveis<br />
para efeit<strong>os</strong> de<br />
determinação do<br />
rendimento coletável<br />
em sede de IRS.<br />
Com a reforma do IRS em 2015,<br />
passaram a ser dedutíveis, n<strong>os</strong><br />
term<strong>os</strong> do disp<strong>os</strong>to no nº1 do<br />
artigo 41º do Código do IRS, “relativamente<br />
a cada prédio ou<br />
parte de prédio, tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> gast<strong>os</strong><br />
efetivamente suportad<strong>os</strong> e pag<strong>os</strong><br />
pelo sujeito passivo para obter<br />
ou garantir tais rendiment<strong>os</strong>, com<br />
exceção d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de natureza<br />
financeira, d<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> a depreciações<br />
e d<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> a mobiliário,<br />
eletrodoméstic<strong>os</strong> e artig<strong>os</strong> de<br />
conforto ou decoração, bem como<br />
do adicional ao imp<strong>os</strong>to municipal<br />
sobre imóveis”. Adicionalmente,<br />
no caso de fração autónoma de<br />
prédio em regime de propriedade<br />
horizontal, são dedutíveis, relativamente<br />
a cada fração ou parte<br />
de fração, outr<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> que,<br />
n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> da lei, o condómino<br />
deva obrigatoriamente suportar<br />
e que sejam efetivamente pag<strong>os</strong><br />
pelo sujeito passivo.<br />
Resulta, portanto, do exp<strong>os</strong>to<br />
que, atualmente, o leque de<br />
despesas dedutíveis é bastante<br />
abrangente, sendo as mais frequentes,<br />
<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de condomínio,<br />
o Imp<strong>os</strong>to Municipal sobre<br />
Imóveis suportado relativamente<br />
a<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> arrendad<strong>os</strong>, o Imp<strong>os</strong>to<br />
do Selo d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> de<br />
arrendamento, comissões pelo<br />
arrendamento pagas a imobiliárias,<br />
despesas com segur<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />
imóveis arrendad<strong>os</strong>, e despesas<br />
de conservação e reparação d<strong>os</strong><br />
imóveis arrendad<strong>os</strong>, entre outras.<br />
Não obstante o exp<strong>os</strong>to, subsistem<br />
ainda algumas questões relativamente<br />
às despesas dedutíveis,<br />
que têm gerado controvérsia<br />
entre contribuintes e Autoridade<br />
Tributária, uma das quais é a necessidade<br />
(ou não) da adoção de<br />
um critério de proporcionalidade<br />
da dedução das despesas em<br />
função da duração d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong><br />
de arrendamento.<br />
Nesta matéria, a Autoridade Tributária<br />
divulgou muito recentemente<br />
– em 6 de Dezembro de<br />
2018 - uma ficha doutrinária proferida<br />
no âmbito do Processo nº<br />
65
Tributação Pessoal<br />
1577/2017, no qual o sujeito passivo<br />
pretendia saber que gast<strong>os</strong><br />
de IMI e despesas de conservação<br />
e reparação poderia deduzir<br />
quando o imóvel não foi objeto<br />
de arrendamento durante todo<br />
o ano, tendo a Autoridade Tributária<br />
concluído que “poderão ser<br />
considerad<strong>os</strong> tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> encarg<strong>os</strong><br />
efetivamente suportad<strong>os</strong> pelo<br />
sujeito passivo, desde que devidamente<br />
comprovad<strong>os</strong>”.<br />
Ainda que a redação da ficha<br />
doutrinária não seja muito taxativa,<br />
entendem<strong>os</strong> que a p<strong>os</strong>ição<br />
da Autoridade Tributária segue<br />
a linha de divers<strong>os</strong> acórdã<strong>os</strong> do<br />
CAAD (nomeadamente d<strong>os</strong> acórdã<strong>os</strong><br />
no âmbito d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> nº<br />
659/2017-T, 201/2015-T, 294/2015-T<br />
e n.º 434/2016-T, para salientar<br />
apenas alguns), no qual a jurisprudência<br />
concluiu que o artigo<br />
41º do Código do IRS, ou qualquer<br />
outro, não contempla qualquer<br />
exceção relativamente à regra<br />
geral da anualidade do IRS, e<br />
que não há que fazer qualquer<br />
outra correspondência temporal<br />
entre o rendimento bruto e as<br />
despesas a deduzir. Há apenas<br />
que assegurar que as deduções<br />
dizem respeito ao ano civil em<br />
que foram pag<strong>os</strong> ou colocad<strong>os</strong> à<br />
disp<strong>os</strong>ição <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> prediais,<br />
não existindo fundamento<br />
legal no Código do IRS para calcular<br />
uma proporção em função<br />
da taxa de ocupação.<br />
Em n<strong>os</strong>so entender, de facto, desde<br />
que <strong>os</strong> gast<strong>os</strong> tenham sido incorrid<strong>os</strong><br />
“para obter ou garantir”<br />
<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> prediais, estes<br />
serão dedutíveis mesmo que durante<br />
parte do ano o imóvel não<br />
se encontre arrendado, mas desde<br />
que o imóvel esteja disponível<br />
para arrendamento (e não a ser<br />
utilizado para habitação própria<br />
e permanente) e, como tal, as<br />
despesas sejam incorridas para<br />
assegurar que o imóvel continua<br />
a ser suscetível de arrendamento.<br />
Esperam<strong>os</strong> que a divulgação do<br />
entendimento da Autoridade<br />
Tributária na ficha doutrinária<br />
acima indicada, em linha com a<br />
jurisprudência arbitral, ponha fim<br />
à litigância que tem existido nesta<br />
matéria.<br />
Ainda no que se refere às deduções<br />
a<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> prediais,<br />
também a 6 de Dezembro, a Autoridade<br />
Tributária divulgou o entendimento,<br />
na ficha doutrinária<br />
proferida no âmbito do Processo<br />
nº 4240/2017, que tratando-se de<br />
vári<strong>os</strong> comproprietári<strong>os</strong>/locadores<br />
que obtêm rendiment<strong>os</strong> prediais<br />
(categoria F) e sendo as despesas<br />
suportadas pel<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>, ainda<br />
que <strong>os</strong> document<strong>os</strong> comprovativ<strong>os</strong><br />
das despesas estejam emitid<strong>os</strong> só<br />
em nome de um d<strong>os</strong> comproprietári<strong>os</strong>,<br />
poderão estas despesas ser<br />
deduzidas por cada um d<strong>os</strong> comproprietári<strong>os</strong>,<br />
na respetiva quota<br />
-parte da renda recebida.<br />
Regimes fiscais atrativ<strong>os</strong><br />
para pessoas singulares<br />
no Sul da Europa<br />
66<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
Primeiro Espanha,<br />
depois Portugal e, mais<br />
recentemente, Itália,<br />
introduziram regimes<br />
fiscais favoráveis<br />
à transferência<br />
de trabalhadores<br />
qualificad<strong>os</strong> bem como<br />
de indivídu<strong>os</strong> que<br />
p<strong>os</strong>suem um elevado<br />
património pessoal para<br />
<strong>os</strong> respetiv<strong>os</strong> territóri<strong>os</strong>.<br />
O regime português, designado<br />
de residentes não habituais, encontra-se<br />
em vigor desde 2009 e<br />
é aplicável às pessoas singulares<br />
que, tornando-se fiscalmente<br />
residentes n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do Código<br />
do IRS, não tenham sido residentes<br />
em território português<br />
em qualquer d<strong>os</strong> cinco an<strong>os</strong><br />
anteriores. O regime prevê, por<br />
um lado, uma tributação reduzida<br />
e proporcional (à taxa de<br />
20% acrescida de sobretaxa em<br />
2017) d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> do trabalho<br />
dependente e independente<br />
auferid<strong>os</strong> por residentes não<br />
habituais em território português<br />
em atividades de elevado<br />
valor acrescentado, e, por outro,<br />
a p<strong>os</strong>sibilidade de optar pelo<br />
método de isenção como método<br />
de eliminação da dupla tributação<br />
internacional d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
de fonte estrangeira<br />
(dependendo da natureza d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> e do cumprimento<br />
de determinadas condições). O<br />
regime é aplicável por 10 an<strong>os</strong>.<br />
O regime espanhol estabelece<br />
uma taxa de tributação de 24%<br />
para rendiment<strong>os</strong> tributáveis até<br />
600.000 Eur<strong>os</strong> e 45% para rendi-
Tributação Pessoal<br />
ment<strong>os</strong> superiores ao mencionado<br />
montante, sendo aplicável<br />
no ano de início da residência<br />
e n<strong>os</strong> 5 p<strong>os</strong>teriores, desde que,<br />
entre outras condições, as pessoas<br />
singulares não tenham sido<br />
residentes fiscais em Espanha<br />
durante <strong>os</strong> 10 an<strong>os</strong> anteriores ao<br />
destacamento.<br />
No que respeita a Itália, o regime<br />
especial para trabalhadores<br />
impatriad<strong>os</strong> entrou em vigor em<br />
2016 e prevê atualmente uma dedução<br />
de 50% do rendimento tributável<br />
proveniente de trabalho<br />
dependente ou independente no<br />
caso de sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> que,<br />
entre outr<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong>, tenham<br />
qualificado como não residentes<br />
fiscais em Itália n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> 5<br />
an<strong>os</strong> anteriores à transferência e<br />
mantenham uma residência fiscal<br />
em Itália durante pelo men<strong>os</strong><br />
dois an<strong>os</strong>. O regime é aplicável<br />
no ano da transferência e n<strong>os</strong> 4<br />
an<strong>os</strong> seguintes.<br />
Em Itália, encontra-se também<br />
em vigor desde 2017 um regime<br />
especial para <strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong> que<br />
p<strong>os</strong>suam um elevado património<br />
pessoal que prevê que estes<br />
p<strong>os</strong>sam optar por uma tributação<br />
forfetária anual de 100.000 Eur<strong>os</strong><br />
sobre <strong>os</strong> seus rendiment<strong>os</strong> de<br />
fonte estrangeira, independentemente<br />
do montante efetivo de<br />
rendimento por estes auferid<strong>os</strong><br />
e da repatriação de capitais para<br />
Itália.<br />
No contexto atual de concorrência<br />
fiscal internacional estes<br />
regimes podem funcionar como<br />
estímulo adicional à atração da<br />
capacidade produtiva e iniciativa<br />
empresarial n<strong>os</strong> países do<br />
Sul da Europa, dado que, designadamente<br />
<strong>os</strong> indivídu<strong>os</strong> de<br />
elevado património pessoal são<br />
particularmente sensíveis à carga<br />
tributária nas suas decisões<br />
de localização.<br />
Reinvestimento e maisvalias<br />
na venda de habitação<br />
própria e permanente –<br />
“O diabo está n<strong>os</strong> detalhes”?<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
No contexto do<br />
atual dinamismo do<br />
mercado imobiliário,<br />
muit<strong>os</strong> são <strong>os</strong> que têm<br />
aproveitado o momento<br />
para realizarem maisvalias<br />
na venda d<strong>os</strong><br />
imóveis onde mantém<br />
a sua habitação<br />
própria e permanente,<br />
concretizando o<br />
reinvestimento (antes ou<br />
depois, como verem<strong>os</strong>)<br />
na aquisição de outro<br />
imóvel destinado<br />
ao mesmo fim.<br />
Por forma a obviar à tributação<br />
destes ganh<strong>os</strong>, e por se entender<br />
que a tributação d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong><br />
poderia tornar excessivamente<br />
oner<strong>os</strong>a a venda d<strong>os</strong> imóveis que<br />
constituem morada de família, o<br />
Código do IRS dispõe no seu artigo<br />
10º, n.º5, uma exclusão de tributação<br />
das mais-valias decorrentes<br />
da alienação de habitação própria<br />
e permanente na aquisição de<br />
novo imóvel com a mesma finalidade,<br />
n<strong>os</strong> seguintes moldes (na<br />
redação atualmente em vigor):<br />
“5 – São excluíd<strong>os</strong> da tributação<br />
<strong>os</strong> ganh<strong>os</strong> provenientes da transmissão<br />
oner<strong>os</strong>a de imóveis destinad<strong>os</strong><br />
a habitação própria e permanente<br />
do sujeito passivo ou do<br />
seu agregado familiar, desde que<br />
verificadas, cumulativamente, as<br />
seguintes condições:<br />
1. o valor de realização, deduzido<br />
da amortização de eventual empréstimo<br />
contraído para a aquisição<br />
do imóvel, seja reinvestido<br />
na aquisição da propriedade de<br />
outro imóvel, de terreno para<br />
construção de imóvel e ou respetiva<br />
construção, ou na ampliação<br />
ou melhoramento de outro<br />
imóvel exclusivamente com o<br />
mesmo destino situado em território<br />
português ou no território<br />
de outro Estado membro da União<br />
Europeia ou do Espaço Económico<br />
Europeu, desde que, neste último<br />
caso, exista intercâmbio de informações<br />
em matéria fiscal;<br />
2. o reinvestimento previsto na<br />
alínea anterior seja efetuado entre<br />
<strong>os</strong> 24 meses anteriores e <strong>os</strong> 36<br />
meses p<strong>os</strong>teriores contad<strong>os</strong> da<br />
data da realização;<br />
3. o sujeito passivo manifeste a<br />
intenção de proceder ao reinves-<br />
67
Tributação Pessoal<br />
68<br />
timento, ainda que parcial, mencionando<br />
o respetivo montante<br />
na declaração de rendiment<strong>os</strong><br />
respeitante ao ano da alienação.<br />
Adicionalmente, dispõe ainda o<br />
nº 6 do referido preceito, que o<br />
benefício não é aplicável sempre<br />
que, tratando-se de reinvestimento<br />
na aquisição de outro imóvel,<br />
o adquirente o não afete à sua<br />
habitação ou do seu agregado familiar,<br />
até decorrid<strong>os</strong> doze meses<br />
após o reinvestimento, e, n<strong>os</strong> demais<br />
cas<strong>os</strong>, quando o adquirente<br />
não requeira a inscrição na matriz<br />
do imóvel ou das alterações decorrid<strong>os</strong><br />
48 meses desde a data<br />
da realização, devendo afetar o<br />
imóvel à sua habitação ou do seu<br />
agregado até ao fim do quinto ano<br />
seguinte ao da realização.<br />
A interpretação e aplicação prática<br />
desta norma tem gerado frequentes<br />
litígi<strong>os</strong> entre <strong>os</strong> contribuintes e<br />
a Autoridade Tributária, muit<strong>os</strong> resolvid<strong>os</strong><br />
com recurso à via judicial,<br />
sendo as fontes do litígio de diversa<br />
natureza, d<strong>os</strong> quais n<strong>os</strong> vam<strong>os</strong><br />
debruçar neste artigo especificamente<br />
sobre dois: as alternativas<br />
de reinvestimento, por um lado, e<br />
o conceito de habitação própria e<br />
permanente, por outro.<br />
Da análise à alínea a) do n.º 5 do<br />
artigo 10º do Código do IRS, concluím<strong>os</strong><br />
que o legislador estabelece<br />
três alternativas de reinvestimento<br />
para que opere a exclusão<br />
de tributação (total ou parcial) da<br />
mais-valia decorrente da alienação<br />
de habitação própria e permanente:<br />
l reinvestimento na aquisição da<br />
propriedade de outro imóvel;<br />
l reinvestimento na aquisição de<br />
terreno para construção de imóvel<br />
e ou respetiva construção; ou,<br />
l reinvestimento na ampliação ou<br />
melhoramento de outro imóvel.<br />
Uma das questões que se suscita<br />
é, em primeiro lugar, determinar<br />
se combinações das diferentes<br />
alternativas previstas pelo legislador<br />
(e.g., reinvestimento na aquisição<br />
da propriedade de outro<br />
imóvel e melhoramento do imóvel<br />
adquirido) são p<strong>os</strong>síveis para efeit<strong>os</strong><br />
de aplicação da referida exclusão<br />
de tributação.<br />
Cumpre notar que, tanto quanto<br />
sabem<strong>os</strong>, não existem orientações<br />
da Autoridade Tributária a<br />
este respeito. No entanto, tem<strong>os</strong><br />
conhecimento que a Autoridade<br />
Tributária, em sede de inspeção,<br />
tem considerado que não é p<strong>os</strong>sível<br />
cumular o valor de aquisição<br />
com <strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> incorrid<strong>os</strong> em<br />
obras de melhoramento nesse<br />
mesmo imóvel, por entender que<br />
combinações das diferentes alternativas<br />
de reinvestimento (tipificadas<br />
no n.º 5 do Artigo 10º do<br />
CIRS) não são p<strong>os</strong>síveis.<br />
Não obstante o exp<strong>os</strong>to, existem<br />
em n<strong>os</strong>so entender argument<strong>os</strong><br />
para considerar que tais combinações<br />
são p<strong>os</strong>síveis, dado que<br />
a lei nada dispõe em sentido<br />
contrário. No mesmo sentido,<br />
discorre Rui Duarte Morais em<br />
“Sobre o IRS” (2014, 3ª edição,<br />
página 137), onde é referido “O<br />
artigo 10.º, n.º 5, exclui da tributação<br />
as mais-valias obtidas<br />
aquando da alienação de habitação<br />
própria permanente do<br />
sujeito passivo ou do seu agregado<br />
familiar, se houver reinvestimento<br />
na aquisição, construção<br />
ou melhoramento (ou<br />
numa combinação destas diferentes<br />
formas, se bem julgam<strong>os</strong><br />
entender) (…)”. Esta é também a<br />
p<strong>os</strong>ição que tem vindo a ser assumida<br />
em algumas decisões arbitrais,<br />
nas quais a consideração<br />
do valor de aquisição, bem como<br />
subsequentes obras de melhoramento<br />
realizadas no imóvel<br />
alvo de reinvestimento, foram<br />
consideradas como combinações<br />
p<strong>os</strong>síveis, quando as obras<br />
realizadas nesse imóvel se destinaram<br />
a capacitar o mesmo de<br />
condições de habitabilidade (ver<br />
a este respeito, decisão arbitral<br />
proferida no âmbito do processo<br />
n.º 60/2012-T, de 31/07/12).<br />
Não obstante, conhecem<strong>os</strong> igualmente<br />
decisões arbitrais que se<br />
pronunciam em sentido inverso<br />
(ver a este respeito decisão arbitral<br />
proferida no âmbito do processo<br />
n.º 330/2017-T, de 02/11/17).<br />
Nestes cas<strong>os</strong>, o tribunal conclui<br />
que tais encarg<strong>os</strong> (com obras de<br />
melhoria) poderão vir a ser considerad<strong>os</strong><br />
como encarg<strong>os</strong> na valorização<br />
do imóvel, podendo ser<br />
utilizad<strong>os</strong> no âmbito da determinação<br />
do valor de aquisição, nas<br />
condições descritas no artigo 51º<br />
do Código do IRS, para efeit<strong>os</strong> de<br />
apuramento de futura mais-valia<br />
na alienação desse imóvel.<br />
Face às dúvidas existentes e p<strong>os</strong>ições<br />
diversas assumidas pela<br />
jurisprudência, seria, portanto,<br />
importante, que a redação da<br />
norma f<strong>os</strong>se clarificada no sentido<br />
de prever expressamente que<br />
a cumulação de alternativas de<br />
reinvestimento é p<strong>os</strong>sível para<br />
efeit<strong>os</strong> desta exclusão.<br />
Outra das questões que tem suscitado<br />
litígi<strong>os</strong> reside na comprovação<br />
de que o imóvel alienado<br />
(ou o imóvel objeto do reinvestimento)<br />
corresponde à habitação<br />
própria e permanente.<br />
A Autoridade Tributária tem vindo<br />
a considerar (mesmo antes da alteração<br />
introduzida pela Reforma<br />
do IRS em 2015 ao artigo 13º do<br />
Código do IRS), que <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> não podem beneficiar da<br />
exclusão pelo reinvestimento caso<br />
a habitação própria e permanente<br />
não coincida com o domicílio<br />
fiscal d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> ou do<br />
seu agregado familiar.<br />
Esta não tem vindo a ser a p<strong>os</strong>ição<br />
assumida pel<strong>os</strong> tribunais. Com<br />
efeito, a jurisprudência considera<br />
que a morada em certo lugar pode
Tributação Pessoal<br />
demonstrar-se através de fact<strong>os</strong><br />
justificativ<strong>os</strong> de que o sujeito<br />
passivo ou agregado familiar fixou<br />
nesse prédio o centro da sua vida<br />
pessoal (o que pode provar-se<br />
através de certas condições físicas<br />
– casa, mobília, etc. –, jurídicas –<br />
contrat<strong>os</strong>, declarações, inscrições<br />
em regist<strong>os</strong> – e sociais - integração<br />
no meio, conheciment<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />
e pel<strong>os</strong> vizinh<strong>os</strong>, locais de reunião<br />
e confraternização, entre outr<strong>os</strong><br />
(veja-se, por exemplo, o disp<strong>os</strong>to<br />
no acórdão do Supremo Tribunal<br />
Administrativo no âmbito do Processo<br />
0590/11).<br />
Adicionalmente, no que se refere<br />
à necessidade de a morada da<br />
habitação própria e permanente<br />
coincidir com o domicílio fiscal,<br />
é referido na jurisprudência que,<br />
se o legislador pretendesse que<br />
o requisito para o benefício em<br />
causa f<strong>os</strong>se o estabelecimento<br />
do domicílio fiscal no imóvel<br />
adquirido, tê-lo-ia dito expressamente,<br />
como o fez no Estatuto<br />
d<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong> fiscais, para<br />
além de que o artigo 10º nº 5<br />
refere-se a habitação própria e<br />
permanente do sujeito passivo<br />
ou do seu agregado familiar,<br />
sendo que esta alternatividade<br />
apenas poderá ser compreendida<br />
como tendo o sentido de a<br />
habitação própria permanente<br />
poder divergir do domicílio fiscal<br />
(em sustentação do exp<strong>os</strong>to,<br />
veja-se <strong>os</strong> acórdã<strong>os</strong> do CAAD no<br />
âmbito do Processo nº 103/2013-<br />
T, do Processo nº 37/2013-T, do<br />
Processo 47/2014-T, do Processo<br />
nº 721/2015-T e do Processo nº<br />
92/2016-T, entre outr<strong>os</strong>).<br />
Atualmente, esta questão encontra-se<br />
já, de certa forma salvaguardada,<br />
na medida em que,<br />
segundo o disp<strong>os</strong>to no nº10 e<br />
seguintes do artigo 13º do Código<br />
do IRS, não obstante o domicílio<br />
fiscal fazer presumir a<br />
habitação própria e permanente<br />
do sujeito passivo, este pode, a<br />
todo o tempo, apresentar prova<br />
em contrário, considerando-se<br />
preenchido este requisito de<br />
prova, designadamente quando<br />
o sujeito passivo faça prova de<br />
que a sua habitação própria e<br />
permanente é localizada noutro<br />
imóvel, ou faça prova de que não<br />
dispõe de habitação própria e<br />
permanente.<br />
Por tudo quanto foi exp<strong>os</strong>to,<br />
e tendo em conta que <strong>os</strong> valores<br />
envolvid<strong>os</strong> na alienação de<br />
imóveis destinad<strong>os</strong> a habitação<br />
própria e permanente são por<br />
norma elevad<strong>os</strong>, recomendam<strong>os</strong><br />
que estas questões sejam devidamente<br />
acauteladas, por forma<br />
a obviar à oneração destas operações<br />
pela não aplicação da exclusão<br />
de tributação prevista no<br />
n.º 5 do artigo 10º do Código do<br />
IRS. Porque nesta, como em muitas<br />
normas fiscais, “o diabo está<br />
n<strong>os</strong> detalhes”.<br />
Rendiment<strong>os</strong> em espécie<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
São cada vez mais<br />
as empresas que<br />
baseiam o seu sistema<br />
de compensação<br />
numa óptica de<br />
compensação global,<br />
integrando, para além<br />
da componente salarial,<br />
outras remunerações<br />
acessórias, bem como<br />
oportunidades de<br />
carreira ou balanço<br />
com a vida pessoal.<br />
A atribuição destas remunerações<br />
acessórias, frequentemente<br />
não pecuniárias, levanta<br />
questões complexas do ponto<br />
de vista fiscal, nuns cas<strong>os</strong>, pela<br />
ausência de previsão legal que<br />
tribute determinad<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong>,<br />
noutr<strong>os</strong>, por se situarem na zona<br />
de intersecção entre a esfera<br />
pessoal e a esfera empresarial.<br />
A este respeito, a Reforma do IRS<br />
introduziu diversas alterações<br />
ao apuramento do rendimento<br />
tributável de determinad<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
em espécie (designadamente,<br />
no caso de empréstim<strong>os</strong><br />
sem jur<strong>os</strong> ou da utilização<br />
de viaturas que gerem encarg<strong>os</strong><br />
para a entidade patronal), tendo<br />
ainda previsto uma dispensa de<br />
retenção na fonte generalizada<br />
sobre <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> em espécie<br />
(podendo, contudo, <strong>os</strong> trabalhadores<br />
optar pela retenção).<br />
De salientar que não existe no<br />
Código do IRS o conceito de<br />
“rendiment<strong>os</strong> em espécie”, pelo<br />
que, se não se suscitam questões<br />
relativamente à sua qualificação<br />
no caso da atribuição<br />
de bens tangíveis ou d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
mencionad<strong>os</strong> no artigo<br />
24º (como por exemplo, a utilização<br />
de habitação proporcionada<br />
pela entidade patronal, <strong>os</strong><br />
empréstim<strong>os</strong> sem jur<strong>os</strong>, ou <strong>os</strong><br />
plan<strong>os</strong> de opções, de subscrição<br />
ou de atribuição de valores mobiliári<strong>os</strong>),<br />
existem outras situações<br />
relativamente às quais esta<br />
69
Tributação Pessoal<br />
qualificação não é tão linear.<br />
Assim, se uma empresa atribuir<br />
um cartão de refeição a<strong>os</strong> seus<br />
funcionári<strong>os</strong> ou vales-infância<br />
ou educação estam<strong>os</strong> perante<br />
um rendimento pecuniário ou<br />
um rendimento em espécie? E o<br />
que sucede ainda se a empresa<br />
suportar o prémio de seguro de<br />
saúde em benefício d<strong>os</strong> trabalhadores<br />
ou efectuar contribuições<br />
para fund<strong>os</strong> de pensões?<br />
Estas questões são relevantes<br />
se as remunerações em causa<br />
forem sujeitas a IRS por serem<br />
atribuídas acima d<strong>os</strong> limites ou<br />
não cumprirem as condições de<br />
exclusão de tributação.<br />
A questão não é despida de<br />
controvérsia, sendo necessário<br />
averiguar se nestes cas<strong>os</strong> estão<br />
presentes as três características<br />
do dinheiro, a saber: meio de<br />
troca, unidade de conta e reserva<br />
de valor. Numa perspectiva<br />
restrita, poder-se-á considerar<br />
que se uma empresa atribuir<br />
vales ou cartões, estam<strong>os</strong> perante<br />
um rendimento em espécie,<br />
porque não está presente<br />
uma característica essencial do<br />
dinheiro, que é a sua fungibilidade.<br />
Não obstante, existe jurisprudência<br />
do Supremo Tribunal<br />
Administrativo (ex. Acórdão de<br />
21 de Abril de 2010, no âmbito<br />
do Processo nº 0619/19), que<br />
determina, no caso d<strong>os</strong> cartões<br />
-refeição, que estes são “dinheiro”<br />
e constituem um mero meio<br />
de pagamento para uma despesa<br />
potencial que se concretizará<br />
com a utilização desse meio de<br />
pagamento.<br />
Importa, portanto, clarificar qual<br />
o conceito de rendimento em<br />
espécie a adoptar, verificando-se<br />
que, no caso de não ser aplicável<br />
a dispensa de retenção, será<br />
necessário deduzir a correspondente<br />
retenção na fonte a<strong>os</strong> restantes<br />
rendiment<strong>os</strong> colocad<strong>os</strong><br />
à disp<strong>os</strong>ição do trabalhador no<br />
mês em que as importâncias são<br />
atribuídas, sendo que, nalguns<br />
cas<strong>os</strong>, tal pode nem ser “matematicamente”<br />
exequível.<br />
Tributação conjunta<br />
de rendiment<strong>os</strong><br />
70<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
Com a reforma da<br />
tributação do IRS em<br />
2015, o regime regra<br />
em sede deste imp<strong>os</strong>to<br />
passou a ser o da<br />
tributação separada,<br />
podendo, contudo,<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
casad<strong>os</strong> ou unid<strong>os</strong><br />
de facto que reúnam<br />
determinadas condições,<br />
optar pela tributação<br />
conjunta, caso em<br />
que apresentam uma<br />
declaração conjunta da<br />
qual consta a totalidade<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> obtid<strong>os</strong><br />
por tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> membr<strong>os</strong><br />
que integram o agregado<br />
familiar.<br />
Sendo exercida a opção tributação<br />
conjunta, o imp<strong>os</strong>to é devido<br />
pela soma d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
das pessoas que constituem o<br />
agregado familiar. Desta forma, o<br />
agregado familiar constitui a unidade<br />
económica relativamente à<br />
qual se afere a tributação.<br />
Nesta matéria, têm surgido diversas<br />
questões relativamente<br />
à compensação de sald<strong>os</strong> entre<br />
vári<strong>os</strong> titulares de rendiment<strong>os</strong><br />
dentro do mesmo agregado<br />
familiar. Com efeito, de modo a<br />
viabilizar o regime regra de tributação<br />
separada, o modelo de<br />
limitação de dedução de perdas<br />
entre as várias categorias de<br />
rendiment<strong>os</strong> foi alterado, tend<strong>os</strong>e<br />
substituído o regime anterior<br />
de comunicabilidade horizontal<br />
mitigada, para passar a estabelecer-se<br />
a dedução de perdas vertical,<br />
isto é, relativamente a cada<br />
sujeito passivo. Não obstante, o<br />
que sucede no caso da tributação<br />
conjunta? Se um d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> obtiver, por exemplo,<br />
men<strong>os</strong> valias na alienação<br />
oner<strong>os</strong>a de valores mobiliári<strong>os</strong>,<br />
e o outro, mais-valias da mesma<br />
natureza, no caso de tributação<br />
conjunta poderá haver compensação<br />
de sald<strong>os</strong> entre amb<strong>os</strong>?<br />
A p<strong>os</strong>ição da Administração Tributária<br />
tem sido a de que tal<br />
compensação de sald<strong>os</strong> não é<br />
p<strong>os</strong>sível, entendendo que, neste<br />
caso, apenas é permitido o<br />
reporte de perdas para <strong>os</strong> an<strong>os</strong><br />
seguintes, em determinadas circunstâncias.<br />
Por outro lado, a jurisprudência<br />
arbitral não é uniforme.<br />
Em acórdão do CAAD no<br />
âmbito do Processo nº 327/2017-<br />
T, o tribunal arbitral considerou<br />
que “Como já se referiu a tributação<br />
conjunta apenas tem<br />
relevância para o apuramento<br />
do quociente familiar e de algu-
Tributação Pessoal<br />
mas deduções à coleta, sendo o<br />
rendimento líquido apurado por<br />
titular”. Já no acórdão do CAAD<br />
no Processo nº 739/2016-T, o<br />
tribunal refere que “A alteração<br />
legislativa ocorrida a partir de 1<br />
de janeiro de 2015 em nada alterou<br />
a forma de apuramento do<br />
ganho sujeito a imp<strong>os</strong>to, que, no<br />
caso de valores mobiliári<strong>os</strong>, se<br />
continua a fazer n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />
artig<strong>os</strong> 43.º e 48.º do Código do<br />
IRS (…) tais normas não consagram<br />
qualquer tipo de proibição<br />
de comunicação horizontal de<br />
perdas, como parece fazer o artigo<br />
55.º, para o caso de reporte<br />
de resultad<strong>os</strong> negativ<strong>os</strong>.”<br />
Atento o facto de que família<br />
é uma unidade económica em<br />
que as decisões se tomam em<br />
conjunto e <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> são<br />
p<strong>os</strong>t<strong>os</strong> em comum, a opção pela<br />
tributação conjunta deverá permitir<br />
a compensação de sald<strong>os</strong><br />
entre <strong>os</strong> titulares d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong>.<br />
Por outro lado, e em caso de<br />
contitularidade d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong>,<br />
deverão <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> assegurar-se<br />
que <strong>os</strong> intermediári<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> e outras entidades<br />
que reportam rendiment<strong>os</strong> <strong>os</strong> fazem<br />
na proporção das respetivas<br />
quotas, de modo a minimizar <strong>os</strong><br />
impact<strong>os</strong> de uma eventual não<br />
compensação de sald<strong>os</strong>.<br />
Tributação<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> de an<strong>os</strong><br />
anteriores – solução à vista?<br />
ANABELA SILVA<br />
People Advisory Services Leader<br />
A tributação d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> produzid<strong>os</strong><br />
em an<strong>os</strong> anteriores,<br />
em matéria de Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento<br />
das Pessoas Singulares<br />
(“IRS”), encontra-se<br />
prevista n<strong>os</strong> artig<strong>os</strong> 74º<br />
e 62º do Código do IRS,<br />
e tem sido, n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong><br />
an<strong>os</strong>, alvo de inúmeras<br />
críticas e queixas por<br />
parte d<strong>os</strong> contribuintes,<br />
nomeadamente junto<br />
do Provedor de Justiça.<br />
De acordo com dad<strong>os</strong> disponibilizad<strong>os</strong><br />
pela Provedoria da<br />
Justiça, desde 2005, este órgão<br />
do Estado recebeu mais de 150<br />
queixas – 31 das quais no corrente<br />
ano – relativamente a este<br />
assunto.<br />
Há uma multiplicidade de situações<br />
que podem conduzir à<br />
obtenção de rendiment<strong>os</strong>, num<br />
determinado ano, que respeitam<br />
a an<strong>os</strong> anteriores. A título meramente<br />
exemplificativo, pode suceder<br />
que o tribunal determine,<br />
no âmbito de um processo judicial,<br />
a ilicitude do despedimento<br />
e o pagamento de retribuições<br />
vencidas até ao trânsito em<br />
julgado da sentença (podendo<br />
estas respeitar a vári<strong>os</strong> an<strong>os</strong>).<br />
Noutr<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, pode a entidade<br />
patronal proceder ao pagamento<br />
de retroativ<strong>os</strong> relativamente ao<br />
ano(s) anterior(es). Pode ainda<br />
verificar-se, num determinado<br />
ano, o recebimento de pensões<br />
relativas a an<strong>os</strong> anteriores decorrentes<br />
do atraso na apreciação<br />
do pedido por parte do Centro<br />
Nacional de Pensões, ou por<br />
recálculo do respetivo valor.<br />
Sempre que se obtenham, num<br />
determinado ano, rendiment<strong>os</strong><br />
que foram produzid<strong>os</strong> em an<strong>os</strong><br />
anteriores, esta situação é suscetível<br />
de gerar uma tributação<br />
distinta (e frequentemente mais<br />
grav<strong>os</strong>a) que aquela que existiria<br />
se <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> f<strong>os</strong>sem imputáveis<br />
ao(s) ano(s) em causa,<br />
em virtude da progressividade<br />
do IRS e pela subida do escalão<br />
de tributação em que normalmente<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
se enquadrariam. Assim, para<br />
além de <strong>os</strong> contribuintes serem<br />
prejudicad<strong>os</strong> pelo atraso no recebimento<br />
das quantias que lhe<br />
são devidas, poderão ainda ser<br />
ainda penalizad<strong>os</strong> com uma tributação<br />
mais grav<strong>os</strong>a que a que<br />
seria aplicável se <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
f<strong>os</strong>sem obtid<strong>os</strong> em cada um<br />
d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> devid<strong>os</strong>.<br />
Percorrendo as soluções adotadas<br />
ao longo d<strong>os</strong> an<strong>os</strong> relativamente<br />
ao tratamento d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
produzid<strong>os</strong> em an<strong>os</strong><br />
anteriores, é p<strong>os</strong>sível constatar<br />
que este tratamento tem vindo<br />
71
Tributação Pessoal<br />
72<br />
a sofrer sucessivas alterações.<br />
Com efeito, até 2001, o artigo<br />
24º do Código do IRS permitia<br />
o reporte fiscal de rendiment<strong>os</strong><br />
ao ano ou an<strong>os</strong> em que foram<br />
produzid<strong>os</strong>, sempre que <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
tivessem sido produzid<strong>os</strong><br />
n<strong>os</strong> cinco an<strong>os</strong> anteriores,<br />
implicando a emissão de uma<br />
liquidação adicional relativa ao<br />
ano(s) em causa e o consequente<br />
recálculo do valor do imp<strong>os</strong>to<br />
a pagar/receber.<br />
Essa disp<strong>os</strong>ição foi, no entanto,<br />
revogada pela Lei n.º 30-G/2000,<br />
de 29 de dezembro, impondo-se,<br />
em consequência, o englobamento<br />
na declaração referente<br />
ao ano em que <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
tivessem sido obtid<strong>os</strong>, d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
produzid<strong>os</strong> em an<strong>os</strong><br />
anteriores. Esta alteração foi à<br />
data justificada pela excessiva<br />
complexidade que o reporte fiscal<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> ao ano em<br />
causa implicava para a Autoridade<br />
Tributária. Não obstante, a<br />
mesma acarretava uma tributação<br />
extremamente grav<strong>os</strong>a para<br />
o contribuinte, atento o acréscimo<br />
extraordinário de rendiment<strong>os</strong>,<br />
resultante do pagamento extemporâneo<br />
de valores que eram<br />
já devid<strong>os</strong>.<br />
De molde a atenuar este efeito,<br />
a Lei n.º 85/2001, de 4 de Ag<strong>os</strong>to,<br />
