Revista dependências - Novembro 2007
Revista dependências - Novembro 2007
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24 | Dependências | Rede Europeia para a Prevenção do Tabagismo reúne em Cascais<br />
vender tabaco a menores, como pode isto<br />
acontecer? Claramente, a lei não está a ser<br />
aplicada e, como tal, não pode funcionar. E<br />
se os nossos legisladores forem cada vez<br />
mais sérios acerca destas matérias, creio<br />
que podemos perfeitamente alcançar esse<br />
objectivo.<br />
Dep – Deveria o tabaco passar a ser considerado<br />
uma substância ilícita?<br />
L.C. – O problema é que existe um segmento<br />
da população fumadora tão significativo<br />
que, torná-la actualmente ilícita, não resultaria.<br />
Foi através de um acidente histórico<br />
que se tornou legal mas não a podemos<br />
tornar ilegal de um momento para o<br />
outro, na medida em que muita gente está<br />
dependente. Obviamente, se considerasse<br />
útil essa medida, proibiria o uso de tabaco<br />
até porque o objectivo é eliminá-lo definitivamente.<br />
Agora, podemos constatar que<br />
a morfina, o ópio, a cocaína ou a heroína<br />
eram substâncias legais e são actualmente<br />
ilícitas porque apenas um pequeno segmento<br />
da população as usa. E o mesmo deverá<br />
acabar por acontecer com os cigarros<br />
mas não hoje nem amanhã.<br />
Dep – Como sabe, no próximo dia 1 de Janeiro<br />
entrará em vigor a nova lei portuguesa<br />
sobre tabagismo. O que poderemos<br />
aprender com as experiências irlandesa e<br />
italiana?<br />
L.C. – A nova lei portuguesa representa um<br />
avanço. No entanto, é inadequada, o que<br />
acabará por ser constatado. A nova lei por-<br />
tuguesa baseia-se na lei espanhola e os colegas<br />
espanhóis já demonstraram que a<br />
mesma não funciona, não atinge os objectivos<br />
definidos. Na Irlanda, definimos o quão<br />
importante é proteger as pessoas nos seus<br />
locais de trabalho, algo que consideramos<br />
um direito humano. E assim sendo, não deveria<br />
ser uma questão selectiva. Então, na<br />
Irlanda, definimos que ninguém deve ser<br />
obrigado a respirar o fumo dos outros, seja<br />
no trabalho, em restaurantes, em bares ou<br />
qualquer outro local público e já demonstrámos,<br />
através de avaliações, o impacto<br />
que tal medida produziu no ambiente de<br />
trabalho, que, por exemplo, o ar ficou mais<br />
limpo, que diversos agentes cancerígenos<br />
foram removidos, que os resultados dos<br />
testes respiratórios melhoraram e os sintomas<br />
também. Sabemos igualmente que o<br />
número de ataques cardíacos diminui, algo<br />
que leva algum tempo a demonstrar através<br />
de avaliações mas que faremos com<br />
toda a certeza.<br />
Dep – Até que ponto contribuiu a<br />
implementação da lei irlandesa para uma<br />
diminuição do número de fumadores?<br />
L.C. – Não terá contribuído assim tanto<br />
para a redução do número de fumadores,<br />
até porque não era esse o seu objectivo<br />
fundamental. O seu grande objectivo consiste<br />
em proteger aqueles que não querem<br />
fumar. Talvez tenha tido algum efeito sobre<br />
a prevalência de fumadores e acredito que<br />
contribuirá para atingirmos uma mudança<br />
cultural ao nível dos comportamentos<br />
mas sabemos que estes fenómenos acontecem<br />
de uma forma lenta. Mas também<br />
sabemos que contribuirá para a “desnormalização”<br />
do consumo de cigarros e contribuirá,<br />
a longo prazo, para que menos jovens<br />
comecem a fumar. Actualmente, são<br />
nítidas as motivações dos jovens para fumar,<br />
o que inclui a pressão de pares, o risco<br />
assumido, a sensualidade ou a masculinidade<br />
a que a indústria tabaqueira utiliza<br />
nas suas mensagens como instrumento de<br />
propaganda e chega até a haver jovens que<br />
o fazem porque não pretendem fazer algo<br />
que julgam ser pior, como consumir drogas<br />
ilícitas. Mas diga-me, se souber, qual é a<br />
outra droga que mata mais de 50 por cento<br />
que a usa…<br />
Dep – E quanto à lei italiana?<br />
L.C. – A lei italiana tem resultado num tremendo<br />
sucesso, apesar de não ter sido alvo<br />
de uma tão intensa preparação como aconteceu<br />
noutros países, como a Irlanda em<br />
que tivemos que enfrentar árduas batalhas<br />
e de nos preparar de forma muito significativa.<br />
Em Itália, começaram por definir que<br />
seria permitido fumar se certos standards<br />
de ventilação fossem cumpridos nos locais<br />
públicos ou no trabalho. E todos sabemos<br />
que a ventilação não funciona e o standard<br />
que propuseram era praticamente impossível<br />
de alcançar e, mesmo sendo possível,<br />
acarretaria custos avultadíssimos. Tudo<br />
isto resultou numa proibição construída de<br />
uma forma muito inteligente.