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Revista Gávea 01

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Ambiguidade: o enigma de Volpi 13

revelar as questões de caráter exclusivamente visuais que o artista apresenta, precisando o

desvelamento de seu pensamento visual.

A distinção começa de início pela identificação do tema da composição. O arco ogival

que aí aparece refaz em forma ampliada o corte interno de uma bandeirinha, forma esta

(parte inferior da bandeirinha) que abrange toda a tela, e é confirmada pelos cortes laterais

que desenham suas pontas. E uma forma (bandeirinha) maior que domina a superfície e

que contém outras formas menores iguais que a constituem (bandeirinhas e/ou triângulos

gerados por elas num efeito positivo-negativo destacados pela cor) ou, melhor dizendo,

várias formas (bandeirinhas) contidas numa outra maior dominante.

Na ogiva resultante tratada por uma cor sempre mais escura e que se repete nas laterais

obtém-se um fundo que é ao mesmo tempo um grande triângulo em negativo e uma

profundidade (fundo acentuado pelas linhas oblíquas que convergem para uma linha vertical

ao centro formando ângulos) mas que Volpi atrai para o plano, pela repetição de cores

que se encontram nesse plano. Assim os planos se aproximam pelo uso da mesma cor

(dentro e fora) e que por suas qualidades se destacam. Efeito semelhante irá ocorrer no uso

de uma cor, que contrasta ou seja destaca, valorizando os triângulos distribuídos por toda a

composição; é pela cor que esses triângulos ressaltam e se transformam em positivos,

unificando os planos e mantendo as formas (bandeirinhas e triângulos) e o olhar em suspensão.

Estabelece-se aí uma tensão manifestada pelos efeitos dicotômicos gerados pela cor,

onde ora se valoriza um dos duplos, ora o outro numa apreensão global da ambigüidade no

olhar, criando no observador um certo deslocamento e estranhamento desse olhar. Essas

dicotomias resumem-se assim num jogo de efeitos, identificáveis em: positivo-negativo

(por exemplo: triângulo/bandeirinha), — dentro-fora, — par-ímpar (por exemplo: valorização

de duas bandeirinhas de mesma cor no mesmo plano e de uma terceira bandeirinha

também de mesma cor na profundidade (ogiva), — simetria-assimetria (por exemplo: no

uso das cores, da mesma forma que o anterior).

E, assim sucessivamente, numa inversão constante, interagindo dentro de modelos

de composição que constantemente se repetem, Volpi cria, recria, numa pesquisa contínua,

que permite novas possibilidades de configuração. Onde, como em Albers, segundo Baltcock

“ a menor das variações em qualquer das cores resulta em nova pintura radicalmente

diferente da anterior quanto ao sentir” .

A textura obtida pela têmpera, usada de forma abstrata (como elemento plástico em

si), portanto, emancipada da sua função de criar mimese, torna-se profundamente significativa

no contexto da obra. Resulta, assim, outras ambigüidades: — técnica antiga

(têmpera) expressa numa linguagem moderna; — textura como elemento plástico em si,

de efeito translúcido (onde o pigmento não se dilui, só se mistura), que resulta numa transparência

de branco (que aqui não é cor) eque homogeneiza toda a tela, porém remete à

ambiência, á luz, à parede caiada, ao afresco e ao passado.

Assim, lançando mão de uma técnica tradicional numa postura moderna, ele une

uma possibilidade de expressão plástica pura a cor e a textura, permitindo um jogo de formas

e massas, obtendo uma densidade expressiva, por uma economia de meios, numa intensidade

colorística.

Sendo a textura o elemento estável e permanente em toda obra ela adquire dinamicidade

no gesto (marca do pincel), que sublinha, define e/ou desenha a forma.

Em certos quadros, somente a direção e a medida da pincelada, desenhando as formas

dentro de uma só cor, garantem a visibilidade dessas formas e estruturam toda a superfície

do quadro.

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