introduziu alterações ao artigo<br />
74º do Código do IRS passando<br />
o mesmo a prever que o valor<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> produzid<strong>os</strong> em<br />
an<strong>os</strong> anteriores seria dividido<br />
pelo número de an<strong>os</strong> ou fração<br />
a que <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> respeitassem,<br />
com o máximo de quatro, aplicando-se<br />
à globalidade d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
a taxa correspondente<br />
à soma daquele quociente com<br />
<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> produzid<strong>os</strong> no<br />
ano.<br />
Esta alteração permitiu atenuar<br />
parcialmente o impacto na tributação,<br />
contudo, continuavam<br />
a verificar-se situações em que<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> eram significativamente<br />
penalizad<strong>os</strong> no<br />
tratamento destes rendiment<strong>os</strong>,<br />
tendo sido inclusivamente suscitada<br />
a inconstitucionalidade<br />
da norma prevista no artigo 74º<br />
do Código do IRS - a qual foi,<br />
contudo, rejeitada pelo Tribunal<br />
Constitucional, conforme resulta<br />
do Acórdão proferido no âmbito<br />
do Processo nº 107/2010.<br />
P<strong>os</strong>teriormente, com a Lei nº<br />
3-B/2010, de 28 de abril, a redação<br />
do artigo 74º foi novamente<br />
alterada no sentido de permitir a<br />
divisão do valor d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
de an<strong>os</strong> anteriores pela soma do<br />
número de an<strong>os</strong> ou fração a que<br />
respeitem, no máximo de seis,<br />
incluindo o ano do recebimento.<br />
E, mais recentemente, com a<br />
Reforma Fiscal de 2015, o rendimento<br />
passou a ser dividido<br />
pelo número de an<strong>os</strong> ou fração<br />
de rendimento a que respeitem,<br />
incluindo o ano do recebimento,<br />
sem qualquer limitação. Não<br />
obstante o exp<strong>os</strong>to, continuavam<br />
a suceder situações em que<br />
<strong>os</strong> contribuintes eram penalizad<strong>os</strong><br />
por esta solução, sobretudo<br />
n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de recálculo de pensões,<br />
pagament<strong>os</strong> de salári<strong>os</strong> em<br />
atraso ou decisões judiciais.<br />
Neste contexto, é de destacar a<br />
alteração agora introduzida ao<br />
artigo 74º do Código do IRS pela<br />
Lei nº 119/2019, de 18 de setembro,<br />
com entrada em vigor a 1<br />
de outubro de 2019, a qual contempla,<br />
em certa medida, uma<br />
solução similar à do reporte fiscal<br />
de rendiment<strong>os</strong> previsto no<br />
anterior artigo 24º do Código do<br />
IRS. De acordo com a redação que<br />
irá agora entrar em vigor, sempre<br />
que seja p<strong>os</strong>sível imputar <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
a an<strong>os</strong> anteriores em<br />
concreto, pode o sujeito passivo,<br />
em alternativa à divisão pelo número<br />
de an<strong>os</strong> a que respeita o<br />
rendimento, proceder à entrega<br />
de declarações de substituição<br />
relativamente a<strong>os</strong> an<strong>os</strong> em causa,<br />
com o limite do quinto ano<br />
imediatamente anterior ao do<br />
pagamento ou colocação à disp<strong>os</strong>ição<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> (sem<br />
prejuízo da divisão pelo número<br />
de an<strong>os</strong> relativamente a<strong>os</strong> restantes<br />
rendiment<strong>os</strong>, se aplicável),<br />
não sendo, contudo, esta p<strong>os</strong>sibilidade<br />
aplicável no caso de rendiment<strong>os</strong><br />
litigi<strong>os</strong><strong>os</strong>. Para este efeito,<br />
as entidades processadoras<br />
d<strong>os</strong> pagament<strong>os</strong> devem efetuar<br />
a discriminação d<strong>os</strong> montantes<br />
respeitantes a cada um d<strong>os</strong> an<strong>os</strong>.<br />
Não obstante o exp<strong>os</strong>to, o facto<br />
tributário considera-se sempre<br />
verificado no ano do pagamento<br />
ou colocação à disp<strong>os</strong>ição d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> para efeit<strong>os</strong> de contagem<br />
do prazo de caducidade.<br />
Com esta alteração, espera-se<br />
que se venha a reduzir substancialmente<br />
o número de cas<strong>os</strong> em<br />
que <strong>os</strong> contribuintes são penalizad<strong>os</strong><br />
com o recebimento d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> de an<strong>os</strong> anteriores,<br />
embora tal p<strong>os</strong>sa ainda vir a suceder<br />
no caso de rendiment<strong>os</strong><br />
litigi<strong>os</strong><strong>os</strong> (sem que seja percetível<br />
as razões para tal exclusão),<br />
sendo, no entanto, fundamental<br />
que <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> simulem<br />
o impacto de optarem pela<br />
entrega de declarações de substituição<br />
em alternativa à divisão<br />
do rendimento pelo número de<br />
an<strong>os</strong> a que o mesmo respeita.<br />
Até porque, no caso do IRS automático,<br />
estas situações de rendiment<strong>os</strong><br />
de an<strong>os</strong> anteriores não<br />
estão excluídas e presumim<strong>os</strong><br />
que será esta última, a opção<br />
que o sistema irá assumir.<br />
De referir, por último, que são<br />
cada vez mais <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> em que<br />
<strong>os</strong> contribuintes necessitam de<br />
efetuar várias simulações a fim<br />
de assegurarem que a sua liquidação<br />
de IRS é a men<strong>os</strong> oner<strong>os</strong>a
Tributação Pessoal<br />
p<strong>os</strong>sível: tributação conjunta<br />
versus tributação separada; tributação<br />
autónoma versus englobamento<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
da mesma categoria; tributação<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> prediais na esfera<br />
da categoria B – rendiment<strong>os</strong><br />
empresariais e profissionais<br />
– ou da categoria F – rendiment<strong>os</strong><br />
prediais; tributação<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> da categoria<br />
B – rendiment<strong>os</strong> empresariais<br />
e profissionais ao abrigo do regime<br />
simplificado ou da contabilidade<br />
organizada (n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />
em que tal opção é p<strong>os</strong>sível);<br />
apenas para citar alguns cas<strong>os</strong>.<br />
Deste modo, é cada vez mais<br />
importante que <strong>os</strong> contribuintes<br />
analisem as diversas alternativas<br />
ao seu dispor, de modo a assegurar<br />
a opção pela alternativa<br />
que lhes é men<strong>os</strong> oner<strong>os</strong>a do<br />
ponto de vista fiscal.<br />
Captação de Talento:<br />
depois do Startup Visa,<br />
chega o Tech Visa<br />
BHAVIK CHUNILAL<br />
Manager, People Advisory Services<br />
Portugal tem vindo<br />
a assistir a um aumento<br />
do investimento<br />
estrangeiro,<br />
nomeadamente<br />
na área tecnológica,<br />
destacando-se<br />
as recentes criações<br />
de centr<strong>os</strong> tecnológic<strong>os</strong><br />
em território nacional<br />
por parte de grandes<br />
empresas, tais como<br />
a Volkswagen,<br />
a Google e a BMW.<br />
Face ao desenvolvimento da dinâmica<br />
tecnológica no meio empresarial<br />
português, o Governo<br />
criou o Tech Visa, em vigor desde<br />
1 de janeiro de 2019, cujo principal<br />
objetivo é apoiar as empresas<br />
na atração e retenção de talento<br />
estrangeiro altamente qualificado.<br />
Para o efeito, o Tech Visa estabelece<br />
um regime de certificação de<br />
empresas tecnológicas e inovadoras,<br />
de modo a agilizar o processo<br />
de obtenção de visto ou autorização<br />
de residência por parte de<br />
indivídu<strong>os</strong> nacionais de Estad<strong>os</strong><br />
terceir<strong>os</strong> que pretendam desenvolver<br />
uma atividade altamente<br />
qualificada em Portugal.<br />
Assim, em conformidade com o<br />
exp<strong>os</strong>to na Portaria nº 328/2018<br />
de 19 de dezembro, as empresas<br />
podem agora candidatar-se a esta<br />
certificação através da plataforma<br />
disponibilizada pelo IAPMEI –<br />
Agência para a Competitividade e<br />
Inovação, I.P. (IAPMEI), sendo esta<br />
entidade responsável pela avaliação<br />
das candidaturas.<br />
Para que uma empresa obtenha<br />
a certificação em apreço, cuja validade<br />
é de 2 an<strong>os</strong>, renovável por<br />
iguais períod<strong>os</strong>, determinad<strong>os</strong><br />
critéri<strong>os</strong> deverão ser preenchid<strong>os</strong>,<br />
entre <strong>os</strong> quais se destacam<br />
<strong>os</strong> seguintes (lista não exaustiva):<br />
l Desenvolvimento de atividade<br />
de produção de bens e serviç<strong>os</strong><br />
internacionalizáveis;<br />
l Demonstração de base tecnológica<br />
e inovadora da atividade,<br />
através do cumpriment<strong>os</strong> de pelo<br />
men<strong>os</strong> duas de um conjunto de<br />
condições específicas, tais como:<br />
i) ser uma startup criada há pelo<br />
men<strong>os</strong> 2 an<strong>os</strong>, que desenvolva a<br />
sua atividade em setores de alta<br />
ou média-alta tecnologia ou de<br />
forte intensidade de conhecimento;<br />
ii) p<strong>os</strong>suir mais de 15% de trabalhadores<br />
altamente qualificad<strong>os</strong>;<br />
iii) ter um crescimento médio<br />
anual do volume de negócio superior<br />
a 20%, n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> 3 an<strong>os</strong>;<br />
iv) ter angariado investimento de<br />
capital de risco, através da entrada<br />
de fund<strong>os</strong> de i Venture Capital<br />
ou Business Angels, n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> 3<br />
an<strong>os</strong>;<br />
l Obtenção de uma avaliação<br />
p<strong>os</strong>itiva, por parte do IAPMEI, n<strong>os</strong><br />
seguintes fatores: potencial de<br />
mercado; grau de inovação tecnológica<br />
e orientação para <strong>os</strong> mercad<strong>os</strong><br />
extern<strong>os</strong>;<br />
l Situação regularizada perante a<br />
Autoridade Tributária e a Segurança<br />
Social.<br />
73
Tributação Pessoal<br />
Verificad<strong>os</strong> <strong>os</strong> requisit<strong>os</strong> previst<strong>os</strong><br />
pelo Governo e obtida decisão<br />
p<strong>os</strong>itiva relativamente à sua<br />
candidatura, a empresa, agora<br />
certificada, passa a poder emitir<br />
term<strong>os</strong> de responsabilidade a<strong>os</strong><br />
nacionais de Estad<strong>os</strong> terceir<strong>os</strong><br />
que pretenda integrar n<strong>os</strong> seus<br />
quadr<strong>os</strong> relacionad<strong>os</strong> com o setor<br />
tecnológico, eliminando, assim,<br />
a necessidade de recorrer à Fundação<br />
para a Ciência e Tecnologia,<br />
I.P., para obtenção de um parecer<br />
prévio, comprovativo de atividade<br />
qualificada.<br />
Assim, o termo de responsabilidade,<br />
cujo formulário poderá ser<br />
obtido na plataforma do IAPMEI e<br />
que terá um prazo de validade de<br />
6 meses a contar da sua emissão,<br />
passa a constituir documento de<br />
caráter obrigatório para efeit<strong>os</strong> de<br />
pedido de visto ou autorização de<br />
residência.<br />
Para que um cidadão estrangeiro<br />
p<strong>os</strong>sa ver a sua atividade ser reconhecida<br />
como altamente qualificada,<br />
n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do programa<br />
Tech Visa, terá igualmente de assegurar<br />
determinad<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong><br />
de elegibilidade, nomeadamente:<br />
l Ser cidadão de Estado terceiro e<br />
não residir de forma permanente<br />
na União Europeia;<br />
l Evidenciar o exercício de atividade<br />
altamente qualificada,<br />
comprovando, entre outr<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong><br />
alternativ<strong>os</strong>, ser detentor de<br />
um nível de qualificação mínima<br />
de nível V, de acordo com o IS-<br />
CED-2011 (i.e., bacharelato, licenciatura,<br />
mestrado);<br />
l Ter uma remuneração anual mínima<br />
equivalente a 2,5 vezes o IAS<br />
– Indexante de Apoi<strong>os</strong> Sociais;<br />
l Dominar a língua portuguesa<br />
ou inglesa, conforme as funções a<br />
desempenhar.<br />
De salientar que as empresas que<br />
pretendam obter esta certificação<br />
poderão submeter a sua candidatura,<br />
na plataforma online criada<br />
para o efeito, até ao dia 31 de dezembro<br />
de 2019, a qual será analisada<br />
no prazo de 20 dias úteis,<br />
findo o qual serão notificadas da<br />
decisão do IAPMEI.<br />
Assim, as empresas tecnológicas<br />
a atuarem em território português<br />
passam, agora, a poder contar<br />
com o programa Tech Visa, que<br />
vem complementar o anteriormente<br />
criado Startup Visa, que se<br />
destina a investidores que pretendam<br />
desenvolver startups em<br />
Portugal.<br />
Englobar ou não englobar?<br />
Quando vale a pena?<br />
DANILO MARIANO<br />
Senior Consultant,<br />
People Advisory Services<br />
Estam<strong>os</strong> a 20 de Maio,<br />
e decorrido mais de metade<br />
do período de entrega do IRS<br />
de 2018, muit<strong>os</strong> contribuintes<br />
ainda têm dúvidas sobre<br />
quais as situações em que<br />
é mais vantaj<strong>os</strong>o optar pela<br />
tributação autónoma ou,<br />
alternativamente, pelo englobamento<br />
d<strong>os</strong> seus rendiment<strong>os</strong>.<br />
Nesse sentido, abaixo<br />
descrevem<strong>os</strong> <strong>os</strong> principais aspet<strong>os</strong><br />
a ter em consideração<br />
relativamente ao exercício<br />
dessa opção no momento<br />
da submissão do IRS.<br />
O que é o englobamento?<br />
O artigo 22º do Código do IRS<br />
estipula que o rendimento coletável<br />
em IRS é o que resulta do<br />
englobamento (i.e., do somatório)<br />
d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> das várias<br />
categorias auferid<strong>os</strong> em cada<br />
ano, depois de feitas as deduções<br />
e <strong>os</strong> abatiment<strong>os</strong> previst<strong>os</strong><br />
naquele Código.<br />
Há, contudo, algumas exceções,<br />
em que <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> não<br />
são englobad<strong>os</strong> para efeit<strong>os</strong> de<br />
determinação do rendimento<br />
coletável, mas sim sujeit<strong>os</strong> a tributação<br />
autónoma, sem prejuízo<br />
da opção pelo englobamento<br />
prevista na lei para alguns cas<strong>os</strong>.<br />
Assim, o Código do IRS, permite,<br />
por exemplo, que o contribuinte<br />
opte por englobar <strong>os</strong> seus diferentes<br />
tip<strong>os</strong> de rendiment<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> à tributação autónoma,<br />
como por exemplo <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
prediais ou rendiment<strong>os</strong> de<br />
capitais (jur<strong>os</strong> e dividend<strong>os</strong>) entre<br />
outr<strong>os</strong>, com <strong>os</strong> demais rendiment<strong>os</strong><br />
de trabalho (dependente<br />
ou independente) e pensões, a<br />
fim de determinar o seu rendimento<br />
coletável. Exercida a opção<br />
pelo englobamento, <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
que estariam sujeit<strong>os</strong><br />
às taxas autónomas passariam a<br />
estar sujeit<strong>os</strong> às taxas progressivas<br />
e <strong>os</strong> contribuintes passariam<br />
igualmente a ter direito às deduções<br />
à coleta.<br />
Quando é vantaj<strong>os</strong>o englobar?<br />
A fim de determinar se é ou não<br />
vantaj<strong>os</strong>o exercer a opção pelo<br />
englobamento, o contribuinte<br />
deve ter em atenção que, ao op-<br />
74
Tributação Pessoal<br />
tar pelo englobamento, <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
que anteriormente eram<br />
sujeit<strong>os</strong> às taxas autónomas<br />
(28% na generalidade d<strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />
para <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de rendiment<strong>os</strong><br />
prediais, de capitais e mais-valias,<br />
por exemplo), passam a ser<br />
sujeit<strong>os</strong> às taxas progressivas<br />
podendo atingir até 48% (acrescid<strong>os</strong><br />
da taxa adicional de solidariedade,<br />
entre 2,5% e 5%). No<br />
entanto, em alguns cas<strong>os</strong>, parte<br />
do rendimento é excluído de tributação<br />
(como por exemplo n<strong>os</strong><br />
dividend<strong>os</strong>, que são considerad<strong>os</strong><br />
em apenas 50 % do seu valor<br />
em caso de englobamento, e em<br />
determinadas condições).<br />
Portanto, a opção pelo englobamento<br />
é normalmente mais<br />
vantaj<strong>os</strong>a para <strong>os</strong> contribuintes<br />
que não p<strong>os</strong>suem rendiment<strong>os</strong><br />
do trabalho ou obtenham rendiment<strong>os</strong><br />
reduzid<strong>os</strong>. Assim, ao<br />
englobar <strong>os</strong> demais rendiment<strong>os</strong><br />
e depois de feitas as deduções,<br />
a taxa final de imp<strong>os</strong>to será inferior<br />
a<strong>os</strong> 28% aplicáveis autonomamente<br />
(no caso d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
acima indicad<strong>os</strong>).<br />
Outro cenário em que será mais<br />
vantaj<strong>os</strong>o optar pelo englobamento<br />
é quando o contribuinte<br />
tem um saldo final negativo (i.e.,<br />
de men<strong>os</strong>-valias) da Categoria<br />
G (com exceção das mais-valias<br />
imobiliárias que p<strong>os</strong>suem regras<br />
distintas), uma vez que ao<br />
englobar, o contribuinte poderá<br />
usar o saldo negativo para compensar<br />
eventuais mais-valias da<br />
mesma categoria d<strong>os</strong> cinco an<strong>os</strong><br />
seguintes.<br />
É importante notar que, ao optar<br />
pelo englobamento, tod<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> da mesma categoria<br />
serão igualmente englobad<strong>os</strong>.<br />
Ou seja, na Categoria E<br />
(Rendiment<strong>os</strong> de Capitais) não<br />
será p<strong>os</strong>sível englobar somente<br />
<strong>os</strong> jur<strong>os</strong> e não englobar <strong>os</strong> dividend<strong>os</strong>,<br />
assim como não é p<strong>os</strong>sível<br />
optar pelo englobamento<br />
de somente uma renda de um<br />
imóvel cujo montante é baixo,<br />
e não optar pelo englobamento<br />
das rendas de um segundo imóvel<br />
de montantes mais elevad<strong>os</strong>.<br />
Tendo em conta o exp<strong>os</strong>to, a opção<br />
pelo englobamento pode ser<br />
muito vantaj<strong>os</strong>a em alguns cenári<strong>os</strong><br />
e prejudicial noutr<strong>os</strong>, pelo<br />
que antes de pr<strong>os</strong>seguir com a<br />
entrega da sua declaração de<br />
IRS de 2018, recomendam<strong>os</strong> que<br />
sejam feitas simulações com e<br />
sem a opção pelo englobamento<br />
a fim de verificar qual o melhor<br />
cenário.<br />
Como declarar <strong>os</strong> filh<strong>os</strong><br />
na Modelo 3 de IRS?<br />
JOANA FREITAS<br />
Senior Manager, People<br />
Advisory Services<br />
Em plena época fiscal<br />
e tendo em conta as<br />
questões que muitas<br />
vezes surgem a<br />
respeito da inclusão<br />
ou não d<strong>os</strong> filh<strong>os</strong><br />
nas declarações bem<br />
como das deduções a<br />
que estes podem dar<br />
lugar, sistematizam-se<br />
abaixo <strong>os</strong> principais<br />
aspet<strong>os</strong> a ter em<br />
consideração.<br />
N<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do Código do IRS,<br />
consideram-se dependentes:<br />
l Os filh<strong>os</strong>, adotad<strong>os</strong> e entead<strong>os</strong>,<br />
menores não emancipad<strong>os</strong>, bem<br />
como <strong>os</strong> menores sob tutela;<br />
l Os filh<strong>os</strong>, adotad<strong>os</strong> e entead<strong>os</strong>,<br />
maiores, bem como aqueles que<br />
até à maioridade estiveram sujeit<strong>os</strong><br />
à tutela de qualquer d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> a quem incumbe a direção<br />
do agregado familiar, que<br />
não tenham mais de 25 an<strong>os</strong><br />
nem aufiram anualmente rendiment<strong>os</strong><br />
superiores ao valor da<br />
retribuição mínima mensal garantida<br />
(a escolaridade deixou<br />
de ser critério com a Reforma do<br />
IRS de 2015);<br />
l Os filh<strong>os</strong>, adotad<strong>os</strong>, entead<strong>os</strong><br />
e <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> a tutela, maiores,<br />
inapt<strong>os</strong> para o trabalho e para<br />
angariar mei<strong>os</strong> de subsistência;<br />
l Os afilhad<strong>os</strong> civis.<br />
De salientar que, salvo as exceções<br />
previstas no Código do IRS,<br />
<strong>os</strong> dependentes não podem, simultaneamente,<br />
fazer parte de<br />
mais de um agregado familiar<br />
nem, integrando um agregado<br />
familiar, ser considerad<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> autónom<strong>os</strong>.<br />
Em qualquer situação, <strong>os</strong> dependentes<br />
só assim podem ser considerad<strong>os</strong><br />
na Declaração de IRS<br />
se devidamente identificad<strong>os</strong><br />
com Número de Identificação<br />
Fiscal (NIF). Adicionalmente, e<br />
sem prejuízo do que se expõe de<br />
seguida, <strong>os</strong> dependentes maiores<br />
podem optar pela entrega<br />
em separado, sendo, assim, tributad<strong>os</strong><br />
de forma autónoma.<br />
75
Tributação Pessoal<br />
76<br />
No caso de pais casad<strong>os</strong> ou<br />
unid<strong>os</strong> de facto, quer no caso<br />
de tributação separada quer de<br />
tributação conjunta, amb<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
element<strong>os</strong> do casal identificam<br />
<strong>os</strong> dependentes na Declaração<br />
de IRS. Há, no entanto, aspet<strong>os</strong><br />
específic<strong>os</strong> a ter em conta na tributação<br />
separada: (i) no que respeita<br />
a<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong>, cada um<br />
d<strong>os</strong> cônjuges ou d<strong>os</strong> unid<strong>os</strong> de<br />
facto, apresenta uma Declaração,<br />
da qual constam <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
de que é titular e 50 % d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> d<strong>os</strong> dependentes<br />
do agregado; (ii) por outro lado,<br />
em matéria de deduções à coleta,<br />
<strong>os</strong> limites das deduções são<br />
reduzid<strong>os</strong> para metade e as percentagens<br />
de deduções à coleta<br />
são aplicadas à totalidade das<br />
despesas de que cada sujeito<br />
passivo seja titular acrescida de<br />
50 % das despesas de que sejam<br />
titulares <strong>os</strong> dependentes que integram<br />
o agregado familiar.<br />
Já no caso de pais não casad<strong>os</strong><br />
ou unid<strong>os</strong> de facto, colocam-se<br />
questões relacionadas com a repartição<br />
das responsabilidades<br />
parentais.<br />
Quando as responsabilidades<br />
parentais são exercidas em comum<br />
por mais do que um sujeito<br />
passivo, sem que estes<br />
estejam integrad<strong>os</strong> no mesmo<br />
agregado familiar, <strong>os</strong> dependentes<br />
são considerad<strong>os</strong> como integrando<br />
o agregado do sujeito<br />
passivo a que corresponder a<br />
residência determinada no âmbito<br />
da regulação do exercício<br />
das responsabilidades parentais,<br />
ou o agregado do sujeito<br />
passivo com o qual o dependente<br />
tenha identidade de domicílio<br />
fiscal no último dia do<br />
ano a que o imp<strong>os</strong>to respeite,<br />
quando, no âmbito da regulação<br />
do exercício das responsabilidades<br />
parentais, não tiver sido determinada<br />
a sua residência ou<br />
não seja p<strong>os</strong>sível apurar a sua<br />
residência habitual.<br />
Sem prejuízo do disp<strong>os</strong>to acima,<br />
e n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do disp<strong>os</strong>to<br />
na Lei n.º 106/2017, de 4 de setembro,<br />
<strong>os</strong> dependentes podem<br />
ser incluíd<strong>os</strong> nas Declarações<br />
de amb<strong>os</strong> <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
para efeit<strong>os</strong> de imputação de<br />
rendiment<strong>os</strong> e de deduções. No<br />
caso de <strong>os</strong> dependentes terem<br />
obtido rendiment<strong>os</strong>, estes devem<br />
ser incluíd<strong>os</strong> na Declaração<br />
do agregado em que se integram,<br />
ou ser dividid<strong>os</strong> em partes iguais<br />
a incluir, respetivamente, em<br />
cada uma das Declarações d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong>, em caso de residência<br />
alternada estabelecida<br />
em Acordo de Regulação do Poder<br />
Parental. Para este efeito, até<br />
15 de fevereiro do ano seguinte<br />
àquele a que o imp<strong>os</strong>to respeita,<br />
devem <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> comunicar<br />
no Portal das Finanças<br />
a existência de residência alternada.<br />
Por sua vez, em term<strong>os</strong> de deduções<br />
à coleta, há que distinguir<br />
entre a dedução fixa e as deduções<br />
por despesas.<br />
A dedução fixa é partilhada n<strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong> em que conste do Acordo<br />
de Regulação do Poder Parental<br />
a residência alternada d<strong>os</strong> menores<br />
(comunicada até 15 de Fevereiro<br />
do ano seguinte àquele a<br />
que o ano respeita). Caso contrário,<br />
e relativamente à Declaração<br />
de IRS de 2018, para quem não<br />
o tenha feito, será aplicada a<br />
dedução, na totalidade, apenas<br />
ao progenitor de quem o dependente<br />
faça parte do respetivo<br />
agregado familiar.<br />
Em relação às deduções à coleta<br />
por despesas, essas deduções<br />
passam a ser consideradas de<br />
forma proporcional à contribuição<br />
de cada progenitor para as<br />
mesmas despesas (desde que<br />
a repartição de despesas conste<br />
do Acordo de Regulação do<br />
Poder Paternal e seja comunicada<br />
até 15 de fevereiro do ano<br />
seguinte àquele a que respeita<br />
o imp<strong>os</strong>to). Caso não seja efetuada<br />
a comunicação no prazo<br />
estabelecido para o efeito, ou<br />
n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> em que a soma das<br />
percentagens comunicadas por<br />
amb<strong>os</strong> <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> não<br />
corresponda a 100%, o valor das<br />
deduções à coleta será dividido<br />
por igual entre <strong>os</strong> dois progenitores.<br />
Importa ainda chamar a atenção<br />
para uma ficha doutrinária publicada<br />
pela Autoridade Tributária<br />
no âmbito do Processo n.º<br />
3454/17, com despacho concordante<br />
da Subdiretora Geral, de<br />
05-12-2017, na qual se vem esclarecer<br />
que o conceito de dependente<br />
não abrange as situações<br />
decorrentes da atribuição das<br />
responsabilidades parentais a<br />
um terceiro.<br />
A Autoridade Tributária publica<br />
tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> an<strong>os</strong> um folheto informativo<br />
que pode ser consultado<br />
em http://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/apoio_contribuinte/Folhet<strong>os</strong>_informativ<strong>os</strong>/Documents/IRS_folheto_2018.pdf<br />
e que resume todas as deduções<br />
previstas com indicação d<strong>os</strong> limites<br />
aplicáveis.
A segurança jurídica<br />
d<strong>os</strong> regimes especiais<br />
Tributação Pessoal<br />
PAULO MENDONÇA<br />
Partner, Tax Services<br />
Recentemente<br />
reabriu-se a polémica<br />
à volta d<strong>os</strong> regimes<br />
d<strong>os</strong> residentes não<br />
habituais e d<strong>os</strong> vist<strong>os</strong><br />
Gold. Portugal também<br />
tem a Comissão<br />
Europeia a rever o<br />
regime fiscal da Zona<br />
Franca da Madeira<br />
(ZFM) no âmbito de<br />
um procedimento por<br />
auxíli<strong>os</strong> de Estado<br />
ilegais que, se correr<br />
mal, provavelmente a<br />
atingirá de forma letal.<br />
Poderíam<strong>os</strong> pensar que a existência<br />
destes regimes é uma<br />
invenção portuguesa, mas a verdade<br />
é que eles proliferam por<br />
toda a União Europeia. E têm<br />
um objetivo claro: permitir alguma<br />
vantagem competitiva que<br />
equilibre <strong>os</strong> prat<strong>os</strong> da balança<br />
no caso de países ou territóri<strong>os</strong><br />
que, por razões naturais ou<br />
conjunturais, são normalmente<br />
preterid<strong>os</strong> nas decisões de investimento<br />
que p<strong>os</strong>sibilitam a<br />
captação de capitais, a criação<br />
de emprego e, por fim, direta<br />
ou indiretamente, o aumento da<br />
receita fiscal. Quando um país<br />
que conseguiu implementar um<br />
desses regimes o perde, imediatamente<br />
outro país recebe todo<br />
o investimento perdido.<br />
E a existência destes regimes<br />
faz perder alguma receita fiscal<br />
ou de natureza semelhante?<br />
Obviamente que não. Se não<br />
existirem vist<strong>os</strong> Gold em Portugal,<br />
<strong>os</strong> candidat<strong>os</strong> escolherão<br />
Espanha, Chipre ou a Irlanda. O<br />
mesmo se aplicará no caso d<strong>os</strong><br />
residentes não-habituais ou se<br />
se permitir que o regime da ZFM<br />
seja ainda mais fragilizado. Não<br />
se gera qualquer receita adicional.<br />
Na verdade, evaporam-se<br />
empreg<strong>os</strong>, depósit<strong>os</strong> bancári<strong>os</strong><br />
e outras aplicações no n<strong>os</strong>so<br />
sistema financeiro e reduz-se a<br />
atividade imobiliária. Tudo efeit<strong>os</strong><br />
negativ<strong>os</strong>. Aliás, a existência<br />
destes regimes especiais induzem<br />
receitas adicionais que de<br />
outra forma não existiriam. Ou<br />
seja, estarem<strong>os</strong> sempre a trocar<br />
alguma coisa por nada.<br />
Será que Portugal se pode dar ao<br />
luxo de alterar ou mesmo terminar<br />
estes regimes antes do tempo?<br />
A resp<strong>os</strong>ta, do ponto de vista<br />
do bom senso, só pode ser negativa.<br />
O n<strong>os</strong>so país continua a<br />
ter um problema sério de credibilidade<br />
internacional por causa<br />
da falta de segurança jurídica e<br />
de estabilidade fiscal para <strong>os</strong> investidores<br />
estrangeir<strong>os</strong>. Quando<br />
se lança um regime direcionado<br />
a não residentes, que assenta<br />
numa perspetiva de estabilidade,<br />
tem que existir um consenso<br />
sério que o mesmo terá que<br />
ser mantido, pelo men<strong>os</strong> pelo<br />
prazo previsto no momento em<br />
que foi lançado. De outra forma,<br />
é melhor estarm<strong>os</strong> quiet<strong>os</strong>. Só a<br />
p<strong>os</strong>sibilidade, que até pode nunca<br />
se concretizar, de tais regimes<br />
poderem ser alterad<strong>os</strong> ou revogad<strong>os</strong>,<br />
quando é mencionada<br />
por responsáveis polític<strong>os</strong> credíveis,<br />
gera efeit<strong>os</strong> irreparáveis e<br />
bastante advers<strong>os</strong>.<br />
E a pergunta é: se <strong>os</strong> resultad<strong>os</strong><br />
destes avanç<strong>os</strong> e recu<strong>os</strong> são tão<br />
nociv<strong>os</strong>, porque é que continuam<br />
a acontecer? Não se tratará<br />
de um mistério propriamente<br />
dito. E será também porventura<br />
excessivo acusar <strong>os</strong> que <strong>os</strong> promovem<br />
de falta de bom senso.<br />
Mas talvez não andarem<strong>os</strong> muito<br />
longe da verdade se apontarm<strong>os</strong><br />
para calculism<strong>os</strong> polític<strong>os</strong> de<br />
circunstância e de vistas curtas<br />
que, por muito bem que pareçam<br />
momentaneamente a certas<br />
franjas da população, são verdadeiramente<br />
nociv<strong>os</strong> para o país<br />
como um todo.<br />
Não se pretende defender neste<br />
texto a existência de sistemas<br />
distorciv<strong>os</strong> da concorrência, que<br />
encoragem negóci<strong>os</strong> ilegais, fuga<br />
a<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> ou a entrada no<br />
n<strong>os</strong>so teritório de crimin<strong>os</strong><strong>os</strong>.<br />
Nada disso. O processo de autorizações<br />
e de monitorização<br />
deve ser o mais rigor<strong>os</strong>o p<strong>os</strong>sível.<br />
O desleixo a este nível<br />
será fatal para a capacidade<br />
futura para defender a existência<br />
destes regimes num modelo<br />
de concorrência não distorciva.<br />
E, se falharm<strong>os</strong> nesta parte tão<br />
importante, só n<strong>os</strong> poderem<strong>os</strong><br />
queixar de nós própri<strong>os</strong>.<br />
77
Tributação Pessoal<br />
Retenção na fonte<br />
para colaboradores<br />
não residentes – quais<br />
as novidades?<br />
78<br />
SUSANA CONSTANTINO<br />
Senior Manager,<br />
People Advisory Services<br />
A Lei do Orçamento<br />
de Estado (“LOE”) para<br />
2019 veio contemplar<br />
novas medidas, para<br />
efeit<strong>os</strong> de retenção<br />
na fonte, no caso<br />
de rendiment<strong>os</strong><br />
de trabalho<br />
dependente, bem<br />
como profissionais<br />
e empresariais (ainda<br />
que decorrentes de<br />
at<strong>os</strong> isolad<strong>os</strong>), pag<strong>os</strong><br />
a colaboradores<br />
não residentes fiscais<br />
em Portugal.<br />
Nestes term<strong>os</strong>, tais rendiment<strong>os</strong><br />
não estão sujeit<strong>os</strong> a qualquer<br />
retenção na fonte até ao montante<br />
correspondente ao valor<br />
mensal da retribuição mínima<br />
mensal garantida (“RMMG”), na<br />
importância de € 600 mensais<br />
face ao ano de 2019, desde que<br />
i) <strong>os</strong> montantes auferid<strong>os</strong> resultem<br />
de trabalho ou de serviç<strong>os</strong><br />
prestad<strong>os</strong> a uma única entidade,<br />
e que ii) o titular d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
comunique à entidade<br />
devedora d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> que não<br />
auferiu ou aufere o mesmo tipo<br />
de rendiment<strong>os</strong> de outras entidades<br />
residentes em território<br />
português ou de estabeleciment<strong>os</strong><br />
estáveis de entidades<br />
não residentes neste território.<br />
Caso tal não se verifique tais<br />
rendiment<strong>os</strong> serão sujeit<strong>os</strong> a<br />
retenção na fonte à taxa liberatória<br />
de 25%, a mesma sendo<br />
igualmente aplicável na parte<br />
que exceda o valor da RMMG<br />
quando tais condições se verifiquem.<br />
Em term<strong>os</strong> de comunicação, de<br />
notar que o colaborador já tinha<br />
a obrigação de comunicar à<br />
entidade pagadora qualquer alteração<br />
à sua situação pessoal<br />
que impacte a retenção na fonte<br />
a aplicar a<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> auferid<strong>os</strong>,<br />
i.e. alteração do estatuto<br />
de residência, alteração do estado<br />
civil, alteração no número<br />
de dependentes a cargo, reconhecimento<br />
de uma deficiência<br />
fiscalmente relevante em<br />
qualquer membro do agregado<br />
familiar, bem como o número<br />
de titulares de rendimento, para<br />
cas<strong>os</strong> em que o colaborador é<br />
casado.<br />
Adicionalmente, e no caso específico<br />
d<strong>os</strong> colaboradores considerad<strong>os</strong><br />
não residentes fiscais<br />
em Portugal haverá, ainda, a<br />
obrigação de comunicar à entidade<br />
pagadora, para efeit<strong>os</strong> de<br />
dispensa de retenção na fonte,<br />
que não auferiu ou aufere o<br />
mesmo tipo de rendiment<strong>os</strong> de<br />
outras entidades. A norma não<br />
prevê qualquer formalidade em<br />
term<strong>os</strong> de comunicação mas é<br />
recomendável uma declaração<br />
escrita onde seja evidenciado,<br />
de forma inequívoca, que tais<br />
colaboradores qualificam como<br />
não residentes fiscais em Portugal<br />
e que apenas auferem rendiment<strong>os</strong><br />
de uma única entidade<br />
empregadora residente em território<br />
português ou de estabelecimento<br />
estável de entidade<br />
não residente.<br />
Caso contrário, ou seja, caso tal<br />
comunicação não seja efetuada,<br />
ou ainda, caso <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
resultem de trabalho prestado<br />
a mais de uma entidade, deverá<br />
a entidade pagadora aplicar<br />
retenção na fonte, à taxa liberatória<br />
de 25%, à totalidade d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> colocad<strong>os</strong> à disp<strong>os</strong>ição.<br />
Ainda se encontra por esclarecer,<br />
de forma inequívoca, se<br />
esta dispensa de retenção na<br />
fonte se traduz em isenção de<br />
IRS, i.e., dispensa de entrega de<br />
uma Declaração de IRS – Modelo<br />
3. A redação da norma parece<br />
indiciar que haverá, efetivamente,<br />
nestes cas<strong>os</strong> e até ao limite<br />
acima mencionado, dispensa de<br />
tributação em sede de IRS, caso<br />
estejam reunidas as condições<br />
previstas na lei. No entanto, o<br />
artigo 72º do Código do IRS não<br />
foi ajustado em conformidade<br />
e dada a recente introdução da<br />
norma não existe, de momento,<br />
conhecimento do entendimento<br />
d<strong>os</strong> Serviç<strong>os</strong> sobre esta matéria.
