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26 GÁVEA
pintura sobre a tela tornar-se aparente, será um contra-senso a qualificar de gestual . A
pintura gestual pura não olha o que ela faz (grifo nosso) e Soulages controla, ao contrário,
meticulosamente. cada instante de acabamento da obra, donde ele assume a responsabilidade
do menor detalhe material".
O que estamos procurando indicar é que qualquer classificação sumária da obra de IC
não é determinante para a sua compreensão. E sobretudo que ler a obra não é somente
decifrar teoricamente seus signos, pois eles não são redutiveis a mensagens somatizadas
—nossa ação exigirá uma adesão mais profunda, a que Chalumeau chama emoção.
Produzir uma pintura contemporânea, impregnada de questões organizadas intelectual
e emocionalmente e que conferem ao quadro seu significado, não é um dado psicológico.
É. isto sim. um esforço do sujeito perante a tela vazia e que pretende transcender os
limites do simples olhar. A consciência passa a ser a existência da própria pintura como
corpo/carne, como um mundo que ali, no espaço da tela, é refletido mas também reflete.
Para assim entendê-la é preciso “olhá-la vendo".
Não vamos nos prender aos primeiros sintomas da “ desintegração da forma", resultado
de um complexo encadeamento de seu percurso criador. Buscamos captar sua abstração
como uma estrutura criada mediante o poder de um ato imaginário. Ou seja, Iberê
Camargo persegue na forma, no imaginário, no simbólico, uma “ coerência nova": o estar
presente na concretude da matéria. Esse exercício que nem sempre opera de modo objetivo
na pintura, está na sua obra dialeticamente como causa e conseqüência gerando de fato,
pois na concretude o símbolo engendra sempre um novo campo simbólico e assim por
diante.
' ‘O artista deixa de ser livre quando
afoga a voz de sua intuição para servir
a uma ideologia que não é a da arte ’ ’ (IC)
Em arte, não se trata de inventar formas e sim de captar forças. Por isso, a rigor,
nenhuma arte é figurativa — segundo Klee, a fórmula não é traduzir o visível, mas tornar
visível. A força está em estreita relação com a sensação: é necessário que uma força se
exerça sobre um corpo, sobre um local, porque ai há sensação. A dinâmica da abstração de
Iberê está justamente nas linhas de força que energizam suas formas — ora elas se aglutinam
em núcleos, ora explodem. A redefinição de sua linguagem pictórica, como indicamos.
se dá com a série dos “ Carretéis", quando passa a efetuar a “ tradução" do real
pelo emprego de um sinal, compreendendo portanto a relação de significação entre um objeto
e um símbolo, identificando-os em conjuntos diferentes.
A base da imaginação criadora — a Abstração em sentido estrito — implica na faculdade
simbolizante que permite a formação do conceito, da idéia, distinta do objeto concreto
que toma-se apenas o exemplo, a referência, o lado do avesso.
A técnica que passa a utilizar não se limita mais à simples colocação das camadas de
cores. Ao contrário são as sucessivas camadas de impasto, pinceladas e espatuladas violentas
e mescladas, as texturas e os sulcos que produzem a obra. A substituição da antiga ordem
é um processo que amadurece vagarosamente e exige do artista uma luta consigo
mesmo, experiência que se reverte integralmente para a tela. Dessa maneira, a abstração
de IC é uma massa permeada de substâncias que perseguem esquemas de pensamento, ora
imaginários ora figurativos. Com esses esquemas ele organiza as matérias, confunde as
formas e a Forma, trabalha a ambiguidade dos signos, articula as linhas de força, acelera e
desacelera o ritmo dos gestos, enfim, deixa visível o percurso da identidade de sua lin