Tributação Pessoal<br />
Regime d<strong>os</strong> RNH – Nova<br />
tabela de Atividades de<br />
Elevado Valor Acrescentado<br />
JOÃO PANCADAS<br />
Senior Manager,<br />
People Advisory Services<br />
NUNO MARTINS<br />
Senior Consultant,<br />
People Advisory Services<br />
Foi recentemente<br />
publicada a Portaria<br />
n.º 230/2019 de<br />
23 de julho, que<br />
procede a alterações<br />
substanciais à<br />
tabela de atividades<br />
de Elevado Valor<br />
Acrescentado, no<br />
âmbito de aplicação<br />
do Regime<br />
d<strong>os</strong> Residentes<br />
Não Habituais.<br />
Esta profunda revisão da tabela<br />
de atividades é contextualizada<br />
pelo legislador como tendo por<br />
objetivo dar estímul<strong>os</strong> à atratividade<br />
de sectores específic<strong>os</strong><br />
da economia que têm revelado<br />
dificuldades na contratação de<br />
trabalhadores com determinad<strong>os</strong><br />
perfis de competências e<br />
qualificações, pretendendo-se,<br />
com esta revisão, um maior alinhamento<br />
entre as atividades<br />
constantes da Portaria e o valor<br />
acrescentado para o mercado de<br />
trabalho nacional.<br />
No âmbito da revisão levada a<br />
cabo, o legislador opta igualmente<br />
por abandonar o modelo<br />
anterior de categorias de atividades,<br />
sem correspondência<br />
direta, baseada em códig<strong>os</strong> de<br />
atividades económicas (CAE),<br />
passando-se a adotar um modelo<br />
assente, com correspondência<br />
direta, em códig<strong>os</strong> da Classificação<br />
Portuguesa de Profissões<br />
(CPP).<br />
Da análise às atividades constantes<br />
da nova tabela de atividades,<br />
constata-se que existem<br />
atividades profissionais que deixam<br />
de constar da tabela (e.g.,<br />
Auditores, Consultores Fiscais,<br />
Psicólog<strong>os</strong>), passando a constar<br />
da mesma trabalhadores qualificad<strong>os</strong><br />
e orientad<strong>os</strong> para o mercado,<br />
d<strong>os</strong> sectores da indústria,<br />
construção, agricultura, produção<br />
animal, entre outr<strong>os</strong>.<br />
Por outro lado, a transição para<br />
o modelo assente n<strong>os</strong> códig<strong>os</strong><br />
da CPP vem tornar mais claras as<br />
circunstâncias em que <strong>os</strong> quadr<strong>os</strong><br />
superiores, administradores<br />
e gestores de empresas (previst<strong>os</strong><br />
no código 8 da Portaria n.º<br />
12/2010) podem qualificar como<br />
atividades de Elevado Valor<br />
Acrescentado.<br />
Adicionalmente, a Portaria n.º<br />
230/2019 passa a condicionar o<br />
reconhecimento de exercício de<br />
atividade de elevado valor acrescentado<br />
a trabalhadores p<strong>os</strong>suidores,<br />
no mínimo, do nível 4 de<br />
qualificação do Quadro Europeu<br />
de Qualificações ou do nível 35<br />
da Classificação Internacional<br />
Tipo da Educação ou serem detentores<br />
de cinco an<strong>os</strong> de experiência<br />
profissional devidamente<br />
comprovada.<br />
A Portaria n.º 230/2019 prevê,<br />
ainda, a p<strong>os</strong>sibilidade de revisão<br />
da tabela de atividades de<br />
elevado valor acrescentado no<br />
prazo de três an<strong>os</strong>, em função da<br />
evolução económica do país.<br />
A Portaria n.º 230/2019 produz<br />
efeit<strong>os</strong> a partir de 01/01/2020,<br />
prevendo um regime transitório,<br />
que p<strong>os</strong>sibilita a opção pela<br />
anterior tabela de atividades<br />
(prevista na Portaria n.º 12/2010)<br />
em detrimento da nova tabela<br />
de atividades, para i) sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> que a 01/01/2020 já se<br />
encontrem inscrit<strong>os</strong> como Residentes<br />
Não Habituais, e para ii)<br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> cuj<strong>os</strong> pedid<strong>os</strong><br />
de inscrição se encontrem pendentes<br />
a 01/01/2020, bem como<br />
aqueles que submetam pedido<br />
de inscrição até 31/3/2020, com<br />
efeit<strong>os</strong> ao ano de 2019.<br />
Com efeito, este regime transitório<br />
permitirá a<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong>,<br />
inscrit<strong>os</strong> no regime d<strong>os</strong> Residentes<br />
Não Habituais em ano<br />
anterior ao de entrada em vigor<br />
da Portaria n.º 230/2019, a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de:<br />
i) Enquadrarem as respetivas<br />
atividades como de elevado valor<br />
acrescentado n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> da<br />
tabela de atividades prevista na<br />
Portaria n.º 12/2010, até ao termo<br />
do período de gozo do seu estatuto<br />
de Residente Não Habitual;<br />
ii) Enquadrarem as respetivas<br />
atividades como de elevado valor<br />
acrescentado n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> da<br />
tabela de atividades prevista na<br />
Portaria n.º 230/2019, de 2020<br />
adiante.<br />
79
Tributação Indireta
ANA BASTO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Tributação Indireta<br />
E quando a disponibilização<br />
de cartões de fornecimento<br />
de combustível afinal<br />
representa um serviço<br />
de financiamento…<br />
A disponibilização<br />
de cartões por uma<br />
empresa é uma<br />
realidade que nunca<br />
foi totalmente isenta<br />
de dúvidas no que<br />
respeita ao seu<br />
enquadramento em<br />
sede do Imp<strong>os</strong>to sobre<br />
o Valor Acrescentado<br />
(“IVA”).<br />
Sendo que atualmente é pacífico<br />
que muitas destas realidades<br />
correspondem àquilo<br />
a que o Código do IVA designa<br />
por vales, cuja principal característica<br />
é a de conferirem ao<br />
seu titular o direito de obter,<br />
junto de transmitentes de bens<br />
ou de prestadores de serviç<strong>os</strong><br />
identificad<strong>os</strong>, o fornecimento<br />
de uma ou de várias categorias<br />
de bens ou serviç<strong>os</strong>. Quanto a<br />
estas realidades o IVA deve ser<br />
liquidado no momento em que<br />
<strong>os</strong> vales são cedid<strong>os</strong>, desde que<br />
<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> identifiquem tod<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> element<strong>os</strong> necessári<strong>os</strong> para<br />
a determinação do imp<strong>os</strong>to<br />
devido no momento em que a<br />
cessão ocorre. Assim, um vale<br />
de fornecimento de combustível<br />
quando é cedido deverá ser<br />
sujeito a IVA, na medida em que,<br />
ainda que a cedência anteceda<br />
o próprio fornecimento do bem,<br />
nem por isso deixam de se verificar<br />
as condições necessárias<br />
para a liquidação do IVA, designadamente<br />
o conhecimento<br />
prévio do tipo de bem que será<br />
fornecido por contrapartida do<br />
vale. Mas nem sempre o que parece<br />
é, senão vejam<strong>os</strong> o que se<br />
passou recentemente com a decisão<br />
do Tribunal de Justiça da<br />
União Europeia que, no acórdão<br />
de 15.05.2019, referente ao processo<br />
C-235/18, entendeu que<br />
o fornecimento de cartões de<br />
combustível por uma empresa<br />
às suas filiais corresponde a um<br />
serviço financeiro isento de IVA.<br />
Vejam<strong>os</strong> então o que propugna<br />
o referido acórdão. A Vega International<br />
Car Transport and<br />
Logistics – Trading GmbH (Vega<br />
International) é uma empresa<br />
austríaca que exerce a atividade<br />
de transportador de veícul<strong>os</strong>,<br />
sendo este serviço assegurado<br />
por diversas filiais com sede em<br />
diferentes países. Esta empresa<br />
gere o fornecimento a todas as<br />
suas filiais de cartões de combustível<br />
emitid<strong>os</strong> por diferentes<br />
fornecedores de combustível.<br />
Por razões de organização interna,<br />
todas as operações efetuadas<br />
através de cartões de<br />
combustível são centralizadas<br />
pela Vega International, que recebe,<br />
por intermédio das suas<br />
filiais, as faturas emitidas, com<br />
IVA, pel<strong>os</strong> fornecedores de combustível.<br />
Em seguida, no fim de<br />
cada mês, a Vega International<br />
re-fatura às suas filiais o combustível<br />
disponibilizado para o<br />
transporte d<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong>, acrescido<br />
de uma margem de 2%. Neste<br />
contexto, é essencial esclarecer<br />
se o fornecimento do combustível,<br />
i.e. a transferência do poder<br />
de dispor do combustível como<br />
proprietário, é efetuado à Vega<br />
International ou à sua filial e,<br />
consequentemente, determinar<br />
em que medida o exercício<br />
do direito à dedução apenas<br />
poderá ser exercido por quem<br />
efetivamente suporta <strong>os</strong> cust<strong>os</strong><br />
de entrega do combustível.<br />
Conclui o Tribunal que (i) a Vega<br />
International não dispõe do<br />
combustível de cuja compra solicita<br />
o reembolso do IVA como<br />
se f<strong>os</strong>se sua proprietária; (ii) o<br />
combustível é adquirido pela<br />
sua filial diretamente a<strong>os</strong> fornecedores;<br />
(iii) a filial é quem<br />
suporta igualmente a totalidade<br />
d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> associad<strong>os</strong> a essa<br />
aquisição, na medida em que<br />
a Vega International lhe fatura<br />
o combustível. Assim, entendeu<br />
este Tribunal que a Vega International<br />
não revende combustível<br />
(que na verdade não chegou<br />
a adquirir), mas antes presta um<br />
serviço financeiro às suas filiais<br />
que se caracteriza pelo financiamento<br />
antecipado de compra<br />
de combustível, mediante<br />
a disponibilização de cartões<br />
de combustível. Consequentemente,<br />
a Veja International fica<br />
preterida no exercício do direito<br />
à dedução do IVA incorrido com<br />
a aquisição do combustível. Note-se<br />
que o acórdão é omisso<br />
81
Tributação Indireta<br />
quanto à restrição do direito<br />
à dedução sobre despesas gerais<br />
da atividade da empresa.<br />
Por outro lado, nada é referido<br />
também quanto ao eventual caráter<br />
acessório, face ao volume<br />
de negóci<strong>os</strong> da empresa, destas<br />
alegadas operações isentas - o<br />
que, para efeit<strong>os</strong> da aplicação<br />
do prorata para a determinação<br />
do direito à dedução do IVA incorrido<br />
nas despesas de utilização<br />
mista (para atividades que<br />
simultaneamente conferem e<br />
não conferem direito à dedução,<br />
como é o caso d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />
financeir<strong>os</strong> com sejam as concessões<br />
de crédito), as mesmas<br />
seriam desconsideradas. É uma<br />
decisão judicial interessante e<br />
que permite clarificar uma temática<br />
importante mas que ainda<br />
assim deixa algumas dúvidas<br />
por esclarecer.<br />
A importância d<strong>os</strong> vales<br />
e a sua tributação em IVA<br />
82<br />
ANA BASTO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A partir de 1 de janeiro<br />
de 2019, tod<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
Estad<strong>os</strong> membr<strong>os</strong><br />
da União Europeia<br />
deverão adotar regras<br />
de IVA uniformes em<br />
matéria de tributação<br />
de vales, mediante<br />
a transp<strong>os</strong>ição<br />
para as respetivas<br />
ordens jurídicas<br />
da Diretiva 2016/1065<br />
do Conselho,<br />
de 27 de junho<br />
de 2016 (Diretiva<br />
Vouchers).<br />
Neste sentido, e conforme resulta<br />
da Prop<strong>os</strong>ta de Lei do Orçamento<br />
do Estado para 2019 (PL<br />
OE 2019), o Código de IVA português<br />
passará a contemplar definições<br />
de vale e das suas tipologias,<br />
ou seja, Vale de Finalidade<br />
Única (VFU) e Vale Finalidade<br />
Múltipla (VFM), sendo de destacar<br />
que o principal critério diferenciador<br />
entre estes dois tip<strong>os</strong><br />
de vale é o conhecimento ou não<br />
de tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> element<strong>os</strong> necessári<strong>os</strong><br />
para a determinação do<br />
IVA devido no momento da sua<br />
emissão ou cessão (i.e., certeza<br />
quanto à natureza d<strong>os</strong> bens ou<br />
serviç<strong>os</strong> titulad<strong>os</strong> pelo voucher<br />
e sua localização, na medida em<br />
que poderão ser potencialmente<br />
aplicadas diferentes taxas de<br />
IVA). Ou seja, no caso da emissão<br />
e cessão de um VFU, o IVA é devido<br />
e exigível no momento em<br />
que ocorre cada cessão, como<br />
se de um pagamento antecipado<br />
pela aquisição de um bem ou<br />
serviço se tratasse. No caso da<br />
emissão e cessão de um VFM, o<br />
IVA é apenas devido e exigível no<br />
momento em que o sujeito passivo<br />
efetua a transmissão d<strong>os</strong><br />
bens ou prestações d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong><br />
a que o vale diz respeito (ou seja,<br />
quando é p<strong>os</strong>sível aplicar a taxa<br />
de IVA correta a<strong>os</strong> bens ou serviç<strong>os</strong><br />
adquirid<strong>os</strong>). Até aqui, parecem<br />
não existir novidades, até<br />
porque a Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira já seguia esta linha<br />
de entendimento em matéria de<br />
tributação de vales, amplamente<br />
divulgado em algumas informações<br />
vinculativas que, no entanto,<br />
podem não apresentar as<br />
soluções mais claras e eficientes<br />
do ponto de vista do fluxo de<br />
faturação e circuito documental<br />
que permitam assegurar, de<br />
forma inquestionável, a liquidação<br />
do IVA e o eventual direito<br />
à dedução deste imp<strong>os</strong>to pel<strong>os</strong><br />
adquirentes sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
(uma vez que não se deverá ignorar<br />
a p<strong>os</strong>sibilidade, ainda que<br />
remota, de estes vales contemplarem<br />
realidades cujo IVA p<strong>os</strong>sa<br />
ser dedutível pelo sujeito passivo<br />
no âmbito da sua atividade).<br />
No entanto, é de destacar que,<br />
não obstante a Diretiva Vouchers<br />
ser expressamente omissa<br />
quanto ao facto de não visar as<br />
situações em que um VFM não é<br />
resgatado pelo consumidor final<br />
durante o seu período de validade,<br />
tendo o vendedor retido<br />
a contraprestação recebida por<br />
esse vale, o Código do IVA deverá<br />
passar a prever uma regra<br />
específica sobre a tributação ou<br />
não desta realidade. Ora, aparentemente,<br />
de acordo com a PL<br />
OE 2019, esta realidade deverá<br />
ser sujeita a IVA, no momento<br />
da caducidade do VFM. De facto,<br />
existem decisões do Tribunal<br />
de Justiça da União Europeia no<br />
sentido de um serviço comprado<br />
e não utilizado ser sujeito a IVA,<br />
destacando-se, por exemplo, o<br />
caso Air France (C-250/14), em<br />
que se concluiu que o valor pago<br />
por um bilhete de voo doméstico<br />
vendido por uma companhia<br />
aérea, mesmo que não seja uti-
Tributação Indireta<br />
N<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do Regulamento de<br />
Execução n.º 282/2011, de 15 de<br />
março, um sujeito passivo tem<br />
um estabelecimento estável para<br />
efeit<strong>os</strong> de IVA se este tiver um<br />
grau suficiente de permanência<br />
e uma estrutura adequada, em<br />
term<strong>os</strong> de recurs<strong>os</strong> human<strong>os</strong> e<br />
técnic<strong>os</strong>, que lhe permitam recelizado,<br />
deverá ser sujeito a IVA,<br />
porém, no momento em que o<br />
cliente adquire o bilhete e procede<br />
ao seu pagamento. Ora,<br />
neste caso, teríam<strong>os</strong> uma resp<strong>os</strong>ta<br />
compatível com um VFU<br />
não resgatado e caducado, mas<br />
eventualmente desajustada para<br />
o caso d<strong>os</strong> VFM não resgatad<strong>os</strong><br />
que tenham caducado. Pois,<br />
nestes cas<strong>os</strong>, por razões intrínsecas<br />
à ausência de element<strong>os</strong><br />
necessári<strong>os</strong> para a determinação<br />
do imp<strong>os</strong>to devido, continua<br />
a não ser adequado que ocorra<br />
tributação em sede de IVA, no<br />
momento da caducidade do<br />
VFM, eventualmente à taxa de<br />
IVA mais grav<strong>os</strong>a “potencialmente”<br />
aplicável a um d<strong>os</strong> bens ou<br />
serviç<strong>os</strong> subjacente a esse VFM,<br />
sendo, assim, discutível a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de não sujeição do IVA<br />
sobre estas operações.<br />
Toll manufacturing<br />
– presunção de<br />
estabelecimento estável<br />
para efeit<strong>os</strong> de IVA?<br />
CATARINA MATOS<br />
Diretor, Tax Services<br />
Com base n<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong><br />
definid<strong>os</strong> no caso<br />
Welmory (C-605/12) do<br />
Tribunal de Justiça da<br />
União Europeia (TJUE),<br />
algumas administrações<br />
fiscais de outr<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong>-<br />
Membr<strong>os</strong> têm presumido<br />
a existência de um<br />
estabelecimento estável,<br />
para efeit<strong>os</strong> de IVA, n<strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong> em que existe<br />
um “toll manufacturing<br />
arrangement” (vulgo,<br />
acordo de fabrico por<br />
encomenda ou “trabalho<br />
a feitio”) – razão para<br />
preocupação?<br />
ber e utilizar <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> que são<br />
prestad<strong>os</strong> para as necessidades<br />
próprias desse estabelecimento.<br />
Com base na definição supra<br />
referida, algumas atividades<br />
desenvolvidas pel<strong>os</strong> prestadores<br />
de serviç<strong>os</strong> no âmbito d<strong>os</strong><br />
denominad<strong>os</strong> “toll manufacturing<br />
arrangement” poderão ser<br />
suficientes para determinar que<br />
o Principal utiliza <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong><br />
human<strong>os</strong> e técnic<strong>os</strong> suficientes<br />
para criar um estabelecimento<br />
estável para efeit<strong>os</strong> de IVA.<br />
De facto, sempre que o fabricante<br />
disponibiliza serviç<strong>os</strong> auxiliares,<br />
nomeadamente receção<br />
e inspeção de matérias primas,<br />
armazenagem, inventário, entre<br />
outras, pode considerar-se que<br />
<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> human<strong>os</strong> e técnic<strong>os</strong><br />
do prestador de serviç<strong>os</strong> serão<br />
atribuíd<strong>os</strong> ao Principal, como tal,<br />
criando um estabelecimento estável<br />
para efeit<strong>os</strong> de IVA no país<br />
onde é prestado o serviço do toll<br />
manufaturer.<br />
Esta presunção tem como consequência<br />
imediata o facto de<br />
a prestação de serviç<strong>os</strong> dever<br />
ser tributada em sede de IVA no<br />
Estado Membro onde é efetuado<br />
o serviço do toll manufaturer e<br />
não no país onde se encontra<br />
estabelecido o Principal, não<br />
obstante tal interpretação poder<br />
colidir com outr<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong> estabelecid<strong>os</strong><br />
pela jurisprudência<br />
do TJUE em matéria de estabeleciment<strong>os</strong><br />
estáveis para efeit<strong>os</strong><br />
de IVA.<br />
Com efeito, o Tribunal, no caso<br />
Welmory, não esclareceu questões<br />
relevantes que agora se colocam,<br />
nomeadamente, em que<br />
exatas circunstâncias <strong>os</strong> recurs<strong>os</strong><br />
human<strong>os</strong> e técnic<strong>os</strong> de um<br />
determinado negócio deverão<br />
ser alocad<strong>os</strong> a outro negócio e,<br />
nestes term<strong>os</strong>, configurar um estabelecimento<br />
estável na lógica<br />
do imp<strong>os</strong>to.<br />
Em face do exp<strong>os</strong>to, <strong>os</strong> operadores<br />
económic<strong>os</strong> deverão acompanhar<br />
a constante evolução do<br />
conceito de estabelecimento estável<br />
em sede de IVA e acautelar<br />
as p<strong>os</strong>síveis implicações que o<br />
mesmo p<strong>os</strong>sa ter n<strong>os</strong> seus model<strong>os</strong><br />
de supply chain, fazendo<br />
sempre as análises necessárias<br />
para poder concluir, com razoável<br />
segurança, o impacto deste<br />
tipo de situações.<br />
83
Tributação Indireta<br />
DANIEL DE BOBOS-RADU<br />
Manager, Tax Services<br />
Mais de 40 an<strong>os</strong><br />
após a criação do<br />
sistema comum do<br />
Imp<strong>os</strong>to sobre o Valor<br />
Acrescentado (IVA), o<br />
Tribunal de Justiça da<br />
União Europeia (TJUE)<br />
está prestes a atingir o<br />
número-recorde de mil<br />
acórdã<strong>os</strong> em matéria<br />
deste imp<strong>os</strong>to, o que,<br />
assumindo uma média<br />
de duas questões por<br />
cada reenvio prejudicial,<br />
se traduzirá em mais<br />
dois milhares de<br />
dúvidas interpretativas<br />
que o TJUE terá logrado<br />
clarificar (ou não).<br />
2019 é também um ano especial<br />
pela introdução de um sistema<br />
de IVA em Angola, podendo seguir-se,<br />
num futuro próximo, a<br />
introdução de um modelo de IVA<br />
em Timor-Leste. É, por isso, um<br />
ano propício para um balanço do<br />
passado e uma reflexão sobre o<br />
futuro do imp<strong>os</strong>to na Europa e,<br />
para o que n<strong>os</strong> importa, no mundo<br />
lusófono.<br />
A respeito do binómio passado-futuro,<br />
é comum a classificação<br />
d<strong>os</strong> vári<strong>os</strong> sistemas de IVA,<br />
atualmente adotad<strong>os</strong> por mais<br />
de 166 países, em duas grandes<br />
categorias: o IVA Tradicional e o<br />
IVA Moderno. O primeiro grupo<br />
abarca <strong>os</strong> sistemas de IVA de<br />
pendor europeu, caracterizad<strong>os</strong><br />
pela aplicação de taxas múltiplas<br />
e por um catálogo mais ou<br />
Harmonização das<br />
legislações – Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre<br />
o volume de negóci<strong>os</strong> –<br />
Sistema comum do Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Valor Acrescentado:<br />
matéria coletável uniforme<br />
men<strong>os</strong> extenso de isenções com<br />
caráter distorcivo (isenções incompletas,<br />
que não conferem o<br />
direito à dedução), ao passo que<br />
o segundo grupo engloba sistemas<br />
de IVA de taxa única e com<br />
um número de isenções reduzido<br />
e bem delimitado, caracterizad<strong>os</strong><br />
por uma redução significativa<br />
d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> de cumprimento<br />
e de administração do imp<strong>os</strong>to.<br />
Desta última perspetiva, poderse-ia<br />
afirmar que um d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
indiret<strong>os</strong> mais modern<strong>os</strong> da<br />
história terá sido a Centesima<br />
rerum venalium, que era de César<br />
e que consistia na liquidação<br />
de 1% sobre as vendas em leilão.<br />
Certamente, um nível elevado<br />
de densidade regulativa, traduzida<br />
na existência de várias<br />
normas excecionais (isenções),<br />
de diferentes taxas do imp<strong>os</strong>to<br />
(com a implícita necessidade<br />
de manutenção de taxonomias<br />
coerentes), de mais de uma dezena<br />
de element<strong>os</strong> de conexão<br />
nas regras de localização, faz do<br />
sistema comum do IVA um sistema<br />
normativo complexo. A essa<br />
complexidade acresce a vertente<br />
multinível, traduzida na articulação<br />
de cada um d<strong>os</strong> sistemas<br />
nacionais com o sistema comum.<br />
Não obstante, a ideia op<strong>os</strong>ta,<br />
segundo a qual um sistema<br />
normativo com poucas normas<br />
seria sinónimo de simplicidade<br />
e modernidade, potenciando<br />
uma administração eficiente do<br />
imp<strong>os</strong>to, também não é inteiramente<br />
verdadeira, porquanto a<br />
utilização de previsões genéricas<br />
poderá implicar uma maior<br />
discricionariedade por parte das<br />
administrações fiscais, a par do<br />
aumento da controvérsia fiscal.<br />
Todavia, independentemente<br />
das atuais reformas do sistema<br />
comum do IVA, a grande revolução<br />
a que estam<strong>os</strong> a assistir,<br />
neste e noutr<strong>os</strong> tribut<strong>os</strong>, passa<br />
pela substituição das linguagens<br />
naturais pelas linguagens<br />
artificiais, fruto da implementação<br />
de sistemas de informação<br />
no cumprimento e na administração<br />
do imp<strong>os</strong>to. As linguagens<br />
artificiais irão p<strong>os</strong>sibilitar<br />
uma reorganização de todo o<br />
conhecimento que fom<strong>os</strong> adquirindo<br />
sobre o imp<strong>os</strong>to, com<br />
fonte n<strong>os</strong> enunciad<strong>os</strong> normativ<strong>os</strong><br />
e nas mil decisões do TJUE,<br />
que formam uma extensa rede<br />
de inferências lógicas e raciocíni<strong>os</strong><br />
de ponderação. E como<br />
a base de toda a linguagem<br />
normativa, natural ou artificial,<br />
é a lógica formal, esta passará<br />
a assumir um papel ainda mais<br />
preponderante no dia-a-dia de<br />
qualquer profissional, de tal<br />
forma que a definição de Pedro<br />
Hispano continua a aplicar-se<br />
na sua plenitude: a lógica é a<br />
arte das artes e a ciência das<br />
ciências porque detém o cami-<br />
84
Tributação Indireta<br />
nho para chegar a<strong>os</strong> princípi<strong>os</strong><br />
de tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> métod<strong>os</strong>.<br />
Quanto à implementação do IVA<br />
em Angola, como em qualquer<br />
reforma deste calibre, a busca<br />
pelo modelo perfeito assume as<br />
proporções de uma busca pelo<br />
Santo Graal da fiscalidade: a<br />
implementação de um imp<strong>os</strong>to<br />
reditício, capaz de se gerir a si<br />
próprio, passando a fazer parte<br />
d<strong>os</strong> procediment<strong>os</strong> standard das<br />
empresas. Uma forma de encarar<br />
a questão passa pela abordagem<br />
clássica do FMI, avaliando se <strong>os</strong><br />
pré-requisit<strong>os</strong> de implementação<br />
se encontram verificad<strong>os</strong>, a<br />
saber: um sistema fiscal simples,<br />
claro e estável, um serviço de cobrança<br />
eficiente, a simplicidade<br />
de procediment<strong>os</strong>, um sistema de<br />
enforcement eficiente, a proporcionalidade<br />
das ações inspetivas,<br />
a existência de sanções efetivas<br />
e a qualidade da revisão judicial.<br />
Assim, no caso de Angola, para<br />
além da referida abordagem clássica,<br />
tomando como referência o<br />
quadro regulativo e institucional<br />
para alcançar o modelo de IVA<br />
mais adequado, a introdução de<br />
mecanism<strong>os</strong> de cumprimento e<br />
administração do imp<strong>os</strong>to basead<strong>os</strong><br />
nas novas tecnologias (v.g.,<br />
sistemas de faturação certificad<strong>os</strong><br />
e SAF-T) vem colmatar algumas<br />
insuficiências do sistema.<br />
Não obstante <strong>os</strong> temp<strong>os</strong> de mudança<br />
que também se avizinham<br />
na busca de um modelo de IVA<br />
para Timor-Leste e tomando em<br />
linha de conta todas as vantagens<br />
da digitalização na conceção<br />
de model<strong>os</strong> tributári<strong>os</strong> eficientes,<br />
impõe-se uma reflexão: não podem<strong>os</strong><br />
esquecer que, de uma<br />
perspetiva financeira pública, o<br />
fundamento do sufrágio universal<br />
reside precisamente no chamamento<br />
de tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> cidadã<strong>os</strong><br />
para a partilha de responsabilidades<br />
em matéria de angariação<br />
de receitas públicas. Nessa ótica,<br />
um sistema fiscal de pendor<br />
mecanicista não pode colocar de<br />
parte a importância da educação<br />
para a cidadania fiscal.<br />
Fisco condenado<br />
a devolver ISV sobre carr<strong>os</strong><br />
usad<strong>os</strong> importad<strong>os</strong><br />
FRANCISCO CAIADO<br />
Manager, Tax Services<br />
Um recente decisão<br />
do CAAD (Centro<br />
de Arbitragem<br />
Administrativa) veio<br />
agitar o setor automóvel:<br />
a Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (AT) foi<br />
condenada (ainda não<br />
transitada em julgado)<br />
à devolução parcial<br />
do Imp<strong>os</strong>to Sobre<br />
Veícul<strong>os</strong> (ISV) cobrado<br />
na importação de um<br />
automóvel usado de<br />
outro Estado Membro<br />
(EM) da União Europeia<br />
(UE) (cfr. decisão<br />
proferida no Processo<br />
n.º 572/2018-T).<br />
No atual regime do Código do<br />
ISV, o cálculo do ISV compreende<br />
duas componentes: a cilindrada<br />
e a ambiental no que concerne<br />
às emissões de CO2. No que diz<br />
respeito à primeira, é sujeita a<br />
uma redução de valor relacionado<br />
com o número de an<strong>os</strong><br />
de uso do veículo aquando da<br />
liquidação do imp<strong>os</strong>to. A temática,<br />
porém, relaciona-se com a<br />
componente ambiental: já que<br />
a redução do valor do imp<strong>os</strong>to é<br />
apenas considerada na componente<br />
cilindrada, não havendo<br />
qualquer objeto de redução no<br />
que toca à parcela ambiental.<br />
Esta desconsideração do número<br />
de an<strong>os</strong> do veículo na componente<br />
ambiental, cria um tratamento<br />
desigual na aplicação do<br />
imp<strong>os</strong>to consoante se trate de<br />
veícul<strong>os</strong> importad<strong>os</strong> ou veícul<strong>os</strong><br />
nacionais, com efeit<strong>os</strong> discriminatóri<strong>os</strong><br />
(e desfavoráveis) n<strong>os</strong><br />
veícul<strong>os</strong> importad<strong>os</strong>.<br />
A compatibilidade desta solução<br />
legislativa com o direito comunitário<br />
– nomeadamente com o<br />
disp<strong>os</strong>to no artigo 110.º do Tratado<br />
de Funcionamento da União<br />
Europeia (TFUE) que estatui que<br />
“nenhum EM fará incidir, direta<br />
ou indiretamente, sobre <strong>os</strong> produt<strong>os</strong><br />
d<strong>os</strong> outr<strong>os</strong> EM´s imp<strong>os</strong>ições<br />
internas, qualquer que seja<br />
a sua natureza, superiores às<br />
que incidam, diretamente ou indiretamente<br />
sobre produt<strong>os</strong> nacionais<br />
similares” – levanta dúvidas<br />
quanto à legalidade desta<br />
solução legislativa nacional com<br />
o referido direito comunitário.<br />
Adicionalmente, o Ministério das<br />
Finanças veio recentemente comunicar<br />
a sua p<strong>os</strong>ição quanto à<br />
85
Tributação Indireta<br />
temática, informando que não<br />
apenas pretende manter a atual<br />
disp<strong>os</strong>ição em matéria de carr<strong>os</strong><br />
usad<strong>os</strong> importad<strong>os</strong>, como ainda<br />
entende recorrer da decisão proferida<br />
pelo CAAD.<br />
A principal linha de argumentação<br />
que está na base destas<br />
objeções segue o entendimento<br />
de que, sendo <strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> nov<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> à totalidade do imp<strong>os</strong>to<br />
correspondente à componente<br />
ambiental, não haveria razão<br />
para um tratamento diferente<br />
com <strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> usad<strong>os</strong> – sendo<br />
ainda estes quem produzem<br />
maior número de emissões de<br />
CO2.<br />
O problema, no entanto, não<br />
é endereçado: isto é, não foi a<br />
questão ambiental suis generis<br />
que esteve na base da decisão<br />
do CAAD, mas sim a já referida<br />
diferença de tratamento entre <strong>os</strong><br />
veícul<strong>os</strong> nacionais e importad<strong>os</strong><br />
de outr<strong>os</strong> EM´s e a sua compatibilidade<br />
com o direito comunitário.<br />
A argumentação do Governo<br />
em prol da defesa do ambiente,<br />
apenas seria legitimada na circunstância<br />
em que a penalização<br />
ambiental recaísse sobre <strong>os</strong><br />
veícul<strong>os</strong> usad<strong>os</strong> de origem nacional,<br />
em moldes semelhantes<br />
como já recai sobre <strong>os</strong> importad<strong>os</strong><br />
usad<strong>os</strong>, o que não acontece.<br />
A necessidade de uma clara decisão<br />
jurisprudencial, em resp<strong>os</strong>ta<br />
ao recurso a ser apresentado<br />
pelo Estado Português a esta<br />
decisão do CAAD, é mais urgente<br />
que nunca, uma vez que diferentes<br />
diretrizes chegam a<strong>os</strong> contribuintes,<br />
não sendo ainda claro<br />
como será o futuro da tributação<br />
sobre veícul<strong>os</strong> importad<strong>os</strong> num<br />
d<strong>os</strong> mais fustigad<strong>os</strong> setores pela<br />
fiscalidade em Portugal.<br />
A alteração no paradigma<br />
da mobilidade e a fiscalidade<br />
86<br />
JOÃO SOUSA<br />
Partner, Tax Services<br />
Agora que n<strong>os</strong><br />
encontram<strong>os</strong> a iniciar<br />
o ano de 2019, importa<br />
chamar à atenção<br />
sobre o impacto<br />
que a fiscalidade<br />
pode ter na alteração<br />
acelerada do paradigma<br />
da mobilidade.<br />
No ano que agora finda, verificou-se<br />
um acréscimo face ao<br />
ano anterior nas vendas de veícul<strong>os</strong><br />
elétric<strong>os</strong> de 170%, acompanhando,<br />
de resto, a tendência<br />
iniciada em períod<strong>os</strong> anteriores,<br />
e as previsões são que daqui a<br />
seis an<strong>os</strong> se vão vender quinze<br />
vezes mais veícul<strong>os</strong> eletrificad<strong>os</strong><br />
(elétric<strong>os</strong> e híbrid<strong>os</strong>) do que<br />
hoje. Entretanto, algumas marcas<br />
já anunciaram datas para o fim<br />
d<strong>os</strong> motores de combustão interna,<br />
sendo inequívoco que o<br />
futuro d<strong>os</strong> automóveis vai passar<br />
pel<strong>os</strong> elétric<strong>os</strong> e híbrid<strong>os</strong>.<br />
É, pois, caso para dizer que a<br />
ap<strong>os</strong>ta na comercialização e<br />
utilização deste tipo de viaturas<br />
se tem revelado um sucesso,<br />
embora o mesmo se deva, essencialmente,<br />
a um duplo vértice<br />
de fatores. Por um lado, a<br />
pressão exercida pela crescente<br />
preocupação ambiental, a qual<br />
tem vindo a ser materializada<br />
em divers<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong>-membr<strong>os</strong><br />
da União Europeia, por via da<br />
produção legislativa no sentido<br />
da proibição de circulação de<br />
viaturas movidas a combustíveis<br />
fósseis na denominada Zona de<br />
Emissões Reduzidas (ZER). Por<br />
outro lado, e também sob a égide<br />
da consciência ambiental,<br />
tem-se mantido ou até incrementado<br />
a carga fiscal sobre as<br />
viaturas movidas a combustíveis<br />
fósseis, enquanto simultaneamente<br />
se reduz ou isenta de tributação<br />
a aquisição e a utilização<br />
de veícul<strong>os</strong> híbrid<strong>os</strong> plug-in<br />
ou elétric<strong>os</strong>.<br />
É sobre este segundo eixo de<br />
medidas que aqui n<strong>os</strong> debruçam<strong>os</strong>,<br />
de entre vári<strong>os</strong> aspet<strong>os</strong><br />
fiscais inerentes à atribuição de<br />
viaturas ligeiras de passageir<strong>os</strong><br />
(doravante “VLP”) a colaboradores.<br />
Desde logo, merece destaque,<br />
em sede de Imp<strong>os</strong>to sobre<br />
o Rendimento das Pessoas Coletivas<br />
(“IRC”), o valor mais elevado<br />
de aquisição sobre o qual<br />
será aferida a aceitação fiscal<br />
d<strong>os</strong> gast<strong>os</strong> de amortização das
Tributação Indireta<br />
VLP’s (tanto no caso de aquisição<br />
como de locação), bem como<br />
a redução (no caso d<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong><br />
híbrid<strong>os</strong> plug-in) ou até a isenção<br />
(no caso d<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> elétric<strong>os</strong>)<br />
das taxas de tributação<br />
autónoma aplicáveis a<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong><br />
correspondentes a tal utilização.<br />
Não sendo novidade, esta<br />
situação pode ser revertida caso<br />
exista a transferência da propriedade<br />
da viatura para a esfera<br />
pessoal do colaborador, uma solução<br />
que resulta na isenção da<br />
tributação autónoma, mas que<br />
obriga a um acordo mútuo entre<br />
<strong>os</strong> colaboradores e empresas e<br />
potencialmente a uma compensação<br />
ao trabalhador pelo acréscimo<br />
da carga fiscal suportada<br />
na sua esfera privada.<br />
No mesmo sentido, em sede de<br />
Imp<strong>os</strong>to sobre <strong>os</strong> Veícul<strong>os</strong> (“ISV”)<br />
e de Imp<strong>os</strong>to Único de Circulação<br />
(“IUC”), as viaturas híbridas<br />
plug-in e as viaturas elétricas<br />
usufruem de redução ou isenção<br />
destes imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, respetivamente.<br />
E atenção que tanto<br />
o ISV como o IUC, sofrem nov<strong>os</strong><br />
aument<strong>os</strong> para 2019, n<strong>os</strong> carr<strong>os</strong><br />
mais poluentes, em virtude do<br />
novo sistema de medição das<br />
emissões de CO2.<br />
Em sede de Imp<strong>os</strong>to sobre o<br />
Valor Acrescentado (“IVA”), quer<br />
a aquisição quer a locação de<br />
viaturas híbridas plug-in ou de<br />
viaturas elétricas manifestam-se<br />
igualmente vantaj<strong>os</strong>as face às<br />
viaturas movidas a combustíveis<br />
f<strong>os</strong>seis, uma vez que – e contrariamente<br />
a estas últimas - o<br />
IVA devido na aquisição ou nas<br />
rendas é dedutível, desde que o<br />
custo de aquisição das viaturas<br />
não seja superior a determinad<strong>os</strong><br />
limites.<br />
E enquanto <strong>os</strong> combustíveis<br />
mantêm o adicional de Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre <strong>os</strong> Produt<strong>os</strong> Petrolífer<strong>os</strong><br />
(“ISP”), a eletricidade continua<br />
– por enquanto - a não ter qualquer<br />
imp<strong>os</strong>to nesta área.<br />
Verificam<strong>os</strong> assim que, de um<br />
ponto de vista fiscal, a utilização<br />
de viaturas híbridas plug-in ou<br />
elétricas se revela particularmente<br />
vantaj<strong>os</strong>a, decorrente da<br />
utilização pel<strong>os</strong> órgã<strong>os</strong> governamentais<br />
da política fiscal enquanto<br />
instrumento de proteção<br />
do ambiente e de consciencialização<br />
das empresas e d<strong>os</strong> particulares<br />
para esta problemática.<br />
Aliás, prova desta tendência era<br />
a Prop<strong>os</strong>ta de Lei do Orçamento<br />
do Estado para 2019, na qual se<br />
encontrava prevista o aumento<br />
das taxas de tributação autónoma<br />
aplicáveis a<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong> com<br />
as viaturas ligeiras de passageir<strong>os</strong>.<br />
Embora esta opção tenha<br />
sido chumbada, não constando<br />
assim da redação final do Orçamento<br />
do Estado para 2019, parece<br />
claro que será uma questão<br />
de tempo para a introdução no<br />
ordenamento jurídico-fiscal de<br />
medidas adicionais que visem<br />
o desincentivo à aquisição e<br />
utilização de viaturas movidas a<br />
combustíveis f<strong>os</strong>seis.<br />
Deste modo, as empresas terão a<br />
sua quota-parte na adaptação a<br />
esta mudança do paradigma da<br />
mobilidade, sendo que a parte<br />
fiscal será um claro fator crítico<br />
para o management das Empresas<br />
virem a considerar neste<br />
âmbito, dependendo a definição<br />
de novas politicas internas das<br />
circunstâncias especificamente<br />
aplicáveis.<br />
87
Tributação Indireta<br />
LILIANA PINHEIRO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
VAT Quick Fixes – A<br />
simplificação da tributação<br />
em sede de IVA das<br />
transações comerciais entre<br />
Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong><br />
88<br />
SARA AZEVEDO<br />
Senior Consultant, Tax Services<br />
A partir de 2020<br />
deverá ser mais<br />
simples a realização<br />
de transações<br />
transfronteiriças<br />
entre operadores de<br />
diferentes Estad<strong>os</strong>-<br />
Membr<strong>os</strong> (EMs) da<br />
União Europeia (UE)<br />
– serão adotadas<br />
medidas<br />
de simplificação<br />
com impacto nas<br />
obrigações declarativas<br />
e de comprovação<br />
da realização<br />
das transações.<br />
A 7 de abril de 2016, a Comissão<br />
Europeia adotou um Plano<br />
de Ação sobre o IVA - “Rumo a<br />
um espaço único do IVA na UE”,<br />
destinado a simplificar o atual<br />
sistema do IVA na UE, tornando<br />
-o mais favorável às empresas e<br />
men<strong>os</strong> permeável à fraude<br />
As chamadas “Soluções Rápidas”/”Quick<br />
Fixes” fazem parte<br />
desse Plano de Ação e consistem<br />
em medidas de implementação<br />
no curto prazo, materializadas<br />
na Diretiva UE 2018/1910, do Conselho,<br />
de 4 de dezembro, a qual<br />
veio alterar a Diretiva 2006/112/<br />
CE, de 11 de Dezembro (“Diretiva<br />
IVA”) e no Regulamento de<br />
Execução UE Nº 2018/1912, de 7<br />
de dezembro que altera o Regulamento<br />
de Execução (UE) nº<br />
282/2011, de 23 de março (“Regulamento<br />
de Execução”). Os<br />
EM deverão assegurar a transp<strong>os</strong>ição<br />
atempada da referida<br />
Diretiva (UE) 2018/1910 para <strong>os</strong><br />
respectiv<strong>os</strong> ordenament<strong>os</strong> jurídic<strong>os</strong><br />
nacionais de modo a que<br />
<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> produzam efeit<strong>os</strong> já<br />
a partir de 1 de janeiro de 2020.<br />
As “Quick Fixes” versam sobre as<br />
seguintes quatro temáticas.<br />
1. A simplificação<br />
e harmonização das regras<br />
relativas às transações<br />
intracomunitárias em regime<br />
de consignação<br />
De modo a reduzir o tempo de<br />
entrega das mercadorias, dando<br />
uma mais rápida resp<strong>os</strong>ta às necessidades<br />
do mercado, <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> optam, não raras<br />
vezes, pela realização de vendas<br />
em regime de consignação. A utilização<br />
deste regime de vendas<br />
entre operadores de diferentes<br />
EM da UE determina, com frequência,<br />
a necessidade de registo<br />
para efeit<strong>os</strong> de IVA do fornecedor<br />
no EM de destino de bens<br />
(no qual o fornecedor detém um<br />
stock até que a propriedade d<strong>os</strong><br />
bens se transfira para o cliente),<br />
para aí reportar a correspondente<br />
operação assimilada a<br />
uma aquisição intracomunitária<br />
de bens seguida de uma venda<br />
doméstica. Não obstante, vári<strong>os</strong><br />
EMs (n<strong>os</strong> quais Portugal não se<br />
inclui) dispõem já de mecanism<strong>os</strong><br />
de simplificação (call-off<br />
stock) aplicáveis às vendas em<br />
regime de consignação, que poderão<br />
afastar essa necessidade<br />
de registo, verificadas que estejam<br />
determinadas condições.<br />
Porém, atualmente, essa simplificação<br />
utilizada por alguns<br />
países não decorre das normas<br />
constantes da Diretiva IVA, o que<br />
justifica a falta de harmonização<br />
das regras consideradas pel<strong>os</strong><br />
vári<strong>os</strong> EMs. As alterações à Diretiva<br />
IVA nesta matéria, através do<br />
aditamento do artigo 17º- A, visa<br />
a consagração do procedimento<br />
simplificado de call-off stock,<br />
sujeito a determinad<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong><br />
e condições. Em face dessa<br />
alteração, poderá deixar ser<br />
exigido o registo para efeit<strong>os</strong> de
Tributação Indireta<br />
IVA d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> vendedores<br />
no território de outr<strong>os</strong> EMs<br />
onde efetue vendas em regime<br />
de consignação, traduzindo-se<br />
numa redução da carga burocrática<br />
e d<strong>os</strong> respetiv<strong>os</strong> cust<strong>os</strong><br />
administrativ<strong>os</strong>.<br />
2. A uniformização do<br />
tratamento em sede de IVA das<br />
transmissões intracomunitárias<br />
de bens em cadeia<br />
No caso das operações em cadeia<br />
(“supply chain”) em que se<br />
verifica a transmissão sucessiva<br />
de bens que são objeto de um<br />
único transporte intracomunitário,<br />
a circulação intracomunitária<br />
d<strong>os</strong> bens apenas poderá ser imputada<br />
a uma das entregas, que<br />
beneficiará da isenção de IVA<br />
prevista para as transmissões<br />
intracomunitárias de bens. Esta<br />
questão tem vindo a ser alvo de<br />
uma forte incerteza junto d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> e das Autoridades<br />
Fiscais d<strong>os</strong> diferentes EMs, o<br />
que, para além de pôr em causa<br />
a segurança jurídica d<strong>os</strong> operadores,<br />
pode conduzir a situações<br />
de dupla tributação / não tributação.<br />
Tal incerteza decorre da<br />
inexistência de regulação dessas<br />
situações na Diretiva IVA.<br />
Na senda das novas normas comunitárias,<br />
a transpor pel<strong>os</strong> EMs<br />
antes de 1 de janeiro de 2020,<br />
prevê-se a consagração de uma<br />
regra de alocação do referido<br />
transporte intracomunitário e,<br />
consequentemente, a identificação<br />
da transação que será considerada<br />
transmissão intracomunitária<br />
de bens, beneficiando da<br />
isenção de IVA. Em traç<strong>os</strong> gerais,<br />
quando o operador intermediário<br />
seja responsável pela organização<br />
do transporte, prevê-se<br />
que o transporte deverá ser<br />
imputado à entrega efetuada<br />
a esse operador intermediário<br />
(entrega do sujeito passivo A ao<br />
sujeito passivo B). Excecionamse<br />
desta regra, as situações em<br />
que o operador intermediário se<br />
encontre estabelecido no EM a<br />
partir do qual <strong>os</strong> bens são expedid<strong>os</strong>,<br />
e comunique ao fornecedor<br />
o seu número de IVA nesse<br />
EM, situação na qual o transporte<br />
será imputado à transmissão<br />
efetuada pelo operador intermediário<br />
ao seu cliente (entrega<br />
do sujeito passivo B ao sujeito<br />
passivo C).<br />
3. Registo no VIES do número<br />
de IVA do adquirente enquanto<br />
condição substantiva para<br />
a isenção da transmissão<br />
intracomunitária de bens<br />
A inscrição do adquirente no Sistema<br />
de Intercâmbio de Informações<br />
sobre o IVA (VIES), como forma de<br />
comprovação do seu registo para<br />
efeit<strong>os</strong> de IVA noutro EM e da inclusão<br />
num regime de tributação<br />
das aquisições intracomunitárias<br />
de bens passará a configurar um<br />
requisito substantivo (e não apenas<br />
formal) para a aplicação da<br />
isenção de IVA nas transmissões<br />
intracomunitárias de bens.<br />
4. Comprovação do transporte<br />
intracomunitário de bens, para<br />
efeit<strong>os</strong> da aplicação da isenção<br />
de IVA aplicável às transmissões<br />
intracomunitárias de bens<br />
Dada a inexistência de normas<br />
comunitárias que regulem o tipo<br />
de evidência e documentação<br />
que deve ser utilizada pel<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> para comprovar<br />
a expedição d<strong>os</strong> bens para fora<br />
do EM de origem com destino ao<br />
adquirente noutro EM, comprovação<br />
essa essencial para efeit<strong>os</strong><br />
da isenção de IVA na transmissão<br />
intracomunitária de bens,<br />
são frequentes as situações de<br />
litigância entre <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
e as autoridades fiscais.<br />
No sentido de minimizar divergências<br />
de entendiment<strong>os</strong> e<br />
harmonizar <strong>os</strong> procediment<strong>os</strong>, o<br />
Regulamento de Execução passa<br />
a contemplar a identificação do<br />
tipo de document<strong>os</strong> que <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> deverão reunir para<br />
comprovar a expedição d<strong>os</strong> bens<br />
para o território de outro EM.<br />
Conforme decorre do acima<br />
descrito, a entrada em vigor das<br />
“Quick Fixes” comportará divers<strong>os</strong><br />
desafi<strong>os</strong> para as empresas<br />
envolvidas em operações transfronteiriças,<br />
que deverão, atempadamente,<br />
tomar medidas,<br />
tendo em vista a preparação<br />
d<strong>os</strong> seus sistemas e process<strong>os</strong><br />
intern<strong>os</strong>, bem como eventuais<br />
revisões de contrat<strong>os</strong> com<br />
clientes e fornecedores e respetivo<br />
enquadramento em sede<br />
de IVA, de modo a assegurar o<br />
cumprimento das novas regras,<br />
que entrarão em vigor em 1 de<br />
janeiro de 2020.<br />
89
Tributação Indireta<br />
LILIANA PINHEIRO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Alguns meses volvid<strong>os</strong><br />
desde a entrada em<br />
vigor da p<strong>os</strong>sibilidade de<br />
opção pelo pagamento<br />
do IVA devido pelas<br />
importações de bens<br />
na declaração periódica<br />
de IVA, a Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira<br />
(AT), motivada pelas<br />
dúvidas suscitadas<br />
pel<strong>os</strong> contribuintes,<br />
veio pelo Ofício-<br />
Circulado n.º 30203, de<br />
4 de julho, disponibilizar<br />
esclareciment<strong>os</strong><br />
complementares<br />
relativamente a<strong>os</strong><br />
requisit<strong>os</strong> de opção,<br />
ao cumprimento das<br />
obrigações declarativas<br />
e à regra de caducidade<br />
do direito à liquidação.<br />
Pagamento do IVA devido<br />
pelas importações de bens<br />
através da declaração<br />
periódica - esclareciment<strong>os</strong><br />
complementares pelo<br />
Ofício-Circulado n.º 30203,<br />
de 4 de julho de 2018<br />
No que respeita ao reporte nas<br />
declarações periódicas de IVA,<br />
apesar de ser sup<strong>os</strong>to <strong>os</strong> camp<strong>os</strong><br />
18 (valor tributável da importação)<br />
e 19 (IVA liquidado)<br />
serem pré-preenchid<strong>os</strong>, é da<br />
responsabilidade do sujeito passivo<br />
a confirmação d<strong>os</strong> valores<br />
neles inscrit<strong>os</strong>, por confronto<br />
com <strong>os</strong> element<strong>os</strong> das declarações<br />
aduaneiras de importação<br />
do período a que respeita a declaração<br />
periódica de IVA, declarações<br />
de importação essas que<br />
devem estar na p<strong>os</strong>se d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong>. Com efeito, a AT<br />
alerta para o facto de <strong>os</strong> valores<br />
pré-preenchid<strong>os</strong> poderem não<br />
refletir o valor tributável total<br />
das importações de bens e do<br />
correspondente IVA liquidado,<br />
realizadas no período a que respeita<br />
a declaração periódica de<br />
IVA, por falha na comunicação<br />
da informação necessária a esse<br />
preenchimento, por exemplo,<br />
por indisponibilidade temporária<br />
d<strong>os</strong> sistemas informátic<strong>os</strong> da<br />
AT ou do próprio operador económico.<br />
Caso a informação pré<br />
-preenchida não esteja correta,<br />
compete ao sujeito passivo alterar<br />
<strong>os</strong> valores pré-preenchid<strong>os</strong>,<br />
devendo munir-se e conservar<br />
<strong>os</strong> element<strong>os</strong> que suportem a<br />
alteração e <strong>os</strong> nov<strong>os</strong> valores indicad<strong>os</strong>.<br />
Caso, por algum motivo,<br />
o valor tributável da importação<br />
venha a sofrer alteração, nomeadamente,<br />
em consequência de<br />
alteração d<strong>os</strong> element<strong>os</strong> da declaração<br />
aduaneira de importação<br />
e a declaração periódica de<br />
IVA relativa a esse período de importação<br />
já tenha sido entregue<br />
com base n<strong>os</strong> valores da primeira<br />
declaração de importação, o<br />
sujeito passivo deverá proceder<br />
à retificação do valor tributável<br />
inicialmente reportado, mediante,<br />
entrega de uma declaração<br />
periódica de IVA de substituição<br />
para o período em que ocorreu a<br />
importação (ou seja, em que foi<br />
inicialmente aceite a declaração<br />
aduaneira de importação).<br />
Para efeit<strong>os</strong> do exercício do direito<br />
à dedução, o sujeito passivo<br />
deve estar na p<strong>os</strong>se, em<br />
versão eletrónica ou física, de<br />
declaração aduaneira de importação,<br />
da qual conste identificado<br />
como importador (destinatário<br />
d<strong>os</strong> bens).<br />
A AT veio ainda dar nota de<br />
que, quando o sujeito passivo<br />
opte pelo pagamento do IVA<br />
devido na importação de bens<br />
na declaração periódica de IVA,<br />
o prazo de caducidade do direito<br />
à liquidação é de quatr<strong>os</strong><br />
an<strong>os</strong>, por força do disp<strong>os</strong>to no<br />
artigo 94.º do Código do IVA e<br />
artigo 45.º e 46.º da Lei Geral<br />
Tributária, contrapondo com o<br />
prazo de caducidade do direito<br />
à liquidação do imp<strong>os</strong>to de 3<br />
an<strong>os</strong>, a contar da data da constituição<br />
da dívida aduaneira,<br />
quanto o IVA seja pago junto<br />
d<strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> aduaneir<strong>os</strong> competentes<br />
(n.º 3 do artigo 28.º<br />
do Código do IVA), ou seja, n<strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong> em que o sujeito passivo<br />
não exerça a opção de pagamento<br />
do IVA na declaração<br />
periódica de IVA.<br />
90
Uma nova realidade<br />
para <strong>os</strong> Regist<strong>os</strong> de IVA?<br />
Tributação Indireta<br />
PATRÍCIA TOMÉ<br />
Manager, Tax Services<br />
Foi publicado no<br />
passado dia 15 de<br />
fevereiro, o Decreto-<br />
Lei n.º 28/2019, que no<br />
âmbito do programa<br />
SIMPLEX+ visa promover<br />
a desmaterialização<br />
e desburocratização<br />
d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> de<br />
emissão e arquivo de<br />
faturas pelas empresas,<br />
tendo-se procedido à<br />
consolidação e à revisão<br />
de algumas regras<br />
que se encontravam<br />
dispersas em diversa<br />
legislação.<br />
O artigo 4.º deste Diploma veio<br />
introduzir a incerteza no tema<br />
em referência. Os sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
devem assegurar que as<br />
faturas sejam processadas por<br />
programas informátic<strong>os</strong> de faturação<br />
previamente certificad<strong>os</strong><br />
pela Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (AT) caso cumpram<br />
alguns requisit<strong>os</strong>, como seja o<br />
facto de disporem, com base no<br />
ano civil anterior, de um volume<br />
de negóci<strong>os</strong> superior a 50.000<br />
Eur<strong>os</strong>. Para efeit<strong>os</strong> desta regra,<br />
entende-se que são considerad<strong>os</strong><br />
como sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
que dispõem de sede, estabelecimento<br />
estável ou domicílio<br />
em território nacional e outr<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> cuja obrigação<br />
de emissão de fatura se encontre<br />
sujeita às regras estabelecidas<br />
no artigo 35.º-A do Código<br />
do IVA. Esta última parte da<br />
norma vem sugerir que a regra<br />
passe a ser extensível a “outr<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong>”. E quais<br />
serão? Não sabem<strong>os</strong>! Por Despacho<br />
do Secretário de Estado<br />
d<strong>os</strong> Assunt<strong>os</strong> Fiscais, de 1 de<br />
março de 2019, também nada se<br />
clarificou quanto à natureza d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> abrangid<strong>os</strong><br />
por esta realidade, tendo sido<br />
apenas mencionado que seria<br />
aplicável a<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
que anteriormente não estavam<br />
a tal obrigad<strong>os</strong> e que passariam<br />
a ter que fazê-lo a partir de 1<br />
de julho de 2019. Ora volvid<strong>os</strong><br />
praticamente quatro meses,<br />
a incerteza subsiste quanto à<br />
obrigação ou não de terem <strong>os</strong><br />
regist<strong>os</strong> de IVA de cumprir com<br />
esta regra. A anterior legislação,<br />
a Portaria n.º 363/2010, de 23 de<br />
junho, limitava de forma explícita<br />
a aplicação das regras aí<br />
vertidas indicando que apenas<br />
se encontravam abrangid<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
“sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> de imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o rendimento das pessoas<br />
singulares (IRS) ou de imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o rendimento das<br />
pessoas coletivas (IRC)”. A legislação<br />
atual vem apresentar esta<br />
lacuna e leva-n<strong>os</strong> a crer que o<br />
tema p<strong>os</strong>sa não ter sido equacionado.<br />
Veja-se que a figura<br />
do registo de IVA, como a conhecem<strong>os</strong><br />
por força das regras<br />
Europeias em matéria deste<br />
imp<strong>os</strong>to, determina que as entidades<br />
não estabelecidas que<br />
realizem operações em território<br />
português fiquem obrigadas<br />
a cumprir com todas as obrigações<br />
fiscais inerentes a esse<br />
estatuto. Não obstante, não se<br />
afigura razoável, no plano fiscal,<br />
alargar o âmbito de aplicação<br />
destas novas regras a<strong>os</strong> regist<strong>os</strong><br />
de IVA que, mesmo sendo<br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> deste imp<strong>os</strong>to,<br />
não dispõem de qualquer estrutura<br />
que lhes permita, de um<br />
ponto de vista prático, cumprir<br />
de forma adequada com esta<br />
obrigação. Sabem<strong>os</strong> que estas<br />
novas tendências fiscais visam a<br />
transparência e a inovação, mas<br />
na realidade, mesmo que de<br />
forma indireta, podem acabar<br />
por criar limitações ao investimento<br />
estrangeiro em Portugal.<br />
E verdade seja dita que, com<br />
obrigações fiscais desmedidas e<br />
desproporcionais, estas entidades<br />
acabarão por escolher outr<strong>os</strong><br />
destin<strong>os</strong> fiscalmente mais<br />
atrativ<strong>os</strong>. Fica assim a nota de<br />
que o mercado aguarda ansi<strong>os</strong>amente<br />
uma clarificação por<br />
parte da AT quanto a este tema.<br />
91
Tributação Indireta<br />
Imp<strong>os</strong>to Único de Circulação<br />
92<br />
AMÍLCAR NUNES<br />
Associate Partner, Tax Services<br />
O Imp<strong>os</strong>to Único<br />
de Circulação (IUC)<br />
é devido anualmente<br />
pel<strong>os</strong> proprietári<strong>os</strong> de<br />
veícul<strong>os</strong> e até ao final<br />
do mês de aniversário<br />
da respetiva matrícula.<br />
Ainda que seja p<strong>os</strong>sível efetuar<br />
o pagamento devido a partir do<br />
início do mês anterior ao da matrícula,<br />
permitindo, assim, evitar<br />
muit<strong>os</strong> dissabores para quem<br />
seja uma dor de cabeça manter-se<br />
no trilho d<strong>os</strong> pagament<strong>os</strong><br />
atempad<strong>os</strong> ao Estado, melhor<br />
ainda seria beneficiar de uma<br />
isenção de IUC. Se já sabe que<br />
o montante de imp<strong>os</strong>to é calculado<br />
em função da cilindrada e<br />
emissões de CO2 de cada tipologia<br />
de veículo, então, fique agora<br />
também a conhecer quais as<br />
isenções existentes.<br />
Regra geral, o rol de isenções de<br />
IUC previstas na Lei assenta ora<br />
nas características d<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong>,<br />
ora na condição do proprietário,<br />
as chamadas condições objetivas<br />
e subjetivas respetivamente.<br />
Pela sua importância, destaquese<br />
logo, em primeiro lugar, a<br />
isenção de IUC para indivídu<strong>os</strong><br />
portadores de deficiência cujo<br />
grau de incapacidade seja igual<br />
ou superior a 60% e que sejam<br />
proprietári<strong>os</strong> de veícul<strong>os</strong> das<br />
categorias A e E, ou mesmo da<br />
categoria B desde que a emissão<br />
de CO2 seja até 180g/km e cujo<br />
montante de IUC não ultrapasse<br />
<strong>os</strong> 240€.<br />
Por outro lado, também as instituições<br />
particulares de solidariedade<br />
social se encontram<br />
isentas do pagamento deste<br />
imp<strong>os</strong>to.<br />
Há isenções “para muit<strong>os</strong> g<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
e feiti<strong>os</strong>”, ou até mesmo<br />
nacionalidades! Por exemplo,<br />
encontram-se isent<strong>os</strong> de IUC <strong>os</strong><br />
cidadã<strong>os</strong> de outro Estado-Membro<br />
cuj<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong>, pese embora<br />
permaneçam em território nacional<br />
por um período superior<br />
a 183 dias, se encontrem matriculad<strong>os</strong><br />
naquela outra jurisdição<br />
e preencham <strong>os</strong> requisit<strong>os</strong> exigíveis<br />
para beneficiar do regime de<br />
admissão temporária. Esta isenção<br />
de IUC aproveita igualmente<br />
<strong>os</strong> trabalhadores transfronteiriç<strong>os</strong><br />
que residam em Espanha e<br />
se desloquem regularmente no<br />
trajeto de ida e volta entre a sua<br />
residência e o local de trabalho<br />
situado em Portugal.<br />
Em pormenor, estão isent<strong>os</strong> de<br />
IUC (total ou parcialmente) as<br />
seguintes situações:<br />
l Automóveis e motocicl<strong>os</strong> dit<strong>os</strong><br />
“Clássic<strong>os</strong>” que com mais de 20<br />
an<strong>os</strong> e constituindo peças de<br />
museus públic<strong>os</strong> sejam objeto<br />
de uso ocasional e não efetuem<br />
deslocações anuais superiores a<br />
500 km;<br />
l Veícul<strong>os</strong> não motorizad<strong>os</strong>, exclusivamente<br />
elétric<strong>os</strong> ou movid<strong>os</strong><br />
a energias renováveis não<br />
combustíveis, veícul<strong>os</strong> especiais<br />
de mercadorias sem capacidade<br />
de transporte, ambulâncias,<br />
veícul<strong>os</strong> funerári<strong>os</strong> e tratores<br />
agrícolas;<br />
l Veícul<strong>os</strong> da categoria B que<br />
p<strong>os</strong>suam um nível de emissão<br />
de CO2 até 180g/km e veícul<strong>os</strong><br />
da categoria A, que se destinem<br />
ao serviço de aluguer com condutor<br />
(letra «T») ou ao transporte<br />
em táxi;<br />
l Veícul<strong>os</strong> declarad<strong>os</strong> perdid<strong>os</strong><br />
a favor do Estado, abandonad<strong>os</strong><br />
ou apreendid<strong>os</strong> no âmbito de<br />
um processo-crime, enquanto<br />
durar a apreensão;<br />
l Veícul<strong>os</strong> das equipas de sapadores<br />
florestais, da administração<br />
central, regional, local e das<br />
forças militares e de segurança,<br />
<strong>os</strong> adquirid<strong>os</strong> pelas associações<br />
humanitárias de bombeir<strong>os</strong> ou<br />
câmaras municipais para o cumprimento<br />
de missões de proteção,<br />
socorro, assistência, apoio e<br />
combate a incêndi<strong>os</strong>, atribuídas<br />
a<strong>os</strong> seus corp<strong>os</strong> de bombeir<strong>os</strong> e<br />
outr<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> propriedade de<br />
Estad<strong>os</strong> estrangeir<strong>os</strong>, missões<br />
diplomáticas e consulares, organizações<br />
internacionais ou agências<br />
europeias especializadas e<br />
respetiv<strong>os</strong> funcionári<strong>os</strong>;<br />
l Os automóveis de mercadorias<br />
e automóveis de utilização mista<br />
com peso bruto superior a 2500<br />
kg, afet<strong>os</strong> ao transporte particular<br />
de mercadorias/ao transporte<br />
por conta própria ou ao transporte<br />
público de mercadorias/<br />
transporte por conta de outrem,<br />
ou aluguer sem condutor que<br />
p<strong>os</strong>sua essas finalidades, autorizad<strong>os</strong><br />
ou licenciad<strong>os</strong> para o<br />
transporte de grandes objet<strong>os</strong><br />
(categoria D) ou que efetuem<br />
transporte exclusivamente na<br />
área territorial de uma região<br />
autónoma (categorias C e D),<br />
gozam de uma redução de 50%<br />
de IUC.
Tributação Indireta<br />
Imp<strong>os</strong>to sobre Veícul<strong>os</strong> (ISV)<br />
Ao abrigo de um princípio de<br />
equivalência, o Imp<strong>os</strong>to sobre<br />
Veícul<strong>os</strong> (ISV) onera <strong>os</strong> contribuintes<br />
na medida da incorporação<br />
d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> associad<strong>os</strong> à<br />
utilização de um veículo motorizado,<br />
seja em matérias ambientais,<br />
seja ao nível do desgaste<br />
das infraestruturas rodoviárias<br />
ou mesmo d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> sociais<br />
inerentes à sinistralidade resultante<br />
da circulação rodoviária.<br />
É nesta medida que se compreende<br />
que, ainda que o seu<br />
pagamento ocorra uma única<br />
vez, <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de suspensão de<br />
imp<strong>os</strong>to, mas sobretudo de isenção<br />
de ISV, sejam reduzid<strong>os</strong>.<br />
Como não podia deixar de ser, as<br />
isenções de ISV, parciais ou totais,<br />
aplicam-se a veícul<strong>os</strong> utilizad<strong>os</strong><br />
em funções de autoridade,<br />
de utilidade pública e serviç<strong>os</strong><br />
de táxi, Enquadram-se nestas<br />
funções <strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> adquirid<strong>os</strong><br />
para atividades operacionais da<br />
Autoridade Nacional de Proteção<br />
Civil, veícul<strong>os</strong> adquirid<strong>os</strong> em estado<br />
novo para forças militares,<br />
militarizadas e de segurança,<br />
abandonad<strong>os</strong> ou perdid<strong>os</strong> a favor<br />
do Estado, bem como veícul<strong>os</strong><br />
automóveis, com lotação<br />
igual ou superior a sete lugares,<br />
incluindo o do condutor, adquirid<strong>os</strong><br />
pel<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> e freguesias<br />
para transporte de crianças<br />
em idade escolar do ensino básico<br />
ou funções operacionais das<br />
equipas de sapadores florestais.<br />
Com a Lei do Orçamento do Estado<br />
para 2018, foi ainda alargada<br />
a<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> adquirid<strong>os</strong> pelas<br />
corporações de Bombeir<strong>os</strong> para<br />
efeito das suas funções, a isenção<br />
já existente para <strong>os</strong> veícul<strong>os</strong><br />
das equipas de sapadores florestais<br />
pelo Instituto da Conservação<br />
da Natureza e das Florestas,<br />
I. P.. Para as restantes situações,<br />
mantém-se a isenção (ou redução<br />
parcial de imp<strong>os</strong>to) de imp<strong>os</strong>to<br />
quanto:<br />
l A<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> para transporte<br />
coletivo com lotação de nove<br />
lugares, adquirid<strong>os</strong> em estado<br />
novo, por instituições particulares<br />
de solidariedade social,<br />
cooperativas e associações de<br />
e para pessoas com deficiência<br />
com o estatuto de organização<br />
não-governamental que, em<br />
qualquer caso, p<strong>os</strong>suam um nível<br />
de emissão de CO2 até 180<br />
g/km;<br />
l A<strong>os</strong> automóveis ligeir<strong>os</strong> de<br />
passageir<strong>os</strong> e de utilização mista<br />
que se destinem ao serviço de<br />
aluguer com condutor, introduzid<strong>os</strong><br />
no consumo e que apresentem<br />
até quatro an<strong>os</strong> de uso,<br />
contad<strong>os</strong> desde a atribuição da<br />
primeira matrícula e respetiv<strong>os</strong><br />
document<strong>os</strong>, e não tenham níveis<br />
de emissão de CO2 superiores<br />
a 160 g/km, podendo neste<br />
caso aplicar-se uma redução<br />
de até 70% do montante do ISV<br />
devido;<br />
l A<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> destinad<strong>os</strong> ao uso<br />
próprio de pessoas com deficiência<br />
motora (maiores de 18 an<strong>os</strong>),<br />
ao uso de pessoas com multideficiência<br />
profunda, pessoas com<br />
deficiência que se movam exclusivamente<br />
apoiadas em cadeiras<br />
de rodas (em que mediante declaração<br />
de incapacidade se admitem<br />
para <strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> níveis de<br />
emissão de CO2 até 180g/km), de<br />
pessoas com deficiência visual e<br />
com deficiência das Forças Armadas,<br />
desde que o nível de CO2<br />
seja até 160 g/km e o montante<br />
da isenção não exceda <strong>os</strong> 7.800€;<br />
l À aquisição de veícul<strong>os</strong> de automóveis<br />
ligeir<strong>os</strong> de passageir<strong>os</strong><br />
com lotação superior a 5 lugares,<br />
por famílias numer<strong>os</strong>as, cujo<br />
nível de emissão de CO2 seja<br />
igual ou inferior a 150 g/kg, e o<br />
montante da isenção não exceda<br />
<strong>os</strong> 7.800€, sendo nesta situação<br />
p<strong>os</strong>sível de beneficiar de uma<br />
redução até 50% do montante<br />
de ISV devido.<br />
Não podendo ficar alheio às<br />
alterações do paradigma económico-social<br />
do país, a Lei do<br />
Orçamento do Estado para 2018<br />
introduziu duas novas isenções<br />
em sede de ISV correspondentes,<br />
respetivamente, a 40% do<br />
montante de imp<strong>os</strong>to na introdução<br />
no consumo de automóveis<br />
ligeir<strong>os</strong> de passageir<strong>os</strong> e de<br />
utilização mista que se destinem<br />
ao exercício de atividades de<br />
aluguer sem condutor, mediante<br />
o cumprimento de determinad<strong>os</strong><br />
requisit<strong>os</strong>, bem como quanto a<br />
veícul<strong>os</strong> adquirid<strong>os</strong> por via sucessória<br />
por um residente em<br />
território nacional a um residente<br />
noutro Estado-Membro<br />
ou país terceiro, <strong>os</strong> quais podem<br />
agora ser introduzid<strong>os</strong> no consumo<br />
com isenção de ISV, mediante<br />
o cumprimento de certas<br />
formalidades.<br />
Foi ainda eliminada a obrigatoriedade<br />
de obtenção de um<br />
certificado de residência oficial<br />
onde conste a data do início<br />
e cessação da residência para<br />
efeit<strong>os</strong> de reconhecimento da<br />
isenção por transferência de<br />
residência, reduzindo-se, também,<br />
de 12 para 6 meses, o período<br />
mínimo de residência para<br />
efeit<strong>os</strong> de aplicação da isenção<br />
de ISV d<strong>os</strong> veícul<strong>os</strong> transmitid<strong>os</strong><br />
em vida ou em morte em caso<br />
de transferência de residência<br />
de outro Estado-Membro ou país<br />
terceiro.<br />
Mas atenção: em caso de transferência<br />
de residência e tal como<br />
ocorre quanto a funcionári<strong>os</strong><br />
diplomátic<strong>os</strong> e consulares portugueses<br />
ou da União Europeia,<br />
entre outr<strong>os</strong>, a isenção de ISV<br />
apenas é aplicável a um automóvel<br />
ou motociclo por beneficiário.<br />
93
Tributação Indireta<br />
O aguardado incentivo<br />
à produção cinematográfica<br />
e audiovisual nacional<br />
94<br />
ALEXANDRA SILVA<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
O Decreto-Lei<br />
nº45/2018, de 19 de<br />
junho, publicado<br />
na sequência da<br />
autorização legislativa<br />
incluída na Lei do<br />
Orçamento do Estado<br />
para 2018 (OE 2018”),<br />
veio constituir o<br />
Fundo de Apoio ao<br />
Turismo e ao Cinema,<br />
que inclui uma<br />
vertente de incentivo<br />
não só à produção<br />
cinematográfica, como<br />
também à produção<br />
audiovisual.<br />
Este incentivo surge assim como<br />
um instrumento que pretende<br />
reforçar a competitividade de<br />
Portugal enquanto local de produção<br />
cinematográfica e audiovisual,<br />
ao estimular a atividade<br />
d<strong>os</strong> produtores e coprodutores<br />
nacionais e ao contribuir para<br />
atração da realização de produções<br />
estrangeiras para o n<strong>os</strong>so<br />
país, promovendo internacionalmente<br />
a imagem do mesmo.<br />
Como tal, este sistema de incentiv<strong>os</strong><br />
beneficia não só empresas<br />
residentes em território nacional,<br />
como também empresas<br />
não residentes com estabelecimento<br />
estável em Portugal.<br />
O incentivo é aplicável a obras<br />
cinematográficas destinadas a<br />
uma exploração inicial em salas<br />
de cinema comerciais, obras<br />
audiovisuais de produção independente<br />
para difusão televisiva,<br />
e obras de ficção, animação ou<br />
documentári<strong>os</strong> para exploração<br />
através de serviç<strong>os</strong> de comunicações<br />
eletrónicas.<br />
Com a criação deste Fundo foi<br />
revogado o benefício fiscal existente,<br />
com o objetivo de o substituir<br />
por um novo regime, que se<br />
espera mais favorável, através da<br />
implementação de um sistema<br />
de reembolso de despesas de<br />
produção (cash rebate).<br />
Em term<strong>os</strong> objetiv<strong>os</strong>, as empresas<br />
beneficiárias têm agora a<br />
p<strong>os</strong>sibilidade de obter apoio financeiro<br />
para obras produzidas<br />
total ou parcialmente em Portugal,<br />
podendo o mesmo variar<br />
entre 25% a 30% do total das<br />
despesas elegíveis. Para tal, são<br />
consideradas elegíveis despesas<br />
incorridas com o pagamento de<br />
remunerações ao pessoal afeto<br />
à produção, honorári<strong>os</strong> pag<strong>os</strong> a<br />
prestadores de serviç<strong>os</strong>, compra<br />
de materiais, equipament<strong>os</strong> e<br />
serviç<strong>os</strong> fornecid<strong>os</strong> por empresas,<br />
desde que <strong>os</strong> fornecedores<br />
tenham sede, direção efetiva ou<br />
estabelecimento estável no n<strong>os</strong>so<br />
país.<br />
O reforço deste regime de incentiv<strong>os</strong><br />
através do OE 2018,<br />
segue a tendência verificada<br />
n<strong>os</strong> restantes países europeus<br />
com regimes similares de apoio<br />
à produção audiovisual. Para o<br />
ano 2019, está ainda previsto na<br />
Prop<strong>os</strong>ta de Lei do Orçamento<br />
do Estado, que <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
no exercício da atividade<br />
de produção cinematográfica e<br />
audiovisual, desenvolvida com o<br />
apoio do Fundo de Apoio ao Turismo<br />
e ao Cinema, beneficiem<br />
da isenção da tributação autónoma<br />
relativamente a<strong>os</strong> encarg<strong>os</strong><br />
que suportem com viaturas<br />
ligeiras de passageir<strong>os</strong>, viaturas<br />
ligeiras de mercadorias, mot<strong>os</strong> e<br />
motocicl<strong>os</strong>.<br />
Sendo um incentivo previsto nas<br />
regras de auxíli<strong>os</strong> de estado da<br />
União Europeia, este regime reflete<br />
<strong>os</strong> objetiv<strong>os</strong> de promoção<br />
cultural e do património, excelência<br />
artística e diversidade,<br />
bem como o estímulo à indústria<br />
europeia de produção cinematográfica<br />
e audiovisual.
Tributação<br />
do Imobiliário
Tributação do Imobiliário<br />
Terren<strong>os</strong> para construção<br />
e o AIMI: Crónica<br />
de uma morte anunciada<br />
96<br />
BRUNA MELO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A discussão remonta<br />
ao final de 2016, altura<br />
em que a criação<br />
de um novo imp<strong>os</strong>to,<br />
o Adicional ao IMI<br />
(AIMI) ou, para alguns,<br />
o “imp<strong>os</strong>to Mortágua”,<br />
é aprovado pelo<br />
Parlamento<br />
em conjunto<br />
com o Orçamento<br />
do Estado para 2017.<br />
Sucessor da verba 28 do Imp<strong>os</strong>to<br />
do Selo (aplicável sobre <strong>os</strong> imóveis<br />
de luxo de valor superior a<br />
um milhão de eur<strong>os</strong>), este novo<br />
imp<strong>os</strong>to foi pensado para incidir<br />
sobre as pessoas singulares<br />
e coletivas (e ainda heranças<br />
indivisas) que sejam proprietári<strong>os</strong><br />
ou detenham determinad<strong>os</strong><br />
direit<strong>os</strong> (por exemplo, usufruto),<br />
sobre prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong> em Portugal.<br />
O objetivo da introdução do<br />
AIMI no n<strong>os</strong>so já complexo sistema<br />
fiscal foi anunciado como<br />
uma medida de forte impacto<br />
p<strong>os</strong>itivo: promover a equidade<br />
fiscal, através da tributação das<br />
pessoas e empresas com maior<br />
capacidade contributiva revelada<br />
pela detenção de imóveis.<br />
Algumas vozes mais à direita<br />
prontamente reclamaram a necessidade<br />
de estímulo à atividade<br />
económica, premente à data<br />
da discussão e p<strong>os</strong>ta em causa<br />
pelo novo imp<strong>os</strong>to. Reconhecendo<br />
o mérito ao então invocado<br />
objetivo extrafiscal, depressa o<br />
legislador se propôs a excluir<br />
do âmbito do AIMI <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong><br />
urban<strong>os</strong> classificad<strong>os</strong> como<br />
«comerciais, industriais ou para<br />
serviç<strong>os</strong>» (excluindo porém do<br />
imp<strong>os</strong>to, não as empresas com<br />
atividades económicas produtivas,<br />
industriais ou fabris, que em<br />
regra não são proprietárias mas<br />
apenas arrendatárias deste tipo<br />
de imóveis, mas sim as sociedades<br />
e fund<strong>os</strong> imobiliári<strong>os</strong> que<br />
detêm este tipo de imóveis para<br />
a respetiva exploração) e como<br />
«outr<strong>os</strong>», de entre uma lista que<br />
inclui ainda prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong><br />
classificad<strong>os</strong> como “habitacionais”<br />
e “terren<strong>os</strong> para construção”.<br />
Depressa esta norma de exclusão<br />
se tornou o epicentro de<br />
um tornado de discussões jurídicas<br />
e fonte de um número avultado<br />
de litígi<strong>os</strong> entre a Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira (AT) e<br />
<strong>os</strong> contribuintes, que reclamaram<br />
desde cedo que da exclusão<br />
do AIMI abrangesse igualmente<br />
<strong>os</strong> terren<strong>os</strong> para construção de<br />
prédi<strong>os</strong> que se destinassem a<br />
comércio, indústria ou serviç<strong>os</strong>.<br />
Para este efeito invocaram, entre<br />
outr<strong>os</strong> argument<strong>os</strong>, a necessidade<br />
de a norma de exclusão do<br />
AIMI ser interpretada de forma<br />
extensiva, de modo a abranger<br />
não apenas <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong><br />
classificad<strong>os</strong> como «comerciais,<br />
industriais ou para serviç<strong>os</strong>»<br />
mas também, em linha com a<br />
alegada intenção do legislador,<br />
<strong>os</strong> terren<strong>os</strong> destinad<strong>os</strong> à construção<br />
desses mesm<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong>.<br />
Isto sob pena de a norma preconizar<br />
um tratamento discriminatório<br />
injustificado entre as primeiras<br />
e segundas situações em<br />
desconformidade com <strong>os</strong> princípi<strong>os</strong><br />
constitucionalmente protegid<strong>os</strong><br />
da igualdade e capacidade<br />
contributiva, especialmente por<br />
<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> no estágio de terren<strong>os</strong><br />
para construção serem indiciadores<br />
de menor capacidade<br />
contributiva que aqueles que<br />
estejam já edificad<strong>os</strong>.<br />
A AT tem vindo naturalmente a<br />
indeferir as pretensões d<strong>os</strong> contribuintes,<br />
considerando que foi<br />
intenção expressa e consciente<br />
do legislador a de incluir no âmbito<br />
de aplicação do AIMI determinad<strong>os</strong><br />
prédi<strong>os</strong> suscetíveis de<br />
integrar o ativo das empresas,<br />
como sejam <strong>os</strong> terren<strong>os</strong> para<br />
construção, e que a liquidação<br />
do imp<strong>os</strong>to deve atender à natureza<br />
do prédio à data relevante<br />
para a tributação e não a uma<br />
potencial edificação futura.<br />
Foi com bons olh<strong>os</strong> que o mercado<br />
recebeu as primeiras decisões<br />
d<strong>os</strong> tribunais arbitrais<br />
(CAAD) favoráveis ao contribuinte,<br />
ainda em 2017, na sequência<br />
d<strong>os</strong> recurs<strong>os</strong> por estes interp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
das decisões da AT, as quais<br />
defenderam a necessidade de<br />
interpretação extensiva da norma<br />
que determina a exclusão de<br />
determinad<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> do AIMI,<br />
por forma a nela abranger <strong>os</strong><br />
terren<strong>os</strong> para construção de prédi<strong>os</strong><br />
afet<strong>os</strong> a comércio, indústria<br />
e serviç<strong>os</strong>.<br />
Na medida em que as decisões<br />
do CAAD recaíram sobre questões<br />
de inconstitucionalidade<br />
das normas que enformam o<br />
AIMI, suscitadas pel<strong>os</strong> contri-
Tributação do Imobiliário<br />
buintes, cedo se antecipou a necessária<br />
intervenção do Tribunal<br />
Constitucional (TC) na matéria.<br />
Chamado a pronunciar-se sobre<br />
a compatibilidade do AIMI com a<br />
Constituição, considerou recentemente<br />
o TC (no seu Acórdão nº<br />
299/2019), que, na definição do<br />
âmbito de incidência do imp<strong>os</strong>to,<br />
o legislador recorreu às espécies<br />
de prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong> previstas<br />
na lei, considerando irrelevante<br />
a concreta utilização dada a<strong>os</strong><br />
mesm<strong>os</strong>. Considera ainda o TC<br />
que, n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de terren<strong>os</strong> para<br />
construção de prédi<strong>os</strong> afet<strong>os</strong> a<br />
comércio, indústria ou serviç<strong>os</strong>,<br />
o nexo de ligação d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong><br />
ao desenvolvimento de uma atividade<br />
económica não se encontra<br />
estabelecido tão cabalmente<br />
como n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de prédi<strong>os</strong> já<br />
edificad<strong>os</strong> e afet<strong>os</strong> àqueles fins,<br />
pelo que, não estando em causa<br />
situações equiparáveis, não<br />
pode colher o argumento de que<br />
as normas em causa violam <strong>os</strong><br />
princípi<strong>os</strong> da igualdade e capacidade<br />
contributiva.<br />
Esta decisão marca a saída vitori<strong>os</strong>a<br />
da AT na discussão que<br />
tem por vindo a ser protagonizada<br />
sociedades imobiliárias, fund<strong>os</strong><br />
de investimento imobiliário<br />
e banc<strong>os</strong>, <strong>os</strong> quais se vêm agora<br />
obrigad<strong>os</strong> a pagar AIMI sobre <strong>os</strong><br />
terren<strong>os</strong> para construção de que<br />
são proprietári<strong>os</strong>, caso ainda<br />
não o tenham feito.<br />
Adiad<strong>os</strong> ficam <strong>os</strong> reclamad<strong>os</strong><br />
alívio da carga fiscal das empresas,<br />
a promoção do investimento<br />
doméstico e estrangeiro e <strong>os</strong> estímul<strong>os</strong><br />
à regeneração do tecido<br />
imobiliário português. Fica por<br />
saber se <strong>os</strong> impact<strong>os</strong> extrafiscais<br />
deste imp<strong>os</strong>to e da sua extensão<br />
são compensad<strong>os</strong> pela receita<br />
fiscal por si gerada. Espera-se<br />
que as contas não sejam feitas<br />
tarde de mais.<br />
As recentes alterações<br />
ao Regime das Sociedades<br />
de Investimento<br />
e Gestão Imobiliária<br />
HÉLDER MATIAS<br />
Associate Partner, Tax Services<br />
No passado<br />
dia 4 de setembro,<br />
foi publicada<br />
a Lei n.º 97/2019, que<br />
procede à primeira<br />
alteração do regime<br />
das sociedades<br />
de investimento<br />
e gestão imobiliária<br />
(SIGI) aprovado<br />
pelo Decreto-Lei<br />
n.º 19/2019,<br />
de 28 de janeiro.<br />
Este diploma veio introduzir<br />
diversas alterações, das quais<br />
destacam<strong>os</strong> as que impactam o<br />
objeto social e a clarificação do<br />
regime fiscal aplicável a estas<br />
entidades.<br />
Em primeiro lugar, destacam<strong>os</strong> a<br />
clarificação de que o objeto social<br />
das SIGI é apenas o arrendamento,<br />
ainda que em sentido<br />
amplo, eliminando-se a referência<br />
a outras formas de exploração<br />
económica do imóvel. Determina-se<br />
assim que as SIGI têm<br />
por objeto a aquisição de direit<strong>os</strong><br />
sobre imóveis para arrendamento<br />
abrangendo este “formas<br />
contratuais atípicas que incluam<br />
prestações de serviç<strong>os</strong> necessárias<br />
à utilização do imóvel”.<br />
Do mesmo modo, estabelece-se<br />
que as SIGI podem exercer a sua<br />
atividade mediante a aquisição<br />
de participações em outras SIGI<br />
ou em sociedades com sede em<br />
território português ou em outro<br />
Estado-Membro da União Europeia<br />
ou do Espaço Económico<br />
Europeu. Assim, as SIGI deixam<br />
de estar obrigadas a exercer a<br />
sua atividade exclusivamente<br />
mediante a aquisição direta de<br />
ativ<strong>os</strong>, abrindo-se a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de procederem à aquisição<br />
de sociedades que operem no<br />
setor imobiliário, opção essa<br />
que, em determinadas situações,<br />
se poderá revelar fiscalmente<br />
mais eficiente, mas acima de<br />
tudo traz uma nova flexibilidade<br />
de atuação a quem opta por este<br />
tipo de veícul<strong>os</strong> de investimento.<br />
No que concerne ao regime fiscal,<br />
é de notar que, aquando da<br />
publicação do Decreto-Lei n.º<br />
19/2019, de 28 de janeiro, ape-<br />
97
Tributação do Imobiliário<br />
sar de expectável que lhes f<strong>os</strong>se<br />
aplicável o regime d<strong>os</strong> Organism<strong>os</strong><br />
de Investimento Coletivo<br />
(OIC), o legislador não o havia<br />
referido expressamente, sendo<br />
que a única referência ao regime<br />
fiscal constava do preâmbulo.<br />
Ora, com a publicação da Lei n.º<br />
97/2019, de 4 de setembro, clarifica-se<br />
que, em regra, às SIGI é<br />
aplicável o regime fiscal previsto<br />
n<strong>os</strong> artig<strong>os</strong> 22.º e 22.º - A do<br />
Estatuto d<strong>os</strong> Benefíci<strong>os</strong> Fiscais<br />
(EBF). Não obstante, clarifica-se<br />
que n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> d<strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
resultantes da alienação oner<strong>os</strong>a<br />
de direit<strong>os</strong> reais sobre imóveis<br />
por SIGI, a exclusão de tributação<br />
prevista nestes artig<strong>os</strong><br />
apenas será aplicável quando<br />
<strong>os</strong> imóveis tiverem sido detid<strong>os</strong><br />
para arrendamento, abrangendo<br />
formas contratuais atípicas<br />
que incluam prestações de serviç<strong>os</strong><br />
necessárias à utilização do<br />
imóvel, durante pelo men<strong>os</strong> três<br />
an<strong>os</strong>.<br />
Adicionalmente, foram ainda<br />
consagradas outras regras destinadas<br />
a clarificar o tratamento<br />
fiscal devido tanto a<strong>os</strong> participantes,<br />
bem como às SIGI, caso<br />
se verifique a perda de qualidade<br />
de SIGI, cessando a aplicação<br />
do regime previsto no EBF.<br />
Em face do acima exp<strong>os</strong>to, entendem<strong>os</strong><br />
que estas alterações<br />
e clarificações, fazendo a aproximação<br />
à realidade internacional<br />
de veícul<strong>os</strong> de investimento semelhantes,<br />
são um passo firme<br />
no sentido de reforçar a credibilidade<br />
da SIGI como uma forma<br />
de investimento atrativa no mercado<br />
imobiliário português.<br />
Imóveis: as razões<br />
para o diferente tratamento<br />
entre Lda e SA<br />
98<br />
HÉLDER MATIAs<br />
Associate Partner, Tax Services<br />
N<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do artigo<br />
2.º, n.º 2, al. d) do<br />
Código do Imp<strong>os</strong>to<br />
Municipal sobre as<br />
Transmissões Oner<strong>os</strong>as<br />
de Imóveis (“IMT”),<br />
este imp<strong>os</strong>to incide<br />
sobre a “aquisição de<br />
partes sociais ou de<br />
quotas nas sociedades<br />
em nome coletivo, em<br />
comandita simples ou<br />
por quotas, quando tais<br />
sociedades p<strong>os</strong>suam<br />
bens imóveis, e quando<br />
por aquela aquisição,<br />
(…) algum d<strong>os</strong> sóci<strong>os</strong><br />
fique a dispor de, pelo<br />
men<strong>os</strong>, 75% do capital<br />
social, ou o número de<br />
sóci<strong>os</strong> se reduza a dois<br />
casad<strong>os</strong> ou unid<strong>os</strong> de<br />
facto”.<br />
Esta norma (em moldes similares)<br />
é aplicável desde 1959. Nasceu<br />
como uma regra antiabuso, tendo<br />
como principal objetivo impedir<br />
que as famílias em vez de comprar<br />
diretamente <strong>os</strong> imóveis comprassem<br />
sociedades que detivessem<br />
imóveis, obviando, por esta via, a<br />
tributação em SISA (hoje IMT) que<br />
incidia no caso da transmissão direta<br />
desses imóveis.<br />
Como resulta da sua redação,<br />
esta norma não se aplica (nem<br />
nunca se aplicou) a Sociedades<br />
Anónimas (“SA”). O motivo histórico<br />
desta exclusão prendeu-se<br />
com o facto das SA em Portugal<br />
serem poucas e de grande dimensão,<br />
onde raramente se observavam<br />
operações de evasão<br />
fiscal relacionadas com SISA. Cerca<br />
de 60 an<strong>os</strong> depois, o mundo e<br />
o contexto económico (e também<br />
fiscal) mudaram substancialmente,<br />
mas a referida regra fiscal continua<br />
exatamente a ser a mesma.<br />
Assim sendo, ao longo d<strong>os</strong> an<strong>os</strong>,<br />
o mercado em busca de vantagens<br />
competitivas e de eficiência<br />
fiscal, ajustou-se para contornar<br />
a tributação aplicável às Lda,<br />
tornando-se comum a constituição<br />
de sociedades imobiliárias<br />
sob a forma legal de SA ou a conversão<br />
em SA das que não o são<br />
ab initio em momento anterior a<br />
alterações acionistas.<br />
Ainda que sem sucesso, a conversão<br />
de Lda em SA já foi inclusive<br />
questionada pela Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira, ao<br />
abrigo da cláusula geral antiabuso<br />
prevista no artigo 38.º da Lei<br />
Geral Tributária, com o argumento<br />
de que tais operações seriam<br />
realizadas unicamente com o<br />
propósito de obtenção de vantagens<br />
fiscais. Note-se ainda que<br />
a legislação fiscal tende a não<br />
distinguir a natureza jurídica das<br />
sociedades e que esta é uma das<br />
diferenças de tratamento fiscal<br />
mais visíveis entre SA e Sociedades<br />
por Quotas (“Lda”).
Tributação do Imobiliário<br />
Em face do exp<strong>os</strong>to, se o objetivo<br />
se cinge a impedir situações de<br />
abuso no mercado de habitação<br />
para particulares entendem<strong>os</strong><br />
que o mesmo continua a ser<br />
atingido, na medida em que <strong>os</strong><br />
cust<strong>os</strong> de constituição / manutenção<br />
de uma SA tornam (hoje<br />
à semelhança de 1959) essa opção<br />
ineficiente na generalidade<br />
das situações. Todavia, para o<br />
mundo empresarial, esta regra<br />
tornou-se apenas mais uma variável<br />
de contexto, decidindo <strong>os</strong><br />
investidores entre SA e Lda, consoante<br />
<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> de estrutura<br />
adicionais de uma SA se antecipem<br />
mais baix<strong>os</strong> do que a tributação<br />
em IMT que seria aplicada<br />
no caso de aquisição de quotas<br />
de uma Lda.<br />
Em n<strong>os</strong>so entender, uma eventual<br />
regra antiabuso nesta área,<br />
caso a mesma se justifique, teria<br />
que passar não pelo tratamento<br />
diferenciado em função da qualificação<br />
jurídica das sociedades<br />
envolvidas mas, por exemplo,<br />
por uma regra que pondere a<br />
relevância d<strong>os</strong> imóveis no total<br />
de ativ<strong>os</strong> dessa sociedade, à<br />
semelhança do que se encontra<br />
previsto em outras regras<br />
do normativo jurídico–tributário<br />
português (v.g. artigo 51.º-C n.º<br />
4 do Código do Imp<strong>os</strong>to sobre o<br />
Rendimento das Pessoas Coletivas<br />
e artigo 27.º n.º 3 b) do Estatuto<br />
d<strong>os</strong> Benefíci<strong>os</strong> Fiscais).<br />
Tributação de mais-valias<br />
com a alienação<br />
de sociedades<br />
com ativ<strong>os</strong> imobiliári<strong>os</strong><br />
JORGE CUNHAL<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
O investimento no<br />
mercado imobiliário<br />
em Portugal continua<br />
a bater recordes.<br />
Neste contexto, importa<br />
realçar que a estrutura<br />
societária utilizada<br />
por investidores no<br />
mercado imobiliário<br />
em Portugal poderá<br />
afetar, de forma<br />
decisiva, a tributação<br />
que incidirá sobre<br />
uma futura venda da<br />
sociedade que detém<br />
<strong>os</strong> imóveis, dependendo<br />
da afetação que é dada<br />
a<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>.<br />
Com efeito, a legislação fiscal<br />
portuguesa isenta de IRC as<br />
mais-valias realizadas por entidades<br />
não residentes com a<br />
transmissão oner<strong>os</strong>a de partes<br />
sociais de entidades residentes<br />
em território português. No entanto,<br />
tal isenção de tributação<br />
não é aplicável em determinadas<br />
situações, nomeadamente<br />
quando o ativo da sociedade<br />
alienada seja maioritariamente<br />
comp<strong>os</strong>to por bens imóveis<br />
situad<strong>os</strong> em Portugal. Uma<br />
isenção de IRC similar abrange<br />
as mais-valias realizadas por<br />
entidades residentes com a<br />
transmissão oner<strong>os</strong>a de partes<br />
sociais, cumprid<strong>os</strong> que estejam<br />
determinad<strong>os</strong> requisit<strong>os</strong>,<br />
não sendo também aplicável<br />
quando o ativo da sociedade<br />
alienada seja maioritariamente<br />
comp<strong>os</strong>to por bens imóveis cá<br />
situad<strong>os</strong>. Contudo, o regime que<br />
vigora para as entidades residentes,<br />
contrariamente ao estabelecido<br />
para as não residentes,<br />
prevê uma exceção que permite<br />
manter a isenção de IRC caso<br />
<strong>os</strong> bens imóveis da sociedade<br />
alienada se encontrem afet<strong>os</strong><br />
a uma atividade de natureza<br />
agrícola, industrial ou comercial<br />
que não consista na compra e<br />
venda de bens imóveis.<br />
Resumindo, aquando do desinvestimento<br />
em sociedades imobiliárias<br />
em Portugal, <strong>os</strong> investidores<br />
não residentes são discriminad<strong>os</strong><br />
negativamente face a<strong>os</strong> investidores<br />
residentes, porquanto a<strong>os</strong><br />
primeir<strong>os</strong> é vedada a isenção de<br />
IRC nas mais-valias eventualmente<br />
apuradas, sendo tal isenção<br />
mantida para <strong>os</strong> segund<strong>os</strong> desde<br />
que <strong>os</strong> imóveis detid<strong>os</strong> pela sociedade<br />
estejam afet<strong>os</strong> a atividades<br />
económicas que não consistam<br />
na compra e venda de bens<br />
imóveis.<br />
Importa ainda notar que alguns<br />
investidores não residentes poderão<br />
beneficiar de isenção de<br />
99
Tributação do Imobiliário<br />
IRC por força da aplicação da<br />
Convenção para Evitar a Dupla<br />
Tributação (“CDT”) celebrada<br />
entre o país de residência da<br />
sociedade alienante e Portugal,<br />
caso exista, na medida em<br />
que algumas dessas CDTs atribuem<br />
competência exclusiva<br />
de tributação das mais-valias<br />
ao país de residência da entidade<br />
alienante. Não obstante,<br />
nestes cas<strong>os</strong>, será necessário<br />
avaliar com a devida cautela<br />
a robustez e substância da estrutura<br />
utilizada, bem como o<br />
seu racional económico, à luz<br />
das novas regras e princípi<strong>os</strong><br />
fiscais internacionais introduzid<strong>os</strong><br />
pela iniciativa BEPS (“Base<br />
Er<strong>os</strong>ion and Profit Shifting”) da<br />
OCDE e que estão a ser transp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
para a legislação fiscal<br />
portuguesa e CDTs celebradas<br />
por Portugal.<br />
Fiscalidade do arrendamento:<br />
causa ou efeito?<br />
100<br />
PAULO MENDONÇA<br />
Partner, Tax Services<br />
O regime legal do<br />
arrendamento de<br />
imóveis, principalmente<br />
nas cidades, é um tema<br />
fraturante. Envolve<br />
uma das necessidades<br />
básicas d<strong>os</strong> cidadã<strong>os</strong><br />
(alojamento) com<br />
proteção constitucional,<br />
mas as opções que<br />
têm sido seguidas<br />
no que respeita à<br />
sua regulamentação<br />
acabam por, de uma ou<br />
outra forma, suscitar<br />
problemas sociais<br />
complex<strong>os</strong>.<br />
Veja-se a discussão recente sobre<br />
a lei das rendas e, muito em<br />
particular, o potencial aumento<br />
que as mesmas vão sofrer em<br />
função do rendimento d<strong>os</strong> inquilin<strong>os</strong><br />
(com as salvaguardas<br />
previstas para <strong>os</strong> inquilin<strong>os</strong> id<strong>os</strong><strong>os</strong>,<br />
por exemplo). Ao mesmo<br />
tempo levantam-se as vozes de<br />
apoio e contra o atual regime<br />
d<strong>os</strong> despej<strong>os</strong>.<br />
É certo que, neste momento,<br />
existe uma conjugação de fatores<br />
que complicam, ainda mais,<br />
uma análise objetiva do problema:<br />
Portugal, de repente, tornou-se<br />
um destino privilegiado<br />
para quadr<strong>os</strong> empresariais e<br />
reformad<strong>os</strong> estrangeir<strong>os</strong>, a que<br />
não será alheio o regime fiscal<br />
d<strong>os</strong> residentes não habituais,<br />
e para pessoas que procuram<br />
acesso ao Espaço Schengen<br />
muitas vezes com recurso ao<br />
regime d<strong>os</strong> vist<strong>os</strong> Gold, entre<br />
outr<strong>os</strong> efeit<strong>os</strong>. Ora, a atratividade<br />
do mercado residencial<br />
com preç<strong>os</strong> ainda relativamente<br />
em conta, pelo men<strong>os</strong> quando<br />
comparad<strong>os</strong> com outr<strong>os</strong> países,<br />
o clima e a segurança do n<strong>os</strong>so<br />
país criaram as condições para<br />
uma procura que, frequentemente,<br />
excede a oferta.<br />
Não espanta que se acelerem<br />
<strong>os</strong> process<strong>os</strong> de gentrificação,<br />
a conversão de unidades habitacionais<br />
em hotéis e em alojamento<br />
local e que <strong>os</strong> preç<strong>os</strong>,<br />
tanto para a compra como para o<br />
arrendamento, sofram aument<strong>os</strong><br />
significativ<strong>os</strong>.<br />
Especificamente no que respeita<br />
ao arrendamento, colocam-se<br />
em cima da mesa soluções que<br />
visam aumentar <strong>os</strong> direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />
inquilin<strong>os</strong> e que implicam alterações<br />
à atual lei das rendas.<br />
Outr<strong>os</strong> avançam com alterações<br />
ao regime fiscal no sentido de<br />
dar um incentivo a<strong>os</strong> proprietári<strong>os</strong><br />
para estes poderem, se não<br />
reduzir, pelo men<strong>os</strong> manter, <strong>os</strong><br />
valores das rendas exigidas a<strong>os</strong><br />
inquilin<strong>os</strong>.<br />
Adquirir ou manter um imóvel<br />
destinado a arrendamento<br />
implica cust<strong>os</strong> significativ<strong>os</strong>. O<br />
proprietário adquire o imóvel<br />
e paga IMT, Imp<strong>os</strong>to do Selo e<br />
cust<strong>os</strong> legais e notariais, depois<br />
paga IMI (e, eventualmente, o<br />
adicional ao IMI) e a sua quota<br />
parte n<strong>os</strong> cust<strong>os</strong> do condomínio.<br />
Se decidir arrendar paga IRS<br />
à taxa de 28%.<br />
Não é certo, num contexto de<br />
elevada procura e menor oferta,<br />
que uma solução de dinamização<br />
do arrendamento, leia-se<br />
controlo do valor das rendas ou<br />
aumento da duração d<strong>os</strong> contra-
Tributação do Imobiliário<br />
t<strong>os</strong>, por via de uma redução da<br />
taxa de IRS incidente sobre as<br />
rendas auferidas pel<strong>os</strong> proprietári<strong>os</strong>,<br />
atinja o objetivo prop<strong>os</strong>to.<br />
Tal poupança, naturalmente,<br />
será absorvida, sem qualquer<br />
impacto no valor da renda, pelo<br />
senhorio com vista a compensar<br />
<strong>os</strong> demais cust<strong>os</strong> que tem que<br />
suportar.<br />
Provavelmente, iniciativas como<br />
a que a Câmara Municipal de<br />
Lisboa recentemente apresentou<br />
no sentido de aumentar a oferta,<br />
através da disponibilização<br />
para arrendamento de imóveis<br />
pertencentes ao Estado, em zonas<br />
centrais e a preç<strong>os</strong> controlad<strong>os</strong>,<br />
com eventual prioridade<br />
para id<strong>os</strong><strong>os</strong> e famílias de menor<br />
rendimento, terá um efeito mais<br />
duradouro e efetivo no nivelamento<br />
da oferta e da procura e,<br />
em última instância, d<strong>os</strong> preç<strong>os</strong>.<br />
Pagament<strong>os</strong> por conta<br />
e o setor imobiliário<br />
PEDRO FUGAS<br />
Partner, Tax Services<br />
As entidades que<br />
exercem, a título<br />
principal, atividade<br />
de natureza comercial,<br />
industrial ou agrícola,<br />
bem como as não<br />
residentes com<br />
estabelecimento<br />
estável em Portugal,<br />
têm de proceder ao<br />
pagamento do Imp<strong>os</strong>to<br />
sobre o Rendimento<br />
das Pessoas Coletivas<br />
(“IRC”).<br />
Ou seja:<br />
(i) Em 3 pagament<strong>os</strong> por conta<br />
(“PC”), com vencimento até 31<br />
de julho, 30 de setembro e 15 de<br />
dezembro (ou se adotarem um<br />
período fiscal diferente do ano<br />
civil, até ao final d<strong>os</strong> 7.º e 9.º<br />
meses e dia 15 do 12.º mês);<br />
(ii) Até 31 de maio (ou se adotarem<br />
um período fiscal diferente<br />
do ano civil, até ao final do 5.º<br />
mês) do ano seguinte, pela diferença<br />
que existir entre o IRC total<br />
calculado na sua declaração de<br />
rendiment<strong>os</strong> e <strong>os</strong> PC realizad<strong>os</strong>.<br />
Os PC são calculad<strong>os</strong> com base<br />
em 80% ou 95% do IRC liquidado<br />
pelo sujeito passivo no período<br />
de tributação imediatamente<br />
anterior àquele a que se devam<br />
realizar esses PC (líquid<strong>os</strong> de retenções<br />
na fonte sofridas nesse<br />
período), consoante o seu volume<br />
de negóci<strong>os</strong> nesse mesmo<br />
período seja igual ou inferior a<br />
€500.000 ou superior a este valor,<br />
respetivamente.<br />
Se o sujeito passivo verificar, pel<strong>os</strong><br />
element<strong>os</strong> de que disponha,<br />
que o PC já efetuado é igual ou<br />
superior ao imp<strong>os</strong>to que será<br />
devido com base na matéria coletável<br />
do período de tributação,<br />
pode deixar de efetuar o 3.º PC.<br />
Ora, muit<strong>os</strong> grup<strong>os</strong> económic<strong>os</strong><br />
que operam no setor imobiliário<br />
esgotam a atividade das sociedades<br />
que constituem (com o<br />
propósito específico de desenvolverem<br />
e promoverem um projeto<br />
imobiliário específico) num<br />
determinado período de tributação<br />
(relativamente ao qual pagam<br />
<strong>os</strong> seus imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>) e vêm-se<br />
obrigad<strong>os</strong> a manter essas mesmas<br />
sociedades, sem qualquer<br />
operação ou geração de rendimento,<br />
durante um ou mais an<strong>os</strong><br />
após terminarem a sua atividade,<br />
por divers<strong>os</strong> motiv<strong>os</strong>. Entre<br />
esses motiv<strong>os</strong> refira-se, a título<br />
de exemplo, questões de garantia<br />
de obra, direito a reembolso<br />
de IMT no âmbito de projeto de<br />
reabilitação urbana (cujo direito<br />
depende do reconhecimento<br />
municipal, o que, em term<strong>os</strong><br />
prátic<strong>os</strong>, pode demorar mais de<br />
um ano), reembols<strong>os</strong> de IVA, entre<br />
outr<strong>os</strong>.<br />
Atendendo ao acima exp<strong>os</strong>to,<br />
as sociedades acima referidas<br />
que tenham esgotado a sua<br />
atividade em 2018 e pago o seu<br />
IRC em maio de 2019 (aquando<br />
da submissão da respetiva declaração<br />
anual de rendiment<strong>os</strong><br />
Modelo 22), ainda que não tenham<br />
qualquer atividade nem<br />
venham a registar qualquer<br />
rendimento em 2019, mas que<br />
não p<strong>os</strong>sam ser liquidadas,<br />
101
Tributação do Imobiliário<br />
pel<strong>os</strong> motiv<strong>os</strong> acima indicad<strong>os</strong><br />
(entre outr<strong>os</strong>), antes do final<br />
de julho ou setembro de 2019,<br />
terão, ainda assim, de realizar<br />
<strong>os</strong> 1.º e 2.º PC em 2019 com<br />
base no IRC que pagaram por<br />
referência a 2018. Não obstante<br />
estes PC poderem ser reembolsad<strong>os</strong><br />
no ano seguinte, aquando<br />
da submissão da respetiva<br />
declaração anual de rendiment<strong>os</strong><br />
(i.e. em maio de 2020), estas<br />
sociedades vêm-se obrigadas<br />
a dispor de fund<strong>os</strong> para pagar<br />
um imp<strong>os</strong>to que não seá devido<br />
em term<strong>os</strong> finais, sem que<br />
p<strong>os</strong>sam limitar esses mesm<strong>os</strong><br />
PC, o que despoleta problemas<br />
de tesouraria para <strong>os</strong> grup<strong>os</strong><br />
económic<strong>os</strong> que operam em<br />
Portugal neste setor específico<br />
de atividade. Neste sentido, faria<br />
algum sentido que para cas<strong>os</strong><br />
particulares como este que<br />
se acabou de descrever que o<br />
legislador pudesse ponderar a<br />
introdução de uma regra que<br />
permitisse limitar a realização<br />
d<strong>os</strong> 1.º e 2.º PC, à semelhança<br />
do que já ocorre para o 3.º PC.<br />
Penalização da manutenção<br />
de imóveis devolut<strong>os</strong> em<br />
zonas de pressão urbanística<br />
102<br />
RICARDO CORREIA<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
As alterações<br />
que se têm vindo<br />
a observar, ao nível<br />
do enquadramento<br />
do Imp<strong>os</strong>to Municipal<br />
sobre Imóveis (IMI),<br />
afiguram-se com<br />
enorme relevância tanto<br />
para <strong>os</strong> contribuintes<br />
como para as<br />
autarquias.<br />
Entre estas, conta-se a título de<br />
exemplo, as alterações, do prazo<br />
de liquidação, d<strong>os</strong> valores a partir<br />
d<strong>os</strong> quais <strong>os</strong> pagament<strong>os</strong> podem<br />
ser fracionad<strong>os</strong>, do aumento do<br />
valor do metro quadrado incluído<br />
na determinação do Valor Patrimonial<br />
Tributário (VPT), sobre o<br />
qual recai a taxa do IMI.<br />
Neste contexto, e mais recentemente,<br />
o Decreto-Lei n.º 67/2019,<br />
de 21 de maio, veio contemplar<br />
também a p<strong>os</strong>sibilidade de as<br />
autarquias agravarem a taxa do<br />
IMI em vigor para <strong>os</strong> imóveis devolut<strong>os</strong>.<br />
Este novo diploma legal veio introduzir<br />
diversas novidades, em<br />
primeiro lugar, pela alteração ao<br />
Código do IMI (aprovado pelo<br />
Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12<br />
de novembro), p<strong>os</strong>sibilitando às<br />
autarquias elevar ao sêxtuplo<br />
as taxas do imp<strong>os</strong>to em vigor,<br />
e agravarem em 10% por cada<br />
ano subsequente, <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong><br />
urban<strong>os</strong> ou frações autónomas<br />
devolut<strong>os</strong> há mais de dois an<strong>os</strong>.<br />
Recorde-se que as autarquias<br />
apenas podiam elevar para o triplo<br />
as taxas do IMI em vigor para<br />
<strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> urban<strong>os</strong> que estivessem<br />
devolut<strong>os</strong> há mais de um ano.<br />
Em segundo lugar, veio alterar o<br />
Decreto-Lei nº 159/2006 de 8 de<br />
ag<strong>os</strong>to, de forma a melhor caracterizar<br />
o conceito de prédio<br />
devoluto, para efeit<strong>os</strong> da aplicação<br />
da taxa do IMI. Neste sentido,<br />
passa a considerar-se como<br />
devoluto, não só <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> que<br />
não p<strong>os</strong>suam contrat<strong>os</strong> de fornecimento<br />
de água e eletricidade,<br />
mas também <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong>, onde<br />
se verifique, cumulativamente,<br />
consum<strong>os</strong> de água e eletricidade<br />
reduzid<strong>os</strong> (não excedendo<br />
em um ano, 7 m3 para água e 35<br />
kWh para eletricidade). De notar,<br />
que se mantém a atribuição da<br />
classificação de devoluto pela<br />
autarquia, após vistoria, onde se<br />
avaliam <strong>os</strong> indíci<strong>os</strong> e as exceções<br />
previstas no novo diploma legal<br />
(as quais também foram ampliadas<br />
na revisão agora efetuada).<br />
Em terceiro lugar, altera-se igualmente<br />
a forma de cooperação<br />
das autarquias com outras entidades,<br />
dado que as empresas<br />
de telecomunicações, de gás, e<br />
eletricidade e água passam a ser<br />
obrigadas a enviar para as autarquias,<br />
até ao dia 1 de outubro
Tributação do Imobiliário<br />
de cada ano, uma lista atualizada<br />
da ausência de contrat<strong>os</strong> de<br />
fornecimento ou de consum<strong>os</strong><br />
baix<strong>os</strong>. Até ao presente momento,<br />
esta informação era disponibilizada<br />
apenas após solicitação<br />
escrita da autarquia (e apenas<br />
referente à existência ou não de<br />
contrat<strong>os</strong> de fornecimento).<br />
Em quarto lugar, estipula-se ainda<br />
que o agravamento das taxas<br />
do IMI para <strong>os</strong> prédi<strong>os</strong> devolut<strong>os</strong><br />
irá circunscrever-se a imóveis localizad<strong>os</strong><br />
em zonas de pressão<br />
urbanística. O conceito de zona<br />
de pressão urbanística passa a<br />
estar associado a zonas de difícil<br />
acesso à habitação, quer pela<br />
falta de oferta, quer pel<strong>os</strong> preç<strong>os</strong><br />
praticad<strong>os</strong> (superior ao suportável<br />
pela generalidade d<strong>os</strong> agregad<strong>os</strong><br />
familiares face a<strong>os</strong> seus<br />
rendiment<strong>os</strong>). A delimitação em<br />
concreto de uma zona de pressão<br />
urbanística irá basear-se em indicadores<br />
objetiv<strong>os</strong> detalhad<strong>os</strong><br />
no Decreto-Lei agora aprovado,<br />
com base n<strong>os</strong> quais, e após prop<strong>os</strong>ta<br />
da autarquia, deve ser aprovada<br />
em assembleia municipal.<br />
De facto, a implementação da<br />
nova legislação vai implicar a<br />
criação ou reforço de competências<br />
das autarquias em term<strong>os</strong><br />
de análise e tratamento de dad<strong>os</strong>,<br />
bem como a adoção de tecnologias<br />
de suporte para a gestão<br />
d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> d<strong>os</strong> imóveis<br />
enquadrad<strong>os</strong> neste contexto.<br />
A exigência será elevada, dada<br />
a necessidade de análise e tratamento<br />
de múltipl<strong>os</strong> indicadores<br />
para determinar as zonas<br />
de pressão urbanística, onde <strong>os</strong><br />
imóveis (já cadastrad<strong>os</strong> ou a cadastrar)<br />
devem ser mapead<strong>os</strong>.<br />
Em seguida, deverá ser p<strong>os</strong>sível<br />
receber e analisar uma enorme<br />
quantidade de dad<strong>os</strong> de consumo<br />
de telecomunicações, de gás,<br />
de eletricidade e água, d<strong>os</strong> vári<strong>os</strong><br />
operadores, respeitantes a<strong>os</strong> vári<strong>os</strong><br />
imóveis, e ter capacidade<br />
de despoletar vistorias e agregar<br />
dad<strong>os</strong> inerentes às mesmas<br />
(que vão refletir um conjunto de<br />
parâmetr<strong>os</strong> e exceções de acordo<br />
com a lei, que permitirá uma<br />
tomada de decisão objetiva). Por<br />
último, deve ser considerada a<br />
integração com <strong>os</strong> process<strong>os</strong> de<br />
notificações do sujeito passivo<br />
do IMI, bem como de outr<strong>os</strong> process<strong>os</strong><br />
já existentes de suporte à<br />
gestão d<strong>os</strong> imóveis da autarquia.<br />
A adoção ou reforço de tecnologia<br />
e process<strong>os</strong> de gestão enquadrad<strong>os</strong><br />
neste contexto assume<br />
uma natureza crítica, para<br />
garantir às autarquias maior<br />
eficiência e eficácia, tanto mais<br />
que o IMI é um d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
fundamentais e que mais receita<br />
gera para as autarquias.<br />
Por outro lado, <strong>os</strong> contribuintes,<br />
decorrente de todas as alterações<br />
que têm vindo a ocorrer,<br />
também devem proceder de forma<br />
regular a uma avaliação das<br />
várias condicionantes que afetam<br />
o VPT e o IMI d<strong>os</strong> seus imóveis.<br />
E tal como nas autarquias,<br />
a necessidade de adoção de tecnologias<br />
e de nov<strong>os</strong> process<strong>os</strong><br />
orientad<strong>os</strong> à gestão é proporcional<br />
à quantidade de imóveis que<br />
dispõem e gerem.<br />
Compra para revenda<br />
em IMI: Vent<strong>os</strong> de mudança<br />
no horizonte?<br />
TIAGO ROSA<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
A tenacidade admirável<br />
do esforço português<br />
para colocar Portugal<br />
na vanguarda do<br />
investimento imobiliário<br />
é, indiscutivelmente,<br />
admirada pel<strong>os</strong><br />
investidores internacionais<br />
e amplamente aplaudida<br />
pela indústria.<br />
Não obstante, o período de<br />
graça que se vive atualmente<br />
ao nível deste setor em particular<br />
torna-o, por vezes, um<br />
alvo apetecível no que se refere<br />
ao ímpeto de arrecadação de<br />
receitas públicas por parte da<br />
Autoridade Tributária e Aduaneira<br />
(“AT”).<br />
Com efeito, de um ponto de<br />
vista fiscal, tem<strong>os</strong> assistido, recentemente,<br />
a uma atividade<br />
legiferante no sentido, por um<br />
lado, do agravamento da carga<br />
tributária incidente sobre <strong>os</strong><br />
operadores do mercado imobiliário<br />
português (e.g., criação do<br />
Adicional ao Imp<strong>os</strong>to Municipal<br />
sobre <strong>os</strong> Imóveis ou “Adicional<br />
ao IMI”) e, por outro, da restrição<br />
do acesso a alguns incentiv<strong>os</strong><br />
fiscais destinad<strong>os</strong> à atração e<br />
potencialização do investimento<br />
imobiliário (e.g.. a restrições práticas<br />
no acesso a<strong>os</strong> benefíci<strong>os</strong><br />
fiscais aplicáveis à reabilitação<br />
103
Tributação do Imobiliário<br />
104<br />
urbana decorrentes da aprovação<br />
da Lei de Orçamento do Estado<br />
para 2018).<br />
Na sequência da recente publicação<br />
de uma resp<strong>os</strong>ta a um<br />
pedido de informação vinculativa<br />
(“PIV”) relativo à cláusula<br />
de caducidade constante do<br />
artigo 9.º, n.º 2, do Código do<br />
IMI, constata-se que o paradigma<br />
subjacente às alterações legislativas<br />
acima mencionadas<br />
é, igualmente, acompanhado<br />
por uma interpretação cada vez<br />
mais restritiva por parte da AT<br />
no que se refere a<strong>os</strong> incentiv<strong>os</strong><br />
fiscais atualmente existentes.<br />
Em term<strong>os</strong> concret<strong>os</strong>, <strong>os</strong> entendiment<strong>os</strong><br />
veiculad<strong>os</strong> pela AT no<br />
âmbito da resp<strong>os</strong>ta ao PIV sub<br />
judice respeitam a duas questões<br />
relacionadas com a referida<br />
cláusula de caducidade<br />
constante do Código do IMI:<br />
l Em que term<strong>os</strong> o arrendamento<br />
de imóveis adquirid<strong>os</strong><br />
para revenda espoleta o fim da<br />
aplicação da suspensão temporária<br />
do IMI? Mediante verificação<br />
do pressup<strong>os</strong>to de “destino<br />
diferente” constante da cláusula<br />
de caducidade constante do<br />
preceito em referência?<br />
l Em que term<strong>os</strong> <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> se encontram vinculad<strong>os</strong><br />
à manutenção da afetação<br />
d<strong>os</strong> imóveis adquirid<strong>os</strong> para<br />
revenda a este destino? Em<br />
momento ulterior à caducidade<br />
natural da suspensão temporária<br />
do IMI aplicável com relação<br />
a imóveis adquirid<strong>os</strong> para revenda<br />
(i.e., findo o período de<br />
três an<strong>os</strong>)?<br />
Relativamente à primeira das<br />
questões identificadas, a AT<br />
pronunciou-se no sentido de<br />
que o arrendamento de prédi<strong>os</strong><br />
urban<strong>os</strong> adquirid<strong>os</strong> para revenda<br />
apenas determina a caducidade<br />
da suspensão temporária<br />
do IMI, quando: (i) <strong>os</strong> imóveis<br />
deixem de estar contabilizad<strong>os</strong><br />
no inventário do sujeito passivo;<br />
e (ii) este arrendamento<br />
não assuma uma natureza precária,<br />
transitória e conjuntural,<br />
vigorando contratualmente por<br />
um período de tempo superior<br />
àquele em que seja aplicável<br />
esta suspensão temporária.<br />
Ao contrário do requisito relativo<br />
à contabilização do imóvel<br />
que não encerra em si qualquer<br />
novidade ou alteração face ao<br />
quadro vigente à data do PIV<br />
em análise, a natureza precária<br />
d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> de arrendamento<br />
eventualmente existentes consubstancia<br />
uma novidade interpretativa,<br />
sem qualquer correspondência<br />
legal, e desprovida<br />
de substrato face à ratio legis<br />
inerente a este regime.<br />
Por outro lado, no que concerne<br />
à segunda questão, a<br />
AT veio ainda afirmar que o<br />
âmbito temporal do requisito<br />
relativo ao reconhecimento<br />
contabilístico d<strong>os</strong> imóveis em<br />
inventário referido acima ultrapassa<br />
aquele correspondente à<br />
própria suspensão temporária,<br />
devendo <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
manter esta afetação contabilística<br />
d<strong>os</strong> imóveis entre <strong>os</strong><br />
moment<strong>os</strong> de aquisição e alienação<br />
do ativo, sob pena de a<br />
AT poder proceder à liquidação<br />
do IMI correspondente a<strong>os</strong> períod<strong>os</strong><br />
de tributação em que vigorou<br />
este benefício fiscal.<br />
Sem prejuízo de <strong>os</strong> entendiment<strong>os</strong><br />
veiculad<strong>os</strong> pela AT no<br />
âmbito desta resp<strong>os</strong>ta apenas<br />
vincularem esta entidade no respeitante<br />
à situação que fundou<br />
este PIV, a circunstância de a<br />
AT poder vir a adotar estes entendiment<strong>os</strong><br />
na ponderação do<br />
tratamento fiscal a conceder a<br />
situações substancialmente semelhantes<br />
merece-n<strong>os</strong> algumas<br />
reservas, especialmente em face<br />
da circunstância de não se afigurar<br />
totalmente claro o âmbito de<br />
aplicação temporal d<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong><br />
i.e., se estes devem também ser<br />
considerad<strong>os</strong> para efeit<strong>os</strong> da<br />
ponderação do tratamento fiscal<br />
a conceder, a título de exemplo:<br />
(i) a imóveis adquirid<strong>os</strong> para<br />
revenda que já sejam objeto de<br />
acord<strong>os</strong> de arrendamento por<br />
praz<strong>os</strong> indeterminad<strong>os</strong> ou por<br />
praz<strong>os</strong> superiores a 3 an<strong>os</strong>; ou<br />
(ii) a sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> que, mediante<br />
caducidade da suspensão<br />
temporária de tributação (por<br />
decurso do período de 3 an<strong>os</strong>),<br />
tenham, no passado, procedido a<br />
uma reclassificação contabilística<br />
d<strong>os</strong> imoveis.<br />
Em suma, com este novo desenvolvimento,<br />
parece estar lançado<br />
um “aviso à navegação” no<br />
sentido de uma futura limitação<br />
da aplicabilidade d<strong>os</strong> incentiv<strong>os</strong><br />
fiscais ao mercado português do<br />
imobiliário, recomendando-se,<br />
por parte d<strong>os</strong> contribuintes, por<br />
um lado, prudência na aplicação<br />
destes benefíci<strong>os</strong> e, por outro,<br />
uma abordagem sistemática e<br />
articulada na aplicação d<strong>os</strong> diferentes<br />
regimes fiscais.
Tributação do Imobiliário<br />
Aquisição de imóveis:<br />
o risco oculto d<strong>os</strong> privilégi<strong>os</strong><br />
creditóri<strong>os</strong> fiscais<br />
ANA SOUSA<br />
Manager, Tax Services<br />
A corrida ao mercado<br />
imobiliário continua.<br />
É neste cenário que<br />
se torna imperativa<br />
a abordagem de um<br />
tema já antigo e<br />
pouco comentado: <strong>os</strong><br />
privilégi<strong>os</strong> creditóri<strong>os</strong><br />
imobiliári<strong>os</strong>.<br />
Tal como previsto no artigo 733.º<br />
do Código Civil, “o privilégio creditório<br />
é a faculdade que a lei, em<br />
atenção à causa do crédito, concede<br />
a cert<strong>os</strong> credores, independentemente<br />
do registo, de serem<br />
pag<strong>os</strong> com preferência a outr<strong>os</strong>”.<br />
Assim, e apesar de, regra geral, o<br />
património do devedor constituir<br />
garantia geral d<strong>os</strong> crédit<strong>os</strong> tributári<strong>os</strong>,<br />
no caso d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre o<br />
património (v.g. Imp<strong>os</strong>to Municipal<br />
sobre Imóveis (IMI), Imp<strong>os</strong>to Municipal<br />
sobre a Transmissão Oner<strong>os</strong>a<br />
de Imóveis (IMT) e Imp<strong>os</strong>to<br />
do Selo), são concedid<strong>os</strong> privilégi<strong>os</strong><br />
creditóri<strong>os</strong> especiais que permitem<br />
a extrapolação desta regra.<br />
De uma forma que pode vir a revelar-se<br />
bastante grav<strong>os</strong>a para o<br />
adquirente de um imóvel, o direito<br />
à satisfação tributária do Estado –<br />
enquanto credor fiscal – poderá<br />
acompanhar o bem. Significa isto<br />
que, existindo dívidas de IMT, Imp<strong>os</strong>to<br />
do Selo e IMI relativas a um<br />
determinado imóvel transacionado,<br />
o Estado tem privilégi<strong>os</strong> imobiliári<strong>os</strong><br />
especiais na graduação<br />
d<strong>os</strong> respetiv<strong>os</strong> crédit<strong>os</strong>, ainda que<br />
o atual proprietário do imóvel não<br />
seja o mesmo que incumpriu com<br />
as referidas obrigações fiscais.<br />
Assim, importa salientar que estes<br />
privilégi<strong>os</strong> não só passam a ser<br />
oponíveis a terceir<strong>os</strong> que adquiram<br />
<strong>os</strong> imóveis, ou o direito real<br />
sobre <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>, como ainda<br />
podem ser preferenciais face a<br />
outr<strong>os</strong> crédit<strong>os</strong>.<br />
Tais obrigações estão naturalmente<br />
dependentes da verificação de<br />
um conjunto de requisit<strong>os</strong>, uma<br />
vez que <strong>os</strong> credores têm de reclamar<br />
<strong>os</strong> referid<strong>os</strong> crédit<strong>os</strong> em meio<br />
próprio e dentro de determinad<strong>os</strong><br />
praz<strong>os</strong>. Não obstante, esta é uma<br />
temática que tem sido descurada<br />
no âmbito das transações imobiliárias<br />
e para a qual deverá ser<br />
dada especial atenção tendo em<br />
consideração o atual contexto<br />
económico.<br />
Relativamente à classificação da<br />
tipologia de crédit<strong>os</strong> têm surgido<br />
divergentes entendiment<strong>os</strong>. Sendo<br />
certo que <strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre<br />
o património gozam de privilégio<br />
imobiliário especial, estando <strong>os</strong><br />
mesm<strong>os</strong> reconhecid<strong>os</strong> no Código<br />
Civil e n<strong>os</strong> respetiv<strong>os</strong> Códig<strong>os</strong> fiscais,<br />
o mesmo não sucede com <strong>os</strong><br />
restantes imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>.<br />
Apesar da controvérsia do tema<br />
e da discussão existente ao nível<br />
do tipo de privilégio conferido<br />
a<strong>os</strong> crédit<strong>os</strong> de Imp<strong>os</strong>to sobre o<br />
Rendimento das Pessoas Coletivas<br />
(IRC), Imp<strong>os</strong>to sobre o Rendimento<br />
das Pessoas Singulares e de contribuições<br />
para a Segurança Social,<br />
a verdade é que o Código Civil e<br />
<strong>os</strong> respetiv<strong>os</strong> diplomas legais não<br />
reconhecem a existência de privilégi<strong>os</strong><br />
imobiliári<strong>os</strong> especiais, mas<br />
sim, privilégi<strong>os</strong> imobiliári<strong>os</strong> gerais.<br />
Neste cenário, o dever contributivo<br />
não deverá ser oponível a terceir<strong>os</strong><br />
que adquiram <strong>os</strong> imóveis.<br />
Sem prejuízo e sendo certo que<br />
<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> sobre o património<br />
não fogem às regras previstas n<strong>os</strong><br />
privilégi<strong>os</strong> imobiliári<strong>os</strong> especiais,<br />
a análise de contingências/risc<strong>os</strong><br />
fiscais no âmbito da aquisição de<br />
imóveis não deverá ser men<strong>os</strong> prezada,<br />
devendo, ao invés ser alvo de<br />
uma atenção cuidada, atendendo<br />
à dimensão do risco que pode potencialmente<br />
envolver.<br />
105
Tributação do Imobiliário<br />
Municípi<strong>os</strong>, Imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
& outras novidades<br />
106<br />
Ana Chacim<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
O ano de 2019 aguarda<br />
ainda as habituais<br />
prop<strong>os</strong>tas para<br />
aprovação em sede<br />
de Orçamento do<br />
Estado, às quais se<br />
juntarão as novidades<br />
recentemente trazidas<br />
pela Lei n.o 51/2018,<br />
16.08, pela introdução<br />
de alterações ao<br />
regime financeiro<br />
das autarquias locais<br />
e das entidades<br />
intermunicipais, bem<br />
como ao Código do<br />
Imp<strong>os</strong>to Municipal<br />
sobre Imóveis (IMI).<br />
No campo tributário, o referido<br />
diploma vem alargar o elenco<br />
das receitas municipais ao<br />
produto da cobrança de contribuições,<br />
designadamente em<br />
matéria de proteção civil. Recorde-se<br />
que o atual quadro jurídico<br />
prevê apenas a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de <strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> cobrarem taxas<br />
pela prestação de serviç<strong>os</strong> em<br />
matéria de prevenção de risc<strong>os</strong><br />
e proteção civil, cuj<strong>os</strong> contorn<strong>os</strong><br />
no respetivo desenho levariam,<br />
potencialmente, a um juízo de<br />
inconstitucionalidade relativamente<br />
às taxas municipais de<br />
Vila Nova de Gaia, Lisboa e Setúbal.<br />
Feita a sinalização normativa,<br />
aguarda-se assim a consagração<br />
do regime legal que legitimará<br />
<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> na cobrança de<br />
contribuições. Numa tentativa<br />
de maior conexão territorial<br />
entre a receita municipal e a dinâmica<br />
económica local, a nova<br />
Lei prevê a atribuição do direito<br />
a<strong>os</strong> municípi<strong>os</strong> a uma participação<br />
de 7,5% na receita do IVA<br />
(liquidado) relativo às atividades<br />
económicas de alojamento, restauração<br />
comunicações, eletricidade,<br />
água e gás.<br />
Mas não se pense apenas na<br />
perspetiva de novas receitas e<br />
a sobrecarga com o seu custo. O<br />
inevitável processo de dinamização<br />
económica ao nível local,<br />
acompanhado da tão esperada<br />
descentralização de competências,<br />
compreende várias perspetivas,<br />
devendo assumir-se uma<br />
ação integrada no que respeita<br />
à autonomia e capacitação d<strong>os</strong><br />
govern<strong>os</strong> locais em matéria de<br />
receita e de despesa. Se, por um<br />
lado, é reconhecida a imperatividade<br />
quanto à maior responsabilização<br />
d<strong>os</strong> autarcas na gestão<br />
municipal, norteada por um juízo<br />
de eficiência e economicidade<br />
da despesa pública, por outro,<br />
cabe a<strong>os</strong> mesm<strong>os</strong> alavancar as<br />
potencialidades económicas locais,<br />
recorrendo ao investimento<br />
comunitário existente, mas<br />
também a instrument<strong>os</strong> fiscais.<br />
Veja-se a clarificação efetuada<br />
quanto à criação de taxas municipais<br />
em resp<strong>os</strong>ta ao benefício<br />
económico decorrente d<strong>os</strong> investiment<strong>os</strong><br />
realizad<strong>os</strong>.<br />
Neste sentido, compreende-se a<br />
obrigatoriedade agora introduzida<br />
para aprovação de um regulamento<br />
municipal com a previsão<br />
d<strong>os</strong> critéri<strong>os</strong> e condições para o<br />
reconhecimento das isenções<br />
relativas a<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> municipais.<br />
Numa ótica de racionalização<br />
de despesa pública (fiscal),<br />
mas igualmente para garantia<br />
de igualdade de acesso a<strong>os</strong> incentiv<strong>os</strong><br />
públic<strong>os</strong> (fiscais), promove-se<br />
indubitavelmente uma<br />
maior transparência na atuação<br />
pública municipal. Inclui-se neste<br />
domínio a criação de isenções ou<br />
taxas reduzidas de derrama, sendo<br />
eliminada a habitual taxa reduzida<br />
de derrama para sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> cujo volume de negóci<strong>os</strong><br />
não ultrapasse <strong>os</strong> €150.000,<br />
até à aprovação do referido regulamento.<br />
Sendo exigida a devida<br />
racionalização, salienta-se ainda<br />
a alteração ao Código do IMI, pela<br />
qual se exclui da isenção atribuída<br />
às entidades públicas o “património<br />
imobiliário público sem<br />
utilização”, promovendo e incentivando<br />
a difícil disponibilização<br />
de edifíci<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> que por vezes<br />
se verifica.
Tributação Digital
Tributação Digital<br />
Os desafi<strong>os</strong> da globalização<br />
fiscal num mundo Digital<br />
108<br />
RUI HENRIQUES<br />
Partner, Tax Services<br />
Num ambiente<br />
fiscal global cada<br />
vez mais interligado,<br />
a informação<br />
é amplamente<br />
compartilhada<br />
entre as autoridades<br />
fiscais. Como<br />
se devem preparar<br />
as multinacionais?<br />
Uma multinacional (MN) norte<br />
-americana com uma estrutura<br />
principal na Europa estava a ser<br />
auditada por uma autoridade<br />
fiscal da União Europeia (UE) em<br />
relação à sua estrutura distribuidora<br />
de risco limitado. Meses<br />
mais tarde, a autoridade fiscal<br />
de outro país da UE iniciou uma<br />
auditoria fazendo as mesmas<br />
perguntas e solicitando o mesmo<br />
ajustamento fiscal que a administração<br />
fiscal do primeiro do<br />
país havia solicitado. Coincidência?<br />
Improvável. Uma administração<br />
fiscal terá compartilhado<br />
as suas informações com a outra<br />
antes da auditoria anterior ter<br />
sido finalizada.<br />
Ambiente fiscal global<br />
Bem-vindo ao ambiente fiscal<br />
global, onde a informação fornecida<br />
numa jurisdição fiscal provavelmente<br />
vai estar disponível<br />
noutras no curto prazo.<br />
As MN têm que estar cientes deste<br />
nível de partilha de informações<br />
e compreender que as ações<br />
que realizam num país poderão<br />
potencialmente impactar sua situação<br />
noutr<strong>os</strong> países também.<br />
Um enforcement fiscal agressivo e<br />
maior escrutínio nas fiscalizações<br />
das operações transfronteiriças<br />
têm-se tornado mais comuns n<strong>os</strong><br />
últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, com a Organização<br />
para a Cooperação e Desenvolvimento<br />
Económico (OCDE), a UE e<br />
as autoridades fiscais individuais<br />
a colaborar e compartilhar informações<br />
sobre perfis fiscais das<br />
empresas e sobre tais transações.<br />
O volume de regulamentações e<br />
novas leis fiscais está a aumentar,<br />
impulsionada pelo foco global<br />
no base er<strong>os</strong>ion and profit<br />
shifting (BEPS). O que é novo é<br />
a velocidade com que a informação<br />
fiscal está a ser compartilhada<br />
e o amplo alcance do fluxo de<br />
informações.<br />
Informações de contribuintes podem<br />
agora ser rapidamente partilhadas<br />
com referências cruzadas<br />
e compartilhadas entre govern<strong>os</strong><br />
e autoridades com pouc<strong>os</strong> cliques,<br />
tornando a consistência<br />
uma parte crítica da estratégia<br />
de gestão de risco fiscal de qualquer<br />
empresa. As autoridades fiscais<br />
também estão a reexaminar<br />
transações anteriores através d<strong>os</strong><br />
mei<strong>os</strong> disponíveis hoje, desafiando<br />
estruturas previamente estabelecidas.<br />
Adaptar à velocidade do digital<br />
O aumento do uso de métod<strong>os</strong><br />
digitais pelas autoridades fiscais<br />
globais para recolher e analisar<br />
dad<strong>os</strong> d<strong>os</strong> contribuintes está a<br />
criar nov<strong>os</strong> desafi<strong>os</strong>. As empresas<br />
têm cada vez mais que enviar<br />
eletronicamente uma maior<br />
variedade de dad<strong>os</strong> e a um ritmo<br />
cada vez mais rápido. As autoridades<br />
fiscais utilizam motores<br />
de análise de dad<strong>os</strong> para encontrar<br />
discrepâncias e comparar<br />
dad<strong>os</strong> entre jurisdições e contribuintes,<br />
e tirar conclusões com<br />
base nessas análises.<br />
As empresas são muitas vezes<br />
incapazes de acompanhar o ritmo<br />
ou combinar as tecnologias<br />
digitais que algumas administrações<br />
fiscais utilizam, o que resulta<br />
em submissões de dad<strong>os</strong> men<strong>os</strong><br />
“polidas” e potencialmente<br />
com inconsistências.<br />
Neste novo mundo fiscal transparente,<br />
p<strong>os</strong>suir process<strong>os</strong> desatualizad<strong>os</strong><br />
e inconsistentes pode<br />
aumentar exponencialmente o<br />
risco de litigância com as autoridades<br />
fiscais.<br />
O compliance é crescentemente<br />
mais complexo por requisit<strong>os</strong><br />
de apresentação de dad<strong>os</strong> que<br />
podem variar por país, não só<br />
no formato e tempo para a apresentação,<br />
mas também no âmbito<br />
d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> ou transações<br />
abrangidas. Em alguns cas<strong>os</strong>, as<br />
autoridades fiscais d<strong>os</strong> países<br />
emergentes são muito rápidas<br />
na digitalização, aumentando <strong>os</strong><br />
risc<strong>os</strong> para as MN que têm presença<br />
nessas geografias.<br />
A abordagem global<br />
à gestão de risco fiscal<br />
Num mundo de mudanças tão<br />
rápidas, as MN facilmente podem<br />
perder o controlo da sua própria<br />
política fiscal pois não sabem que<br />
dad<strong>os</strong> têm as autoridades e o que<br />
estas estão a fazer com <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>.<br />
De forma a assegurar o controlo,<br />
é recomendável examinar as<br />
áreas que são suscetíveis de ser<br />
a fonte de maior risco e começar<br />
a desenvolver uma estratégia de
Tributação Digital<br />
gestão de risco fiscal pró-ativa e<br />
globalmente consistente.<br />
As MN precisam saber onde<br />
sua informação está localizada,<br />
quem lida e tem acesso à mesma.<br />
Uma gestão do risco fiscal<br />
centralizada a nível global é<br />
fundamental. Este pode ser um<br />
novo paradigma para <strong>os</strong> grup<strong>os</strong><br />
que têm crescido por meio de<br />
aquisições e que estão habituadas<br />
a gerir o risco fiscal de forma<br />
descentralizada através de suas<br />
entidades locais.<br />
Como as administrações fiscais<br />
se tornam cada vez mais interligadas,<br />
o ritmo da mudança fiscal<br />
é suscetível de acelerar ainda<br />
mais, aumentando o risco de litigância.<br />
A administração fiscal<br />
digital vai “chegar” mais longe, a<br />
partilha de informação formal e<br />
informal vai aumentar, e as iniciativas<br />
bilaterais e multilaterais<br />
para tratamento de dad<strong>os</strong> e resolução<br />
de disputas continuarão<br />
a evoluir.<br />
Action-points<br />
As MN que mudam sua mentalidade<br />
para abordar estas questões<br />
de forma pro-ativa e de uma<br />
forma consistente e estratégica<br />
estarão melhor preparadas para<br />
gerir uma política de planeamento<br />
fiscal global, o risco fiscal<br />
e a litigância que p<strong>os</strong>sa surgir.<br />
Medidas específicas que podem<br />
ser adotadas para uma abordagem<br />
global mais consistente<br />
nesta época digital incluem:<br />
l Implementar um estabelecer<br />
uma estratégia fiscal centralizada<br />
e consistente para o compliance,<br />
planeamento e interações<br />
com as administrações<br />
fiscais a nível global.<br />
l Adotar uma estrutura de governança<br />
corporativa fiscal que documenta<br />
formalmente políticas e<br />
procediment<strong>os</strong> do negócio e fornece<br />
à administração uma clara<br />
visão sobre <strong>os</strong> risc<strong>os</strong> fiscais.<br />
l A revisão de process<strong>os</strong> e a digitalização<br />
do compliance permitirá<br />
uma visibilidade e controlo<br />
sobre <strong>os</strong> dad<strong>os</strong> multi-jurisdição<br />
que facilitará tremendamente a<br />
gestão de risco e a capacidade<br />
de otimização fiscal.<br />
l Utilizar plataformas digitais e<br />
process<strong>os</strong> de workflow para gerir<br />
de forma consistente a litigância<br />
fiscal a nível multi-jurisdicional<br />
em curso e potenciais, de uma<br />
forma estratégica. Desenvolver<br />
um plano que define as circunstâncias<br />
em que as disputas serão<br />
resolvidas, argumentação<br />
utilizada atentas as diferentes<br />
regras nas jurisdições em que<br />
tais transações se verificam.<br />
Estratégia de transformação<br />
digital da função fiscal:<br />
já definiu a sua?<br />
RUI HENRIQUES<br />
Partner, Tax Services<br />
Digitalização, RPA,<br />
Cloud, Big Data, são<br />
tod<strong>os</strong> term<strong>os</strong> que<br />
estão na moda e que<br />
fica bem utilizar numa<br />
conversa em contexto<br />
de negócio.<br />
Mas até que ponto <strong>os</strong> intervenientes<br />
da função fiscal (e financeira)<br />
estão efetivamente<br />
conscientes do que tudo isto<br />
significa, do impacto para a sua<br />
organização e do que é necessário<br />
fazer acontecer e como? Até<br />
que ponto <strong>os</strong> responsáveis da<br />
função fiscal estão preparad<strong>os</strong><br />
para uma mudança exponencial?<br />
Nesta era de transformação digital<br />
o conceito de “business as<br />
usual” está ultrapassado.<br />
O mundo em que trabalham<strong>os</strong><br />
nunca mais será o mesmo, e as<br />
competências necessárias são<br />
muito diferentes. A função fiscal<br />
será assegurada cada vez mais<br />
por sistemas, automatism<strong>os</strong>,<br />
gerid<strong>os</strong> por profissionais com<br />
competências de IT, e as competências<br />
que são exigidas àqueles<br />
que hoje asseguram a função<br />
fiscal são conhecimento, criatividade<br />
e capacidade de colaboração<br />
com aqueles que gerem <strong>os</strong><br />
sistemas.<br />
Num mundo em que tudo está<br />
interligado, em que a excelência<br />
é cada vez mais um padrão, em<br />
que a performance já é muito<br />
elevada e será ainda mais, só há<br />
um fator diferenciador para inovar:<br />
nós human<strong>os</strong>!<br />
O que era ficção científica já não<br />
é ficção na função fiscal, e são<br />
109
Tributação Digital<br />
110<br />
as Administrações Tributárias<br />
(AT’s) que estão a dinamizar esta<br />
era de transformação da função<br />
fiscal.<br />
A transformação digital da função<br />
fiscal já é uma realidade<br />
que será muito mais abrangente<br />
em pouco tempo (men<strong>os</strong> de 10<br />
an<strong>os</strong> certamente), e facilitada<br />
pelas AT’s, vislumbrando-se a<br />
oportunidade de quem tem o<br />
conhecimento fiscal usá-lo em<br />
benefício das suas organizações<br />
e demonstrando que a função<br />
fiscal é geradora de valor na organização.<br />
Face a este contexto, urge que<br />
as empresas portuguesas façam<br />
uma auto-avaliação do que é<br />
necessário fazer para recuperar<br />
o tempo perdido com inércia,<br />
e atuar rápido. O adiamento só<br />
vai trazer disrupção. Disrupção<br />
porque a AT já tem e está a aumentar<br />
muito rapidamente a<br />
sua capacidade de automatizar<br />
o compliance, de analisar dad<strong>os</strong><br />
massivamente, e por isso, a capacidade<br />
de auditar as empresas<br />
será muito maior em pouco tempo.<br />
O paradigma é informação<br />
em tempo real.<br />
E as organizações que não tiverem<br />
capacidade de dar resp<strong>os</strong>ta<br />
a esta enorme capacidade da AT<br />
terão um tornado a entrar pela<br />
porta que se traduzirá em litigância,<br />
desfoco e cash-out. Ou<br />
seja, se existe uma oportunidade<br />
de demonstrar que a função fiscal<br />
pode ser geradora de valor, a<br />
inércia vai evidenciar que a função<br />
fiscal é destruidora de valor.<br />
Mas como agarrar a transformação<br />
digital? O que é a transformação<br />
digital? Vam<strong>os</strong> automatizar<br />
alguns process<strong>os</strong>?<br />
Não. A transformação digital de<br />
uma organização exige uma estratégia.<br />
Não se resume a robotizar<br />
um processo de preenchimento<br />
de uma declaração fiscal.<br />
É muito mais do que isso.<br />
A transformação digital da função<br />
fiscal exige que se compreendam<br />
as necessidades de<br />
negócio, dentro e fora da organização,<br />
que se desafiem <strong>os</strong> process<strong>os</strong><br />
da área financeira e fiscal<br />
end-to-end, que se adaptem ao<br />
ambiente regulatório e à estratégia<br />
fiscal da organização, que<br />
se capacitem <strong>os</strong> profissionais, e<br />
mais.<br />
São três <strong>os</strong> vetores principais da<br />
transformação digital da função<br />
fiscal: process<strong>os</strong>, tecnologia e<br />
pessoas.<br />
E a transformação digital mais<br />
não é (simplisticamente) que a<br />
revisão e otimização d<strong>os</strong> process<strong>os</strong>,<br />
e a aplicação de tecnologia<br />
sobre <strong>os</strong> mesm<strong>os</strong>. Que tecnologia?<br />
Depende da realidade<br />
de cada empresa. Tipicamente,<br />
passará pela agregação de diferentes<br />
soluções tecnológicas<br />
que permitam estruturar dad<strong>os</strong>,<br />
automatizar <strong>os</strong> process<strong>os</strong>, visualizar<br />
a informação processada,<br />
fazer interagir diversas plataformas.<br />
E são as pessoas que farão a<br />
diferença. Têm que antes de<br />
mais ajustar-se a esta realidade.<br />
Deixar de viver em negação ou<br />
achar que tudo isto faz parte do<br />
futuro. O futuro começou ontem.<br />
E esta realidade não implicará<br />
certamente a perda do p<strong>os</strong>to<br />
de trabalho para tod<strong>os</strong> aqueles<br />
que demonstrem ter a iniciativa<br />
e capacidade de “surfar esta<br />
onda”. Colaborar com element<strong>os</strong><br />
da organização que têm as<br />
competências tecnológicas e dar<br />
utilidade a todo o conhecimento<br />
acumulado, ajudando a transpor<br />
o mesmo para <strong>os</strong> sistemas e fortalecendo<br />
a sua organização. E<br />
sendo criativo na forma de correlacionar<br />
<strong>os</strong> dad<strong>os</strong> processad<strong>os</strong><br />
automaticamente com o objetivo<br />
de criar novas dimensões de<br />
análise de dad<strong>os</strong> que até aqui<br />
não eram usad<strong>os</strong>.<br />
Pronto para a transformação?<br />
Quer controla-la ou ser controlado?<br />
Nada acontece gradualmente.<br />
O futuro não acontece por<br />
inerência do passar do tempo. O<br />
futuro som<strong>os</strong> nós que o fazem<strong>os</strong><br />
acontecer. E o valor está na humanidade!
Tributação Digital<br />
Como pode a função fiscal<br />
criar valor na era digital?<br />
RUI HENRIQUES<br />
Partner, Tax Services<br />
Num contexto de<br />
crescente exigência<br />
de transparência,<br />
as autoridades<br />
fiscais têm vindo<br />
a criar plataformas<br />
sofisticadas de<br />
captura de dad<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />
contribuintes que lhes<br />
permitam o cruzamento<br />
de informação. E o<br />
fluxo de informação<br />
que as empresas têm<br />
que partilhar com<br />
as autoridades está<br />
a atingir níveis sem<br />
precedentes como<br />
resulta, por exemplo,<br />
das obrigações de<br />
Country by Country<br />
Report (CbCR).<br />
Com um novo nível de escrutínio,<br />
as empresas - e especialmente<br />
a função fiscal – devem identificar<br />
de forma clara a informação<br />
que tem que ser partilhada [por<br />
exemplo, através do Standard Audit<br />
File for Tax Purp<strong>os</strong>es (SAF-T)],<br />
ter total confiança na qualidade<br />
dessa informação e que a mesma<br />
está devidamente estruturada.<br />
O desafio<br />
As empresas estão cada vez mais<br />
obrigadas a partilhar faturas de<br />
clientes, volumes de mercadorias<br />
transacionadas, demonstrações<br />
financeiras, faturas de fornecedores<br />
e registr<strong>os</strong> bancári<strong>os</strong>, tudo<br />
em format<strong>os</strong> especificad<strong>os</strong> pela<br />
autoridade tributária, que por<br />
sua vez está a usar aplicações de<br />
análise de dad<strong>os</strong> para validar faturas<br />
e identificar discrepâncias,<br />
verificar as declarações de vendas<br />
e compras, e comparar dad<strong>os</strong><br />
entre jurisdições e contribuintes.<br />
O que significa para as empresas?<br />
Para assegurar o compliance com<br />
estas exigências e ficar um passo<br />
à frente, a função fiscal tem necessariamente<br />
que potenciar as<br />
suas capacidades de data analytics<br />
e repensar como recolher,<br />
tratar e analisar <strong>os</strong> dad<strong>os</strong>.<br />
O que fazer?<br />
Esta é a oportunidade da função<br />
fiscal gerar valor e mitigar <strong>os</strong> risc<strong>os</strong><br />
nesta era Digital, mediante<br />
a adoção de medidas que assegurem<br />
uma adequada gestão de<br />
toda a informação que é gerada<br />
e partilhada com as autoridades.<br />
Esta é a oportunidade de gerir de<br />
forma eficaz o risco fiscal, reduzir<br />
interações com autoridades e<br />
litigância e, consequentemente,<br />
cust<strong>os</strong>/perseverar valor da organização.<br />
Por isso é altamente recomendável<br />
que as empresas:<br />
l validem o compliance formal e<br />
material d<strong>os</strong> ficheir<strong>os</strong> SAF-T;<br />
l testem a inexistência de discrepâncias<br />
entre <strong>os</strong> dad<strong>os</strong> incluíd<strong>os</strong><br />
n<strong>os</strong> ficheir<strong>os</strong> SAF-T com<br />
a informação contabilística e com<br />
<strong>os</strong> model<strong>os</strong> declarativ<strong>os</strong> fiscais<br />
entregues - atenuando <strong>os</strong> risc<strong>os</strong><br />
à medida que <strong>os</strong> problemas são<br />
detetad<strong>os</strong>.<br />
Informação é poder. Falta de<br />
controlo sobre a informação,<br />
desconhecimento da informação<br />
partilhada, é uma desvantagem<br />
competitiva com consequências<br />
inesperadas. Assegurando<br />
a harmonização da informação<br />
partilhada com as autoridades,<br />
bem como a quantidade (apenas<br />
a necessária) e qualidade d<strong>os</strong><br />
dad<strong>os</strong>, coloca as empresas num<br />
patamar de equilíbrio em qualquer<br />
discussão.<br />
Informação é conhecimento. A<br />
digitalização facilita o processo<br />
de transformar informação em<br />
conhecimento, e no que respeita<br />
à função fiscal, permite às<br />
empresas monitorizar indicadores-chave<br />
como a taxa efetiva de<br />
tributação ou as necessidades<br />
de tesouraria para pagamento<br />
de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, potenciar poupanças<br />
fiscais que permitam libertar<br />
excedentes para determinad<strong>os</strong><br />
investiment<strong>os</strong>. Na verdade, a<br />
“função fiscal” gera valor acrescentado<br />
para a organização, assumindo-se<br />
como um ativo estratégico.<br />
111
Tributação Digital<br />
Uma visão sobre as<br />
exigências futuras das<br />
empresas do setor TMT<br />
112<br />
RUI HENRIQUES<br />
Partner, Tax Services<br />
Num contexto de<br />
significativa disrupção e<br />
incerteza, as empresas<br />
são desafiadas<br />
a antecipar como será<br />
o futuro e qual será<br />
o seu impacto.<br />
O dilema é indiscutivelmente<br />
maior para as empresas do setor<br />
de tecnologia, media e telecomunicações<br />
(TMT), que lidera<br />
a disrupção, mas que está também<br />
permanentemente exp<strong>os</strong>to<br />
à ameaça de entrada de novas<br />
entidades disruptivas.<br />
Em acréscimo, a tecnologia 5G<br />
permitirá criar nov<strong>os</strong> model<strong>os</strong><br />
de negóci<strong>os</strong> e p<strong>os</strong>sibilidades<br />
quase infinitas para as empresas<br />
TMT, o que no mínimo, irá permitir<br />
que a internet p<strong>os</strong>sa ser acedida<br />
em mais lugares e por mais<br />
pessoas do que nunca.<br />
Para pr<strong>os</strong>perar num mundo cada<br />
vez mais conectado, as empresas<br />
TMT precisam investir na tecnologia<br />
5G e noutras inovações<br />
avançadas, incluindo inteligência<br />
artificial, blockchain, cloud,<br />
IoT e RPA. Para ter sucesso, estas<br />
tecnologias terão que ser usadas<br />
de formas inovadoras, integrando-as<br />
em plataformas que<br />
forneçam uma base para uma<br />
rápida e robusta capacidade de<br />
tomada de decisões.<br />
Não sabem<strong>os</strong> que produt<strong>os</strong> e<br />
mercad<strong>os</strong> existirão no futuro,<br />
mas isso não é relevante. O sucesso<br />
não reside em saber que<br />
produt<strong>os</strong> estarem<strong>os</strong> a vender, e<br />
a que clientes, daqui a 10 an<strong>os</strong>.<br />
O fator diferenciador e de sucesso<br />
vai assentar na capacidade<br />
de criar e dispor de plataformas<br />
flexíveis que permitam às empresas<br />
transformar-se em empresas<br />
digitais adaptáveis que conseguem<br />
ter capacidade de rápida<br />
resp<strong>os</strong>ta perante oportunidades<br />
de mercado imprevistas.<br />
No mundo imprevisível de amanhã,<br />
as empresas TMT líderes de<br />
mercado devem:<br />
l Compreender o mercado e as<br />
sensibilidades operacionais de<br />
seus model<strong>os</strong> de negóci<strong>os</strong><br />
l Equipar-se para terem capacidade<br />
de reagir em tempo real às<br />
alterações de mercado<br />
l Usar plataformas interativas e<br />
ec<strong>os</strong>sistemas que lhes permitam<br />
coordenar <strong>os</strong> seus recurs<strong>os</strong> para<br />
uma interação contínua em resp<strong>os</strong>ta<br />
às permanentes e rápidas<br />
exigências de mudança d<strong>os</strong> seus<br />
clientes.<br />
Adaptar <strong>os</strong> model<strong>os</strong> de negócio<br />
às sensibilidades do mercado<br />
Um exemplo pertinente de sensibilidade<br />
ao mercado é o impacto<br />
da mudança demográfica<br />
d<strong>os</strong> clientes sobre as estratégias<br />
de canais e conteúd<strong>os</strong> no setor<br />
de media e entretenimento. Um<br />
estudo recente de EY destaca a<br />
necessidade para que as empresas<br />
acomodem as preferências da<br />
geração cada vez mais tech-savvy<br />
do baby boomer, que tem rendimento<br />
disponível e que tendem a<br />
ser mais leais do que as gerações<br />
mais novas.<br />
Para conseguir isso, as empresas<br />
têm que adotar uma abordagem<br />
orientada e sustentada em dad<strong>os</strong><br />
que permitam entender como as<br />
gerações mais antigas utilizam<br />
a tecnologia, para que p<strong>os</strong>sam<br />
criar experiências personalizadas<br />
n<strong>os</strong> canais cert<strong>os</strong> e desbloquear<br />
enormes oportunidades de crescimento.<br />
Resp<strong>os</strong>ta em tempo real<br />
Há uma série de novas ferramentas<br />
que podem permitir às empresas<br />
TMT a leitura imediata das<br />
necessidades de mercado. Aproveitar<br />
<strong>os</strong> dad<strong>os</strong> gerad<strong>os</strong> nas redes<br />
sociais é um exemplo óbvio,<br />
e plataformas mais inovadoras<br />
surgirão no futuro. É fundamental<br />
que as empresas façam uso das<br />
tecnologias que têm à sua disp<strong>os</strong>ição<br />
e se p<strong>os</strong>icionem nessas<br />
plataformas.<br />
Uma área emergente de oportunidade<br />
é o comércio de conversação<br />
em que as empresas podem<br />
usar chat bots e outr<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong><br />
de chat automatizado para<br />
interagir com <strong>os</strong> consumidores.<br />
O comércio conversacional pode<br />
ser uma ótima maneira de trazer<br />
uma marca para <strong>os</strong> consumidores<br />
e construir uma relação personalizada,<br />
confiável e bidirecional a<br />
longo prazo.<br />
A transformação<br />
exige interação contínua<br />
Não há nenhum ponto final<br />
para a transformação. É um<br />
processo contínuo que requer<br />
interação contínua, em resp<strong>os</strong>ta<br />
às dinâmicas de exigência<br />
d<strong>os</strong> clientes. As empresas<br />
TMT que compreendem isso já<br />
ajustaram suas estratégias de
Tributação Digital<br />
negóci<strong>os</strong> e tecnologia em conformidade.<br />
Por exemplo, algumas entidades<br />
utilizam inteligência artificial (IA)<br />
para transformar as operações de<br />
back-office em centr<strong>os</strong> de suporte<br />
de negóci<strong>os</strong> globais pront<strong>os</strong> para o<br />
futuro. Estas ferramentas de IA vão<br />
evoluir ainda mais, pois melhoram<br />
a sua capacidade de espelhar<br />
a inteligência humana e realizar<br />
análises mais complexas, orçamentação,<br />
tomada de decisões e<br />
planeamento. As empresas vão<br />
tornar-se mais ágeis e mais rápidas<br />
no mercado e poderão responder<br />
às necessidades d<strong>os</strong> seus clientes<br />
melhor e mais rapidamente.<br />
A próxima onda da indústria<br />
Neste momento é incerto antecipar<br />
quais as empresas que serão<br />
<strong>os</strong> gigantes TMT de amanhã.<br />
Na verdade, podem nem existir<br />
ainda. No entanto, uma coisa<br />
que podem<strong>os</strong> ter certeza: serão<br />
empresas digitais adaptativas<br />
que estão predisp<strong>os</strong>tas a reagir<br />
à mudança de comportament<strong>os</strong><br />
d<strong>os</strong> clientes e para aproveitar as<br />
oportunidades de mercado. Para<br />
estas entidades, o planeamento<br />
será um processo fluído e vão<br />
cultivar estratégias operacionais<br />
“plug-and-play” que lhes permitam<br />
fazer ajustament<strong>os</strong> rápid<strong>os</strong>.<br />
Eles também vão atuar em<br />
ec<strong>os</strong>sistemas expansiv<strong>os</strong> e com<br />
tecnologias avançadas que lhes<br />
permitam tomar decisões de negóci<strong>os</strong><br />
impactantes no momento<br />
certo e no lugar certo.<br />
Digitalização da função<br />
fiscal – destruição criativa<br />
Shumpeteriana ou “the<br />
winner takes it all”<br />
PAULO MENDONÇA<br />
Partner, Tax Services<br />
Com o advento<br />
d<strong>os</strong> smartphones,<br />
iniciou-se uma<br />
revolução que,<br />
como normalmente<br />
acontece n<strong>os</strong> process<strong>os</strong><br />
disruptiv<strong>os</strong>, no<br />
início passou algo<br />
desapercebida<br />
para, finalmente,<br />
se consolidar como<br />
algo imparável<br />
e incontornável.<br />
Certas profissões serão mais afetadas<br />
que outras. Sempre foi assim.<br />
A grande diferença é que a<br />
revolução digital atinge em cheio<br />
um reduto que, até há pouco<br />
tempo, de considerava inexpugnável:<br />
as atividades profissionais<br />
de cariz intelectual, mais concretamente<br />
as ligadas à prestação<br />
de serviç<strong>os</strong> profissionais.<br />
Na área da fiscalidade, o processo<br />
tem três intervenientes principais:<br />
a administração fiscal, <strong>os</strong><br />
contribuintes e <strong>os</strong> prestadores<br />
de serviç<strong>os</strong> na área da fiscalidade.<br />
A administração fiscal portuguesa<br />
p<strong>os</strong>sui já uma infraestrutura<br />
digital bastante avançada, que<br />
permite que uma grande parte<br />
das interações relacionadas com<br />
as questões fiscais d<strong>os</strong> contribuintes<br />
seja canalizada por esta<br />
via. À medida que aumenta o<br />
volume de informação disponível<br />
do lado da administração fiscal,<br />
nomeadamente através d<strong>os</strong><br />
mecanism<strong>os</strong> de comunicação<br />
automática de faturas, reportes<br />
de retenções na fonte e outr<strong>os</strong><br />
tip<strong>os</strong> de operações realizadas<br />
com intervenção de instituições<br />
financeiras e outras, aquela coloca-se<br />
numa p<strong>os</strong>ição em que,<br />
não só está cada vez mais capacitada<br />
para controlar a veracidade<br />
das declarações fiscais d<strong>os</strong><br />
contribuintes, mas até para ser<br />
ela própria a propor a estes últim<strong>os</strong><br />
o reporte adequado à sua<br />
situação concreta, como já acontece<br />
hoje em dia, pelo men<strong>os</strong> de<br />
forma parcial, no que respeita às<br />
declarações de IRS.<br />
Os contribuintes, com raras exceções,<br />
vão-se habituando a<br />
controlar a sua situação fiscal<br />
corrente, incluindo <strong>os</strong> temas em<br />
contenci<strong>os</strong>o, com recurso à infraestrutura<br />
digital da administração<br />
fiscal. N<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> em que<br />
<strong>os</strong> process<strong>os</strong> de interação são<br />
113
Tributação Digital<br />
mais complex<strong>os</strong> ou volum<strong>os</strong><strong>os</strong>,<br />
como acontece na certificação<br />
de crédit<strong>os</strong> incobráveis para<br />
efeit<strong>os</strong> de IVA, preenchimento de<br />
certificad<strong>os</strong> de residência e outr<strong>os</strong><br />
formulári<strong>os</strong> ou verificação<br />
da atualização d<strong>os</strong> coeficientes<br />
relativ<strong>os</strong> a<strong>os</strong> valores patrimoniais<br />
tributári<strong>os</strong>, vão querer instituir<br />
rotinas automatizadas que<br />
o permitam fazer com o menor<br />
envolvimento humano p<strong>os</strong>sível<br />
e com um risco mínimo de erro.<br />
Vão ainda querer controlar de<br />
forma imediata o ponto de situação,<br />
no que respeita ao cumprimento<br />
das obrigações fiscais em<br />
Portugal (e noutras jurisdições<br />
onde operam) e estar informad<strong>os</strong><br />
sobre alterações legislativas<br />
que <strong>os</strong> afetem diretamente e das<br />
medidas que podem colocar em<br />
prática visando o seu aproveitamento<br />
(se forem benéficas, como<br />
acontece no caso de regimes<br />
associad<strong>os</strong> a benefíci<strong>os</strong> fiscais,<br />
perdões fiscais, etc.) ou para se<br />
defenderem das mesmas (caso<br />
sejam potencialmente adversas,<br />
como acontecerá no caso de imp<strong>os</strong>ição<br />
de novas obrigações declarativas,<br />
taxas ou contribuições<br />
especiais, etc.).<br />
Os prestadores de serviç<strong>os</strong> profissionais<br />
na área da fiscalidade<br />
vão necessariamente ter que se<br />
adaptar a um novo modelo de<br />
funcionamento e de exigência<br />
por parte d<strong>os</strong> clientes. Terão de<br />
se equipar, na perspetiva d<strong>os</strong><br />
recurs<strong>os</strong> human<strong>os</strong>, adicionado<br />
às suas competências na área<br />
técnica d<strong>os</strong> imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> e nas especializações<br />
por indústrias,<br />
profissionais com uma componente<br />
tecnológica que sejam<br />
capazes de dar resp<strong>os</strong>ta à imediata<br />
necessidade de digitalização<br />
d<strong>os</strong> process<strong>os</strong>, mas que<br />
p<strong>os</strong>suam também as competências<br />
necessárias para entender e<br />
acompanhar <strong>os</strong> desenvolviment<strong>os</strong><br />
associad<strong>os</strong> às duas áreas anteriormente<br />
referidas. Cada vez<br />
mais se aprofundará a dicotomia<br />
entre o trabalho relacionado<br />
com o cumprimento das obrigações<br />
de declarativas e o relacionado<br />
com o aproveitamento<br />
de questões como a confidencialidade,<br />
segurança de dad<strong>os</strong><br />
e compatibilidade de sistemas,<br />
acesso à informação das empresas<br />
e à plataforma digital da administração<br />
fiscal, com vista à recolha,<br />
confirmação e entrega de<br />
element<strong>os</strong> de natureza diversa.<br />
Os leig<strong>os</strong> começam a ter de se<br />
familiarizar com bases de dad<strong>os</strong><br />
(SQL, Mongo DB, …), a existência<br />
de diferentes linguagens de programação<br />
(HTML, PHP, Angular<br />
JS, Ruby on Rails,…), a interoperabilidade<br />
de smartphones com<br />
sistemas operativ<strong>os</strong> Windows,<br />
Android ou IOS, entre outras temáticas.<br />
O próprio legislador será confrontado<br />
com exigências até<br />
agora pouco habituais. O método<br />
tradicional de redação de leis,<br />
pejadas de conceit<strong>os</strong> indeterminad<strong>os</strong>,<br />
normas confusas que remetem<br />
outras criando circuit<strong>os</strong><br />
interpretativ<strong>os</strong> complex<strong>os</strong>, é incompatível<br />
com o novo estado<br />
da arte.<br />
114
Digital e BEPS – Impact<strong>os</strong><br />
no setor industrial<br />
Tributação Digital<br />
PEDRO PAIVA<br />
Partner, Tax Services<br />
O setor industrial<br />
debate-se<br />
atualmente com<br />
um conjunto de<br />
desafi<strong>os</strong> associad<strong>os</strong><br />
a diversas tendências<br />
que decorrem de<br />
um conjunto muito<br />
diversificado de<br />
fatores, que, em<br />
muit<strong>os</strong> cas<strong>os</strong>, estão<br />
ligad<strong>os</strong> ao ambiente<br />
digital que marca<br />
<strong>os</strong> n<strong>os</strong>s<strong>os</strong> dias.<br />
Essas tendências, com algumas diferenças<br />
claras dentro do próprio<br />
setor industrial, vão desde a Indústria<br />
4.0, à necessidade de transformação<br />
de model<strong>os</strong> de negócio<br />
em resultado da digitalização da<br />
economia, a uma aceleração do<br />
número de aquisições por parte<br />
de grup<strong>os</strong> industriais, sobretudo<br />
de empresas tecnológicas que<br />
p<strong>os</strong>sam trazer valor acrescentado,<br />
bem como à manutenção do foco<br />
na inovação para continuar a assegurar<br />
cresciment<strong>os</strong> numa época<br />
em que se perspetiva uma falta de<br />
talento e de recurs<strong>os</strong> adaptad<strong>os</strong> a<br />
estes desafi<strong>os</strong>.<br />
Os divers<strong>os</strong> stakeholders do setor<br />
estão a ser impactad<strong>os</strong> por todas<br />
estas alterações que sucedem a um<br />
ritmo vertigin<strong>os</strong>o e que estão a afetar<br />
todo o ec<strong>os</strong>sistema industrial.<br />
A tecnologia, a economia digital, o<br />
desenvolvimento das comunicações<br />
e a cada vez maior mobilidade<br />
do capital e do trabalho estão a<br />
alterar a forma como toda a cadeia<br />
de produção e distribuição, quer<br />
de entidades domésticas, quer de<br />
grup<strong>os</strong> multinacionais, está organizada.<br />
Por exemplo, no setor automóvel<br />
<strong>os</strong> construtores começam<br />
a adaptar as suas estratégias a um<br />
maior foco na prestação de serviç<strong>os</strong><br />
do que no produto (e.g., em resultado<br />
de nov<strong>os</strong> model<strong>os</strong> de consumo<br />
como o “car sharing”) sofrendo<br />
pressões em divers<strong>os</strong> sentid<strong>os</strong> d<strong>os</strong><br />
própri<strong>os</strong> govern<strong>os</strong> quanto à mobilidade<br />
individual.<br />
Todas estas alterações continuam<br />
a alimentar o debate público que<br />
influenciou a iniciativa BEPS (Base<br />
Er<strong>os</strong>ion and Profit Shifting) da<br />
OCDE. Este debate continua a reflectir<br />
sobre se o enquadramento<br />
fiscal internacional ainda se m<strong>os</strong>tra<br />
adequado a esta nova realidade e<br />
se <strong>os</strong> grup<strong>os</strong> empresariais contribuem<br />
com um nível de “fair share”<br />
de pagamento de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> em<br />
cada jurisdição. A OCDE e a União<br />
Europeia têm tentado contrariar<br />
esta perceção com ações que aumentam<br />
o nível de reporte fiscal<br />
e que reforçam as regras de substância<br />
e de transparência num ambiente<br />
de maior escrutínio.<br />
Paralelamente, e neste âmbito,<br />
há também interesses conflituantes<br />
entre <strong>os</strong> diferentes países que<br />
igualmente afetam o setor industrial.<br />
Os mercad<strong>os</strong> mais madur<strong>os</strong><br />
estão a tentar criar um enquadramento<br />
fiscal que aloque <strong>os</strong> lucr<strong>os</strong><br />
às entidades que inovem e que<br />
sejam responsáveis pela tomada<br />
de decisões estratégicas, enquanto<br />
que <strong>os</strong> mercad<strong>os</strong> emergentes pretender<br />
alocar <strong>os</strong> lucr<strong>os</strong> à produção<br />
e ao consumo. Esta tensão vai criar<br />
ainda maior complexidade e risc<strong>os</strong><br />
do ponto de vista fiscal, dependendo<br />
d<strong>os</strong> mercad<strong>os</strong> em que grup<strong>os</strong><br />
empresariais têm atividade.<br />
Neste contexto, <strong>os</strong> grup<strong>os</strong> empresariais<br />
industriais deverão avaliar, à<br />
luz das regras fiscais e do BEPS, a<br />
forma como se encontram organizad<strong>os</strong>,<br />
o que resultará, em muit<strong>os</strong><br />
cas<strong>os</strong>, na necessidade de reequacionar<br />
o seu modelo de negócio e<br />
a própria estrutura corporativa e<br />
financeira. A mera escolha do local<br />
em que se colocam <strong>os</strong> centr<strong>os</strong> de<br />
controlo da manutenção remota de<br />
produt<strong>os</strong> industriais através de sensores<br />
ou a adaptação das cadeias<br />
de valor de produt<strong>os</strong> industriais à<br />
economia digital que as torna mais<br />
colaborativas com nov<strong>os</strong> parceir<strong>os</strong>,<br />
são apenas exempl<strong>os</strong> de aspet<strong>os</strong><br />
que determinam alterações com<br />
impact<strong>os</strong> fiscais relevantes.<br />
115
Tributação Digital<br />
As “bitcoins”<br />
não pagam imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong><br />
em Portugal<br />
116<br />
FRANCISCO CAIADO<br />
Manager, Tax Services<br />
Até muito<br />
recentemente,<br />
<strong>os</strong> contribuintes<br />
que investiram em<br />
moedas digitais, como<br />
a bitcoin, andaram<br />
‘a<strong>os</strong> papéis’ para saber<br />
qual o enquadramento<br />
tributário d<strong>os</strong><br />
rendiment<strong>os</strong> obtid<strong>os</strong><br />
com este tipo<br />
de moedas, já que<br />
a Autoridade Tributária<br />
permaneceu muito<br />
tempo sem definir<br />
publicamente<br />
a sua p<strong>os</strong>ição<br />
sobre esta questão.<br />
Finalmente, a Autoridade Tributária<br />
tornou pública a sua p<strong>os</strong>ição,<br />
relativamente a um pedido de informação<br />
vinculativa, tendo convolado<br />
a resp<strong>os</strong>ta em Ficha Doutrinária<br />
(Processo n.º 5717/2015).<br />
Saliente-se que a Autoridade<br />
Tributária apenas se debruçou<br />
sobre esta realidade em sede de<br />
IRS, assim como não analisou <strong>os</strong><br />
vári<strong>os</strong> tip<strong>os</strong> de rendiment<strong>os</strong> hipoteticamente<br />
tributáveis, tendo<br />
apenas enquadrado <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong><br />
associad<strong>os</strong> a<strong>os</strong> ganh<strong>os</strong><br />
obtid<strong>os</strong> por compra e venda de<br />
cripto-moeda por moeda real<br />
(qualquer que esta seja), revelando-se,<br />
todavia, estes rendiment<strong>os</strong><br />
como aqueles que potencialmente<br />
são mais importantes.<br />
Segundo a Autoridade Tributária,<br />
estes rendiment<strong>os</strong> não se<br />
enquadram no âmbito da categoria<br />
G (por não se subsumirem<br />
na tipificação fechada do artigo<br />
10.º do Código do IRS), nem no<br />
âmbito da categoria E (devido<br />
facto de <strong>os</strong> rendiment<strong>os</strong> em causa<br />
não serem gerad<strong>os</strong> pela mera<br />
aplicação de capital, mas antes<br />
estarem associad<strong>os</strong> ou exigirem<br />
a alienação de um direito).<br />
Assim, a Autoridade Tributária<br />
acaba por concluir que, face ao<br />
ordenamento jurídico português<br />
atualmente vigente, a venda de<br />
cripto-moeda não é tributável,<br />
só tal acontecendo num cenário<br />
em que o sujeito passivo de<br />
IRS desenvolva uma atividade<br />
profissional ou empresarial para<br />
comprar e vender cripto-moedas,<br />
em que acabará por ser tributada<br />
em sede de IRS no âmbito<br />
da categoria B.<br />
As cripto-moedas transacionadas<br />
funcionam essencialmente à<br />
margem de regulação, ainda não<br />
existindo legislação específica<br />
de natureza regulatória nem tributária<br />
que sistematize esta realidade,<br />
no entanto, este paradigma<br />
deverá ser alterado a nível<br />
europeu e progressivamente n<strong>os</strong><br />
Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong>. Aliás, Portugal<br />
já se juntou a uma iniciativa<br />
liderada por França, Alemanha,<br />
Itália e Espanha para avançar<br />
com a tributação da economia<br />
digital.
SAFT 2019: não deixes<br />
para amanhã aquilo<br />
que devias fazer hoje<br />
Tributação Digital<br />
ANA ANDREIA OLIVEIRA<br />
Assistant Manager, Tax Services<br />
O SAFT não é somente<br />
uma nova parametrização<br />
do sistema de reporte<br />
financeiro (“ERP”) das<br />
empresas, representa<br />
também a componente<br />
prática da aplicação<br />
direta da legislação.<br />
O SAFT contabilidade é um tema<br />
que se tem vindo a debater cada<br />
vez mais ao longo destes últim<strong>os</strong><br />
meses: um novo formato, novas<br />
exigências de padronização do<br />
ERP de cada entidade, um prazo<br />
definido de entrega. Mas a atitude<br />
tem sido “tem<strong>os</strong> tempo, é só<br />
para entregar em 2020…”<br />
(In)felizmente tudo o que requer<br />
um prazo de entrega definido<br />
impõe uma preparação prévia e<br />
isto significa que não será só em<br />
2020. O futuro é agora.<br />
As novas formatações, exigências<br />
e até mesmo o prazo não são<br />
assim tão simples de cumprir<br />
conforme se p<strong>os</strong>sa inicialmente<br />
antever. Nem todas as empresas<br />
têm um plano de contas com<br />
base no Sistema de Normalização<br />
Contabilístico (SNC) que lhes<br />
permita fazer um mapeamento<br />
direto para as taxonomias com<br />
uma simples função Excel do<br />
tipo “vlookup”. A realidade contabilística<br />
é bem mais complexa.<br />
O “novo” SAFT não é somente<br />
uma obrigação que tem de ser<br />
cumprida, é uma partilha de informação<br />
quase cega das empresas<br />
para com a Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira (AT). Trata-se<br />
de expor a nu a contabilidade<br />
da empresa e permitir que<br />
esses dad<strong>os</strong> sejam analisad<strong>os</strong>,<br />
sendo o seu propósito único a<br />
auditoria e inspeção às contas<br />
numa ótica estritamente fiscal.<br />
Mas o principal problema vem<br />
muito antes. Como n<strong>os</strong> prepararm<strong>os</strong><br />
para essa mudança? Para<br />
muitas empresas sediadas em<br />
Portugal e que fazem parte de um<br />
grupo com sede no estrangeiro,<br />
é muito comum que a realidade<br />
com que se confrontam (até mesmo<br />
do próprio departamento de<br />
gestão) seja de cariz internacional.<br />
Vivem<strong>os</strong> numa era de globalização,<br />
e por isso é normal que se<br />
questione como se poderá cumprir<br />
de forma rigor<strong>os</strong>a a adoção<br />
de critéri<strong>os</strong> tão própri<strong>os</strong> e específic<strong>os</strong><br />
da realidade Portuguesa em<br />
empresas de cariz internacional?<br />
Analisando a portaria que regulamenta<br />
a adoção do SAFT (i.e.<br />
Portaria n.º 302/2016), parecen<strong>os</strong><br />
que o tema das taxonomias<br />
será o critério mais fácil de resolver.<br />
Mas existem realidades,<br />
por exemplo uma conta com<br />
impacto na Demonstração de<br />
Resultad<strong>os</strong>, que tanto pode ter<br />
a natureza de um rendimento<br />
como de um gasto (que uma<br />
simples regra de débito/crédito<br />
não resolvem), sendo necessário<br />
criar mais contas. Para isso existe<br />
a necessidade de explicar a<strong>os</strong><br />
gestores internacionais o que é<br />
o SAFT (um tipo de reporte, que<br />
apesar de constituir uma recomendação<br />
da OCDE, em que Portugal<br />
afigura-se como pioneiro).<br />
Outra limitação intrínseca a esta<br />
alteração prende-se com a exportação<br />
do próprio ficheiro SAFT.<br />
Neste contexto, veio a Ordem d<strong>os</strong><br />
Contabilistas Certificad<strong>os</strong> prestar<br />
esclarecimento através da<br />
publicação de um guia de aplicação<br />
para a contabilidade em<br />
que evidenciam que “O ficheiro<br />
SAF-T (PT) da contabilidade deve<br />
ser extraído obrigatoriamente do<br />
programa informático de contabilidade,<br />
não podendo ser obtido<br />
por qualquer outro sistema informático<br />
externo ao próprio programa”.<br />
Este tema vai certamente<br />
interferir com o próprio papel<br />
d<strong>os</strong> contabilistas certificad<strong>os</strong> e<br />
das empresas de contabilidade<br />
e consultoria que dão suporte às<br />
diferentes empresas sediadas em<br />
Portugal, uma vez que o ficheiro<br />
SAFT só poderá ser extraído do<br />
ERP da contabilidade da empresa.<br />
Esta p<strong>os</strong>ição garante que a informação<br />
facultada à AT não será<br />
manipulada, mas por outro lado<br />
coloca um entrave significativo<br />
ao auxílio que se pode prestar às<br />
empresas que se deparam com<br />
divers<strong>os</strong> entraves de natureza<br />
técnica para gerar este ficheiro.<br />
Estes são apenas alguns d<strong>os</strong><br />
desafi<strong>os</strong> que se colocam relativamente<br />
a este assunto. E tod<strong>os</strong><br />
tomarão algum tempo a serem<br />
analisad<strong>os</strong>, estruturad<strong>os</strong> internamente<br />
para assegurar a gestão<br />
do risco numa área tão sensível<br />
e relativamente à qual a exp<strong>os</strong>ição<br />
de informação será total.<br />
O problema está identificado,<br />
urge agora iniciar a construção<br />
da solução para responder com<br />
sucesso ao desafio que esta temática<br />
coloca.<br />
117
Tributação Digital<br />
O adiamento da<br />
desmaterialização…<br />
118<br />
CATARINA MATOS<br />
Diretor, Tax Services<br />
O Decreto-Lei n.º<br />
111-B/2017, de 31<br />
de ag<strong>os</strong>to, alterou<br />
o Código d<strong>os</strong><br />
Contrat<strong>os</strong> Públic<strong>os</strong><br />
(CCP), procedendo<br />
à transp<strong>os</strong>ição da<br />
Diretiva 2014/55/UE do<br />
Parlamento Europeu e<br />
do Conselho, de 16 de<br />
abril de 2014, relativa<br />
à faturação eletrónica<br />
n<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>.<br />
No passado dia 28 de dezembro,<br />
veio o Decreto-lei n.º 123/2018,<br />
definir o modelo de governação<br />
para a implementação da faturação<br />
eletrónica n<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong><br />
públic<strong>os</strong> e proceder à primeira<br />
alteração ao Decreto-Lei n.º 111-<br />
B/2017, de 31 de ag<strong>os</strong>to, no que<br />
respeita a<strong>os</strong> nov<strong>os</strong> praz<strong>os</strong> de<br />
entrada em vigor a aplicar a<strong>os</strong><br />
contraentes públic<strong>os</strong> e a<strong>os</strong> cocontratantes.<br />
Neste âmbito, e ao contrário do<br />
prazo inicialmente previsto, i.e. 1<br />
janeiro de 2019, passam a estar<br />
previst<strong>os</strong> <strong>os</strong> seguintes praz<strong>os</strong>:<br />
1. Os contraentes públic<strong>os</strong> referid<strong>os</strong><br />
no artigo 3.º do CCP são<br />
obrigad<strong>os</strong>, a partir de 18 de abril<br />
de 2019, a receber e a processar<br />
faturas eletrónicas no modelo<br />
estabelecido pela norma europeia<br />
respetiva aprovada pela<br />
Comissão Europeia e publicitada<br />
no portal d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>,<br />
sem prejuízo do estabelecido no<br />
ponto seguinte.<br />
2. O prazo referido anteriormente<br />
é alargado até 18 de abril de 2020<br />
para <strong>os</strong> contraentes públic<strong>os</strong> que<br />
não integrem as alíneas a) e d) do<br />
n.º 1 do artigo 2.º do CCP, i.e. entidades<br />
que não sejam Estado ou<br />
Institut<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>.<br />
3. Até 17 de abril de 2020 <strong>os</strong> cocontratantes<br />
podem utilizar mecanism<strong>os</strong><br />
de faturação diferentes<br />
da faturação eletrónica, sem prejuízo<br />
do estabelecido no ponto<br />
seguinte.<br />
4. O prazo referido anteriormente<br />
é alargado até 31 de dezembro<br />
de 2020 para as micro, pequenas<br />
e médias empresas, definidas<br />
n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> da Recomendação<br />
2003/361/CE, da Comissão Europeia,<br />
de 6 de maio de 2003, e para<br />
as entidades públicas enquanto<br />
entidades cocontratantes.<br />
5. As empresas e entidades referidas<br />
n<strong>os</strong> númer<strong>os</strong> anteriores,<br />
que não utilizem faturação eletrónica<br />
n<strong>os</strong> praz<strong>os</strong> estabelecid<strong>os</strong><br />
no Decreto, não podem, em caso<br />
algum, ser objeto de discriminação<br />
por parte d<strong>os</strong> contraentes<br />
públic<strong>os</strong>.<br />
Adicionalmente, e tendo em conta<br />
a necessidade da existência<br />
de regras bem definidas sobre a<br />
matéria, de modo a evitar a proliferação<br />
de requisit<strong>os</strong> e format<strong>os</strong>,<br />
e em alguns cas<strong>os</strong> de regras setoriais,<br />
a Entidade de Serviç<strong>os</strong> Partilhad<strong>os</strong><br />
da Administração Pública,<br />
I. P. (ESPAP) é a entidade que<br />
coordenará a implementação da<br />
faturação eletrónica, competindo-lhe<br />
a emissão de requisit<strong>os</strong><br />
técnic<strong>os</strong> e funcionais que suportam<br />
a referida implementação.<br />
A ESPAP fornecerá a solução para<br />
a receção e o processamento de<br />
faturas eletrónicas, atendendo<br />
às necessidades e especificidades<br />
de cada setor, garantindo o<br />
relacionamento e colaboração<br />
eletrónica com <strong>os</strong> cocontratantes,<br />
tendo em conta que:<br />
a) <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> da Administração<br />
direta do Estado e <strong>os</strong> institut<strong>os</strong><br />
públic<strong>os</strong> integram o âmbito de<br />
entidades vinculadas à utilização<br />
obrigatória do sistema de faturação<br />
eletrónica fornecido pela<br />
ESPAP; e<br />
b) <strong>os</strong> serviç<strong>os</strong> e entidades não<br />
referid<strong>os</strong> na alínea anterior, incluindo<br />
a Presidência da República,<br />
a Assembleia da República, a<br />
Procuradoria Geral da República,<br />
<strong>os</strong> tribunais, as entidades administrativas<br />
independentes com<br />
funções de regulação, as entidades<br />
do setor público empresarial<br />
e as instituições de ensino superior<br />
públicas previstas na Lei n.º<br />
62/2007, de 10 de setembro, independentemente<br />
da sua natureza,<br />
integram o âmbito de entidades<br />
voluntárias que podem aderir ao<br />
sistema de faturação eletrónica<br />
fornecido pela ESPAP, mediante a<br />
celebração de um contrato.<br />
Este Decreto-Lei veio, no limite,<br />
serenar <strong>os</strong> operadores relativamente<br />
ao prazo de entrada em<br />
vigor, atenta a complexidade<br />
inerente à implementação do<br />
processo de faturação eletrónica,<br />
nomeadamente ao nível de requisit<strong>os</strong><br />
técnic<strong>os</strong> e funcionais necessári<strong>os</strong>.<br />
Mas atenção, trata-se<br />
de um mero adiamento, porque<br />
a faturação eletrónica será uma<br />
realidade a breve prazo e tod<strong>os</strong><br />
devem estar preparad<strong>os</strong> para<br />
esse momento!
Tributação Digital<br />
Certificação ou não<br />
certificação? – eis a questão!<br />
CATARINA MATOS<br />
Diretor, Tax Services<br />
Atualmente, a obrigação<br />
de utilização de<br />
programas de faturação,<br />
previamente certificad<strong>os</strong><br />
pela Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (AT),<br />
encontra-se prevista no<br />
Decreto-Lei n.º 28/2019,<br />
de 15 de fevereiro, que<br />
veio regulamentar as<br />
obrigações relativas<br />
ao processamento<br />
de faturas e outr<strong>os</strong><br />
document<strong>os</strong><br />
fiscalmente relevantes<br />
e das obrigações de<br />
conservação de livr<strong>os</strong>,<br />
regist<strong>os</strong> e respetiv<strong>os</strong><br />
document<strong>os</strong> de suporte,<br />
que recaem sobre <strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> de IVA.<br />
Neste âmbito, o artigo 4.º do referido<br />
decreto-lei prevê que ficam<br />
sujeit<strong>os</strong> à obrigação de utilizar<br />
exclusivamente programas<br />
informátic<strong>os</strong> de faturação, que<br />
tenham sido objeto de prévia<br />
certificação pela AT, <strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> com sede, estabelecimento<br />
estável ou domicílio em<br />
território nacional e outr<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> cuja obrigação de<br />
emissão de fatura se encontre<br />
sujeita às regras estabelecidas<br />
na legislação interna, n<strong>os</strong> term<strong>os</strong><br />
do artigo 35.º-A do Código<br />
do Imp<strong>os</strong>to sobre o Valor Acrescentado<br />
(IVA).<br />
Ou seja, a obrigação de utilização<br />
exclusiva de programas de faturação<br />
certificad<strong>os</strong> pela AT que até<br />
agora incidia sobre sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
de IVA com sede, estabelecimento<br />
estável ou domicílio no<br />
território nacional, passa a incidir<br />
sobre outr<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong><br />
cuja obrigação de emissão de fatura<br />
se encontre sujeita às regras<br />
estabelecidas na legislação interna.<br />
A dúvida reside sobre que<br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong>?<br />
Deverão ser incluíd<strong>os</strong> neste grupo<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> sem sede,<br />
estabelecimento estável ou domicílio<br />
no território nacional –<br />
<strong>os</strong> denominad<strong>os</strong> regist<strong>os</strong> de IVA<br />
- que, por efetuarem operações<br />
tributáveis localizadas em território<br />
nacional, estejam obrigad<strong>os</strong><br />
a emitir faturas sujeitas às regras<br />
de faturação do Código do IVA?<br />
Os requisit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> programas de<br />
faturação, assim como <strong>os</strong> procediment<strong>os</strong><br />
de certificação, são definid<strong>os</strong><br />
por Portaria do Ministério<br />
das Finanças, sendo que à data<br />
ainda se mantém em vigor a Portaria<br />
n.º 363/2010, de 23 de junho,<br />
n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> da qual apenas <strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> de IRS e IRC se<br />
encontravam sujeit<strong>os</strong> a esta obrigação,<br />
ou seja, <strong>os</strong> mer<strong>os</strong> regist<strong>os</strong><br />
de IVA encontram-se dispensad<strong>os</strong><br />
do cumprimento da mesma.<br />
Com a publicação deste decreto<br />
-lei muitas dúvidas se têm suscitado,<br />
se <strong>os</strong> mer<strong>os</strong> regist<strong>os</strong> de IVA<br />
passarão a ser abrangid<strong>os</strong> por<br />
esta obrigação. Aliás, o recente<br />
Despacho n.º 254/2019 – XXI do<br />
Secretário de Estado d<strong>os</strong> Assunt<strong>os</strong><br />
Fiscais (SEAF) determina ser<br />
necessário “que a AT proceda à<br />
análise cuidada e continue a divulgar<br />
orientações sobre estas<br />
novas obrigações (…) esclarecendo,<br />
nomeadamente, as questões<br />
da eventual necessidade<br />
de cumprimento das obrigações<br />
de certificação de programas informátic<strong>os</strong><br />
por parte de sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> de IVA não residentes e<br />
sem estabelecimento estável em<br />
Portugal”.<br />
Ainda a propósito, no final do<br />
passado mês de ag<strong>os</strong>to, foi publicada<br />
uma informação vinculativa<br />
onde o tema é abordado pela Direção<br />
de Serviç<strong>os</strong> do IVA, fazendo-se<br />
referência a um despacho<br />
do SEAF não publicado, n<strong>os</strong> term<strong>os</strong><br />
do qual a obrigação de utilização<br />
de programa de faturação<br />
certificado só será aplicável a<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> não estabelecid<strong>os</strong>,<br />
registad<strong>os</strong> para efeit<strong>os</strong> de<br />
IVA no território nacional, a partir<br />
de 1 de janeiro de 2021 (data<br />
da entrada em vigor do artigo 2.º<br />
da Diretiva 2017/2455, de 5 de dezembro).<br />
Não obstante, uma regra<br />
de tal importância, que poderá<br />
gerar um custo administrativo<br />
substancial para <strong>os</strong> operadores<br />
económic<strong>os</strong>, não pode ser objeto<br />
de enquadramento no âmbito de<br />
uma informação vinculativa para<br />
uma entidade específica e com<br />
base em remissões para document<strong>os</strong><br />
desconhecid<strong>os</strong> para <strong>os</strong><br />
contribuintes em geral.<br />
Por outro lado, é inevitável suscitar<br />
outra questão: a verificar-se<br />
tal obrigação, no limite, não ficará<br />
mais ténue a fronteira entre <strong>os</strong><br />
mer<strong>os</strong> regist<strong>os</strong> de IVA e <strong>os</strong> estabeleciment<strong>os</strong><br />
estáveis?<br />
As dúvidas vão surgindo ao longo<br />
d<strong>os</strong> temp<strong>os</strong>, mas a principal<br />
permanece (ainda) sem resp<strong>os</strong>ta<br />
geral e abstrata… Certificação ou<br />
não Certificação?<br />
119
Tributação Digital<br />
Faturação eletrónica<br />
n<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong><br />
120<br />
FILIPA GUEDES<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
O Código d<strong>os</strong> Contrat<strong>os</strong><br />
Públic<strong>os</strong> tem vindo<br />
a ser, ao longo d<strong>os</strong><br />
an<strong>os</strong>, objeto de várias<br />
alterações, a última<br />
das quais introduzida<br />
pelo Decreto-Lei n.º 111-<br />
B/2017, de 31 de ag<strong>os</strong>to.<br />
De entre as significativas alterações<br />
introduzidas, destaca-se a<br />
obrigatoriedade de emissão de<br />
faturas eletrónicas no âmbito da<br />
execução de contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>,<br />
em vigor a partir de 1 de janeiro<br />
de 2019.<br />
A referida obrigação resulta da<br />
transp<strong>os</strong>ição da Diretiva 2014/55/<br />
UE do Parlamento Europeu e do<br />
Conselho, de 16 de abril de 2014,<br />
relativa à faturação eletrónica<br />
n<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>.<br />
Em term<strong>os</strong> prátic<strong>os</strong>, a partir de<br />
1 de janeiro de 2019, passa a ser<br />
obrigatório que <strong>os</strong> fornecedores<br />
de entidades da administração<br />
pública, no âmbito da execução<br />
d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong> com estas<br />
celebrad<strong>os</strong>, procedam à emissão<br />
faturas exclusivamente por<br />
via eletrónica, excecionando-se<br />
apenas <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de contrat<strong>os</strong><br />
secret<strong>os</strong> ou acompanhad<strong>os</strong> de<br />
medidas especiais de segurança.<br />
No que respeita à definição de<br />
fatura eletrónica, e de acordo<br />
com a norma comunitária, uma<br />
fatura eletrónica é uma fatura<br />
emitida, transmitida e recebida<br />
num formato eletrónico<br />
estruturado que permite o seu<br />
processamento automático e<br />
eletrónico (modelo standard<br />
europeu). Não são assim consideradas<br />
eletrónicas as faturas<br />
em PDF ou noutra apresentação<br />
meramente visual.<br />
As faturas eletrónicas emitidas no<br />
âmbito da execução de contrat<strong>os</strong><br />
públic<strong>os</strong> devem conter obrigatoriamente<br />
<strong>os</strong> seguintes element<strong>os</strong><br />
de informação (quando aplicáveis)<br />
previst<strong>os</strong> no artigo 299º-B do<br />
Decreto-Lei n.º 111-B/2017, a saber:<br />
l Identificadores do processo<br />
e da fatura<br />
l Período de faturação<br />
l Informações sobre<br />
o cocontratante<br />
l Informações sobre<br />
o contraente público<br />
l Informações sobre a entidade<br />
beneficiária, se distinta<br />
da anterior<br />
l Informações sobre<br />
o representante fiscal<br />
do cocontratante<br />
l Referência do contrato<br />
l Condições de entrega<br />
l Instruções de pagamento<br />
l Informações sobre<br />
ajustament<strong>os</strong> e encarg<strong>os</strong><br />
l Informações sobre as rubricas<br />
da fatura<br />
l Totais da fatura<br />
De notar que a fatura eletrónica<br />
deverá seguir o modelo aprovado<br />
pela norma Europeia, e mencionado<br />
no portal reservado a<strong>os</strong><br />
contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>.<br />
Não obstante, as faturas eletrónicas<br />
devem ainda cumprir<br />
obrigatoriamente com <strong>os</strong> requisit<strong>os</strong><br />
exigid<strong>os</strong> na legislação fiscal,<br />
designadamente, <strong>os</strong> previst<strong>os</strong> no<br />
artigo 36º do Código do IVA.<br />
Esta nova obrigação, que numa<br />
lógica de harmonização da faturação<br />
da contratação pública a<br />
nível europeu permitirá uma clara<br />
melhoria da gestão d<strong>os</strong> flux<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong><br />
por parte das entidades<br />
da administração pública, pode<br />
constituir, numa fase de implementação<br />
inicial, um desafio para<br />
<strong>os</strong> fornecedores dessas entidades.<br />
Assim, por forma a minimizar esses<br />
impact<strong>os</strong>, prevê a norma europeia<br />
que, no âmbito da transp<strong>os</strong>ição<br />
da Diretiva, devem <strong>os</strong><br />
Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong> ter em conta<br />
as necessidades das pequenas e<br />
médias empresas, bem como das<br />
autoridades e entidades adjudicantes<br />
de pequena dimensão.<br />
Prevê ainda o legislador europeu<br />
que, no âmbito da transp<strong>os</strong>ição<br />
da Diretiva, <strong>os</strong> Estad<strong>os</strong>-Membr<strong>os</strong><br />
deverão proporcionar o apoio necessário<br />
a todas as autoridades e<br />
entidades adjudicantes e fornecedores,<br />
para que a nova norma<br />
europeia sobre faturação eletrónica<br />
p<strong>os</strong>sa ser corretamente<br />
implementada e utilizada, destacando-se<br />
a obrigatória realização<br />
de ações de formação especialmente<br />
destinadas às pequenas e<br />
médias empresas.<br />
No entanto, não obstante a entrada<br />
em vigor da obrigação de<br />
faturação eletrónica no âmbito<br />
da execução d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong><br />
se aproxime a pass<strong>os</strong> larg<strong>os</strong>,<br />
aguarda-se a regulação d<strong>os</strong> aspet<strong>os</strong><br />
complementares da faturação<br />
eletrónica, não previst<strong>os</strong> no Código<br />
d<strong>os</strong> Contrat<strong>os</strong> Públic<strong>os</strong>, que será<br />
efetuada por portaria d<strong>os</strong> membr<strong>os</strong><br />
do Governo responsáveis pelas<br />
áreas das finanças e das obras<br />
públicas, bem como, a publicação<br />
de informações complementares<br />
de apoio a<strong>os</strong> contratantes no portal<br />
d<strong>os</strong> contrat<strong>os</strong> públic<strong>os</strong>.
RUI CARVALHO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
No passado dia 13 de<br />
dezembro de 2018 foi<br />
aprovado em Conselho<br />
de Ministr<strong>os</strong> (“CM”) um<br />
decreto-lei que vem<br />
dar início a uma nova<br />
regulamentação em sede<br />
das obrigações relativas ao<br />
processamento de faturas<br />
e outr<strong>os</strong> document<strong>os</strong><br />
fiscais relevantes, sendo<br />
extensível às obrigações<br />
de conservação de livr<strong>os</strong>,<br />
regist<strong>os</strong> e respetiv<strong>os</strong><br />
document<strong>os</strong> de suporte<br />
que recaem/incidem sobre<br />
<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> de IVA.<br />
Conforme comunicado do CM,<br />
este diploma tem como “objetiv<strong>os</strong><br />
essenciais promover a simplificação<br />
legislativa e conferir<br />
uma maior segurança jurídica<br />
a<strong>os</strong> contribuintes, consolidando<br />
e atualizando legislação dispersa<br />
relativa ao processamento<br />
de faturas e de outr<strong>os</strong> document<strong>os</strong><br />
fiscalmente relevantes,<br />
bem como harmonizando regras<br />
divergentes em matéria de conservação<br />
de document<strong>os</strong> para<br />
efeit<strong>os</strong> de IVA, IRC e IRS”.<br />
Processamento de faturas<br />
e outr<strong>os</strong> document<strong>os</strong><br />
fiscalmente relevantes<br />
– Desburocratização,<br />
Desmaterialização,<br />
Disrupção e Desafi<strong>os</strong><br />
Prevê-se, portanto, uma alteração<br />
significativa ao nível d<strong>os</strong><br />
procediment<strong>os</strong> em apreço cuja<br />
implementação, ainda que não<br />
totalmente conhecida, será iniciada<br />
já em 2019 prolongand<strong>os</strong>e,<br />
à partida, durante 2020 e<br />
an<strong>os</strong> seguintes.<br />
Faturas sem papel, faturas com<br />
um QR-Code e pré-preenchimento<br />
de declarações de IVA,<br />
são algumas das medidas que<br />
se pretendem implementar n<strong>os</strong><br />
próxim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, que têm também<br />
como objetivo o combate<br />
à fraude e evasão fiscais.<br />
Contudo, <strong>os</strong> objetiv<strong>os</strong> destas<br />
medidas não se esgotam n<strong>os</strong><br />
já enunciad<strong>os</strong>. Há um foco<br />
claro da Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (“AT”) na desburocratização<br />
administrativa e<br />
legislativa associada a estes<br />
temas, bem como um propósito<br />
de desmaterialização que p<strong>os</strong>sibilite<br />
uma redução da pegada<br />
ecológica, relacionada com<br />
o consumo de papel, e gast<strong>os</strong><br />
com o arquivo físico da documentação.<br />
Process<strong>os</strong> de mudança são<br />
muitas das vezes disruptiv<strong>os</strong><br />
e este não será à partida uma<br />
exceção. Na verdade, as alterações<br />
que se perspetivam irão<br />
romper com procediment<strong>os</strong> e<br />
process<strong>os</strong> antig<strong>os</strong>, há muito<br />
enraizad<strong>os</strong> no modus operandi<br />
d<strong>os</strong> consumidores finais e<br />
Tributação Digital<br />
agentes económic<strong>os</strong>, sendo<br />
necessário que venha a ocorrer,<br />
por parte destes, uma mudança<br />
de paradigma e de p<strong>os</strong>tura perante<br />
esta nova realidade (mais<br />
digital), por forma a que se<br />
proceda a uma implementação<br />
rápida e eficiente destas novas<br />
medidas.<br />
Trata-se também de um desafio<br />
para <strong>os</strong> vári<strong>os</strong> stakeholders<br />
e contribuintes. Se para a AT o<br />
desafio está necessariamente<br />
na criação de medidas, process<strong>os</strong>,<br />
procediment<strong>os</strong> e soluções<br />
de fácil aceitação e utilização<br />
generalizada/massiva por parte<br />
d<strong>os</strong> contribuintes, estes últim<strong>os</strong><br />
(consumidores finais e<br />
empresas), terão o desafio de<br />
se adaptarem a estas novas<br />
realidades, sendo necessário,<br />
muito provavelmente, que alterem<br />
também <strong>os</strong> seus hábit<strong>os</strong><br />
e procediment<strong>os</strong>. A este nível,<br />
e no que respeita às empresas,<br />
estas terão necessariamente de<br />
alterar procediment<strong>os</strong> intern<strong>os</strong><br />
na área administrativa e financeira,<br />
não só para que consigam<br />
acompanhar, lidar e cumprir<br />
com estas mudanças, mas também<br />
para poderem beneficiar<br />
de todas as vantagens, eficiências<br />
e sinergias que estas medidas<br />
vão certamente aportar<br />
a<strong>os</strong> process<strong>os</strong> de compliance<br />
contabilístico, fiscal e administrativo.<br />
121
Tributação Digital<br />
Novas realidades<br />
no processamento de<br />
faturas e arquivo – Dúvidas,<br />
desafi<strong>os</strong> e benefíci<strong>os</strong><br />
122<br />
RUI CARVALHO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
O Decreto-Lei n.º 28/2019,<br />
de 15 de fevereiro<br />
(“DL 28/2019”), procedeu<br />
à regulamentação das<br />
obrigações relativas ao<br />
processamento de faturas<br />
e outr<strong>os</strong> document<strong>os</strong><br />
fiscalmente relevantes<br />
e das obrigações de<br />
conservação de livr<strong>os</strong>,<br />
regist<strong>os</strong> e respetiv<strong>os</strong><br />
document<strong>os</strong> de suporte,<br />
que recaem sobre <strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> do<br />
Imp<strong>os</strong>to sobre o Valor<br />
Acrescentado (IVA).<br />
O referido diploma vem consolidar<br />
e atualizar diversa legislação<br />
dispersa relativa ao processamento<br />
de faturas e de outr<strong>os</strong> document<strong>os</strong><br />
fiscalmente relevantes,<br />
harmonizando regras divergentes<br />
em matéria de conservação de<br />
document<strong>os</strong>.<br />
De facto, são criadas através do<br />
presente decreto-lei as condições<br />
para a desmaterialização de document<strong>os</strong>,<br />
incentivando a adoção<br />
de um sistema de faturação eletrónica<br />
e de arquivo eletrónico de<br />
document<strong>os</strong>, permitindo às empresas<br />
uma redução d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong><br />
com o cumprimento das obrigações<br />
fiscais, estimulando o desenvolvimento<br />
e a utilização pelas<br />
empresas de nov<strong>os</strong> instrument<strong>os</strong><br />
tecnológic<strong>os</strong>, incorporando uma<br />
fil<strong>os</strong>ofia de inovação e desburocratização.<br />
Uma dessas medidas consiste nas<br />
“Faturas sem papel”, prevendo-se<br />
assim a p<strong>os</strong>sibilidade de dispensa<br />
de impressão de faturas.<br />
Contudo, são muitas as dúvidas<br />
sobre conceit<strong>os</strong> como “faturas<br />
sem papel” e “faturação eletrónica”<br />
que importa esclarecer.<br />
A fatura eletrónica poderá entender-se<br />
como um documento<br />
comercial em todo semelhante a<br />
uma fatura tradicional, a qual foi<br />
desmaterializada, isto é, transmitida<br />
em formato eletrónico, com<br />
tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> dad<strong>os</strong> relevantes. N<strong>os</strong><br />
term<strong>os</strong> do nº 10 do artigo 36º do<br />
Código do IVA e do artigo 12º e seguintes<br />
do DL 28/2019, estabelecem-se<br />
as condições necessárias<br />
para a emissão de faturas por via<br />
eletrónica, sendo de destacar: (i)<br />
a prévia aceitação por parte do<br />
destinatário; (ii) a garantia da autenticidade<br />
da sua origem, a integridade<br />
do seu conteúdo e a sua<br />
legibilidade através de quaisquer<br />
control<strong>os</strong> de gestão que criem<br />
uma pista de auditoria fiável, considerando-se<br />
cumpridas essas<br />
exigências se adotada, nomeadamente,<br />
uma assinatura eletrónica<br />
avançada ou um sistema de intercâmbio<br />
eletrónico de dad<strong>os</strong> (EDI).<br />
Neste sentido, o simples envio de<br />
uma fatura digitalizada em formato<br />
PDF não se subsume no conceito<br />
de faturação eletrónica prevista<br />
no DL 28/2019 se não forem asseguradas<br />
as condições referidas<br />
anteriormente.<br />
Ainda que estejam pendentes de<br />
esclarecimento por parte da Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira (AT)<br />
alguns procediment<strong>os</strong> para implementação<br />
de “Faturas sem papel”,<br />
a dispensa de impressão da fatura<br />
ou do seu envio em formato eletrónico<br />
passará a ocorrer quando<br />
o adquirente se tratar de um particular<br />
que forneça o seu número<br />
de identificação fiscal (“NIF”) e a<br />
entidade emitente, que emite a<br />
fatura, tenha optado pela transmissão<br />
eletrónica d<strong>os</strong> element<strong>os</strong><br />
das faturas em tempo real à AT.<br />
Desta forma, desde que o consumidor<br />
aceite, as faturas deixam de<br />
ser impressas em papel e passam<br />
a poder ser emitidas por meio<br />
eletrónico (através de um programa<br />
informático certificado), sendo<br />
disponibilizadas no Portal da AT e<br />
enviadas pelo emitente por meio<br />
eletrónico.<br />
“Faturação eletrónica” e “Faturas<br />
sem papel” são assim realidades<br />
diferentes, mas com um impacto<br />
relevante na vida das empresas,<br />
nomeadamente a redução da<br />
despesa associada à emissão das<br />
mesmas, o aumento da produtividade<br />
e eficiência administrativa<br />
e o rigor na transmissão d<strong>os</strong> dad<strong>os</strong>.<br />
Estas vantagens, aliadas a<strong>os</strong><br />
benefíci<strong>os</strong> que resultam d<strong>os</strong> procediment<strong>os</strong><br />
de arquivo inerentes<br />
a cada tipologia de faturas (eletrónicas,<br />
sem papel e em papel<br />
– esta última com p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de <strong>os</strong> document<strong>os</strong> poderem ser<br />
digitalizad<strong>os</strong> e arquivad<strong>os</strong> em formato<br />
eletrónico), nomeadamente<br />
o acesso facilitado à documentação<br />
e poupança no espaço físico,<br />
resultam num novo paradigma<br />
d<strong>os</strong> process<strong>os</strong> administrativ<strong>os</strong> e<br />
financeir<strong>os</strong> que terá um impacto<br />
considerável para as empresas e<br />
também para <strong>os</strong> consumidores<br />
finais.
Processo<br />
e Procedimento
Processo e Procedimento<br />
Inspetores fiscais sem<br />
fronteiras – <strong>os</strong> super-heróis<br />
da tributação internacional<br />
124<br />
PEDRO SIMÕES PEREIRA<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Muito em voga no<br />
debate internacional,<br />
e ao abrigo do<br />
programa do BEPS<br />
(Base Er<strong>os</strong>ion<br />
& Profit Shifting),<br />
estão as questões<br />
inerentes à er<strong>os</strong>ão<br />
da base tributável e à<br />
alocação de receitas<br />
e lucr<strong>os</strong> por parte d<strong>os</strong><br />
grup<strong>os</strong> multinacionais.<br />
Também agora,<br />
mais do que nunca,<br />
a figura do anti vilão<br />
no papel assumido<br />
pel<strong>os</strong> inspetores<br />
tributári<strong>os</strong><br />
sem fronteiras<br />
vem responder,<br />
de forma crescente,<br />
ao relativamente<br />
encriptado mundo<br />
das operações<br />
económicas mundiais.<br />
Muito em voga no debate internacional,<br />
e ao abrigo do programa<br />
do BEPS (Base Er<strong>os</strong>ion &<br />
Profit Shifting), estão as questões<br />
inerentes à er<strong>os</strong>ão da base<br />
tributável e à alocação de receitas<br />
e lucr<strong>os</strong> por parte d<strong>os</strong> grup<strong>os</strong><br />
multinacionais. Também agora,<br />
mais do que nunca, a figura do<br />
anti vilão no papel assumido<br />
pel<strong>os</strong> inspetores tributári<strong>os</strong> sem<br />
fronteiras vem responder, de forma<br />
crescente, ao relativamente<br />
encriptado mundo das operações<br />
económicas mundiais.<br />
Os inspetores sem fronteiras<br />
ou, na sua terminologia original,<br />
Tax Inspectors Without Borders<br />
“TIWB”, assume-se na génese<br />
como um programa conjunto da<br />
OCDE (Organização para a Cooperação<br />
do Desenvolvimento<br />
Económico) e das Nações Unidas.<br />
A ideia original remonta a<br />
2010 em que, à semelhança d<strong>os</strong><br />
médic<strong>os</strong> sem fronteiras, também<br />
uma força de especialistas e experts<br />
em matérias de índole fiscal<br />
deveriam ser enviad<strong>os</strong> - com<br />
origem em países economicamente<br />
desenvolvid<strong>os</strong> – para países<br />
em desenvolvimento. Com<br />
base nesta premissa, entre 2015<br />
e 2016 a OCDE e a UNDP (United<br />
Nations Development Programme)<br />
lançaram uma iniciativa<br />
conjunta que visava, como objetivo<br />
inicial, concretizar 100 ações<br />
em matéria fiscal até 2020.<br />
No seu relatório anual com referência<br />
ao período 2017/2018,<br />
a OCDE refere que <strong>os</strong> programas<br />
em curso, de ajuda ativa entre<br />
partner administration (departamento<br />
ou jurisdição do país que<br />
partilha o técnico ou o financiamento<br />
para a concretização do<br />
programa) e h<strong>os</strong>t administration<br />
(departamento ou instituição<br />
que, num país em desenvolvimento,<br />
solicita assistência em<br />
matéria fiscal, e corresponde<br />
ao organismo responsável pelo<br />
cálculo e cobrança de imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>),<br />
excederam as expectativas iniciais<br />
e apresentam taxas de crescimento<br />
surpreendentes, sendo<br />
<strong>os</strong> países das regiões de África,<br />
da América Latina e das Caraíbas,<br />
bem como da Europa do<br />
Leste <strong>os</strong> principais a requerer e a<br />
beneficiar de forma abrangente<br />
da expertise d<strong>os</strong> inspetores provenientes<br />
de um número cada<br />
vez maior de países parceir<strong>os</strong>. A<br />
este título importará salientar a<br />
adesão recente da Bélgica, Índia,<br />
África do Sul como alguns d<strong>os</strong><br />
países que se juntaram, enquanto<br />
partner administrations, a outr<strong>os</strong><br />
como a França, a Alemanha,<br />
a Itália, Quénia, Holanda, Nigéria,<br />
Espanha e Reino Unido.<br />
África continua a ser a principal<br />
fonte de pedid<strong>os</strong> em matéria<br />
d<strong>os</strong> programas d<strong>os</strong> TIWB. Estes,<br />
por seu turno, abrangem um largo<br />
espectro de matérias técnicas<br />
em divers<strong>os</strong> sectores de indústria,<br />
naturalmente em resp<strong>os</strong>ta<br />
a cada caso particular da h<strong>os</strong>t<br />
administration. Os programas<br />
ativ<strong>os</strong> contemplam, entre outr<strong>os</strong>,<br />
a implementação de ações com<br />
vista ao apuramento e levantamento<br />
de risc<strong>os</strong>, melhorias n<strong>os</strong><br />
process<strong>os</strong> de auditoria/inspeção,<br />
e negociação de acord<strong>os</strong><br />
prévi<strong>os</strong> de preç<strong>os</strong> de transferência.<br />
Em concreto, cumpre sa-
Processo e Procedimento<br />
lientar que as principais ações<br />
inspetivas levadas a cabo nestes<br />
países têm como referência matérias<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência<br />
e de tributação internacional,<br />
nomeadamente ao nível de estabeleciment<strong>os</strong><br />
estáveis, validação<br />
de management e service fees e<br />
a avaliação de direit<strong>os</strong> de propriedade<br />
intelectual.<br />
Não é de espantar, por isso,<br />
que em paralelo com a ação<br />
d<strong>os</strong> inspetores sem fronteiras<br />
– preconizadores, no caso, de<br />
auditorias concertadas fora da<br />
sua jurisdição matriz – muit<strong>os</strong><br />
países na região Africana, e em<br />
concreto de língua portuguesa,<br />
tenham cumulativamente introduzido<br />
no seu normativo legislação<br />
específica em matéria de<br />
preç<strong>os</strong> de transferência, como<br />
foi o caso de Angola (em 2014),<br />
Cabo Verde (em 2015) e Moçambique<br />
(em 2017), o que vem assumir-se,<br />
em países com frágeis<br />
mecanism<strong>os</strong> de controlo interno<br />
em outras matérias fiscais por si<br />
muito mais maduras, como uma<br />
problemática adicional no léxico<br />
quotidiano d<strong>os</strong> dois lad<strong>os</strong> das<br />
barricadas, ora da máquina fiscal<br />
e d<strong>os</strong> respetiv<strong>os</strong> inspetores,<br />
ora do local management de empresas<br />
que, a atuar localmente,<br />
deixam de poder pensar apenas<br />
no seu domínio e esfera de ação<br />
locais.<br />
Os programas desenvolvid<strong>os</strong><br />
apresentam, num relativo curto<br />
espaço de tempo, resultad<strong>os</strong> de<br />
sucesso altamente quantificáveis,<br />
que se traduzem desde 2012<br />
e à data de Abril de 2018, num<br />
valor acumulado de receitas fiscais<br />
de 414 milhões de dólares,<br />
apresentando um crescimento<br />
de 136 milhões de dólares por<br />
comparação ao anterior período<br />
de reporte do Relatório Anual da<br />
OCDE (i.e., à data de abril 2017).<br />
Como já referido, <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> de<br />
maior sucesso são provenientes<br />
da região africana, correspondendo<br />
a um total de 244 milhões<br />
de dólares de receita arrecada,<br />
seguida da América Latina e Caraíbas<br />
(110,8 milhões de dólares),<br />
Ásia (57,4 milhões de US) e Europa<br />
do Leste (1,5 milhões de US).<br />
Supletivamente ao propósito<br />
da maximização da receita em<br />
curt<strong>os</strong> períod<strong>os</strong> de tempo, <strong>os</strong><br />
programas do TIWB visam, numa<br />
perspetiva de longo prazo, desenvolver<br />
competências técnicas<br />
mais diversificas e sustentadas,<br />
permitindo melhorar a qualidade<br />
das inspeções de auditoria<br />
fiscal, melhoria de ferramentas,<br />
process<strong>os</strong> e procediment<strong>os</strong>, mudança<br />
organizacional, melhoria e<br />
adaptação de legislações vazias<br />
e, acima de tudo, ajudar a moldar<br />
as ações e comportament<strong>os</strong><br />
d<strong>os</strong> contribuintes resultando,<br />
por sua vez, num compliance de<br />
melhor qualidade.<br />
Os resultad<strong>os</strong> assinalad<strong>os</strong> pelas<br />
h<strong>os</strong>t administrations são, essencialmente,<br />
<strong>os</strong> seguintes:<br />
Ao nível das competências técnicas:<br />
l Inspetores com mais autonomia<br />
e confiança n<strong>os</strong> process<strong>os</strong><br />
de inspeção e na realização de<br />
entrevistas a<strong>os</strong> contribuintes;<br />
l Ações de formação tailor-made<br />
que granjeiam conhecimento<br />
n<strong>os</strong> procediment<strong>os</strong> de gestão de<br />
risco e de inspeções de preç<strong>os</strong><br />
de transferência;<br />
l Partilha de conhecimento e<br />
aprendizagem peer-to-peer melhorou<br />
através de mecanism<strong>os</strong><br />
de feedback e trabalho em equipa.<br />
Ao nível das ferramentas, procediment<strong>os</strong><br />
e process<strong>os</strong>:<br />
l Diretivas e manuais desenvolvid<strong>os</strong><br />
para a estandardização de<br />
process<strong>os</strong>;<br />
l Regras fiscais em matéria de<br />
procediment<strong>os</strong> amigáveis e de<br />
acord<strong>os</strong> prévi<strong>os</strong> de preç<strong>os</strong> de<br />
transferência;<br />
l Aumento das inspeções, com<br />
sucesso, na temática de preç<strong>os</strong><br />
de transferência.<br />
Ao nível das alterações organizacionais:<br />
l Estabelecimento de equipas e<br />
unidades específicas em matéria<br />
de preç<strong>os</strong> de transferência.<br />
Ao nível das alterações comportamentais<br />
(pelo sujeito passivo):<br />
l A solicitação, pel<strong>os</strong> inspetores,<br />
de informação relevante tem<br />
contribuído para aumentar a<br />
predisp<strong>os</strong>ição d<strong>os</strong> contribuintes<br />
em disponibilizar informação<br />
a<strong>os</strong> inspetores.<br />
Em suma, e não obstante o Programa<br />
d<strong>os</strong> TIWB ser corolário, à<br />
data, de sucesso quase imediato<br />
e garantido de arrecadação de<br />
receitas a nível internacional,<br />
o seu objetivo último consiste<br />
em promover a autonomia<br />
e assegurar a sustentabilidade<br />
futura destes países num contexto<br />
mundial de rápidas transformações<br />
e disrupções em que<br />
“o que vai ser” passou a “já foi“<br />
em unidades de tempo medidas<br />
em “cripto moment<strong>os</strong>”. Estas<br />
implementações pretendem-se<br />
robustas, afiguram-se complexas<br />
e sofisticadas do ponto de<br />
vista conceptual mas, simultaneamente,<br />
frágeis do ponto de<br />
vista da sua monitorização prática.<br />
Os inspetores sem fronteiras<br />
abraçam um novo mundo,<br />
o da disseminação das suas<br />
práticas tributárias e veem, assim,<br />
na sua missão de anti vilão,<br />
uma solução pelo bem comum<br />
que responde, inevitavelmente,<br />
às necessidades pragmáticas<br />
decorrentes da crescente complexidade<br />
fiscal no panorama<br />
mundial.<br />
125
Processo e Procedimento<br />
A (aparente?) simplificação<br />
do preenchimento da IES<br />
126<br />
ANA SOFIA ANTUNES<br />
Director, Tax Services<br />
Recentemente, entrou<br />
em vigor o Decreto-<br />
Lei n.º 87/2018, de<br />
31 de outubro, que<br />
visa simplificar o<br />
preenchimento<br />
d<strong>os</strong> anex<strong>os</strong> A e I da<br />
Informação Empresarial<br />
Simplificada (“IES”),<br />
através da consagração<br />
de novas regras de<br />
pré-preenchimento<br />
destes anex<strong>os</strong> com<br />
dad<strong>os</strong> extraíd<strong>os</strong> do<br />
denominado ficheiro<br />
SAF-T (PT) relativo<br />
à contabilidade d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> a<strong>os</strong><br />
quais esta obrigação<br />
seja aplicável.<br />
O referido diploma legal entrou<br />
em vigor no passado dia 1 de<br />
novembro, aplicando-se a<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> cuja obrigação de<br />
submissão da IES seja p<strong>os</strong>terior<br />
essa data.<br />
Para efeit<strong>os</strong> da sua implementação,<br />
aguarda-se, contudo,<br />
a publicação da Portaria d<strong>os</strong><br />
membr<strong>os</strong> do Governo responsáveis<br />
pela área das finanças, pelo<br />
Instituto Nacional de Estatística,<br />
I. P., e pelas áreas da justiça e da<br />
economia, a qual deverá prever<br />
não só as disp<strong>os</strong>ições para sua<br />
utilização, mas também um regime<br />
transitório, de modo a garantir<br />
um período de adaptação d<strong>os</strong><br />
sujeit<strong>os</strong> passiv<strong>os</strong> e respetiv<strong>os</strong><br />
contabilistas certificad<strong>os</strong>.<br />
O modo de preenchimento automático<br />
da IES (assim como<br />
de qualquer outra declaração)<br />
é sempre um fator p<strong>os</strong>itivo de<br />
poupança de horas de trabalho<br />
e, na sua génese, pretende-se<br />
que atue como um mecanismo<br />
facilitador da vida d<strong>os</strong> profissionais,<br />
d<strong>os</strong> contribuintes e da<br />
própria Autoridade Tributária e<br />
Aduaneira (“AT”).<br />
Contudo, exigindo-se a entrega<br />
prévia do ficheiro SAF-T (PT)<br />
relativo à contabilidade, tal poderá<br />
implicar a adaptação e/<br />
ou revisão d<strong>os</strong> sistemas informátic<strong>os</strong><br />
d<strong>os</strong> contribuintes, com<br />
o inerente aumento d<strong>os</strong> cust<strong>os</strong><br />
de aplicação e implementação<br />
desta medida. A extração<br />
de forma correta, atempada e<br />
completa do SAF-T (PT) deve ser<br />
uma preocupação crescente d<strong>os</strong><br />
contribuintes.<br />
Um simples erro no momento da<br />
submissão, seja ele estrutural,<br />
de conteúdo ou do programa,<br />
poderá implicar o incumprimento<br />
perante a AT, com a p<strong>os</strong>sível<br />
aplicação de coimas “em cascata”,<br />
pela não entrega do SAF-T<br />
(PT) e da IES. Por outro lado, será<br />
facultado à AT um conjunto alargado<br />
e relevante de informação,<br />
cuja leitura importa garantir ser<br />
a correta.<br />
Ainda que com algum grau de<br />
incerteza quanto a praz<strong>os</strong> e<br />
metodologias de entrega do ficheiro<br />
SAF-T (PT) relativo à contabilidade<br />
(n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> a definir<br />
pela referida Portaria), trata-se<br />
de uma realidade já legislada<br />
e, como tal, presente no quotidiano<br />
das organizações que não<br />
deve ser descurada. Com efeito,<br />
a (aparente) simplificação das<br />
obrigações declarativas poderá<br />
acarretar, para muit<strong>os</strong> contribuintes,<br />
um incremento de complexidade<br />
técnica e de revolução<br />
digital d<strong>os</strong> seus process<strong>os</strong> e<br />
sistemas de informação, que importa<br />
acautelar com a brevidade<br />
e maior tempestividade p<strong>os</strong>sível.
Processo e Procedimento<br />
Troca de informação entre<br />
estad<strong>os</strong>-membr<strong>os</strong>, sobre<br />
planeamento fiscal e não só!<br />
ANTÓNIO NEVES<br />
Partner, Tax Services<br />
Em 25 de junho de<br />
2018, entrou em vigor a<br />
Diretiva (UE) 2018/822<br />
do Conselho, de 25<br />
de maio de 2018,<br />
a qual vem alterar<br />
a Diretiva 2011/16/<br />
UE do Conselho,<br />
de 15 de fevereiro,<br />
relativa à cooperação<br />
administrativa no<br />
domínio da fiscalidade.<br />
Esta última Diretiva já tinha<br />
sido, n<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong>, alterada<br />
para contemplar a troca<br />
automática de informações<br />
obrigatória no que respeita,<br />
nomeadamente, a rulings, ao<br />
country-by-country reporting e<br />
a contas financeiras.<br />
Com esta nova alteração, passa<br />
também a verificar-se a troca<br />
automática de informações no<br />
que respeita a mecanism<strong>os</strong><br />
transfronteiriç<strong>os</strong> a comunicar,<br />
<strong>os</strong> quais se encontram associad<strong>os</strong><br />
com o planeamento fiscal<br />
e poderão indiciar formas de<br />
evasão fiscal.<br />
A Diretiva abrange tod<strong>os</strong> <strong>os</strong><br />
imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, exceto IVA, direit<strong>os</strong><br />
aduaneir<strong>os</strong>, imp<strong>os</strong>t<strong>os</strong> especiais<br />
de consumo e segurança social.<br />
Na prática, vem introduzir-se<br />
uma nova obrigação de comunicação,<br />
por parte d<strong>os</strong> intermediári<strong>os</strong><br />
(consultores, advogad<strong>os</strong>,<br />
auditores, contabilistas,<br />
instituições financeiras, etc.) ou<br />
contribuintes, às autoridades<br />
fiscais de um estado-membro,<br />
as quais deverão partilhar automaticamente<br />
essa informação<br />
com as suas congéneres de<br />
outr<strong>os</strong> estad<strong>os</strong>-membr<strong>os</strong>.<br />
A obrigação de comunicação<br />
apenas se aplica quando se<br />
verifica a existência de um mecanismo<br />
transfronteiriço que<br />
envolva mais de um estadomembro<br />
ou um estado-membro<br />
e um país terceiro. Deste<br />
modo, encontram-se excluíd<strong>os</strong><br />
<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> puramente doméstic<strong>os</strong><br />
sem impacto transfronteiriço<br />
(não obstante, em<br />
Portugal, estes poderão ser<br />
reportáveis n<strong>os</strong> term<strong>os</strong> do decreto-lei<br />
n.º 29/2008, de 25 de<br />
fevereiro).<br />
Para que um dado mecanismo<br />
transfronteiriço seja de comunicar,<br />
haverá que verificar<br />
alguns requisit<strong>os</strong>, designadamente,<br />
quanto à residência d<strong>os</strong><br />
participantes, à localização das<br />
atividades desenvolvidas pel<strong>os</strong><br />
participantes ou ao impacto do<br />
mesmo na obrigação de troca<br />
de informações financeiras ou<br />
na identificação do beneficiário<br />
efetivo. A Diretiva elenca<br />
um conjunto de características-chave,<br />
sendo que somente<br />
serão relevantes <strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong><br />
transfronteiriç<strong>os</strong> que<br />
contenham, pelo men<strong>os</strong>, uma<br />
dessas características, as quais<br />
incluem:<br />
l A obtenção de uma vantagem<br />
fiscal;<br />
l A existência de uma cláusula<br />
de confidencialidade;<br />
l A existência de um success<br />
fee;<br />
l Um mecanismo<br />
estandardizado;<br />
l A aquisição de sociedade<br />
com prejuíz<strong>os</strong> fiscais;<br />
l A conversão de rendimento<br />
em capital ou noutra realidade<br />
com regime fiscal mais<br />
favorável;<br />
l As operações circulares<br />
de fund<strong>os</strong> sem substância<br />
económica;<br />
l Os pagament<strong>os</strong> a uma<br />
entidade que beneficie de um<br />
regime de tributação mais<br />
favorável;<br />
l A dedução de depreciação<br />
relativamente a um ativo em<br />
127
Processo e Procedimento<br />
128<br />
mais de uma jurisdição;<br />
l A eliminação da dupla<br />
tributação em mais de uma<br />
jurisdição;<br />
l A transferência de ativ<strong>os</strong> em<br />
que se verifique uma diferença<br />
material no valor reconhecido<br />
nas jurisdições envolvidas;<br />
l Mecanism<strong>os</strong> que visem<br />
contornar a obrigação de<br />
reporte de contas financeiras;<br />
l Uma estrutura sem<br />
substância económica que vise<br />
não permitir a identificação do<br />
beneficiário efetivo;<br />
l O uso de safe harbors<br />
unilaterais em sede de preç<strong>os</strong><br />
de transferência;<br />
l A transferência intragrupo<br />
de intangíveis de difícil<br />
valorização;<br />
l A alteração do modelo de<br />
negócio da qual resulte uma<br />
redução superior a 50% do<br />
EBIT.<br />
A obrigação de comunicação<br />
por parte d<strong>os</strong> intermediári<strong>os</strong>,<br />
ou contribuintes, somente será<br />
de cumprir num estado-membro<br />
e poderá ser dispensada<br />
caso consigam comprovar que<br />
a comunicação foi efetuada por<br />
outro intermediário, ou contribuinte.<br />
Alguns intermediári<strong>os</strong><br />
poderão beneficiar de dispensa<br />
de comunicação devido a sigilo<br />
profissional, mas terão de analisar<br />
o mecanismo e notificar<br />
outro intermediário, ou o contribuinte,<br />
da respetiva obrigação<br />
de comunicação.<br />
A comunicação, quando devida,<br />
deve ser efetuada no prazo<br />
de 30 dias a contar da data<br />
relevante (disponibilização do<br />
mecanismo, finalização do mecanismo<br />
para implementação<br />
ou início da implementação do<br />
mecanismo, a que se verificar<br />
primeiro). No caso de mecanism<strong>os</strong><br />
estandardizad<strong>os</strong>, o intermediário<br />
poderá ter de apresentar<br />
um relatório trimestral<br />
sobre atualizações relevantes.<br />
A primeira comunicação por<br />
parte de intermediári<strong>os</strong> / contribuintes<br />
deve ocorrer até 31<br />
de ag<strong>os</strong>to de 2020, devendo<br />
abranger tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong><br />
cujo primeiro passo de implementação<br />
se verifique entre 25<br />
de junho de 2018 e 1 de julho<br />
de 2020. A troca automática de<br />
informação entre autoridades<br />
fiscais deverá ocorrer no prazo<br />
de 1 mês a contar do final do<br />
trimestre em que se verifique<br />
a comunicação pelo intermediário,<br />
ou contribuinte, sendo a<br />
primeira devida até 31 de outubro<br />
de 2020.<br />
A comunicação às autoridades<br />
fiscais envolve um detalhe do<br />
mecanismo, sendo de identificar<br />
o(s) contribuinte(s).<br />
Os estad<strong>os</strong>-membr<strong>os</strong> devem<br />
transpor a Diretiva até 31 de<br />
dezembro de 2019, aplicando a<br />
mesma a partir de 1 de julho de<br />
2020. No processo de transp<strong>os</strong>ição,<br />
será também estabelecido<br />
o regime sancionatório que deverá<br />
ser efetivo, proporcional e<br />
dissuasor.<br />
Face ao exp<strong>os</strong>to, a Diretiva (UE)<br />
2018/822 do Conselho, de 25 de<br />
maio de 2018, vem introduzir<br />
uma obrigação muito relevante<br />
em matéria de fiscalidade<br />
com impacto transfronteiriço.<br />
Comparativamente ao regime<br />
atualmente em vigor em Portugal,<br />
verifica-se uma maior<br />
abrangência d<strong>os</strong> “esquemas<br />
ou atuações” a reportar, muit<strong>os</strong><br />
sem dependência da obtenção<br />
de uma vantagem fiscal, a obrigação<br />
de identificar o contribuinte<br />
e a troca de informações<br />
entre estad<strong>os</strong>-membr<strong>os</strong>.<br />
Embora a primeira obrigação<br />
de comunicação somente se<br />
verifique daqui a cerca de 2<br />
an<strong>os</strong>, urge desde já identificar<br />
as situações relevantes que<br />
ocorram desde 25 de junho de<br />
2018 e que sejam futuramente<br />
passíveis de comunicação.<br />
A implementação harmonizada<br />
entre estad<strong>os</strong>-membr<strong>os</strong>, face<br />
às imensas dúvidas suscitadas<br />
pela redação da Diretiva, será<br />
com certeza um desafio para <strong>os</strong><br />
intermediári<strong>os</strong>, contribuintes e<br />
autoridades fiscais.
DIOGO CUNHA<br />
Manager, Tax Services<br />
Processo e Procedimento<br />
Medidas de caráter<br />
extraordinário para a<br />
recuperação de pendências<br />
n<strong>os</strong> tribunais administrativ<strong>os</strong><br />
e fiscais (será desta?)<br />
N<strong>os</strong> últim<strong>os</strong> an<strong>os</strong><br />
tem-se assistido a um<br />
aumento significativo<br />
da litigância ao nível<br />
administrativa e fiscal,<br />
com consequente<br />
aumento d<strong>os</strong> temp<strong>os</strong><br />
de resp<strong>os</strong>ta<br />
d<strong>os</strong> tribunais<br />
e a acumulação<br />
das pendências.<br />
Como tod<strong>os</strong> sabem<strong>os</strong>, a mor<strong>os</strong>idade<br />
no funcionamento d<strong>os</strong> tribunais<br />
administrativ<strong>os</strong> e fiscais<br />
tem um impacto prejudicial significativo<br />
na vida d<strong>os</strong> cidadã<strong>os</strong> e<br />
das empresas, afetando de forma<br />
determinante a competitividade<br />
da economia (em 2016 o número<br />
de process<strong>os</strong> pendentes na jurisdição<br />
administrativa e fiscal era<br />
de 72.516, segundo dad<strong>os</strong> da Direção<br />
-Geral da Política de Justiça).<br />
Neste contexto, foi recentemente<br />
publicado o Decreto-Lei n.º<br />
81/2018 de 15 de outubro de 2018,<br />
que visa a implementação de um<br />
conjunto de medidas extraordinárias<br />
que pretendem acelerar o<br />
número de decisões, bem como<br />
reduzir significativamente o volume<br />
das pendências existentes,<br />
nomeadamente:<br />
1) A isenção de custas processuais<br />
pela desistência de pedid<strong>os</strong><br />
n<strong>os</strong> process<strong>os</strong> administrativ<strong>os</strong> e<br />
tributári<strong>os</strong> pendentes, até ao final<br />
de 2019;<br />
2) A obrigação, para a Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira, de revogar<br />
ou rever tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> at<strong>os</strong> tributári<strong>os</strong><br />
ou administrativ<strong>os</strong> que sejam objeto<br />
de um processo pendente,<br />
quando ocorra ou tenha ocorrido<br />
alteração do entendimento administrativo<br />
em sentido favorável<br />
ao sujeito passivo, e bem assim<br />
quando tenha sido proferida jurisprudência<br />
quanto à matéria<br />
objeto do processo em sentido<br />
favorável ao sujeito passivo;<br />
3) A p<strong>os</strong>sibilidade d<strong>os</strong> sujeit<strong>os</strong><br />
passiv<strong>os</strong> poderem submeter a<strong>os</strong><br />
tribunais arbitrais tributári<strong>os</strong>,<br />
dentro das respetivas competências,<br />
as pretensões que tenham<br />
formulado em process<strong>os</strong> de impugnação<br />
judicial, com dispensa<br />
de pagamento de custas processuais,<br />
relativamente a<strong>os</strong> cas<strong>os</strong><br />
que se encontrem pendentes de<br />
decisão em primeira instância<br />
n<strong>os</strong> tribunais tributári<strong>os</strong>, e que<br />
nestes tenham dado entrada até<br />
31 de dezembro de 2016.<br />
Do conjunto de medidas supra<br />
citadas, destaca-se claramente<br />
a última, uma vez que permitirá<br />
que process<strong>os</strong> pendentes junto<br />
d<strong>os</strong> tribunais tributári<strong>os</strong> de 1.ª<br />
instância, com entrada até 31 de<br />
dezembro de 2016 p<strong>os</strong>sam transitar<br />
para <strong>os</strong> tribunais arbitrais<br />
tributári<strong>os</strong> e assim serem resolvid<strong>os</strong><br />
de forma muito mais célere<br />
pendências que se têm arrastado<br />
ao longo de an<strong>os</strong> n<strong>os</strong> tribunais<br />
administrativ<strong>os</strong> tributári<strong>os</strong>. Recorde-se<br />
que n<strong>os</strong> tribunais arbitrais<br />
o prazo máximo de decisão,<br />
em regra, são 6 meses.<br />
O pedido de transição para o tribunal<br />
arbitral, a apresentar ao<br />
abrigo desta norma, encontra-se<br />
disponível até 31 de dezembro<br />
de 2019, devendo o mesmo ser<br />
acompanhado de certidão judicial<br />
eletrónica do requerimento<br />
apresentado para a extinção da<br />
instância judicial. Adicionalmente,<br />
chama-se a atenção para o<br />
facto de apenas <strong>os</strong> process<strong>os</strong> que<br />
se encontrem na fase de impugnação<br />
judicial serem admitid<strong>os</strong> à<br />
aludida transição. Por fim, as pretensões<br />
a submeter nesse pedido<br />
de constituição de tribunal arbitral<br />
devem coincidir com o pedido<br />
e a causa de pedir do processo<br />
judicial a extinguir, apenas se<br />
admitindo a redução do pedido.<br />
Em suma, trata-se de uma oportunidade<br />
única, concedida a<strong>os</strong><br />
contribuintes, de conseguirem<br />
forçar a tomada de decisões de<br />
forma mais célere, relativamente<br />
a process<strong>os</strong> que se têm vindo a<br />
arrastar ao longo d<strong>os</strong> an<strong>os</strong>. Com<br />
isto pretende-se melhorar a performance<br />
da n<strong>os</strong>sa justiça tributária,<br />
que se pretende, para além<br />
de garantir a aplicação de princípi<strong>os</strong><br />
de legalidade e equidade,<br />
mais célere e tempestiva, em claro<br />
benefício de todas as partes<br />
envolvidas.<br />
129
Processo e Procedimento<br />
A nova cláusula<br />
geral anti-abuso<br />
130<br />
JÚLIO ALMEIDA<br />
Senior Consultant, Tax Services<br />
Foram recentemente<br />
aprovadas<br />
(Lei n.º 32/2019, de<br />
3 de maio) alterações<br />
ao alcance da cláusula<br />
geral antiabuso (CGAA)<br />
prevista no artigo<br />
38.º da Lei Geral<br />
Tributária que, se não<br />
acauteladas pel<strong>os</strong><br />
agentes económic<strong>os</strong>,<br />
poderão implicar<br />
um incremento<br />
da litigância com<br />
a Autoridade Tributária<br />
e Aduaneira (AT).<br />
Este diploma transpõe a Diretiva<br />
(UE) 2016/1164 do Conselho (“Diretiva<br />
ATAD”), a qual estabelece<br />
regras contra práticas de elisão<br />
fiscal consideradas lesivas no<br />
contexto da iniciativa Base Er<strong>os</strong>ion<br />
Profit Shifting (“BEPS”) da<br />
OCDE.<br />
Para além de alterações a outras<br />
medidas específicas antiabuso<br />
previstas na ATAD e em vigor no<br />
normativo português (em concreto,<br />
regras sobre: a dedução<br />
de gast<strong>os</strong> de financiamento, a<br />
imputação de lucr<strong>os</strong> de sociedades<br />
controladas (“CFC rules”)<br />
não residentes e regras de tributação<br />
à saída), a Lei agora<br />
aprovada vem alterar ainda a<br />
CGAA.<br />
Como aspeto crítico das alterações<br />
recentes, salienta-se o<br />
facto de deixar de ser necessário<br />
à AT identificar como finalidade<br />
principal a obtenção de<br />
uma vantagem fiscal bastando<br />
identificar como uma das finalidades<br />
em causa a obtenção<br />
de vantagens fiscais, o que legitima<br />
uma maior latitude na<br />
apreciação por parte da AT das<br />
operações realizadas por grup<strong>os</strong><br />
económic<strong>os</strong>.<br />
Não obstante, importa destacar<br />
que, no considerando 11 da<br />
Diretiva ATAD, é salvaguardado<br />
que as “regras gerais antiabuso<br />
deverão ser aplicáveis a montagens<br />
que não sejam genuínas,<br />
caso contrário, o contribuinte<br />
deverá dispor do direito de optar<br />
pela estrutura mais vantaj<strong>os</strong>a<br />
do ponto de vista fiscal para<br />
as suas atividades comerciais”.<br />
Verem<strong>os</strong> como a jurisprudência<br />
futura decidirá sobre as questões<br />
que certamente se suscitarão<br />
sobre esta matéria, pois<br />
este é um processo crítico na<br />
gestão fiscal d<strong>os</strong> contribuintes.<br />
Prevê-se ainda que <strong>os</strong> jur<strong>os</strong><br />
compensatóri<strong>os</strong> que sejam devid<strong>os</strong><br />
em resultado de liquidações<br />
adicionais de imp<strong>os</strong>to por<br />
via da aplicação da cláusula geral<br />
antiabuso sejam majorad<strong>os</strong><br />
em 15 pont<strong>os</strong> percentuais.<br />
É de referir igualmente que o<br />
artigo 38.º da LGT passa a dispor<br />
que, n<strong>os</strong> cas<strong>os</strong> em que tenha<br />
resultado a não aplicação de<br />
retenção na fonte com caráter<br />
definitivo ou uma redução do<br />
montante de imp<strong>os</strong>to retido a<br />
título definitivo, deve-se considerar<br />
que a vantagem fiscal se<br />
verificou na esfera do beneficiário<br />
efetivo do rendimento, tendo<br />
em conta <strong>os</strong> at<strong>os</strong> que correspondam<br />
à substância ou à<br />
realidade económica em causa.<br />
Quando a entidade portuguesa<br />
obrigada a proceder à entrega<br />
de imp<strong>os</strong>to retido na fonte tenha<br />
ou devesse ter (colocando<br />
o ónus da prova no contribuinte<br />
e não na AT) conhecimento da<br />
construção ou série de construções,<br />
a AT tem legitimidade para<br />
exigir a esta entidade o imp<strong>os</strong>to<br />
que se demonstre estar em falta.<br />
Esta regra pretende mitigar a<br />
arbitragem fiscal internacional,<br />
designadamente em matéria de<br />
localização de dívida financeira<br />
(que originam jur<strong>os</strong>) e/ou ativ<strong>os</strong><br />
intangíveis (que permitem a cobrança<br />
de royalties).<br />
As alterações agora introduzidas<br />
poderão ter impact<strong>os</strong><br />
fiscais consideráveis nas operações<br />
realizadas por grup<strong>os</strong><br />
económic<strong>os</strong> e respetiv<strong>os</strong> flux<strong>os</strong><br />
de rendimento transfronteiriç<strong>os</strong>,<br />
reforçando a importância<br />
crítica de um aconselhamento<br />
especializado, quer na revisão<br />
de estruturas existentes, quer<br />
na revisão prévia à implementação<br />
de qualquer estrutura ou<br />
transação, que permita avaliar<br />
e quantificar tais impact<strong>os</strong>, por<br />
forma a obviar a diferend<strong>os</strong><br />
com a AT, sempre mor<strong>os</strong><strong>os</strong> e<br />
por vezes com desfech<strong>os</strong> imprevisíveis.
Processo e Procedimento<br />
Acesso automático<br />
a contas financeiras<br />
de residentes – Será desta<br />
LUÍS PINTO<br />
Associate Partner, Tax Services<br />
Em 11 de janeiro último<br />
foi aprovado, pelo<br />
Parlamento, o regime<br />
de acesso automático<br />
a contas financeiras de<br />
residentes em Portugal,<br />
aguardando-se<br />
para breve o envio<br />
do respetivo diploma<br />
ao Presidente<br />
da República,<br />
para promulgação.<br />
Relembre-se que este regime,<br />
que obriga as instituições financeiras<br />
a reportar à Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira (AT) informação<br />
sobre as contas financeiras<br />
d<strong>os</strong> seus clientes residentes,<br />
já havia sido apresentado pelo<br />
Governo em setembro de 2016,<br />
tendo na altura sido vetado pelo<br />
Presidente da República, por entender<br />
não estarem reunidas as<br />
condições necessárias à sua implementação,<br />
atento o processo<br />
de consolidação do sistema financeiro<br />
em curso.<br />
Embora tenha ficado em “stand<br />
by”, sempre foi intenção do Governo<br />
a aprovação deste diploma,<br />
como medida de combate à<br />
fraude e evasão fiscal. E a verdade<br />
é que, em maio de 2018, após<br />
o Presidente da República ter<br />
sugerido que as condicionantes<br />
anteriores que justificaram o anterior<br />
veto presidencial haviam<br />
sido ultrapassadas, o Governo<br />
voltou a aprová-lo em Conselho<br />
de Ministr<strong>os</strong>, tendo contudo tal<br />
diploma ficado “estagnado” até<br />
agora.<br />
O regime em causa não é novidade<br />
para <strong>os</strong> mais atent<strong>os</strong>. Aliás,<br />
para as instituições financeiras,<br />
trata-se de um alargamento, a<strong>os</strong><br />
seus clientes residentes em território<br />
nacional, de uma obrigação<br />
de reporte à qual já se encontram<br />
adstrit<strong>os</strong> relativamente<br />
a<strong>os</strong> clientes não residentes, ao<br />
abrigo d<strong>os</strong> normativ<strong>os</strong> do CRS e<br />
do FATCA, embora com particularidades<br />
face a estes.<br />
Em concreto, e caso venha a ser<br />
promulgado, o diploma determinará<br />
o acesso automático, pela<br />
AT, a<strong>os</strong> sald<strong>os</strong> (novidade) e rendiment<strong>os</strong><br />
pag<strong>os</strong>/creditad<strong>os</strong> em<br />
contas financeiras (de depósito,<br />
custódia, apólices de seguro do<br />
ramo vida e outras contas financeiras)<br />
mantidas junto de instituições<br />
financeiras a titulares ou<br />
beneficiári<strong>os</strong> residentes em Portugal,<br />
cujo saldo/valor agregado,<br />
no final do respetivo ano civil,<br />
exceda € 50.000.<br />
Para além de outras regras relevantes<br />
(datas de aferição e procediment<strong>os</strong><br />
específic<strong>os</strong> ao nível<br />
de contas novas versus contas<br />
preexistentes, limites aplicáveis<br />
para efeit<strong>os</strong> de reporte e regras<br />
de determinação do conceito<br />
de residência, sald<strong>os</strong> e p<strong>os</strong>ições<br />
agregadas) destaca-se o facto<br />
de o primeiro reporte de informação<br />
ocorrer já em 31 de julho<br />
próximo quanto à p<strong>os</strong>ição das<br />
contas a 31 de dezembro de 2018,<br />
o que representará mais um d<strong>os</strong><br />
muit<strong>os</strong> desafi<strong>os</strong> que se colocam<br />
atualmente às instituições financeiras.<br />
Aguarda-se, assim, que 2019 seja<br />
um ano particularmente intenso<br />
no âmbito da temática da “transparência<br />
fiscal”, já que, para além<br />
deste regime, se encontra igualmente<br />
prevista a transp<strong>os</strong>ição<br />
da Diretiva (UE) 2018/822 do Conselho,<br />
de 25 de maio (referente à<br />
troca automática de informações<br />
em relação a<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong><br />
transfronteiriç<strong>os</strong> a comunicar) e,<br />
bem assim, clarificações ao nível<br />
do regime do Registo Central<br />
do Beneficiário Efetivo (Lei n.º<br />
89/2017, de 21 de Ag<strong>os</strong>to), cuja<br />
respetiva aplicação se iniciará<br />
durante o ano.<br />
131
Processo e Procedimento<br />
O alargamento da<br />
p<strong>os</strong>sibilidade de recurso em<br />
sede de arbitragem tributária<br />
132<br />
PEDRO PAIVA<br />
Partner, Tax Services<br />
RICARDO GONÇALVES<br />
Senior Consultant, Tax Services<br />
Uma das questões com<br />
que frequentemente<br />
se deparam <strong>os</strong><br />
contribuintes, quando<br />
colocad<strong>os</strong> perante<br />
uma situação de litígio<br />
com a Autoridade<br />
Tributária e Aduaneira<br />
(“AT”), é a de recorrer<br />
a<strong>os</strong> Tribunais<br />
Administrativ<strong>os</strong> ou<br />
Fiscais ou, ao invés, à<br />
Arbitragem Tributária,<br />
sob a égide do<br />
Centro de Arbitragem<br />
Administrativa (CAAD),<br />
enquanto forma<br />
alternativa de resolução<br />
de conflit<strong>os</strong>.<br />
Não raras vezes, a escolha entre<br />
estas duas vias para a resolução<br />
de litígi<strong>os</strong> passa pela contrap<strong>os</strong>ição<br />
de duas realidades. Por um<br />
lado, a celeridade na obtenção<br />
de uma decisão que permita<br />
dirimir definitivamente o litígio<br />
e, por outro, a p<strong>os</strong>sibilidade de,<br />
obtida uma decisão desfavorável,<br />
a mesma ser passível de recurso<br />
para um tribunal superior.<br />
Se a Arbitragem Tributária se<br />
destaca no primeiro ponto, com<br />
um prazo máximo previsto para<br />
a emissão de uma decisão final<br />
de seis meses após a constituição<br />
do Tribunal Arbitral (o qual,<br />
regra geral, tem sido cumprido),<br />
as grandes limitações relativas à<br />
recorribilidade das decisões arbitrais<br />
consubstanciam um entrave<br />
significativo à escolha, pel<strong>os</strong> contribuintes,<br />
do recurso a esta via.<br />
Reconhecendo esta preocupação,<br />
o legislador veio recentemente<br />
propor o alargamento<br />
das hipóteses de recurso das<br />
decisões em matéria tributária<br />
proferidas pelo CAAD no âmbito<br />
da Prop<strong>os</strong>ta de Lei 180/XIII, passando-se<br />
a prever a p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de recurso, para o Supremo<br />
Tribunal Administrativo (STA),<br />
de algumas decisões proferidas<br />
pelo CAAD. Assim, caso num determinado<br />
litígio seja proferida<br />
uma decisão arbitral em sentido<br />
op<strong>os</strong>to a outra decisão proferida<br />
pelo CAAD na mesma matéria,<br />
será p<strong>os</strong>sível recorrer para o STA<br />
com vista a obter uma decisão<br />
final.<br />
Anteriormente, o recurso de<br />
decisões proferidas pelo CAAD<br />
apenas estava previsto para as<br />
situações de op<strong>os</strong>ição com uma<br />
decisão proferida pel<strong>os</strong> Tribunais<br />
Centrais Administrativ<strong>os</strong> ou<br />
pelo STA, sendo igualmente p<strong>os</strong>sível<br />
o recurso para o Tribunal<br />
Constitucional em matérias de<br />
constitucionalidade. Porém, fora<br />
desta p<strong>os</strong>sibilidade de escrutínio<br />
adicional caíam <strong>os</strong> cas<strong>os</strong> que<br />
não haviam sido anteriormente<br />
apreciad<strong>os</strong> por um tribunal superior<br />
e, n<strong>os</strong> quais, a jurisprudência<br />
do CAAD assumia contorn<strong>os</strong>,<br />
não raras vezes, diametralmente<br />
op<strong>os</strong>t<strong>os</strong>, criando-se um nível de<br />
insegurança e incerteza n<strong>os</strong> contribuintes<br />
relativamente ao recurso<br />
à via arbitral que atualmente<br />
é evidente. Ou seja, afigura-se<br />
difícil de perceber qual o sentido<br />
da orientação da jurisprudência<br />
emanada pelo CAAD, existindo<br />
uma clara dificuldade (quando tal<br />
não deveria acontecer) em antecipar<br />
o que este órgão entenderá,<br />
no futuro, sobre um determinado<br />
tema / assunto que venha a ser<br />
dirimido com a AT.<br />
Assim, caso venha a ser aprovado,<br />
este alargamento da p<strong>os</strong>sibilidade<br />
de recurso de decisões<br />
proferidas pelo CAAD em<br />
matéria tributária, o qual ganha<br />
especial relevância nas situações<br />
em que a jurisprudência<br />
deste tribunal assume correntes<br />
op<strong>os</strong>tas, consubstancia um<br />
muito esperado passo no sentido<br />
de remover <strong>os</strong> entraves<br />
existentes no recurso à Arbitragem<br />
Tributária, aumentando a<br />
sua credibilidade e conferindo<br />
garantias adicionais a<strong>os</strong> contribuintes<br />
relativamente à validade<br />
das decisões proferidas.
Processo e Procedimento<br />
Informação Empresarial<br />
Simplificada – Um novo ciclo<br />
RUI CARVALHO<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Para a generalidade<br />
das empresas cujo<br />
período de tributação<br />
é coincidente com o<br />
ano civil o dia 15 de<br />
Julho de cada ano<br />
assinala o culminar<br />
das obrigações<br />
contabilísticas e fiscais<br />
relativas ao ano fiscal<br />
anterior.<br />
De facto, é este o momento<br />
para a entrega do modelo de<br />
Informação Empresarial Simplificada<br />
(IES) que já de algum<br />
tempo a esta parte, consiste na<br />
entrega, por via eletrónica e de<br />
forma totalmente desmaterializada,<br />
de obrigações declarativas<br />
de natureza contabilística,<br />
fiscal e estatística, a diferentes<br />
entidades.<br />
Face ao volume de informação<br />
a reportar na IES o período que<br />
medeia entre a submissão das<br />
declarações Modelo 22 (cujo<br />
período de entrega terminou a<br />
30 de junho – excepcionalmente<br />
este ano para períod<strong>os</strong> find<strong>os</strong><br />
a 31 de dezembro de 2017)<br />
e o dia 15 de Julho, é regra<br />
geral representativo de grande<br />
volume de trabalho para<br />
<strong>os</strong> departament<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong><br />
das empresas, devido não<br />
só à necessidade de compilar<br />
toda a informação necessária<br />
ao preenchimento da IES, bem<br />
como ao processo administrativo<br />
que deriva da forma de<br />
preenchimento da declaração,<br />
na maioria das vezes, efetuado<br />
manualmente. Este processo<br />
tem especial impacto em grup<strong>os</strong><br />
de sociedades e sociedades<br />
profissionais de contabilistas<br />
certificad<strong>os</strong> (CC).<br />
Um novo ciclo avizinha-se com<br />
a implementação da designada<br />
medida IES+ a qual, no âmbito<br />
do Programa Simplex, veio<br />
prever a implementação de<br />
um conjunto de procediment<strong>os</strong><br />
contabilístic<strong>os</strong> e fiscais com<br />
vista, designadamente, ao pré<br />
-preenchimento de uma parte<br />
significativa d<strong>os</strong> Anex<strong>os</strong> A e I<br />
da IES, nomeadamente através<br />
da inclusão das taxonomias na<br />
estrutura contabilística das empresas.<br />
Se por um lado esta medida representa<br />
uma revolução n<strong>os</strong> procediment<strong>os</strong><br />
contabilístic<strong>os</strong> com<br />
uma poupança considerável de<br />
tempo ao nível do preenchimento<br />
de divers<strong>os</strong> camp<strong>os</strong> da IES, na<br />
verdade não deixa também de<br />
ser um desafio à generalidade<br />
das empresas e CC, na medida<br />
em que continua a representar<br />
um investimento de tempo<br />
considerável na parametrização<br />
de softwares de contabilidade e<br />
respetivas validações, nomeadamente<br />
ao nível do ficheiro normalizado<br />
de auditoria tributária<br />
(SAF-T (PT)).<br />
Tendo sido adiada a implementação<br />
da medida IES+ por via<br />
do Despacho n.º 45/2018-XXI<br />
do SEAF, não foi p<strong>os</strong>sível ainda<br />
beneficiar destas medidas de<br />
simplificação, esperando-se no<br />
entanto que as mesmas p<strong>os</strong>sam<br />
ser aplicáveis durante o segundo<br />
semestre de 2018, nomeadamente<br />
a entidades cujo período<br />
de tributação não coincida com<br />
o ano civil ou nas situações em<br />
que se verifique a cessação de<br />
atividade.<br />
O ano de 2019 será à partida o<br />
ano de concretização massiva<br />
deste novo ciclo. Contudo, muit<strong>os</strong><br />
agentes económic<strong>os</strong> questionam-se<br />
quanto à extensão<br />
da simplificação da IES e em<br />
que medida esta não deveria<br />
ser alargada a outr<strong>os</strong> anex<strong>os</strong>,<br />
nomeadamente O e P, tendo em<br />
conta a informação de faturação<br />
que já é reportada à Autoridade<br />
Tributária numa base mensal<br />
desde 2013.<br />
133
Processo e Procedimento<br />
TIAGO CAPELO SILVA<br />
Senior Manager, Tax Services<br />
Na última década<br />
assistiu-se a uma<br />
crescente preocupação<br />
em combater a fraude<br />
e a evasão fiscal<br />
consubstanciand<strong>os</strong>e<br />
na proliferação de<br />
iniciativas concretas<br />
baseadas em<br />
mecanism<strong>os</strong> de troca<br />
de informação entre<br />
autoridades tributárias<br />
a uma escala global.<br />
O sucesso das medidas<br />
do combate à evasão fiscal<br />
baseadas n<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong><br />
de troca de informações<br />
Embora alguns desses mecanism<strong>os</strong><br />
já se encontrarem, há muito,<br />
estabelecid<strong>os</strong> no âmbito de divers<strong>os</strong><br />
instrument<strong>os</strong> basead<strong>os</strong> em<br />
acord<strong>os</strong> bilaterais, foi na sequência<br />
da cimeira de Londres do G20<br />
de 2009 que se verificou uma dramática<br />
evolução mundial da defesa<br />
da bandeira da transparência<br />
fiscal, traduzida num compromisso<br />
real da grande maioria das jurisdições<br />
em aderir a iniciativas de<br />
troca de informações.<br />
Neste âmbito, para além do aumento<br />
d<strong>os</strong> acord<strong>os</strong> celebrad<strong>os</strong><br />
entre diversas jurisdições que<br />
instituem um mecanismo de troca<br />
de informações a pedido das<br />
autoridades fiscais, foram igualmente<br />
crescendo <strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong><br />
transfronteiriç<strong>os</strong> automátic<strong>os</strong> de<br />
troca de informações, d<strong>os</strong> quais<br />
se destacam o Foreign Account Tax<br />
Compliance Act (FATCA), mecanismo<br />
imp<strong>os</strong>to pel<strong>os</strong> Estad<strong>os</strong> Unid<strong>os</strong>,<br />
e o Common Reporting Standard<br />
(CRS), iniciativa liderada pela OCDE<br />
que, atualmente, se caracteriza por<br />
quase 4000 relações bilaterais de<br />
troca de informação com relação a<br />
mais de 100 jurisdições.<br />
Mas será que todas estas iniciativas<br />
promovem, de facto, a transparência<br />
fiscal e a mitigação da evasão<br />
fiscal? É a procura de resp<strong>os</strong>ta<br />
a esta pergunta que levou a OCDE<br />
a divulgar, recentemente, as conclusões<br />
preliminares de um estudo<br />
que será publicado em breve e<br />
que pretende avaliar, com recurso<br />
a dad<strong>os</strong> relativ<strong>os</strong> a depósit<strong>os</strong> bancári<strong>os</strong>,<br />
o impacto d<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong><br />
de troca de informações.<br />
O documento revela-n<strong>os</strong> que tem<br />
sido feito um esforço académico<br />
para determinar o impacto d<strong>os</strong><br />
mecanism<strong>os</strong> de troca de informação<br />
na atividade bancária, em especial<br />
n<strong>os</strong> denominad<strong>os</strong> Centr<strong>os</strong><br />
Financeir<strong>os</strong> Internacionais (CFI),<br />
sendo consensual a observação<br />
de um declínio dessa atividade.<br />
Neste caso, o estudo permite observar<br />
a evidência de que o aumento<br />
d<strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> de troca<br />
de informações encontra-se associado<br />
à redução de depósit<strong>os</strong><br />
bancári<strong>os</strong> n<strong>os</strong> CFI – desde 2008,<br />
o estudo revela uma descida de<br />
34% d<strong>os</strong> depósit<strong>os</strong> detid<strong>os</strong> por<br />
entidades não bancárias –, o que<br />
parece indicar que estas medidas<br />
apresentam um impacto p<strong>os</strong>itivo<br />
no combate à evasão fiscal.<br />
Não obstante estas conclusões<br />
evidenciarem fortes evidências do<br />
sucesso das ações de combate à<br />
evasão fiscal, resta saber em que<br />
medida a redução de depósit<strong>os</strong><br />
bancári<strong>os</strong> não corresponde, na<br />
verdade, a uma substituição por<br />
outr<strong>os</strong> instrument<strong>os</strong> financeir<strong>os</strong><br />
que p<strong>os</strong>sam estar fora do âmbito<br />
da comunicação, e, por outro lado,<br />
qual é, em concreto, o impacto<br />
que <strong>os</strong> mecanism<strong>os</strong> de troca de<br />
informação produzem nas contas<br />
públicas e se <strong>os</strong> cofres das diferentes<br />
jurisdições estão, efetivamente,<br />
a sentir um aumento significativo<br />
das suas receitas fiscais como fruto<br />
deste combate. Resta-n<strong>os</strong> aguardar<br />
pela divulgação destes dad<strong>os</strong><br />
para que se p<strong>os</strong>sa concluir com um<br />
maior nível de certeza sobre o nível<br />
de eficácia destas medidas.<br />
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